Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
261/10.7TTMAI.P2
Nº Convencional: JTRP000
Relator: PAULA LEAL DE CARVALHO
Descritores: INCAPACIDADE PERMANENTE ABSOLUTA PARA O TRABALHO HABITUAL
FACTOR DE BONIFICAÇÃO
SUBSÍDIO DE ELEVADA INCAPACIDADE
Nº do Documento: RP20170213261/10.7TTMAI.P2
Data do Acordão: 02/13/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROVIDO
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL), LIVRO DE REGISTOS N.º251, FLS.347-365)
Área Temática: .
Sumário: I - Determinando as lesões de que o sinistrado padece em consequência de acidente de trabalho incapacidade permanente para o exercício da totalidade das funções que constituem o núcleo essencial da sua profissão, apenas lhe sendo possível a realização de tarefas meramente residuais (no caso, escolha de ferramentas e materiais, sendo a profissão a de ajudante de pedreiro, incapacidade aquela também extensível à profissão de pedreiro), encontra-se o mesmo afetado de incapacidade perante absoluta para o exercício do trabalho habitual (IPATH).
II - A atribuição do fator de bonificação de 1,5 previsto nº nº 5, al. a), das Instruções Gerais da TNI é cumulável com uma IPATH (incidindo o referido fator sobre o coeficiente de desvalorização de IPP para o exercício de outra profissão).
III - No âmbito da Lei 100/97, de 13.09, em caso de IPATH o subsídio por situação de elevada incapacidade a que se reporta o art. 23º do referido diploma é devido por inteiro (sem ponderação do coeficiente de IPP para o exercício de outra profissão).
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº 261/10.7TTMAI.P2
Relatora: Paula Leal de Carvalho (Reg. 942)
Adjuntos: Des. Jerónimo Freitas
Des. Nelson Fernandes

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto

I. Relatório

Participado, aos 03.04.2010, acidente de trabalho em que figura como sinistrado (A.) B… e entidade responsável C… – Companhia de Seguros, SA por aquele sofrido aos 01.04.2009, realizou-se, na fase conciliatória do processo, exame médico singular, nos termos do qual foi atribuída ao A. a IPP de 58,64% (fls. 46 a 49) e fixada a data da alta definitiva em 21.04.2010.

Teve lugar tentativa de conciliação, a qual se frustrou por a Ré Seguradora não haver aceite o grau de IPP atribuído [o sinistrado aceitou a incapacidade atribuída e a Ré aceitou a existência do acidente, a sua caracterização como acidente de trabalho, o nexo de causalidade entre as lesões e o acidente bem como a retribuição].

A Ré Seguradora requereu exame por junta médica, tendo esta, bem como o sinistrado, com mandatária judicial constituída, formulado quesitos [fls. 58 e 65, respetivamente] e, realizado exame por junta médica, considerou esta, por maioria (peritos do Tribunal e da Seguradora) que o sinistrado se encontra afetado da IPP de 51,92%, sem IPATH (havendo o Sr. perito médico do sinistrado considerado que o A. se encontra afetado de IPATH e com a IPP de 58,64%) -fls. 80 a 83.

Foi proferida sentença que julgou o A. afetado da IPP de 51,92% e condenou a Ré a pagar-lhe a pensão anual e vitalícia de €2.729,43 com efeitos a partir de 22.04.2010, dia imediato ao da alta definitiva, pagamento a efetuar mensalmente, correspondendo cada prestação a 1/14 da pensão e sendo os subsídios de férias e de Natal, no valor, cada um, de 1/14 da pensão pagos nos meses de maio e novembro (fls. 85/86).

Inconformado, o A. interpôs recurso, na sequência do que foi, aos 27.02.2012, proferido acórdão que decidiu “anular o processado desde o exame médico de fls. 80 a 83, o qual deverá ser repetido, seguindo-se depois a normal tramitação legal, devendo o Tribunal a quo, previamente, diligenciar pelo cumprimento do disposto nas alíneas a) e b) do nº 13 das Instruções gerais da Tabela nacional de incapacidades. Custas pela parte vencida a final” (fls. 119 a 127).

Baixados os autos à 1ª instância, foram colhidos: parecer do IEFP[1] relativo à “Análise de Funções de Trabalhador Sinistrado” que consta de fls. 143 a 147; parecer elaborado por perito médico do IEFP cujo relatório consta de fls. 201/202; parecer do Centro de Reabilitação Profissional de Gaia que consta do documento de fls. 236/237.

Realizaram-se também os exames por junta médica que constam de fls. 152/153, 213 a 218 e 254/255 que, por unanimidade, consideraram o A. afetado da IPP de 58,2% [incapacidades parcelares de 0,30 + 0,06+0,07 e sobre as quais foi aplicado o fator de bonificação de 1,5 a que se reporta o nº 5, al. a), das Instruções Gerais da TNI] e, por maioria [peritos do Tribunal e da Ré Seguradora], que o A. não se encontra afetado de IPATH, tendo o perito médico do sinistrado considerado que o A. se encontra, também, afetado da referida IPATH.

Foi, aos 04.07.2016, proferida sentença (fls. 266) que considerou o A. afetado da IPP de 58,20%, tendo condenado a Ré a pagar-lhe, para além de €30,00 a título de despesas de transporte, a pensão anual e vitalícia de €3.059,57, com início de vencimento reportado a 22.04.2010, dia imediato ao da alta definitiva, pagamento a efetuar mensalmente, até ao terceiro dia de cada mês correspondendo cada prestação a 1/14 da pensão e sendo os subsídios de férias e de Natal, no valor, cada um, de 1/14 da pensão pagos nos meses de maio e novembro. Mais se determinou o pagamento, de uma só vez, das prestações já vencidas, acrescidas de juros de mora, à taxa legal (art. 135º do CPT). Fixou-se à ação o valor de €51.755,09.

Inconformado, o A. veio recorrer, tendo formulado, a final das suas alegações, as seguintes conclusões:
“1. Em nosso modesto entendimento, a Douta Julgadora não procedeu à necessária e justa crítica de todos os exames realizados nos autos, apenas se centrando no resultado do último dos exames por Junta Médica (JM), afastando assim a discussão em aquilatar se era aplicável ao sinistrado uma situação de Incapacidade Absoluta Para o Trabalho Habitual (IPATH).
2. O sinistrado desdobrou-se em esforços processuais no sentido de o demonstrar, mormente com a solicitação de vários exames e relatórios médicos que antecederam o exame final por JM, sem olvidar o estudo do posto de trabalho igualmente constante dos autos e cuja realização todos os relatórios.
3. Ou seja, após este último estudo, o sinistrado foi alvo de perícia de avaliação do dano corporal em direito laboral, efectuado por perito em medicina do trabalho, do IEFP, conforme fls. , que considerou o sinistrado com IPATH, justificando-o.
4. Além do mais, após a JM de 01/12/2014 e face às dúvidas que a mesma fez suscitar ao sinistrado, foi solicitado pelo sinistrado parecer a ser realizado por especialistas em Medicina Física e Medicina do Trabalho, do Centro de Reabilitação Profissional de Gaia, a fim de perceber se o sinistrado se acha ou não em situação de IPATH, conforme fls. , vindo os dois peritos avaliadores com o parecer de que o examinando se encontra com incapacidade permanente absoluta para a sua profissão habitual.
5. Novamente reunida a JM, em 15/03/2016, vieram os Srs. Peritos à excepção do Perito do sinistrado declarar, por maioria, que o sinistrado não se encontra totalmente incapaz de exercer a sua profissão.
6. Insurge-se, pois, o sinistrado porquanto a Meretíssima Juiz a quo fez, em nosso modesto aviso, tábua rasa dos demais elementos processuais, principalmente dos relatórios médicos subscritos por especialistas e que constam dos autos.
7. In casu, o Tribunal poderia, face aos dados objectivos constantes dos autos e sobre os quais se fez acima o respectivo destaque.
8. Trata-se mesmo de um facto notório que merece a apreciação livre e objectiva que o sinistrado respeitosamente reclama, sendo certo que a força probatória das perícias é fixada livremente pelo Tribunal (art. 389º. do CC).
9. O que se passou com o laudo maioritário da JM foi que o mesmo não atentou nas características especificadas da profissão do sinistrado, alicerçando a sua fundamentação de que o mesmo se acha reconvertido porque entendem poder realizar algumas (muitíssimo poucas e insignificantes) tarefas, elencando-as.
10. E a tal estavam os Srs. Peritos obrigados, nos termos do que dispõe o art. 106º. do CPT, aliás em sintonia com o que dispõe o art. 586º. do CPC, que preceitua: “O resultado da perícia é expresso em Relatório, no qual o perito ou peritos se pronunciam fundamentadamente sobre o respectivo objecto”.
11. O Tribunal poderia, face aos dados objectivos constantes dos autos e sobre os quais se fez acima o respectivo destaque, perfeitamente aderir à posição minoritária da JM, considerando outrossim os dois relatórios periciais que se acham juntos aos autos e subscritos por três peritos.
12. Com efeito, se, por um lado, se estes relatórios periciais são os únicos que se encontram devidamente fundamentados, por outro lado, é essa mesma posição que corresponde à realidade objectiva da situação real limitativa do sinistrado.
13. Para dilucidar todas estas questões, importa antes de mais, concatenar a matéria de facto que deve considerar-se assente:
a) A profissão do Recorrente, que é a de pedreiro (ajudante).
b) As perdas relevantes e profundamente limitativas dos seus membros superior e inferior direitos.
c) O lado activo do sinistrado é o lado ou a mão direita.
14. No caso concreto, o Recorrente tem manipular, transportar e executar cargas, com ambos os pés e com as mãos (passe a redundância) para a perfeita execução das tarefas de pedreiro.
15. Por essa razão, ou seja, por o sinistrado ter ficado desprovido dessas qualidades, tal como se acha implícito nas Respostas dadas aos quesitos formulados à Junta Médica, perdeu ele o seu posto de trabalho.
16. Não foi, por isso, reconvertido. Ou seja: ficou ele absolutamente incapaz para a profissão habitual.
17. Aliás, torna-se sintomático dessa situação a IPP atribuída – 58,2%.
18. Devia ter sido sufragado, assim, a posição minoritária da JM (com recurso aos dois relatórios periciais igualmente juntos autos) de que o sinistrado se acha com uma IPP de 58,2% e com uma situação de IPATH.
19. A douta sentença em apreço, aderiu, acriticamente, à posição maioritária da JM, de forma seguidista e directa ou indirectamente violou, entre outras, as disposições legais, o que preceituam o art. 106º. do CPT, o art. 586º. do CPC, o ponto 5.º-A das Instruções Gerais da Tabela Nacional de Incapacidades e, acima de tudo, o art. 389º. do CC.
TERMOS EM QUE (…), JULGANDO PROCEDENTE O PRESENTE RECURSO E CONSEQUENTEMENTE DECIDINDO CONFORME O MODESTAMENTE ACABADO DE SUGERIR, (…)”.

Não consta dos autos que tenham sido apresentadas contra-alegações.

Nesta Relação a Exmª Srª Procuradora Geral Adjunta emitiu douto parecer no sentido de que as conclusões são reprodução das alegações, o que equivale a falta de conclusões, vício insuscetível se suprimento e que conduz à rejeição do recurso, parecer sobre o qual, notificadas as partes, apenas o Recorrente respondeu, dele discordando.

Para o caso de eventual procedência do recurso, por despacho da ora relatora foi determinado o cumprimento do disposto no art. 665º, nº 3, do CPC quanto às questões relativas à atribuição de subsídio por situação de elevada incapacidade e de acumulação de IPATH com o fator 1,5 previsto no nº 5, al. a), das Instruções Gerais da TNI, na sequência do que apenas o A. respondeu, referindo em síntese, que: a atribuição do fator de bonificação de 1,5 não é incompatível com a existência de IPATH; a pensão não deve ser fixada abaixo do limite de 70% da retribuição; o valor do subsídio por situação de elevada incapacidade não deve ser inferior a €4.000,00.

Colheram-se os vistos legais.
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II. Fundamentação de Facto

Uma vez que a sentença recorrida[2] não consignou a matéria de facto provada, passamos a fazê-lo [tendo em conta o acordo obtido na tentativa de conciliação e a prova documental junta aos autos].
Assim, e para além do referido no relatório antecedente, tem-se como provada a seguinte factualidade:

1. O A. sofreu um acidente aos 01.04.2009 quando trabalhava para a entidade empregadora D… Unipessoal, Ldª, o qual consistiu numa queda, do que lhe resultaram lesões.

2. À data do acidente o A. auferia a retribuição de €450,00 x 14 + €110,00 x 11 meses.

3. A responsabilidade infortunística pelas consequências do acidente encontrava-se totalmente transferida para a Ré, Companhia de Seguros C…, SA.

4. O A. despendeu em transportes a quantia de €30,00.

5. Do exame singular realizado na fase conciliatória do processo, a que se reporta o auto de exame médico de fls. 47 a 50, consta, para além do mais, que o A. é pedreiro, com a categoria profissional de ajudante.

6. No exame por junta médica de fls. 213 a 216, realizado aos 09.12.2014, os Srs. Peritos médicos, por maioria (peritos da Ré Seguradora e do Tribunal) responderam aos quesitos formulados do seguinte modo:
- Quesitos de fls. 58, formulados pela Ré Seguradora, e respetivas respostas:
“1º. Quais as lesões resultantes do acidente descrito nos autos?
Rigidez do ombro direito e rigidez do tornozelo direito.
2º. Qual o grau de IPP que o sinistrado se encontra afectado?
IPP de 58,2%.”
- Quesitos de fls. 65/66, formulados pelo A., e respetivas respostas:
“(…)
a) Quais as lesões resultantes do acidente?
b) Quais as sequelas daí resultantes?
a) e b) – Respondido no anterior. Lesões – luxação acrómio clavicular Dtª e fratura do tornozelo Dtº.
c) As sequelas determinam uma incapacidade para o exercício da sua profissão habitual?
Não.
d) Está o sinistrado capaz de manipular e transportar cargas como habitualmente na sua actividade profissional de pedreiro?
Pode efectuar manipulação e transporte de objectos na medida da sua IPP. De notar que se aplica a bonificação do factos 1,5, para reconversão do seu posto de trabalho.
e) Está o sinistrado capaz de exercer as suas funções somente com o seu MSE e MIE, atendendo a ausência de mobilidade do ombro do MSD e ausência de mobilidade da tíbio társica do MID?
É de admitir que sim.
f) Como?
Tendo em atenção os exames pedidos pedidos e efetuados (RMN ombro, Rx e EMG) que não revelam lesão significativa que seja impeditiva de exercer axctividades na sua profissão, na medida da IPP.
(…);
k) Concordam os Srs. Peritos que o sinistrado beneficia do factor de bonificação de 1,5 por não ser reconvertível no seu posto de trabalho?
Sim.
(…)”.

7. Ainda no referido exame por junta médica, de fls. 213 a 216, o Sr. Perito médico do sinistrado respondeu aos mencionados quesitos nos seguintes termos:
- Quesitos de fls. 58:
“1º - Rigidez e dor à mobilização do ombro direito e limitação funcional (rigidez) do tornozelo direito.
2º - IPP de 58,64”.
- Quesitos de fls. 65/66:
(…)
a. Fractura do tornozelo direito e luxação acrómio clavicular à Dtª.
b. Rigidez e dor à mobilização do ombro direito e limitação funcional (rigidez) do tornozelo direito.
c. Sim.
d. Não.
e. Presentemente, não.
k. Sim.
l. IPP de 58,64.”.

8. Ainda nos termos de tal exame por junta médica, as lesões apresentadas pelo A. foram enquadradas nas seguintes rubricas da TNI:
- Capítulo I, 3.2.7.1.a), havendo sido atribuído o coeficiente de desvalorização de 0,30;
- Capítulo I. 3.2.2.b), havendo sido atribuído o coeficiente de desvalorização de 0,06;
- Capítulo I. 14.2.2.1.a), havendo sido atribuído o coeficiente de desvalorização de 0,07,
E havendo sido, de acordo com o princípio da capacidade restante, atribuído o coeficiente de desvalorização global de 0,388, acrescido do fator de bonificação de 1,5, no total de 0,582 de IPP.

9. Na sequência do relatório relativo ao “estudo do posto de trabalho” de fls. 143 a 147 e do parecer do Centro de Reabilitação Profissional de Gaia (CRPG) de fls. 236/237, por requerimento de 30.11.2015, de fls. 241 vº, o A. formulou três quesitos a submeter à junta médica: o primeiro a perguntar se “está incapaz para o exercício da sua profissão habitual de pedreiro da construção civil”; o segundo no sentido de, em caso de resposta negativa, ser apresentada justificação considerando as limitações referidas nos mencionados relatório e parecer; o terceiro, se existe uma “efectiva possibilidade de reabilitação do sinistrado ou reconversão no seu posto de trabalho e em que medida atendendo às sequelas de que ficou a padecer”.

10. Do auto de exame por junta médica de fls. 254/255, realizado aos 15.03.2016, consta o seguinte:
“(…) após a consulta do processo e da observação do sinistrado os peritos respondem aos quesitos das folhas 58, 65 e 66 por maioria:
Os peritos mantêm as respostas dadas anteriormente a fls. 212 e seguintes, com os seguintes esclarecimentos:
1 – As descritas a folhas 213.
2 – IPP de 58,2%, a folhas 213 dos autos. De referir que já foi aplicado o fator 1,5 por o sinistrado não ser reconvertível em relação ao posto de trabalho, não estando totalmente incapaz de exercer a sua profissão. Mais entendem que as sequelas apresentadas estão valorizadas adequadamente, tendo sido beneficiadas pelo fator 1,5. Referem que dentro do âmbito da sua profissão, pode exercer algumas tarefas dentro da sua profissão.
De seguida respondem aos quesitos de folhas 241 verso:
Os peritos entendem que não se encontra totalmente incapaz de exercer a sua profissão, pois existem certas tarefas que pode realizar no âmbito da sua profissão (tais como proceder à selecção de materiais, ferramentas e equipamentos, confeccionar argamassas, assegurar limpeza e conservação de máquinas, entre outras, conforme descrito a fls. 237 e 237), devendo ser reconvertido no seu posto de trabalho, situação pela qual já foi atribuído o factor 1,5.
Pelo perito do sinistrado foi dito que mantem a IPP atribuída e a incapacidade para a sua profissão habitual, pelas razões do parecer do Centro de reabilitação de Gaia e no relatório de perícia de avaliação do Dano Corporal a fls. 201 e 2012, elaborado pelo Médico Dr. E…”.

11. Solicitado pela 1ª instância inquérito profissional e do estudo do posto de trabalho do A., o Instituto de Emprego e Formação Profissional elaborou o parecer de fls. 143 a 147 no qual se refere o seguinte:
“(…)
II. O Sr. B… tem a categoria profissional de Pedreiro, tendo desempenhado funções na empresa D…, Ldª.
III. À data do acidente, as tarefas executadas pelo Sr. B…, segundo descrição do próprio, eram as seguintes:
1. (…)
2. Selecionar os materiais, os equipamentos, as ferramentas e os meios auxiliares a utilizar tendo em conta o serviço a realizar;
3. Carregar, transportar e descarregar, manualmente ou com auxílio de equipamento adequado, materiais [massa, areias, cimento, tijolos, blocos], equipamentos e ferramentas, de acordo com o serviço a realizar;
4. Executar elementos construtivos em betão [vigas, pilares, lajes, muros e paredes]:
3.1. Realizando o enchimento das cofragens com o betão, segurando a mangueira de transporte de betão, orientando a abertura da mesma e distribuindo uniformemente o vazamento do betão;
3.2. Operando, manualmente, com diferentes tipos de vibradores de betão, em função das características da obra a executar a fim de obter a sua adequada compactação e resistência;
3.3. Realizando, manualmente, o espalhamento e regularização do betão, na construção das lajes, com o auxílio de pás e ancinhos adequados;
3.4. Acompanhando os trabalhos de polimento e procedendo, manualmente, à retificação de defeitos deixados no betão pela máquina de polimento.
5. Confeccionar argamassas amassando manualmente com o auxílio da pá, os materiais adequados;
6. Alimentar um betoneira, carregando-a manualmente com materiais diversos, nomeadamente, pedra, areia, cimento e água, a fim de produzir argamassas;
7. Carregar manualmente o balde com as argamassas e transportá-lo até aos locais onde é necessária a sua utilização;
8. Carregar o carro de mão com as argamassas e empurra-lo, manualmente, até aos locais da sua utilização;
9. Escolher, seccionar e assentar, manualmente, tijolo e blocos de betão, colocando argamassa, com o auxílio das ferramentas adequadas;
10. Executar reboco de paredes e tetos;
11. Verificar a qualidade dos trabalhos realizados utilizando instrumentos diversos, nomeadamente níveis, fios de prumos e réguas;
12. Efetuar desmontes e demolições, sempre que necessário, utilizando ferramentas adequadas, nomeadamente martelos pneumáticos;
13. Assegurar a limpeza e conservação das máquinas e ferramentas de trabalho que utiliza.
IV. À realização das tarefas, anteriormente descritas, estão associadas as seguintes exigências:
● Relativamente às Condições de Execução do Trabalho, as tarefas são executadas em espaços abertos, estando o trabalhador sujeito às condições atmosféricas, ruídos, poeiras e vibrações;
● Quanto às Exigências Físicas, relativamente à Posição de Trabalho, o trabalhador adota as posições em pé, de joelhos, curvado, agachado, deslocando-se e subindo e descendo.
No que diz respeito ao Tipo e Intensidade do Esforço, o desenvolvimento da sua atividade obriga a que o trabalhador levante, baixe e transporte nos brações/mãos e/ou ombros pesos que podem atingir 50 Kg. O trabalhador tem igualmente, de realizar o esforço de empurrar/puxar pesos [máquinas de distribuição de betão e compressores].
● Não são necessárias Exigências Sensoriais acima da média, para a execução das tarefas.
● Quanto às Exigências Psicomotoras, para o desempenho das tarefas descritas é necessária a coordenação motora e, especificamente, a coordenação mão-mão, mão-braço, mão-pé e pé-pé. É ainda necessário a firmeza e controlo muscular contínuo, nomeadamente quando o trabalhador opera com os vibradores de betão, com as mangueiras e distribuição de betão ou com o martelo pneumático.
● Não são necessárias Exigências Mentais acima da média, para a execução das tarefas.
● Na execução das tarefas descritas são, essencialmente, mobilizados mãos, braços, pernas e pés.
● De referir que no desenvolvimento da sua atividade, o trabalhador tem de subir e descer escadas verticais, por vezes carregando pesos nas mãos ou nos ombros.
● Destaca-se o facto de que o trabalhador, no desenvolvimento da atividade descrita, está sujeito a torções laterais do tronco e do pescoço, a flexões frontais e laterais do tronco e do pescoço, à extensão do pescoço, bem como a trabalhar com ambos os brações estendidos em frente e/ou com os braços acima do nível dos ombros.
● De salientar que a execução das tarefas descritas obriga a que o trabalhador tenha, frequentemente, que trabalhar em posições de equilíbrio instável, nomeadamente quando trabalha em andaimes, em cima de cogragens ou em cima do betão, no seu espalhamento.
● Na realização das tarefas, o trabalhador tem, por vezes, necessidade de se deslocar em terreno acidentado.
● (…)
● De salientar que o trabalhador está sujeito a horários de trabalho irregulares, nomeadamente nas fases de enchimento de betão que, dependendo da dimensão/extensão da obra a realizar, podem exigir várias horas seguidas de trabalho que se prolongam pelo período noturno.”.

12. Foi, pela 1ª instância, solicitado ao IEFP parecer por especialista em Medicina do Trabalho, na sequência do que foi emitido o parecer médico de fls. 201/202, no qual se refere o seguinte “(…). Pelas lesões atrás descritas e pela incapacidade apresentada, e pelo perfil da função que nos foi apresentado pelo Instituto de Emprego e Formação Profissional (IEFP), julgamos ser de atribuir uma IPATH (…). Já que manifestamente não podendo utilizar o membro superior direito, não pode carregar, transportar, descarregar, manualmente ou com o auxílio de equipamento adequado, materiais (massa, areias, cimento, tijolos, blocos), equipamento e ferramentas, de acordo com o serviço a realizar, operar manualmente os vibradores de betão, não podendo também subir e descer escadas, nem podendo transportar pesos que possam atingir os 50 Kgs.”.

13. Foi, pela 1ª instância, solicitado parecer ao Centro de Reabilitação Profissional de Gaia, parecer esse elaborado por médico do trabalho e psicóloga do trabalho do referido Centro e que consta de fls. 236/237, nele se referindo o seguinte:
“(…)
2. Enquadramento da situação da pessoa acidentada
Situação profissional
(…)
Atualmente refere que se encontra desempregado depois dos serviços de medicina do trabalho da entidade empregadora o terem considerado inapto para o trabalho habitual, em abril de 2010, aquando da alta pela companhia de seguros.
(…)
3. Avaliação
Alterações funcionais com o evento traumático com impacto no domínio profissional
O examinado apresenta alterações das funções neuromusculoesqueléticas e relacionadas com o movimento ao nível do ombro direito (limitação da flexão, extensão e elevação do membro superior direito, dificultando a movimentação manual de cargas físicas) e também ao nível do tornozelo direito (limitação dos movimentos de flexão e extensão, o que dificulta a marcha, sobretudo em pisos irregulares e ultrapassar desníveis como por exemplo as escadas verticais dos andaimes.
Descrição das atividades que integram o conteúdo funcional da profissão habitual e das exigências funcionais requeridas
Como ajudante de pedreiro o examinado desempenhava as seguintes tarefas:
● Proceder à seleção de materiais, equipamentos e ferramentas a utilizar de acordo com o serviço atribuído pelo encarregado da obra;
● Carregar, descarregar e transportar, manualmente ou com auxílio de equipamento adequado, materiais, equipamentos e ferramentas;
● Executar elementos como vigas, pilares, lajes e outros em betão;
● Confecionar argamassas (como por exemplo cimento) e trnasportá-las para os locais de utilização;
● Assentar tijolos e blocos de betão com recurso a ferramentas adequadas e a argamassas;
● Executar rebocos de paredes e tetos;
● Proceder a desmontes e demolições;
● Assegurar a limpeza e conservação de máquinas, ferramentais e locais de obra.
As tarefas descritas executam-se com o apoio de ferramentas manuais e mecânicas, com recurso aos membros inferiores e superiores, requerendo significativa força muscular, agilidade e destreza, apelando à capacidade para levantar, transportar, mover e manusear objetos de peso e dimensão diversa. São ainda exigidas constantes deslocações por diferentes níveis e estruturas.
Impactos das limitações funcionais no desempenho da profissão habitual
O examinado, enquanto ajudante de pedreiro, e de acordo com as tarefas anteriormente descritas, necessita com frequência de transportar manualmente diversos materiais (sacos de cimento, blocos, tijolos), ferramentas e equipamentos (martelo pneumático, por exemplo) com que opera, tarefas essas que não consegue desempenhar com as limitações funcionais descritas.
Pelo exposto, somos de opinião que o examinado se encontra com incapacidade permanente absoluta para o seu trabalho habitual.
Funções profissionais compatíveis com o estado funcional
O maior impacto do acidente no desempenho profissional do examinado encontra-se, como anteriormente referido, ao nível dos membros superior e inferior direitos, condicionando o desempenho por parte do examinando de quaisquer funções profissionais que necessitem do contributo pleno e funcional dos mesmos. Assim, o seu atual perfil funcional será compatível com a ocupação de um posto de trabalho cujo conteúdo funcional envolva atividade dos membros superiores, mas sem grande exigência física, como seja, vigilante ou porteiro, telefonista ou empregado de receção, caixa ou bilheteiro.
(…)
Conclusões
Somos de parecer que o examinando se encontra com incapacidade permanente absoluta para a profissão habitual. (…)”.

14. Em consequência do acidente o A. ficou a padecer das lesões descritas nos mencionados autos de exame por junta médica, tendo tido alta definitiva aos 21.04.2010.
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IV. Fundamentação

1. Nos termos do disposto nos arts 635º, nº 4, e 639º, nº 1, do CPC aprovado pela Lei 41/2013, de 26.06, aplicável ex vi do art. 1º nº 2 al. a) do CPT (redação do DL 295/2009, de 13.10, tendo em conta a data da instauração da ação, aos 03.04.2010, com o envio da participação do acidente), as conclusões formuladas pelos recorrentes delimitam o objeto do recurso, não sendo lícito ao tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo as de conhecimento oficioso.
Assim, a única questão suscitada pelo Recorrente consiste em saber se as lesões de que se encontra afetado lhe determinam incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual (IPATH). E, em caso de procedência de tal questão, haverá que proceder ao cálculo da pensão devida e apreciar, ainda que oficiosamente, do direito ao subsídio por situação de elevada incapacidade.

2. Da IPATH

2.1. Na sentença recorrida referiu-se apenas o seguinte:
“Reunida a junta médica os srs. Peritos médicos consideraram, justificadamente, por maioria, que o sinistrado tinha uma IPP de 58,20% (já com aplicação do Factor de Bonificação 1,5).
Aquelas posições não merecem qualquer reparo, encontrando-se fundamentadas na TNI”.

2.2. Ao caso, tendo em conta a data do acidente de trabalho – 01.04.2009 – é aplicável o regime jurídico constante da Lei 100/97, de 13.09 (cfr. art. 187º, nº 1, da Lei 98/2009, de 04.09)
Antes de mais importa referir que o laudo pericial da junta médica não tem força vinculativa obrigatória, estando sujeito à livre apreciação do julgador, sem prejuízo, todavia, de a eventual divergência dever ser fundamentada em outros elementos probatórios que, por si ou conjugadamente com as regras da experiência, levem a conclusão contrária, sendo certo que o juiz não dispõe de conhecimentos técnico-científicos necessários a um julgamento que envolva o recurso a tais conhecimentos.
Mas, importa também referi-lo, no que se reporta à determinação da existência ou não de IPATH, definidas e enquadradas que sejam, na TNI, as lesões que o sinistrado apresente (esta a questão de cariz essencialmente técnico/médico), o juízo a fazer quanto a saber se as mesmas determinam ou não incapacidade absoluta para o trabalho habitual passa, também pela apreciação de diversos outros aspetos, como o tipo de tarefas concretas que a profissão do sinistrado envolve, conjugado, se for o caso, com as regras do conhecimento e experiência comuns, o que extravasa um juízo puramente técnico-científico.

2.3. Dispõe o art. 17º, nº 1, da Lei 100/97 que: “1. Se do acidente resultar redução na capacidade de trabalho ou ganho do sinistrado, este terá direito às seguintes prestações: a) …; b) Na incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual: pensão anual e vitalícia compreendida entre 50% e 70% da retribuição, conforme maior ou menor capacidade funcional residual para o exercício de outra profissão compatível e subsídio por situações de elevada incapacidade permanente. (…)”.
E o nº 10 das Instruções Gerais da TNI, aprovada pelo DL 35272007, de 23.10, refere que “na determinação da incapacidade global a atribuir devem ser ponderadas as efectivas possibilidades de reabilitação profissional do sinistrado, face às suas aptidões e às suas capacidades restantes. Para tanto, sempre que seja considerado adequado ou conveniente, podem as partes interessadas ou o Tribunal solicitar parecer às entidades competentes nas áreas do emprego e formação profissional, sobre as efectivas possibilidades de reabilitação do sinistrado.”, norma esta que tem paralelo no art. 41º, nº 2, do DL 143/99, de 30.04, nos termos do qual “2. Sempre que haja lugar à aplicação do disposto na alínea b) do nº 1 do artigo 17º e no nº 1 do artigo 19º da lei, o juiz pode requisitar o parecer prévio de peritos especializados, designadamente do Ministério do Trabalho e da Solidariedade.”, pareceres estes que, no caso, foram solicitados e na sequência do que, para além da análise do posto de trabalho (nº 13, al. b), das Instruções Gerais da TNI), foram emitidos os pareceres, de fls. 201/202, pelo IEFP (médico especialista em Medicina do Trabalho) e de fls. 236/237, pelo Centro de Reabilitação Profissional de Gaia.
O exercício de uma profissão é caracterizada pela execução, e necessidade dessa execução, de um conjunto de tarefas que constituem o núcleo essencial dessa profissão.
Como diz José Augusto Cruz de Carvalho, in Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais, 2ª Edição, 1983, Livraria Petrony, considerações que, sendo embora tecidas a propósito da Base XVI, nº 1, al. b), da então Lei 2127, de 3.08.65, são aplicáveis no âmbito do art. 17º da Lei 100/97, que “a fixação do regime especial para os casos da al. b), resultou da consideração lógica (consagrada em legislação estrangeira) de que a incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual é sempre mais grave do que uma diminuição parcial da mesma amplitude fisiológica, não só pela necessidade de reeducação profissional, exigindo por isso uma compensação maior”.

2.4. De acordo com o laudo emitido pela junta médica as lesões que o A. apresenta foram enquadradas:
- No Capítulo I.3.2.7.1.a) da TNI, que se reporta à “Mobilidade do ombro - Imobilidade (anquilose) e limitação da mobilidade (rigidez)” “em boa posição (permite levar a mão à boca”, a que corresponde um coeficiente de desvalorização de 0,25 a 0,30, havendo sido atribuído, no caso concreto, o de 0,30;
- No Capítulo I.3.2.2.b) da TNI, que se reporta a “Luxação da clavícula” “Externa (acrómio-clavicular)”, a que corresponde, no lado ativo, um coeficiente de desvalorização de 0,00 a 0,06, havendo sido atribuído, no caso concreto, o de 0,06;
- No Capítulo I.14.2.2.1.a) da TNI, que se reporta ao tornozelo, “limitação (rigidez) da articulação tíbio-társica”, “na flexão”, “mobilidade entre 0º e 10º”, a que corresponde um coeficiente de desvalorização de 0,04 a 0,07, havendo sido atribuído, no caso concreto, o de 0,07.
A junta médica, por maioria (peritos da Seguradora e do Tribunal) entendeu que o A. não se encontra afetado de IPATH por considerar que o mesmo “não se encontra totalmente incapaz de exercer a sua profissão, pois existem certas tarefas que pode realizar no âmbito da sua profissão (tais como proceder à selecção de materiais, ferramentas e equipamentos, confeccionar argamassas, assegurar limpeza e conservação de máquinas, entre outras, conforme descrito a fls. 237 e 237), devendo ser reconvertido no seu posto de trabalho” [de referir que, no exame médico singular, que teve lugar na fase conciliatória do processo, o Sr. perito médico não atribuiu IPATH, sem que, todavia, haja fundamentado essa não atribuição].
Por sua vez, o perito do sinistrado, bem como o perito médico do IEFP e o Centro de Reabilitação Profissional de Gaia (CRPG) entenderam que, face às limitações físicas que apresenta e às tarefas que se compreendem na profissão do A. (de pedreiro/“ajudante de pedreiro”), o mesmo se encontra afetado de IPATH, mais considerando o CRPG que a reconversão do A. o poderia ser em profissões cujo “conteúdo funcional envolva atividade dos membros superiores, mas sem grande exigência física, como seja, vigilante ou porteiro, telefonista ou empregado de receção, caixa ou bilheteiro.”.
Tendo em conta:
- o conteúdo funcional das tarefas próprias da profissão do A. descritas no relatório elaborado pelo IEFP de fls. 132 a 147 que aqui se têm por reproduzidas e as capacidades exigidas para a execução das mesmas, também descritas nesse relatório [necessidade adoção de variadas posições , designadamente de joelhos, curvado, subir e descer escadas; levantar, baixar e transportar nos braços /ou ombros pesos que podem atingir 50 Kg, esforço de empurrar/puxar pesos (máquinas de distribuição de betão e compressores), coordenação mão-braço, pé-pé, firmeza e controlo muscular contínuo, nomeadamente quando o trabalhador opera com os vibradores de betão, com as mangueiras e distribuição de betão ou com o martelo pneumático; na execução das tarefas próprias desses trabalho são, essencialmente, mobilizados, para além das mãos, braços, pernas e pés; necessidade de trabalhar, para além do mais, com ambos os brações estendidos em frente e/ou com os braços acima do nível dos ombros; necessidade de, frequentemente, trabalhar em posições de equilíbrio instável, nomeadamente quando trabalha em andaimes, em cima de cofragens ou em cima do betão, no seu espalhamento; necessidade de se deslocar em terreno acidentado.];
- As lesões/sequelas de que padece e as limitações funcionais delas consequentes, bem como os pareceres do IEFP e do Centro de Reabilitação de Gaia e as regras da experiência comum,
Não podemos deixar de considerar que o A. se encontra absolutamente incapacitado para o exercício da sua profissão habitual de servente/ajudante de pedreiro.
Com efeito, decorre dos referidos pareceres o A. não pode “utilizar o membro superior direito, não pode carregar, transportar, descarregar, manualmente ou com o auxílio de equipamento adequado, materiais (massa, areias, cimento, tijolos, blocos), equipamento e ferramentas, de acordo com o serviço a realizar, operar manualmente os vibradores de betão, não podendo também subir e descer escadas, nem podendo transportar pesos que possam atingir os 50 Kgs.”. Resulta ainda do exame por junta médica que o A. apresenta rigidez do ombro direito que lhe permite apenas levar a mão à boca, o que, praticamente, apenas lhe permite o movimento do antebraço direito (o seu lado ativo). Ora, tal não se nos afigura, de forma alguma, compatível com a possibilidade do enchimento de cofragens com betão, carregar uma betoneira de diversos materiais, assentar manualmente tijolos e blocos de betão, colocação de argamassas, execução de reboco de paredes e tetos, efetuar desmontes e demolições e utilização de ferramentas, designadamente martelos pneumáticos. Trata-se de profissão cujas tarefas que a integram requerem força, capacidade e mobilidade físicas de que o A., face às sequelas que apresenta tanto nos membros superior e inferior direitos, não dispõe.
Acresce dizer que, também de acordo com o parecer do Centro de Reabilitação Profissional de Gaia, todas as profissões passíveis de virem a ser desempenhadas pelo A. nele indicadas, designadamente vigilante, porteiro, telefonista, rececionista, caixa bilheteiro, nada têm a ver com a sua profissão habitual, o que leva a concluir que o mesmo se encontra absolutamente incapaz para o exercício da mesma.
E, salvo melhor opinião, não se nos afigura procedente o parecer maioritário da junta médica. Concretizando a possibilidade de o A. manter o exercício do seu trabalho habitual, diz esta que o mesmo pode proceder à seleção de materiais, de ferramentas e de equipamentos, bem como confecionar argamassas e assegurar a limpeza e conservação de máquinas.
No que se reporta à seleção de materiais, ferramentas e equipamentos, consubstancia isso tarefa absolutamente residual do trabalho habitual de um pedreiro ou ajudante de pedreiro, não podendo ninguém manter essa profissão apenas com a execução dessa tarefa.
Quanto à confeção de argamassas e limpeza e conservação de máquinas afigura-se-nos que as mesmas exigem, igualmente, capacidade de mobilidade, nos seus vários movimentos, do braço direito.
Para além das referidas tarefas, nenhumas outras são indicadas pela junta médica ou pela sentença recorrida que sejam suscetíveis de continuarem a ser executadas pelo A., limitando-se o mais referido pela junta a considerações meramente conclusivas, tais como a de que o A. “mantém a capacidade para o exercício da sua profissão na proporção da capacidade restante”.
Em face do exposto, entendemos que o A. se encontra afetado de IPATH para o exercício do seu trabalho habitual de ajudante de pedreiro, incapacidade essa extensiva também à profissão de pedreiro.
E, assim sendo, procedem as conclusões do recurso.

3. Da IPATH e do fator de bonificação de 1,5

A junta médica e a sentença recorrida, que aderiu àquela, aplicou, sobre a IPP atribuída, o fator de bonificação de 1,5 previsto no nº 5, al. a), das Instruções Gerais da TNI, sendo que, aí e como já referido, consideraram os Srs. Peritos médicos, por maioria, que o A. não se encontrava afetado de IPATH e que, por consequência, seria de lhe atribuir tal bonificação.
Havendo-se, no presente acórdão, decidido que o A. se encontra afetado de IPATH impõe-se apreciar da questão de saber se, sobre a IPP de que se encontra afetado para o exercício de outra profissão, deverá, ou não, ser aplicado o mencionado fator. Ou seja, atenta a revogação da sentença recorrida, importa também apreciar da questão, que é de natureza meramente jurídica e de conhecimento oficioso, de saber se a atribuição de tal fator é ou não cumulável com uma incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual (IPATH).

3.1. Dispõe a mencionada instrução que:
“Os coeficientes de incapacidade previstos são bonificados, até ao limite da unidade, com uma multiplicação pelo factor 1,5, segundo a fórmula: IG + (IG x 0,5), se a vítima não for reconvertível em relação ao posto de trabalho ou tiver 50 anos ou mais quando não tiver beneficiado da aplicação desse factor.”.
Sendo que, na correspondente instrução constante da anterior TNI (então aprovada pelo DL 341/93, de 30.09 e revogada pela acima mencionada), se dispunha que: “Sempre que se verifique perda ou diminuição de função inerente ou imprescindível ao desempenho do posto de trabalho que ocupava com carácter permanente, os coeficientes de incapacidade previstos são bonificados com uma multiplicação pelo factor 1,5, se a vítima não for reconvertível em relação ao posto de trabalho ou tiver 50 anos ou mais.”
Do referido facilmente se conclui que deixou de constituir requisito da atribuição do aludido fator de bonificação a perda ou diminuição de função inerente ou imprescindível ao desempenho do posto de trabalho, continuando todavia a exigir-se, em alternativa, que ou o sinistrado não seja reconvertível em relação ao posto de trabalho ou que tenha 50 anos ou mais.
No caso verifica-se um dos referidos pressupostos, pois que o A. se encontra afetado de uma incapacidade permanente absoluta para o seu trabalho habitual, do que manifestamente decorre que não é reconvertível no seu posto de trabalho (quanto ao segundo, o sinistrado nasceu aos 01.01.1980, conforme referido no auto de tentativa de conciliação, pelo que não tem 50 anos).

3.2. A questão da possibilidade de cumulação da IPATH com a atribuição do fator de bonificação de 1,5 não é nova, sendo a jurisprudência do STJ uniforme e reiterada no sentido de que nada impede tal cumulação, acórdãos esses de que citamos, a título exemplificativo, os de 19.03.2009, Processo 08S3920, de 29.03.2012, proferido no Processo 307/09.1TTCTB.C1.S1, e de 05.03.2013, proferido no Processo 270/03.2TTVFX.1.L1.S1, todos consultáveis in www.dgsi.pt e que passaremos a transcrever:

3.2.1. Assim, no primeiro dos mencionados Acórdãos (19.03.2009), refere-se que:

“2. Importa, então, ajuizar se, ocorrendo incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual, na determinação do valor final da incapacidade é aplicável uma bonificação, consistente na multiplicação pelo factor 1,5, conforme o estipulado na alínea a) do n.º 5 das «Instruções gerais» da Tabela Nacional de Incapacidades por Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais (TNI), aprovada pelo Decreto-Lei n.º 341/93, de 30 de Setembro.
No domínio de aplicação da sobredita TNI, este Supremo Tribunal teve a oportunidade de se pronunciar acerca da questão enunciada, no acórdão de 16 de Junho de 2004, Processo n.º 1144/04, da 4.ª Secção (Secção Social), cuja orientação foi reafirmada no acórdão de 2 de Fevereiro de 2005, Processo n.º 3039/04, da 4.ª Secção, que concluiu no sentido de que «[t]endo o sinistrado ficado afectado de uma IPP de 61% e incapaz para o exercício da profissão habitual, a tal grau de incapacidade deve ser aplicado, para efeitos do cálculo do valor da pensão, o factor de bonificação de 1,5 previsto no n.º 5, alínea a), das Instruções Gerais da TNI, não sendo este «incompatível com as disposições da Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro, nomeadamente com o preceituado no n.º 1, alínea b), do [seu] artigo 17.º»
(…)
Para que se verifique a falada bonificação, a par da perda ou diminuição de função inerente ou imprescindível ao desempenho do posto de trabalho que ocupava com carácter permanente, exige-se que a vítima não seja reconvertível em relação ao posto de trabalho ou que tenha 50 anos de idade ou mais.
No caso vertente, resulta da factualidade apurada nos autos que a sinistrada desempenhava as funções de trabalhadora rural e que, em consequência das lesões sofridas no acidente, apresentava «[r]igidez do ombro direito e sequelas de lesão do nervo circunflexo», sendo-lhe atribuída a «IPP de 31,8%, com incapacidade para a profissão habitual», pelo que, atentas as funções exercidas pela sinistrada, verifica-se perda de função inerente e imprescindível ao desempenho do seu posto trabalho.
Assim sendo, e porque a sinistrada nasceu em 7 de Abril de 1952, tendo, à data do acidente e da alta, mais de 50 anos, na fixação do grau de incapacidade permanente devia ter sido levado em conta o questionado factor 1,5 de bonificação.
Tal como pondera a Ex.ma Procuradora-Geral-Adjunta, não se justifica «que se faça uma interpretação diferente quando estamos ou não estamos perante uma situação de IPATH. Na verdade, mal se compreende que se trate de modo diferente uma situação em que o sinistrado continue a desempenhar o seu trabalho habitual com mais esforço, e uma situação em que esteja impedido permanente e absolutamente de o realizar. É que, pelo menos, teoricamente, em qualquer dos casos, haverá sempre que ter em conta o esforço que é exigido ao trabalhador para o desempenho de outros trabalhos, quando o mesmo está afectado de uma IPATH, traduzido, como não pode deixar de ser, no esforço que terá de desenvolver para se adaptar a novas funções, quanto mais não seja, e é o caso, quando o trabalhador já ultrapassou uma determinada idade (mais de 50 anos), devendo tal esforço ser também […] compensado com a aplicação do factor de bonificação aqui em causa.»».

3.2.2. No segundo dos Acórdãos citados (29.03.2012), diz-se que:
« (…)
Reapreciada a questão, sufraga-se inteiramente a fundamentação transcrita, que tem perfeito cabimento no caso em apreciação.
Na verdade, mal se compreenderia que se tratasse de modo diferente uma situação em que o sinistrado continuasse a desempenhar o seu trabalho habitual com mais esforço, e uma situação em que estivesse impedido permanente e absolutamente de o realizar. É que, em qualquer dos casos, haverá que ter em conta o esforço que é exigido ao trabalhador para desempenhar a sua actividade profissional, traduzido, quando o mesmo está afectado de uma IPATH, no esforço que terá de desenvolver para se adaptar a novas funções, devendo o mesmo ser também compensado com a aplicação do factor de bonificação em apreciação.
Acresce que não se desenha qualquer incompatibilidade entre a aplicação do assinalado factor de bonificação e o estipulado na alínea b) do n.º 1 do artigo 17.º da Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro, como pretende a seguradora recorrente, porquanto uma coisa é o cálculo da prestação por incapacidade devida ao sinistrado, operado nos termos da citada alínea, outra é a aplicação da questionada bonificação.
No caso, resulta da factualidade apurada que o sinistrado foi vítima de um acidente quando, como supervisor de construção, procedia à verificação/orientação dos trabalhos de colocação de laje de cimento em cima de um andaime e este partiu, tendo caído de cabeça no chão, o que lhe causou sequelas neurológicas graves, que lhe determinaram uma IPP de 53% (0,53), com IPATH.
Ora, a não reconvertibilidade do sinistrado em relação ao posto de trabalho resulta da reconhecida incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual, atentas as sequelas resultantes do acidente de trabalho que sofreu.
Justifica-se, pois, a bonificação do valor final da incapacidade com base na multiplicação pelo factor 1,5 previsto na alínea a) do n.º 5 das «Instruções gerais» da Tabela Nacional de Incapacidades, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 352/2007, de 23 de Outubro, pelo que improcedem as conclusões da alegação do recurso de revista.”. [sublinhado nosso]

3.2.3. E, no mesmo sentido, no terceiro dos Acórdãos mencionados (05.03.2013) refere-se o seguinte:
«“Não se sufragando a solução eleita no Acórdão sub judicio – como se adianta desde já – os conhecidos argumentos da recorrida, respeitáveis embora, não são seguramente razão bastante, susceptível de induzir-nos à reponderação/alteração do entendimento, há muito firmado e mantido, de modo reiterado e pacífico, neste Supremo Tribunal e Secção.
Com efeito – como ainda recentemente se proclamou no Acórdão de 24.10.2012, tirado na Revista n.º 380/10.4TTOAZ.P1.S1, em que interviemos e que, por óbvias razões, acompanhamos de muito perto –, não ocorre incompatibilidade entre o estatuído na alínea b) do n.º 1 do art. 17.º da LAT/Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro, e na alínea a) do n.º 5 das Instruções Gerais da TNI, podendo cumular-se os benefícios nela estabelecidos.
Valendo aqui igualmente a fundamentação expendida (e oportunamente usada também no Acórdão desta Secção tirado na revista n.º 307/09.1TTCTB.C1.S1, de 29.3.2012, a que se alude no Aresto acima citado), transcrevemos dele o excerto seguinte:
(…)
Considerando apenas como relevante a verificação de um dos dois requisitos postulados – …sem embargo de, à data em que é reconhecida a diminuição decorrente da IPATH, o sinistrado já ter mais de 50 anos – diremos, como também se concluiu e aqui se não discute, que, atenta a natureza da actividade profissional por si desenvolvida e as lesões permanentes de que ficou afectado, a hipótese da reconversão profissional do sinistrado, relativamente ao seu posto de trabalho, não seria realmente equacionável, resultando aliás como corolário inevitável da reconhecida incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual.
A equânime compreensão da realidade subjacente a ambas as situações não consente outra leitura da falada Instrução da TNI, ou seja, não se vê justificação plausível para que se trate diversamente o caso em que o sinistrado continua a desempenhar o seu trabalho habitual, com mais esforço, e aquele em que o mesmo esteja impedido, permanente e absolutamente, de o realizar: em qualquer dos casos – usando as palavras certas do citado Acórdão de 24.10.2012 – haverá que ter em conta o esforço que é exigido ao trabalhador para desempenhar a sua actividade profissional, traduzido, quando o mesmo está afectado de IPATH, no acrescido sacrifício que terá de desenvolver para se adaptar a novas funções, devendo por isso o mesmo ser também compensado com a aplicação do factor de bonificação em apreciação.
Procedem, assim, as conclusões da motivação recursória, pelo que, sendo devida a bonificação do valor final da incapacidade, multiplicada, por isso, pelo factor 1,5, o ajuizado em contrário não pode subsistir, havendo que revogar o respectivo segmento decisório do Acórdão sob censura.». [realce a negrito nosso]

3.2.4. Por fim, mas não menos importante, o STJ, no seu Acórdão nº 10/2014, de 28.05.2014, in DR, I Série, de 30.06.2014, uniformizou jurisprudência no sentido de que «[a] expressão “se a vítima não for reconvertível em relação ao posto de trabalho”, contida na alínea a) do n.º 5 das Instruções Gerais da Tabela Nacional de Incapacidades por Acidente de Trabalho ou Doenças Profissionais, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 352/2007, de 23 de Outubro, refere-se às situações em que o sinistrado, por virtude das lesões sofridas, não pode retomar o exercício das funções correspondentes ao concreto posto de trabalho que ocupava antes do acidente.», referindo-se, a dado passo da sua fundamentação, que:
“(…) aquele segmento normativo «não reconvertível em relação ao posto de trabalho», como pressuposto da bonificação prevista naquela alínea, refere-se às situações em que o sinistrado não pode retomar o exercício das funções correspondentes ao posto de trabalho que desempenhava antes do acidente.
A reconversão em relação ao posto de trabalho prevista naquela norma materializa-se no regresso do sinistrado ao desempenho das funções que tinha quando ocorreu o acidente, apesar das limitações em termos de capacidade que trabalho que do mesmo decorreram.
Pode, assim, afirmar-se que um trabalhador que foi vítima de um acidente de trabalho é reconvertido em relação ao posto de trabalho que tinha antes do acidente quando o pode retomar, apesar das limitações funcionais de que seja portador em consequência do acidente sofrido.
Quando esse regresso não seja possível, quando essa retoma não seja possível, o trabalhador não é susceptível de reconversão nesse posto de trabalho.
(…)
Adite-se que na linha da jurisprudência definida nesta secção os casos de IPATH são situações típicas de não reconvertibilidade do sinistrado em relação ao seu anterior posto de trabalho.
(…)”

3.3. Do transcrito decorre, pois, que não existe incompatibilidade entre a atribuição de IPATH e do fator de bonificação, sendo aquela uma das situações típicas em que, precisamente, deverá ser atribuído tal fator. Mais decorre que a irreconvertibilidade no posto de trabalho é a consequência ou corolário inevitável da incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual.
Com efeito, o requisito relativo à irreconvertibilidade no posto de trabalho reporta-se ao “posto de trabalho” do sinistrado, ou seja, ao conjunto de funções que integram a atividade profissional que o mesmo desempenhava, pelo que, se foi ao sinistrado atribuída uma IPATH, tal significa, necessariamente, que o mesmo está, de forma permanente e absoluta, incapacitado para desempenhar a sua atividade profissional habitual; e se assim é, não se vê como possa o mesmo ser reconvertível nessa mesma atividade/posto de trabalho.
Deste modo, e em conclusão, a existência de IPATH não é incompatível com a atribuição do fator 1,5, pelo que, ainda que com fundamento diferente do considerado pela junta médica, é de manter a atribuição de tal fator.

4. Considerando que o A. se encontra afetado de IPATH com uma IPP de 58,20% (está já com a aplicação do mencionado fator de bonificação) para o exercício de outra profissão e o disposto no art. 17º, nº 1, al. b), e 26º da Lei 100/97, tem o A. direito, com efeitos a partir de 22.04.2010, dia imediato ao da alta definitiva, à pensão anual e vitalícia de €4.629,16, atualizável nos termos legais, que deverá ser calculada de acordo com a seguinte fórmula e não com base em 70% da retribuição anual como refere o Recorrente:
- €7.510,00 [€450,x14+€110,00 x11] x 50%=€3.755,00
- €3.755,00 x 70% = €5.257,00
- €5.257,00 – €3.755,00= €1.502.00
- €1.502,00 x 58,20% = €874,16
- €3.755,00 + €874,16 = €4.629,16.
Com efeito, entendemos que tal fórmula matemática é o modo de cálculo que mais conforme se mostra com a do letra art. 17º, nº 1, al. b) da Lei 100/97, exigindo esta que se pondere a maior ou menor capacidade funcional residual para o exercício de outra profissão, fórmula essa que permite, assim, determinar com um mínimo de objetividade o grau de capacidade residual relevante na fixação da pensão, privilegiando os valores da certeza e segurança jurídicas. Aliás esta é a posição largamente maioritária na jurisprudência quanto ao modo de cálculo da pensão.

Tal pensão é devida desde 22.04.2010, dia imediato ao da alta definitiva, sendo atualizável nos termos legais, e devendo o seu pagamento ser efetuado mensalmente, até ao terceiro dia de cada mês correspondendo cada prestação a 1/14 da pensão e sendo os subsídios de férias e de Natal, no valor, cada um, de 1/14 da pensão pagos nos meses de maio e novembro e devendo o pagamento das prestações já vencidas ter lugar, de uma só vez, com o pagamento da primeira prestação que tenha lugar após o trânsito em julgado do presente acórdão.
Sobre as prestações já vencidas são devidos juros de mora, à taxa legal, desde a data do vencimento de cada uma das prestações em dívida (art. 135º do CPT).

5. Do subsídio por situação de elevada incapacidade permanente

Atenta a incapacidade do A. (IPATH com 58,20% de IPP para outra profissão) tem o mesmo direito ao subsídio por situação de elevada incapacidade permanente previsto no art. 23º da Lei 100/97, nos termos do qual “A incapacidade permanente absoluta ou a incapacidade permanente parcial igual ou superior a 70% confere direito a um subsídio igual a 12 vezes a remuneração mensal garantida à data do acidente, ponderado pelo grau de incapacidade fixado, sendo pago de uma só vez aos sinistrados nessas situações.”.
Diga-se que o A. não requereu, no auto de tentativa de conciliação que teve lugar na fase conciliatória do processo, nem posteriormente, a atribuição de tal subsídio.
Não obstante, o direito à reparação dos danos emergentes de acidente de trabalho, no qual se inclui, também, a mencionada prestação, tem natureza indisponível, resultando de preceito inderrogável da lei – arts. 34º e 35º da citada Lei 100/97 e 26º, nºs 1, al. e) e 3 do CPT.
Nos termos do art. 74º do CPT “o juiz deve condenar em quantidade superior ao pedido ou em objeto diverso dele quando isso resulte da aplicação à matéria provada, ou aos factos de que possa servir-se, nos termos do artigo 514º do Código de Processo Civil, de preceitos inderrogáveis de leis (…)”.
E, por outro lado, nos termos do disposto no art. 608º, nº 2, do CPC/2013, para além das questões suscitadas pelas partes, deve o juiz, no caso este Tribunal da Relação, pronunciar-se sobre questões que sejam de conhecimento oficioso.
Assim, e nos termos das citadas disposições, impõe-se a esta Relação o conhecimento de tal questão.

5.1. Discutiu-se, no âmbito da citada Lei se, em caso de IPATH, o subsídio será devido na totalidade ou se, no seu cálculo, deverá ser ponderado o coeficiente de desvalorização da IPP (para o exercício de outra atividade). E, desde já adiantando, dir-se-á que, no âmbito da Lei 100/97 que é a aplicável ao caso, se sufraga o primeiro dos mencionados entendimentos na esteira, aliás, da jurisprudência do STJ sobre essa questão.
Como decorre do art. 17º do mesmo diploma, a incapacidade permanente pode ser absoluta ou parcial. E, aquela, pode ser absoluta para todo e qualquer trabalho (IPA) [nº 1, al.a)] ou absoluta para o trabalho habitual (IPATH) [nº 1, al.b)].
Desde logo, e salvaguardando o devido respeito por opinião contrária, a letra do art. 23º aponta no sentido da interpretação de que o subsídio será devido por inteiro tanto nos casos de IPA, como nos de IPATH, apenas sendo de ponderar o grau de IPP nas situações em que o sinistrado apresenta (apenas) uma IPP superior a 70%.
Com efeito, ao dispor como dispôs, o legislador não desconhecia que a incapacidade permanente absoluta tanto poderia ser para todo o trabalho ou apenas para o trabalho habitual e, apesar disso e da diferenciação que fez no art. 17º para efeitos de determinação da pensão, o certo é que, no art. 23º, não efetuou qualquer distinção. Ora, onde o legislador não distingue, não se nos afigura que deva o intérprete distinguir, tanto mais quando se nos afigura seguro, quer da letra da lei, quer do confronto com o referido art. 17º, que não pretendeu fazê-lo. E, nos termos do art. 9º, nº 3, do Cód. Civil há que presumir que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados. Ora, se tivesse sido intenção do legislador, nos casos de IPATH, atribuir relevância à ponderação do grau de IPP certamente que teria utilizado, na formulação do preceito, diferente redação.
Por outro lado, nas situações de incapacidade permanente absoluta, a atribuição prende-se e justifica-se, essencialmente, em função da natureza e finalidade desse subsídio e da natureza absoluta da incapacidade, seja ela para todo e qualquer trabalho, seja apenas para o trabalho habitual, enquanto que nas situações de incapacidade apenas parcial ela se justifica face ao elevado grau de incapacidade (superior a 70%), o qual, podendo variar, determinará a correspondente ponderação.
Acresce que no sentido da interpretação que perfilhamos, já acolhida em arestos anteriores, pronunciou-se também o nosso mais alto tribunal, entre outros[3], no Acórdão de 02.02.2006, in www.dgsi.pt, Proc 05S3820, no qual, para além do mais, se refere que na determinação da pensão já é tida em conta a diferenciação das situações de IPA e de IPATH, pois que o facto de o sinistrado com IPATH vir a auferir um pensão de menor valor monetário pressupõe já a eventual compensação que poderá obter através da sua capacidade residual de ganho, e que resulta de ter ficado afectado para o exercício da sua normal actividade profissional, mas não para toda e qualquer actividade profissional.
Por outro lado, a circunstância de a lei não ter efectuado a distinção entre as duas situações no tocante ao cálculo do subsídio de elevada incapacidade permanente tem a sua razão de ser na própria teleologia da prestação pecuniária que está em causa. A pensão anual e vitalícia por incapacidade destina-se a compensar o sinistrado pela desvalorização funcional de carácter permanente que resultou do acidente, e assim se compreende que o valor dessa pensão acompanhe, durante a sobrevida do interessado, a proporção da perda da capacidade de trabalho que o afecta. Ao contrário, o subsídio, com um valor pré-determinado e que é pago numa única vez, destina-se a facilitar a adaptação do sinistrado à sua situação de desvalorização funcional com perda de capacidade de ganho, permitindo-lhe porventura efectuar uma aplicação económica que lhe proporcione outros proventos ou reorientar a sua vida profissional para outro tipo de actividade. E, sendo essa a finalidade da lei, como tudo indica, não se descortina motivo bastante, do ponto de vista de política legislativa, para distinguir, nesse quadrante, entre a incapacidade permanente para todo e qualquer trabalho e a incapacidade permanente para o trabalho habitual, quando é certo que, mesmo nesta última situação, o sinistrado fica imediatamente impedido de exercer as tarefas para que se encontra profissionalmente habilitado e o aproveitamento da sua capacidade residual de trabalho está necessariamente dependente de uma reabilitação profissional que não só envolve encargos como poderá exigir uma demorada fase de preparação e adaptação.
(…)
O subsídio por situações de elevada incapacidade deve, pois, ser calculado com base na existência de uma incapacidade absoluta, já que o sinistrado, para além de ter ficado afectado por uma parcial desvalorização funcional, se encontra também permanentemente impossibilitado de exercer o seu trabalho habitual.
E, também nesse mesmo sentido, o acórdão do STJ de 04.05.2011, Processo 199/07.5TTVCT.P1.S1, in www.dgsi.pt.
Não se vê, pois, razão para, no domínio da Lei 100/97, alterar tal entendimento, sendo certo que a diferente solução legal constante do art. 67º da nova LAT (Lei 98/2009) não é aplicável ao caso, já que esta apenas se aplica aos acidentes de trabalho ocorridos após a data da sua entrada em vigor (01.01.2010). Refira-se, todavia, que esta reforça a interpretação por nós acolhida no âmbito da Lei 100/97 pois que o legislador, quando assim o pretendeu, veio a fazer tal distinção.

5.2. Deste modo, no caso, à data do acidente (01.04.2009) a remuneração mínima mensal garantida era a de €450,00 (DL 246/08, de 18.12), pelo que, nos termos do disposto no art. 23º da Lei 100/97, tem o A. direito a um subsídio por situação de elevada incapacidade permanente no montante de €5.400,00 (450,00 x 12).

O A. tem ainda direito, sobre a mencionada quantia, a juros de mora. Não prevendo a lei prazo certo para o seu pagamento e não havendo o mesmo sido reclamado nos autos, pelo que, em consequência, a Ré não foi, nos termos do art. 805º, nº 1, do Cód. Civil, interpelada para tal pagamento, os juros sobre a prestação em causa são devidos desde a data do trânsito em julgado da presente acórdão.

6. Resta apenas relembrar que a sentença recorrida condenou a Ré no pagamento da quantia de €30,00 a título de despesas de transporte, segmento esse que não foi impugnado e que, assim, transitou em julgado.
***
V. Decisão

Em face do exposto, acorda-se em conceder provimento ao recurso, em consequência do que se revoga a sentença recorrida, na parte impugnada, que é substituída pelo presente acórdão em que se decide:
A. Julgar que o A., B…, em consequência das lesões sofridas no acidente em apreço nos autos, se encontra afetado de incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual (IPATH) de ajudante de pedreiro, extensiva também à de pedreiro, e com uma IPP de 58,20% para o exercício de outra profissão;
B. Condenar a Ré, C… – Companhia de Seguros, SA, a pagar ao Autor, com efeitos a partir de 22.04.2010, dia imediato ao da alta definitiva, a pensão anual e vitalícia de €4.629,16, atualizável nos termos legais, pensão essa a pagar mensalmente, até ao terceiro dia de cada mês, correspondendo cada prestação a 1/14 da pensão e sendo os subsídios de férias e de Natal no valor, cada um, de 1/14 da pensão, pagos nos meses de maio e novembro e devendo o pagamento das prestações já vencidas ter lugar, de uma só vez, com o pagamento da primeira prestação que se vença após o trânsito em julgado do presente acórdão;
C. Condenar a Ré a pagar ao Autor, sobre as prestações já mencionadas em B), juros de mora, à taxa legal, desde a data do vencimento de cada uma das prestações em dívida até integral pagamento.
D. Condenar a Ré a pagar ao A. a quantia de €5.400,00 a título de subsídio por situação de elevada incapacidade, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a data do trânsito em julgado do presente acórdão.

Nos termos do disposto no art. 120º, nº 3, do CPT, fixa-se à ação o valor de €83.660,58.

Custas pela Recorrida.

Porto, 13.02.2017
Paula Leal de Carvalho
Jerónimo Freitas
Nelson Fernandes
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[1] Abreviatura de Instituto de Emprego e Formação Profissional.
[2] Bem como a primeira sentença que foi proferida.
[3] Cfr. também Acórdão do STJ de 14.11.07, in www.dgsi.pt, de 07S2716.