Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
553/14.6TTBRG.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: EDUARDO PETERSEN SILVA
Descritores: AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO JUDICIAL DA REGULARIDADE E LICITUDE DO DESPEDIMENTO
FORMULÁRIO
INDEFERIMENTO LIMINAR
AUDIÊNCIA DE PARTES
Nº do Documento: RP20150105553/14.6TTBRG.P1
Data do Acordão: 01/05/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROVIDO
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL)
Área Temática: .
Sumário: I - Recebido pela secretaria o formulário a que se refere o artigo 98º-C do CPT, ao juiz cumpre designar audiência de partes, não podendo indeferir liminarmente o requerimento.
II - Tendo a empregadora comunicado ao trabalhador, por escrito, que o contrato de trabalho termina por falta de trabalho, tal comunicação é de inequívoco despedimento, e a acção a utilizar para a impugnação do despedimento é a acção especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento e não a acção comum.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº 553/14.6TTBRG.P1
Apelação

Relator: Eduardo Petersen Silva (reg. nº 421)
Adjunto: Desembargadora Paula Maria Roberto
Adjunto: Desembargadora M. Fernanda P. Soares

I. Relatório
B…, residente em …, Braga, veio interpor a presente acção especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento mediante apresentação do competente formulário, contra C…, Ldª, com sede em …, opondo-se ao despedimento decidido por esta em 6.6.2014.
Com o formulário, o A. juntou uma carta da R., assinada por “A Gerência, D…”, com o seguinte teor: “Vimos, para os devidos efeitos, transmitir pelo presente meio que o Vosso contrato de trabalho a favor da firma terminou em 06 de Junho de 2014, por falta de trabalho, data a partir da qual se deverão considerar dispensados”.

Aberta conclusão, foi proferido o seguinte despacho pelo Mmº Juiz: “Com o presente requerimento pretende o Autor impugnar a decisão de despedimento individual, conforme consta da declaração junta com o formulário.
No entanto, usou o processo errado.
Com efeito, o ora requerente não foi objecto de nenhum despedimento, mas apenas recebeu uma comunicação de dispensa, por falta de trabalho, o que, redundará numa simples denúncia unilateral do contrato ilegal.
Ora, a acção especial de impugnação judicial da regularidade e ilicitude do despedimento está reservada aos casos de efectivo despedimento individual e sempre que tal decisão da entidade empregadora seja comunicada por escrito ao trabalhador, seja por facto a este imputável, seja por extinção do posto de trabalho, seja por inadaptação (artigo 387º do Código do Trabalho).
Por outras palavras, neste caso deveria ter sido usado o processo comum, que começa por uma petição inicial e não por um formulário.
Desta feita, ocorre erro na forma de processo, que implica a anulação de todos os actos praticados, que, no caso, se resumem à entrega do requerimento/formulário e documentos anexos (cfr. artigo 193º do Código de Processo Civil).
Em face do exposto, julgando nulo o requerimento de oposição ora apresentado ordeno o arquivamentos dos autos.
Notifique”.

Inconformado, interpôs o Autor o presente recurso, apresentando a final as seguintes conclusões, aqui sumariadas:
1. A comunicação dirigida ao trabalhador configura um verdadeiro despedimento,
2. Caindo no âmbito de aplicação do artº 98º-C do CPT,
3. Mesmo a considerarem-se taxativos os fundamentos deste constantes, o teor da declaração é compatível com uma extinção do posto de trabalho.
4. A sentença violou o artigo 98º-A nº 1 do CPT.
Deve revogar-se o despacho, substituindo-se por outro que ordene o prosseguimento dos autos, com a designação da audiência de partes.

O recurso admitido, sendo então fixado valor à acção de €2001,00 e, citada a Ré nos termos do artigo 641º 7 do CPC, em cumprimento de despacho do ora relator que ordenou a baixa dos autos para tanto, a mesma não contra-alegou.

O Exmº Senhor Procurador-Geral Adjunto nesta Relação emitiu parecer profundamente fundamentado e de leitura muito recomendável, no sentido do provimento do recurso tanto mais que o despacho nem sequer podia ter sido proferido antes da audiência de partes.

Dado cumprimento ao disposto na primeira parte do nº 2 do artigo 657º do Código de Processo Civil foi o processo submetido à conferência para julgamento.

II. Direito
Delimitado o objecto do recurso pelas conclusões do recorrente, não sendo lícito ao tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo as de conhecimento oficioso, a questão a decidir é a de saber se não ocorreu erro na forma de processo e se assim não devia ter sido indeferido liminarmente o requerimento inicial, devendo pelo contrário ter prosseguido os normais termos processuais dos autos, com a designação de audiência de partes.

III. Matéria de facto
A constante do relatório que antecede.

Apreciando:
Assiste inteira razão ao recorrente, e de resto também ao Ministério Público.
A questão é muito simples, e vamos decidi-la com muita simplicidade, nesta ressumando toda a douta fundamentação referida pelo Ministério Público.
O teor da comunicação é mais que suficiente para configurar um despedimento declarado por escrito ao trabalhador. O teor da comunicação é duplo: “o contrato termina por falta de trabalho” – portanto, não há dúvida alguma, o contrato termina, e não simplesmente ocorre uma situação de falta de trabalho – e termina por vontade da empregadora “data a partir da qual se deverão considerar dispensados”. Dispensados não do dever de trabalhar, mas dispensados porque o contrato terminou, como a empregadora assim o declarou.
Tirando a denúncia do contrato de trabalho a termo, unilateralmente, pelo empregador (artigos 344º e 345º do Código do Trabalho) não conhecemos, em Direito do Trabalho, a figura da denúncia unilateral do contrato ilegal, na exacta medida em que na comunicação não se faz alusão alguma à natureza a termo do contrato, nem há qualquer hipótese de extrair do texto da comunicação que se está a denunciar um contrato a termo antes do decurso do respectivo prazo, por falta de trabalho. O que conhecemos são formas de revogação unilateral pelo empregador, chamadas despedimento – artigo 340º do Código do Trabalho. E a matéria da cessação do contrato de trabalho é imperativa, pelo que não é possível ao intérprete da comunicação qualificar diversamente – artigo 339º do Código do Trabalho.
A acção especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento prevista no artigo 387º do Código do Trabalho de 2009 e nos artigos 98º-B e seguintes do Código de Processo de Trabalho, não exige que o despedimento tenha sido precedido da observância dum qualquer mínimo do formalismo legalmente exigido para o processamento das diversas razões que permitem a revogação unilateral do contrato de trabalho pelo empregador. Por um argumento de maioria de razão, se a comunicação de despedimento, escrita e inequívoca, não vem acompanhada de nenhum procedimento, o despedimento é ilícito, e tanto bastaria para que, na lógica da celeridade desta nova acção, nada a impedisse. Não ocorreu pois nenhum erro na forma de processo.
Neste sentido, os acórdãos deste Tribunal de 23 e de 30.5.2011.

De resto, não está previsto nenhum momento processual prévio à citação para a audiência de partes que permita ao juiz indeferir liminarmente o requerimento inicial – cfr. artigo 98º-E e 98º - F nº 1 ambos do Código de Processo do Trabalho.
Termos em que procede o recurso.
Não são devidas custas, uma vez que a empregadora não contra-alegou e foi o tribunal quem deu causa ao processado – artigo 527º do CPC.

IV. Decisão
Acordam assim julgar procedente o recurso e em consequência revogar o despacho recorrido e ordenar a sua substituição por outro que determine o normal prosseguimento dos autos, com a marcação da audiência de partes.
Sem custas.

Porto, 5.1.2015
Eduardo Petersen Silva
Paula Maria Roberto
Fernanda Soares
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Sumário:
I. Recebido pela secretaria o formulário a que se refere o artigo 98º-C do CPT, ao juiz cumpre designar audiência de partes, não podendo indeferir liminarmente o requerimento.
II. Tendo a empregadora comunicado ao trabalhador, por escrito, que o contrato de trabalho termina por falta de trabalho, tal comunicação é de inequívoco despedimento, e a acção a utilizar para a impugnação do despedimento é a acção especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento e não a acção comum.

Eduardo Petersen Silva
(Processado e revisto com recurso a meios informáticos (artigo 138º nº 5 do Código de Processo Civil).