Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
959/14.0T8PNF.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: JERÓNIMO FREITAS
Descritores: ACIDENTE DE TRABALHO
CONCEITO DE RETRIBUIÇÃO
NOÇÃO
CUSTOS ALEATÓRIOS
ÓNUS DA PROVA
Nº do Documento: RP20181207959/14.0T8PNF.P1
Data do Acordão: 12/07/2018
Votação: MAIORIA COM 1 DEC VOT E 1 VOT VENC
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: NÃO PROVIDO
Indicações Eventuais: 4ªSECÇÃO (SOCIAL), (LIVRO DE REGISTOS N.º285, FLS.286-295)
Área Temática: .
Sumário: I - O conceito de retribuição para efeitos do cálculo das prestações devidas ao sinistrado ou beneficiários no âmbito da reparação devida por acidente de trabalho não coincide e é mais amplo que o consagrado no Código do Trabalho.
II - Na noção da n.º2, do art.º 71.º, da Lei 98/09, assume preponderância a regularidade no pagamento. Não pressupõe necessariamente a existência de correspectividade entre as prestações do empregador e a disponibilidade do trabalhador, antes abrangendo também quaisquer outras prestações que tenham causa específica e individualizável diversa da remuneração do trabalho, desde que recebidas com carácter de regularidade e não destinadas a compensar o sinistrado por custos aleatórios.
III - São custos aleatórios os que tenham subjacente um acontecimento incerto, sujeito às incertezas do acaso, casual, fortuito, imprevisível. O que vale por dizer que não só o montante deve ser susceptível de variar, como também a causa que lhe está subjacente deve ter alguma incerteza ou imprevisibilidade.
IV - O facto de entidade empregadora denominar nos recibos da retribuição determinado pagamento como “ajudas de custo”, não é suficiente para as considerar como tal. À partida, desde que pagas regular e periodicamente, na medida em que pressupõem uma vinculação prévia do empregador e são susceptíveis de gerar uma expectativa de ganha para o trabalhador, essas quantias presumem-se retribuição, recaindo sobre a entidade empregadora, nos termos dos arts. 344.º, n.º 1 e 350.º, n.º 1 do CC, o ónus de provar que essa atribuição patrimonial reveste a natureza de ajudas de custo.
V - As prestações em causa correspondem a valores fixos e diários “ logo, independentes de quaisquer custos ou despesas aleatórias – devidos por cada dia de trabalho – no que se evidencia a sua correspectividade com o trabalho desenvolvido pelo trabalhador”, implicando neste caso - como provado - que o sinistrado fizesse “fora de casa o pequeno-almoço e almoço, diariamente”, mas sem necessidade de qualquer documento comprovativo.
VI - É certo, pois, que o autor tomava “fora de casa o pequeno-almoço e almoço, diariamente”, bem assim que aquele pagamento visava reembolsá-lo “por custos com as refeições que efectuava quando estava a fazer transportes”, mas isso não significa necessariamente que tomava as refeições em estabelecimentos de restauração, nem tão pouco que despendesse diariamente esse valor em refeições, pois bem podia fazer-se acompanhar delas já previamente confecionadas em casa, sem custos para além dos que sempre teria que suportar para, como é normal nos nossos usos, tomar diariamente essas refeições.
VII - A prova feita não exclui a possibilidade do autor gerir aquele valor, que sabe de antemão lhe vai ser pago por cada dia de trabalho efectivo independentemente de demonstrar qualquer gasto real para além do que normalmente teria no âmbito da sua economia pessoal e familiar, o que se traduz na possibilidade de usar esse valor, acrescendo-o ao magro salário que aufere, para retirar “uma vantagem económica representativa do rendimento da sua actividade laborativa”.
VIII - Neste quadro, essas prestações pagas ao autor traduzem, no rigor das coisas, um valor material com repercussão positiva na sua economia pessoal e familiar, que se traduz num rendimento com o qual sabe poder contar mensalmente e, em função dessa certeza, programar regularmente a sua vida.
IX - Mas mesmo que não possa ter-se a certeza que o autor assim procede, o certo é que estamos perante um pagamento regular que é efectuado sem necessidade de comprovação das despesas, acrescendo que é perfeitamente possível, na realidade das coisas, que os valores recebidos sejam afectos à sua economia pessoal e familiar.
X - E, esse é o ponto fulcral da questão. O ónus de prova recai sobre a Ré e não sobre o trabalhador sinistrado. Era à Ré que cabia demonstrar estar a suportar custos aleatórios do autor, os quais têm subjacentes “a variabilidade e contingência das prestações”.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: APELAÇÃO n.º 959/14.0T8PNF.P1
SECÇÃO SOCIAL

ACORDAM NA SECÇÃO SOCIAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO
I. RELATÓRIO
I.1 Na presente acção especial, emergente de acidente de trabalho, que correu termos na Comarca do Porto Este – Juízo do Trabalho de Penafiel – J4, o sinistrado B…, com o patrocínio do Ministério Público, apresentou petição inicial dando início à fase litigiosa, para demandar a COMPANHIA DE SEGUROS C…, SA. e a sua entidade empregadora “D…, SA, pedindo a condenação das mesmas, em função das respectivas quotas de responsabilidade, a pagarem-lhe o seguinte:
1- O capital de remição da pensão anual calculada com base na IPP que vier a ser fixada ao sinistrado em junta médica, calculada com base na retribuição reclamada, devida desde 14.11.2014;
2- A quantia de 322,45 euros a título de indemnização pelo período de incapacidade temporária;
3- A quantia de 30,00 euros relativa a despesas de deslocação a Tribunal e ao gabinete médico-legal de Penafiel;
4- Juros de mora à taxa legal, vencidos e vincendos, sobre todas as prestações e até integral pagamento.
Na tentativa de conciliação não foi obtido acordo em razão do autor não ter concordado com a IPP de 0% - curado sem desvalorização – atribuído pelo senhor perito médico no exame singular; e, ainda, por a entidade empregadora recusar qualquer responsabilidade na reparação do sinistro, alegando que as verba entregue ao sinistrado no valor de €12 x 22dias x 11 meses, a título de ajudas de custo e não de subsídio de refeição, cujo valor não estava incluído na retribuição coberta pelo seguro de acidentes de trabalho, destinavam-se reembolsá-lo dos seus custos aleatórios com a sua alimentação nas viagens, sem prejuízo de, nos termos do CCTV aplicável ao sector, o sinistrado não ter direito a subsídio de alimentação.
Na petição inicial o autor alegou, para além do mais, que auferia todos os meses, para além do vencimento base, diuturnidades, prémio de função e a quantia de 12€ por dia de serviço [12€ x 22 dais x 11 meses], a título de subsídio de refeição.
Regularmente citadas as RR apresentaram contestação, ambas reiterando as posições assumidas na tentativa de conciliação.
A R D… veio concretizar a sua posição, alegando que a verba mensal que o sinistrado recebia a título de “ajudas de custo” e não “subsídio de alimentação” - uma vez que, os motoristas de pesados afectos ao transporte nacional não têm direito a subsídio de alimentação -, visava reembolsá-lo dos seus gastos com alimentação nas viagens que efectuava a mando da ré. A quantia diária de 12,00 euros era-lhe entregue para o reembolsar dos seus gastos com o seu pequeno-almoço e o almoço, as duas refeições que, em regra, tomava no exercício das suas funções, tudo em cumprimento do estatuído na CCTV aplicável ao sector.
Concluiu, defendendo que não tendo essas “ajudas de custo” qualquer natureza retributiva, pois destinavam-se a compensar o autor por custos aleatórios, o pedido deduzido contra a ré terá necessariamente que improceder.
Foi proferido despacho saneador, onde se reconheceu a regularidade da instância, fixando-se os factos assentes e a base instrutória.
Realizou-se audiência de discussão e julgamento, culminada com a decisão sobre a matéria de facto.
I.2 Subsequentemente o tribunal a quo proferiu sentença, concluída com o dispositivo seguinte:
- «Nesta conformidade, condeno:
A) a Ré “COMPANHIA DE SEGUROS C…, SA” a pagar ao Autor, B…:
I - a quantia de €23,89, a título de despesas de deslocações obrigatórias, acrescida de juros de mora, à taxa de 4% ao ano, a partir de 21-03-2017 até integral pagamento.
B) a Ré “D…, SA” a pagar ao Autor, B…:
I - a quantia de €323,02, a título de indemnizações por incapacidades temporárias não pagas, acrescida de juros de mora, a contar sobre a quantia diária de cada uma daquelas indemnizações nos termos supra explanados, desde a data a que se reporta cada uma dessas quantias diárias, à taxa de 4% ao ano até integral e efectivo pagamento;
II - a quantia de € 6,11, a título de despesas de deslocações obrigatórias, acrescida de juros de mora, à taxa de 4% ao ano, a partir de 21-03-2017 até integral pagamento.
*
Custas pelas RR Seguradora e D…, na proporção das respectivas responsabilidades.
Fixo o valor de processo em €1.616,29 - artigo 120.º do Código de Processo do Trabalho.
Registe e notifique.
(..)».
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I.7 Delimitação do objecto do recurso
Sendo o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das alegações apresentadas, salvo questões do conhecimento oficioso [artigos 87.º do Código do Processo do Trabalho e artigos 639.º, 635.º n.º 4 e 608.º n.º2, do CPC, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho] a questão suscitada pela recorrente para apreciação consiste em saber se os 12,00 euros diários entregues ao autor destinavam-se a compensar o sinistrado por custos aleatórios, não podendo ser considerados parte integrante da sua retribuição.
II. FUNDAMENTAÇÃO
II.1 MOTIVAÇÃO DE FACTO
O Tribunal a quo fixou o elenco factual seguinte:
A. O Autor foi admitido ao serviço da 2ª Ré, para quem mediante retribuição, prestava as funções de motorista de pesados.
B. No dia 16 de Setembro de 2014, cerca das 06:30 horas, em …, Valongo, o Autor sofreu um acidente.
C. Na altura do acidente o A. desempenhava funções de motorista de pesado de mercadorias, exclusivamente em território nacional.
D. Trabalhava de segunda-feira a sábado e folgava ao domingo, fazendo fora de casa o pequeno-almoço e almoço, diariamente.
E. No referido dia 16 de Setembro de 2014, cerca das 06:30 horas, no exercício das suas funções e por determinação da 2ª Ré, procedia à entrega de um alvará, quando foi atropelado e projectado por um empilhador, do que resultou um traumatismo da região lombosagrada.
F. A 2ª Ré dedica-se à actividade de transportes nacionais e internacionais.
G. A 2ª Ré tinha a sua responsabilidade relativamente a acidentes de trabalho em que fosse interveniente o Autor transferida para a Ré seguradora mediante contrato de seguro titulado pela apólice nº ……, cuja cópia se encontra junta aos autos a fls. 29 e ss, pela retribuição de €811,21 x 14 meses.
H. Do acidente resultou para o A. incapacidade temporária absoluta (correspondente ao período durante o qual o Autor esteve totalmente impedido de realizar a sua actividade profissional) desde 17.09.2014 a 13.11.2014.
I. Relativamente a tais períodos a Ré Companhia de Seguros pagou ao sinistrado 1.263,27 euros
J. O A despendeu 30,00€ referente a despesas de deslocações obrigatórias desde a sua residência a este tribunal e ao gabinete médico-legal de Penafiel.
K. O Autor nasceu a 18 de Junho de 1973 em …, Paredes.
L. Na data do acidente o Autor auferia a retribuição base anual de 525,00€ x 14, acrescida de 15,30€ x 14 (diuturnidades) 270,91€ x 14 (prémio de função) e 12,00€ por cada dia de trabalho efectivo prestado, que a R D… descriminava como sendo ajudas de custo, e que visavam reembolsar o trabalhador por custos com as refeições que efectuava quando estava a fazer transportes.
M. Em consequência do acidente referido o A. sofreu traumatismo lombosagrado estando desde 13-11-2014 curado sem desvalorização, data em que lhe foi atribuída alta por consolidação médico-legal das lesões.
II.2 MOTIVAÇÃO de DIREITO
A recorrente impugna a sentença exclusivamente na vertente da aplicação do direito aos factos, vindo defender que o tribunal a quo errou ao considerar que a quantia de €12 que pagava diariamente ao sinistrado, sob a designação “ajudas de custo”, integra o conceito de retribuição dado pelo art.º 71.º/3 da Lei 98/2009, de 04 de Setembro [REGULAMENTA O REGIME DE REPARAÇÃO DE ACIDENTES DE TRABALHO E DE DOENÇAS PROFISSIONAIS].
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Releva ainda deixar nota da posição assumida pela recorrente na acção, mais precisamente do que foi concretamente alegado na contestação, que consiste exclusivamente no seguinte:
- «1º- A verba mensal que o sinistrado recebia a título de “ajudas de custo” (e não “subsídio de alimentação”, uma vez que, os motoristas de pesados afectos ao transporte nacional não têm direito a subsídio de alimentação, já que andam constantemente deslocados do seu local fixo de trabalho) visava reembolsá-lo dos seus gastos com a sua alimentação nas viagens que efectuava a mando da ré,
2º- Entregando a ré ao sinistrado a quantia diária de 12,00 euros para o reembolsar dos seus gastos com o seu pequeno-almoço e o almoço,
3º- Uma vez que, no exercício das suas funções, o sinistrado, em regra, tomava essas duas refeições,
4º- Tudo em cumprimento do estatuído na CCTV aplicável ao sector.
5º- Assim, uma vez que as “ajudas de custo” recebidas pelo sinistrado em cada mês não têm qualquer natureza retributiva, tendo apenas e só carácter aleatório, pois destinavam-se a compensá-lo por custos aleatórios (cf. artigo 71º, n.º 2 da LAT), o pedido deduzido contra a ré terá necessariamente que improceder, o que expressamente se invoca, com as legais consequências».
II.2.1 Como bem se vê, no que respeita a eventual CCTV aplicável, a Ré limitou-se a alegar conclusivamente – “Tudo em cumprimento do estatuído na CCTV aplicável ao sector”, sem cuidar de indicar qual o instrumento de regulamentação colectiva de trabalho a que se refere, quais os fundamentos que conduzem à sua aplicação e, ainda, qual a cláusula de que estaria a fazer aplicação.
Dai que, com o devido respeito, é descabido vir agora no recurso, sem mais, afirmar que os 12,00 euros diários eram “entregues pela apelante ao sinistrado em cumprimento do prevenido na cláusula 47ª do CCTV” e pretender defender que a sentença recorrida violou “entre outros, o artigo 72ª/2 da LAT e a cláusula 47ª do CCTV”.
Trata-se, pois, da introdução de uma questão de direito que não foi submetida à apreciação da 1.ª instância, pelas mesmas razões acima indicadas, isto é, em momento algum Ré veio alegar qual a CCTV aplicável, justificar a sua aplicação e invocar a norma que estaria a ser violada.
Assim sendo, estamos perante uma questão nova, por essa razão não podendo este tribunal de recurso dela conhecer. Como tem sido entendimento corrente da doutrina e da jurisprudência, apenas nos casos expressamente previstos (cfr. artigo 665º nº 2, 608º, nº 2, in fine, CPC), pode o tribunal superior substituir-se ao tribunal que proferiu a decisão recorrida.
Com efeito, a jurisprudência tem reiteradamente entendido que os recursos não visam criar e emitir decisões novas sobre questões novas (salvo se forem de conhecimento oficioso), mas impugnar, reapreciar e, eventualmente, modificar as decisões do tribunal recorrido, sobre os pontos questionados e “dentro dos mesmos pressupostos em que se encontrava o tribunal recorrido no momento em que a proferiu” [Cfr. Acórdãos do STJ (disponíveis em www.dgsi.pt): de 22-02-2017, proc.º 519/15.4T8LSB.L1.S1, Conselheiro Ribeiro Cardoso; de 14-05-2015, proc.º 2428/09.1TTLSB.L1.S1, Conselheiro Melo Lima; de 12-09-2013, proc.º 381/12.3TTLSB.L1.S1 e de 11-05-2011, proc.º786/08.4TTVNG.P1.S1, Conselheiro Pinto Hespanhol].
II.2.2 Como é sabido, o recorrente deve expor ao tribunal ad quem as razões da sua discordância, procurando convencer da sua pertinência para evidenciar o erro que sustenta existir na decisão de que recorre, a fim de que este tribunal se debruce sobre elas e decida se procedem ou não.
Ora, se bem atentarmos nas alegações de recurso, com excepção da questão que singelamente veio procurar introduzir, em bom rigor a recorrente limita-se a reiterar o que alegou na contestação, não colocando qualquer outra questão de direito, devidamente sustentada, para opor à fundamentação do tribunal a quo.
Não obstante, prosseguiremos com a apreciação.
O trabalhador e os seus familiares têm direito à reparação dos danos emergentes dos acidentes de trabalho e doenças profissionais nos termos previstos na Lei 98/2009, de 4 de Setembro (art.º2.º).
No caso, em consequência do acidente de trabalho sofrido no dia 16 de Setembro de 2014, o autor esteve na situação de “incapacidade temporária absoluta (correspondente ao período durante o qual o Autor esteve totalmente impedido de realizar a sua actividade profissional) desde 17.09.2014 a 13.11.2014 [facto H). A partir daquela data foi considerado “curado sem desvalorização, data em que lhe foi atribuída alta por consolidação médico-legal das lesões [facto M].
O direito à reparação dos danos emergentes de acidente de trabalho compreende as prestações mencionadas no art.º 23.º da Lei 98/2009, entre elas, [al.b)] “Em dinheiro - indemnizações, pensões, prestações e subsídios previstos na presente lei.”.
Uma vez que o sinistrado ficou curado sem desvalorização, está apenas em causa a indemnização por incapacidade temporária para o trabalho, destinada “a compensar o sinistrado, durante um período de tempo limitado, pela perda ou redução da capacidade de trabalho ou de ganho resultante de acidente de trabalho” [art.º 48.º 1]. Releva ainda o n.º 3/d] do mesmo artigo, de onde resulta que em caso de incapacidade temporária absoluta, ao sinistrado é devida “indemnização diária igual a 70 % da retribuição nos primeiros 12 meses e de 75 % no período subsequente“.
E, está em causa essa prestação pelo facto da Ré empregadora não assumir a responsabilidade pelo pagamento na parte proporcional - por não estar coberta pelo seguro de acidentes de trabalho em razão da Ré não a ter transferido - relativa à prestação que pagava ao autor de “12,00€ por cada dia de trabalho efectivo prestado, que (..) descriminava como sendo ajudas de custo, e que visavam reembolsar o trabalhador por custos com as refeições que efectuava quando estava a fazer transportes” [facto L].
Com efeito, estando o empregador obrigado a transferir a responsabilidade pela reparação prevista na lei para entidades legalmente autorizadas a realizar esse seguro, quando se verifique que a retribuição declarada é inferior à real, a seguradora só é responsável em função da que lhe foi declarada, recaindo sobre aquele a responsabilidade restante aferida em termos proporcionais (art.º 79.º1 e 4, da Lei 98/2009).
No entender da recorrente, discordando do Tribunal a quo, aquela prestação não integra o conceito de retribuição e, logo, não recai sobre si qualquer responsabilidade pelo pagamento em que foi condenada. O fulcro da questão consiste, pois, em saber se aquela prestação integra, ou não, o conceito de retribuição.
A noção de retribuição dada pelo Código do Trabalho, nomeadamente, no art.º 258.º, “compreende a retribuição base e outras prestações regulares e periódicas feitas, directa ou indirectamente, em dinheiro ou em espécie” (n.º2), presumindo-se “constituir retribuição qualquer prestação do empregador ao trabalhador” (n.º3).
Mas como se sabe, para efeitos de cálculo das prestações em dinheiro devidas para reparação dos danos emergentes de acidente de trabalho cabe atender ao conceito dado pela própria lei que regulamenta os acidentes de trabalho, na actual Lei 98/2009, de 04 de Setembro, aqui aplicável, o n.º2, do art.º 71.º. Solução que não diverge da já consagrada nos anteriores regimes jurídicos dos acidentes de trabalho e doenças profissionais, os quais continham igualmente uma noção própria de retribuição a considerar para efeitos de cálculo das prestações devidas para reparação dos danos emergentes de acidente de trabalho.
Atentemos, pois, nas normas em causa.
O n.º2, do art.º 71.º, co actual regime, dispõe:
- «[2] Entende-se por retribuição mensal todas as prestações recebidas com carácter de regularidade que não se destinem a compensar o sinistrado por custos aleatórios».
Na precedente Lei 100/97, de 13 de Setembro, estabelecia o n.º3, do art.º 26.º, o seguinte: “Entende-se por retribuição mensal tudo o que a lei considera como seu elemento integrante e todas as prestações recebidas mensalmente que revistam carácter de regularidade e não se destinem a compensar o sinistrado por custos aleatórios”.
E, na Lei 2127, de 3 de Agosto, que antecedeu este último diploma, dispunha o n.º2 da Base XXIII, o seguinte: “Entende-se por retribuição tudo o que a lei considere como seu elemento integrante e todas as prestações que revistam carácter de regularidade”.
Confrontando as sucessivas normas entre si, constata-se o seguinte:
i) As três normas atribuem especial relevância à regularidade no pagamento, para considerarem, como regra, que as prestações recebidas com carácter de regularidade integram o conceito de retribuição para efeitos do regime de reparação de acidentes de trabalho e doenças profissionais;
ii) Com a lei 100/97 o legislador passou a exigir expressamente, para que as prestações recebidas com “carácter de regularidade” integrem a noção de retribuição -para efeitos dessa lei - que “não se destinem a compensar o sinistrado por custos aleatórios”.
iii) Esta exigência, excluindo da noção de retribuição as prestações que se destinem a compensar o sinistrado por custos aleatórios, mantém-se na actual norma e com a mesma formulação;
iv) A norma actual não remete para os critérios da retribuição da lei geral, como acontecia com as que a precederam, ambas essas iniciando-se dizendo “Entende-se por retribuição (mensal) tudo o que a lei considera como seu elemento integrante…”;
Ao longo da vigência dos sucessivos regimes jurídicos de reparação dos acidentes de trabalho os Tribunais superiores foram inúmeras vezes confrontados com questões similares a esta, ou seja, para definirem se determinada prestação integra, ou não, o conceito de retribuição, existindo vasta jurisprudência sobre esta problemática.
De acordo com a noção legal dada pelo art.º 258.º do actual CT/09 – que não diverge da que resultava dos antecedentes art.º 82.º da LCT e 249.º do CT/03 -, a retribuição consiste no conjunto de valores (pecuniários ou não) que a entidade patronal está obrigada a pagar regular e periodicamente ao trabalhador em razão da actividade por ele desempenhada (ou, mais rigorosamente, da disponibilidade da força de trabalho por ele oferecida) [Monteiro Fernandes Direito do Trabalho, 14.ª Edição, Almedina, Coimbra, 2009, p. 479].
Parafraseando o Ac. do STJ de 19-02-2004 [proc.º 03S3478, Conselheiro Fernandes Cadilha, disponível em www.dgsi.pt] “[E]m primeira linha, a retribuição é determinada pelo clausulado do contrato e pelos usos laborais, e eventualmente por certos critérios normativos (o salário mínimo, a igualdade retributiva, etc.). No entanto, num segundo momento, ao montante global da retribuição poderão acrescer certas prestações que preencham os requisitos e periodicidade e regularidade”.
De acordo com o critério legal, a retribuição assenta na exigência de correspectividade ou contrapartida negocial: “é necessário que exista correspectividade entre as prestações do empregador e a situação de disponibilidade do trabalhador – ou seja, noutros termos que essas prestações não tenham causa específica e individualizável, diversa da remuneração do trabalho”. Mas de outro passo, o critério legal requer uma certa periodicidade e regularidade no pagamento e assenta numa presunção legal, considerando-se que as prestações que sejam realizadas regular e periodicamente constituem retribuição, “característica que tem um duplo sentido indiciário: por um lado, sugere a existência de uma vinculação prévia (quando se não ache expressamente consignada) e, por conseguinte de uma prática vinculativa; por outro, assinala a medida das expectativas de ganho do trabalhador e, por essa via, confere relevância ao nexo existente entre a retribuição e as necessidades pessoais e familiares daquele” [cfr. Monteiro Fernandes, Op. cit., p. 480/481].
Mas como é entendimento pacífico e transversal aos sucessivos regimes jurídicos acima enunciados, o conceito de retribuição para efeitos do cálculo das prestações devidas ao sinistrado ou beneficiários no âmbito da reparação devida por acidente de trabalho não coincide e é mais amplo que o consagrado no Código do Trabalho. Daí que o legislador tenha sempre inserido uma noção própria de retribuição, mesmo quando remetia para os critérios da retribuição da lei geral, com o propósito de abranger outras prestações pagas regularmente que não integrariam esta última noção. Exemplificam o afirmado os sumários dos acórdãos do STJ (disponíveis em www.dgsi.pt) que seguem:
- Ac. de 23-09-1992, Proc.º 003423, Conselheiro Sousa Macedo:
I - Para efeito de cálculo de indemnização ou de pensão por acidente de trabalho o n. 2 da Base XXIII da Lei n. 2127 utiliza o termo retribuição em sentido mais amplo do que o perfilhado pela L.C.T., compreendendo todas as prestações de carácter regular.
II - Por isso, o subsídio de refeição, quer seja pago em dinheiro, quer seja satisfeito em espécie, integra a retribuição para efeitos de cálculo de pensões devidas por acidentes de trabalho.
- Ac. de 12-07-2001, Proc.º 01S1202, Conselheiro José Mesquita:
I - O n. 2, da Base XXII da LAT acolheu um conceito de retribuição não perfeitamente coincidente com o constante do art. 82.º da LCT.
II - Assim, é tido por razoável para efeitos da noção de retribuição a que se reporta aquela Base, o auferimento de remuneração por horas extraordinárias durante o período de um ano.
Contudo, embora reconhecendo que a Lei 2127 ao receber o conceito de retribuição da LCT, enfatizava o elemento regularidade - ao acrescentar “(..) e todas as prestações que revistam carácter de regularidade – a jurisprudência do STJ afirmou-se no sentido de que “A ideia de regularidade não pode ser entendida tão linearmente”, devendo a expressão "todas as prestações" ser interpretada no sentido de nela somente se integrarem as atribuições patrimoniais que constituíssem para o trabalhador uma vantagem económica representativa do rendimento da sua actividade laborativa. Assim o elucida o Acórdão de 17-10-2001 [proc.º 01S166, Conselheiro José Mesquita, disponível em www.dgsi.pt,], onde se lê o seguinte:
- «(..)
A ideia de regularidade não pode ser entendida tão linearmente.
Em primeiro lugar, não é a LAT que a acrescenta ao conceito de retribuição da LCT.
A cronologia dos diplomas - 1965, a LAT e 1969, a LCT - logo evidencia que a LAT não tomou o conceito de retribuição da LCT enfatizando, tanto logicamente, a ideia de regularidade. Antes faz uma primeira afirmação de tal ideia, que depois foi retomada pela LCT no seu art. 82º.
Daí que os demais elementos neste preceito contidos - contrapartida da prestação de trabalho e periodicidade - ganhem relevância interpretativa do conceito de retribuição vasado naquela Base XXIII da LAT.
Em segundo lugar, terão sido considerações desta natureza que inspiraram a nova lei dos Acidentes de Trabalho - Lei nº 100/97, de 13-9 - que no seu art. 26º, nº 3, veio fazer ajustamentos??? ao conceito de retribuição, preceituando:
"3. Entende-se por retribuição mensal tudo o que a lei considere como seu elemento integrante e todas as prestações recebidas mensalmente que revistam carácter de regularidade e não se destinem a compensar o sinistrado, por custos aleatórios".
É aqui, na compensação de despesas, que volta a ganhar relevo a ideia de contrapartida da prestação de trabalho, fazendo sobressair a ideia de rendimento ou de vantagem económica, com exclusão das prestações que visem compensar custos adicionais.
Nesta linha de pensamento, se escreveu no acórdão deste STJ, de 8.3.95, no BMJ, 445º, pi. 379:
"Ora, tendo a pensão por acidente de trabalho por finalidade compensar, ainda que parcialmente o trabalhador, ou os seus familiares, pela falta ou redução do rendimento do trabalho, em resultado do sinistro, que limitou ou aniquilou a sua aptidão para o trabalho, não seria compreensível nem razoável que, no cômputo desse rendimento, se incluíssem valores não lucrativos, mas apenas compensatórios de despesas realizadas pelo trabalhador com deslocações ou novas instalações em serviço da entidade patronal - (cfr. base IX, alínea b), da LAT; Tomás de Resende, Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais, 2ª ed. pi. 30)-
Por isso, considerando os indicados cânones hermenêuticos, deve interpretar-se a expressão "todas as prestações", inserida no nº2 da referida base XXIII, por forma a nela somente se integrarem as atribuições patrimoniais que constituam para o trabalhador uma vantagem económica, representativa do rendimento da sua actividade laborativa. Essas prestações pecuniárias hão-de traduzir um valor material com repercussão positiva na economia do trabalhador, significando para este uma fonte de rendimento"-
Esta ideia de rendimento ou de vantagem económica com repercussão positiva na economia do trabalhador é a única que, respeitando a filosofia da reparação pelos acidentes de trabalho, nos fornece uma harmonia consistente do conceito de retribuição, que começa naturalmente, na ideia de correspectividade da prestação de trabalho.
(..)».
No mesmo sentido, entre outros, pronunciou-se igualmente o Ac. de 06-12-2001 [proc.º 01S1313, Conselheiro Diniz Nunes, disponível em www.dgsi.pt], conforme sintetiza o respectivo sumário:
IV - O conceito de retribuição para efeitos de reparação dos danos emergentes de acidente de trabalho não é coincidente com o estabelecido pela LCT, sendo mais amplo, nele se englobando todas as prestações que revistam carácter de regularidade.
V - Tendo a pensão por acidente de trabalho por finalidade compensar, ainda que parcialmente, o sinistrado ou os seus familiares pela falta ou redução do rendimento de trabalho, em resultado do sinistro, a expressão "todas as prestações" deve ser interpretada no sentido de nela somente se integrarem as atribuições patrimoniais que constituam para o trabalhador uma vantagem económica representativa do rendimento da sua actividade laborativa.
VI - Assim, sempre que as importâncias recebidas pelo sinistrado a título de ajudas de custo, ainda que provada a regularidade do seu pagamento, não representem para ele qualquer ganho efectivo, essas importâncias não se integram no conceito de retribuição para efeitos do cálculo da pensão que lhe for atribuída.
A talhe de foice, releva assinalar que em qualquer desses acórdãos a questão colocava-se a propósito de quantias pagas com carácter de regularidade pelas entidades empregadoras (e não cobertas pelo seguro de acidentes de trabalho) a título de “ajudas de custo”. De resto, como uma busca pela jurisprudência a este propósito evidencia, a questão relativa à qualificação para os efeitos em causa de quantias pagas com caracter de regularidade a título de “ajudas de custo” é recorrente e transversal aos sucessivos regimes jurídicos de reparação dos acidentes de trabalho [cfr. Ac. do STJ de 19-02- 2004, proc.º 03S3478, Conselheiro Fernandes Cadilha; Ac. STJ de 23-11-2005, proc.º 05S2260, Conselheiro Pinto Hespanhol; Ac. STJ de 02-05-2007, proc.º 07S362, Conselheiro Mário Pereira; Ac. de 8-10-2008, proc.º 08S1984, Conselheiro Mário Pereira; Ac. STJ de 18-12-2008, proc.º 08S2277, Conselheiro Sousa Peixoto; AC. STJ de 17-03-2010, proc.º 436/09.1YFLSB, SOUSA GRANDÃO; Ac. STJ 13-04-2011, 216/07.9TTCBR.C1.S1, GONÇALVES ROCHA; (todos disponíveis em www.dgsi.pt].
É também entendimento reafirmado pela jurisprudência dos tribunais superiores, mormente do STJ, que o facto de entidade empregadora denominar nos recibos da retribuição determinado pagamento como “ajudas de custo”, não é suficiente para as considerar como tal. À partida, desde que pagas regular e periodicamente, na medida em que pressupõem uma vinculação prévia do empregador e são susceptíveis de gerar uma expectativa de ganha para o trabalhador, essas quantias presumem-se retribuição, recaindo sobre a entidade empregadora, nos termos dos arts. 344.º, n.º 1 e 350.º, n.º 1 do CC, o ónus de provar que essa atribuição patrimonial reveste a natureza de ajudas de custo (o mesmo valendo para outras atribuições, tais como abonos de viagem, despesas de transporte, abonos de instalação e outras equivalentes) [Cfr. Ac. STJ de 02-05-2007, proc.º 07S362, Conselheiro Mário Pereira; Ac. de 8-10-2008, proc.º 08S1984, Conselheiro Mário Pereira; Ac. STJ de 18-12-2008, proc.º 08S2277, Conselheiro Sousa Peixoto (disponíveis em www.dgsi.pt)]
Como assinalado inicialmente, com a Lei 100/97 o legislador passou a exigir expressamente, para que as prestações recebidas com “carácter de regularidade” integrem a noção de retribuição -para efeitos do regime de reparação de acidentes de trabalho e doenças profissionais - que “não se destinem a compensar o sinistrado por custos aleatórios”. Cremos que com esta inovação o legislador procurou ir ao encontro do entendimento que vinha sendo afirmado pela jurisprudência, interpretando a expressão "todas as prestações" no sentido de nela somente se integrarem as atribuições patrimoniais que constituíssem para o trabalhador uma vantagem económica representativa do rendimento da sua actividade laborativa.
Não obstante, importa que nos detenhamos sobre o sentido da expressão “custos aleatórios”. Aleatório significa:
- “Que depende de acontecimento incerto”, “Sujeito às incertezas do acaso” [in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2013, https://dicionario.priberam.org].
- Que depende do acaso ou de circunstâncias imprevisíveis; sujeito a contingências; casual; fortuito [in https://www.infopedia.pt/dicionarios/lingua-portuguesa].
Portanto, serão custos aleatórios os que tenham subjacente um acontecimento incerto, sujeito às incertezas do acaso, casual, fortuito, imprevisível. O que vale por dizer que não só o montante deve ser susceptível de variar, como também a causa que lhe está subjacente deve ter alguma incerteza ou imprevisibilidade.
Esta é a ideia que está subjacente ao acórdão do STJ de 17-03-2010 [proc.º 436/09.1YFLSB, Conselheiro Sousa Grandão], em cuja fundamentação se encontra o extracto que segue:
-«(..)
Por seu turno, o n.º 3 do falado artigo 26.º prescreve deste modo:
“Entende-se por retribuição mensal tudo o que a lei considera como seu elemento integrante e todas as prestações recebidas mensalmente que revistam carácter de regularidade e não se destinem a compensar o sinistrado por custos aleatórios”.
Se este normativo começa por apelar ao critério geral de retribuição – que já alude, ele próprio, à regularidade da prestação – para depois adicionar aquelas prestações regulares que não se destinem a compensar custos aleatórios, é forçoso reconhecer que perfilha um conceito mais abrangente, apenas aludindo, para efeitos de exclusão retributiva, à variabilidade e contingência das prestações.
No domínio da sinistralidade laboral, o que o legislador pretende é compensar o sinistrado pela falta ou diminuição dos rendimentos provenientes do trabalho: assim se compreende que as prestações reparatórias atendam ao “salário médio”, onde se integram todos os valores que a entidade patronal satisfazia regularmente e em função das quais o trabalhador programava regularmente a sua vida.
A matéria de facto provada – ponto n.º 13 – demonstra que as prestações em causa correspondiam a valores fixos e diários – logo, independentes de quaisquer custos ou despesas aleatórias – devidos por cada dia de trabalho – no que se evidencia a sua correspectividade com o trabalho desenvolvido pelo trabalhador, seguramente mais penoso por estar deslocado – sem necessidade de qualquer documento comprovativo.
A aludida factualidade – devendo aqui anotar-se que era ónus da Recorrente provar a natureza aleatória dos valores pagos – consequencia que as questionadas prestações integram o conceito de retribuição e, nessa medida, hão-de integrar o cálculo das prestações reparatórias».
Nesta mesma linha de entendimento pode assim afirmar-se que o conceito de retribuição para efeitos do cálculo das prestações devidas ao sinistrado ou beneficiários no âmbito da reparação devida por acidente de trabalho, sendo mais amplo que o consagrado no Código do Trabalho, abrange todas as prestações recebidas com carácter de regularidade, desde que não se destinem a compensar o sinistrado por custos aleatórios, isto é, “custos de natureza acidental e meramente compensatória” [AC. TR Lisboa de 26 de Março de 2014, proc.º 1837/12.3TTLSB.L1-4, Desembargadora Paula Sá Fernandes, disponível em www.dgsi.pt].
Em contraponto, não são considerados como retribuição os pagamentos que são destinados a reembolsar o trabalhador por despesas já realizadas ou a realizar no cumprimento ou execução da prestação do trabalho em razão de alguma incerteza ou imprevisibilidade, que não são mais do que uma simples compensação de uma diminuição patrimonial, real ou presumida, que nem traz ao trabalhador uma efectiva utilidade ou acréscimo de rendimento do trabalho, nem é sequer susceptível de lhe criar, em termos de razoabilidade, expectativas de ganho.
É altura de enfocarmos esta análise na norma aqui aplicável, em concreto o n.º2, do art.º 71.º da Lei 98/2009. Como deixámos afirmado ao confrontar a actual norma, com as normas dos sucessivos regimes jurídicos de reparação dos acidentes de trabalho, continua a dar-se especial relevância ao elemento regularidade, exclui-se da noção de retribuição as prestações que se destinem a compensar o sinistrado por custos aleatórios (em termos similares ao n.º3, do art.º 26.º da Lei 100/97) e, para além disso, desapareceu a remissão para os critérios da retribuição da lei geral, aos quais apelavam ambas as normas que a precederam.
Esta última inovação não contende com qualquer das considerações que deixámos atrás. Antes pelo contrário, cremos que o legislador visou deixar bem claro estar-se perante um noção de retribuição não coincidente com a da lei geral, mais ampla que aquela e na qual assume preponderância a regularidade no pagamento. Dito de outro modo, uma noção de retribuição que não pressupõe necessariamente a existência de correspectividade entre as prestações do empregador e a disponibilidade do trabalhador, antes abrangendo também quaisquer outras prestações que tenham causa específica e individualizável diversa da remuneração do trabalho, desde que recebidas com carácter de regularidade e não destinadas a compensar o sinistrado por custos aleatórios.
Fazendo nossas as palavras do recentíssimo Ac. do STJ de 31-10-2018 [proc.º 359/15.5T8STR.L1.S1, Conselheiro António Leones Dantas, disponível em www.dgsi.pt], escreve-se no mesmo o seguinte:
- «Para os efeitos daquele artigo 71.º, são retribuição «todas as prestações recebidas com carácter de regularidade que não se destinem a compensar o sinistrado por custos aleatórios».
Não se faz apelo à contrapartida da efetiva prestação de trabalho, estando-se antes perante uma noção mais ampla onde cabem todas as prestações recebidas pelo sinistrado que não se destinem a compensar custos aleatórios.
Outro dos elementos que permitem incluir estas prestações na base de cálculo das reparações é o conceito de regularidade.
O conceito de regularidade tem aqui implícita uma dimensão temporal que aponta para a repetição dos pagamentos e a partir daí a dimensão dos rendimentos normalmente auferidos pelo sinistrado.
Importa que na ponderação deste conceito não se esqueça que o que está em causa é a perda da capacidade para o futuro do sinistrado e não a fixação da dimensão de rendimentos devidos ao sinistrado.
(..)».
II.2.3 Revertendo ao caso, resulta dos factos provados que o sinistrado “Na altura do acidente (..) desempenhava funções de motorista de pesado de mercadorias, exclusivamente em território nacional” [facto C], auferindo, na data do acidente, “a retribuição base anual de 525,00€ x 14, acrescida de 15,30€ x 14 (diuturnidades) 270,91€ x 14 (prémio de função) e 12,00€ por cada dia de trabalho efectivo prestado, que a R D… descriminava como sendo ajudas de custo, e que visavam reembolsar o trabalhador por custos com as refeições que efectuava quando estava a fazer transportes.”[facto L].
Em causa está a quantia de “12,00€ por cada dia de trabalho efectivo prestado, que a R D… descriminava como sendo ajudas de custo, e que visavam reembolsar o trabalhador por custos com as refeições que efectuava quando estava a fazer transportes”, relativamente à qual a Ré empregadora não tinha transferida a responsabilidade infortunística transferida pelo seguro de acidentes de trabalho celebrado com a Ré seguradora.
É sabido que a jurisprudência esteve dividida quanto à questão de saber quando deve considerar-se que uma prestação é regular e periódica. Contudo, na esteira do acórdão do STJ de 1 de Outubro de 2015 [publicado no Diário da República, 1.ª série — N.º 212 — 29 de outubro de 2015], - proferido em julgamento ampliado da revista, em processo civil, nos termos do artigo 186.º do CPT – que embora se tenha debruçado sobre a cláusula de um instrumento de regulamentação colectiva de trabalho (cláusula 12.ª do Regulamento de Remunerações, Reformas e Garantias Sociais, integrado no AE entre a TAP — Air Portugal, S.A. e o SNPVAC — Sindicato Nacional do Pessoal de Voo da Aviação Civil, publicado no BTE 1.ª série n.º 8, de 28 de Fevereiro de 2006), no percurso lógico para chegar à sua interpretação passou pela questão de saber quando é que se deve entender que há “regularidade e periodicidade” na atribuição de uma determinada prestação pecuniária, vem sendo maioritariamente entendido que esse carácter regular só se verifica se a prestação for paga durante 11 dos 12 meses que se tiverem por referência temporal.
No caso está provado que aquela prestação de € 12 era paga ao sinistrado “por cada dia de trabalho efectivo prestado”, o que vale por dizer que, descontado o período legal de férias, pelo menos era-lhe paga 11 em cada 12 meses do ano.
Assim, no caso nem se coloca qualquer dúvida, dado que mesmo a entender-se que aquele critério afirmado pelo STJ tem aplicação para efeitos do n.º2, do art.º 71.º da Lei 98/2009, sempre é de concluir estar-se inequivocamente perante uma prestação recebida com carácter de regularidade, como tal integrando a noção de retribuição do n.º2, do art.º 71.º da Lei 98/2009, a menos que se destine a compensar o sinistrado por custos aleatórios.
Como deixámos assinalado, não basta a R. denominar aquela prestação nos recibos de vencimento como “ajudas de custo”, para que fique excluída do conceito de retribuição.
Beneficiando o sinistrado da presunção legal de que aquela prestação constitui retribuição, sobre a Ré recaía o ónus de ilidir tal presunção (arts. 344.º, n.º 1 e 350º, nº 1, do Cód. Civil), pressupondo isso a alegação e prova de factos de onde resultasse demonstrado que aquele pagamento se destinava a compensar custos aleatórios, isto é, custos de natureza acidental e meramente compensatória.
Entende a Recorrente Ré que essa prova foi feita, dado ter-se provado o seguinte:
- [D] (o sinistrado autor) Trabalhava de segunda-feira a sábado e folgava ao domingo, fazendo fora de casa o pequeno-almoço e almoço, diariamente.
-[L] que a R. D… descriminava (aqueles pagamentos) como sendo ajudas de custo, e que visavam reembolsar o trabalhador por custos com as refeições que efectuava quando estava a fazer transportes.
Argumenta a Ré: “Não se pode considerar que o valor de 12,00 euros diários seja superavitário face às despesas normais que visa reembolsar, uma vez que, é do conhecimento geral que um pequeno-almoço e um almoço no nosso país não custam menos de 12,00 euros”.
Com o devido respeito por opinião contrária, entende-se que não foram alegados factos nem feita a prova necessária para que se possa ter como demonstrado, com a certeza e o rigor que nos parece exigível, que aquele pagamento cobria ou destinava a compensar o sinistrado por “custos aleatórios”. Passamos a explicar esta asserção.
Como defendemos acima, serão custos aleatórios os que tenham subjacente um acontecimento incerto, sujeito às incertezas do acaso, casual, fortuito, imprevisível. O que vale por dizer que não só o montante deve ser susceptível de variar, como também a causa que lhe está subjacente deve ter alguma incerteza ou imprevisibilidade.
Não é isso que acontece no caso. Tal como se refere no acórdão do STJ de 17-03-2010, acima citado [proc.º 436/09.1YFLSB, Conselheiro Sousa Grandão], também aqui as prestações em causa correspondem a valores fixos e diários “logo, independentes de quaisquer custos ou despesas aleatórias – devidos por cada dia de trabalho – no que se evidencia a sua correspectividade com o trabalho desenvolvido pelo trabalhador”, implicando neste caso - como provado - que o sinistrado fizesse “fora de casa o pequeno-almoço e almoço, diariamente”, mas sem necessidade de qualquer documento comprovativo.
É certo, pois, que o autor tomava “fora de casa o pequeno-almoço e almoço, diariamente”, bem assim que aquele pagamento visava reembolsá-lo “por custos com as refeições que efectuava quando estava a fazer transportes”, mas isso não significa necessariamente que tomava aquelas refeições em estabelecimentos de restauração, nem tão pouco que despendesse diariamente o valor de € 12/dia em refeições, pois bem podia fazer-se acompanhar delas já previamente confecionadas em casa, sem custos para além dos que sempre teria que suportar para, como é normal nos nossos usos, tomar diariamente essas refeições.
Portanto, na nossa perspectiva, a prova feita não exclui a possibilidade do autor gerir aquele valor, que sabe de antemão lhe vai ser pago por cada dia de trabalho efectivo independentemente de demonstrar qualquer gasto real para além do que normalmente teria no âmbito da sua economia pessoal e familiar, o que se traduz na possibilidade de usar esse valor, acrescendo-o ao magro salário que aufere, para retirar “uma vantagem económica representativa do rendimento da sua actividade laborativa”.
Neste quadro, salvo melhor opinião, essas prestações pagas ao autor traduzem, no rigor das coisas, um valor material com repercussão positiva na sua economia pessoal e familiar, que se traduz num rendimento com o qual sabe poder contar mensalmente e, em função dessa certeza, programar regularmente a sua vida.
Mas mesmo que não possa ter-se a certeza que o autor assim procede, o certo é que estamos perante um pagamento regular que é efectuado sem necessidade de comprovação das despesas, acrescendo que é perfeitamente possível, na realidade das coisas, que os valores recebidos sejam afectos à sua economia pessoal e familiar.
E, sempre com o devido respeito por opinião contrária, esse é o ponto fulcral da questão. Com efeito, o ónus de prova recai sobre a Ré e não sobre o trabalhador sinistrado. Era à Ré que cabia demonstrar estar a suportar custos aleatórios do autor, os quais têm subjacentes, como vimos defendendo e nas palavras do citado acórdão do STJ, “a variabilidade e contingência das prestações”.
Ora, pelas razões que vimos expondo, não cremos que essa prova tenha sido feita. Mais, nem a Ré sequer alegou factos que, a provarem-se, fossem idóneos e suficientes para provar estar a suportar custos aleatórios do sinistrado e, logo, afastar a presunção decorrente da regularidade no pagamento da prestação em causa.
Concluindo, improcede o recurso, não merecendo censura a decisão recorrida.
III. DECISÃO
Em face do exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar o recurso improcedente, em consequência confirmando a sentença recorrida.
Custas do recurso a cargo da recorrente.

Porto, 7 de Dezembro de 2018
Jerónimo Freitas
Nelson Fernandes (vencido pelas razões constantes do voto que junto)
Rita Romeira - Declaração: ”Pese embora, ter concordado com o decidido no acórdão a que se alude no voto de vencido e concordar com o decidido no presente, em meu entender, tal não configura alteração de posição, por num e noutro o quadro factual não serem coincidentes.”
__________________
Vencido, pelas razões seguintes:
Salvaguardando o devido respeito pela posição que fez vencimento, acompanhando-se essa quanto à afirmação de que impende sobre a empregadora o ónus da prova de que as quantias pagas se assumem como custos aleatórios (na senda do que tem sido afirmado pela jurisprudência), já não se acompanha no mais por considerar que, no caso, diversamente do que se conclui, esse ónus foi satisfeito, ao ter-se provado que o sinistrado prestava as funções de motorista de pesados, fazia fora de casa o pequeno-almoço e almoço diariamente e que recebia €12,00 por cada dia de trabalho efetivo prestado, que a Ré descriminava como sendo ajudas de custo, e que visavam reembolsar o trabalhador por custos com as refeições que efetuava quando estava a fazer transportes.
Na verdade, a referida factualidade provada satisfaz, na minha ótica, precisamente o que sobre essa questão tem sido afirmado pela jurisprudência (incluindo desta Secção) a respeito do ónus da prova, em conformidade com a posição que tomei no recente acórdão de 22 de outubro de 2018[1], de que fui relator, o que permite concluir que o valor em causa se integra na previsão da parte final do n.º 2 do artigo 71.º da LAT – destina-se a compensar o sinistrado por custos aleatórios.
Encurtando razões, para fundamentar a minha posição, remetendo para o que escrevi no referido acórdão[2], não poderemos deixar de ter presente a significação comum da expressão (adjetivo) “aleatório”, permitindo entender que se teve em conta, excecionando-as, as prestações que se destinem a compensar o sinistrado por custos que dependem do acaso ou de circunstâncias imprevisíveis, sendo que, num caso como o que se decide, é fundada a afirmação de que era afinal imprevisível o valor de tais custos pois que, enquanto condutor de pesados, dependeriam os mesmos do tipo de refeição, local e até estabelecimento em que fossem prestados os serviços – que dependeria pois do tipo de alimentação, modo e local como satisfaria essa necessidade.
Daí que o pagamento da quantia de €12,00 por cada dia de trabalho efetivo prestado se destinasse, de facto, a compensar o trabalhador por custos aleatórios, no caso, como se provou, os “custos com as refeições que efetuava quando estava a fazer transportes” (enquanto motorista de pesados, fazia fora de casa o pequeno-almoço e almoço diariamente e que recebia €12,00 por cada dia de trabalho efetivo prestado), sendo que, compreendendo-se que se visou desse modo facilitar o pagamento desses gastos – assim tornando desnecessário qualquer acerto de contas, prescindindo-se da apresentação de quaisquer faturas –, foi estipulado um valor fixo para as refeições por cada dia de serviço efetivo. Na verdade, tendo por base o elenco factual fixado em 1.ª instância para a decisão jurídica a proferir, o facto de se provar que a analisada prestação visa compensar o trabalhador/sinistrado por concretas despesas acrescidas que tem com a sua alimentação permite dizer que estamos perante a previsão da última parte do n.º 3 do artigo 71.º da LAT – pagamento que se destinava, efetivamente, a compensar o sinistrado por custos aleatórios que tivesse que suportar.
Aliás, esclarecendo, sequer se trata de situação propriamente similar ao pagamento do subsídio de alimentação. É que esse subsídio, como o próprio nome indica, não visa afinal pagar as despesas efetivas com a alimentação e sim apenas, diversamente, como que subsidiar de algum modo tais despesas normais, diversamente da prestação que aqui se analisa, face ao que se provou, por ter ela uma causa e uma destinação específica, precisamente aquele pagamento efetivo, assumindo assim uma natureza que permite integrá-la na categoria de ajudas de custo[3] – de resto é com tal designação que constam dos recibos de vencimento – e, portanto, não se podendo sequer dizer que exceda o montante máximo a atribuir para efeito do pagamento de tais despesas com alimentação do trabalhador, muito embora se trate de montante pago em quantia certa relativamente a cada dia de trabalho efetivo, a sua aleatoriedade mantém-se, por essa ter a ver de acordo com a lei não com o que é pago pela entidade patronal e sim, noutros termos, com o tratar-se ou não de prestação que se destina a “compensar o sinistrado por custos aleatórios”, ou seja, é na natureza dos custos, assim o serem ou não imprevisíveis/aleatórios, que determina a aplicação da norma – e neste caso, será afinal imprevisível o preço efetivo das refeições, os quais podem variar conforme o local e tipo de estabelecimento prestador do serviço. E digo seria pois que, afinal, mas por acordo (como se dirá infra, face ao previsto em CCT), foram porém fixados valores fixos, sendo que, como se refere no Acórdão da Relação de Évora de 12 de julho de 2018[4], poderemos também dizer, como nesse, que “o pagamento acordado visa facilitar o reembolso das despesas com a alimentação e não a beneficiá-lo através da atribuição de um suplemento remuneratório regular. Ou seja, não resultava daí um ganho para o trabalhador no final do mês. Apenas era reembolsado das despesas que havia efetuado”.
Aliás, salvaguardando naturalmente o respeito que me merece a posição que fez vencimento, considero que a invocação nas alegações de recurso da cláusula da Convenção Coletiva de Trabalho não se assume no caso como uma verdadeira questão nova, pois que, sendo verdade que na contestação a Ré se limitou a alegar que fazia o pagamento da referida quantia de €12,00 “em cumprimento do estatuído na CCTV aplicável ao sector” (artigo 4.º), sem identificar pois a CCT em causa, se dúvidas houvesse sempre o Tribunal de 1.ª instância poderia ter convidado a mesma Ré a esclarecer a que CCT se referia. É que, afinal, a CCT indicada pela Recorrente[5], objeto aliás de portarias de extensão, prevê efetivamente o pagamento de valores fixos diários para o reembolso das despesas com alimentação/cada refeição[6]’[7], pagamentos esses aí tidos expressamente como ajudas de custo, dando assim sustentação ao que supra mencionei a respeito da natureza de custo aleatório do valor de €12,00 pago no caso ao Sinistrado.[8]
Por último, deixo apenas um pequeno exercício de raciocínio, com o único objetivo de melhor deixar esclarecida a minha posição: Estando a entidade patronal vinculada a pagar/suportar os custos com a alimentação do seu trabalhador que tenha de fazer deslocações fora da empresa em serviço, por ser motorista, apresentando este contra reembolso pela entidade patronal dos valores por si despendidos as correspondentes faturas das refeições que tomou, parece-me inquestionável que os valores em causa, ainda que regulares, deverão ser tidos como verdadeiras ajudas de custo, como ainda, para efeitos da norma citada da LAT, visando compensar os custos com a aludida alimentação, que se assumirão então como compensação por “custos aleatórios. Ora, se se aceitar que têm nessas circunstâncias tal natureza, será então caso para perguntar se o facto de porventura vir a ser posteriormente celebrado um qualquer acordo (individual, de empresa ou através de CCT) que defina valores fixos a serem pagos para custear precisamente essa mesma alimentação altera ou não, afinal, a natureza desses custos e correspondentes pagamentos. Salvo o devido respeito por diverso entendimento, na minha ótica a resposta terá de ser a de que não altera, precisamente porque a natureza dos custos se manteve afinal, apenas variando o modo como passaram a ser compensados, inicialmente contra fatura e depois pela fixação de valores exatos por cada refeição. Ora, é precisamente o caso que se aprecia, sendo que, diga-se por último, existindo CCT que vincula as partes, sequer está na disponibilidade da entidade patronal a possibilidade de deixar de cumprir o aí estipulado.
São no essencial estas as razões por que, salvaguardando de novo o devido respeito pela posição que fez vencimento, essa não acompanho.

Nelson Fernandes
_________________
[1] Apelação 4442/16.1T8VIS.P1 – então referente à quantia de €19,00 paga pela entidade patronal em cada dia efetivo de trabalho e que se provou que visava reembolsar o trabalhador (motorista, também) “dos gastos com alimentação (pequeno almoço, almoço e jantar) nas viagens que efetuava a mando” da sua entidade patronal”.
[2] Na senda aliás da apreciação realizada no Acórdão da Relação de Lisboa de 9 de Maio de 2018, mas aí com a diferença de que a entidade patronal não logrou provar que a quantia paga visasse compensar essas despesas – Relatora Desembargadora Maria José Costa Pinto, in www.dgsi.pt.
[3] Como se refere no sumário do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13 de Abril de 2011 (Relator Conselheiro Gonçalves Rocha, in www.dgsi, muito embora proferido no domínio de aplicação da Lei 100/97, assim seu artigo 26.º, n.º 3, mas que se pode ter por relevante no domínio da atual LAT, face à similitude de redação das normas): “as ajudas de custo não visam, em regra, pagar o trabalho ou a disponibilidade para o trabalho, antes se destinam a compensar as despesas realizadas pelo trabalhador por ocasião da prestação do trabalho ou por causa dele”, sendo que “Só assim não será quando estas compensações excedem as despesas suportadas, pois conforme resulta da parte final do artigo 260º nº 1 do CT/2003, a parte excedente dessas despesas deverá considerar-se retribuição, no caso de se tratar de deslocações frequentes.”
[4] Relator Desembargador Moisés Silva, in www.dgsi.pt.
[5] Certamente a mesma a que se referia na contestação que apresentou.
[6] De resto, quanto à exigência de fatura, assim no BTE n.º9/1980, de 8 de março, cláusula 46.ª da CCT, essa só está estabelecida para os casos de refeições tomadas no estrangeiro.
[7] Aliás esse é o regime estabelecido até ao presente, onde se mantém, assim BTE 34/2018, cláusula 57.ª: “a empresa pagará aos trabalhadores todas as refeições que estes por motivo de serviço, tenham de tomar”, fixando-se também valores diários dependendo das refeições em causa.
[8] Devo esclarecer, quanto à questão da CCT que a alegação feita neste processo é igual à que foi realizada no processo de cujo acórdão fui relator, tendo então entendido que não havia necessidade de lhe fazer expressa referência por então se ter entendido que se estava perante compensação por custos aleatórios, incluindo que nada obstava a que fosse acordado o pagamento de valor fixo, precisamente para não obrigar à entrega de faturas e acertos de contas. Ora é precisamente isso que, na minha ótica, resulta da CCT, a que as partes estão vinculadas.