Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
5520/21.0T8MAI-A.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: ISOLETA DE ALMEIDA COSTA
Descritores: COMPETÊNCIA MATERIAL
CUSTAS DE PARTE
EXECUÇÃO
TRIBUNAL DE FAMÍLIA
Nº do Documento: RP202204075520/21.0T8MAI-A.P1
Data do Acordão: 04/07/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA A DECISÃO
Indicações Eventuais: 5ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - A competência em razão da matéria para conhecer das ações executivas para pagamento da quantia devida por custas de parte relativas a processo que correu termos no Tribunal de Família e Menores compete aos juízos de execução existentes na área reportada, ou, não os havendo, aos juízos locais cíveis ou de competência genérica, ou aos juízos centrais cíveis, conforme o valor da ação não supere, ou supere € 50.000, respetivamente (artigos 129º/1; 130º /2 alínea c) e 117º nº 1 alínea b, todos da LOSJ)
II - No âmbito da LOSJ, os Tribunais de Família e Menores têm competência material para executar as decisões por eles proferidas quanto aos alimentos entre cônjuges e ex-cônjuges (artigo 122º/1, f), quanto aos alimentos a filhos menores (artigo 123º/1, e) e decisões em matéria tutelar educativa (artigo124º/1, c).
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo: 5520/21.0T8MAI-A.P1

Sumário artigo 663 nº 7 do CPC)
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ACORDAM OS JUÍZES DA 3ª SECÇÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO:

AA intentou a presente ação executiva, para pagamento de quantia certa, contra BB, requerendo a cobrança das custas de parte no valor de 3.751,22 euros, relativas ao processo de incumprimento das responsabilidades parentais, que correu termos sob o nº 1375/16.5T8MTS-I, no Tribunal de Família e Menores da Maia.

Remetida a certidão que constitui o título executivo ao Juízo de Execução da Maia, neste foi proferido despacho mediante o qual o Mmo. Juiz se declarou incompetente em razão da matéria para tramitar a ação (convocando o disposto no artigo 129º da LOSJ, na interpretação conjugada com o artigo 123º/1, d) do mesmo diploma e com o artigo 85º/1 do CPC).

DESTE DESPACHO APELOU O EXEQUENTE QUE LAVROU AS SEGUINTES CONCLUSÕES
1.A presente execução visa a cobrança de custas de parte relativas ao Processo n.º 1375/16.5T8MTS e apensos, que corre termos no Juiz 1 do Juízo de Família e Menores da Maia.
2.As custas de parte integram-se no âmbito da condenação judicial por custas cuja execução se rege pelas disposições previstas no artigo 626.º do CPC referente à execução de decisão judicial condenatória.
3.As normas que atribuem competência material aos juízos de família e menores são, com relevância, os arts. 122º, nº 1, al. f) 123º, nº 1, al. e) e 124º, nº 1, al. c), da LOSJ, ao passo que as normas que atribuem competência material aos juízos de execução constam do art. 129º da LOSJ.
(…)

14.No caso concreto, não faz sentido o conhecimento e tramitação da presente execução pelo juízo de família e menores; sendo que, se tal acontecesse, a norma constante do art. 85º, nº 2 do CPC não faria/seria esvaziada de sentido e aplicação.
15.No sentido do que vimos argumentando, atente-se por exemplo na Decisão da Sra. Juíza Presidente do Tribunal da Relação de Guimarães de 08.10.2020, disponível em: https://www.trg.pt/gallery/1621%2020.0T8VCT.G1-Execu%C3%A7%C3%A3o%20por%20Custas%20Parte%20-%2008-10-2020.pdf.
18.O Despacho recorrido violou, assim, o art. 20º da CRP; o art. 9º do CC; os arts. 85º, 626º, ambos do CPC; arts. 122º, 123º, 124º e 129º, todos da LOSJ e os arts. 26º, nº 1 e 35º, nº 5 do RCP.
19.Pelo que, considerando tudo o exposto, o despacho recorrido deverá ser revogado, prosseguindo a execução no Juízo de Execução.

Nada obsta ao mérito.

OBJETO DO RECURSO:

O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, ressalvadas as matérias que sejam de conhecimento oficioso (artigos 635º/3, e 639º/ 1 e 2, do CPC).
Em consonância, a única questão a decidir é a de saber se a competência material para tramitar as execuções para cobrança coerciva de custas de parte devidas por efeito de condenação em processo de regulação das responsabilidades parentais (incumprimento) reside no Tribunal de Família e Menores onde foi tramitada a ação, ou está excluída da competência especializada destes tribunais, incluindo-se no âmbito da competência material dos juízos de execução.

O MÉRITO DO RECURSO:

FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO:

Dá-se por reproduzida a factualidade supra.

FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO:
I

Na questão em apreço perfilhamos o entendimento constante da decisão sumária da Exma. Presidente do Tribunal da Relação de Guimarães, de 08.10.2020, disponível em: https://www.trg.pt/gallery/1621%2020.0T8VCT.G1-Execu%C3%A7%C3%A3o%20por%20Custas%20Parte%20-%2008-10-2020.pdf, citada nas alegações de recurso e que segue o entendimento que sobre a questão foi expresso pelo Conselheiro Salvador da Costa in https://blogippc.blogspot.com/2020/02/competencia-material-para-acao.html.

As custas de parte integram a condenação por custas, constituindo uma vertente autónoma do conceito de custas (artigos 529º/1 e 4, 607º/6, 663º/2 e 679º, todos do CPC e 26º/1 do RCP).
A parte vencedora que quiser ressarcir-se das custas de parte, no montante que lhe for devido, no prazo legal para o efeito, deve remeter à outra parte a nota discriminativa e justificativa, que se tem por liquidada caso não haja impugnação ou a mesma seja improcedente (artigos 533º/1 e 3 CPC e 25º/1 do RCP).

II
Esclarece o Cons.º Salvador da Costa na página citada que: “O título em que se funda a ação executiva para pagamento das custas de parte, nos termos do disposto no artigo 703.º/1, a) e d), do CPC, é compósito, porque envolve o segmento condenatório da parte vencida no pagamento das custas, na vertente das custas de parte, transitado em julgado, e a referida nota discriminativa e justificativa das custas de parte devidamente consolidada”.
Por sua vez, o artigo 85º/1 do CPC, regula o processo no qual a execução é tramitada e o nº 2 estabelece a regra da remessa ao tribunal competente para a execução de sentença, de certos elementos. Respeita a sua aplicação aos casos de execução de sentença condenatória no pagamento de certa quantia.
Consequentemente, o disposto no artigo 85º/ 1 e 2, do CPC responde aos casos normais de execução de sentença condenatória do pedido material, mas não abarca o segmento da condenação nas custas, pelo que não é aplicável à ação executiva que tenha por objeto a efetivação do direito a custas de parte. “A partir da remessa pela parte vencedora à parte vencida na causa da nota de custas de parte, os termos da cobrança do respetivo crédito deixam de ter conexão com o processo declarativo em que ocorreu o secundário segmento condenatório do autor ou do réu, ou de ambos, no pagamento de custas em sentido estrito, que incluem a vertente das custas de parte”. (ibidem)
Com efeito, (…) “A tramitação da ação executiva de forma autónoma por apenso ao processo declarativo onde foi proferido o segmento condenatório do réu no pagamento de custas dependia de norma que o estabelecesse”.
Como inexiste essa norma, que na espécie não teria razão de ser, importa concluir no sentido de que a ação executiva para pagamento de quantia certa não corre termos por apenso ao processo declarativo em que foi proferida a decisão condenatória no pagamento de custas.
“É isso, aliás, que resulta implicitamente do conjunto normativo para o qual o n.º 5 do artigo 35.º do Regulamento das Custas Processuais remete, designadamente, o disposto nos artigos 626.º/ 1 e 2, 551.º/ 3, e 724.º, todos do referido Código” (ibidem).

III
O artigo 129.º/1 da LOSJ atribui competência aos juízos de execução no âmbito dos processos de execução de natureza cível.
O artigo 130.º/2, c) da mesma lei estabelece que são aos juízos locais cíveis ou de competência genérica a exercer, no âmbito do processo de execução, as competências previstas no Código de Processo Civil, onde não houver juízo de execução ou outro juízo ou tribunal de competência especializada competente para o efeito.
Acresce que o artigo 117.º/1, b), do referido diploma legal, define que compete aos juízos centrais cíveis exercer, no âmbito das ações executivas de natureza cível de valor superior a € 50.000, as competências previstas naquele código em circunscrições não abrangidas pela competência de outro juízo ou tribunal.
Por consequência, “Decorre da interpretação conjunta das referidas normas que a competência em razão da matéria para conhecer das ações executivas para pagamento de quantia certa relativa às custas de parte se inscreve nos juízos de execução existentes na área reportada, ou, não os havendo, nos juízos locais cíveis ou de competência genérica, ou nos juízos centrais cíveis, conforme o valor da ação não supere ou supere € 50.000, respetivamente”.

IV
No âmbito da LOSJ, os tribunais de família e menores apenas executam as decisões por eles proferidas quanto aos alimentos entre cônjuges e ex-cônjuges (artigo 122º/1, f), quanto aos alimentos relativos a filhos menores (artigo 123º/1 e) e decisões em matéria tutelar educativa (artigo124º/1, c).
Considerando que, mesmo em tais ações, a execução para cobrança de custas de parte não corre termos nem no processo declarativo em que ocorreu a condenação no pagamento das custas, nem por apenso, processando-se com absoluta autonomia em relação a ele, perante o exposto, concluímos que, para a sua tramitação, é competente o juízo de execução da área geográfica respetiva.

SEGUE DELIBERAÇÃO

PROCEDE A APELAÇÃO. REVOGA-SE A DECISÃO RECORRIDA. DECLARA-SE COMPETENTE EM RAZÃO DA MATÉRIA PARA TRAMITAR A PRESENTE AÇÃO EXECUTIVA O TRIBUNAL RECORRIDO, JUÍZO DE EXECUÇÃO DA MAIA.

Custas pelo exequente, dada a não oposição (artº 527º nº 1 do CPC).

Porto, 7 de abril de 2022
Isoleta de Almeida Costa
Ernesto Nascimento
Madeira Pinto