Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
69/15.3GBMTS-A.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: JORGE LANGWEG
Descritores: HOMICÍDIO NEGLIGENTE
OMISSÃO DO DEVER DE CUIDADO
NEXO CAUSAL
Nº do Documento: RP2019030869/15.3GBMTS-A.P1
Data do Acordão: 03/08/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: CONFERÊNCIA
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO, (LIVRO DE REGISTOS N.º792, FLS.93.110)
Área Temática: .
Sumário: I – Enquanto administrador da sociedade proprietária de um veículo pesado de mercadorias, um camião com quase 25 anos de idade, utilizado regularmente e sujeito a cargas pesadas, estava o arguido obrigado a garantir as boas condições de funcionamento e de segurança de todo o equipamento e as condições de segurança do veículo.
II - Comete o crime de homicídio por negligência, por omissão, p. e p. pelos art.ºs 137º, n.º 1 e 10º do C. Penal, o administrador que não acautelou a manutenção preventiva da viatura, da qual se desprendeu uma roda que causou a morte de um transeunte, o que não aconteceria se a viatura fosse objecto da competente manutenção.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº 69/15.3GDGDM-A.P1

Data do acórdão: 8 de Março de 2019

Relator: Jorge M. Langweg
Adjunta: Maria Dolores da Silva e Sousa
Origem:
Tribunal Judicial da Comarca do Porto
Juízo de Instrução Criminal de Matosinhos
Acordam, em conferência, os juízes acima identificados do Tribunal da Relação do Porto

Nos presentes autos acima identificados, em que figura como recorrente o arguido B…;
I – RELATÓRIO

1. Em 1 de Outubro de 2018 foi proferida nos autos principais uma decisão instrutória de pronúncia do arguido B…, pela prática de um crime de homicídio por negligência, p. e p. pelo art. 137.°, n°l, do Código Penal, em conjugação com o disposto pelo art. 10.° do mesmo diploma.
2. Inconformado com tal decisão, o arguido interpôs recurso, terminando a motivação de recurso com as seguintes conclusões:
"(…)
Vem, o recorrente interpor Recurso para este Venerando Tribunal, pois entende, como só pode entender, que nos autos não há indícios, dos quais possam resultar uma forte ou séria possibilidade da sua condenação em julgamento.
Assim, o recorrente recorre de facto e de direito, da douta decisão proferida pelo Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo de Instrução Criminal de Matosinhos - Juiz 3, a que se reportam os autos supra.
Os presentes autos tiveram a sua origem no "AUTO DE NOTÍCIA" que deu conta que no dia "27-01-15", pelas "17:55", na "RUA …" , "…. - … … " tinha ocorrido um "acidente de viação, atropelamento, tendo sido interveniente apenas um veículo pesado de mercadorias, com a matrícula MQ - .. - .. e um peão (vítima) que circulava no passeio", "...a vítima já tinha falecido..." , "Foi o referido veículo apreendido - Fls. 1, 2 e 3 dos autos.
"C…" nascida a "10-11-1966" foi vítima mortal do referido acidente, conforme "REGISTO DE ENTRADA DE CADÁVER" de fls. 7 dos autos.
O veículo pesado de mercadorias, interveniente no acidente, com a matrícula MQ – .. - .., foi apreendido nesse dia 27 de Janeiro de 2015. - Cír. AUTO DE APREENSÃO DE VEÍCULO" de fls 12 dos autos.
A "PARTICIPAÇÃO DE ACIDENTE DE VIAÇÃO", consta a fls. 13 a 15 dos autos.
Foi feito exame ao local do acidente, conforme "AUTO DE EXAME DIRETO AO LOCAL ". - Fls 43 e 44 dos autos
O AUTO DE EXAME DIRETO AO VEÍCULO", consta de Fls. 45 e 46 dos autos.
O veículo MQ-..-.. é propriedade da "D…, SA", que o comodatou à empresa "E…, S.A." em 1 de Janeiro de 2008, pelo período de cinco anos "renovável por iguais e sucessivos períodos enquanto não for denunciado por qualquer uma das partes." - Fls. 75, 264 a 266 dos autos
O Veículo tem as seguintes características, para além de outras:
"Matrícula MQ-..-...
Data da Matrícula: 1990-07-27
Data Primeira Matrícula: 1990-07-27
Marca T…
Modelo …
Cilindrada 9603
Categoria PESADO
Tipo MERCADORIAS Situação Veículo: REGULAR Peso Bruto: 32000"
- Fls. 75 a 77 dos autos.
A data de 27 de Janeiro de 2015, o veículo encontrava-se com a IPO - Inspecção Periódica Obrigatória em dia, realizada em "2014-07-28 no "CENTRO DE INSPECÇÕES NORTE, SA", tendo obtido como "Resultado de Inspeção: APROVADO". - Fls. 78 e 79 dos autos.
Nos autos constam todas as IPO s realizadas ao veículo com a matrícula MQ-..-.., desde o ano de 1995. - Fls. 186 a 221 dos autos.
"O veículo estava aprovado em Inspeção Periódica obrigatória, não existindo qualquer referência nas reprovações do eixo em causa. " - Fls 285 e fls.. 78,79, 198 a 221.
As reinspecções (a última das quais em 2012-08-01) a que o veículo teve de se submeter não resultaram da deteção de qualquer deficiência ou problema no eixo. - Fls. 198 a 221.
Devidamente notificada para o efeito, a E…, SA. apresentou e foram juntas aos autos 21 facturas, todas do ano de 2014, referentes à manutenção do veículo com a matrícula MQ-..-.., a saber:
- "Factura n.°2014/…, F…, Lda", datada de "2014-12-29" no montante de "€620,01; - fls. 105 dos autos.
- "Factura n.°…….., G… datada de "2014-09-25" no montante de "é"6,15"; - fls. 106 dos autos.
- "Factura n. °../……., H…, Lda; datada de "2014-12-05" no montante de "€3.666,37"; - fls. 107 dos autos.
- "Factura n.° ….., I…\ datada de "2014-11-0T no montante de "€529,15"; - fls. 108 dos autos.
- "Factura n.°…/…., J…, Lda", datada de "2014-11-04" no montante de "€413,50"; - fls. 109 dos autos
- "Factura-Recibo n. ° ../…., K…, Lda", datada de "2014-10-31" no montante de "€199,85"; - fls. 110 dos autos
- "Factura n.° …., L…, Vila Real", datada de "2014-10-2T'' no montante de "€38,19"; - fls. 111 dos autos
- "Factura n.°…….., G…", datada de "2014-09-29" no montante de "€377,00"; - fls. 112 dos autos
- "Factura-Recibo n.°… - ……., M…", datada de "2014-07-26" no montante de "€15,01"; - fls. 113 dos autos
- "Factura-Recibo n. °…/…., N…" datada de "2014-06-03" no montante de "€38,60"; - fls. 114 dos autos
- "Factura-Recibo n.° ../…., K…, Lda", datada de "2014-06-06" no montante de "€232,69 "; - fls. 115 dos autos
- "Factura-Recibo n.° ../…., K…, Lda", datada de "2014-07-03" no montante de "€84,87"; - fls. 116 dos autos.
-"Factura-Recibo n.° ../…., K…, Lda", datada de "2014-07-03" no montante de "€103,06"; - fls. 117 dos autos.
- "Factura-Recibo n.° ../…., K…, Lda", datada de "2014-07-17" no montante de "€177,40", (50%) - fls. 118 dos autos.
- "Factura n.°2014/…, F…, Lda", datada de "2014-06-21" no montante de "€785,00"; -/fís. 119 dos autos
- "Factura-Recibo n. ° ../…., K…, Lda", datada de "2014-06-06" no montante de "€508,67"; - fls. 120 dos autos
- "Factura-Recibo n.º ../…., K…, Lda", datada de "2014- 03-2T' no montante de "€22,14"; - fls. 121 dos autos
- "Factura n. °…….., G…", datada de "2014-04-01" no montante de "€1.008,00"; - fls. 122 dos autos
- "Factura-Recibo n.°../…., K…, Lda", datada de "2014-03-06" no montante de "€377,00"; - fls. 123 dos autos
- "Factura-Recibo n.° ../…., K…, Lda", datada de "2014-02-01" no montante de "€ 151,51"; - fls. 124 dos autos
- "Factura n.°…., O…", datada de "2014-01-29" no montante de "€ 403,44"; - fls. 125 dos autos
- Fls. 105 a 125 dos autos.
A E…, SA, no ano de 2014, despendeu na manutenção da viatura com a matrícula MQ-..-.. a quantia de €9.265,47 (nove mil duzentos e sessenta e cinco euros e quarenta e sete cêntimos). - Fls 105 a 125 dos autos.
No mês anterior ao acidente, ou seja Dezembro de 2014, a E…, SA despendeu a quantia de €4.292,53 na manutenção de tal viatura ( €620,01 + €6,15 + €3.666,37). - Fls 105, 106 e 107 dos autos.
A viatura MQ-..-.. tem a sua Ia matricula em 1990, e à data do acidente tinha percorrido 185181 Km, o que dá uma média de 7716 Km por ano. - Fls. 12, 45, 75, 76 e 77 dos autos.
Este veículo era habitualmente conduzido pelo trabalhador, com a categoria de motorista O… - Fls. 250 a 253, 541 e 542, dos autos.
Este O…, nascido a 12-05-1953, conduzia o veículo pesado de mercadoria com a matrícula MQ-..-.. no dia, hora (27 de Janeiro de 2015) e local do triste acidente.
É titular da cartão de condução ". - ……", válida para as categorias B, BI, BE, C, Cl, CIE E CE desde 15 de Dezembro de 1977 E No seu RIC - "REGISTO INDIVIDUAL DO CONDUTOR", tem apenas registada uma contraordenação por utilização do telemóvel, tendo-lhe sido aplicada em 22 de Janeiro de 2014 a sanção de 30 dias de inibição de conduzir, suspensa pelo período de 180 dias. - Fls 144 e 153 dos autos.
Resulta ainda dos autos, que o peso da totalidade da carga que transportou em tal fatídico dia, na viatura com a matrícula MQ-..-.. estava muito abaixo do permitido por lei - transportou "2500Kg a 3000Kg. " - Fls. 81 a 85 e 251 dos autos.
Do "AUTO DE EXAME DIRECTO" (LEITURA EFECTUADA À FOLHA DE REGISTO DO TACÓGRAFO) consta que no dia 27 de Janeiro de 2015 tinha percorrido com o veículo MQ-..-.. a distância de 139 Km, cumpriu os limites de velocidade e respeitou os tempos de condução e repouso. - Fls. 90, 91, 92, 93 e 94 dos autos.
Constando expressamente em "CONCLUSÕES" Pela análise da folha de registo (vulgo disco) juntos ao processo e tendo em consideração todos os factos mencionados, não se verificam anomalias/infrações."- Fls. 93 e 94 dos autos.
A viatura MQ-..-.. e o rodado duplo esquerdo da mesma foram entregues à E…, SA em 24 de Março e 18 de Maio de 2015, respectivamente, por determinação do tribunal, sem que este impusesse qualquer condição para a sua circulação. - Fls. 350 e 387 dos autos.
Foram nomeados, em 24 de Fevereiro de 2015, peritos P… e Q…, ambos a prestar funções na Empresa S… concessionária da T… em Portugal "Para proceder à avaliação e exame do veículo de matrícula MQ-..- (nomeadamente ao eixo e pneumáticos traseiro, lado esquerdo, do qual deve elaborar relatório nos termos legais. " - Fls 95 e 96 dos autos
Do relatório de peritagem estes senhores peritos fizeram constar: "IV. CONCLUSÕES Os danos evidentes nos componentes anteriormente referidos permitem-nos concluir que os três componentes; porca de afinação, anilha de freio e porca de fixação, foram forçados a rodar por acção da gripagem existente no rolamento de fora e anel interior do rolamento de fora, até se soltarem completamente da parte roscada do eixo, estando a partir desse momento criadas as condições para que a roda pudesse libertar-se do eixo auxiliar traseiro do camião, a qualquer momento.
Desconhecemos a manutenção preventiva realizada à viatura. Não foi realizada na Rede Oficial de Após Venda da T… em Portugal."
Fls. 176 a 183 dos autos.
Inquirido P…, em 7 de Outubro de 2016, disse: "A porca de fixação apresenta danos de utilização de ferramenta ou equipamento não apropriado, na instalação da mesma, não se podendo aferir quando é que tal terá sido executado.
Que a porca de afinação (...) que apresenta um desgaste anormal, originado pela fricção com o rolamento. Refere ainda que a fábrica T… especifica valores de afinação que desconhece se foram ou não respeitados, durante a vida útil da refeida porca de afinação.
Que as referidas anomalias poderão ter sido o motivo pelo qual a roda se soltou.
Refere que desconhece por completo qual a manutenção efectuada na referida viatura, quando ou em que oficina foi feita, sabendo apenas que esta não foi efectuada na rede T… a nível nacional. -Fls 567 e 568 dos autos.
Inquirido, Q…, em 7 de Dezembro de 2016 disse: "concluiu que existiu má assistência ou inexistência e que houve utilização de ferramentas inadequadas. Os mecânicos, pela experiência, sabem ou devem saber as ferramentas indicadas para utilizar na situação concreta."
Fls. 617 dos autos.
Nos autos de inquérito, foram inquiridas as testemunhas U… e V…. - Fls. 696 e 698 dos autos.
Da certidão permanente (válida até à data de 13 de Dezembro de 2016) junta aos autos a fls 621 e seguintes, resulta que a E…, SA, como o seu nome indica é uma sociedade anónima, com o capital de €2.694.600,00, tem por objecto "Pré-fabricados de betão e rochas ornamentais" e como administrador único B….
Cfr. Fls 621 e seguintes
No âmbito do inquérito foram constituídos e interrogados como arguidos: W…: - Fls. 246 dos autos O…: - Fls. 541 dos autos, B…: - Fls. 275 dos autos, X…: - Fls. 749 dos autos, Y… - Fls. 793 dos autos, AJ – B…, aqui recorrente, quando interrogado no âmbito do inquérito, no dia 20 de Outubro de 2015, disse, para além do mais: "O arguido embora seja presidente do concelho de administração, raramente está nas instalações da empresa, delegando funções nos seus colaboradores... ", "No caso concreto da manutenção e reparação das viaturas, dá instruções taxativas e expressas para todas as manutenções nomeadamente do MQ - .. - 75 sejam efectuadas regularmente, de forma que tal veículo circule no estrito respeito das normas legais em perfeitas condições de segurança, dizendo na empresa que quanto a questões de segurança não há poupanças, sempre exigiu aos seus colaboradores segurança máxima, quer para eles quer para terceiros, não permitindo em momento algum que os seus colaboradores facilitem a questão de segurança. No dia a dia são os seus colaboradores que decidem, quando levam as viaturas para efectuarem a manutenção e inspecções. " - Fls. 275 a 277 dos autos.
Foi determinado "o arquivamento dos presentes autos, de harmonia com o disposto no n." 2 do art. 277° do CPP" ("O inquérito é igualmente arquivado se não tiver sido possível ao Ministério Público obter indícios suficientes da verificação do crime ou de quem foram os agentes ".) Fls. 837 e seguintes dos autos de inquérito.
Na sequência do despacho de arquivamento, veio Z… requerer a "ABERTURA DA INSTRUÇÃO", contra:
"B…, administrador da E…, SA.
O…, motorista…
Y… mecânico... "
Fls. 891 e seguintes dos autos
No requerimento de abertura de instrução foi requerida, para além de outra, a seguinte produção de prova:
"Requer-se a V Ex" que sejam novamente inquiridos os peritos da S… que procederam à vistoria à viatura MQ-..-.. na sequência do acidente e que elaboraram o relatório de fls. 176 e seguintes para que esclareçam o seguinte:
Em termos de segurança rodoviária uma viatura como a dos autos, com mais de 25 anos, com 185.181Kms e numa atividade de carga e descarga e transporte de granito tem condições para continuar a circular na via pública?
Em caso afirmativo com que regularidade e frequência deveria ser submetida a revisão mecânica nos componentes de maior risco designadamente aqueles que vieram a dar origem ao acidente ao eixo traseiro, e especificamente à porca de afinação, anilha de freio e porca de fixação?
Qual a duração expectável das peças cuja degradação provocou a saída do rodado do eixo e assim, o acidente?
Por referência às facturas juntas aos autos pela E…, que lhe foram emitidas por diversas oficinas, e reportadas a serviços variados, é possível pela descrição dos trabalhos e bens facturados, saber se algum ou alguns desses serviços implicam na sua concretização alguma intervenção no eixo traseiro e concretamente na porca de afinação, anilha de freio ou porca de fixação?
De que modo foram utilizadas ferramentas inadequadas no manuseamento do eixo traseiro?
A avaria existente nas peças que compunham o eixo emitia quaisquer sinais mormente sonoros ou vibração ou outros que pudessem ser detetados pelo condutor? "- Fls. 891 a 908 dos autos
A Abertura de Instrução foi admitida pelo tribunal. - Fls. 977 dos autos.
Tendo o tribunal procedido à inquirição dos senhores peritos que elaboraram o relatório de fls. 176 a 183 dos autos de inquérito, os quais e em súmula foram peremptórios em considerar que:
- a idade do camião de 25 anos não é muita, a fábrica T… ainda continua a produzir componentes novos para estes camiões;
- os Kms - 185181 Km - do camião não são muitos Kms, já que um camião deste tipo pode fazer 1.000.000 (um milhão) ou 2.000.000 (dois milhões) de Kms;
- as peças em causa nos presentes autos não têm duração expectável, não existe a nível de fabricante uma durabilidade, existe uma manutenção para acompanhar a sua degradação ao longo dos anos;
- as peças não têm de ser mexidas senão para a sua manutenção;
- em 100 ou 80 mil km devem ser vistas as peças, não é preciso substituí-las.
- as peças em causa foram lubrificadas;
- desconhecem quem fez a lubrificação às peças;
- desconhecem quando foi feita a lubrificação às peças, o que poderia ter acontecido há dois ou três anos;
- o mecânico que efectuou a lubrificação/lubrificações poderia/deveria ter visto que as mesmas deviam ser substituídas.
Através da análise das facturas não conseguem apurar quem mexeu naquelas peças;
Não foram utilizadas ferramentas correctas na manutenção, tinham sinais da utilização de ferramentas impróprias;
A avaria emitiria sinais sonoros, mas se o eixo elevatório estivesse levantado, poderia não haver essa precepção, poderia não ser audível (sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso no Tribunal, com início às 10:24:01 horas e o seu termo pelas 11:12:33 horas do dia 13 de Junho de 2018).
E depoimento de Q… gravado através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso no Tribunal, com início às 11:13:48 horas e o seu termo pelas 11:41:24 horas do dia 13 de Junho de 2018.
Foi determinando "... nova inquirição das testemunhas W…, identificado a fls. 635, e V…, identificado a fls. 698 o que veio a acontecer no dia 9 de Julho de 2018.
Foi ouvido o agora recorrente, depoimento gravado através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso no Tribunal, com início às 11:16:32 horas e o seu termo pelas 11:33:19 horas do dia 19 de Setembro de 2018.
Que reiterou o que já tinha dito a Fls. 275 e seguintes dos autos, reiterando a sua continua preocupação com a segurança de pessoas e bens, explicando como são "delegadas funções nos seus colaboradores", a "existência de procedimentos desde sempre existentes na empresa que têm de ser seguidos", que "a manutenção ao camião foi sempre feita", "desconhecendo como a mesma foi feita ou que ferramenta foi usada" , "não podendo imputar responsabilidade aos seus colaboradores por um serviço que não fizeram", já que as manutenções são executadas em oficinas externas à E….
Nesse dia realizou-se o debate instrutório.
Na "DECISÃO" o Meritíssimo Juiz de instrução deu como suficientemente indiciados, os seguintes factos:
"No dia 27 de Janeiro de 2015, às 17:55h, a viatura pesada de mercadorias de marca T…, com a matrícula MQ-..-.. circulava na Rua …, em …, concelho de Matosinhos, no sentido … - ….
Quando efectuava uma curva à direita, o rodado da parte lateral esquerda traseira soltou-se do seu eixo, atrasando-se em relação ao pesado, que prosseguiu marcha, foi continuando aos saltos, pela parte traseira do pesado, em direcção ao passeio do lado direito da via de trânsito por onde a viatura circulava, e atento o sentido desta, acabando por embater no peão de seu nome C…, que transitava nesse passeio no mesmo sentido que a viatura pesada.
Com a violência do embate, a referida C… foi projectada para a frente, caindo no solo e embatendo com a cabeça no passeio, acabando por falecer no local devido às lesões traumáticos meningo-encefálicas, vertebro-medulares, torácicas, abdominais e pélvicas, descritas no relatório da autópsia, que o embate desse rodado lhe provocou.
No momento do sinistro, a viatura MQ-..-.. era conduzida pelo arguido O… e era propriedade da empresa "D…, Lda."
Encontrando-se todavia na posse da empresa E…, SA, em virtude de um contrato de comodato celebrado entre esta última e a D…, Lda."
O eixo da viatura soltou-se do rodado da parte lateral esquerda traseira em virtude da sobrecarga e falta de manutenção das peças que o compunham, situação que levou a que a porca de afinação, anilha de freio e porca de fixação, tivessem sido forçados a rodar por acção da gripagem existente no rolamento de fora e anel interior, culminando com a libertação da roda do eixo auxiliar traseiro do camião.
Para além disso, a porca de fixação possuía danos provocados pela utilização de uma ferramenta de impacto "afiada ", ferramenta imprópria para efectuar a operação de desaperto e/ou aperto da porca do cubo da roda.
A viatura MQ-..-.., à data do acidente, tinha 24 anos e 6 meses, e era alvo de utilização pela comodatária, servindo para transporte de várias toneladas, dado que era a única viatura ao serviço da empresa comodatária que possuía grua.
Ao arguido B…, administrador da comodatária do veículo em causa, pessoa que tomava e toma as decisões em representação da empresa, incumbia acautelar a correia manutenção preventiva da viatura, da qual faria parte a supervisão e substituição das peças aqui em causa - porca de afinação, anilha de freio e porca de fixação.
Incumbia-lhe assegurar e incumbir terceiro, nisso especializado, de regular e periodicamente tratar da manutenção preventiva da viatura, da qual faria parte a supervisão ou vigilância e substituição das peças aqui em causa - porca de afinação, anilha de freio e porca de fixação.
A viatura pesada não era sujeita a revisões periódicas, antes apenas a reparações pontuais de avarias que iam surgindo.
O arguido B…, como responsável da empresa comodatária, que mantinha a viatura em laboração, deveria exercer uma permanente vigilância sobre ela e, de modo preventivo, vigiando regularmente as componentes de maior risco — desde logo eixo, rodas, direcção e pneus.
O arguido Y…, sócio gerente da H…, Lda. havia sido incumbido, num período não concretamente determinado, mas durante vários anos antes dos factos aqui em causa, pelo administrador da empresa comodatária E…, de levar a cabo a reparações na viatura.
O arguido B…, administrador da E…, SA, não garantiu a cabal manutenção preventiva da viatura, tendo a obrigação (desde logo, porque ciente das necessidades-especificas das viaturas pesadas e do desgaste que sofrem) de prever que ao descurar o rigor da manutenção das peças que compõem o eixo, estas deixariam de garantir a fixação devida dos rodados, e que tal acarretaria um aumento exponencial da possibilidade de acidente rodoviário.
Ao não tomar as precauções devidas, a sua atitude deu causa ao acidente que pôs termo à vida da falecida C….
E, em virtude de tais factos, dados como provados, decidiu o Meritíssimo Juiz pronunciar o B… pela "prática de um crime de homicídio por negligência, p. e p. pelo art. 137.°, n° 1, do Código Penal, em conjugação com o disposto pelo art. 10° do mesmo diploma.
E não pronunciar os restantes arguidos.
Sempre, com o devido respeito que é muito, não pode o recorrente concordar com a decisão proferida pelo Senhor Juiz de instrução, considerando mesmo tratar-se de uma decisão desadequada, desproporcionada, não fundamentada e consequentemente, injusta.
A prova produzida não é de molde a considerar que há indícios que permitam pronunciar o recorrente, como foi pronunciado, pelo que, o Tribunal a quo fez uma errada aplicação ou interpretação das normas jurídicas - artigos 137.°, 15° e 10° do C.P.; e artigo 286° do CPP - à situação fáctica que se traz à douta apreciação de V.as Ex.as.
A absoluta falta de indícios da prática do ilícito por parte do recorrente impunha decisão diversa daquela que foi tomada, ou seja, impunha que o recorrente não fosse pronunciado.
Pelo que, a decisão do Tribunal a quo, carece de ser revogada e substituída por outra em que se decida pela não pronuncia do aqui recorrente.
E se não há qualquer reparo aos factos dados como suficientemente indiciados, sob os números 1, 2, 3, 4, 5 e 13.
Já o mesmo não acontece com os factos inscritos sob os números 9, 10, 11, 12, 14 e 15 da "DECISÃO INSTRUTÓRIA".
Isto porque se encontra devidamente demonstrado nos autos que a viatura com a matrícula MQ – .. - .., tinha a Inspecção Periódica Obrigatória em dia.
As reinspecções (a última das quais em 2012-08-01) a que o veículo teve de se submeter não resultaram da deteção de qualquer deficiência ou problema no eixo.
Que a idade - 24 anos - e kilómetros - 185181 Km - do camião não são significativos, já que um camião do mesmo modelo pode fazer 1.000.000 (um milhão) ou 2.000.000 (dois milhões) de Kms, continuando presentemente a ser fabricadas peças para viaturas de igual modelo.
O camião fazia uma manutenção regular, como aconteceu no ano de 2014, mesmo no mês anterior - Dezembro de 2014 - ao do fatídico acidente.
Todos os órgãos e componentes do camião estavam nas devidas condições com excepção das peças que compunham o eixo.
O que não foi desmentido pelos Senhores Peritos, antes confirmaram ter havido lubrificação ou lubrificações ao eixo, só não podendo precisar quando e em que oficina.
O que tais peritos afirmaram é que a manutenção foi feita com utilização de ferramentas ou instrumentos inapropriados para o efeito, não podendo precisar quando e em que oficina.
As manutenções do camião foram efectuadas em empresas - oficinas - terceiras nisso especializadas, conforme facturas do ano de 2014 juntas aos autos.
Tais manutenções não foram efectuadas em oficina da "rede T… a nível nacional" é certo, mas certo é também que não são estas, apenas, as preparadas e aptas para efectuar a manutenção em viaturas dessa marca, nem há qualquer imposição nesse sentido, tanto mais que qualquer oficina que não pertença a tal "rede T…" compra componentes de marca T… à T…, sem qualquer restrição, para aplicar em viaturas dessa marca.
Pelo que, quando a E…, SA ordenada a manutenção/reparação de uma viatura numa oficina - agente económico – que labora no mercado, dentro dos parâmetros legais para a sua actividade como é o caso das oficinas que emitiram as facturas constantes dos autos, é de esperar que a manutenção tivesse sido corretamente efetuada.
O motorista que conduzia habitualmente o camião, era motorista experiente e com um "REGISTO INDIVIDUAL DO CONDUTOR" exemplar, não se tendo apercebido de qualquer problema no eixo do camião.
O Administrador da E…, SA, (como a outro qualquer homem médio), não tinha, nem tem conhecimentos técnicos para tal e confiava, como só podia confiar (e confia um homem médio) que as reparações/manutenções eram adequadamente realizadas pelas oficinas, substituídas as peças que havia a substituir e sempre com a utilização de ferramentas adequadas.
Não lhe podendo ser exigido que não confiasse que as manutenções e ou reparações não estivessem bem realizadas e que os instrumentos utilizados não eram os adequados.
Não podia, pois, ser exigido ao recorrente outro comportamento, quer por acção quer por omissão, que não o tido.
E assim não se encontram suficientemente indiciados os factos inscritos sob os números 9, 10, 11, 12, 14 e 15 da "DECISÃO INSTRUTÓRIA", quando é imputada responsabilidade ao aqui recorrente.
E porque assim é, o recorrente não podia ser pronunciado, como foi e por isso se impõe o presente recurso.
Nos presente autos está em causa a prática de um crime de homicídio por negligência previsto e punível pelo artigo 137, n° 1 do Código Penal: "Quem matar outra pessoa por negligência é punido com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa."
Por sua vez, dispõe o artigo 15° do Código Penal: "Age com negligência quem, por não proceder com o cuidado a que, segundo as circunstâncias, está obrigado e de que é capaz:
Representar como possível a realização de um facto que preenche um tipo de crime mas actuar sem se conformar com essa realização; ou Não chegar sequer a representar a possibilidade de realização do facto. "
Assim, na alínea a) do artigo 15° do Código Penal o legislador delimita os casos de negligência consciente, vincando bem, na parte final, a respectiva distanciação do dolo eventual, já na alínea b), do referido artigo 15° do Código Penal fica definido o conteúdo da negligência inconsciente.
Estatui o artigo 286°, n° 1 do Código de Processo Penal: "A instrução visa a comprovação judicial da decisão de deduzir acusação ou de arquivar o inquérito em ordem a submeter ou não a causa a julgamento. "
E como bem refere o Senhor Juiz da Instrução, pese embora ter decidido em sentido contrário "o juiz só deve pronunciar o arguido quando, pelos elementos de prova recolhidos nos autos, forma a sua convicção no sentido de que é (mais) provável que o arguido tenha cometido o crime do que o não tenha cometido ou os indícios são os suficientes quando haja uma alta probabilidade de futura condenação do arguido, ou, pelo menos uma probabilidade mais forte de condenação do que de absolvição.
Ora no caso em concreto, com todas as provas carreadas no autos, quer na fase de inquérito, quer na fase de instrução, o recorrente só pode ser absolvido num eventual julgamento.
Nesta conformidade a DECISÃO, só poderia ser a de não pronúncia.
Como se pugna e requer.
Face ao exposto, o recorrente considera que o Tribunal violou os artigos: - artigos 137.°, 15° e 10° do C.P. e artigo 286° do CPP.
Termos em que, nos melhores de direito, com o mui douto suprimento de V. Exas deve ser revogada a douta DECISÃO recorrida, e, em consequência, ser reformulada e decididir não pronunciar o aqui recorrente, fazendo como sempre a melhor JUSTIÇA!

3. O recurso foi admitido, com subida imediata, em separado e com efeito suspensivo do processo.
4. O assistente Z… respondeu ao recurso, pugnando pela sua improcedência:

"Os factos em concreto colocados em crise pelo recorrente são os que se prendem com a responsabilidade do arguido B… na qualidade de administrador da comodatária do veículo em causa pela correta e preventiva manutenção da viatura:
Ao arguido B…, administrador da comodatária do veículo em causa, pessoa que tomava e toma as decisões em representação da empresa, incumbia acautelar a correta manutenção preventiva da viatura, da qual faria parte a supervisão e substituição das peças aqui em causa - porca de afinação, anilha de freio e porca de fixação.
Incumbia-lhe assegurar e incumbir terceiro, nisso especializado, de regular e periodicamente tratar da manutenção preventiva da viatura, da qual faria parte a supervisão ou vigilância e substituição das peças aqui em causa - porca de afinação, anilha de freio e porca de fixação.
A viatura pesada não era sujeita a revisões periódicas, antes apenas a reparações pontuais de avarias que iam surgindo.
O arguido B…, como responsável da empresa comodatária, que mantinha a viatura em laboração, deveria exercer uma permanente vigilância sobre ela e, de modo preventivo, vigiando regularmente as componentes de maior risco - desde logo eixo, rodas, direcção e pneus.
O arguido B…, administrador da E…, SA, não garantiu a cabal manutenção preventiva da viatura, tendo a obrigação (desde logo, porque ciente das necessidades especificas das viaturas pesadas e do desgaste que sofrem) de prever que ao descurar o rigor na manutenção das peças que compõem o eixo, estas deixariam de garantir a fixação devida dos rodados, e que tal acarretaria um aumento exponencial da possibilidade de acidente rodoviário.
Ao não tomar as precauções devidas, a sua atitude deu causa ao acidente que pôs termo à vida da falecida C….
No que à indiciação destes factos diz respeito, a decisão instrutória não merece qualquer reparo.
Todos os indícios recolhidos nos autos apontam no sentido de que o acidente só aconteceu porque aquele que estava obrigado a zelar pela sua boa manutenção por forma a evitar riscos para terceiros emergentes da sua circulação, não lhe providenciou cabal manutenção, sobretudo tendo em conta a utilização intensiva e a vetusta idade, levando à deterioração da mesma, com o desfecho trágico da morte de C….
Um rodado de um camião, quando ele circula numa estrada pavimentada e em bom estado e sem intervir em qualquer tipo de acidente não sai do respectivo eixo, por "motivo fortuito" e imprevisível!
Trata-se de uma avaria que nunca ocorreria num camião novo ou num camião com muito uso desde que fosse objecto de vigilância permanente e não apenas de revisões de mudança de óleo ou para reparar avarias já surgidas.
Não obstante o facto 11 conste do rol de factos atacados pelo presente recurso, tal foi referido por todas as testemunhas, inclusivamente pelos funcionários da comodatária e pelo próprio arguido B… - que a viatura em causa era reparada quando surgia uma avaria e o motorista detetava e era enviada a viatura à oficina. Em momento algum foi referido qualquer tipo de manutenção preventiva na viatura em causa, e muito menos às peças severamente deterioradas que vieram a provocar o acidente, pelo que se afigura verdadeiramente incompreensível a discordância do recorrente quanto a esta matéria.
Da perícia realizada nos autos por peritos da S…, resultou que a viatura MQ – .. - .. apresentava sobrecarga nas peças que compunham aquele eixo de onde se soltou o pneu e falta de manutenção do mesmo eixo, o que fez com que a porca de afinação, anilha de freio e porca de fixação, tivessem sido forçados a rodar por acção da gripagem existente no rolamento de fora e anel interior do rolamento de fora, até se soltarem completamente da parte roscada do eixo, o que fez com que a roda se libertasse do eixo auxiliar traseiro do camião.
Quanto à porca de fixação, acrescentaram os Srs peritos que a mesma possuía "danos provocados pela utilização de uma ferramenta de impacto " afiada", ferramenta impropria para efectuar a operação de desaperto e/ou aperto da porca do cubo da roda".
Quanto à porca de afinação, dizem os mesmos que "existe um desgaste anormal na face de encosto da porca de afinação, originado pela rotação e fricção do rolamento gripado".
Em sede de instrução os peritos P… e Q… referiram-se ao estado das peças de forma absolutamente clara, não deixando dúvidas acerca do estado deplorável em que se encontravam, esclarecendo o perito Q… que as marcas existentes nas peças dava conta de que as mesmas haviam sido desapertadas " à martelada", e por várias vezes, e que as peças haviam sido utilizadas muito para além do seu limite.
Ou seja, que para além da ausência de manutenção, as ditas peças necessitavam, há muito, de serem substituídas.
Do relatório final do inquérito elaborado pela GNR consta como conclusões do mesmo que o veiculo em causa sofreu utilização intensa e sobrecarga das peças que o compõem, facto este que aumentou com as sucessivas cargas transportadas - " Esta sobrecarga e uma paupérrima e deficiente manutenção do veículo com a utilização diária provocam deterioração, essencialmente nos eixos /veios e rodados (parte essencial para o veiculo circular)"
Não subsistem, por isso, quaisquer dúvidas acerca da causa do acidente: o mesmo foi provocado pela saída do rodado do eixo do pesado, que se deveu a uma deficiente (ou ausente) manutenção do mesmo e ao uso de ferramentas impróprias no manuseamento de algumas peças que compõem o eixo.
Não se tratou de acidente emergente de riscos inerentes ao uso da viatura, mas sim de acidente decorrente de uso intensivo e em atividade que provocava grande e permanente desgaste (cargas e descargas de pedras de granito) de uma vetusta viatura com muitos quilómetros e que não era sujeita a regular vigilância, reparação e substituição das peças que compunham e integravam os órgãos mecânicos suscetíveis de por em causa a segurança do condutor e sobretudo de terceiros: eixos e rodas, direção travões.
Naturalmente que o recorrente estava obrigado a, por si mesmo, ou através de funcionário instruído para o efeito, cuja actuação lhe cumpria fiscalizar - a vigiar de modo regular e permanente o funcionamento da viatura e sujeitá-la a revisões e reparações periódicas e não apenas a limitar-se a reparar as avarias que surgissem - e não o fez.
Um intervenção preventiva e regular era exigível e tivesse ela sido adoptada o sinistro teria sido evitado.
Por isso, em termos objectivos é evidente que o arguido cometeu um crime de homicídio por negligência, p e p pelo art 137 n° 1 e 15 b) C Penal.
A viatura MQ – .. - .. é de 1990, tendo por isso á data dos factos 25 anos!
Trata-se de uma viatura pesada, com muitos quilómetros, com grua destinada a facilitar a carga e descarga (a única viatura ao serviço da empresa comodatária com essas características), e que se encontra afeta a uma actividade de fortíssimo desgaste (carga, transporte diário e descarga, e em ritmo intenso de toneladas de granito).
Ora, conjugando:
- a vetusta idade da viatura,
- o desgaste intenso e permanente inerente à actividade que exerce e ao ritmo imprimido na mesma
- a circunstância de as peças cujo desgaste originou o acidente - se situarem nos eixos da viatura - ou seja, na parte da viatura que suporta todo o peso da mesma, e sobretudo o da carga - e que por conseguinte são peças de desgaste rápido e, por outro lado, cujo bom funcionamento é essencial para a segurança da viatura, e de quem com ela se cruze, há que concluir que esse órgão, tal qual outros também importante em termos de segurança devem estar sob vigilância constante ao nível da manutenção preventiva.
Ora, o responsável por essa vigilância seria o recorrente, representante da empresa que enquanto comodatária, tinha essa viatura a seu cargo.
Era-lhe exigível enquanto tal, que assegurasse e incumbisse terceiro, nisso especializado, de regular e periodicamente tratar da manutenção preventiva da viatura, da qual faria parte a supervisão ou vigilância e substituição das peças aqui em causa - porca de afinação, anilha de freio e porca de fixação.
Ora, resultou de forma absolutamente cristalina de toda a prova do inquérito e instrução que essa viatura não era sujeita a revisões periódicas antes e apenas de reparações pontuais de avarias que iam surgindo.
Para além disso, é de salientar o absoluto desnorte dos vários funcionários da empresa comodatária, da qual o arguido é responsável, ouvidos em instrução e inquérito, quanto às responsabilidades de cada um, limitando-se todos os intervenientes a "empurrar" a responsabilidade para o próximo, para além de ser patente a contradição entre vários dos depoimentos com relação ao modo como era intervencionada a viatura, qual o procedimento adoptado e quem era o responsável pelo arranjo, a quem a avaria era reportada, etc
Mas uma coisa é certa: de todos os depoimentos resultou que não existia qualquer plano de manutenção regular do camião: a viatura, com utilização intensa no transporte de pedra e diária, andava ao "deus dará", com excepção de quando surgia uma avaria percepcionada pelo motorista, caso em que era reparada. A testemunha W… afirmou mesmo, em sede de instrução, que não havia instrução de manutenção regular fora da oficina.
No essencial, dos depoimentos do inquérito e instrução resultou o seguinte:
O… - motorista do veículo em causa - referiu que na própria empresa – E… - havia um mecânico que fazia a "manutenção geral", mas que as reparações com maior complexidade era feitas fora da empresa, assumindo que quando se apercebia de alguma anomalia", reportava a situação ao Eng W… e que a viatura era reparada.
W… - referiu que era o motorista quem depois de detectar uma avaria dava conhecimento ao encarregado V… da necessidade de reparação e este reportava à administração, nomeadamente à parte financeira, e sendo esta quem diligenciava por encontrar oficina
U…, responsável financeira da E…, - disse que as manutenções são impulsionadas pelo motorista, sendo ela própria quem as autoriza.
V… - responsável geral de produção da E… - indicado por W… como sendo a pessoa responsável por enviar as viaturas para reparação - negou que assim fosse, afirmando que as manutenções dos veículos são impulsionadas pelos respectivos motoristas, sendo "apenas avisado disso", e negando que a manutenção dos veículos esteja a seu cargo.
X… - mecânico da empresa que faz a manutenção das máquinas industriais - assumiu que faz parte das suas funções efectuar mudanças de óleo, de 10.000 em 10.000km nos camiões e lubrificação das ponteiras de direcção e transmissões, que é feita semanalmente. Acrescentou que as manutenções dos 20.000km e as revisões são feitas numa empresa de mecânica em Amarante. Negou ter intervencionado o eixo. O papel que o mesmo confessa assumir nas "lubrificações" dos camiões - que parece ir de encontro ao depoimento do motorista O…, que referiu que a empresa possuía um mecânico para manutenções gerais - é contrariada pelos depoimentos de V… e W…, que alegaram desconhecer que o X… tivesse essa incumbência.
A confusão patente nos funcionários da empresa acerca das responsabilidades de cada um é sintomática da total ausência de um plano de manutenção regular, e em especial dos eixos em causa, peças sujeitas a fortíssimo desgaste e com necessidade de cautelas acrescidas, que não foram tomadas.
Foi precisamente a respeito dessas cautelas que se pronunciaram os peritos da T… ouvidos novamente em instrução
P… referiu que o veículo em causa tem condições para circular apesar da idade mas apenas se estiver sujeito a manutenção regular e correcta, sendo necessárias duas manutenções por ano. Mais referiu que, as peças em causa não têm uma duração pré- definida, mas que é essencial fazer a manutenção correta para se compreender se algum componente precisa de reparação ou substituição. Acrescentou que a viatura não é conhecida na rede de concessionários T… e que, quanto mais antigos os camiões, maior número de manutenções deve realizar.
Q… esclareceu que as peças componentes do eixo estavam muito danificadas, sinal de ausência de manutenção, e que haviam sido utilizadas muito para além do que poderiam. Mais referiu que as peças danificadas não estariam lá se houvesse manutenção e que uma viatura com a idade em causa requer maiores cuidados, estando em causa peças de maior desgaste, com ajustes rigorosos a serem feitos com ferramentas de precisão.
Do exposto resulta que a viatura em causa à data dos factos nem sequer tinha condições de andar na estrada, muito menos de laborar numa actividade desgastante e perigosa como a que envolve o transporte de pedra.
Atendendo aos condicionalismos próprios da viatura em causa - idade e utilização intensiva -, se o responsável da empresa comodatária optou por manter a viatura em laboração diária, sabendo perfeitamente das limitações da mesma, criando elevado risco para terceiros, deveria exercer uma permanente e atenta vigilância sobre ela e de modo preventivo, vigiando regularmente as componentes de maior risco - desde logo eixo, rodas, direcção e pneus.
Se assim fizesse certamente que nunca este acidente teria ocorrido.
Não o fez, deixando cair a viatura, depois de anos e anos de desleixo, num estado deplorável por falta de manutenção da mesma.
E que não se diga que se tratou de um facto anómalo, ou de um caso único - os factos indiciados nos autos demonstram que o desleixo do qual o recorrente é responsável revelam uma certa forma de agir, perpetuada no tempo, que explica a razão de ser do vasto rol de reprovações da viatura nas Inspecções Periódicas - um total de 14 reprovações (!!)
O próprio arguido, nas suas declarações, assumiu que a viatura em questão carecia de manutenção preventiva, sendo reparada apenas quando surgiam avarias. Nenhum do inquiridos, e nem próprio recorrente, souberam em momento algum indicar oficina onde a viatura tenha sido sujeita a intervenção aos componentes cuja danificação esteve na origem do acidente.
Por outro lado, tendo o arguido B… identificado V… como encarregado geral da manutenção na aludida sociedade, ou seja, como sendo a pessoa que saberia das instruções para a segurança dos veículos, o certo é que tal não foi minimamente confirmado por aquele, que afirmou - conforme já referido acima - que as manutenções eram impulsionadas pelo motorista e que este só lhe "dava conhecimento" de que o veículo ia para manutenção.
Pelo exposto o arguido, ao não garantir a cabal manutenção preventiva da viatura, violou os deveres de cuidado a que estava obrigado, já que o mesmo tinha a obrigação (desde logo, pela experiencia que possui na lida com viaturas pesadas, cientes das suas necessidades especificas e do desgaste que sofrem) de prever que ao descurar o rigor na manutenção e no manuseamento das peças que compõem o eixo, deixariam de garantir a fixação devida dos rodados, e que tal acarretaria um aumento exponencia da possibilidade de acidente rodoviário.
Ou seja, ao não tomar as precauções devidas, as suas atitudes deram causa ao acidente que pôs termo à vida da falecida C…, tendo com isso cometido um crime de homicídio por negligencia, p. e p. pelo art. 137° do CP, crime cuja punição está relacionada precisamente com a formulação de deveres de cuidado no sentido da preservação de um determinado bem jurídico.
Para que o tipo legal de crime de homicídio negligente esteja preenchido, é necessário que à lesão do bem jurídico tutelado corresponda a violação de um dever de cuidado (cfr. Teresa Beleza, Direito Penal, Vol. II, Edição de 1983, Pág. 575 e Hans-Heinrich Jescheck, Tratado de Derecho Penal, Parte General, 4a Edição - 1993, Págs. 512 e 530).
Tal como vem consagrado na própria definição legal de negligência, a mesma está relacionada também com a capacidade instrumental do agente, que se afere a partir do seu conhecimento e capacidades pessoais -art° 15° do Código Penal.
"Age com negligência quem, por não proceder com o cuidado a que, segundo as circunstâncias, está obrigado..." (violação do dever de cuidado) e "... e de que é capaz", (capacidade instrumental )
(Neste sentido Figueiredo Dias in Temas Básicos da Doutrina Penal, Coimbra Editora - 2001, pág. 352).
A capacidade instrumental é a capacidade que detém o "homem médio", ou seja, aquele pertencente à categoria intelectual e social do círculo de vida do agente" (Figueiredo Dias ob. citada).
Ou seja, teremos de analisar não só aquilo que é previsível e evitável para a generalidade das pessoas, mas também se para aquela pessoa em concreto, era previsível e evitável que um certo acontecimento se desse.
No caso em apreço, o proprietário ou comodatário da viatura são pessoas colectivas cujo objecto é precisamente a venda e transporte de pedra, sendo que para tal possuem ao seu serviço várias viaturas pesadas, com as quais o seu administrador lida diariamente, sendo as mesmas indissociáveis da actividade da empresa, estando por isso cientes das necessidades e particularidades das mesmas.
Tinham por isso a obrigação de prever que, ao não estar assegurada uma cautelosa e eficaz manutenção preventiva da viatura, incrementariam exponencialmente os riscos de um acidente.
Por forma a concluir pelo respeito ou desrespeito do dever de cuidado, há que atender à circunstancia de o agente ter superado ou não o risco permitido, no sentido de que, se o agente ultrapassa o limite do risco permitido, faz subir as probabilidades de certo evento, podendo tomar-se juridicamente responsável pela produção do mesmo — vide Claus Roxin, "Violação do Dever e Resultado nos Crimes Negligentes", in Problemas Fundamentais do Direito Penal, Colecção Vega Universidade, 3.a Edição - 2004, Pág. 256 e seg.
Segundo este autor, para se saber se determinada conduta pode ou não ser imputada ao agente como violadora do dever de cuidado, há que averiguar se a conduta concreta do agente fez aumentar a probabilidade de produção do resultado em comparação com o risco permitido.
Se assim for, dever-se-á punir a título de crime negligente; se não houver aumento de risco, o agente não poderá ser responsabilizado.
O dever objectivo de cuidado retira-se das circunstâncias concretas de cada caso, sendo que, no caso em análise, sendo todos os responsáveis pessoas especializadas em lidar com viaturas pesadas, porque o fazem diariamente, estavam cientes das limitações da viatura MQ (idade e esforço diário), com a agravante de estarem também cientes de que a manutenção "paupérrima" da mesma, se traduziria, mais tarde ou mais cedo, num acidente do qual resultariam danos.
Termos em que deverá ser negado provimento ao recurso do arguido B… e ser confirmada a decisão instrutória que pronunciou o arguido pelo crime de homicídio por negligência.

5. O Ministério Público também apresentou resposta ao recurso, pugnando pela sua improcedência, essencialmente, com base na fundamentação da decisão instrutória, que classificou de exemplar.
6. Nesta instância, o Ministério Público emitiu parecer, pugnando pela improcedência do recurso do arguido, essencialmente, por entender que os elementos recolhidos em inquérito e no decurso da instrução apoiam a descrição dos factos efetuada pelo assistente e com o acervo probatório existente no processo é altamente provável que o arguido seja condenado em julgamento.
7. Não tendo sido requerida audiência, o processo foi à conferência, após os vistos legais, respeitando as formalidades legais [artigos 417º, 7 e 9, 418º, 1 e 419º, 1 e 3, c), todos, ainda do mesmo texto legal].

Questões a decidir
Do thema decidendum dos recursos:
Para definir o âmbito dos recursos, a doutrina [1] e a jurisprudência [1] são pacíficas em considerar, à luz do disposto no artigo 412º, nº 1, do Código de Processo Penal, que o mesmo é definido pelas conclusões que os recorrentes extraíram da sua motivação, sem prejuízo, forçosamente, do conhecimento das questões de conhecimento oficioso.
A função do tribunal de recurso perante o objeto do recurso, quando possa conhecer de mérito, é a de proferir decisão que dê resposta cabal a todo o thema decidendum que foi colocado à apreciação do tribunal ad quem, mediante a formulação de um juízo de mérito.
Atento o teor do relatório produzido nesta decisão, importa decidir as questões substanciais suscitadas neste recurso:
Nos presentes autos encontra-se consubstanciada prova indiciária suficiente da prática, pelo arguido B…, por omissão, a prática de um crime de homicídio por negligência, p. e p. pelo art. 137.°, n°l, do Código Penal, em conjugação com o disposto pelo art. 10.° do mesmo diploma?
*
Para decidir as matérias acima descritas, importará, primeiramente, recordar a fundamentação da decisão instrutória recorrida.
*
II – FACTOS PROCESSUAIS RELEVANTES
Extrato da decisão:
«(…)
Nos termos do disposto pelo art. 286°, n° 1 do Código de Processo Penal, a instrução visa comprovar judicialmente a decisão de acusar ou de arquivar o inquérito, com a formulação de um juízo de probabilidade para legitimar a sujeição do arguido a julgamento.
Assim, se até ao encerramento da instrução forem recolhidos indícios suficientes de se terem verificado os pressupostos de que depende a aplicação, em julgamento, de uma pena ou uma medida de segurança, o juiz profere despacho de pronúncia, caso contrário, profere despacho de não pronúncia - cf. art. 308°, n° 1 do Código de Processo Penal.
Segundo dispõe o art. 283°, n° 2 do Código de Processo Penal "consideram-se suficientes os indícios sempre que deles resultar uma possibilidade razoável de ao arguido vir a ser aplicada, por força deles, em julgamento, uma pena ou uma medida de segurança".
Embora existam divergências na doutrina e jurisprudência quanto a saber quando é que os indícios são suficientes, diremos que, com a posição maioritária, entendemos ser necessário que dos indícios resulte uma forte ou séria possibilidade de condenação em julgamento.
Nesta linha de orientação se posiciona o Professor Figueiredo Dias ("Direito Processual Penal", I, 1984, pág. 133) que se pronuncia nos seguintes termos: "os indícios só serão suficientes e a prova bastante, quando, já em face deles, seja de considerar altamente provável a futura condenação do acusado, ou quando seja mais provável do que a absolvição".
Assim também o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 18.10.2005, publicado em www.dgsi.pt/isti. onde pode ler-se que "aquela «possibilidade razoável» de condenação é uma possibilidade mais razoável, mais positiva do que negativa; o juiz só deve pronunciar o arguido quando, pelos elementos de prova recolhidos nos autos, forma a sua convicção no sentido de que é (mais) provável que o arguido tenha cometido o crime do que o não tenha cometido ou os indícios são os suficientes quando haja uma alta probabilidade de futura condenação do arguido, ou, pelo menos uma probabilidade mais forte de condenação do que de absolvição".
No mesmo sentido o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 28/9/11, publicado no mesmo local, decidiu que "a suficiência dos indícios (...) pressupõe a formação de uma verdadeira convicção de probabilidade: Indícios suficientes são assim, «os elementos que, relacionados e conjugados, persuadem da culpabilidade do agente, fazendo nascer a convicção de que (o arguido) virá a ser condenado. Eles constituem um todo persuasivo de culpabilidade do arguido, impondo um juízo de probabilidade do que lhe é imputado".
Com interesse para a decisão instrutória, consideram-se os seguintes factos suficientemente indiciados:
No dia 27 de Janeiro de 2015 às 17:55h a viatura pesada de mercadorias de marca T…, com a matrícula MQ-..-.. circulava na Rua …, em …, concelho de Matosinhos, no sentido … - ….
Quando efectuava uma curva à direita, o rodado da parte lateral esquerda traseira soltou-se do seu eixo, atrasando-se em relação ao pesado, que prosseguiu marcha, foi continuando aos saltos, pela parte traseira do pesado, em direcção ao passeio do lado direito da via de trânsito por onde a viatura circulava, e atento o sentido desta, acabando por embater no peão de seu nome C…, que transitava nesse passeio no mesmo sentido que a viatura pesada.
Com a violência do embate, a referida C… foi projectada para a frente, caindo no solo e embatendo com a cabeça no passeio, acabando por falecer no local devido às lesões traumáticas meningo-encefálicas, vertebro-medulares, torácicas, abdominais e pélvicas, descritas no relatório da autópsia, que o embate desse rodado lhe provocou.
No momento do sinistro, a viatura MQ-..-.. era conduzida pelo arguido O… e era propriedade da empresa "D…, Lda.".
Encontrando-se todavia na posse da empresa E…, SA, em virtude de um contrato de comodato celebrado entre esta última e a "D…, Lda.".
O eixo da viatura soltou-se do rodado da parte lateral esquerda traseira em virtude da sobrecarga e falta de manutenção das peças que o compunham, situação que levou a que a porca de afinação, anilha de freio e porca de fixação, tivessem sido forçados a rodar por acção da gripagem existente no rolamento de fora e anel interior do rolamento de fora, até se soltarem completamente da parte roscada do eixo, culminando com a libertação da roda do eixo auxiliar traseiro do camião.
Para além disso, a porca de fixação possuía danos provocados pela utilização de uma ferramenta de impacto "afiada", ferramenta imprópria para efectuar a operação de desaperto e/ou aperto da porca do cubo da roda.
A viatura MQ – .. - .., à data do acidente, tinha 24 anos e 6 meses, e era alvo de utilização pela comodatária, servindo para transporte de várias toneladas, dado que era a única viatura ao serviço da empresa comodatária que possuía grua.
Ao arguido B…, administrador da comodatária do veículo em causa, pessoa que tomava e toma as decisões em representação da empresa, incumbia acautelar a correta manutenção preventiva da viatura, da qual faria parte a supervisão e substituição das peças aqui em causa - porca de afinação, anilha de freio e porca de fixação.
Incumbia-lhe assegurar e incumbir terceiro, nisso especializado, de regular e periodicamente tratar da manutenção preventiva da viatura, da qual faria parte a supervisão ou vigilância e substituição das peças aqui em causa - porca de afinação, anilha de freio e porca de fixação.
A viatura pesada não era sujeita a revisões periódicas, antes apenas a reparações pontuais de avarias que iam surgindo.
O arguido B…, como responsável da empresa comodatária, que mantinha a viatura em laboração, deveria exercer uma permanente vigilância sobre ela e, de modo preventivo, vigiando regularmente as componentes de maior risco - desde logo eixo, rodas, direcção e pneus.
O arguido Y…, sócio gerente da H…., Lda, havia sido incumbido, num período não concretamente determinado, mas durante vários anos antes dos factos aqui em causa, pelo administrador da empresa comodatária E…, de levar a cabo reparações na viatura.
O arguido B…, administrador da E…, SA, não garantiu a cabal manutenção preventiva da viatura, tendo a obrigação (desde logo, porque ciente das necessidades especificas das viaturas pesadas e do desgaste que sofrem) de prever que ao descurar o rigor na manutenção das peças que compõem o eixo, estas deixariam de garantir a fixação devida dos rodados, e que tal acarretaria um aumento exponencial da possibilidade de acidente rodoviário.
Ao não tomar as precauções devidas, a sua atitude deu causa ao acidente que pôs termo à vida da falecida C….
Com interesse para a decisão instrutória, nenhum outro facto se indiciou.
Em especial, consideram-se os seguintes factos não suficientemente indiciados:
Ao arguido O…, condutor da mesma viatura, era exigível que desse conta àquele responsável e eventualmente ao mecânico que dava assistência à mesma viatura da necessidade de serem feitas as tais intervenções regulares e periódicas na mesma viatura.
Era-lhe exigível que avisasse a entidade patronal da necessidade dessas intervenções mecânicas preventivas e que soubesse do risco que da utilização da viatura sem essas intervenções advinha para terceiros.
A causa da avaria - rolamentos gripados - era detectável pelo arguido O…, face ao tipo de ruído que provocava e a sinais que se notavam na própria condução.
Os trabalhos de reparação que ultrapassassem um simples mudar de óleo eram a cargo da oficina H…, Lda,
Pelo menos aquando das últimas vezes que a viatura se encontrou naquela oficina, já existiam sinais da avaria do eixo mesma.
A necessidade de reparação de tal avaria era detectável pelo arguido Y…, se tivesse usado dos cuidados que o circunstancialismo ditava (tipo de viatura, idade, trabalhos a que estava submetida), e o arguido Y… estava obrigado a alertar o condutor e o comodatário para a necessidade de reparação e a reparar a mesma.
Nas intervenções que o arguido Y… efectuou na viatura e concretamente no eixo traseiro da mesma, foram utilizadas ferramentas inadequadas, o que mais agravou a causa da avaria.
Os arguidos O… e Y… tinham a obrigação de prever que ao descurar o rigor na manutenção e no manuseamento das peças que compõem o eixo, deixariam de garantir a fixação devida dos rodados, e que tal acarretaria um aumento exponencial da possibilidade de acidente rodoviário.
Ao não tomarem as precauções devidas, os arguidos O… e Y… deram causa ao acidente que pôs termo à vida da falecida C….
Motivação
A convicção do tribunal, quantos aos factos suficientemente indiciados, baseou-se na consideração conjugada da prova constante dos autos, analisada à luz das regras da experiência, relevando desde logo, sobre as circunstâncias do acidente que causou a morte à vítima, lesões que conduziram a esta e características do veículo pesado em causa, os elementos constantes de 13 a 20, 43, 44, 47 a 79, 168 a 175 (relatório de autópsia), 284 a 288 (relatório da GNR, destacamento de trânsito), e bem assim o depoimento de AB… (fls. 187), testemunha presencial do ocorrido, sendo certo que nenhum outro elemento existe que contrarie aqueles, designadamente as declarações do arguido O… (que confirmou ser o condutor da viatura em causa), que não se apercebeu, até ser alertado por terceiros, do soltar do rodado e do atingimento da vítima.
No que respeita à propriedade da viatura e contrato de comodato sobre a mesma, relevaram os documentos de fls. 75 e 264 a 266.
Quanto às razões da libertação da roda do eixo auxiliar traseiro do camião, considerou- se o relatório pericial constante dos autos (fls. 176 e segs. e respectivo DVD), a que alude também o relatório de fls. 284 a 288, sendo visíveis nas fotos que acompanham aquele os danos nas peças que motivaram tal libertação.
Tais elementos encontram-se ainda complementados e rectificados pelas declarações de P… (fls. 567 e 617) e Q… (fls. 617), peritos que elaboraram o relatório de fls. 176 e segs., e AC… cabo da GNR (destacamento de trânsito) que elaborou o relatório de fls. 284 a 288.
Dos relatórios e declarações por último referidos decorre claramente que foi a ausência da necessária manutenção do veículo em questão que determinou que não fossem detectadas e corrigidas as deficiências nas peças que, precisamente em virtude de estarem danificadas, levaram a que o rodado se soltasse.
Ora, de acordo com as declarações do arguido O… (fls. 253), motorista do veículo em causa, na E… era feita por um mecânico a "manutenção geral", efectuando-se as "reparações mais complicadas" fora da empresa, sendo que "quando se apercebia de alguma anomalia", "dava conhecimento ao Engenheiro W…", e "quando era detectada a avaria o veículo parava e era reparado".
Pelo arguido W… (fls. 635) foi dito que era o motorista a dar conhecimento ao encarregado V… da necessidade de manutenção do veículo, sendo este quem reportava à administração, nomeadamente à parte financeira, e sendo esta quem diligenciava por encontrar oficina.
A testemunha U…, responsável financeira da E…, afirmou (fls. 696) que as manutenções são impulsionadas pelo motorista, sendo a depoente quem dá autorização e ordem para a reparação e pagamento.
V… (fls. 698), responsável geral de produção da E…, afirmou que as manutenções dos veículos são impulsionadas pelos respectivos motoristas, sendo apenas avisado disso, pois os veículos ficam indisponíveis para as entregas, sendo a programação destas e a organização das cargas diárias da sua competência, já não o velar directamente pela manutenção dos veículos.
Já o arguido X… (fls. 750) declarou que é mecânico da "E…, S.A." há cerca de 17 anos, mas que faz a manutenção das máquinas industriais, como talhadoras de blocos de pedra, polidoras, engenhos de cortar pedra, etc. Nos camiões só faz mudanças de óleo, de 10.000 em l0.000 km, e lubrificação das ponteiras de direcção e transmissões, que é feita semanalmente nos camiões. As manutenções dos 20.000km e as revisões são feitas numa empresa de mecânica em Amarante. Nunca fez a manutenção do eixo auxiliar traseiro do lado esquerdo do MQ-..-.., pois só uma empresa especializada o pode fazer.
Por sua vez, o arguido Y… (fls. 793) declarou que a sua empresa labora na área da manutenção e reparação de viaturas pesadas, já tendo prestado este tipo de serviço, nomeadamente à MQ-..-.., designadamente no motor. As reparações ora são solicitadas pelo motorista, ora pelo Sr. W…, sendo que a última reparação ao MQ-..-.. foi em 26-06-2017. Em 05-12-2014 realizou uma intervenção referente a componentes do motor.
Mais afirmou que nunca procedeu a qualquer reparação e/ou manutenção das peças que supostamente originaram que a roda se soltasse do eixo da viatura MQ-..-.., ou seja, na roda traseira lado esquerdo, referindo que, antes do veículo chegar à oficina, já sabiam a intervenção a fazer, nunca se tendo apercebido de qualquer anomalia nos rodados do veículo, tanto mais que o rodado que estava danificado é de elevar, assim, apenas está junto ao solo quando o veículo se encontra a transportar carga, razão pela qual, quando se deslocava à oficina para reparação ou manutenção, o rodado encontrava-se suspenso/levantado, pelo que não foi verificado.
Ouvidos em sede de instrução, V… e W… (que já não são arguidos nesta fase processual) corroboraram o já referido no inquérito, sendo clara a contradição entre as suas declarações e as da testemunha X…, que aqueles disseram não proceder a trabalhos em veículos, sendo certo que pelo mesmo foi expressamente referido fazer mudanças de óleo aos camiões a pedido do encarregado "Sr. V…".
Conjugadas as declarações a que resumidamente nos vimos de referir, verifica-se reinar no seio da E…, de que o arguido B… é o presidente do conselho de administração (documento de fls. 628 a 631), alguma confusão quanto a quem faz o quê, designadamente no que respeita aos veículos pesados utilizados.
Além disso, verifica-se que tais veículos eram intervencionados apenas quando era detectada uma avaria, sem que houvesse qualquer plano de manutenção regular, ou quaisquer instruções no sentido de velar pela mesma: W… afirmou mesmo, em sede de instrução, que não havia instrução de manutenção regular fora da oficina.
E tal explica, a nosso ver, que não fosse possível sequer, ainda que tenham sido juntas ao processo facturas de múltiplas oficinas (fls. 105 a 125), determinar onde foi feita intervenção nas peças cujas deficiências deram origem a que o rodado se soltasse.
E a ausência de manutenção não será alheia ao historial de reprovações, em sede de inspecção periódica, correspondente à viatura em causa, como se retira de fls. 78.
Veja-se que, de acordo com os esclarecimentos do perito P… em sede de instrução, o veículo em causa tem condições para circular com segurança se estiver sujeito a manutenção regular e correcta, devendo todos os camiões realizar pelo menos duas manutenções por ano, consoante a utilização da viatura. Mais referiu que, nos componentes em causa, não há periodicidade de substituição, não existe uma durabilidade expectável, dependendo da utilização que é feita; tem que ir sendo feita manutenção para se compreender que algum componente não está em condições.
Acrescentou que (como já consta a fls. 617) a viatura não é conhecida na rede de concessionários T… e que, quanto mais antigos os camiões, maior número de manutenções deve realizar.
E também o perito Q… esclareceu que, na parte analisada, a viatura estava mal tratada, com peças danificadas que não estariam lá se houvesse manutenção.
Referiu ainda que uma viatura com a idade em causa requer maiores cuidados, estando em causa peças de maior desgaste, com ajustes rigorosos a serem feitos com ferramentas de precisão.
Assim, tendo em conta as características do veículo em questão, com quase 25 anos de idade e utilizado regularmente, pensamos que, de acordo com as mais elementares regras da experiência, ao arguido B…, como administrador da sociedade (E…, S.A.) que da viatura em questão retirava proveito, incumbia, quanto mais não fosse através de instruções precisas (cujo cumprimento lhe incumbia também fiscalizar) às pessoas competentes, assegurar que a viatura fosse sujeita a manutenção periódica e regular, em oficina especializada. Tal era o cuidado que lhe era exigível e não há razões para pensar que do mesmo não fosse capaz.
De acordo com a prova supra descrita, nada disto foi feito.
Ao invés, de acordo com tal prova e com as próprias declarações do arguido B…, a viatura em questão carecia de tal manutenção preventiva, sendo reparada apenas quando surgiam avarias, não sabendo o arguido, ou os demais inquiridos funcionários da sociedade, indicar oficina onde aquela tenha sido sujeita a intervenção aos componentes cuja danificação esteve na origem do acidente que vitimou C….
Aliás, tendo o arguido B… identificado V… como encarregado geral da manutenção na aludida sociedade, e pessoa que teria noção do que eram as instruções para a segurança dos veículos, o certo é que tal não foi minimamente confirmado por aquele, que afirmou em sede de instrução que o motorista só dava conhecimento de que o veículo ia para manutenção, fazendo o levantamento das necessidades e tratando directamente com a directora financeira o local da reparação, apenas lhe sendo comunicado que o veículo não ia estar disponível para as entregas (como vimos, tal testemunha já havia afirmado em sede de inquérito não velar directamente pela manutenção dos veículos).
Face ao exposto, apenas podemos concluir pela indiciação dos factos imputados ao arguido B….
No que respeita aos factos não indiciados, verifica-se que não há quaisquer elementos de prova no sentido da detectabilidade da avaria em questão por parte dos arguidos O… (os peritos ouvidos em sede de instrução admitiram claramente a hipótese de não ser detectável por este, atendendo às características do veículo) e Y… (não resultando da prova produzida, sequer, que a H…, Lda, de que é legal representante, tenha intervindo nas peças em questão, intervenção que o mesmo negou), sendo certo que resulta das facturas juntas aos autos que a viatura foi intervencionada em múltiplas oficinas para além da H…, Lda (e os peritos supra referidos, em sede de instrução, confirmaram não ser possível saber, através das facturas juntas, onde foi feita intervenção nas referidas peças).
Além disso, estando em causa mero funcionário da E… (o arguido O…) e legal representante (o arguido Y…) de sociedade que prestou serviços mecânicos à viatura de que aquela era comodatária, não podemos concluir pela indiciação de que sobre os mesmos impendessem as obrigações que lhes eram imputadas.
Aliás, no que respeita ao primeiro (em relação ao segundo pensamos ser despiciendas ulteriores considerações), resulta da prova supra descrita que o mesmo ia reportando superiormente as avarias da viatura no sentido da sua reparação, não tendo razões para, no seio da sua entidade patronal, entender ser insuficiente a sua diligência, já que nada mais lhe ia sendo exigido, sendo certo que, de acordo com as suas declarações (fls. 252), o veículo já se encontrava na E… quando passou a trabalhar nesta empresa, 15 anos antes dos factos.
*
Enquadramento jurídico-penal dos factos
Aos arguidos é imputada a prática de um crime de homicídio por negligência, p. e p. pelo art. 137.°, n°l, do Código Penal.
Em conformidade com a previsão incriminadora do n°l do art. 137.° do C. Penal, "quem matar outra pessoa por negligência é punido com pena de prisão até três anos ou com pena de multa".
A estrutura do tipo em presença é aparentemente simples e pode linearmente sintetizar-se pela forma seguinte: o respectivo sujeito activo pode ser qualquer pessoa, tratando-se, pois, de um crime comum; a conduta típica consiste em, através do emprego de qualquer meio ou mecanismo, suprimir a vida de outrem; ainda em sede de tipo objectivo, é necessário que a morte (desvalor de resultado) seja objectivamente imputável (num critério teleológico-normativo) à conduta violadora do cuidado devido.
Para que determinada conduta possa ser subsumida à materialidade objectiva do referido tipo incriminador é necessário que o agente tenha, por acção ou por omissão, realizado o resultado proibido por lei: a supressão da vida de outrem.
Neste sentido e uma vez que o evento ocasionado se distingue, em termos fenomenológicos, da conduta que lhe dá causa, pode dizer-se que o crime de homicídio negligente é, do ponto de vista da actuação do agente sobre o bem jurídico protegido, um crime material ou de resultado.
Atento o teor da factualidade imputada aos arguidos, está em causa nos presentes autos, não uma acção daqueles conducente ao resultado proibido, mas um eventual comportamento omissivo.
Assim, para a análise desta forma de comissão (por omissão), ter-se-á de recorrer, antes de mais, ao art. 10.° do C. Penal:
Assim, prescreve o n°l de tal norma que "Quando um tipo legal de crime compreender um certo resultado, o facto abrange não só a acção adequada a produzi-lo como a omissão da acção adequada a evitá-lo, salvo se for outra a intenção da lei" (sublinhado nosso), estabelecendo o seu n°2 que "A comissão de um resultado por omissão só é punível quando sobre o omitente recair um dever jurídico que pessoalmente o obrigue a evitar esse resultado (mais uma vez, sublinhado nosso).
A esta forma de crime por omissão chama a doutrina da omissão impura, já que a mesma resulta por indicação de um tipo legal de crime na sua formulação positiva de acção do agente e não por realização de um tipo legal de crime especificamente previsto na parte especial do C. Penal ou em legislação extravagante.
A omissão apresenta-se, assim, como uma forma típica de realização de um crime, devendo contudo, e para isso, verifícar-se uma série de requisitos naquela disposição indicados.
Verifica-se pois uma cláusula geral de equiparação que se verificará sempre que através de uma autónoma valoração ético-social se chegue à conclusão que, no caso concreto, o desvalor da omissão é semelhante ao desvalor da acção. Esta equiparação será pois suportável sempre que ela seja indiscutível à face da valoração ético-social da ilicitude.
Apesar da aludida cláusula geral de equiparação, produzido determinando resultado típico, apenas há crime por omissão quando sobre o agente haja um determinado dever jurídico de agir, que pessoalmente o obrigue a evitar o resultado típico (no caso dos autos, a morte). Ou seja, quando sobre o agente recai um dever de garante de não verificação do resultado.
Assim, não é sobre toda e qualquer pessoa que recai o dever de agir, contrariando um resultado lesivo para um certo bem jurídico.
Qualquer formulação vaga que assim estipulasse estaria ferida de inconstitucionalidade por violar o princípio da legalidade, na sua formulação de tipicidade, bem como da proporcionalidade. Daí ser necessária a existência de um dever que pessoalmente obrigue o agente a intervir.
Para além do referido dever de intervir, só se pune a omissão quando o comportamento que se esperava do agente fosse idóneo a evitar o resultado. Compreende-se que assim seja, pois se o resultado se verificasse mesmo que o agente tivesse agido, não faria sentido punir a omissão deste.
Ora, de onde emerge esse dever jurídico que fundamenta a punibilidade da omissão?
Começou por entender-se que o dever jurídico de garante (a posição de garante) teria de fundar-se na lei, num contrato ou numa situação de ingerência, se desta resultasse perigo para bens jurídicos criados pelo próprio omitente, ainda que não culposamente.
Seguindo o entendimento de Figueiredo Dias, um alargamento desmesurado das fontes de onde deriva esta posição de garante poria em sério risco as exigências da segurança das pessoas e da determinabilidade dos tipos incriminadores exigidos pelo princípio da legalidade. Assim, a lei, o contrato e a ingerência não são fontes do dever de garante mas apenas planos em que aquele se deve reflectir.
Nas exactas palavras de Figueiredo Dias, "a verdadeira fonte dos deveres e das posições de garantia reside (...) na valoração autónoma da ilicitude material, completadora do tipo formal, através da qual a comissão por omissão vem a equiparar-se à omissão na situação concreta, por força das exigências de solidariedade do homem para com os outros homens dentro da comunidade. Caso em que será a "proximidade existencial do 'eu' e do 'outro', o princípio dialógico do "ser-com-os-outros e "ser-para-os-outros", o exercício da virtude cristã da "caridade" e do "amor do próximo" (ou como quer que prefiramos exprimir-nos) que criam os deveres e as posições de garantia".
"Só que", continua Figueiredo Dias, "o ser assim não pode significar a substituição, a nível do tipo de ilícito, de deveres que têm de surgir como especificamente jurídicos (...), por um qualquer quadro de concepções morais que valeriam mediatamente como deveres jurídicos: toda a manifestação imposta de solidarismo tem de se apoiar em um claro vínculo jurídico" (ob. cit., pág. 704).
No presente caso, vejamos se os arguidos tinham, de algum modo, um dever jurídico que os obrigasse, pessoalmente, a agir (no sentido de assegurar a manutenção das peças do veículo pesado cuja danificação levou a que o rodado se soltasse e atingisse a vítima, provocando-lhe a morte) para evitar um resultado que se veio a verificar.
Nos termos do art. 503.°, n°l, do C. Civil, aquele que tiver a direcção efectiva de qualquer veículo de circulação terrestre e o utilizar no seu próprio interesse, ainda que por intermédio de comissário, responde pelos danos provenientes dos riscos próprios do veículo, mesmo que este não se encontre em circulação.
Nos termos do art. 2.°, n°l, do DL n.° 554/99, de 16 de Dezembro, as inspecções periódicas visam confirmar, com regularidade, a manutenção das boas condições de funcionamento e de segurança de todo o equipamento e das condições de segurança dos veículos referidos no artigo anterior, de acordo com as suas características originais homologadas ou as resultantes de transformação autorizada nos termos do artigo 115.° do Código da Estrada.
E o art. 10.°, n°l, do mesmo diploma, prescreve que compete ao proprietário, usufrutuário, adquirente com reserva de propriedade, locatário financeiro ou a qualquer outro seu legítimo possuidor a responsabilidade pela apresentação do veículo às inspecções previstas no diploma em questão.
Ora, estando o veículo em causa nos autos ao serviço da sociedade E…, mediante contrato de comodato, concluímos ser esta quem tem a sua direcção efectiva, utilizando-o no seu próprio interesse e devendo assegurar, como legítima possuidora, as boas condições de funcionamento e de segurança de todo o equipamento e as condições de segurança do veículo, sendo responsável pelos danos que a circulação deste, que comporta perigos evidentes, possa causar.
Neste sentido, refere Figueiredo Dias (ob. cit., pág. 711) que uma das fontes do dever de garante é o dever de fiscalização de fontes de perigo no âmbito de domínio próprio, cujo "fundamento material geral residirá em que a comunidade tem de poder confiar em quem exerce um poder de disposição sobre um âmbito de domínio ou sobre um lugar determinado, que se encontram acessíveis a outras pessoas, deve também dominar os riscos que para estas podem resultar de estados ou de situações perigosas" (em itálico no original).
E um dos exemplos deste tipo de fonte do dever de garante dados pelo citado Autor é, precisamente, "o caso de donos de veículos motorizados que devem conservá-los em condições de segurança".
Aqui chegados, importa perguntar: poderá retirar-se do exposto que, designadamente por força das normas que vimos de referir e da sua ligação à E…, está fundado para os arguidos um dever jurídico que os obrigasse, pessoalmente, a agir?
A resposta terá de ser, em relação ao arguido B…, positiva. Com efeito, sendo aquele administrador da sociedade em causa, incumbia-lhe agir no sentido de assegurar que os veículos ao seu serviço circulassem de forma segura, designadamente, para os demais utentes da via pública, fossem eles condutores de outros veículos ou peões, como a vítima. Está, assim, afirmada a posição de garante do arguido B…, sendo que a acção por ele omitida - acautelar a correta manutenção preventiva da viatura, da qual faria parte a supervisão e substituição das peças em causa - era adequada a evitar a produção do resultado típico - a morte da vítima - que veio a verificar-se.
Já no que respeita aos arguidos O… e Y…, a resposta será negativa.
Em relação ao primeiro, não se deu como indiciado que a deficiência dos componentes em questão fosse perceptível ao mesmo, como motorista, não sendo a ele, como mero funcionário da sociedade, que incumbiria determinar a manutenção a efectuar aos veículos que a mesma tem ao seu serviço.
Quanto ao segundo, apenas resultou indiciado que foi incumbido, num período não concretamente determinado, mas durante vários anos antes dos factos aqui em causa, pelo administrador da empresa comodatária E…, de levar a cabo reparações na viatura (sendo certo que ficou por indiciar que a necessidade de reparação da avaria em questão fosse detectável pelo arguido Y…). Tal é manifestamente insuficiente para fundar o aludido dever jurídico de acção.
Estes dois arguidos não podem, pois, ser pronunciados.
Verificado, no caso em apreço, fundamento para equiparar a omissão da conduta do arguido B… à acção susceptível de produzir o resultado típico, cumpre analisar se há culpa do mesmo.
Tratando-se de responsabilidade negligente, o comportamento do agente haverá de configurar a violação de um dever objectivo de cuidado (cfr. art. 15.° do Cód. Penal), sendo este o elemento normativo nuclear em torno do qual se estrutura o ilícito típico em presença.
O dever de cuidado é, "em termos dogmáticos, o ideal de um cânone de comportamento que a sociedade julga como o mais adequado à protecção de bens jurídico- penais" (Faria Costa, "O Perigo em Direito Penal", pág. 478), e os crimes negligentes inscrevem-se, justamente em razão da imprecisão do conceito, na categoria dos chamados tipos abertos.
Pese embora o que ficou dito, um esforço de sistematização é, todavia, possível, podendo reconduzir-se o dever objectivo de cuidado ou diligência aos usos e normas jurídicas associadas ao exercício de um certo ofício ou actividade, às normas ou regulamentos que visam prevenir perigos - como justamente sucede com as disposições do Código da Estrada - e, finalmente, aos usos e à experiência comum com vista à adopção de determinadas cautelas e cuidados a fim de evitar a produção do resultado (cfr. Eduardo Correia, "Direito Criminal I", 1971, pág. 425 e segs.).
Revertendo ao caso dos autos à luz de quanto vai dito, importa começar por determinar se, com a conduta por si empreendida, o arguido violou uma qualquer norma objectiva de cuidado, cuja inobservância se possa dizer causal do acidente que vitimou C….
Assim, estando em causa um veículo pesado com quase 25 anos de idade, utilizado regularmente e sujeito a cargas pesadas, as mais elementares regras da experiência ditavam que o mesmo fosse sujeito, de forma sistemática e periódica, a acções de manutenção, com verificação exaustiva dos componentes sujeitos a maior desgaste e de maior importância para a segurança da circulação, entre os quais, obviamente, os atinentes aos rodados. Tal manutenção teria de ser efectuada, como nos parece óbvio, em oficina e por pessoas especializadas, que assegurassem a utilização dos métodos e ferramentas adequados.
A necessidade de proceder com tais cuidados, aliás, encontra eco legal na obrigatoriedade de inspecção periódica dos veículos automóveis ligeiros, pesados e reboques, a qual, saliente-se, não assegura que os aludidos componentes estejam em boas condições, já que, de acordo com o Anexo II do DL n.° 554/99, de 16 de Dezembro (diploma que regula tal inspecção), as observações e verificações são efectuadas sem desmontagem das peças do veículo. Esta desmontagem deverá, assim, ser efectuada no âmbito da manutenção a assegurar por quem do veículo retira benefício.
Ora, atenta a indiciada factualidade, torna-se claro que na conduta omissiva do arguido B… se surpreende a violação do dever objectivo de cuidado a que se encontrava vinculado.
De qualquer forma, para que um determinado comportamento seja subsumível ao disposto no art. 137.°, n.°l, do Cód. Penal, o resultado produzido haverá de ser imputável à concreta violação do dever objectivo de cuidado pelo agente, em conformidade com as regras da imputação objectiva.
Uma vez que a falta de observância das normas de cuidado, constituindo embora um indício do preenchimento do tipo de ilícito, não pode, em caso algum, fundamentá-lo (cfr. Figueiredo Dias, Comentário Conimbricense do Código Penal, Tomo I, pág.108), necessário se torna ainda, para que a ilicitude se afirme, que o resultado típico proibido possa ser imputado à concreta violação do dever objectivo de cuidado pelo agente, em conformidade com as regras da imputação objectiva. E isto porque "a mera omissão dum dever jurídico não implica, desde logo, a possibilidade objectiva da negligência", sendo ao invés "necessário que esse dever jurídico se possa dizer adequado a evitar a produção do evento" (ob. cit., pág. 425). Dito de outro modo, é necessário que no dano ocasionado - no caso, a morte da vítima - se possa reconhecer uma concretização típica do perigo - no caso, para a vida do falecido - criado, assumido ou potenciado pelo agente ao não observar o dever de cuidado a que estava obrigado em razão das regras da experiência ou por força de determinada norma jurídica.
Ora, no caso dos autos, facilmente se conclui que as regras da experiência, ao impor a manutenção preventiva do veículo em questão nos termos supra expostos, visam precisamente minimizar os riscos de acidente, e mormente os provocados pelo soltar-se de um rodado, com a inerente probabilidade (além da eventual falta de controlo do próprio veículo por quem o conduz) de atingimento de bens ou pessoas (pois que a viatura em questão se destina obviamente a circular na via pública, juntamente com inúmeros outros veículos e pessoas), como no caso dos autos, contribuindo a não observância daquelas, sem sombra de dúvida, para a potenciação do risco de produção do resultado danoso, tendo sido precisamente no desenvolvimento desse risco potenciado que veio a ocorrer a morte da vítima: a conduta inobservante do arguido fez aumentar a probabilidade de produção do resultado em comparação com o risco permitido, devendo reconhecer-se no processo causal que conduziu ao atingimento da vítima a concretização do risco proibido potenciado pela omissão daquele.
Uma vez aqui chegados, terá de valorar-se a negligência ao nível do tipo-de-culpa, que consiste, precisamente, na atitude pessoal descuidada ou leviana perante o dever-ser jurídico- penal.
Ora, este necessário juízo de culpa só poderá ser afirmado se, como dispõe o art. 15.° da lei penal substantiva, puder reconhecer-se naquele que actua uma capacidade pessoal para prever e para cumprir o dever objectivo de cuidado, bem como o concreto processo causal, o nexo entre a inobservância desse dever e o resultado punível, tendo em conta as suas faculdades e qualidades.
E o facto é que de toda a matéria de facto indiciada claramente resulta que o arguido podia e devia ter cumprido o dever de cuidado a que estava obrigado.
Com efeito, nada conduzindo a que se afirme uma capacidade individual inferior à do homem médio, era-lhe exigível, nas já analisadas circunstâncias, que assegurasse, através de instruções precisas (cujo cumprimento lhe incumbia também fiscalizar) às pessoas competentes, que a viatura em questão, atentas as suas características, fosse sujeita a manutenção periódica e regular, em oficina especializada. Tal era o cuidado que lhe era exigível e de que era, obviamente, capaz, pelo que, ao não proceder em conformidade com o mesmo, adoptou conduta leviana causadora do resultado morte.
Resulta, pois, suficientemente indiciada a prática pelo arguido do crime de homicídio negligente p. e p. pelo art. 137.°, n°1, do C. Penal, como tal, nos termos do art.. 308.°, n°l, do C.P.P., devendo ser pronunciado.
(…)"
III – FUNDAMENTAÇÃO EM MATÉRIA DE DIREITO

O arguido B… foi pronunciado pela prática de um crime de homicídio por negligência, p. e p. pelo art. 137.°, n°1, do Código Penal, em conjugação com o disposto pelo art. 10.° do mesmo diploma.
Em termos sucintos, tal deveu-se à produção da morte de um transeunte em resultado de uma roda se ter soltado de um camião quando este se deslocava na via pública, por motivo de falta de manutenção preventiva, competindo ao arguido a obrigação de, por si mesmo, ou através de terceiro, assegurar essa manutenção que não foi realizada.
Por seu turno, o arguido pronunciado não se conforma com o despacho de pronúncia, motivando o seu recurso, em suma, concluindo que a prova produzida não revelam indícios da praticado crime, uma vez que o veículo circulava com a I.P.O. válida, sem que a anomalia em causa tivesse sido detetada e o arguido sempre ordenou a realização das reparações das avarias que foram surgindo e lhe foram reportadas, juntando, inclusivamente, faturas de manutenções realizadas.
De jure
Tendo em conta o objeto do recurso, começa-se por recordar os requisitos legais previstos para a prolação de um despacho de pronúncia:
O artigo 308° do Código de Processo Penal estatui que há lugar a despacho de pronúncia, se tiverem sido recolhidos indícios suficientes de se terem verificado os pressupostos de que depende a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança.
Uma noção legal de indícios suficientes encontra-se na redação do número 2 do art. 283° do mesmo texto legal, considerando suficientes os indícios sempre que deles resultar uma possibilidade razoável de ao arguido vir a ser aplicada, por força deles, em julgamento, uma pena ou medida de segurança.
Por outras palavras, uma indiciação suficiente consiste na verificação de um conjunto de factos que, relacionados e conjugados, componham a convicção de que, com a discussão ampla em julgamento, resultarão provados - em juízo de certeza e não de mera probabilidade -, os elementos constitutivos da infração pela qual os agentes venham a ser julgados.
Essa verificação e subsequente formação da convicção não devem ser proferidas de forma apressada ou precipitada.
Para ser proferido despacho de pronúncia, os factos indiciários deverão ser suficientes e bastantes, de modo que, logicamente relacionados e conjugados, consubstanciem um todo persuasivo da culpabilidade dos arguidos, impondo um juízo de probabilidade no que respeita aos factos que lhe são imputados. Tal exigência de análise é reforçada pela importância social e pessoal de alguém ser sujeito a julgamento de natureza penal, gerando sequelas proporcionais ao grau de inocência das pessoas injustamente acusadas/pronunciadas.
Também a prova indiciária é apreciada segundo as regras de experiência e a livre convicção do julgador, com a amplitude prevista no artigo 127º do Código de Processo Penal, tendo enquanto pressupostos valorativos a obediência a critérios da experiência comum e de lógica do homem médio.
Exercendo a sua liberdade de convicção, o juiz de instrução criminal apenas tem de indicar os fundamentos suficientes para que, através das regras da ciência, da lógica e da experiência, se possa controlar a razoabilidade daquela convicção sobre a prova indiciária.
Foi o que fez no caso em apreço.
Em concreto:
Resulta claramente indiciado, sendo pacífico até para o arguido recorrente, que o veículo, cujo desprendimento da roda causou a morte de uma pessoa transeunte, estava ao serviço da sociedade E…, mediante contrato de comodato, a qual tinha a sua direção efectiva, utilizando-o no seu próprio interesse.
Competia-lhe, pois, nos termos legais bem enunciados no despacho de pronúncia, assegurar, como legítima possuidora, as boas condições de funcionamento e de segurança de todo o equipamento e do veículo, sendo responsável pelos danos que a circulação deste, que comporta perigos evidentes, possa causar.
O arguido ora recorrente, enquanto administrador dessa sociedade, incumbia-lhe agir no sentido de assegurar que os veículos ao seu serviço circulassem de forma segura, designadamente, para os demais utentes da via pública, fossem eles condutores de outros veículos ou peões, como a vítima. Está, assim, afirmada a posição de garante do arguido B…, sendo que a ação por ele omitida - acautelar a correta manutenção preventiva da viatura, da qual faria parte a supervisão e substituição das peças em causa - era adequada a evitar a produção do resultado típico - a morte da vítima - que veio a verificar-se.
Tratando-se de responsabilidade negligente, o comportamento do agente deverá integrar a violação de um dever objetivo de cuidado (art. 15.° do Cód. Penal), sendo este o elemento normativo nuclear em torno do qual se estrutura o ilícito típico em presença.
O dever de cuidado é, em termos dogmáticos, o comportamento expectável como sendo o mais adequado à proteção de bens jurídico-penais.
Estando o arguido obrigado a garantir as boas condições de funcionamento e de segurança de todo o equipamento e as condições de segurança do veículo pesado de mercadorias em causa e tratando-se este de um camião com quase 25 anos de idade, utilizado regularmente e sujeito a cargas pesadas, as mais elementares regras da experiência ditavam que o mesmo fosse sujeito, de forma sistemática e periódica, a ações de manutenção preventiva, com a verificação exaustiva dos componentes sujeitos a maior desgaste e de maior importância para a segurança da circulação, entre os quais, obviamente, os atinentes aos rodados.
Como referido pelo perito Q…, a viatura em apreço estava mal mantida, com peças danificadas que não estariam lá nessas condições se houvesse manutenção e uma viatura com a idade em causa requer maiores cuidados, estando em causa peças de maior desgaste, com ajustes rigorosos a serem feitos com ferramentas de precisão.
Assim, tendo em conta as características do veículo em questão, com quase 25 anos de idade e utilizado regularmente, entende-se que, de acordo com as mais elementares regras da experiência, competia ao arguido B…, como administrador da sociedade (E…, S.A.), quanto mais não fosse através de instruções às pessoas tecnicamente competentes, assegurar que a viatura fosse sujeita a manutenção periódica e regular, em oficina especializada. Tal era o cuidado que lhe era exigível e não há a menor razão para pensar que o arguido não fosse capaz de ter esse comportamento. Bem pelo contrário.
De acordo com a prova supra descrita, o comportamento exigível ao arguido – que teria evitado a morte da pessoa sinistrada – foi pelo mesmo omitido.
Mais: o próprio arguido, nas suas declarações, assumiu que a viatura em questão carecia de manutenção preventiva, sendo reparada apenas quando surgiam avarias.
Conclui-se, forçosamente, que a omissão do dever de cuidado que impendia sobre o arguido causou, indiciariamente, a morte da pessoa sinistrada.
Do exposto resulta que a impugnação do despacho de pronúncia, por motivo de falta de prova indiciária do ilícito, não tem o menor fundamento.
Nestes termos, deverá ser negado provimento ao recurso, confirmando-se a decisão instrutória de pronúncia do arguido B….
Das custas:
Sendo o recurso julgado não provido, impõe-se a condenação do recorrente no pagamento das custas, nos termos previstos nos artigos 513°, 1, do Código de Processo Penal e 8º, nº 9, do Regulamento das Custas Processuais.
A taxa de justiça individual é fixada em 4 (quatro) unidades de conta, nos termos da Tabela III anexa àquele Regulamento, tendo em conta o objeto e extensão do recurso.
*
IV – DECISÃO
Nos termos e pelos fundamentos expostos, acordam os juízes subscritores em conferência, por unanimidade, negar provimento ao recurso interposto pelo arguido B….
Custas a cargo do recorrente, fixando-se a taxa de justiça individual em 4 UC (quatro unidades de conta).

Nos termos do disposto no art. 94º, 2, do Código de Processo Penal, aplicável por força do art. 97º, 3, do mesmo texto legal, certifica-se que o acórdão foi elaborado e integralmente revisto pelo relator.

Porto, em 8 de Março de 2019.
Jorge Langweg
Maria Dolores da Silva e Sousa
_________________________
[1] Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, III, 2ª edição revista e atualizada, Editorial Verbo, 2000, pág. 335, V.
[2] Como decorre já de jurisprudência datada do século passado, cujo teor se tem mantido atual, sendo seguido de forma uniforme em todos os tribunais superiores portugueses, até ao presente: entre muitos, os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 19 de Outubro de 1995 (acórdão de fixação de jurisprudência obrigatória), publicado no Diário da República 1ª-A Série, de 28 de Dezembro de 1995, de 13 de Maio de 1998, in B.M.J., 477º,-263, de 25 de Junho de 1998, in B.M.J., 478º,- 242 e de 3 de Fevereiro de 1999, in B.M.J., 477º,-271 e, mais recentemente, de 16 de Maio de 2012, relatado pelo Juiz-Conselheiro Pires da Graça no processo nº. 30/09.7GCCLD.L1.S1.