Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
7724/10.2TBMTS-B.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: HENRIQUE ARAÚJO
Descritores: PROCESSO CIVIL
ALTERAÇÃO DO ROL DE TESTEMUNHAS
CONTAGEM DO PRAZO
Nº do Documento: RP201505127724/10.2tbmts-B.P1
Data do Acordão: 05/12/2015
Votação: MAIORIA COM 1 VOT VENC
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: O rol de testemunhas pode ser aditado ou alterado até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final sendo a data a considerar a que designa dia para julgamento, independentemente de este se realizar ou não e de terem sido agendadas mais sessões em função do volume de prova a produzir.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: PROC. N.º 7724/10.2tbmts-B.p1
Da Comarca do Porto – Póvoa de Varzim – Instância Central – 2ª Secção Cível – J2.
REL. N.º 996
Relator: Henrique Araújo
Adjuntos: Fernando Samões
Vieira e Cunha
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ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO:

I. RELATÓRIO

“B…, CRL”, Autora nos autos acima identificados, em que é Ré “C…, S.A.”, interpôs recurso do despacho que lhe indeferiu o requerimento de alteração do rol de testemunhas.

O recurso foi admitido nesta Relação por decisão proferida em 24.03.2015, com subida em separado e com efeito devolutivo – cfr. fls. 42 a 45.

Nas alegações de recurso, a apelante pede a revogação do despacho impugnado, apoiando-se nas seguintes conclusões:
a) Em 22 de Outubro de 2014, foi a A. notificada que, por despacho de fls. (…), foi fixado o dia 17 de Novembro de 2014 para o início da audiência de julgamento, e, concretamente, para a produção da seguinte prova: visualização dos DVD's juntos aos autos por ambas as partes e inquirição das três primeiras testemunhas arroladas pela A;
b) A inquirição das restantes testemunhas será realizada na audiência agendada para o dia 15 de Janeiro de 2015;
c) No dia 31 de Outubro de 2014, a A. juntou aos autos um requerimento, solicitando a substituição de duas testemunhas indicadas no requerimento probatório atempadamente junto aos autos;
d) Estas duas testemunhas só seriam ouvidas no dia 15 de Janeiro de 2015;
e) O Tribunal a quo indeferiu o requerimento, por entender que não tinha sido respeitado pela A. o prazo previsto no artigo 598º CPC;
f) O artigo 598º CPC (que corresponde ao anterior artigo 512º-A CPC) flexibiliza o momento de apresentação dos meios probatórios, designadamente em relação à apresentação da prova testemunhal, permitindo que esta se faça até 20 dia antes da audiência de discussão e julgamento;
g) Este prazo pretende assegurar o contraditório, por um lado, e o normal prosseguimento do processo, por outro;
h) Estes princípios devem ser articulados com o direito das partes alterarem os seus requerimentos probatórios;
i) No caso concreto, o prazo que medeia entre a apresentação do requerimento para a substituição das testemunhas e a data da audiência em que estas serão ouvidas é cerca de dois meses e meio;
j) A A. cumpriu, por isso, o prazo de 20 dias e está assegurado o princípio do contraditório, bem como o normal desenvolvimento do processo;
l) Deverá ser, por isso, alterada a decisão de indeferimento do requerimento de substituição de duas testemunhas apresentadas pela A.
m) Não foi correctamente aplicado ao caso concreto o artigo 598º CPC.

Não houve contra-alegações.
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Sendo o objecto do recurso delimitado pelas conclusões da recorrente, a única questão que cumpre decidir é a de saber se deve ser admitida a alteração ao rol de testemunhas requerida pela Autora.
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II. FUNDAMENTAÇÃO

OS FACTOS

Para a decisão do recurso importa considerar os seguintes factos:

1. Em 13.09.2013, a Autora apresentou o seu requerimento de prova no qual arrolou 14 testemunhas (cfr. fls. 142 a 146 dos autos principais), que foi apenas admitido até à 10ª testemunha, considerando-se as outras não escritas (cfr. despacho de fls. 154, de 20.01.2014).

2. Por despacho proferido em 22.10.2014 foi determinado que a audiência de julgamento se haveria de iniciar às 9,45 horas do dia 17.11.2014, com o visionamento dos diversos registos videográficos juntos pelas partes, ordenando-se apenas a reconvocação das três primeiras testemunhas oferecidas pela Autora para as 12,00 horas desse mesmo dia.
Nesse mesmo despacho designou-se, desde logo, o dia 27.11.2014 para a continuação do julgamento, convocando-se para as 10,00 horas desse dias as 4ª, 5ª e 6ª testemunhas da Autora, as três seguintes para as 11,00 horas, a restante e as duas primeiras não comuns arroladas pela Ré para as 14,00 horas, e as três seguintes arroladas pela mesma Ré, não comuns, para as 14,00 horas e a restante para as 15,00 horas – cfr. fls. 16/17.

3. As partes foram notificadas desse despacho.

4. Em conclusão aberta em 29.10.2014, a secção informou o Mm.º Juiz de que a data de início de julgamento mereceu o acordo de ambas as partes, mas a data da continuação (27.11.2014) não contou com o assentimento do Ex.º mandatário da Ré.

5. Face a esta informação o Mm.º Juiz, nessa mesma data de 29.10.2014, mandou que se procedesse a novos contactos com os Ex.ºs mandatários das partes com vista à obtenção de consenso quanto à data da continuação do julgamento.

6. Em 31.10.2014, a Autora pediu a alteração do rol de testemunhas nos seguintes termos:
A A. requer a substituição da testemunha D… pela testemunha E… (…)
A A. requer a substituição da testemunha F… pela testemunha G… (…)”.

7. Em despacho proferido em 03.11.2014, precedido de informação da secção, o Mm.º Juiz designou o dia 15 de Janeiro de 2015 para a continuação da audiência de julgamento, em substituição do dia 27.11.2014 anteriormente designado, e ordenou a convocação das 4ª, 5ª e 6ª testemunhas da Autora para as 10,00 horas desse dia, as três seguintes para as 11,00 horas, a restante e as duas primeiras não comuns arroladas pela Ré para as 12,00 horas, as três seguintes, não comuns, arroladas pela Ré para as 14,00 horas e a restante para as 15,00 horas – cfr. fls. 21.
Neste despacho, o Mmº Juiz indeferiu, por intempestiva, a alteração ao rol de testemunhas requerida pela Autora e referida no antecedente ponto 6.

O DIREITO

Como dissemos, a única questão a resolver neste recurso é a de saber se o pedido de alteração do rol de testemunhas deduzido pela apelante devia ter sido admitido.
É sabido que o CPC aprovado pela Lei 41/2013, de 26 de Junho, passou a impor às partes o ónus de apresentarem os seus requerimentos probatórios nos respectivos articulados – cfr. artigos 552º, n.º 2, e 572º, alínea d).
Anteriormente não era assim. As partes apresentavam esses requerimentos, em regra, no prazo de 15 dias a contar da notificação do despacho saneador – artigo 512º do CPC.
Apesar de a presente acção se ter iniciado antes da entrada em vigor do actual CPC, será à luz das disposições do novo CPC que terá de apreciar-se a questão colocada no recurso, atento o disposto no n.º 1 do artigo 5º da Lei 41/2013.
A alteração do requerimento probatório e o aditamento ou alteração ao rol de testemunhas vêm regulados no artigo 598º, dizendo o n.º 1 respeito à primeira situação e o n.º 2 à segunda.
Convém estabelecer desde já a distinção entre as duas situações. Uma coisa é alterar o requerimento probatório, que pode abranger prova pericial, documental, testemunhal, etc., outra coisa, bem mais limitada, é alterar ou aditar o rol de testemunhas, que é apenas um dos segmentos do requerimento probatório.
Também os tempos de apresentação desses pedidos são diferentes. Enquanto a alteração do requerimento probatório pode ocorrer na audiência prévia, quando a esta haja lugar, o rol de testemunhas pode ser aditado ou alterado até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final.
O n.º 2 do artigo 598º permite, portanto, que, até uma data muito próxima da audiência final, as partes substituam testemunhas constantes do rol que apresentaram no momento próprio, ou aditem testemunhas a esse mesmo rol, sem que se lhes exija qualquer justificação para a substituição ou para o aditamento.
Vejamos, então, o caso dos autos.
A Autora, agora apelante, requereu alteração ao rol nos termos que constam do ponto 6., supra.
Esse pedido de alteração, deduzido cerca de uma semana depois de ter sido notificada da data designada para o início do julgamento, foi motivado, seguramente, pelo parcial indeferimento do rol que apresentou em 13.09.2013, uma vez que o número de testemunhas arroladas excedia o máximo de 10, previsto no artigo 511º, n.º 1. Aquilo que a apelante pretendeu com esse requerimento foi trocar duas das testemunhas incluídas nesse número de 10, por duas que estavam para além dele. Ou seja, mais concretamente, procurou excluir do rol as testemunhas indicadas nos números de ordem 8. e 4. e incluir nesse rol as indicadas nos números 14. e 11.
O Mmº Juiz indeferiu o pedido de alteração com fundamento na sua intempestividade.
E a nosso ver, procedeu correctamente.
Com efeito, a audiência final foi agendada, por despacho de 22.10.2014, para o dia 17.11.2014 – cfr. ponto 2., supra –, constando do respectivo despacho a programação dos trabalhos a realizar nesse mesmo dia, bem como a designação de nova data para a sua continuação.
Se a referência para a contagem dos 20 dias a que alude o artigo 598º, n.º 2, for essa primeira data (17.11.2014 – cfr. ponto 2.) o pedido de alteração do rol (apresentado em 31.10.2014 – cfr. ponto 6.) é extemporâneo, por não ter respeitado esse prazo. Mas se, como advoga a apelante, se tomar por referência a data aprazada para a audição das testemunhas abrangidas por esse pedido (15.01.2015 – cfr. ponto 7.), então a alteração do rol ter-se-á de considerar tempestiva.
O nosso entendimento vai no sentido de que a data a considerar, para o efeito da contagem dos 20 dias, é a que designa dia para julgamento, independentemente de este se realizar ou não e de terem sido agendadas mais sessões em função do volume de prova a produzir.
O legislador processual civil foi sensível a várias vozes da doutrina e, nas últimas reformas do CPC, maleabilizou o prazo para as partes requererem novas provas, consentindo a oferta de novos meios probatórios em momento posterior ao normal, sempre que tal não contendesse com o prosseguimento ulterior do processo.
A solução encontrada, presente no anterior artigo 512º-A e no actual 598º, n.º 2, já permite fazer face à generalidade das situações em que a parte considere necessária a alteração do rol de testemunhas.
Cremos, por isso, que, nas situações em que hajam sido programadas várias sessões de julgamento – como no caso –, não é aceitável que o prazo de 20 dias se conte tendo como referência o início de qualquer uma delas, pois isso, além de criar instabilidade no processo, poderia interferir negativamente nos interesses da parte contrária[1].
Concluindo-se, portanto, que a alteração ao rol tem de ser requerida 20 dias antes do início da audiência, bem andou o tribunal recorrido quando indeferiu o requerimento aludido em 6.
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III. DECISÃO

Em conformidade com o exposto, julga-se improcedente a apelação e confirma-se o despacho recorrido.
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Sem custas, dado que a apelante delas está isenta (cfr. fls. 42 a 45).
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PORTO, 12 de Maio de 2015
Henrique Araújo
Fernando Samões
Vieira e Cunha (Vencido – continuo a defender o que, como relator, fizemos constar no Ac. RP 20/10/09, pº 2172/04.6TBVFR.P1, no sentido de que a doutrina do artº 598º/2 CPCiv. se deve reportar, “maxime”, ao encerramento da audiência, tanto mais que na sentença se haverá de ter em atenção a situação existente nesse momento – artº 611º nº1 CPCiv. Veja-se também o discorrido no Ac. RP 30/10/03 Col. IV/193 e doutrina que cita)
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[1] Neste mesmo sentido, cfr. o acórdão da Relação de Lisboa de 15.11.2012, no processo n.º 76/11.5TBCSC-A.L1-2, em www.dgsi.pt.