Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
367/18.4Y7PRT.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: PAULA LEAL DE CARVALHO
Descritores: ACIDENTE DE TRABALHO
TRABALHADOR SUBSCRITOR DA CGA
CONTRATO DE TRABALHO EM FUNÇÕES PÚBLICAS
COMPETÊNCIA DA JURISDIÇÃO ADMINISTRATIVA
Nº do Documento: RP20190411367/18.4Y7PRT.P1
Data do Acordão: 04/11/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROVIDO
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL) (LIVRO DE REGISTOS Nº 292, FLS 385-400)
Área Temática: .
Sumário: O Tribunal do Trabalho é materialmente incompetente, sendo competente a Jurisdição Administrativa, para conhecer de acidente de trabalho sofrido por trabalhador, subscritor da CGA, que se encontra vinculado a Hospital com a natureza de Entidade Pública Empresarial (EPE) por contrato de trabalho em funções públicas.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Procº nº 367/18.4Y7PRT.P1 Apelação
Relator: Paula Leal de Carvalho (Reg. nº 1104)
Adjuntos: Des. Rui Penha
Des. Jerónimo Freitas

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:

I. Relatório:

Participado, aos 29.03.2018, acidente de trabalho de que teria sido vítima a A., B... e frustrada a tentativa de conciliação que teve lugar na fase conciliatória do processo, aquela, patrocinada pelo Digno Magistrado do Ministério Público, apresentou petição inicial demandando o Réu, Centro Hospitalar ..., EPE, pedindo a condenação deste a pagar-lhe a: a) A pensão anual e vitalícia de €928,21, correspondente ao salário anual referido em 3º e ao grau de IPP de 5%, a partir do dia seguinte ao da alta (05-12-2012), obrigatoriamente remível, e, consequentemente, o capital de remição a calcular; b) Juros de mora à taxa legal sobre a referida importância, a contar do vencimento da obrigação, nos termos do art. 135º, do CPT.
Para tanto alegou em síntese que: trabalha para o Réu, mediante contrato de trabalho em funções públicas, desempenhando as funções de enfermeira; foi vítima de um acidente de trabalho sofrido aos 18.03.2012; no dia 04-12-2012, foi submetida a Junta Médica pela ADSE, que lhe atribuiu alta nessa data, verificando a existência de IPP, a fixar em Junta Médica da Caixa Geral de Aposentações (CGA); contudo, nunca foi sujeita a Junta Médica pela CGA para fixação de IPP, a qual declinou a sua competência e responsabilidade; o Réu não tinha a sua responsabilidade transferida para qualquer seguradora; o Réu não participou o acidente ao Tribunal, antes tendo solicitado ao Instituto de Medicina Legal e Ciências Forenses – Delegação do Norte (INMLCF) exame médico à A; em consequência do acidente de trabalho sofreu lesões determinantes dos períodos de incapacidade temporária que indica, tendo tido alta definitiva aos 04.12.2012 atribuída por junta médica da ADSE, com uma IPP de 5%.
O Réu é uma entidade pública empresarial (art. 1º nº 1 a) do DL nº 326/2007 de 28-09), decorrendo do art. 2º, nº 4, do DL nº 503/99 de 20-11, que estabelece o regime dos acidentes sofridos por trabalhadores que exercem funções públicas, que aos trabalhadores que exerçam funções em entidades públicas empresariais é aplicável o regime de acidentes de trabalho previsto no Código do Trabalho, devendo as respetivas entidades empregadoras transferir a responsabilidade pela reparação dos danos emergentes de acidentes de trabalho nos termos previstos naquele Código, o que também decorre dos arts. 4º nº 5, conjugado com o art. 2º, nº 1, al. b), da Lei nº 35/2014 de 20.06 – Lei Geral do Trabalho em Funções Publicas. Assim, sendo a A. trabalhadora de entidade pública empresarial, é-lhe aplicável o regime do Código do Trabalho e da Lei nº 98/2009 de 04-09, no que se refere á reparação do acidente que a vitimou. E configurando o sinistro dos autos um acidente de trabalho regulado pelo Código do Trabalho e legislação complementar, então, a competência para dirimir os conflitos inerentes cabe ao Tribunal do Trabalho, conforme estabelecido no art. 126º nº 1 c) da Lei nº 62/2013 de 26-08, com a redação da Lei nº 40-A/2016 de 22-12.

O Réu contestou arguindo a incompetência material do Tribunal do Trabalho, considerando ser competente a jurisdição administrativa.
Para tanto, alegou em síntese que:
O que sucedeu foi que sendo a A. uma trabalhadora em funções públicas - uma antiga funcionária pública – beneficiária do regime da proteção social convergente, a ACSS, IP e a DGAEP não se entenderam quanto ao regime emergente, na área dos acidentes de trabalho, aplicável aos trabalhadores em funções públicas por efeito da reforma operada em 2008 com o RCTFP (Lei nº59/2008, de 11-09), sendo que uma daquelas entidades dava instruções num sentido e outra em sentido diferente; foi nesse quadro de indefinição que a ré aguardou sem contratar qualquer seguro de responsabilidade civil laboral, até serem emitidas instruções adequadas, quanto aos trabalhadores de emprego público. E a própria CGA só muito tardiamente «devolveu» todos os processos de acidentes que lhe foram sendo remetidos pelo R., incluindo o da A.; só com essas devoluções pela CGA aliás generalizada a todos os hospitais do SNS o Réu, encetou diligências para que os trabalhadores fossem submetidos a junta médica, para fixação da incapacidade dos trabalhadores, sendo que ao longo da assistência prestada, os trabalhadores foram sempre remunerados sem qualquer restrição remuneratória, não obstante as IPP de que padecessem, mas não pagou capitais de remição, até por ser diferente o regime a esse respeito entre o do emprego público e o consagrado na LAT.
A A.é uma trabalhadora em funções públicas, do mapa de emprego público da ré, sendo subscritora da CGA e beneficiária da ADSE, beneficiária da proteção social convergente (cfr. Lei 4/2009) com acto de nomeação de 17.11.1997 e com ingresso no R. em 20.02.2001, tendo este aplicado durante os últimos anos o regime dos acidentes em serviço constante do Dec-Lei nº 503/99, de 20-11.
Com a reforma do regime jurídico dos hospitais EPE, constante do DL 18/2017, de 10.02 foi estabelecido que “ 2 - Relativamente aos trabalhadores que, nos termos do artigo 29.º, não tenham optado pelo regime do contrato de trabalho e que, mantenham o regime de protecção social convergente (RPSC), as E. P. E., integradas no SNS asseguram o pagamento das contribuições a título de entidade empregadora, para a Caixa Geral de Aposentações, I. P., e para a ADSE, quando aplicável. 3 - Ao pessoal previsto no número anterior integrado no RPSC é aplicável o Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de novembro, bem como no Decreto-Lei n.º 118/83, de 20 de novembro, para os organismos dotados de autonomia administrativa e financeira», pelo que os trabalhadores detentores de relação de emprego público (beneficiários do regime da proteção social convergente) estão novamente sujeitos ao regime dos acidentes em serviço do emprego público.
Nos termos do artigo 12º da referida LGTFP, «São da competência dos tribunais administrativos e fiscais os litígios emergentes do vínculo de emprego público» e, no art. 4º nº 4 alínea b) do ETAF estabelece-se a correspondente competência dos Tribunais Administrativos.
De todo o modo a questão do regime substantivo aplicável não contende com a da competência dos TAF.
No que se refere ao direito ao capital de remição entre o regime da LAT e o regime do DL 503/99, de 20-11 existem diferenças, sendo que no domínio da proteção social convergente e das regras dos acidentes em serviço no emprego público, diferentemente do que sucede na LAT, não há sempre direito a um capital de remição, uma vez que naquela são conferidos aos trabalhadores outros direitos que equilibram a esfera jurídica do trabalhador sinistrado, não sendo certo que, à sua luz, haja lugar ao pagamento de qualquer ‘capital de remição’.
Termina concluindo que “Deve ser julgada provada e procedente a excepção de incompetência do Tribunal em razão da matéria, em linha com a jurisprudência indicada, e, em todo o caso, sendo o objeto do processo definido pelo pedido do capital de remição, não provada e improcedente, com as legais consequências, da absolvição da ré”.

A Mmª Juíza proferiu despacho saneador/sentença, decisão essa nos termos da qual julgou improcedente a exceção da incompetência material do Tribunal do Trabalho e, julgando a acção procedente, condenou o Réu a pagar à A., com efeitos a partir de 05/12/2012 (dia seguinte ao da alta), o capital de remição da pensão anual de €928,21.

Inconformado, o Réu recorreu, tendo formulado as seguintes conclusões:
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A Recorrida contra-alegou tendo formulado as seguintes conclusões:
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Por despacho da ora relatora foi determinada a baixa dos autos à 1ª instância pra fixação do valor da acção, na sequência do que veio o mesmo a ser fixado em €14.583,11.

Deu-se cumprimento ao disposto no art. 657º, nº 2, 1ª parte, do CPC.
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II. Decisão da matéria de facto:
A) Na sentença recorrida foi dada como provada a seguinte factualidade:
Factos provados:
1. Mediante contrato de trabalho em funções públicas, por tempo indeterminado, a Autora desempenha as funções de enfermeira, sobre as ordens, direcção e fiscalização da Ré.
2. No dia 18-03-2012, no trajecto da sua residência para o Hospital, com vista à sua prestação de trabalho, a Autora sofreu um acidente de viação, na zona ..., com despiste da viatura e consequente embate.
3. Desse embate resultaram lesões na coluna vertical e costela esquerda.
4. Em sede de exame realizado no INML, apurou-se que, como consequência directa e necessária do aludido acidente, a Autora sofreu as lesões descritas e examinadas no Relatório Pericial de fls. 40/42, concretamente, na ráquis “contractura da musculatura paravertebral esquerda”.
5. Concluiu-se ainda que: “Os elementos disponíveis permitem admitir o nexo de causalidade entre o traumatismo e o dano atendendo a que: existe adequação entre a sede do traumatismo e a sede do dano corporal resultante, existe continuidade sintomatológica eadequação temporal entre o traumatismo e o dano corporal resultante, o tipo de lesões é adequado a uma etiologia traumática, o tipo de traumatismo é adequado a produzir este tipo de lesões.”
6. E fixou-se a data da consolidação médico-legal das lesões em 04-12-2012, tendo em conta a data da alta clinica atribuída pela Junta Médica da ADSE.
7. As lesões sofridas determinaram à Autora:
- Incapacidade Temporária Absoluta (ITA) desde 19-03-2012 até 16-08-2012, num período de 151 dias,
- Incapacidade Temporária Parcial (ITP) de 20%, desde 17-08-2012 até 04-12-2012, num período de 110 dias.
8. E, ainda, uma incapacidade parcial e permanente (IPP) de 5%.
9. Em 2012, como contrapartida pelo trabalho prestado, a Autora auferia a retribuição anual de €26.520,28, assim, repartida:
- €1.369,03 x 14 de retribuição base;
- 4,27x22x11 de subsídio de refeição;
- 526,71x12 de média mensal de outras retribuições.
10. A Ré não tinha a responsabilidade pelos danos emergentes de acidentes de trabalho da sua funcionária transferida para qualquer entidade seguradora.
11. A Autora encontra-se paga de todas as indemnizações devidas até à data da alta.
Factos não provados: (com interesse à decisão)
Não há.”.
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B) Encontrando-se assente por acordo das partes nos articulados (vinculação entre A. e Réu por contrato de trabalho em funções públicas) e por prova documental/recibos de remunerações (inscrição da A. na Caixa Geral de Aposentações e na ADSE), tem-se ainda como assente o seguinte:
12. Entre a A e o Réu vigora um contrato de trabalho em funções públicas.
13. A A. encontra-se inscrita na Caixa Geral de Aposentações e na ADSE.
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III. Do Direito

III. Fundamentação do Direito

1. Salvas as matérias de conhecimento oficioso, o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões formuladas pelo recorrente, não sendo lícito ao tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas (arts. 635, nº 4, e 639º, nº 1, do CPC aprovado pela Lei 41/2013, de 26.06, aplicável ex vi do art. 1º, nº 2, al. a), do CPT aprovado pelo DL 295/2009, de 13.10).
Assim, importa apreciar da questão da incompetência material do Tribunal do Trabalho.

2. Da incompetência material do Tribunal do Trabalho

Na decisão recorrida considerou-se ser o Tribunal do Trabalho o materialmente competente, para tanto referindo-se o seguinte:
“Estando assente por acordo que no dia 18/03/2012 a Autora sofreu um acidente enquanto prestava trabalho por conta e ordem do Réu, caracterizado como acidente de trabalho, que o Réu não nega, e do qual resultaram lesões que lhe determinaram incapacidades para o trabalho, a questão a decidir é se são os Juízos de Trabalho os competentes para a presente acção.
Nos termos do disposto no art.º 126.º, n.º 1, al. c) da Lei da Organização do Sistema Judiciário, os Juízos de Trabalho têm competência, em matéria cível para conhecer das questões emergentes de acidentes de trabalho e doenças profissionais.
Por sua vez decorre do disposto no art.º 4.º n.º 4, al. b) da Lei n.º 13/2002 de 19/02 (ETAF) que são da competência dos Tribunais Administrativos os litígios emergentes do vínculo de emprego público.
Cumpre, então apreciar se o regime de reparação do acidente de que sofreu a Autora é o previsto na Lei n.º 98/2009 de 04/09 (LAT), ou antes o previsto no D.L. n.º 503/99 de 20/11 (na redacção mais recente, do DL n.º 33/2018 de 15/05), que estabelece o regime dos acidentes sofridos por trabalhadores que exercem funções públicas.
Nos termos do disposto no art.º 2.º deste diploma:
1- O disposto no presente decreto-lei é aplicável a todos os trabalhadores que exercem funções públicas, nas modalidades de nomeação ou de contrato de trabalho em funções públicas, nos serviços da administração direta e indireta do Estado.
2- (…)
3– (…)
4- Aos trabalhadores que exerçam funções em entidades públicas empresariais ou noutras entidades não abrangidas pelo disposto nos números anteriores é aplicável o regime de acidentes de trabalho previsto no Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto, devendo as respetivas entidades empregadoras transferir a responsabilidade pela reparação dos danos emergentes de acidentes de trabalho nos termos previstos naquele Código.
Por outro lado, o art.º 4º nº 5 da Lei nº 35/2014 de 20/06, com a alteração da Lei n.º 73/2017 de 16/08 - Lei Geral do Trabalho em Funções Publicas (LGTFP) - dispõe: “5 - O regime do Código do Trabalho e legislação complementar, em matéria de acidentes de trabalho e doenças profissionais, é aplicável aos trabalhadores que exercem funções públicas nas entidades referidas nas alíneas b) e c) do n.º 1 do artigo 2.º”, ou seja, entidades públicas empresariais (al. b) do n.º 1 do art.º 2.º).
Anote-se que este art.º 4.º, n.º 5 da LGTFP apenas remete para as entidades referidas nas alíneas b) e c) do seu artigo 2.º, e não para todo o conteúdo deste artigo, como parece entender o Réu, e que, assim, excluiria estas entidades da aplicação do regime do Código do Trabalho e legislação complementar, em matéria de acidentes de trabalho e doenças profissionais. Porém, ao invés, o legislador foi expresso em remeter apenas para as “...entidades referidas nas alíneas b) e c) do n.º 1 do artigo 2.º” de onde se conclui que foi intenção do legislador abranger estas entidades pelo regime do Código do Trabalho e legislação complementar, em matéria de acidentes de trabalho e doenças profissionais.
Por fim, a Lei n.º 18/2017 de 10/02, que, além do mais, estabelece os princípios e regras aplicáveis às unidades de saúde que integram o Serviço Nacional de Saúde com a natureza de entidade pública empresarial, no Capítulo II, a propósito das Entidades Públicas Empresariais, estabelece no 31.º, sob epígrafe “Regime de proteção social”:
“1 - Sem prejuízo do disposto no n.º 1 do artigo 29.º, o regime de proteção social dos trabalhadores das E. P. E., integradas no SNS é o regime geral da segurança social.
“2 - Relativamente aos trabalhadores que, nos termos do artigo 29.º, não tenham optado pelo regime do contrato de trabalho e que, mantenham o regime de proteção social convergente (RPSC), as E. P. E., integradas no SNS asseguram o pagamento das contribuições a título de entidade empregadora, para a Caixa Geral de Aposentações, I. P., e para a ADSE, quando aplicável.
“3 - Ao pessoal previsto no número anterior integrado no RPSC é aplicável o Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de novembro, bem como no Decreto-Lei n.º 118/83, de 20 de novembro, para os organismos dotados de autonomia administrativa e financeira.”
Decorre deste regime que, aos trabalhadores que mantenham o regime de protecção social convergente (RPSC), assegurando as E. P. E., o pagamento das contribuições a título de entidade empregadora, para a Caixa Geral de Aposentações, I. P., e para a ADSE, quando aplicável, é aplicável o Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de Novembro, bem como no Decreto-Lei n.º 118/83, de 20 de Novembro, para os organismos dotados de autonomia administrativa e financeira.
Assim, no caso dos autos, sendo a Sinistrada subscritora da Caixa Geral de Aposentações e beneficiária da ADSE, é-lhe aplicável o Decreto-Lei n.º 503/99, de 20/11 que, como vimos, no n.º 4 do art.º 2.º remete, quanto ao regime de acidentes de trabalho, para o regime previsto no Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 99/2003, de 27/08.
E como se refere no Acórdão do Tribunal de relação do Porto de 02/05/2016 (Proc. nº 31/14.3T8PNF), também citado pela Digníssima Senhora Procuradora da Republica:
Se o próprio DL 503/99 estabelece a distinção, expressamente, entre empregadores, digamos assim, integrados na administração indireta do Estado e entidades públicas empresariais – confronto do nº 1 com o nº 4 do artigo 2º ora transcrito – se o objetivo da criação de entidades públicas empresariais, convertendo anteriores hospitais públicos, é a gestão racionalizada e se esta inclui ou envolve a aplicação do regime regra do contrato de trabalho, se é o próprio diploma que cria o Réu que estabelece a aplicação deste regime, então não é possível, salvo melhor opinião e com o devido respeito, sob pena de frustração dos intuitos do legislador, entender que os Centros Hospitalares integram a administração indireta do Estado para o efeito de, no tocante à definição legal da proteção infortunística, se subsumirem ao nº 1 do citado artigo 2º do DL 503/99 e não ao nº 4 do mesmo preceito, que expressamente os prevê. Ou, melhor dizendo, ainda que teoricamente tais Centros integrem a administração indireta do Estado, ainda que a relação seja de emprego público, a verdade é que, havendo previsão expressa – referido nº 4 – há-de obedecer-se a ela, e portanto entender que os acidentes sofridos por trabalhadores ao serviço de entidades públicas empresariais, estão sujeitos à proteção infortunística laboral.”
Conclui-se, pois, serem os Juízos de Trabalho os competentes para conhecer dos acidentes sofridos por trabalhadores ao serviço de entidades públicas empresariais, sendo este Juízo de Trabalho materialmente competente para tal.”
Do assim decidido discorda o Recorrente. Pela manutenção do decidido pugna a Recorrida. Ambas as partes invocam jurisprudência em sustentação das suas posições.

2.1. Aos 01.09.2014, entrou em vigor a nova Lei da Organização do Sistema Judiciário, aprovada pela Lei 62/2013, de 26.08[1], que revogou as Leis 3/99, de 13.01 e 52/2008 (arts. 1.º a 159.º da Lei n.º 52/2008, de 28 de agosto, na parte em que aprova a Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais) e entrou em vigor aos 01.09.2014 (cfr. arts. 188º, nº 1, da Lei 62/2013 e 118º do DL 49/2014, de 27.03), e em cujos arts. se dispõe que:
- Art. 38º, nº 1: “1 - A competência fixa-se no momento em que a ação se propõe, sendo irrelevantes as modificações de facto que ocorram posteriormente, a não ser nos casos especialmente previstos na lei.”;
- Art. 126º: “1 - Compete aos juízos do trabalho conhecer, em matéria cível: (…) c) Das questões emergentes de acidentes de trabalho e doenças profissionais;”
Por sua vez, no art. 4º, nº 4, al. b), da Lei 13/2002, 19.02 (ETAF), determina-se que: “4. Estão igualmente excluídas do âmbito da jurisdição administrativa e fiscal: (…); b) A apreciação de litígios decorrentes de contratos de trabalho, ainda que uma das partes seja uma pessoa coletiva de direito público, com exceção dos litígios emergentes do vínculo de emprego público;”.

- O art. 2º, nº 4, do DL 503/99, de 20.11[2], que estabelece o regime jurídico dos acidentes em serviço e das doenças profissionais no âmbito da Administração pública [na redacção introduzida pela Lei 59/2008], dispõe que: “4 - Aos trabalhadores que exerçam funções em entidades públicas empresariais ou noutras entidades não abrangidas pelo disposto nos números anteriores é aplicável o regime de acidentes de trabalho previsto no Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto, devendo as respectivas entidades empregadoras transferir a responsabilidade pela reparação dos danos emergentes de acidentes de trabalho nos termos previstos naquele Código.”.
Na Lei 12-A/2008, de 27.02, que estabelecia os regimes de vinculação de carreiras e de remunerações dos trabalhadores que exercem funções públicas, dispunha-se no art. 3º, nº 5, que “5. Sem prejuízo do disposto no nº 2 do artigo anterior, a presente lei não é aplicável às entidades públicas empresariais nem (…)”, sendo que no nº 2 do art. 2º, se determinava que “2 - A presente lei é também aplicável, com as necessárias adaptações, aos actuais trabalhadores com a qualidade de funcionário ou agente de pessoas colectivas que se encontrem excluídas do seu âmbito de aplicação objectivo.”
A referida Lei 12-A/2008 foi revogada pela actual Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (LGTFP), aprovada pela Lei 35/2014, de 20.06[3], na qual se dispõe que:
No art. 2º, nº 1, al. a) [na sua redacção original e que se manteve nas redacções posteriores]: “1. A presente lei não é aplicável a: Gabinetes de apoio dos membros do Governo e dos titulares dos órgãos referidos nos nºs 2 a 4 do artigo anterior; b) Entidades públicas empresariais; c) Entidades administrativas independentes com funções de regulação da actividade económica dos sectores privado, público e cooperativo e Banco de Portugal.
No art. 4º, nº 4 [na sua redacção original], que: “4. O regime do Código do Trabalho e legislação complementar, em matéria de acidentes de trabalho e doenças profissionais, é aplicável aos trabalhadores que exercem funções públicas nas entidades referidas nas alíneas b) e c) do nº 1 do artigo 2º”, preceito este que, com a Lei 25/2017, transitou para o nº 5 do mesmo, com idêntica redacção.
De referir que, nos termos do artº 9º, nº 1, da Lei 35/2014, referente à sua aplicação no tempo, “1 - Ficam sujeitos ao regime previsto na LTFP aprovada pela presente lei os vínculos de emprego público e os instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho constituídos ou celebrados antes da sua entrada em vigor, salvo quanto a condições de validade e a efeitos de factos ou situações totalmente anteriores àquele momento.”.
Ora, tendo em conta o art. 9º da citada Lei 35/2014 e, bem assim, que o acidente de trabalho ora em apreço nos autos ocorreu aos 18.03.2012, sendo que a alta definitiva se verificou aos 04.12.2012 e a participação a juízo do mesmo, com a qual se considera instaurada a acção (cfr. 26º, nº 4, do CPT), temos que, em matéria de vigência no tempo, ao caso é aplicável a Lei 62/2013 e a Lei 12-A/2008 (e não já a Lei 35/2014, de 20.06), para além da aplicabilidade do DL 503/99.

2.2. A questão de saber se, em matéria de acidentes de trabalho sofridos por trabalhador de unidade hospitalar com a natureza de EPE que não haja optado pelo contrato individual de trabalho, é dos tribunais do trabalho ou da jurisdição administrativa, não é nova, tendo já sido objecto de decisão por parte do Tribunal de Conflitos, designadamente nos seus Acórdãos de 19.01.2017, Processo 010/16 e de 06.02.2014.Processo 024/12, bem como pelo Supremo Tribunal de Justiça, no seu Acórdão de 17.11.2016, Processo 31/14.3T8PNF.P1.S1, que aliás revogou o Acórdão desta Relação de 02.05.2016, citado pela Recorrida, todos publicados in www.dgsi.pt, em que se pronunciaram no sentido da competência da jurisdição administrativa.
Assim, refere-se no sumário do Acórdão de 19.01.2017 do Tribunal de Conflitos que:
“I - O Centro Hospitalar C..., EPE, é uma pessoa coletiva pública integrada na administração indireta do Estado, estando os trabalhadores que nele exercem funções públicas sujeitos, à data dos factos, à disciplina do DL n.º 503/99, de 20.11.
II - Nessa medida, pertence aos tribunais administrativos a competência para dirimir litígio respeitante à aplicação daquele DL a acidente de trabalho que vitimou trabalhadores nele exercem funções públicas.”.
E, bem assim, no sumário desse mesmo Tribunal de 06.02.2014:
“I - O Centro Hospitalar D..., EPE, é uma pessoa colectiva pública integrada na administração indirecta do Estado, estando os trabalhadores que nele exercem funções públicas sujeitos à disciplina do D.L. nº 503/99, de 20 de Novembro.
II - Por isso, os competentes para julgar uma acção administrativa interposta por um destes trabalhadores contra aquele por virtude da incapacidade resultante de um acidente sofrido no exercício de funções, são os tribunais administrativos.”
No sumário do citado Acórdão do STJ de 17.11.2016 diz-se que:
“1 – Os trabalhadores com vínculo de natureza pública aos estabelecimentos hospitalares a que foi atribuído o estatuto de EPE, nos termos dos Decretos Lei n.º 326/2007, de 28 de setembro e n.º 233/2005, de 29 de dezembro, caso não tenham optado pelo contrato de trabalho de direito privado, mantêm o vínculo de natureza pública, com a conservação integral do respetivo estatuto, nos termos do artigo 15.º do último daqueles diplomas.
2 – O estatuto dos trabalhadores com vínculo de natureza pública previsto no número anterior engloba o regime de proteção dos acidentes em serviço decorrente do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de novembro, na redação emergente da Lei n.º 59/2008, de 11 de setembro.
3 – Incumbe aos tribunais da jurisdição administrativa, nos termos do artigo 4.º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, aprovado pela Lei n.º 13/2002 de 17 de fevereiro, o conhecimento de litígio derivado de acidente em serviço sofrido por trabalhador ao serviço de Hospital EPE, com vínculo de natureza pública e que não optou pelo contrato de trabalho de direito privado.”
E, na fundamentação deste aresto, do STJ, refere-se, para além do mais, o seguinte:
“1 - Está em causa no presente processo a interpretação dos n.ºs 1 e 4 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de novembro, na redação resultante da Lei n.º 59/2008, de 11 de setembro.
A decisão da 1.ª instância, apoiando-se no n.º 1 daquele artigo e na integração do Réu na administração indireta do Estado, considerou que o acidente sofrido pela autora deveria ser considerado como um acidente em serviço, nos termos daquele diploma, e como tal deveriam ser os tribunais da jurisdição administrativa a conhecer do litígio.
A decisão recorrida, sem pôr em causa a integração do Réu na administração indireta do Estado, considerou que natureza de entidade pública empresarial, nos termos do n.º 4 daquele artigo, arrastava a integração do acidente dos autos no regime de direito privado emergente do Código do Trabalho e respetiva legislação complementar, pelo que, em coerência, deveriam ser os tribunais judiciais a conhecer do litígio.
2 – Resulta dos autos que a Autora desempenhava, na data do acidente, as suas funções para o Réu a coberto de um contrato de trabalho em funções públicas e que era subscritora da Caixa Geral de Aposentações desde janeiro de 1983, tendo transitado para aquele vínculo do anterior regime de vinculação dos trabalhadores que desempenhavam funções públicas.
A Lei n.º 59/2008, de 11 de setembro, aprovou o Regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas, em sintonia com o regime dos vínculos dos trabalhadores que desempenham funções públicas, resultante da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro, que disciplinou os regimes de vinculação, de carreiras e de remunerações dos trabalhadores que exercem funções públicas.
É sabido que este diploma rompeu com o modelo tradicional de vinculação daqueles trabalhadores, estabelecendo no seu artigo 9.º, basicamente, duas novas categorias de vínculo: - a nomeação e o contrato de trabalho em funções públicas. É prevista ainda, nos termos do n.º 3 deste artigo, a comissão de serviço como forma de vinculação, que, contudo, não releva no âmbito deste processo.
No artigo 10.º deste diploma define-se o âmbito do regime de nomeação e no artigo 20.º estabelece-se o do contrato de trabalho em funções públicas, este por exclusão de partes, ou seja, ficariam sujeitos a esse regime os trabalhadores que não fossem vinculados por nomeação, ou em comissão de serviço.
Nos termos do seu artigo 98.º aquela Lei impôs a transição para o regime de contrato de trabalho em funções públicas aos trabalhadores que não se integrassem no âmbito do regime de nomeação acima referido, enquanto os demais mantinham o regime de nomeação previsto da nova lei.
O modelo emergente deste diploma veio a consolidar-se com a Lei n.º 59/2008, de 11 de setembro, que estabeleceu o Regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas.
2.1 - A Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro, definiu o seu âmbito de aplicação nos artigos 2.º e 3.º que são do seguinte teor:
«Artigo 2.º
Âmbito de aplicação subjetivo
1 - A presente lei é aplicável a todos os trabalhadores que exercem funções públicas, independentemente da modalidade de vinculação e de constituição da relação jurídica de emprego público ao abrigo da qual exercem as respetivas funções.
2 - A presente lei é também aplicável, com as necessárias adaptações, aos atuais trabalhadores com a qualidade de funcionário ou agente de pessoas coletivas que se encontrem excluídas do seu âmbito de aplicação objetivo.
3 - Sem prejuízo do disposto nas alíneas a) e e) do artigo 10.º, a presente lei não é aplicável aos militares das Forças Armadas e da Guarda Nacional Republicana, cujos regimes de vinculação, de carreiras e de remunerações constam de leis especiais.
4 – (…).»
«Artigo 3.º
Âmbito de aplicação objetivo
1 - A presente lei é aplicável aos serviços da administração direta e indireta do Estado.
2 - A presente lei é também aplicável, com as necessárias adaptações, designadamente no que respeita às competências em matéria administrativa dos correspondentes órgãos de governo próprio, aos serviços das administrações regionais e autárquicas.
3 - A presente lei é ainda aplicável, com as adaptações impostas pela observância das correspondentes competências, aos órgãos e serviços de apoio do Presidente da República, da Assembleia da República, dos tribunais e do Ministério Público e respetivos órgãos de gestão e de outros órgãos independentes.
4 – (…).
5 - Sem prejuízo do disposto no n.º 2 do artigo anterior, a presente lei não é aplicável às entidades públicas empresariais nem aos gabinetes de apoio quer dos membros do Governo quer dos titulares dos órgãos referidos nos n.ºs 2 e 3.»
De acordo com o disposto no n.º 1 do artigo 2.º, o regime de vínculos consagrado seria aplicável «a todos os trabalhadores que exercem funções, independentemente da modalidade de vinculação e de constituição da relação jurídica de emprego público ao abrigo da qual exercem as respetivas funções» e, nos termos do n.º 2 do mesmo dispositivo, aquele regime seria igualmente aplicável «aos atuais trabalhadores com a qualidade de funcionário ou agente de pessoas coletivas que se encontrem excluídas do seu âmbito de aplicação objetivo», que é definido no artigo 3.º.
Por outro lado, nos termos do n.º 1 deste artigo 3.º, o regime estabelecido é aplicável aos serviços da administração direta e indireta do Estado e nos termos do n.º 5 do mesmo artigo, «sem prejuízo do disposto no n.º 2 do artigo anterior, a presente lei não é aplicável às entidades públicas empresariais …».
Resulta, em síntese, destes dispositivos que os trabalhadores que tinham o estatuto de funcionários públicos e que se encontravam ao serviço de entidades públicas empresariais transitaram para o regime do contrato de trabalho em funções públicas, apesar de o novo regime de vinculação não ser aplicável a essas entidades, onde o regime de trabalho regra era o do contrato de trabalho de direito privado, tal como resultava dos artigos 16.º e 23.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º DL n.º 558/99, de 17 de dezembro, que estabelecia o regime jurídico do setor empresarial do Estado e das empresas públicas e que veio a ser substituído pelo Decreto-lei n.º 133/2013, de 3 de outubro.
3 – O Réu Centro Hospitalar do ..., EPE foi criado pelo Decreto-Lei n.º 326/2007, de 28 de setembro, que, para além do mais, aprovou os respetivos estatutos.
O artigo 5.º daquele diploma consagra algumas das linhas do regime jurídico das entidades criadas, sendo do seguinte teor:
«Artigo 5.º
Regime aplicável
1 - Às entidades públicas empresariais criadas pelo presente decreto-lei aplica-se, com as necessárias adaptações, o regime jurídico, financeiro e de recursos humanos, constante dos capítulos II, III e IV do Decreto-Lei n.º 233/2005, de 29 de dezembro.
2 - A aplicação do capítulo IV do Decreto-Lei n.º 233/2005, de 29 de dezembro, ao pessoal de todos os hospitais E. P. E. com relação jurídica de emprego público não prejudica a aplicação das regras gerais de mobilidade e racionalização de efetivos em vigor para os funcionários e agentes da Administração, designadamente as constantes da Lei n.º 53/2006, de 7 de dezembro, e do Decreto-Lei n.º 200/2006, de 25 de outubro, com as necessárias adaptações.»
Em síntese, resulta deste artigo que o regime de recursos humanos imposto ao Réu é o que resulta do Decreto-Lei n.º 233/2005, de 29 de dezembro, e, por força do n.º 2 do mesmo artigo, a aplicação daquele regime «ao pessoal de todos os hospitais EPE com relação jurídica de emprego público» não prejudica a aplicação a estes trabalhadores do regime da mobilidade e racionalização de efetivos referido naquele dispositivo.
O artigo 14.º do Decreto-Lei n.º 233/2005, de 29 de dezembro, define o regime de pessoal das EPE no âmbito da saúde, nos seguintes termos:
«Artigo 14.º
Regime de pessoal
1- Os trabalhadores dos hospitais E. P. E. estão sujeitos ao regime do contrato de trabalho, de acordo com o Código do Trabalho, demais legislação laboral, normas imperativas sobre títulos profissionais, instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho e regulamentos internos.
2 - Os hospitais E. P. E. devem prever anualmente uma dotação global de pessoal, através dos respetivos orçamentos, considerando os planos de atividade.
3- Sem prejuízo do disposto no n.º 4 do artigo 15.º, os hospitais E. P. E. não podem celebrar contratos de trabalho para além da dotação referida no número anterior.
4 - Os processos de recrutamento devem assentar na adequação dos profissionais às funções a desenvolver e assegurar os princípios da igualdade de oportunidades, da imparcialidade, da boa fé e da não discriminação, bem como da publicidade, exceto em casos de manifesta urgência devidamente fundamentada.»
Coerentemente com o regime geral das EPE, este artigo consagra como regime geral do trabalho no âmbito destas EPE o do contrato de trabalho de direito privado, estabelecendo o artigo 15.º o regime de transição do pessoal como relação jurídica de emprego público para as novas EPE, sendo do seguinte teor:
«Artigo 15.º
Regime transitório do pessoal com relação jurídica de emprego público
1 - O pessoal com relação jurídica de emprego público que, à data da entrada em vigor do presente decreto-lei, esteja provido em lugares dos quadros das unidades de saúde abrangidas pelo artigo 1.º, bem como o respetivo pessoal com contrato administrativo de provimento, transita para os hospitais E. P. E. que lhes sucedem, sendo garantida a manutenção integral do seu estatuto jurídico, sem prejuízo do disposto no Decreto- Lei n.º 193/2002, de 25 de setembro.
2 - Mantêm-se com caráter residual os quadros de pessoal das unidades de saúde referidas no número anterior, exclusivamente para efeitos de acesso dos funcionários, sendo os respetivos lugares a extinguir quando vagarem, da base para o topo.
3 - Mantêm-se válidos os concursos de pessoal pendentes e os estágios e cursos de especialização em curso à data da entrada em vigor do presente decreto-lei.
4 - O pessoal a que se refere o presente artigo pode optar a todo o tempo pelo regime do contrato de trabalho nos termos dos artigos seguintes.»
Analisado o regime decorrente destes dois artigos, constata-se que se estabelece o regime do contrato de trabalho de direito privado para os trabalhadores que venham a ser contratados, coerentemente, com a disciplina que resulta do regime das EPE.
Já relativamente aos trabalhadores, que, de acordo com o regime acima referido, se mantiveram no âmbito do regime de contrato de trabalho em funções públicas, o artigo 15.º estabelece que «transita[m] para os hospitais EPE (…), sendo garantida a manutenção integral do seu estatuto jurídico, sem prejuízo do disposto no Decreto-lei n.º 193/2002, de 25 de setembro».
Em síntese, todos os trabalhadores que se encontravam vinculados aos estabelecimentos hospitalares por uma relação jurídica de emprego público mantinham integralmente o respetivo estatuto jurídico, apesar de vinculados às novas entidades EPE, consagrando-se, contudo, a possibilidade de os mesmos virem a optar pelo regime do contrato de trabalho de direito privado, opção que não releva no caso dos autos, por a Autora não ter optado por tal regime.
A garantia da manutenção integral do estatuto projeta-se no regime dos acidentes em serviço que está na base do litígio a resolver no presente processo.
Mas, coerentemente com esta disciplina, o artigo 19.º consagra as bases do regime de proteção social dos trabalhadores ao serviço das novas entidades hospitalares, nos seguintes termos:
«Artigo 19.º
Regime de proteção social
1 - Sem prejuízo do disposto no n.º 1 do artigo 15.º, no n.º 1 do artigo 17.º e no n.º 1 do artigo anterior, o regime de proteção social dos hospitais E. P. E. é o regime geral da segurança social.
2 - Relativamente aos funcionários e agentes que não optem pelo regime do contrato de trabalho ou que, nos termos do número anterior, mantenham o regime de proteção social da função pública, os hospitais E. P. E. contribuem para o financiamento da Caixa Geral de Aposentações com a importância que se encontrar legalmente estabelecida para a contribuição das entidades empregadoras com autonomia administrativa e financeira.
3 - Os hospitais E. P. E. observam, relativamente ao pessoal referido no número anterior, o regime previsto no Decreto-Lei n.º 118/83, de 25 de fevereiro, e no Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de novembro, para os organismos dotados de autonomia administrativa e financeira.»
Em síntese, os trabalhadores que mantenham o vínculo jurídico de natureza pública conservam o regime de proteção social anterior, tal como resulta do n.ºs 2 e 3 deste artigo, mesmo no que se refere a acidentes em serviço.
4 – As alterações ao Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de novembro, decorrente da Lei n.º 59/2008, de 11 de setembro, surgem no contexto da implementação do regime do contrato de trabalho em funções públicas.
Na verdade, a Lei n.º 59/2008, de 11 de setembro, adaptou o âmbito de aplicação do regime dos acidentes em serviço ao novo regime dos vínculos, dando ao artigo 2.º daquele artigo a seguinte redação:
«Artigo 2.º
Âmbito de aplicação
1 - O disposto no presente decreto-lei é aplicável a todos os trabalhadores que exercem funções públicas, nas modalidades de nomeação ou de contrato de trabalho em funções públicas, nos serviços da administração direta e indireta do Estado.
2 - O disposto no presente decreto-lei é também aplicável aos trabalhadores que exercem funções públicas nos serviços das administrações regionais e autárquicas e nos órgãos e serviços de apoio do Presidente da República, da Assembleia da República, dos tribunais e do Ministério Público e respetivos órgãos de gestão e de outros órgãos independentes.
3 - O disposto no presente decreto-lei é ainda aplicável aos membros dos gabinetes de apoio quer dos membros do Governo quer dos titulares dos órgãos referidos no número anterior.
4 - Aos trabalhadores que exerçam funções em entidades públicas empresariais ou noutras entidades não abrangidas pelo disposto nos números anteriores é aplicável o regime de acidentes de trabalho previsto no Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 99/2003, de 27 de agosto, devendo as respetivas entidades empregadoras transferir a responsabilidade pela reparação dos danos emergentes de acidentes de trabalho nos termos previstos naquele Código.
5 - O disposto nos números anteriores não prejudica a aplicação do regime de proteção social na eventualidade de doença profissional aos trabalhadores inscritos nas instituições de segurança social.
6 - As referências legais feitas a acidentes em serviço consideram-se feitas a acidentes de trabalho.»
Da análise da nova redação deste artigo resulta evidente que o regime estabelecido é aplicável relativamente aos trabalhadores que exercem funções com vínculo de natureza pública, nos serviços da administração direta ou indireta do Estado
No que se refere aos trabalhadores que exercem funções em EPEs, ou noutras entidades públicas não abrangid[o]s pelos números anteriores, de acordo com o disposto no n.º 4, «é aplicável o regime de acidentes de trabalho previsto no Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 99/2003, de 27 de agosto, devendo as respetivas entidades empregadoras transferir a responsabilidade pela reparação dos danos emergentes de acidentes de trabalho nos termos previstos naquele Código».
Esta norma está claramente direcionada para os trabalhadores das EPE em regime de contrato de trabalho de direito privado, em relação aos quais o regime de proteção relativo a acidentes em serviço é o que resulta do Código do Trabalho, hoje o Código de Trabalho de 2009, e da Lei n.º 98/2009, de 4 de setembro.
A norma daquele n.º 4 não pode ser interpretada no sentido de retirar os trabalhadores das EPE da saúde com relação jurídica de emprego público, do regime da proteção dos acidentes em serviço, que é parte integrante do seu estatuto, conforme acima se referiu.
Na verdade tal interpretação colide diretamente com o teor do n.º1 deste artigo e com o facto de as entidades empresariais em causa integrarem a administração indireta do Estado, mas acima de tudo, com as normas específicas das EPE da saúde acima referidas e que garantiram àqueles trabalhadores a manutenção integral do respetivo estatuto.
A norma daquele n.º 4 do artigo 2.º do Decreto-lei n.º 503/99, de 20 de novembro, não poderá ser lida fora do contexto do regime jurídico concreto que enquadra os trabalhadores que desempenham funções públicas, nomeadamente, no âmbito das entidades públicas empresariais, uma vez que é parte integrante da unidade de sistema que caracteriza o regime jurídico de prestação de trabalho destes trabalhadores.
Tal interpretação colidiria com os princípios em termos de hermenêutica jurídica, violando, claramente, o disposto no n.º 1 do artigo 9.º do Código Civil, que impõe que «a interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico» conduzindo ao absurdo de impor a trabalhadores que têm um relação de trabalho de natureza pública um regime de proteção de acidentes em serviço de direito privado.
Acresce que a atribuição do estatuto de EPE aos hospitais, conforme bem se considerou no acórdão do Tribunal de Conflitos acima referido, não retirou os hospitais do âmbito da administração indireta do Estado e não pôs em causa a sua natureza de pessoas coletivas públicas, pelo que os trabalhadores ao serviço destes, com vínculo de natureza pública, sempre serão abrangidos pelo n.º 1 do referido artigo 2.º do Decreto-Lei n,º 503/99, de 20 de novembro.
IV
1 - Resulta do artigo 211.º, n.º 1, da Constituição da República (CRP), que os tribunais judiciais são os tribunais comuns em matéria cível e criminal e exercem jurisdição em todas as áreas não atribuídas a outras ordens judiciais.
No âmbito dos tribunais judiciais, incumbe às Secções do Trabalho das Instâncias Centrais dos Tribunais de Comarca, nos termos do artigo 126.º da Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto - Lei da Organização do Sistema Judiciário - conhecer em matéria cível dos litígios emergentes de relação de trabalho subordinado, nomeadamente, «b) das questões emergentes de relações de trabalho subordinado e de relações estabelecidas com vista à celebração de contratos de trabalho».
Decorre, igualmente, da alínea n) deste artigo, que compete àquelas secções o julgamento «n) das questões entre sujeitos de uma relação jurídica de trabalho ou entre um desses sujeitos e terceiros, quando emergentes de relações conexas com a relação de trabalho, por acessoriedade, complementaridade ou dependência, e o pedido se cumule com outro para o qual o juízo seja diretamente competente».
Por outro lado, resulta do artigo 212.°, n.º 3, da Constituição da República, que compete aos Tribunais Administrativos e Fiscais o julgamento das ações e recursos contenciosos que tenham por objeto dirimir os «litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais».
A competência dos Tribunais Administrativos e Fiscais veio a ser concretizada no artigo 4.º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, aprovado pela Lei n.º 13/2002 de 17 de fevereiro, no quadro das normas constitucionais acimas citadas, reafirmando-se no n.º 1 do artigo 1.º daquele diploma que «os tribunais da jurisdição administrativa e fiscal são os órgãos de soberania com competência para administrar a justiça em nome do povo nos litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais».
Na determinação do conteúdo do conceito de relação jurídico administrativa ou fiscal, tal como referem J.J. GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, deve ter-se presente que «esta qualificação transporta duas dimensões caracterizadoras: (1) as ações e recursos incidem sobre relações jurídicas em que, pelo menos um dos sujeitos é titular, funcionário ou agente de um órgão de poder público (especialmente da administração); (2) as relações jurídicas controvertidas são reguladas, sob o ponto de vista material, pelo direito administrativo ou fiscal. Em termos negativos, isto significa que não estão aqui em causa litígios de natureza «privada» ou «jurídico civil». Em termos positivos, um litígio emergente de relações jurídico administrativas e fiscais será uma controvérsia sobre relações jurídicas disciplinadas por normas de direito administrativo e/ou fiscal».
Coerentemente com o conceito de relação jurídico administrativa, assumida como critério orientador na definição da competência da jurisdição administrativa, nos termos do n.º 3 alínea d) do artigo 4.º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, na sua versão original, esclareceu-se desde logo que estava excluída daquela jurisdição a «apreciação dos litígios emergentes de contratos individuais de trabalho, que não conferem a qualidade de agente administrativo, ainda que uma das partes seja pessoa coletiva de direito público».
No quadro constitucional, a Lei n.º 12 –A/2008, de 27 de fevereiro, no seu artigo 83.º, n.º 1, que aprovou «os regimes de vinculação, de carreiras e de remunerações dos trabalhadores que exercem funções públicas, veio precisar que «os tribunais da jurisdição administrativa e fiscal são os competentes para apreciar os litígios emergentes das relações jurídicas de emprego público».
A Lei n.º 59/2008, de 11 de setembro, que aprovou o Regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas, em coerência com a competência delineada para os Tribunais Administrativos e Fiscais veio através do seu artigo 10.º alterar o Estatuto daqueles Tribunais passando a prever no seu artigo 4.º, n.º 3, que «ficam igualmente excluídas do âmbito da jurisdição administrativa e fiscal: d) A apreciação de litígios emergentes de contratos individuais de trabalho, ainda que uma das partes seja uma pessoa coletiva de direito público, com exceção dos litígios emergentes de contratos de trabalho em funções públicas», dispositivo que corresponde à alínea b) do n.º 4 do mesmo artigo, na versão resultante do Decreto-Lei n.º 214-G/2015, de 2 de outubro, em vigor.
À luz do acima referido, a relação jurídica que vincula a autora ao Réu enquadrava-se num contrato de trabalho em funções públicas disciplinado à época pelo regime dessa forma de vinculação em funções públicas aprovado pela Lei n.º 59/2008, de 11 de setembro, diploma que veio a ser revogado pela Lei n.º 35/2014, de 20 de junho, que aprovou a Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas.
Por outro lado, também à luz do acima referido, o acidente sofrido pela Autora deve ser considerado como um acidente em serviço, disciplinado pelo Decreto-lei n.º 503/99, de 20 de novembro.
O litígio a dirimir no presente processo deverá ser enquadrado pelo Direito Público, emergindo claramente de uma relação jurídico administrativa, pelo que a competência para conhecer do mesmo é dos Tribunais da Jurisdição Administrativa.”

2.3. Não vemos razões para discordar do entendimento sufragado pelos mencionados arestos, sendo que o caso em apreço nos autos é em tudo idêntico aos demais acima referidos.
O Réu, Centro Hospitalar ..., tem a natureza de entidade pública empresarial (EPE), tendo sido criado pelo DL 326/1007, de 28.09.2007 e em cujo art. 5º, nº 1, se determina também que “1 - Às entidades públicas empresariais criadas pelo presente decreto-lei aplica-se, com as necessárias adaptações, o regime jurídico, financeiro e de recursos humanos, constante dos capítulos ii, iii e iv do Decreto-Lei n.º 233/2005, de 29 de Dezembro.”.
E a A. encontra-se também vinculada ao Réu por contrato de trabalho em funções públicas, não tendo, pois, optado pelo regime do contrato individual de trabalho, e efectuando descontos para a Caixa Geral de Aposentações e ADSE, o que não é posto em causa pelas partes.
Importa, por fim, referir que a publicação, entretanto, do DL 18/2017, de 10.02, não afeta o entendimento acima preconizado, muito menos no caso dos autos.
Dispõe tal diploma, nos seus arts. 29º a 31º que:
Artigo 29.º
Regime transitório dos trabalhadores com vínculo de emprego público
1 - Os trabalhadores com vínculo de emprego público que, à data da entrada em vigor do presente decreto-lei, estejam providos em postos de trabalho dos mapas de pessoal das unidades de saúde a que se refere o presente capítulo, mantêm integralmente o seu estatuto jurídico, sem prejuízo do disposto na Lei n.º 35/2014, de 20 de junho.
2 - Os mapas de pessoal das unidades de saúde referidas no número anterior mantêm-se com caráter residual, exclusivamente para efeitos de desenvolvimento da carreira daqueles trabalhadores, sendo os respetivos postos de trabalho a extinguir quando vagarem, da base para o topo.
3 - Mantêm-se válidos os concursos de pessoal que estejam pendentes e os estágios e cursos de especialização em curso à data da entrada em vigor do presente decreto-lei.
4 - Os trabalhadores a que se refere o presente artigo podem optar a todo o tempo pelo regime do contrato de trabalho nos termos dos artigos seguintes.
Artigo 30.º
Opção pelo contrato de trabalho
A opção definitiva pelo regime do contrato de trabalho é feita, individual e definitivamente, mediante acordo escrito com o conselho de administração, tornando-se efetiva, para todos os efeitos legais, a cessação do vínculo de emprego público com a sua publicação no Diário da República, data em que o contrato de trabalho a celebrar com a E. P. E., integrada no SNS passa a produzir efeitos.
Artigo 31.º
Regime de proteção social
1 - Sem prejuízo do disposto no n.º 1 do artigo 29.º, o regime de proteção social dos trabalhadores das E. P. E., integradas no SNS é o regime geral da segurança social.
2 - Relativamente aos trabalhadores que, nos termos do artigo 29.º, não tenham optado pelo regime do contrato de trabalho e que, mantenham o regime de proteção social convergente (RPSC), as E.P.E., integradas no SNS asseguram o pagamento das contribuições a título de entidade empregadora, para a Caixa Geral de Aposentações, I.P., e para a ADSE, quando aplicável.
3 - Ao pessoal previsto no número anterior integrado no RPSC é aplicável o Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de novembro, bem como no Decreto-Lei n.º 118/83, de 20 de novembro, para os organismos dotados de autonomia administrativa e financeira.
Desde logo, tal diploma é posterior à data do acidente em causa nos autos, não afectando o estatuto da A. a essa data (de trabalhadora com vínculo de emprego público – contrato de trabalho em funções públicas) e o direito à reparação daí decorrente, para além de que o próprio diploma também continua a manter o estatuto já detido pelos trabalhadores com vínculo de emprego público que não hajam optado pelo regime do contrato individual de trabalho (art. 29º, nº 1).
E, por outro lado, veio no nº 3 do art. 31º esclarecer que ao pessoal a que se reporta o art. 29º integrado no regime de protecção social convergente, é aplicável o DL 503/99, de 20.11, ou seja, aplica-se-lhe o regime jurídico dos acidentes em serviço e das doenças profissionais no âmbito da Administração Pública.
Diga-se que se discorda do entendimento sufragado na decisão recorrida no sentido de que, por via da remissão operada pelo citado art. 31º, nº 3, para o DL 503/99, seria aplicável o art. 2º, nº 4, deste e, daí, que o regime dos acidentes de trabalho fosse o do Código do Trabalho [“4 - Aos trabalhadores que exerçam funções em entidades públicas empresariais ou noutras entidades não abrangidas pelo disposto nos números anteriores é aplicável o regime de acidentes de trabalho previsto no Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto, devendo as respectivas entidades empregadoras transferir a responsabilidade pela reparação dos danos emergentes de acidentes de trabalho nos termos previstos naquele Código.”].
Desde logo, se fosse essa a intenção do legislador, a remissão seria feita especificadamente para o art. 2º, nº 4, e não, de modo genérico, para todo o diploma. Se se pretendesse aplicar, apenas, o nº 4 desse art. 2º, a técnica legislativa razoável e adequada seria remeter, apenas, para essa norma, não fazendo qualquer sentido remeter para todo o diploma, havendo-se que presumir que o legislador soube exprimir o seu pensamento em termos adequados (art. 9º, nº 3, do Cód. Civil).
Por outro lado, com tal remissão, nos termos em que se encontra feita, pretendeu o legislador, precisamente, remeter para o todo o regime substantivo constante do DL 503/99, esclarecendo que aos trabalhadores das entidades públicas empresariais que integram o SNS que mantenham, nos termos do art. 29º, tal vínculo e o regime de protecção social convergente se aplica, em matéria de acidentes de trabalho, não o regime do Código do Trabalho, mas sim o regime do citado DL 503/99 em consonância com o seu estatuto de trabalhador com vínculo de emprego público (contrato de trabalho em funções públicas). E é este o caso da A., que mantém o contrato de trabalho em funções públicas, efectuando descontos para a CGA e para a ADSE.

Face ao referido, deverá julgar-se procedente a exceção dilatória da incompetência, em razão da matéria, do Tribunal do Trabalho por serem os Tribunais da Jurisdição Administrativa os materialmente competentes e, em consequência, revogar-se a decisão e sentença recorrida, absolvendo-se o Réu da instância – arts. 96º, al. a), 99º, nº 1, 576º, nº 2 e 577º, al. a), todos do CPC .
***
IV. Decisão

Em face do exposto, acorda-se em conceder provimento ao recurso, em consequência do que se decide revogar a decisão recorrida, que considerou ser o Tribunal do Trabalho o materialmente competente, bem como a subsequente sentença, o que tudo é substituído pelo presente acórdão em que se decide julgar procedente a exceção dilatória da incompetência material do Tribunal do Trabalho com a consequente absolvição do Réu, Centro Hospitalar ..., EPE, da instância.

Custas, em ambas as instâncias, pela A/Recorrente.

Porto, 11.04.2019
Paula Leal de Carvalho
Rui Penha
Jerónimo Freitas
______________
1] Alterada pelas: Lei 40-A/2016, de 22.12, 94/2017, de 23.08, Lei Orgânica 4/2017, de 25.08, Lei 23/2018, de 05.06. DL 110/2018, de 10.12 e pela Lei 19/2019, de 19.02.
[2] Objeto de alterações posteriores: DL 59/2008, Lei 64-A/2008, Lei 11/2014, Lei 82-B/2014 e DL 33/2018.
[3] E alterada pelas Leis nºs 82-B/2014, de 31.12, 84/2015, de 07.08, 18/2016, de 20.06, 42/2016, de 28.12, 25/2017, de 30.05, 70/2017, de 14.08, 73/2017, de 16.08, 49/2018, de 14.08, 71/2018, de 31.12 e 6/2019, de 14.01.