Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
4830/20.9T8VNG-A.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: TERESA SÁ LOPES
Descritores: ACIDENTE DE TRABALHO
CURA SEM DESVALORIZAÇÃO
NÃO PARTICIPADO AO TRIBUNAL
INCIDENTE DE REVISÃO DA INCAPACIDADE
Nº do Documento: RP202105174830/20.9T8VNG-A.P1
Data do Acordão: 05/17/2021
Votação: MAIORIA COM 1 DECLARAÇÃO DE VOTO E 1 VOTO VENCIDO
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE, CONFIRMADA A SENTENÇA
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL)
Área Temática: .
Sumário: I - “Nos termos do art. 145.º, n.º 7 do Código de Processo do Trabalho (CPT), o incidente de revisão pode ter lugar nos casos em que sendo responsável uma seguradora, o acidente não tenha sido participado ao tribunal em virtude do sinistrado ter sido considerado curado sem desvalorização”.
II - Decorre do artigo 145º, nº8 do CPT que sendo esse o circunstancialismo, é possível a pensão por IPP, ser fixada sem que antes o tenha sido, não se tratando nesse caso, na reapreciação da sua situação clínica, de manter aumentar ou reduzir a pensão, mas é ainda possível, no âmbito do mesmo incidente, não só fixar a pensão como atribuir outras prestações, como indemnização por ITA ou despesas médicas ocorridas, se as situações que o justifiquem surjam após a alta da seguradora.
III - Não tendo a Seguradora posto em causa a natureza laboral do acidente, nem mesmo a ocorrência deste, após aquele lhe ter sido participado, não pode discutir a questão da inexistência de um acidente de trabalho, no âmbito do mesmo incidente de Revisão de Incapacidade.
(sumário baseado, em parte, no sumário do acórdão desta secção de 07.09.2009, referenciado no texto)
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº 4830/20.9T8VNG-A.P1
Origem: Tribunal Judicial da Comarca do Porto
Juízo do Trabalho de Vila Nova de Gaia – Juiz 3
Recorrente: B…
Recorrida: C…, SA

Relatora: Teresa Sá Lopes
1º Adjunto: Des. António Luís Carvalhão
2ª Adjunta: Des. Rita Romeira
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:
I – RELATÓRIO
(Consigna-se que tendo a 1ª Relatora, Desembargadora Rita Romeira, ficado vencida aproveitou-se parte do texto inicialmente relatado, com meras alterações na sua configuração, mantendo um tipo de letra distinto).

O A., B…, jogador profissional de futebol, nascido em ...05.1987, portador do passaporte …….., contribuinte n.º ………, beneficiário da segurança social com o n.º ………, Rua …, n.º .., ….-… … – Vila Nova de Gaia, nos autos principais, Proc. n.º 4830/20.9T8VNG de que estes são apenso, veio, ao abrigo do disposto no artigo 145º, n. º 8 do Código do Processo de Trabalho, requerer que deve ser submetido a exame médico de Revisão de Incapacidade contra as requeridas, C…, Companhia de Seguros, S.A. e D… – Futebol SAD alegando, em síntese, que é jogador profissional de futebol, que celebrou com a requerida, D… – Futebol SAD, um contrato de trabalho desportivo, válido para a época desportiva 2013/2014, tendo enquanto lhe prestava o seu trabalho, durante um treino, no dia 25.07.2013, sofrido uma lesão no joelho direito e sido de imediato assistido pela equipa médica do clube.
Mais, alega que após a realização de exames, foi internado e submetido a intervenção cirúrgica no dia 26.07.2013, no Hospital E… (…), pelo Dr. F…, designadamente uma meniscectomia parcial interna direita por artroscopia no joelho direito e, posteriormente, foi-lhe atribuída alta médica pela seguradora, em 28.08.2013, tendo sido considerado curado sem desvalorização.
Por fim, alega que, actualmente, sente um agravamento muito significativo das lesões resultantes do sinistro supra referido.
Termina requerendo a realização de exame médico e formulando, para o efeito, os quesitos juntos a fls. 4 deste apenso.

Juntou documentos, nomeadamente, “informação clínica" datada de 25.07.2013, da qual consta ITA previsível de 30 dias, em 14.08.2013 continua com ITA e em 28.08.2013 tem alta sem desvalorização e um parecer médico legal de revisão, subscrito pelo Médico G….
*
Notificadas as requeridas do presente incidente de revisão e a Ré seguradora, ainda, “para, no prazo de 10 dias, juntar aos autos a respectiva apólice de seguro e adicionais, eventualmente, em vigor, de toda a documentação clínica e nosológica relativamente ao sinistrado e cópia das folhas de férias do mês anterior ao do acidente”, veio, ela, além da junção dos documentos solicitados, “Em oposição ao incidente que lhe move...”, nos termos e com os fundamentos constantes a fls. 17 vº e ss., invocando, em síntese, sob o que designa de:
“- a) inadmissibilidade do incidente (recusa de cobertura do sinistro)
- b) inadmissibilidade do incidente (falta de enquadramento do sinistro)
- c) impossibilidade de determinação de nexo entre a situação actual e o alegado acidente de 2013
- c) o abuso de direito – supressio, tuo quoque e venire contra factum proprium”.
Alega, que:
- os impressos de boletim clínico e de alta juntos pelo autor, apesar de conterem o timbre da seguradora império, não foram preenchidos pelos serviços clínicos da seguradora mas do próprio clube, tendo a alta clínica curado sem desvalorização comunicada ao autor sido efetuada pelo médico do D… sem qualquer intervenção dos serviços clínicos da seguradora, como resulta do boletim junto pelo autor;
- o incidente previsto no art.145.º do Cód. do Proc. de Trabalho pressupõe que haja sido fixada uma incapacidade que tenha entretanto sofrido melhoria ou agravamento, não se podendo recorrer ao incidente para discutir a solução de alta clínica, como o autor pretende fazer, por ter caducado o direito de ação, nos termos do art. 179.º da Lei n.º 98/2009, de 4 de setembro (Lei que regulamenta o regime de reparação de acidentes de trabalho e de doenças profissionais);
- a seguradora não aceitou nem aceita a existência do acidente de trabalho nem que o autor estivesse ao serviço do D… na data alegada como sendo a data do acidente, por estar cedido a clubes terceiros − clubes … −, decorrendo na … e em Portugal no mês de julho de 2013 férias dos futebolistas, jogadores e competições, apenas sendo reparáveis nos termos da LAT os acidentes ocorridos ao serviço da entidade empregadora e apenas se encontrando abrangido pela apólice a pessoa que esteja ao serviço do tomador do seguro;
- a irregularidade da participação do acidente comunicado como tendo ocorrido em 25 de julho de 2013 e a falsidade do seu conteúdo;
- é impossível a determinação de nexo entre a situação actual e o alegado acidente ocorrido em 2013;
- existe abuso de direito por o autor, após o alegado acidente e tratamento cirúrgico, ter continuado a jogar até maio de 2020, onde, lesionado e com 33 anos de idade, está no final da sua carreira, só agora vindo invocar agravamento de sequelas que já tinham que existir à data da alta;
- não aceita as alegadas sequelas nem que as mesmas traduzam um agravamento da situação clínica existente à data da alta.
Conclui e pede, em síntese, que não deve ser admitido o presente incidente de revisão, indeferindo-se o mesmo, com as legais consequências.
E, caso assim não se entenda, sem prejuízo da ulterior discussão do alegado agravamento formula quesitos, nos termos que constam a fls.25 vº e 26.
Mais se requer que para apreciação do incidente se proceda aos seguintes meios de prova:
(...).
*
Após, em 10.10.2020, foi proferido despacho a notificar as partes – incluindo o D… SAD −, sendo as rés para, no prazo de 10 dias, informarem se existia na data de julho e agosto de 2013 algum acordo ou entendimento/protocolo celebrado entre o D… e a ré seguradora subjacente à prestação da assistência médica/tratamento clínico dos jogadores do D… pelos serviços clínicos/departamento médico do D… aos jogadores do D… SAD, permitindo que essa assistência fosse assim prestada, sem necessidade de intervenção/recurso aos serviços clínicos da ré seguradora.
*
Junta a informação solicitada, em 19.11.2020, a Mª Juíza “a quo” proferiu o seguinte despacho:
«Face à informação ora prestada pela ré seguradora, verifica-se que a atribuição de alta sem desvalorização datada de 28/8/2013, assinada pelo médico H…, que é médico e diretor clinico do departamento clinico do D…, e a alta clínica atribuída pelos serviços clínicos do D…tendo o acidente sido participado à ré seguradora na data, como a mesma admitiu no art. 2.º do seu requerimento anómalo de oposição ao incidente −, vincula a ré seguradora, que não pode pretender agora contestar/impugnar a ocorrência do acidente, nem as lesões dele decorrentes, nos termos alegados pelo requerente deste incidente de revisão de incapacidade nos arts. 3.º a 7.º do requerimento inicial por si apresentado.
Em conformidade, e reiterando aqui a fundamentação que foi expendida no anterior despacho proferido em 10-10-2020 (fls.209 a 211 do suporte físico do processo) é desprovido de fundamento o requerimento apresentado pela ré seguradora de inadmissibilidade do incidente de revisão deduzido pelo sinistrado, bem como toda a oposição/contestação/impugnação da ocorrência do acidente e das lesões nele sofridas, não sendo admissível que a ré esteja a pretender discutir agora a ocorrência do acidente ou as lesões dele decorrentes e, bem assim, as sequelas dele decorrentes.
Está, por conseguinte, incontrovertida a matéria de facto alegada pelo sinistrado nos arts. 1.º a 7.º do requerimento inicial do incidente de revisão de incapacidade.
A única questão em discussão no presente incidente é a existência ou inexistência de alteração – agravamento − da situação clínica que o sinistrado apresentava na data da alta clínica em consequência – e que era curado sem desvalorização −, decorrente do acidente sofrido pelo 25-07-2013.
Na fase processual legalmente prevista para o efeito poderá a ré seguradora, se assim o entender, exercer os direitos processuais legalmente previstos na tramitação do incidente de revisão de incapacidade (arts. 145.º a 147.º do Cód. Proc. Trabalho).
É aqui ainda de referir que a atuação processual da ré seguradora, opondo-se ao incidente de revisão e pugnando pela sua inadmissibilidade legal e impugnando a ocorrência do acidente – que lhe foi participado na altura, como a mesma admitiu no art. 2.º do seu requerimento anómalo de oposição ao incidente −, alegando que não aceitou o acidente que lhe foi participado e que os seus serviços clínicos não tiveram qualquer intervenção na atribuição da alta clínica, a qual foi efetuada pelos serviços clínicos do próprio tomador do seguro – D… −, quando não podia ou não devia ignorar que, nos termos do contrato de seguro celebrado com o tomador do seguro, a competência para tratar, avaliar e emitir os boletins de exame e de alta competia aos médicos do corpo clínico do D…, raia a litigância de má-fé, tendo gerado perturbação processual absolutamente escusada e anómala, sendo que foi só após a notificação efetuada pelo tribunal para o efeito que a mesma prestou a informação sobre o acordo existente no contrato de seguro que contrariava a pretensão que deduziu quanto à inoponibilidade à mesma do acidente ocorrido.
Afigura-se-nos, pois, que houve uma atuação claramente abusiva do processo com a conduta processual adotada pela ré seguradora com a apresentação do requerimento de 7/8/2020, totalmente infundado e dilatório, preenchendo a previsão legal do art. 531.º do Cód. do Proc. Civil, pelo que deve ser aplicada a taxa sancionatória excecional aí estabelecida, a qual se fixa – atendendo aos limites mínimo de 2 UC e máximo de 15 UC estabelecido no art. 10.º do Regulamento das Custas Processuais – em 5 (cinco) Unidades de Conta.
Em conformidade, indefiro o requerimento apresentado pela ré seguradora em 07-08-2020, condenando a mesma nas custas do incidente anómalo a que deu causa, fixando a taxa de justiça devida, nos termos do disposto nos arts. 530.º, n.º 1, e art. 7.º, n.º 4, do Regulamento das Custas Processuais e Tabela II do Regulamento, em 3 (três) Unidades de Costa, acrescido da taxa sancionatória excecional prevista no art. 531.º do Cód. do Proc. Civil, fixando a mesma em 5 (cinco) Unidades de Conta, nos termos do disposto no art. 10.º do Regulamento das Custas Processuais.
***
Conforme foi também referido no anterior despacho de 10-10-2020, o incidente de revisão não serve para o sinistrado obter agora a fixação de incapacidade decorrente de sequelas existentes à data da alta.
Assim, não é de admitir os quesitos 1. a 4. do requerimento de revisão nos moldes que estão efetuados, pois isso equivaleria a admitir que o sinistrado estivesse agora, através do presente incidente, a apurar se do mesmo resultaram sequelas valorizáveis e enquadráveis na TNI, quando o mesmo foi considerado curado sem desvalorização, ou seja, sem sequelas passíveis de enquadramento e valorização na TNI, sendo as lesões que sofreu as que foram consideradas existirem na altura pelos serviços clínicos do D….
Mas o autor/sinistrado tem direito a instaurar o presente incidente para revisão da sua situação clínica, em ordem a apurar se, em consequência da lesão sofrida – rotura em "asa de cesto" do menisco interno do joelho direito – decorrente de queda magoando-se no joelho direito em treino no dia 25-07-2013, lesão essa que foi cirurgicamente tratada com meniscectomia parcial interna por artroscopia realizada em 26 de julho de 2013, ocorreu o alegado agravamento da situação clínica que tinha na data da alta – curado sem desvalorização.
Assim, o exame médico deve apurar se o sinistrado apresenta atualmente alguma/s sequela/s que seja/m resultado de algum agravamento, recaída ou recidiva da lesão sofrida − rotura em "asa de cesto" do menisco interno do joelho direito −, considerando que, após a realização do tratamento descrito − meniscectomia parcial interna por artroscopia realizada em 26 de julho de 2013 −, o mesmo foi considerado curado sem desvalorização em 28-08-2013.
***
A fim de permitir que existam no processo todos os elementos clínicos referentes às lesões e tratamento efetuado ao sinistrado na sequência do acidente ocorrido em 25-07-2013, notifique o D… (Departamento Médico/Serviços Clinicos) para proceder à junção aos autos de todo o processo clínico do aqui sinistrado referente aos exames, avaliação e tratamentos efetuados no âmbito e em consequência do acidente ocorrido em dia 25-07-2013.
Após a junção de tais elementos e com cópia deste despacho e de todos os elementos clínicos juntos, solicite ao Instituto Nacional de Medicina Legal a realização do pretendido exame médico de revisão da incapacidade, previsto no artigo 70.º, n.os 1 e 2 da Lei nº 98/2009, de 04/09, e no artigo 145.º, n.os 1 a 3 do Código de Processo do Trabalho.
Notifique.».
*
Inconformada com este despacho a Seguradora interpôs recurso, cujas alegações terminou com as seguintes “CONCLUSÕES
1 – O requerente não pode apresentar um requerimento de revisão nos termos do n.º 8 do art. 145.º do CPT quando pretende de forma extemporânea sindicar e ver reavaliada sequelas existentes à data da alta quando deixou caducar o direito de o fazer através de acção especial de acidente de trabalho;
2 – Sendo a seguradora notificada da instauração do incidente de revisão nos termos do n.º 8 do art. 145.º do CPT, pode aquela deduzir oposição ao incidente invocando fundamentos com base nos quais entenda que não se verificam os respectivos pressupostos, designadamente impugnando os factos relativos ao acidente, lesões e sequelas e seu nexo causal, dado que os mesmos não foram objecto de prévia aceitação em tentativa de conciliação em fase conciliatória, nem comprovados em sentença em fase contenciosa, precisamente porque não correu acção para o efeito;
3 – Estando notificada pelo Tribunal, assistindo-lhe o direito ao contraditório, não se pode qualificar de requerimento anómalo o articulado de oposição que a seguradora apresenta onde sustenta a inadmissibilidade do incidente, impugna factos alegados e alega outros que afastam o nexo causal da situação actual do sinistrado com o acidente de trabalho invocado;
4 – O facto de a seguradora ter contratualizado com o segurado que os serviços médicos deste podem tratar o sinistrado até à alta, de modo que num caso o médico do clube dá alta sem desvalorização a um atleta, não vincula a seguradora à versão do sinistrado do acidente constante da participação, nem sequer ao facto de saber se estava ao serviço da seguradora ou não, e muito menos à sua qualificação como de trabalho, inibindo-a de discutir esses factos se em incidente de revisão posterior, o sinistrado dirigir pretensões contra a seguradora;
5 – Entender de forma diferente sempre importaria uma violação do direito ao contraditório por parte da seguradora responsável que não tendo aceite, nem discutido o acidente por o mesmo não ter sido participado a juízo, ficava inibida de futuro de questionar os pressupostos do alegado acidente de trabalho como tal, na apreciação de um incidente de revisão de incapacidade;
6 – Quando o legislador refere no n.º 8 do art.º 145.º do CPT que o incidente se aplica ocorrer “com as necessárias adaptações” aos casos de alta sem desvalorização não participados a juízo, esta a ressalvar precisamente a especialidade do incidente em que é necessário apurar os factos que sejam pressupostos do acidente, das lesões, das sequelas e do nexo que sejam controvertidos por não virem provados em processo de que o incidente corra por apenso;
7 – A interpretação que a Mmª Juiz faz do art.º 145.º n.º 8 do CPTrab. no sentido que a seguradora nesse caso, não tem direito ao contraditório dos factos invocados como fundamento do direito invocado pelo requerente (acidente, lesões, alta, sequelas e nexo causal), apenas podendo discutir se o estado à data da alta sofreu ou não agravamento, tornando-se comprovados e não controvertidos os factos objecto da participação da empregadora e o as lesões, alta e sequelas fixadas no boletim de alta, que não foi antes sujeito a nenhuma comprovação judicial por sentença ou acordo em tentativa de conciliação na fase conciliatória, importa a violação do direito constitucional ao processo equitativo consagrado no artº 20.º n.º 4 da CRP, estando por isso, o Tribunal impedido de a aplicar nessa interpretação sob pena de violação do art. 204.º da mesma Lei fundamental;
8 – Tendo a recorrente apresentado oposição a um incidente onde se pronuncia sobre o requerido e formula quesitos e requer outras provas, não praticou nenhum acto anómalo ou muito menos provocou um incidente, antes praticou um acto de exercício de contraditório na tramitação de incidente a que foi chamado e que não está findo, razão pela qual não podia ser condenado em taxa de justiça de incidente anómalo;
9 – A peça processual de oposição apresentada pela recorrente não era infundada, nem dilatória, e muito menos imprudente ou abusiva, razão pela qual não se verificavam os pressupostos para a aplicação de taxa de sancionatória excepcional muito menos de 5 Ucs.
10 – Este instituto exige que se esteja perante “situações excepcionais em que o sujeito aja de forma patológica no desenrolar normal da instância, ao tentar contrariar ostensivamente a legalidade da sua marcha ou a eficácia da decisão praticando acto processual manifestamente improcedente” como refere o STJ na sua avisada jurisprudência, não sendo o caso na peça processual apresentada pela recorrente e que até determinou que a Mmª Juiz eliminasse parte dos quesitos formulados pelo requerente no sentido precisamente a que a recorrente se quis opor;
10. Violou, por isso, a decisão recorrida, o disposto nos arts.145.º n.º 8 do CPTrab, 3.º n.º 3, 530.º n.º 1, 531.º do CPCiv, 70.º da LAT e 7.º n.º 4 e 10º do RCP, 9.º n.º 3 do CCiv e 204.º da CRP.
Nestes termos, nos mais de Direito e sempre com o mui Douto suprimento de V. Exas., deverá ser dado provimento ao presente recurso de apelação e revogar-se a decisão recorrida nos segmentos referidos, substituindo-se por outra que mande prosseguir o incidente com a produção dos meios de prova indicados para apuramento das questões nele suscitadas, por ser de inteira J U S T I Ç A!” (realce e sublinhado nossos).
*
Não foram apresentadas contra-alegações.
*
Nos termos que constam do despacho, de fls. 235, a Mª Juíza “a quo” admitiu a apelação, com subida em separado e com efeito suspensivo e ordenou a remessa do apenso a esta Relação.

O Ex.mo Procurador-Geral Adjunto teve vista nos autos, nos termos do art. 87º nº3, do CPT, mas não emitiu parecer, por entender estar-lhe vedada essa possibilidade.
*
Cumpridos os vistos legais, há que apreciar e decidir.
*
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações da recorrente, cfr. art.s 635º, nº 4 e 639º, nºs 1 e 2 do Código de Processo Civil aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho, aplicável “ex vi” do art. 87º, nº 1, do Código de Processo do Trabalho, ressalvadas as questões de conhecimento oficioso que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado.
Assim as questões a apreciar e decidir consistem em saber se, deve ser admitida a oposição deduzida pela recorrente ao incidente de revisão e revogada a decisão recorrida e, ainda, por não se verificarem os pressupostos para a aplicação da taxa devida por incidente anómalo e fixação de taxa sancionatória excepcional.
*
II - FUNDAMENTAÇÃO
A factualidade a atender é a que decorre do relatório que antecede, devidamente documentada nos autos.
*
Pretende a recorrente que seja revogada a decisão recorrida, na medida em que admitiu o incidente de revisão, requerendo se mande prosseguir a oposição por ela deduzida com a produção dos meios de prova que indicou, para apuramento das questões por si suscitadas, entre elas a discussão da sua eventual responsabilidade. Além disso, considera que não deduziu qualquer incidente anómalo nem há lugar à aplicação de taxa sancionatória excepcional.
Que dizer?
O art. 145º do CPT, sob a epígrafe, “Revisão da incapacidade ou da pensão”, no seu nº8, determina que nos casos em que o acidente (de que resultaram as lesões sofridas pelo sinistrado) não tenha sido participado ao tribunal, por o sinistrado ter sido considerado curado sem incapacidade, e sendo responsável uma seguradora, é aplicável o disposto nos números anteriores do referido artigo, com as necessárias adaptações.
Ora, o incidente de revisão (em que o sinistrado, vem invocar o agravamento das lesões sofridas em acidente de trabalho) pressupõe, como regra, a existência de um processo de acidente de trabalho, que terminou na fase conciliatória do processo, por homologação de acordo obtido em tentativa de conciliação, ou que seguindo para a fase contenciosa do processo, termina por decisão judicial.
No entanto, como decorre daquele dispositivo, já referido, verifica-se que aquela regra admite excepções, ou seja, é possível requerer incidente de revisão da incapacidade, sem que tenha corrido qualquer processo em Tribunal.
É o caso dos autos. O mesmo, não se inclui em nenhuma daquelas situações acabadas de referir, não havendo notícia, em termos judiciais (quer na fase conciliatória quer na fase contenciosa) da existência de um sinistro ocorrido com o sinistrado, agora, requerente do presente incidente de revisão.
Ora, como dissemos, quando se requer a revisão da incapacidade tal pedido tem, em regra, por referência um processo judicial onde já está assente a existência de um acidente de trabalho, uma determinada incapacidade e pensão, invocando o sinistrado, tão só, os factos que fundamentam o pedido de revisão.
Mas, quando inexiste esse processo judicial, como é o caso que estamos a tratar, então, o requerimento apresentado pelo sinistrado deve descrever a existência de um sinistro, as consequências do mesmo, referir que foi dado como curado sem desvalorização e, ainda, alegar os factos que justificam, no seu entender, o pedido de revisão.
No caso, o sinistrado cumpriu minimamente o acabado de referir. É o que decorre do seu requerimento a pedir a revisão.
Perante isso, duas questões se colocam, que importam analisar para que se decida o recurso em apreço, ou seja, como deve reagir a seguradora, quando confrontada, judicialmente, com tal pedido de revisão? É-lhe lícito deduzir oposição ao incidente de revisão com os fundamentos apresentados pela aqui recorrente e em que momento processual o deve fazer?
Passamos a responder a estas questões em conformidade com o sentido da decisão que obteve vencimento.
Servindo-nos da fundamentação do acórdão desta secção proferido em 24.09.2020 (a mesma relatora, com intervenção como Adjuntos dos Desembargadores Domingos Morais e Paula Leal de Carvalho, in www.dgsi .pt):
Começamos por deixar aqui a fundamentação do acórdão do STJ de 30.03.2017, in www.dgsi.pt, no qual é feita referência à Lei nº 100/97, de 13 de Setembro (LAT/97), aplicável atenta a data de ocorrência do acidente de trabalho ali em causa, Lei essa anterior à Lei nº98/2009, de 04 de Setembro (LAT), aplicável no caso destes autos, atenta a data em que ocorreu o acidente (25.07.2013).
Lê-se no citado acórdão que «O sentido e a razão de ser deste Incidente de Revisão de Incapacidade radica no facto de se permitir legalmente que o Sinistrado, já após a fixação da sua incapacidade para o trabalho e a atribuição da consequente pensão por decisão judicial, confrontado que seja com um agravamento do seu estado de saúde, recidiva ou recaída, resultante das lesões sofridas em consequência do acidente de trabalho que deu origem à reparação, possa requerer em juízo a reapreciação do seu estado de saúde e a alteração da incapacidade anteriormente fixada.
Aliás, a própria denominação de “revisão” só pode querer dizer que a sua situação clínica irá ser reapreciada (“revista”).
E para que tal aconteça necessário se torna que o Sinistrado o tenha requerido em Tribunal, fundamentadamente, indicando – e provando – as razões desse agravamento e os termos em que se repercutam na sua capacidade de ganho, enquanto geradora de uma incapacidade maior do que aquela que lhe foi fixada judicialmente.
Provada a modificação, nos termos alegados, após a realização das respetivas diligências que se mostrem necessárias, com o Sinistrado a ser submetido à indispensável perícia médica, maxime por Junta Médica, estão reunidas as condições para que o Tribunal decida o incidente de revisão e fixe a incapacidade resultante dessas perícias.
É o que resulta do disposto no art. 25.º da LAT (Lei nº 100/97, de 13 de Setembro) que, sob a epígrafe Revisão das prestações, estabelece o seguinte:
1. Quando se verifique modificação da capacidade de ganho do sinistrado proveniente de agravamento, recidiva, recaída ou melhoria da lesão ou doença que deu origem à reparação, ou de intervenção clínica ou aplicação de prótese ou ortótese, ou ainda de formação ou reconversão profissional, as prestações poderão ser revistas e aumentadas, reduzidas ou extintas, de harmonia com a alteração verificada. (…)
2. A revisão só poderá ser requerida dentro dos 10 anos posteriores à data da fixação da pensão, uma vez em cada semestre, nos dois primeiros anos, e uma vez por ano, nos anos imediatos.
3. (…)”
2.2. Este normativo conjugado com o nº 6, do art. 145º, do CPT, permite ao Juiz, realizada que se mostre a respetiva perícia médica, decidir por despacho se mantém, reduz ou aumenta a pensão a pagar ou até, se for caso disso, declarar extinta a obrigação de a pagar.».
Ora, estipula o nº8 do mesmo artigo 145º do CPT que o incidente, em causa, «(…), é aplicável, com as necessárias adaptações, aos casos em que, sendo responsável uma seguradora, o acidente não tenha sido participado ao tribunal por o sinistrado ter sido considerado curado sem incapacidade».
Permite este normativo que quando não tenha havido participação do acidente ao tribunal por a entidade responsável ter considerado o sinistrado curado sem incapacidade, o incidente de revisão de incapacidade seja suscitado, considerando o sucedido após a alta dada por aquela entidade.
Adiantamos já que a tal se reconduz o caso em análise, considerando - tal como foi ponderado na decisão recorrida - que o acidente foi participado na altura e ainda que nos termos do contrato de seguro celebrado com o tomador do seguro, a competência para tratar, avaliar e emitir os boletins de exame e de alta competia aos médicos do corpo clínico do D….
De referir que o propósito do legislador não foi que nestes casos se desse início a um processo de discussão da verificação da ocorrência de um acidente de trabalho, pois estamos claramente no âmbito de um incidente de revisão da incapacidade em juízo (a epígrafe do artigo não deixa qualquer dúvida), o que significa que se visa acolher situações supervenientes e não discutir aquelas que já foram antes avaliadas (no sentido também de que não foram oportunamente questionadas).
Deste modo, a expressão “com as necessárias adaptações” tem tão só o significado de que, na medida em que não existiu um processo em juízo no qual possa correr termos o incidente como previsto nos números 1 a 7 do referido art.º 145º, há que adaptar a tramitação do incidente a essa realidade de não existir um processo prévio em juízo, o que não se confunde com a possibilidade de discussão de algo que está subjacente à consideração, como no caso em apreço, de existir período de ITA findo o qual o sinistrado ficou curado sem desvalorização, ou seja, não se confunde com a possibilidade de discutir a ocorrência de acidente de trabalho quando foi isso que determinou atribuir período de ITA e depois cura sem desvalorização.
Por seu turno, o artigo 70º da LAT, aqui aplicável, sob a epígrafe “Revisão das prestações”, prevê expressamente que «(…) a prestação pode ser alterada ou extinta, de harmonia com a alteração verificada».
O âmbito de tal incidente não se circunscreve à fixação de pensão por IPP antes permite outrossim aferir do direito à reparação por ITA e outras prestações como despesas médicas [na base pode estar uma recidiva que se traduz no reaparecimento de um estado patológico numa pessoa que anteriormente se tinha curado dele], nas situações em que, sendo responsável uma seguradora, o acidente não tenha sido participado ao tribunal por o sinistrado ter sido considerado curado sem incapacidade e após a alta, a situação clínica do Sinistrado venha a revelar necessitar de ser reapreciada.
Ou seja, decorre do artigo 145º, nº8 do CPT que no referido circunstancialismo de o acidente não ter sido participado ao tribunal por o sinistrado ter sido considerado, pela seguradora responsável, curado sem incapacidade, é possível a pensão por IPP, ser fixada sem que antes o tenha sido, não se tratando nesse caso, na reapreciação da sua situação clínica, de manter aumentar ou reduzir a pensão, mas é ainda possível, no âmbito do mesmo incidente, não só fixar a pensão como atribuir outras prestações, como indemnização por ITA ou despesas médicas ocorridas, se as situações que o justifiquem surjam após a alta da seguradora.
Relativamente ao caso concreto, face aquelas que foram as conclusões da Apelante, cumpre realçar que a Apelante não declinou a sua responsabilidade após o acidente lhe ter sido participado pelo tomador do seguro, D… – Futebol SAD, não tendo aquela posto em causa a natureza laboral do acidente, nem mesmo a ocorrência deste, importando ainda ter em atenção o que ficou a constar do contrato de seguro “a competência para tratar, avaliar e emitir os boletins de exame de alta competia aos médicos do corpo clínico do D…”, não estando aqui em causa, nem podendo estar, a eventual inobservância pelo tomador de seguro junto da seguradora do estabelecido nas “condições particulares”.
A situação dos autos diverge assim – num prossuposto crucial – do caso analisado no acórdão desta secção de 07.09.2009 (Relatora Desembargadora Albertina Pereira, in www.dgsi.pt ), em que após a averiguação realizada, o acidente não foi considerado da sua responsabilidade pela Seguradora.
Ora, no caso concreto, não tendo a Seguradora posto em causa a natureza laboral do acidente, nem mesmo a ocorrência deste, após aquele lhe ter sido participado, valendo-nos agora de um argumento ponderado na fundamentação do Acórdão da Relação de Guimarães de 03.11.2016 (Relator Desembargador Antero Veiga, in www.dgsi.pt), ainda que para um quadro factual diverso: «(…) Seria até injusto para o sinistrado, convencido da aceitação da natureza laboral do sinistro pelo comportamento então tido pela seguradora, e tantos anos depois, , sabido que as provas tendem a perder-se com o decurso dos anos, exigir-lhe a prova da ocorrência (…)».
O desiderato a que chegamos, no presente caso, é assim o de que a Seguradora não pode discutir a questão da inexistência de um acidente de trabalho.
Acompanhamos assim a decisão recorrida onde na mesma se lê: “a alta clínica atribuída pelos serviços clínicos do D…tendo o acidente sido participado à ré seguradora na data, como a mesma admitiu no art. 2.º do seu requerimento (…) de oposição ao incidente −, vincula a ré seguradora, que não pode pretender agora contestar/impugnar a ocorrência do acidente, nem as lesões dele decorrentes”.
Improcede assim nesta parte a pretensão da Apelante.
A interpretação do artigo 145º nº 8 do CPT, no sentido que a Seguradora não tem direito ao contraditório dos factos invocados como fundamento do direito invocado pelo requerente no que respeita à verificação do acidente – quanto não declinou a sua responsabilidade após a participação que lhe foi feita do mesmo - apenas podendo discutir se o estado à data da alta sofreu ou não agravamento, tornando-se comprovados e não controvertidos os factos objeto da participação da empregadora e o as lesões, alta e sequelas fixadas no boletim de alta, mesmo não tendo sido sujeito a nenhuma comprovação judicial por sentença ou acordo em tentativa de conciliação na fase conciliatória, não importa a violação do direito constitucional ao processo equitativo consagrado no artigo 20º nº 4 da CRP, estando por isso, o Tribunal impedido de a aplicar nessa interpretação sob pena de violação do artigo 204º da mesma Lei fundamental.
Resta-nos analisar uma última questão.
Lê-se na decisão recorrida, o excerto que novamente se transcreve:
“(…)
É aqui ainda de referir que a atuação processual da ré seguradora, opondo-se ao incidente de revisão e pugnando pela sua inadmissibilidade legal e impugnando a ocorrência do acidente – que lhe foi participado na altura, como a mesma admitiu no art. 2.º do seu requerimento anómalo de oposição ao incidente −, alegando que não aceitou o acidente que lhe foi participado e que os seus serviços clínicos não tiveram qualquer intervenção na atribuição da alta clínica, a qual foi efetuada pelos serviços clínicos do próprio tomador do seguro – D… −, quando não podia ou não devia ignorar que, nos termos do contrato de seguro celebrado com o tomador do seguro, a competência para tratar, avaliar e emitir os boletins de exame e de alta competia aos médicos do corpo clínico do D…, raia a litigância de má-fé, tendo gerado perturbação processual absolutamente escusada e anómala, sendo que foi só após a notificação efetuada pelo tribunal para o efeito que a mesma prestou a informação sobre o acordo existente no contrato de seguro que contrariava a pretensão que deduziu quanto à inoponibilidade à mesma do acidente ocorrido.
Afigura-se-nos, pois, que houve uma atuação claramente abusiva do processo com a conduta processual adotada pela ré seguradora com a apresentação do requerimento de 7/8/2020, totalmente infundado e dilatório, preenchendo a previsão legal do art. 531.º do Cód. do Proc. Civil, pelo que deve ser aplicada a taxa sancionatória excecional aí estabelecida, a qual se fixa – atendendo aos limites mínimo de 2 UC e máximo de 15 UC estabelecido no art. 10.º do Regulamento das Custas Processuais – em 5 (cinco) Unidades de Conta”.
A este respeito concluiu em suma a Apelante que:
- tendo apresentado oposição a um incidente onde se pronuncia sobre o requerido e formula quesitos e requer outras provas, não praticou nenhum ato anómalo ou muito menos provocou um incidente, antes praticou um ato de exercício de contraditório na tramitação de incidente a que foi chamado e que não está findo, razão pela qual não podia ser condenado em taxa de justiça de incidente anómalo;
- a peça processual de oposição não era infundada, nem dilatória, e muito menos imprudente ou abusiva, razão pela qual não se verificavam os pressupostos para a aplicação de taxa de sancionatória excecional muito menos de 5 Ucs;
- a peça processual apresentada até determinou que a Mmª Juiz eliminasse parte dos quesitos formulados pelo requerente no sentido precisamente a que a recorrente se quis opor.
Entendemos que também nesta parte não assiste razão à Apelante.
Ser analisada no incidente em causa a questão da ocorrência do acidente de trabalho, por si só, não seria uma pretensão da Apelante que traduza a prática de um ato anómalo, sendo antes formulada no exercício do contraditório a que lhe assistia.
Não pode é deixar de ponderar-se o que foi alegado a esse respeito pela Apelante e os condicionalismos analisados que levaram ao indeferimento da pretensão formulada a esse respeito. E é do que resulta de tal ponderação que também em nosso entender se justifica a sanção culminada na decisão recorrida.
Com efeito, alegando a Apelante que não aceitou o acidente que lhe foi participado e que os seus serviços clínicos não tiveram qualquer intervenção na atribuição da alta clínica, a qual foi efetuada pelos serviços clínicos do próprio tomador do seguro – D… -, a Apelante não trouxe, por sua iniciativa, como entendemos lhe era devido, a informação cabal necessária para a ponderação da decisão sobre a pretensão em causa que formulou.
Aliás, o assim afirmado, como resulta da decisão recorrida, é contraditório com o facto do acidente lhe ter sido participado na altura, como a mesma admitiu.
Como relevante é aqui que os referidos condicionalismos tenham resultado outrossim do acordo existente no contrato de seguro de a competência para tratar, avaliar e emitir os boletins de exame e de alta competia aos médicos do corpo clínico do D…, tendo a informação sobre o mesmo sido junta tão só após a notificação efetuada pelo Tribunal a quo para o efeito, não devendo a Apelante se ter limitado, como fez na oposição que deduziu, a afirmar que os seus serviços clínicos não tiveram qualquer intervenção na atribuição da alta clínica.
Foi essa conduta processual da Apelante que também a nosso ver se impõe censurar da forma como foi feito pelo Tribunal a quo, em termos de quantitativo da taxa sancionatória excecional prevista no artigo 531º do Código do Processo Civil – “(…), a qual se fixa – atendendo aos limites mínimo de 2 UC e máximo de 15 UC estabelecido no art. 10.º do Regulamento das Custas Processuais – em 5 (cinco) Unidades de Conta” isto sem prejuízo do demais alegado por aquela em sede de oposição ao incidente, ás diligências requeridas e pretensões formuladas a respeito dos quesitos e meios de prova.
Improcede também nesta parte a apelação.
*
III - DECISÃO
Em conformidade, com o exposto, acordam os Juízes desta Secção em julgar improcedente a apelação, confirmando-se a decisão recorrida.

Custas a cargo da Apelante.

Porto, 17 de Maio de 2021
Relatora: Teresa Sá Lopes:
1º Adjunto: António Luís Carvalhão
2ª Adjunta: Rita Romeira (vencida em conformidade com voto que segue)
*
Voto vencida a decisão.
Admitia a oposição deduzida pela seguradora e, em consequência, declarava procedente o recurso na totalidade, pelas seguintes razões que referi no projecto que elaborei. A saber:
“Pretende a recorrente que seja revogada a decisão recorrida, na medida em que admitiu o incidente de revisão, requerendo se mande prosseguir a oposição por ela deduzida com a produção dos meios de prova que indicou, para apuramento das questões por si suscitadas, entre elas a discussão da sua eventual responsabilidade. Além disso, considera que não deduziu qualquer incidente anómalo nem há lugar à aplicação de taxa sancionatória excepcional.
Que dizer?
O art. 145º do CPT, sob a epígrafe, “Revisão da incapacidade ou da pensão”, no seu nº8, determina que nos casos em que o acidente (de que resultaram as lesões sofridas pelo sinistrado) não tenha sido participado ao tribunal, por o sinistrado ter sido considerado curado sem incapacidade, e sendo responsável uma seguradora, é aplicável o disposto nos números anteriores do referido artigo, com as necessárias adaptações.
Ora, o incidente de revisão (em que o sinistrado, vem invocar o agravamento das lesões sofridas em acidente de trabalho) pressupõe, como regra, a existência de um processo de acidente de trabalho, que terminou na fase conciliatória do processo, por homologação de acordo obtido em tentativa de conciliação, ou que seguindo para a fase contenciosa do processo, termina por decisão judicial.
No entanto, como decorre daquele dispositivo, já referido, verifica-se que aquela regra admite excepções, ou seja, é possível requerer incidente de revisão da incapacidade, sem que tenha corrido qualquer processo em Tribunal.
É o caso dos autos. O mesmo, não se inclui em nenhuma daquelas situações acabadas de referir, não havendo notícia, em termos judiciais (quer na fase conciliatória quer na fase contenciosa) da existência de um sinistro ocorrido com o sinistrado, agora, requerente do presente incidente de revisão.
Ora, como dissemos, quando se requer a revisão da incapacidade tal pedido tem, em regra, por referência um processo judicial onde já está assente a existência de um acidente de trabalho, uma determinada incapacidade e pensão, invocando o sinistrado, tão só, os factos que fundamentam o pedido de revisão.
Mas, quando inexiste esse processo judicial, como é o caso que estamos a tratar, então, o requerimento apresentado pelo sinistrado deve descrever a existência de um sinistro, as consequências do mesmo, referir que foi dado como curado sem desvalorização e, ainda, alegar os factos que justificam, no seu entender, o pedido de revisão.
No caso, o sinistrado cumpriu minimamente o acabado de referir. É o que decorre do seu requerimento a pedir a revisão.
Perante isso, duas questões se colocam, que importam analisar para que se decida o recurso em apreço, ou seja, como deve reagir a seguradora, quando confrontada, judicialmente, com tal pedido de revisão? É-lhe lícito deduzir oposição ao incidente de revisão com os fundamentos apresentados pela aqui recorrente e em que momento processual o deve fazer?
Podemos adiantar, desde já, que em nosso entender a resposta a estas questões tem suporte legal e mostra-nos que a recorrente tem razão.
Explicando.
A expressão contida no nº8 do referido art. 145º - “com as necessárias adaptações” - permite-nos afirmar que o legislador do Código de Processo do Trabalho admitiu que, no caso a que se refere aquele nº8, a tramitação processual do incidente de revisão sofre «desvios».
E, se a seguradora não teve oportunidade de «discutir» judicialmente o sinistro sofrido pelo sinistrado, não pode, agora, negar-se-lhe esse direito, quando ela, seguradora, nem sequer estava obrigada a participar o acidente a juízo. Sendo que, só, esta interpretação, em nosso entender, sempre com o devido respeito, salvaguarda a possibilidade de a mesma se pronunciar sobre essa matéria, exercendo cabalmente o seu direito de defesa.
Por isso, o incidente de revisão, no caso em análise, sofre, obrigatoriamente, um «desvio» em termos processuais, de modo a permitir à seguradora apresentar a sua versão dos factos.
E, assim sendo, é admissível a oposição apresentada pela aqui recorrente.
Resta-nos, saber em que termos deve tal oposição ser processualmente tramitada.
No caso, a legislação aplicável – CPT -, não indica concretamente a tramitação a seguir quando é deduzida oposição ao incidente de revisão.
E, o art. 146º, daquele código, regula a tramitação do incidente quando a entidade responsável pretende discutir a sua responsabilidade total ou parcial do agravamento, ou seja, quando no exame médico singular é considerado um agravamento na incapacidade do sinistrado e a seguradora entende que esse agravamento não é da sua responsabilidade. Sendo que, o citado artigo obriga a esperar que o exame médico de revisão seja realizado e que o senhor perito médico conclua pela existência de agravamento.
No entanto, a recorrente não coloca à discussão, apenas tal questão, mas, ainda outras, sendo uma delas e a mais relevante a inexistência de um acidente de trabalho.
Tal questão é, sem dúvida, prévia à necessidade de realização do exame médico singular.
Mas, defendendo nós que é admissível a oposição deduzida pela seguradora, só podemos concluir que a realização desse exame, no caso concreto, (tal como foi ordenado na decisão recorrida) é prematuro, havendo que conhecer, desde já, e como questão prévia, a defesa apresentada pela seguradora, a saber, se estamos perante um acidente de trabalho, sendo certo que se, acaso, o Tribunal viesse a decidir pela inexistência de um acidente de trabalho, certamente que o incidente de revisão “morria” de imediato sem necessidade de se ordenar a realização de qualquer exame médico singular de revisão.
Entendemos que, tal questão, inexistência de um acidente de trabalho, apesar de não estar expressamente prevista no incidente de revisão, pode ser decidida recorrendo-se, por analogia, ao determinado nos nºs 2 e 3 do referido art. 146º do CPT. Decidida essa questão, e se o incidente tiver de prosseguir, por se ter concluído pela existência de um acidente de trabalho, então sim, deverá ser solicitado o exame a que alude o nº1 do art. 145º, podendo a seguradora, se o perito concluir pelo agravamento, usar do disposto no art. 146º, ambos do CPT.”.
Em conformidade, revogava a decisão recorrida e ordenava que o Tribunal “a quo” conhecesse da oposição deduzida pela recorrente.

Rita Romeira