Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
8231/16.5T8PRT.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: CARLOS PORTELA
Descritores: PROCEDIMENTO ESPECIAL DE DESPEJO
ENTREGA DE COISA CERTA
COMUNICAÇÃO
Nº do Documento: RP202009248231/16.5T8PRT.P1
Data do Acordão: 09/24/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Indicações Eventuais: 3ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: À execução para entrega de imóvel, podem servir de título executivo, os documentos a que se referem os artigos 14º, n.º 5, e 15º, n.º 1, alínea e), do Novo Regime de Arrendamento Urbano, desde que, para a sua válida formação do documento enquanto título executivo, se cumpram os formalismos previstos no n.º 7 do artigo 9º e na alínea e) do artigo 15º do referido diploma legal.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Apelação nº 8231/16.5T8PRT.P1
Tribunal recorrido: Comarca do Porto
Porto – Inst. Central – 1ª Secção de Execução
Relator: Carlos Portela
Adjuntos: Joaquim Correia Gomes
António Paulo Vasconcelos

Acordam na 3ª Secção do Tribunal da Relação do Porto

I.Relatório:
B… e C…, ambos devidamente identificados nos autos, vieram intentar a presente acção executiva, para entrega de coisa certa, contra D…, também ele, devidamente identificado e na qual pretendem a entrega coerciva de determinado imóvel.
O requerimento executivo dado entrada em Juízo em 15/4/2016.
Para o efeito alegaram terem dado de arrendamento ao executado o imóvel cuja entrega peticionam.
Mais alegaram que aquele deixou de pagar as respectivas rendas.
Juntaram, como título executivo, o contrato de arrendamento, bem como notificação judicial avulsa, mediante a qual o executado foi notificado da resolução do contrato de arrendamento e ainda que deveria proceder ao pagamento das rendas em falta e à entrega do imóvel.
Perante tal pretensão foi proferido despacho no qual se considerou que o contrato de arrendamento e a notificação judicial avulsa não se enquadram nas situações previstas no art.º 703º, nº1 do CPC, entendendo-se que não existe por isso título executivo.
Desse modo e nos termos do disposto no art.º 726º, nº2, alínea a) do CPC, indeferiu-se liminarmente o requerimento executivo.
Não se conformando com tal decisão, vieram os exequentes interpor recurso do mesmo, apresentando desde logo e nos termos legalmente previstos as suas alegações.
O recurso foi considerado tempestivo e legal, sendo admitido como de apelação, com subida imediata, nos autos e efeito meramente devolutivo.
Recebido o processo nesta Relação, proferiu-se despacho onde se teve o recurso como próprio, tempestivamente interposto e admitido com efeito e modo de subida adequados.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
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II. Enquadramento de facto e de direito:
Ao presente recurso são aplicáveis as regras processuais previstas na Lei nº 41/2013 de 26 de Junho.
É consabido que o objecto do presente recurso, sem prejuízo das questões que sejam de conhecimento oficioso obrigatório, está definido pelo conteúdo das conclusões vertidas pelos exequentes/apelantes nas suas alegações (cf. artigos 608º, nº2, 635º, nº4 e 639º, nº1 do CPC).
E é o seguinte o teor dessas mesmas conclusões:
1º - Culminou, o tribunal de 1ª instância com o despacho de indeferimento liminar do requerimento executivo fundamentado na inexistência de título executivo.
2º - Titulo executivo este que os recorrentes haviam apresentado como sendo o contrato de arrendamento, acompanhado com as notificações judiciais avulsas – positivas - ao executado e aos demais fiadores.
3º - E em que os notificaram da resolução do contrato de arrendamento, pelos fundamentos ali melhor aduzidos.
4º - Pretendendo assim, com a execução, que o imóvel da sua propriedade, lhes fosse entregue.
5º - Entendeu o Tribunal de 1ª Instância que, o contrato de arrendamento, e ainda que acompanhado de tais notificações judiciais avulsas, não se integra em nenhum dos títulos mencionados nas alíneas do artigo 703º do Código de Processo Civil, pelo que indeferiu liminarmente o requerimento executivo.
6º - Entendem os recorrentes não dever ser essa a conclusão legal a extrair das disposições conjugadas do artigo 703º, alínea d), do C.P.C., com as dos artigos e artigos 14º, n.º 5, e 15º, n.º 2, alínea e), do Novo Regime de Arrendamento Urbano – Lei 6/2006, de 27/02, com as alterações que lhe foram introduzidas pela Lei 31/2012, de 14/08 e Lei 79/2014, de 19/12
7º - Tendo por referência o n.º 2 do artigo 1084º e artigo 1083º, ambos do Código Civil, e bem assim, os artigos 726º, 859º, e 862º, todos do Código de Processo Civil
8º - No sentido em que entendem que à execução para entrega de imóvel, podem servir de título executivo, os documentos a que se referem os artigos 14º, n.º 5, e 15º, n.º 1, alínea e), do Novo Regime de Arrendamento Urbano, e desde que, para a sua válida formação do documento enquanto título executivo, cumpra os formalismos do n.º 7 do artigo 9º e a alínea e) do artigo 15º do referido diploma legal.
9º - Ao decidir assim, não fez a interpretação que se lhe impunha do artigo 703º, alínea d) do Código de Processo Civil, e alínea e) do n.º 2 do artigo 15º da Lei 6/2006, de 27/02, uma vez que, é exactamente por força da conjugação das disposições legais citadas, com os artigos 1083º e 1084º do Código Civil, que o contrato de arrendamento, quando acompanhado da notificação judicial avulsa (ou outra forma de comunicação prevista no n.º 7 do artigo 9º do N.R.A.U.) se constitui como título executivo extra judicial bastante à execução para entrega de coisa certa.
10º - E assim decidindo, violou as disposições legais acima citadas.
11º - Bem como os artigos 726º, 859º, e 862º, todos do Código de Processo Civil.
12º - Para além de que, da decisão recorrida resulta que o Tribunal de 1ª Instância não conheceu nem aplicou os normativos indicados do NRAU, pelo que, para além de os violar por tal via, cometeu a nulidade por omissão de pronúncia por falta de apreciação de questões que o tribunal devia ter apreciado, e o não fez, nulidade que igualmente se invoca para os devidos efeitos legais.
13º - Impondo-se assim a sua revogação, e consequente substituição por outra decisão que, atentos os fundamentos aduzidos supra, ordene o prosseguimento da instância executiva nos precisos termos vertidos em sede de requerimento executivo.
Por conseguinte, verifica-se que a douta sentença recorrida não fez uma correcta interpretação aplicação ao direito, tendo violado os preceitos legais enunciados nas antecedentes conclusões, pelo que a revogação da decisão proferida pelo Tribunal a quo, substituindo-a por outra, ou assim se não entendendo, que ordene a prossecução dos termos subsequentes da lide, representará acto de BOA E SÃ JUSTIÇA.
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Perante o acabado de expor resulta claro que é a seguinte a questão suscitada nos autos:
A de saber se nos autos existe título executivo bastante que justifique o normal prosseguimento dos autos.
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Para responder a esta questão, importa considerar para além de tudo o mais que ficou descrito no ponto I. as seguintes circunstâncias constantes do processo:
Em 15/04/2014 deu entrada em juízo a presente execução para entrega de cosa certa na qual são exequentes B… e C… e executado D… e no qual os primeiros alegam que consideram operada a resolução do contrato por falta de pagamento de rendas e pedem que seja ordenada a imediata desocupação do imóvel e a sua subsequente entrega.
O requerimento executivo foi acompanhado pelo contrato de arrendamento celebrado entre os primeiros exequentes e o executado e o requerimento da Notificação Judicial Avulsa onde são requerentes os ora exequentes e requerido o ora executado e no qual os exequentes/apelantes alegam entre o mais o seguinte:
O não pagamento pelo locatário (e pelo fiador (das rendas respeitantes aos meses de Novembro e Dezembro de 2015, e Janeiro e Fevereiro de 2016, no montante global de 948,00 €.
O decurso do prazo previsto para a resolução do contrato nos termos do disposto nos artigos 1083º, nºs 1, 3 e 4 e 1984º, nºs 1 e 2 do Código Civil.
A sua vontade expressa de ver resolvido o contrato.
O pedido de comunicação aos requeridos da mesma vontade de resolução, nos termos do disposto no art.º 261º do CPC e na alínea a) do nº7 do art.º 9º do NRAU.
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Vejamos:
São relevantes para a questão que temos decidir as seguintes normas do NRAU – Lei 6/2006 de 27/02 com as alterações introduzidas pela Lei 31/2012 de 14/08 e pela Lei 79/2014 de 19/12:
Artigo 9.º
Forma da comunicação
1 - Salvo disposição da lei em contrário, as comunicações legalmente exigíveis entre as partes relativas a cessação do contrato de arrendamento, actualização da renda e obras são realizadas mediante escrito assinado pelo declarante e remetido por carta registada com aviso de recepção.
2 - As cartas dirigidas ao arrendatário, na falta de indicação por escrito deste em contrário, devem ser remetidas para o local arrendado.
3 - As cartas dirigidas ao senhorio devem ser remetidas para o endereço constante do contrato de arrendamento ou da sua comunicação imediatamente anterior.
4 - Não existindo contrato escrito nem comunicação anterior do senhorio, as cartas dirigidas a este devem ser remetidas para o seu domicílio ou sede.
5 - Qualquer comunicação deve conter o endereço completo da parte que a subscreve, devendo as partes comunicar mutuamente a alteração daquele.
6 - O escrito assinado pelo declarante pode, ainda, ser entregue em mão, devendo o destinatário apor em cópia a sua assinatura, com nota de recepção.
7 - A comunicação pelo senhorio destinada à cessação do contrato por resolução, nos termos do n.º 2 do artigo 1084.º do Código Civil, é efectuada mediante:
a) Notificação avulsa;
b) Contacto pessoal de advogado, solicitador ou agente de execução, comprovadamente mandatado para o efeito, sendo feita na pessoa do notificando, com entrega de duplicado da comunicação e cópia dos documentos que a acompanhem, devendo o notificando assinar o original;
c) Escrito assinado e remetido pelo senhorio nos termos do n.º 1, nos contratos celebrados por escrito em que tenha sido convencionado o domicílio, caso em que é inoponível ao senhorio qualquer alteração do local, salvo se este tiver autorizado a modificação.
Artigo 14.º
Acção de despejo
1 - A acção de despejo destina-se a fazer cessar a situação jurídica do arrendamento sempre que a lei imponha o recurso à via judicial para promover tal cessação e segue a forma de processo comum declarativo.
2 - Quando o pedido de despejo tiver por fundamento a falta de residência permanente do arrendatário e quando este tenha na área dos concelhos de Lisboa ou do Porto e seus limítrofes ou no respectivo concelho quanto ao resto do País outra residência ou a propriedade de imóvel para habitação adquirido após o início da relação de arrendamento, com excepção dos casos de sucessão mortis causa, pode o senhorio, simultaneamente, pedir uma indemnização igual ao valor da renda determinada de acordo com os critérios previstos nas alíneas a) e b) do n.º 2 do artigo 35.º desde o termo do prazo para contestar até à entrega efetiva da habitação.
3 - Na pendência da acção de despejo, as rendas que se forem vencendo devem ser pagas ou depositadas, nos termos gerais.
4 - Se as rendas, encargos ou despesas, vencidos por um período igual ou superior a dois meses, não forem pagos ou depositados, o arrendatário é notificado para, em 10 dias, proceder ao seu pagamento ou depósito e ainda da importância da indemnização devida, juntando prova aos autos, sendo, no entanto, condenado nas custas do incidente e nas despesas de levantamento do depósito, que são contadas a final.
5 - Em caso de incumprimento pelo arrendatário do disposto no número anterior, o senhorio pode requerer o despejo imediato, aplicando-se, em caso de deferimento do requerimento, com as necessárias adaptações, o disposto no n.º 7 do artigo 15.º e nos artigos 15.º-J, 15.º-K e 15.º-M a 15.º-O.
Artigo 14.º-A
Título para pagamento de rendas, encargos ou despesas
1 - O contrato de arrendamento, quando acompanhado do comprovativo de comunicação ao arrendatário do montante em dívida, é título executivo para a execução para pagamento de quantia certa correspondente às rendas, aos encargos ou às despesas que corram por conta do arrendatário.
2 - O contrato de arrendamento, quando acompanhado da comunicação ao senhorio do valor em dívida, prevista no n.º 3 do artigo 22.º-C do regime jurídico das obras em prédios arrendados, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 157/2006, de 8 de agosto, é título executivo para a execução para pagamento de quantia certa correspondente à compensação pela execução de obras pelo arrendatário em substituição do senhorio.
Artigo 15.º
Procedimento especial de despejo
1 - O procedimento especial de despejo é um meio processual que se destina a efectivar a cessação do arrendamento, independentemente do fim a que este se destina, quando o arrendatário não desocupe o locado na data prevista na lei ou na data fixada por convenção entre as partes.
2 - Apenas podem servir de base ao procedimento especial de despejo independentemente do fim a que se destina o arrendamento:
a) Em caso de revogação, o contrato de arrendamento, acompanhado do acordo previsto no n.º 2 do artigo 1082.º do Código Civil;
b) Em caso de caducidade pelo decurso do prazo, não sendo o contrato renovável, o contrato escrito do qual conste a fixação desse prazo;
c) Em caso de cessação por oposição à renovação, o contrato de arrendamento acompanhado do comprovativo da comunicação prevista no n.º 1 do artigo 1097.º ou no n.º 1 do artigo 1098.º do Código Civil;
d) Em caso de denúncia por comunicação pelo senhorio, o contrato de arrendamento, acompanhado do comprovativo da comunicação prevista na alínea c) do artigo 1101.º ou no n.º 1 do artigo 1103.º do Código Civil ou da comunicação a que se refere a alínea a) do n.º 5 do artigo 33.º da presente lei;
e) Em caso de resolução por comunicação, o contrato de arrendamento, acompanhado do comprovativo da comunicação prevista no n.º 2 do artigo 1084.º do Código Civil, bem como, quando aplicável, do comprovativo, emitido pela autoridade competente, da oposição à realização da obra;
f) Em caso de denúncia pelo arrendatário, nos termos dos n.ºs 3 e 4 do artigo 1098.º do Código Civil e dos artigos 34.º e 53.º da presente lei, o comprovativo da comunicação da iniciativa do senhorio e o documento de resposta do arrendatário.
3 - Para efeitos do disposto na alínea d) do número anterior, o comprovativo da comunicação prevista no n.º 1 do artigo 1103.º do Código Civil é acompanhado dos documentos referidos nos n.ºs 2 e 3 do mesmo artigo ou, sendo caso disso, de cópia da certidão a que se refere o n.º 7 do artigo 8.º do Decreto-Lei n.º 157/2006, de 8 de agosto, que aprova o regime jurídico das obras em prédios arrendados.
4 - O procedimento especial de despejo previsto na presente subsecção apenas pode ser utilizado relativamente a contratos de arrendamento cujo imposto do selo tenha sido liquidado ou cujas rendas tenham sido declaradas para efeitos de IRS ou IRC.
5 - Quando haja lugar a procedimento especial de despejo, o pedido de pagamento de rendas, encargos ou despesas que corram por conta do arrendatário pode ser deduzido cumulativamente com o pedido de despejo no âmbito do referido procedimento desde que tenha sido comunicado ao arrendatário o montante em dívida, salvo se previamente tiver sido intentada ação executiva para os efeitos previstos no artigo anterior.
6 - No caso de desistência do pedido de pagamento de rendas, encargos ou despesas, o procedimento especial de despejo segue os demais trâmites legalmente previstos quanto ao pedido de desocupação do locado.
7 - Sempre que os autos sejam distribuídos, o juiz deve pronunciar-se sobre todas as questões suscitadas e, independentemente de ter sido requerida, sobre a autorização de entrada no domicílio.
8 - As rendas que se forem vencendo na pendência do procedimento especial de despejo devem ser pagas ou depositadas, nos termos gerais.”
São igualmente relevantes as seguintes normas do Código Civil:
Artigo 1083.º
Fundamento da resolução
1 - Qualquer das partes pode resolver o contrato, nos termos gerais de direito, com base em incumprimento pela outra parte.
2 - É fundamento de resolução o incumprimento que, pela sua gravidade ou consequências, torne inexigível à outra parte a manutenção do arrendamento, designadamente quanto à resolução pelo senhorio:
a) A violação de regras de higiene, de sossego, de boa vizinhança ou de normas constantes do regulamento do condomínio;
b) A utilização do prédio contrária à lei, aos bons costumes ou à ordem pública;
c) O uso do prédio para fim diverso daquele a que se destina, ainda que a alteração do uso não implique maior desgaste ou desvalorização para o prédio;
d) O não uso do locado por mais de um ano, salvo nos casos previstos no n.º 2 do artigo 1072.º;
e) A cessão, total ou parcial, temporária ou permanente e onerosa ou gratuita, do gozo do prédio, quando ilícita, inválida ou ineficaz perante o senhorio.
3 - É inexigível ao senhorio a manutenção do arrendamento em caso de mora igual ou superior a três meses no pagamento da renda, encargos ou despesas que corram por conta do arrendatário ou de oposição por este à realização de obra ordenada por autoridade pública, sem prejuízo do disposto nos n.ºs 3 a 5 do artigo seguinte.
4 - É ainda inexigível ao senhorio a manutenção do arrendamento no caso de o arrendatário se constituir em mora superior a oito dias, no pagamento da renda, por mais de quatro vezes, seguidas ou interpoladas, num período de 12 meses, com referência a cada contrato, não sendo aplicável o disposto nos n.os 3 e 4 do artigo seguinte.
5 - É fundamento de resolução pelo arrendatário, designadamente, a não realização pelo senhorio de obras que a este caibam, quando tal omissão comprometa a habitabilidade do locado e, em geral, a aptidão deste para o uso previsto no contrato.
6 - No caso previsto no n.º 4, o senhorio apenas pode resolver o contrato se tiver informado o arrendatário, por carta registada com aviso de receção, após o terceiro atraso no pagamento da renda, de que é sua intenção pôr fim ao arrendamento naqueles termos.
Artigo 1084.º
Modo de operar
1 - A resolução pelo senhorio com fundamento numa das causas previstas no n.º 2 do artigo anterior é decretada nos termos da lei de processo.
2 - A resolução pelo senhorio quando fundada em causa prevista nos n.os 3 e 4 do artigo anterior bem como a resolução pelo arrendatário operam por comunicação à contraparte onde fundamentadamente se invoque a obrigação incumprida.
3 - A resolução pelo senhorio, quando opere por comunicação à contraparte e se funde na falta de pagamento da renda, encargos ou despesas que corram por conta do arrendatário, nos termos do n.º 3 do artigo anterior, fica sem efeito se o arrendatário puser fim à mora no prazo de um mês.
4 - O arrendatário só pode fazer uso da faculdade referida no número anterior uma única vez, com referência a cada contrato.
5 - Fica sem efeito a resolução fundada na oposição pelo arrendatário à realização de obra ordenada por autoridade pública se, no prazo de 60 dias, cessar essa oposição.
Mas para além destas cabe não esquecer que nos termos do disposto no art.º 703º, al. d) do Código de Processo Civil, “à execução (…) podem servir de base (…) os documentos a que, por disposição especial, seja atribuída força executiva”.
Ora todos já vimos, que para o Tribunal “a quo”, no caso dos autos não existe título exequível já que o contrato de arrendamento e a notificação judicial avulsa não se enquadram em qualquer das situações previstas no citado art.º 703º.
Não tem no entanto razão no entendimento que perfilha.
Assim, é consabido que o título executivo a que se reporta o art.º 14º-A do NRAU tem natureza complexa, sendo integrado pelo contrato de arrendamento e pela comunicação ao devedor (arrendatário ou fiador).
A ser deste modo, tal título porque especial e complexo, só existe da conjugação dos documentos aí previstos, não valendo isoladamente nem o contrato de arrendamento nem a referida comunicação.
Ou seja, exigem-se para a formação do título, dois elementos, primeiro o contrato de arrendamento e segundo o comprovativo da notificação ao locatário por parte do locador.
Assim, têm razão os exequentes/apelantes quando defendem que na execução para entrega de imóvel, podem servir de título executivo, quer a sentença proferida em acção especial de despejo, quer os documentos a que se referem os artigos 14º, nº5 e 15º, nº1, alínea a) do NRAU – Lei 6/2006 de 27/02, com as alterações introduzidas pela Lei 31/2012 de 14708 e pela Lei 79/2014 de 19/12.
Assiste-lhes igualmente razão quando salientam que neste último caso, para a formação do documento enquanto título executivo quando forem invocados algum ou alguns dos fundamentos de resolução enumerados de forma taxativa, no art.º 1083º do Código Civil, impõe-se dar cumprimento aos formalismos do nº7 do art.º 9º e da alínea e) do art.º 15º do NRAU.
Tudo isto em conjugação com o nº2 do art.º 1084º do Código Civil.
Ora no caso dos autos, estão verificados todos os formalismos prévios para a constituição do título executivo.
Por outro lado, também se constata que o imóvel objecto do contrato, não foi entregue no prazo fixado para o efeito fixado pelos locadores aqui exequentes ao locatário aqui executado.
A ser deste modo, era legítimo o recurso à via executiva, a fim de impor coercivamente a mesma entrega.
Em suma, valem nos autos as regras conjugadas dos artigos 703º, alínea d) do CPC e as dos artigos 14º, nº5 e 15º, nº1, alínea e) do NRAU.
Vale também o disposto nos artigos 1083º e 1084º, nº2 do Código Civil e o disposto nos artigos 726º, nºs 1 e 6, 859º e 862º do Código de Processo Civil.
E ao decidir como decidiu ou seja, ao indeferir liminarmente por falta de título, o requerimento executivo, o Tribunal “a quo” não interpretou nem aplicou correctamente tais normas, razão pela qual deve ser revogada a decisão proferida.
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Sumário (cf. art.º 663º, nº7 do CPC):
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III. Decisão:
Pelo exposto, julga-se procedente o presente recurso de apelação, revogando-se a decisão proferida e determinando-se que a mesma seja substituída por outra que faça prosseguir os autos nos termos e para os efeitos previstos nos artigos 859º e 862º do Código de Processo Civil.
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Custas do recurso a cargo do executado aqui apelado (cf. art.º 527º, nºs 1 e 2 do CPC).
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Notifique.

Porto, 24 de Setembro de 2020
Carlos Portela
Joaquim Correia Gomes
António Paulo Vasconcelos