Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
1177/23.2T8VFR.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: HORÁCIO CORREIA PINTO
Descritores: DEFESA DO AMBIENTE
INCÊNDIO FLORESTAL
FOGO POSTO
CONTRAORDENAÇÃO
ENTIDADE RESPONSÁVEL
HERANÇA JACENTE
PATRIMÓNIO AUTÓNOMO
PERSONALIDADE JUDICIÁRIA
Nº do Documento: RP202403131177/23.2T8VFR.P1
Data do Acordão: 03/13/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL/CONFERÊNCIA)
Decisão: JULGADO IMPROCEDENTE O RECURSO INTERPOSTO PELA ARGUIDA.
Indicações Eventuais: 4.ª SECÇÃO CRIMINAL
Área Temática: .
Sumário: I – No tocante à responsabilidade contra-ordenacional, as entidades colectivas respondem por intermédio dos seus representantes.
II – A herança, ainda que jacente, sendo uma entidade colectiva ou equiparada, um património autónomo, tem personalidade judiciária e, em determinadas circunstâncias, até pode ter personalidade jurídica com vista ao exercício de direitos.
III – Qualquer património pode ter responsabilidade civil e penal em sede de ordenação-social, desde que os pressupostos da responsabilidade se verifiquem.
IV – O artigo 3° do dec-lei nº 124/2006, de 28/06, diploma que estabelece as medidas e acções a desenvolver no âmbito do Sistema Nacional de Defesa da Floresta contra Incêndios, contém um conjunto de definições, entre as quais se prevê, entre outros, a sua aplicabilidade a quem, a qualquer título, for possuidor ou detenha a administração dos terrenos que integram os espaços florestais do continente, independentemente da sua natureza jurídica.
V – Assim sendo, ali se inclui, se for o caso, a responsabilização contra-ordenacional da herança enquanto património autónomo, sem prejuízo de também se chegar até lá através da lei geral ordinária.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº 1177/23.2T8VFR.P1
4ª Secção Criminal do TRP.






Relatório.

Por decisão proferida pelo Tribunal Judicial da Comarca de Santa Maria da Feira (J3) julgou-se improcedente a impugnação judicial apresentada pela recorrente HERANÇA ABERTA POR ÓBITO DE AA e, em consequência, decidiu manter a decisão administrativa que a condenou pela prática de uma contra-ordenação prevista e punível pelos artºs 15 nº 2, alª b), e 38, nºs 2, alª a), e nº 4 do Decreto-Lei nº 124/2006, de 28/06, na coima no valor de 280,00€ (duzentos e oitenta euros).

Inconformada a condenada veio recorrer e articulou as seguintes conclusões:
A) O presente recurso versa sobre a sentença que julgou improcedente a impugnação judicial apresentada pela recorrente Herança aberta por óbito de AA e, em consequência, decidiu manter a decisão administrativa que a condenou pela prática de uma contra-ordenação prevista e punível pelos artºs 15, nº2, alª b), e 38, nºs 2, alª a), e 4 do Decreto-Lei nº 124/2006, de 28/06, na coima no valor de 280,00€ (duzentos e oitenta euros;
B) A Recorrente, não se conforma com o decidido, porquanto, e, salvo o devido respeito por opinião em contrário, a decisão recorrida merece censura, quer quanto à decisão sobre a matéria de facto, quer quanto à decisão de direito, enfermando, ainda, de nulidades e inconstitucionalidades que a invalidam;
C) O Tribunal “a quo”, na esteira da entidade administrativa, na verificação dos pressupostos legais, considerou que inexistia qualquer nulidade que obstasse ao conhecimento do mérito da causa;
D) Designadamente, no que concerne à caracterização da herança aberta por óbito de AA, como pessoa singular ou pessoa coletiva, com personalidade e capacidade jurídicas, para efeitos do disposto no artigo 7º do RGCO;
E) Ora, conforme decorre da decisão recorrida, o Tribunal “a quo” no enquadramento das normas aplicáveis (cfr. artigos 38, nº2 alínea a) e 4 do Decreto-Lei nº 126/2006 de 28/06 e Lei nº 2/2020 de 31/03), qualificou a arguida – Herança Aberta - erradamente, como pessoa singular;
F) Sucede que, conforme decorre do artigo 2046 do Código Civil, uma herança não é nem uma pessoa singular, nem uma pessoa colectiva, pois não é suscetível de ser sujeito de direitos e obrigações, e, nos termos do disposto no artigo 11 do Código penal, só as pessoas singulares são suscetíveis de responsabilidade criminal;
G) Uma herança pode, ter ou não, personalidade judiciária, caso seja ou não jacente, cfr. decorre do artigo 12, alínea a) do CPC, e, a representação da herança por “cabeça-de-casal”, não pressupõe nem faz presumir, se houve ou não aceitação da vocação sucessória;
H) E, não tendo o Tribunal “a quo” dado como provado que, a herança não foi aceite, nem declarada vaga, e, por isso, é jacente/aberta, gozando de personalidade judiciária, não poderia, sem a intervenção de todos os herdeiros, considerar a regularidade da instância;
I) Pelo exposto, por insuficiência da matéria de facto dada como provada, carece a arguida de personalidade judiciária para deter essa qualidade no âmbito dos presentes autos, e, não sendo a arguida uma pessoa singular, não é suscetível de responsabilidade contraordenacional, exceção que se invoca e determina a sua absolvição;
J) Por outro lado, não sendo a herança uma pessoa singular, só poderia ser responsabilizada por uma contraordenação se existisse conexão entre a actuação ou omissão geradora da ilicitude por parte dos seus representantes/herdeiros ou administrador/cabeça de casal (caso tal dever se incluía naqueles poderes de administração);
K) Percorrida a matéria de facto provada verifica-se que em lado algum consta a referência à pessoa física, designadamente, da cabeça de casal, que tenha, em representação da arguida, omitido a obrigação de realizar em nome e no interesse da arguida, a conduta ilícita, pois que, os factos que suportam o juízo de imputação do ilícito contraordenacional à herança integram o objeto do processo, pelo que têm de constar do despacho de acusação, constituindo a respetiva prova pressuposto da condenação daquela;
L) Assim, não sendo a matéria de facto suficiente para sustentar a imputação à arguida/recorrente da conduta ilícita geradora de responsabilidade contraordenacional, deverá concluir-se pela insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, conforme previsto no artº 410, nº 2, alª a), do Código de Processo Penal, o que determina a absolvição da arguida, por ser insuprível tal insuficiência, sob pena de violação do princípio da vinculação temática do tribunal.
M) Para além do facto de a arguida não ser uma pessoa singular, a decisão recorrida, no que concerne aos factos integradores do elemento subjetivo da contraordenação é absolutamente omissa;
N) O Tribunal “a quo” quanto ao elemento subjetivo do tipo de contraordenação, limitou-se a reproduzir o que constava do auto de notícia e da decisão da entidade administrativa, dando como provado: “4) Com a conduta descrita, a recorrente revelou desatenção e irrefletida inobservância das normas no âmbito do Sistema de Defesa da Floresta Contra Incêndios, atuando com manifesta falta de cuidado e prudência que a defesa da floresta contra incêndios no momento se lhe impunha, agindo de forma livre e consciente, não se avistando factos que retirem a censurabilidade à infracção.”
O) Tais alegados factos constituem meras citações legais, generalidades doutrinais e conclusões;
P) O artº 58, nº 1, alª b), do RGCO impõe que da decisão que aplique uma coima conste “A descrição dos factos imputados, com indicação das provas obtidas” (factos ou omissões), abrangendo os seus elementos objetivos e subjetivos;
Q) E, esta imposição não foi cumprida, incorrendo assim a decisão administrativa na nulidade a que se refere o artº 379, nº 1, alª a), do Código de Processo Penal, aplicável ex vi artº 32 do RGCO, e, por inerência, a decisão recorrida, ao omitir a factualidade respeitante ao elemento subjetivo da contraordenação, está ferida de nulidade;
R) Assim, não sendo admissível a integração de novos factos, a ausência de factos integradores do elemento subjetivo da contraordenação, quer no auto de notícia quer na decisão administrativa e ainda na sentença recorrida, não poderá ser suprida, pelo que, tal omissão determina, necessariamente a absolvição da arguida da prática da contraordenação que lhe foi imputada;
S) A arguida não se conforma também com o decidido pelo Tribunal “a quo” relativamente ao erro na determinação da norma aplicável e à prescrição do procedimento;
T) Considerou o Tribunal “a quo” que o regime aplicável, por força do disposto no artigo 79, nº 1 e 2 e 80º alínea c) do Decreto-Lei nº 82/2021 de 13/10, é o estabelecido no decreto-lei nº 124/2006, de 28.06 e na Lei nº 2/2020 de 31.03; e que, “a contra-ordenação em causa punível com uma coima entre 280,00€ e 10.000,00€, prevê o artº 27, alª b), do RGCO, que “o procedimento por contra-ordenação extingue-se por efeito da prescrição logo que sobre a prática da contraordenação haja decorrido o prazo de três anos, quando se trate de contra-ordenação a que seja aplicável uma coima de montante igual ou superior a 2.493,99€ e inferior a 49.879,79€”;
U) Porém, e salvo sempre o devido respeito por opinião em contrário, tal interpretação daquele regime mais favorável, viola o disposto no artigo 29, nº 4 da CRP, que prevê que, “Ninguém pode sofrer pena ou medida de segurança mais graves do que as previstas no momento da correspondente conduta ou da verificação dos respetivos pressupostos, aplicando-se retroativamente as leis penais de conteúdo mais favorável ao arguido.”;
V) Ora, o Decreto-Lei nº 124/2006, de 28 de Junho, que regula o Sistema Nacional de Defesa da Floresta contra Incêndios, foi revogado pelo Decreto-Lei nº 82/2021, de 13/ de Outubro, que entrou em vigor no dia 01.01.2022;
W) No âmbito do Decreto Lei nº 124/2006, de 28.06, o artigo 15, nº 2 a 19 previa a regulamentação das “Redes secundárias de faixas de gestão de combustível” e o artigo 38, nºs 1 e 2, alª a) do mesmo diploma, punia a violação daquele artigo 15, com uma coima de 140,00€ a 5.000,00€. (“1 - As infrações ao disposto no presente decreto-lei constituem contraordenações puníveis com coima, de (euro) 140 a (euro) 5000, no caso de pessoa singular, e de (euro) 1500 a (euro) 60 000, no caso de pessoas coletivas, nos termos previstos nos números seguintes. 2 - Constituem contraordenações: a) A infração ao disposto nos nºs 1, 2, 9, 10, 12, 13 e 14 do artigo 15);
X) Já no âmbito do Decreto-Lei nº 82/2021, de 13.10, o artigo 49, nº 7º, alª a) e, sob a mesma epígrafe do anterior decreto-lei, prevê a regulamentação das redes secundárias de faixas de gestão de combustível” e o artigo 71, nº 1, alª f) e nº 2 alª a) pune a mesma infracção, classificando-a como leve, com uma coima de 150 a 1.500,00€. (1- Sem prejuízo da responsabilidade criminal que possa resultar dos mesmos factos, nos termos da lei, constitui contraordenação a realização das seguintes ações: a) O incumprimento dos deveres de gestão de combustível estabelecidos nos termos do nº 7 ou do nº 9 do artigo 49; 2 - As contraordenações previstas no número anterior são puníveis com as seguintes coimas: a) No caso das contraordenações previstas nas alíneas f), s) e u) do número anterior, qualificadas como leves, coima de valor entre: i) (euro) 150 e (euro) 1500, no caso de pessoas singulares; (…));
Y) Por sua vez, a Lei nº 2/2020 de 31.03 que estabelecia no seu artigo 203 um regime excecional das redes de faixas de gestão de combustível, e no seu nº 2, que, “Durante o ano de 2020, as coimas a que se refere o artigo 38 do Decreto-Lei nº 124/2006, de 28 de junho, na sua redação atual, são aumentadas para o dobro”;
Z) Sucede que, esta Lei foi alterada pela Lei nº 75-B/2020, de 31/12 e, posteriormente, revogada pela Lei nº 48/2021 de 23 de Julho, a qual no seu nº1 estabeleceu o seguinte: “A presente lei impede a duplicação do valor das coimas relativas à limpeza das redes de gestão de combustíveis nos espaços florestais previstas no artigo 38 do Decreto-Lei nº 124/2006, de 28 de junho, alterando a Lei nº 75-B/2020, de 31 de dezembro - Orçamento do Estado para 2021.”;
AA) Pelo que, mal andou o Tribunal “a quo” ao aplicar norma revogada, Lei nº 2/2020 de 31.03 e, desfavorável à arguida, violando a decisão recorrida o princípio da não retroactividade da lei penal/contraordenacional menos favorável, pois que, sempre seria de considerar que a contra-ordenação em causa era punível com uma coima entre 140,00€ e 5.000,00€, atento o estabelecido na Lei nº 48/2021 de 23.07;
BB) Ora, conjugando todas estas alterações legislativas com aplicação retroativa da lei concretamente mais favorável, e, não tendo a nova Lei (Decreto-Lei nº 82/2021, de 13.10) criado um novo prazo de prescrição, nem tendo criado uma nova causa de suspensão da prescrição, tendo-se limitado a alterar o quantitativo máximo e mínimo das coimas aplicáveis, deveria o Tribunal “a quo” ter aplicado este regime ao caso dos autos, por ser mais favorável à arguida, e por isso, mais justo e equitativo;
CC) Esta interpretação é a que melhor contende com o nº 2 do artigo 3 do RGCO, onde se estatui : “2 - Se a lei vigente ao tempo da prática do facto for posteriormente modificada, aplicar-se-á a lei mais favorável ao arguido, salvo se este já tiver sido condenado por decisão definitiva ou transitada em julgado e já executada.”;
DD) Obviamente que o Decreto-Lei nº 82/2021, de 13.10, é o regime mais favorável à arguida, e que se encontrava já em vigor na data da decisão proferida pela entidade administrativa, e, por maioria de razão na data da prolação da decisão recorrida;
EE) Pois que, o Decreto-Lei nº 82/2021, de 13/10 prevê, para a alegada infracção em causa nos autos, uma moldura penal com um limite máximo manifestamente inferior ao previsto pelo Decreto-Lei nº 124/2006, conforme supra exposto, nomeadamente, para efeitos do prazo de prescrição do procedimento contraordenacional;
FF) Assim sendo, estando, plenamente, preenchidos os requisitos do artigo 3º do RGCO, a entidade administrativa e o Tribunal “a quo”, na apreciação da conduta da arguida, ora recorrente, deveriam ter aplicado a nova lei, por ser mais favorável à arguida, errando, assim, na determinação da norma aplicável;
GG) Isto é, deveria a decisão recorrida ter aplicado o regime previsto no decreto-lei nº 82/2021, de 13.10, onde a contraordenação de falta de gestão de combustível, está prevista no artigo 49 nº 7 alínea a) e é punida pelo artigo 72 nº 1 alínea f), por aplicação da lei mais favorável à arguida, em obediência ao principio da não retroatividade da lei, previsto no artigo 29, nº 4 da CRP, e, não o tendo feito, feriu a decisão recorrida de inconstitucionalidade que desde já se invoca para efeitos de direito de recurso;
HH) Nos termos do artigo 49, nº 7, alª a) do Decreto-Lei nº 82/2021, de 13.10, a violação do artigo 72, nº 1, alª f) e 2 , é punida com uma coima entre 150,00€ a 1.500,00€;
II) Em matéria de prescrição contraordenacional, estabelece o artigo 27 do RGCO que o procedimento por contraordenação se extingue por efeito da prescrição logo que sobre a prática da contraordenação hajam decorrido um ano;
JJ) O prazo de prescrição começa a contar-se no dia da prática dos factos (artigo 119 do CP) e pode ser suspenso ou interrompido por diversas causas, ou seja, a partir de 06.06.2020;
KK) Por sua vez, os artigos 27-A e 28, ambos do RGCO, definem essas causas de suspensão ou de interrupção da prescrição. Ocorrendo uma causa de suspensão, o prazo de prescrição suspende-se enquanto a causa se mantiver e volta a correr quando aquela findar (artigo 120, nº 6 do CP); ocorrendo uma causa de interrupção, o prazo de prescrição fica inutilizado, reiniciando-se a sua contagem (artigo 121, nº 2 do CP.).
LL) Assim, os factos em causa ocorreram no dia 06.06.2020, data em que se iniciou a contagem do prazo de prescrição, pelo que, se não existissem causas de suspensão ou interrupção, o procedimento administrativo prescreveria em 06.06.2021;
MM) Assim, em cumprimento daquele comando constitucional ínsito no artigo 29, nº4 da CRP, deveria o Tribunal “a quo” ter declarado extinto o procedimento contraordenacional, pelo que, não o tendo feito, violou aquela decisão o princípio da não retroatividade da lei sancionatória mais favorável, previsto no artigo 29, nº 4 da CRP, inconstitucionalidade que se invoca e que certamente será declarada por V. Ex.as;
SEM PRESCINDIR,
NN) O princípio da igualdade abrange a proibição do arbítrio, a proibição de discriminações e a obrigação de diferenciação, exigindo um tratamento igual a situações de facto iguais e um tratamento diverso de situações de facto diversos;
OO) A decisão recorrida viola ainda o referido comando constitucional, de forma arbitrária e discriminatória, quando a confrontamos com a sentença proferida em 22.09.2022, já transitada em julgado, por este mesmo Tribunal “a quo” e mesma Juíza de Direito, no âmbito do processo nº 2886/22.9T8VFR, que correu termos neste mesmo Juízo e Tribunal, onde se decidiu o seguinte:
- determino que, ao caso dos autos, seja aplicada a lei mais favorável ao arguido, considerando-se o mesmo acusado e condenado pela prática de uma contra-ordenação de falta de gestão de combustível, prevista no artigo 72 nº 1 alínea f) e 2 e punida pelo artigo 49 nº 7 alínea a) do Decreto Lei nº 82/2021, de 13 de Outubro;
- julgo verificada a prescrição do procedimento contraordenacional em causa, em que é arguido BB e, nessa medida, declaro a extinção do mesmo e o consequente arquivamento dos autos.
PP) Neste processo, a situação factual era exatamente igual à dos presentes autos, pelo que, e, não obstante, a tal ter aludido a recorrente em sede de resposta ao Parecer do Ministério Publico, a verdade é que, o Tribunal “a quo”, arbitrariamente, decidiu tratar de modo diferente, uma situação igual.
QQ) Razão pela qual, e ainda, é inconstitucional a decisão recorrida, por violar o princípio da igualdade previsto no artigo 13 da CRP, INCONSTITUCIONALIDADE QUE SE INVOCA PARA OS DEVIDOS E LEGAIS EFEITOS.
O recurso deve ser provido …

Resposta do MP.
I. A Herança Aberta por Óbito de AA não é uma pessoa singular, coletiva (ou equiparada) ou associação sem personalidade jurídica, razão pela qual não é legalmente responsável em processos de contraordenação, nos termos do disposto no artº 7 do RGCOC;
II. Pela prática da contraordenação prevista no artº 15, nº 2, alª b) do DL Nº 124/2006 que incidem sobre terrenos que fazem parte de uma herança respondem a(s) pessoa(s) singulares cuja autoridade policial ou administrativa venha a apurar que de facto tivessem a posse do terreno ou detivessem a administração do mesmo;
III. Caso assim não se entenda, e se admita com recurso ao artº 12, alª a) do CPC. a possibilidade de a herança responder num processo contraordenacional, certo é que não existem elementos nos autos que permitam aferir se a herança já foi ou não aceite, sendo certo que só a herança jacente goza de personalidade judiciária, razão pela qual a sentença padece do vício da insuficiência da matéria de facto, previsto no artº 410, nº 2, alª a) do CPP.
IV. A decisão administrativa tem descrito o elemento subjetivo da contraordenação – cf. decorre de fls. 33 (verso) no item culpa do agente – razão pela qual a decisão administrativa não padece de nulidade, por violação do disposto no artº 58, nº 1, alª b) do RGCOC;
V. A norma do artº 203 da Lei nº 2/2020, de 31/03, à semelhança das previstas no artº 153º, nº 2 da Lei nº 114/2017, de 29 de Dezembro e artº 163 nº 2 da Lei nº 71/2018, de 31 de Dezembro, são manifestamente leis temporárias, porquanto das mesmas resulta expressamente que a sua vigência se reporta aos factos ocorridos no decurso dos anos de 2018 a 2020 e a que respeitam as respetivas Leis do Orçamento do Estado;
VI. Ora, estando em causa um regime excecional que vigorou naqueles anos por decisão expressa do legislador e não em virtude de modificação das conceções quanto à ilicitude da conduta que lhe subjaz, a circunstância de tal agravação ter deixado de vigorar em 2021 (mormente por força da revogação operada pela citada Lei nº 48/2021, de 23 de Julho), não permite afastar a sua aplicabilidade às condutas ocorridas na vigência da citada norma temporária;
VII. Assim sendo, aplicar-se-ia o artº 15, nº 2, alª b) e 38, nº s 2, alª a) e 4 do DL nº 124/2006, de 28/06 com uma moldura de 240,00€ a 10.000,00€ (140,00€ a 5.000,00€ acrescido do dobro por força do artº 203, nº 2 da Lei nº 2/2020, de 31/03);
VIII. Por conseguinte, o prazo de prescrição do procedimento contraordenacional é de 3 anos, o qual tendo em conta as causas de interrupção (notificação para o exercício da defesa e da decisão administrativa) e suspensão (notificação do despacho de exame preliminar do recurso), não foi atingido – cf. artº s 27, alª b), 27-A, nº 1, alª c) e nº 2 e 28, nº 1, alªs c) e d) do RGCOC.

Já neste Tribunal Superior a Senhor Procurador Geral-Adjunto elaborou Parecer no seguinte sentido:
Concorda-se com Resposta do MP em 1ª instância, desde logo no que diz respeito à falta de personalidade jurídica da herança indivisa por óbito de AA, questão prévia de conhecimento oficioso, que implicará a pronúncia por parte do tribunal ad quem, aderindo-se aos argumentos aí explanados.
Na verdade, e dos factos considerados provados, resulta que a herança por óbito de AA, representada pela cabeça de casal, CC, foi responsabilizada em termos contraordenacionais pelos seguintes factos:
«na qualidade de proprietária do terreno confinante com edificações inseridas em espaços rurais, localizado na Travessa ..., em ..., união de freguesias ..., ..., ... e ..., concelho de Santa Maria da Feira, não havia procedido à gestão de combustível numa faixa envolvente a edificações com largura mínima de 50m, designadamente porque tinha mato crescido a menos de 50 metros das habitações, concretamente:
a) No estrato arbóreo, nos povoamentos de eucaliptos e pinheiro bravo, não foi cumprido a distância entre copas de 10 metros, estando as mesmas encostadas;
b) No que respeita à desramação, a mesma não foi efectuada, no mínimo 4 metros acima do solo, nas árvores que tinham mais de 8 metros de altura, e em 50% da sua altura nas árvores inferiores a 8 metros».
Para o efeito, e necessariamente, se terá de ter em conta não só as regras de responsabilização contraordenacional definida no artigo 7º do RGCO «1 - As coimas podem aplicar-se tanto às pessoas singulares como às pessoas colectivas, bem como às associações sem personalidade jurídica. 2 - As pessoas colectivas ou equiparadas serão responsáveis pelas contra-ordenações praticadas pelos seus órgãos no exercício das suas funções.
Como as regras respeitantes aos conceitos civis de herança indivisa e jacente, às regras de atribuição de personalidade jurídica e judiciária e à suficiência de factos dados como provados na sentença recorrida para a comprovação dessa personalidade jurídica e judiciária.
Como se verifica dos factos dados como provados foi aberta a sucessão por óbito de AA.
Ou seja, da conjugação dos normativos processuais previstos nos artigos 11, 12 do CPC, decorre que à herança jacente é atribuída capacidade judiciária - susceptibilidade de ser parte - mas tal não implica que a herança jacente tenha personalidade jurídica.
O artigo 1046 do Código Civil define o conceito de herança jacente «Diz-se jacente a herança aberta, mas ainda não aceita nem declarada vaga para o Estado.»,
O que remete para a aceitação da herança e para as suas consequências.
Por um lado, o domínio e posse dos bens da herança pressupõem a aceitação.
Por outro lado, a aceitação pode ser expressa ou tácita, sendo que os actos de administração dos bens herança por parte de um sucessível não implicam a aceitação tácita da herança (artigo 1056 do CC).
Por sua vez, a administração da herança pertence ao cabeça-de-casal, podendo este cargo ser exercido, por acordo entre os herdeiros, por um não herdeiro.
Ou seja, a regra é que têm personalidade jurídica e capacidade judiciária as pessoas singulares e as pessoas colectivas nos termos dos artigos 66 e segs, 157 e segs do Código Civil.
Por sua vez, quer em termos de responsabilidade criminal, quer em termos de responsabilidade contraordenacional, as pessoas colectivas podem ser responsabilidades pelos actos praticados no seu interesse pelos representantes dos seus órgãos sociais e no caso das contra-ordenações ainda por associações sem personalidade jurídica.
Tendo presente todas estas regras e os factos dados como provados na sentença recorrida, entende-se que de facto a herança de AA não tem personalidade jurídica e não está portanto abrangida pelo artigo 7 do RGCO.
Veja-se, por exemplo, o entendido no Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 2-6-2016 «A herança indivisa e não partilhada apenas goza de personalidade judiciária enquanto se mantiver na situação (tendencialmente transitória) de jacente.
3. A partir da cessação desta situação, operada mediante a sua aceitação por parte dos sucessíveis chamados, passa a não dispor de tal prerrogativa processual pelo que não poderá, em seu próprio nome, desempenhar o papel de parte processual em lide forense, demandar e ser demandada.
4. Existindo elementos seguros que demonstrem que a herança foi aceite pelos sucessíveis chamados, deve ser julgada procedente a excepção dilatória de falta de personalidade judiciária da herança.
Conforme já afirmado não cabe a herança jacente no âmbito do disposto no artigo 7 do RGCO, pois apenas está prevista responsabilidade contraordenacional relativamente às pessoas singulares, às pessoas colectivas e a às associações, mesmo sem personalidade jurídica.
Do mesmo modo se entendeu, com as devidas adaptações no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 19-11-1997 «A entidade identificada como arguida, "Daud Abdala, Herdeiros", não é pessoa singular, nem pessoa colectiva, no sentido definido pelos artºs 157 e segs. do CC, nomeadamente, por não poder ser titular de direitos e obrigações, na medida em que não goza de personalidade, nem capacidade jurídicas, sendo destituída de personalidade e capacidade judiciárias – artºs 5 e 9 do CPC, e também não pode ser "pessoa equiparada a pessoa colectiva", pois não é uma "associação sem personalidade jurídica", artº 159 e segs. do CC muito menos é uma sociedade irregular, pois não foi alegado ou provado que entre os herdeiros tivesse sido celebrado qualquer negócio jurídico para exploração de qualquer actividade lucrativa. Também não se pode dizer que tenha sido a herança, património autónomo (artº 26 do CPC) que tenha sido chamada ao processo na qualidade de arguida. II - Tal "entidade" identificada como "arguida" não é passível de ser responsabilizada pela prática de qualquer contra-ordenação e de ser demandada como tal.
Ficam assim prejudicadas as restantes questões levantadas em sede de recurso.

Da decisão recorrida.
Compulsados os autos, tem-se que como factos relevantes para a decisão da causa:
1. Em 06 de Junho de 2020, foi verificado pelo Núcleo de Protecção Ambiental (NPA) do Destacamento Territorial da Guarda Nacional Republicana (GNR) em Santa Maria da Feira, que a Herança de "AA", NIF ...40, na qualidade de proprietária do terreno confinante com edificações inseridas em espaços rurais, localizado na Travessa ..., em ..., união de freguesias ..., ..., ... e ..., concelho de Santa Maria da Feira, não havia procedido à gestão de combustível numa faixa envolvente a edificações com largura mínima de 50m, designadamente porque tinha mato crescido a menos de 50 metros das habitações, concretamente:
a) No estrato arbóreo, nos povoamentos de eucaliptos e pinheiro bravo, não foi cumprido a distância entre copas de 10 metros, estando as mesmas encostadas;
b) No que respeita à desramação, a mesma não foi efectuada, no mínimo 4 metros acima do solo, nas árvores que tinham mais de 8 metros de altura, e em 50% da sua altura nas árvores inferiores a 8 metros.
2. A arguida é representada pela Cabeça de Casal de Herança, CC, residente em Rua ..., ... ....
3. O terreno referido em 1) está classificado na Carta de Ocupação de Solo de Portugal Continental como "Floresta de Eucalipto".
4. Com a conduta descrita, a recorrente revelou desatenção e irreflectida inobservância das normas no âmbito do Sistema de Defesa da Floresta Contra Incêndios, actuando com manifesta falta de cuidado e prudência que a defesa da floresta contra incêndios no momento se lhe impunha, agindo de forma livre e consciente, não se avistando factos que retirem a censurabilidade à infracção.
5. Em 28/12/2022, a herança foi notificada de que tinha sido constituída arguida e para exercer o seu direito de audição e defesa.
6. Em 25/01/2023, a arguida remeteu comunicação ao Núcleo de Protecção Ambiental (NPA) da GNR de Santa Maria da Feira, invocando a nulidade do procedimento contraordenacional e a prescrição do mesmo.
7. Em 28/02/2023, a arguida foi notificada da decisão administrativa proferida pelo Núcleo de Protecção Ambiental (NPA) da GNR de Santa Maria da Feira, a 15.02.2023, que a condenou no pagamento de uma coima, no montante de Euros: 280,00, pela prática da contraordenação de incumprimento da obrigação da gestão de combustível no seu terreno, numa faixa com a largura definida no PMDFCI, com o mínimo de 10 m e o máximo de 50 m, medida a partir da alvenaria exterior do edifício, quando a faixa abranja exclusivamente terrenos ocupados com outras ocupações, prevista nos artº 15, nº2, alª b), e 38, nº 2, alª a), do Decreto-Lei nº 124/2006, de 28/06, a título de negligência.
8. O recurso de impugnação judicial foi submetido a 24/03/2023.
9. O Plano Municipal de Defesa da Floresta de Santa Maria da Feira encontra-se em vigor.

Factos não provados
Com relevância para a decisão da causa, inexistem factos não provados.

Motivação
O recurso de contra-ordenação versou apenas sobre matéria de direito, não tendo a recorrente impugnado os factos que constam do auto de notícia e da decisão contra-ordenacional. Assim, a convicção do Tribunal, no que concerne à factualidade típica, fundou-se no teor do auto de notícia, bem como nos factos dados como provados na decisão administrativa. Mais assentou a convicção, quanto à factualidade dada como provada, nos elementos que constam do processo contra-ordenacional e que foram carreados aos autos, bem como, no que tange ao facto nº 9, na informação prestada pelo Município de Santa Maria da Feira, a 12.05.2023.
Tais elementos foram analisados criticamente e de forma objectiva, à luz do princípio da livre apreciação da prova, permitindo ao tribunal dar como provados os factos supra elencados.

Fundamentação de direito.
Da nulidade do procedimento contra-ordenacional por violação do princípio ne bis in idem Invoca a recorrente a nulidade do procedimento contra-ordenacional, por a decisão administrativa ter resultado do lavrar de um outro auto de notícia, a versar sobre os mesmos factos que constavam já de um primeiro, no qual era visada a cabeça-de-casal da herança, e não a herança propriamente dita, pelo que ocorreu violação do princípio ne bis in idem, já que, quanto ao primeiro auto de notícia referente à cabeça-de-casal, o despacho de arquivamento adquiriu força de “caso decidido”. Tanto significa que não podem os factos dele objecto ser de novo valoráveis, por não ser admitida a substituição de auto de notícia.
Cabe apreciar.
Plasmado no artº 29, nº 5, da CRP, o qual dispõe que “ninguém pode ser julgado mais do que uma vez pela prática do mesmo crime”, o princípio ne bis idem é aplicável no âmbito do processo contra-ordenacional, por força do disposto no artº 32 do RGCO.
Trata-se, assim, de impedir e proibir o duplo julgamento e, consequentemente a dupla penalização – cfr. CANOTILHO, Gomes J. J. e MOREIRA, Vital – Constituição da República Portuguesa Anotada, p. 497 - como corolário do caso julgado ou decidido, que assenta no princípio da segurança jurídica, sem prejuízo dos princípios da culpa e da legalidade.
Deste modo, este princípio proíbe que seja instaurado e movido contra a mesma pessoa procedimento pelos mesmos factos, ou que tenha lugar a aplicação, no mesmo processo, uma sanção por factos já sancionados anteriormente.
Não se sendo alheio à discussão sobre aquilo em que consistirão os “mesmos factos”, a realidade é que não está em causa qualquer violação deste princípio, porquanto, proferido despacho de arquivamento, o procedimento contra-ordenacional não foi movido contra a mesma pessoa, i.e., contra a cabeça-de-casal, mas contra a herança de que aquela o é.
Ora, sendo condição essencial do duplo julgamento ou valoração dos factos que este princípio proíbe que aquele tenha lugar em relação à mesma pessoa, patentemente isso não se verifica no caso.
Ora, o princípio de ne bis in idem trazido para os ilícitos de mera ordenação social pressupõe a existência de uma decisão definitiva em processo de contra-ordenação sobre um facto imputando ao mesmo agente, impedindo que tal facto seja novamente objecto de processo contra-ordenacional.
No entanto, no caso, não estando em causa o mesmo agente da prática da infracção, carece desde logo um dos pressupostos legais, do que resulta a impossibilidade material de violação do princípio ne bis in idem, nos termos a contrario do artº 79, nº 1 do Decreto-Lei nº 433/82, de 27 de Outubro.
Pelo exposto, julga-se improcedente a nulidade do procedimento contra-ordenacional invocada.

Da prescrição do procedimento contra-ordenacional.
O Decreto-Lei nº 124/2006, de 28/06 (“Sistema Nacional de Defesa da Floresta contra Incêndios) disciplina “o conjunto de medidas e acções de articulação institucional, de planeamento e de intervenção relativas à prevenção e protecção das florestas contra incêndios, nas vertentes da compatibilização de instrumentos de ordenamento, de sensibilização, planeamento, conservação e ordenamento do território florestal, silvicultura, infraestruturação, vigilância, detecção, combate, rescaldo, vigilância pós-incêndio e fiscalização, a levar a cabo pelas entidades públicas com competências na defesa da floresta contra incêndios e entidades privadas com intervenção no sector florestal”– cfr. artº 2, nº1, desse mesmo diploma legal.
Prevê o artº 15, nº 2, alª b), desse Decreto-Lei que “os proprietários, arrendatários, usufrutuários ou entidades que, a qualquer título, detenham terrenos confinantes a edifícios inseridos em espaços rurais, são obrigados a proceder à gestão de combustível, de acordo com as normas constantes no anexo do presente decreto-lei e que dele faz parte integrante, numa faixa com a largura definida no PMDFCI, com o mínimo de 10 m e o máximo de 50 m, medida a partir da alvenaria exterior do edifício, quando a faixa abranja exclusivamente terrenos ocupados com outras ocupações”, sob pena de praticarem uma contra-ordenação, ainda que a título de negligência – cfr. artº 38, nº s 2, alª a), e 4, do mesmo diploma, punível com a uma coima entre 140,00€ e 5.000,00€, mas a fixar entre Euros: 280,00€ e 10.000,00€, nos termos conjugados do disposto no artº 38, nº1, da citada Lei e no artº 203, nº2, da Lei nº 2/2020, de 31/03.
Este regime foi entretanto revogado pelo Decreto-Lei nº 82/2021, de 13/10, que, contudo, continuou a prever como contra-ordenação, desta feita, como contra-ordenação leve, o incumprimento dos deveres de gestão de combustível previstos no artº 49, nº7, alª a), deste novo corpo normativo, nos termos conjugados do artº 72, nº1, alª f) e nº 2 do mesmo.
Ora, dispõe o artº 3, nºs 1 e 3, do Regime Geral das Contra-ordenações e Coimas (“RGCOC”), consagrado no Decreto-Lei nº 433/82, de 27-10, e que conhece aqui aplicação, que “a punição da contra-ordenação é determinada pela lei vigente no momento da prática do facto ou do preenchimento dos pressupostos de que depende”, a não ser que a lei vigente nessa altura venha a ser alterada, caso em que se aplicará a que é mais favorável ao arguido (nº 2).
Porém, resulta do disposto nos artº 79 nº 1, 2 e 4 e 80 alínea c) do referido diploma que:
- os planos municipais de defesa da floresta contra incêndios em vigor produzem efeitos até 31 de Dezembro de 2024, sendo substituídos pelos programas municipais de execução previstos no presente decreto-lei;
- os planos municipais de defesa da floresta contra incêndios cujo período de vigência tenha terminado em 2021 mantêm-se em vigor até 31 de Dezembro de 2022, sem prejuízo da sua actualização ou da sua revogação por programas municipais de execução de gestão integrada de fogos rurais;
- enquanto se mantiverem em vigor os planos municipais de defesa da floresta contra incêndios, são aplicáveis as disposições do Decreto-Lei nº 124/2006, de 28 de Junho, na sua redacção actual, relativas aos deveres de gestão de combustível na rede secundária de faixas de gestão de combustível e às contra-ordenações respectivas, sem prejuízo da aplicação das normas da secção iii do capítulo iv do Decreto-Lei nº 82/2021, de 13 de Outubro (respeitante a servidões administrativas e execução).
No caso do Plano Municipal de Defesa da Floresta contra Incêndios de Santa Maria da Feira, o mesmo consta do Aviso nº 13789/2021, publicado no Diário da República nº 139/2021, Série II de 2021-07-20, com período de vigência de 10 anos.
Temos assim que, não obstante a revogação do Decreto-Lei nº 124/2006, de 28 de Junho, operada por força da entrada em vigor do Decreto-Lei nº 82/2021, de 13 de Outubro, as disposições legais em causa nos autos se mantêm plenamente vigentes, visto que os planos municipais de defesa da floresta contra incêndios em vigor produzem efeitos até 31 de Dezembro de 2024.
Destarde, no caso sub judice, resulta que o plano municipal de defesa da floresta contra incêndios do Município de Santa Maria da Feira ainda se encontra em vigor, pelo que é de aplicar o regime do referido Decreto-Lei nº 124/2006, não se encontrando a decisão administrativa enfermada de qualquer erro na determinação do regime jurídico aplicável.
Nestes termos, no que concerne à prescrição, sendo a contra-ordenação em causa punível com uma coima entre 280,00€ e 10.000,00€, prevê o artº 27, alª b), do RGCO, que “o procedimento por contra-ordenação extingue-se por efeito da prescrição logo que sobre a prática da contra-ordenação haja decorrido o prazo de três anos, quando se trate de contra-ordenação a que seja aplicável uma coima de montante igual ou superior a 2.493,99€ e inferior a 49.879,79€”.
Assim, é de aplicar esta norma e, consequentemente, um prazo de prescrição de 3 anos.
Por sua vez, determina o artº 28, nº1, do RGCO, que “[a] prescrição do procedimento por contra-ordenação interrompe-se: a) Com a comunicação ao arguido dos despachos, decisões ou medidas contra ele tomados ou com qualquer notificação; b) Com a realização de quaisquer diligências de prova, designadamente exames e buscas, ou com o pedido de auxílio às autoridades policiais ou a qualquer autoridade administrativa; c) Com a notificação ao arguido para exercício do direito de audição ou com as declarações por ele prestadas no exercício desse direito; d) Com a decisão da autoridade administrativa que procede à aplicação da coima”, bem sempre que, desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo da prescrição acrescido de metade (n.º2).
O prazo de prescrição deste procedimento contra-ordenacional é de 3 anos, como já referido, pelo que, olhando à data da prática dos factos e à data da decisão, é de notar que o mesmo não se encontrava prescrito aquando desta última, sem sequer considerar as interrupções do mesmo motivadas pela notificação da recorrente para exercer o seu direito de defesa e pela notificação da decisão, respectivamente, a 28.12.2022 e a 28.02.2023, ou as suspensões desse prazo instituídas pela Lei nº13-B/2021, de 05/04.
Ademais, note-se que, ao abrigo do nº 3, do artº 28 do RGCO, não decorreu, desde o início do procedimento contraordenacional, o prazo de prescrição (3 anos), acrescido de metade (1 e 6 meses), ou seja, ainda não decorreram 4 anos e 6 meses, o que só sucederá a 06.12.2024.
Não se olvide ainda que a prescrição se suspende durante o tempo em que o procedimento contraordenacional estiver pendente a partir da notificação do despacho que procede ao exame preliminar do recurso da decisão da autoridade administrativa que aplica a coima, até à decisão final do recurso, até um máximo de seis meses, nos termos do artº 27-A, nº1, alª c) e nº 3 do RGCO.
Assim, atento o regime jurídico aplicável, é patente que o procedimento por contraordenação não se encontra ainda prescrito.
Pelo exposto, julga-se improcedente a invocada prescrição do procedimento contraordenacional.

Do mérito do recurso.
O objecto do recurso define-se no âmbito das conclusões, sem prejuízo das questões oficiosas – artº 412 nº 1 do CPP.
Há duas questões prévias que importa aflorar e decidir: a personalidade judiciária da herança e âmbito e efeitos do recurso previstos no artº 75 do RGCOC (Regime Geral de Contra-Ordenações e Coimas) – a 2ª instância (tribunal de revista) apenas conhece matéria de direito. As únicas excepções a este princípio prendem-se com a proibição da reformatio in pejus e do conhecimento de eventuais questões oficiosas, como por exemplo causas de impugnação restrita.
Posto isto circunscrever o recurso:
a) Falta de personalidade judiciária;
b) Insuficiência para a decisão da matéria de facto provada (artº 410 nº 2 alª a) do CPP);
c) Falta de elemento subjectivo;
d) Erro na determinação da norma aplicável;
e) Prescrição do procedimento contra-ordenacional;
f) Violação do princípio da igualdade – inconstitucionalidade prevista no artº 13 da CRP.

Quanto à personalidade judiciária dizer que numa primeira fase o recorrente veio alegar violação do ne bis in idem. O núcleo da GNR demandou CC e após, diligências várias, verificou-se, junto do Serviço de Finanças, a propriedade pertence à herança indivisa (óbito) AA tem por cabeça de casal CC.
O Núcleo de Investigação da GNR para esta área determinou o arquivamento quanto aquela indiciada, sem prejuízo de definição do titular da propriedade, que recaíu na herança de AA. Sujeitos processiuais distintos.
Formalizado o processo foi accionada a herança de AA.
Inevitavelmente temos de nos socorrer da matéria dada como provada para rebater a argumentação do recorrente. Efectivamente não está em causa uma pessoa singular mas antes um património autónomo – herança por óbito de AA, representada pela cabeça de casal.
1. Em 06 de Junho de 2020, foi verificado pelo Núcleo de Protecção Ambiental (NPA) do Destacamento Territorial da Guarda Nacional Republicana (GNR) em Santa Maria da Feira, que a Herança de "AA", NIF ...40, na qualidade de proprietária do terreno confinante com edificações inseridas em espaços rurais, localizado na Travessa ..., em ..., união de freguesias ..., ..., ... e ..., concelho de Santa Maria da Feira, não havia procedido à gestão de combustível numa faixa envolvente a edificações com largura mínima de 50m, designadamente porque tinha mato crescido a menos de 50 metros das habitações, concretamente:
2. A arguida é representada pela Cabeça de Casal de Herança, CC, residente em Rua ..., ... ....
(…)
5. Em 28/12/2022, a herança foi notificada de que tinha sido constituída arguida e para exercer o seu direito de audição e defesa.
6. Em 25/01/2023, a arguida remeteu comunicação ao Núcleo de Protecção Ambiental (NPA) da GNR de Santa Maria da Feira, invocando a nulidade do procedimento contraordenacional e a prescrição do mesmo.
7. Em 28/02/2023, a arguida foi notificada da decisão administrativa proferida pelo Núcleo de Protecção Ambiental (NPA) da GNR de Santa Maria da Feira, a 15.02.2023, que a condenou no pagamento de uma coima, no montante de Euros: 280,00, pela prática da contraordenação de incumprimento da obrigação da gestão de combustível no seu terreno, numa faixa com a largura definida no PMDFCI, com o mínimo de 10 m e o máximo de 50 m, medida a partir da alvenaria exterior do edifício, quando a faixa abranja exclusivamente terrenos ocupados com outras ocupações, prevista nos artº 15, nº2, alª b), e 38, nº 2, alª a), do Decreto-Lei nº 124/2006, de 28/06, a título de negligência.
Não há dúvida que a herança foi a requerida por violação da assinalada contra-ordenação e de que a cabeça-de-casal da herança é CC.
Não há qualquer confusão entre pessoa colectiva ou equiparada (património autónomo) e pessoa singular, aliás foi por esse motivo que a demanda foi arquivada quanto ao indivíduo CC e redireccionada para a parte legítima, pessoa colectiva/equiparada ou património autónomo, herança de AA. Não há dúvida quanto à responsabilidade contra-ordenacional. As entidades colectivas, obviamente respondem por intermédio dos seus representantes, na circunstância a cabeça de casal. Vejam-se artºs 7 do RGCOC e artº 11 do CP e artºs 11 e 12 alª a) do CPC ex vi artº 32 e 41 do RGCOC.A herança, ainda que jacente, entidade colectiva/equiparada/património-autónomo (artºs 11/12 do CPC) tem personalidade judiciária e, em determinadas circunstâncias, até pode ter personalidade jurídica (exercício de direitos). A herança jacente (artº 2046 do CC) também pode ter um curador. Fácil compreender que um qualquer património pode ter responsabilidade civil e penal, rectius de ordenação-social, desde que os pressupostos da responsabilidade se verifiquem. Caso assim não fosse, estava encontrado o meio para ninguém ser responsável pelos actos praticados: demandada a cabeça-de-casal, alega que há uma herança e demandada a herança alega que não tem personalidade judiciária …
O artº 3º do citado diploma legal - DL nº 124/2006, de 28/06 - estabelece um conjunto de definições, prevendo o nº 1, alª ff) que: “1 - Para efeitos do disposto no presente decreto-lei, entende-se ff) por: «Proprietários e outros produtores florestais», os proprietários, usufrutuários, superficiários, arrendatários ou quem, a qualquer título, for possuidor ou detenha a administração dos terrenos que integram os espaços florestais do continente, independentemente da sua natureza jurídica”. O diploma legal que configura legislação especial não dá margem para qualquer exclusão, veja-se, a qualquer título… o que de per si, basta, mas, sem prejuízo de também se chegar até lá, através da lei geral ordinária.
O recorrente pretende dizer que a matéria de facto é insuficiente para a decisão de direito. Estamos no domínio da impugnação restrita da matéria de facto. O seu conhecimento (artº 410 nº 2 alª a) do CPP) é oficioso. A matéria de facto vertida na rubrica factos provados é suficiente e caracteriza a herança como sujeito jurídico de deveres.
Já acima transcrevemos a matéria de facto dada como provada e independentemente do que colectivamente se possa chamar à herança – pessoa colectiva, equiparada ou património autónomo – não há qualquer dúvida que tem personalidade judiciária, razão por que foi requerida em processo de contra-ordenação.
Improcedem a falta de capacidade judiciária e o alegado vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada (artº 410 nº 2 alª a) do CPP).

Falta de elemento subjectivo.
A recorrente, sobre a falta de elemento subjectivo, alega nulidade da decisão a quo nos termos do artº 379 nº 1 alª a) do CPP, ex vi artº 32 do RGCOC.
Apesar do recorrente não poder discutir matéria de facto, sempre diremos que a falta de cuidado, decorrência dos factos objectivos praticados, encontra-se devidamente plasmada no artº 4 da rubrica de factos provados. O diploma refere-se à limpeza dos solos como meio de protecção ambiental contra incêndios. A falta de cuidado traduz-se na ausência periódica de limpeza, incumbência dos titulares da propriedade. O desenvolvido no artº 4 é suficiente para caracterizar o elemento subjectivo. Aproveitamos ainda para brandir que o recorrente só pode discutir circunstâncias de direito…
Não vislumbramos onde possa caber uma nulidade tipo da prevista no artº 379 nº 1 alª a) do CPP, já que os fatos dados como provados são claramente suficientes para imputar a infracção no plano objectivo e subjectivo à herança recorrente.
O artº 58 do RGCOC cumpriu-se cabalmente, incluindo a alª b) do do referido dispositivo – descrição factual e fundamentação da decisão condenatória fundamentação de direito. Aliás a recorrente não impugnou de facto, como podia, junto do tribunal a quo.
Improcede a alegada nulidade.

O erro na determinação da norma aplicável prende-se com a prescrição do procedimento criminal.
Sobre esta matéria o tribunal a quo é muito objectivo e não concede na aplicação de outra norma transitória, nem em contagem distinta do prazo prescritivo.
(…)
No caso do Plano Municipal de Defesa da Floresta contra Incêndios de Santa Maria da Feira, o mesmo consta do Aviso nº 13789/2021, publicado no Diário da República nº 139/2021, Série II de 2021-07-20, com período de vigência de 10 anos.
Temos assim que, não obstante a revogação do Decreto-Lei nº 124/2006, de 28 de Junho, operada por força da entrada em vigor do Decreto-Lei nº 82/2021, de 13 de Outubro, as disposições legais em causa nos autos se mantêm plenamente vigentes, visto que os Planos Municipais de Defesa da Floresta contra Incêndios em vigor, produzem efeitos até 31 de Dezembro de 2024.
Destarde, no caso sub judice, resulta que o Plano Municipal de Defesa da Floresta contra Incêndios do Município de Santa Maria da Feira ainda se encontra em vigor, pelo que é de aplicar o regime do referido Decreto-Lei nº 124/2006, não se encontrando a decisão administrativa enfermada de qualquer erro na determinação do regime jurídico aplicável. Entendimento corroborado pela entidade administrativa.
Nestes termos, no que concerne à prescrição, sendo a contra-ordenação em causa punível com uma coima entre 280,00€ e 10.000,00€ (artº 15 nº 2 e 19 do D/L124/06 de 28/Junho e artº 38 nº 1 do mesmo diploma legal, conjugado com artº 203 nº 2 da Lei do Orçamento Geral de Estado de 2020), prevê o artº 27, alª b), do RGCO, que “o procedimento por contra-ordenação extingue-se por efeito da prescrição logo que sobre a prática da contra-ordenação haja decorrido o prazo de três anos, quando se trate de contra-ordenação a que seja aplicável uma coima de montante igual ou superior a 2.493,99€ e inferior a 49.879,79€”.
Assim, é de aplicar esta norma e, consequentemente, um prazo de prescrição de 3 anos.
Por sua vez, determina o artº 28, nº1, do RGCO, que “[a] prescrição do procedimento por contra-ordenação interrompe-se: a) Com a comunicação ao arguido dos despachos, decisões ou medidas contra ele tomados ou com qualquer notificação; b) Com a realização de quaisquer diligências de prova, designadamente exames e buscas, ou com o pedido de auxílio às autoridades policiais ou a qualquer autoridade administrativa; c) Com a notificação ao arguido para exercício do direito de audição ou com as declarações por ele prestadas no exercício desse direito; d) Com a decisão da autoridade administrativa que procede à aplicação da coima”, bem sempre que, desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo da prescrição acrescido de metade (nº 2).
O prazo de prescrição deste procedimento contra-ordenacional é de 3 anos, como já referido, pelo que, olhando à data da prática dos factos e à data da decisão, é de notar que o mesmo não se encontrava prescrito aquando desta última, sem sequer considerar as interrupções do mesmo motivadas pela notificação da recorrente para exercer o seu direito de defesa e pela notificação da decisão, respectivamente, a 28.12.2022 e a 28.02.2023, ou as suspensões desse prazo instituídas pela Lei nº13-B/2021, de 05/04.
Ademais, note-se que, ao abrigo do nº 3, do artº 28 do RGCO, não decorreu, desde o início do procedimento contraordenacional, o prazo de prescrição (3 anos), acrescido de metade (1 ano e 6 meses), ou seja, ainda não decorreram 4 anos e 6 meses, o que só sucederá a 06.12.2024.
Não se olvide ainda que a prescrição se suspende durante o tempo em que o procedimento contraordenacional estiver pendente a partir da notificação do despacho que procede ao exame preliminar do recurso da decisão da autoridade administrativa que aplica a coima, até à decisão final do recurso, até um máximo de seis meses, nos termos do artº 27-A, nº1, alª c) e nº 3 do RGCO.
Assim, atento o regime jurídico aplicável, é patente que o procedimento por contraordenação não se encontra ainda prescrito.
Pelo exposto, julga-se improcedente a invocada prescrição do procedimento contraordenacional. (sublinhados nossos).
A pretensão da recorrente quanto a um regime mais favorável, por via da sucessão de leis orçamentais, disciplinadoras desta matéria, não colhe por força do Plano Municipal de Defesa da Floresta contra Incêndios de Santa Maria da Feira, o mesmo consta do Aviso nº 13789/2021, publicado no Diário da República nº 139/2021, Série II de 2021-07-20, com período de vigência de 10 anos. O D/L nº 124/2006 está em vigor por via do Plano Municipal previsto para Santa Maria da Feira.
Uma leitura atenta do D/L 124/2006 de 28 de Junho demonstra no sumário, o uso de medidas e acções a estabelecer no âmbito do Sistema Nacional de Defesa da Floresta contra Incêndios.
Depois de consulta aturada a vários diplomas concluímos que nos termos do artº 80 (norma revogatória) do D/L nº 82/2021 de 13 de outubro, o D/L nº 124/2006 de 28 de Junho foi revogado, sem prejuízo do disposto nos nºs 3 e 4 do artº anterior – artº 79 nºs 3 e 4 (D/L 82/2021) onde expressamente se diz: enquanto se mantiverem em vigor os planos municipais de defesa da floresta contra incêndios em vigor – produzem efeitos até 31 de Dezembro de 2024 - são aplicáveis as disposições do D/L nº 124/2006 de 28 de Junho…
De onde se conclui que o D/L 124/2006 está em vigor, por força do disposto nos artºs 80 alªc) e 79 nºs 1 e 2 do D/L 82/21 de 28 de Junho. Aliás o recorrente não teria razão em qualquer circunstância porque não é uma pessoa singular mas sim um património autónomo, contra-ordenação (leve) que na sua perspectiva seria punida entre 500/5.000€ - artº 72 nº 2 alª ii) do citado diploma.
Tendo em conta o valor da coima aplicada (280,00€), o prazo de prescrição é o previsto no artº 27 alª b) do RGCOC – 3 (três) anos a que acrescem as suspensões e interrupções verificadas, contudo o legislador salvaguardou um prazo geral, previsto no artº 28 nº 3 do RGCOC – a prescrição tem sempre lugar quando, desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão (não superior a 6 meses, por força do disposto no artº 27-A nº 2 do mesmo diploma) tiver decorrido o prazo de prescrição, acrescido de metade. O que nos remete para um prazo máximo de 3 (três) anos + 18 (dezoito) meses + 6 (seis) meses = 5 (cinco) anos. Prazo de prescrição, acrescido de metade, mais o prazo máximo de suspensão.
Prazo que ainda está longe de ser ultrapassado.
Improcede qualificação jurídica distinta, bem como a prescrição do procedimento contra-ordenacional.

Da violação do princípio da igualdade.
A argumentação da recorrente é insólita e fora de contexto.
O comando constitucional (artº 13 da CRP) não nos parece cobrir uma situação de julgados contraditórios, cuja previsão extraordinária só existe para os Tribunais Superiores, mas sim uma discriminação … suportada em diferença de raça, sexo, língua, origem, religião, ideologia e outras, quando todos os cidadãos são iguais perante a lei. Ao Tribunal Superior compete avaliar as causas de recurso nos termos da lei. O recorrente limitou-se a citar uma decisão que correu termos, alegadamente, no mesmo juízo e tribunal, sem que o tribunal superior possa sindicar um processo que não é objecto de recurso. Os autos respondem por si, no respeito por princípios, entre outros, de publicidade, contraditoriedade (defesa), concentração, continuidade, imediação e investigação.
A questão da prescrição foi tradada em conformidade e nos termos acima expressos. Resulta da lei que a qualificação não pode ser a mesma que o recorrente pretende, razão por que o prazo prescritivo tem de ser necessariamente distinto.
Sem mais considerações, não alcançamos onde possa existir violação do princípio da igualdade.
Improcede a inconstitucionalidade.

A título de conclusão assinalar que a herança foi tratada como proprietário e outros produtores florestaisa qualquer título… o que lhe valeu uma condenação como se fosse pessoa jurídica singular (artº 3 nº 1 alª ff) do D/L 124/2006 de 28 de Junho), contudo não temos dúvida que se trata de um património autónomo, com responsabilidade, em primeira linha do cabeça-de-casal, mas em representação da entidade colectiva ou assimilada. Nesta perspectiva a herança até acabou por ser benefiada na coima, pois rigoramente devia ter sido tratada como entidade colectiva (património autónomo) para efeito de sanção… Por via de não existir recurso do MP, decidimos manter a decisão, caso contrário estaríamos perante uma flagrante violação do princípio da reformatio in pejus.

Improcede o recurso in totum.


Acordam os juízes que integram esta 4ª Secção Criminal do TRP em julgar improcedente o recurso interposto pela Herança aberta por óbito de AA, confirmando-se a decisão recorrida.

Custas pela recorrente fixando-se a taxa de justiça em 5 (cinco) UC,s.

Registe e notifique.





Porto, 13 de Março de 2024.
Relator: Horácio Correia Pinto.
1ª Adjunto: William Themudo Gilman
2ª Adjunta: Maria dos Prazeres Silva.