Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
| Processo: |
| ||
| Nº Convencional: | JTRP000 | ||
| Relator: | MARIA DA LUZ SEABRA | ||
| Descritores: | ACÇÃO DE DEMARCAÇÃO LINHA DIVISÓRIA DIREITO DE PROPRIEDADE | ||
| Nº do Documento: | RP202309122058/21.0T8LOU.P1 | ||
| Data do Acordão: | 09/12/2023 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
| Decisão: | RECURSO IMPROCEDENTE; DECISÃO CONFIRMADA | ||
| Indicações Eventuais: | 2ª SECÇÃO | ||
| Área Temática: | . | ||
| Sumário: | I - Numa ação de demarcação não se mostra controvertido o direito de propriedade de cada uma das partes sobre cada um dos prédios confinantes, não sendo necessário declarar incluída num daqueles prédios qualquer área em litígio, apenas importará proceder à definição da linha divisória entre os dois prédios confinantes, demarcando as respectivas estremas no ponto onde confrontam. II - Não havendo consenso quanto aos limites de cada um dos prédios, existindo controvérsia sobre a localização da linha divisória, por existir porventura uma faixa de terreno próximo do ponto em que os prédios confinantes se encontram, cujo direito de propriedade poderá ser questionado, dele se arrogando titulares ambas as partes, essa incerteza resolver-se-á com a demarcação a efectuar, porquanto o reconhecimento do direito de propriedade sobre aquela faixa de terreno resultará implicitamente da demarcação que ficar estabelecida. | ||
| Reclamações: | |||
| Decisão Texto Integral: | Processo n.º 2058/21.0T8LOU.P1- APELAÇÃO ** Sumário (elaborado pela Relatora):……………………… ……………………… ……………………… ** I. RELATÓRIO:1. AA e mulher BB intentaram ação declarativa de condenação, em processo comum, contra CC, formulando os seguintes pedidos de condenação da Ré: a) Reconhecer que do prédio referido no artigo primeiro faz parte a faixa de terreno que ocupou com a rede referida nos artigos 23º e 24º. b) Reconhecer que o limite Sul do prédio referido no artigo 1º, na confinação com os prédios da Ré se faz pela linha reta imaginária referida nos artigos 12, 13 e 14º. c) Reconhecer aos autores o direito de propriedade sobre a nitreira referida no artigo 15 e solo onde se encontrava o coberto referido no artigo 17º d) Remover a rede referida no artigo 23º bem como os esteios e colunas que a seguram colocados no solo do prédio dos AA e sobre a nitreira referida no artigo 15º e 16º da PI, e) Abster-se da prática de quaisquer atos que estorvem ou perturbem o direito de propriedade e posse dos AA sobre o prédio dos AA nomeadamente sobre a parcela de terreno referida no artigo 26º, nitreira referida no artigo 15º e solo onde se encontrava o coberto referido no artigo 17º f) Proceder-se à demarcação entre o prédio referido no artigo 1º e os prédios da Ré, nos termos referidos nos artigos 12º, 13º e 14º ou de acordo com a prova produzida e convicção e prudente arbítrio do tribunal. Como fundamento da referida pretensão, alegaram em síntese que, fisicamente nunca foi feita qualquer marcação entre os prédios identificados nos autos como pertencentes aos AA e à Ré, porque outrora haviam pertencido aos mesmos donos (pais de A. e Ré), mas que em 2007 na composição dos lotes com vista à divisão de coisa comum acordaram entre si que a delimitação do prédio do artigo 1º com os prédios das alíneas a) e b)do artigo 2º se fazia por uma linha reta desde a esquina Sudeste do muro divisório com o proprietário confinante a Poente do prédio referido no artigo 1º (atualmente DD e anteriormente EE – sapateiro) em direção à esquina poente do muro fronteiro do prédio da alínea c) do artigo 3º, virado a Sul para a Rua ... , onde se inicia o vão de entrada ou portão com n.º ... da Rua ..., portanto à esquina adjacente à coluna ou pilar direito do portão com o n.º ... da Rua ..., tendo desde essa altura os AA utilizado a nitreira e coberto que ficaram dentro dessa delimitação, até que, há cerca de 10 meses a ré por sua iniciativa, em desacordo com o autor, destruiu o coberto identificado nos autos que fazia parte integrante do prédio dos AA e colocou uma rede de malha sol intervalada e segura com colunas, invadindo largamente a extrema poente (considerando que extrema oposta com a Travessa ... está orientada para Nascente) do prédio referido no artigo 1º, concluindo que em face da implantação da rede em questão a ré está a apropriar-se da maior parte do solo da antiga nitreira e do coberto, impedindo agora aos autores por completo o acesso a essa zona, ocupando uma área do prédio dos AA referido no artigo 1º de cerca de 130 m2. 2. A Ré deduziu contestação, impugnando os factos alegados pelos AA, sustentando que o prédio identificado no artigo 1º não tem a configuração e nem a delimitação referida pelos AA, nomeadamente no local onde está colocada a linha a amarelo divisória a sul e nascente do referido prédio, nunca a Ré aceitou tal delimitação, nem em 2007, nem posteriormente, não tendo havido acordo das partes quanto à localização da linha que delimita os prédios dos AA. dos prédios da Ré. Relativamente à nitreira, sustenta que está implantada em terreno que integra o seu prédio rústico do artigo 568 (antigo 34) e não em terreno do prédio dos AA. referido no artigo 1º, da qual o A. marido se tem vindo a aproveitar, fazendo-o, porém, sem qualquer titulo, e apenas por mera tolerância da Ré, que permitiu e tolerou, por mero favor, que o A. marido usasse a referida nitreira, para aí guardar coisas suas, nunca os AA. tiveram posse, mas apenas e só mera detenção da referida nitreira, por mera condescendência da Ré, o que igualmente aconteceu com o coberto, situado a Poente da referida nitreira, que estava inserido e fazia e faz parte do terreno do prédio da alínea b) do artigo 3º da p.i. – propriedade da Ré – e não se situa dentro da delimitação que os AA. vêm referindo, sendo que tal coberto não era nem é usado pelo A. Concluiu que a linha que delimita o prédio dos AA., identificado no artigo 1º, dos prédios da Ré, identificados no artigo 3º, alíneas a, b e c, é a que consta da planta topográfica que foi junta, como doc. nº 1, sendo que, a linha que delimita, e que sempre delimitou, os prédios dos AA. dos prédios da Ré, na parte em que confrontam entre si, era constituída pela linha divisória das árvores que separavam os prédios e por um conjunto de vides em bardo, que separavam o prédio do artigo 1º dos AA. dos prédios do artigo 3º, alíneas a), b) da Ré, sendo que a colocação da malha sol intervalada e segura com colunas foi efetuada respeitando exatamente essa linha divisória, nomeadamente respeitando os limites e a linha divisória que sempre ali existiu há mais de trinta, quarenta e cinquenta anos, constituída pela linha de árvores e de videiras em bardo, todos plantados em terreno integrante do prédio rústico identificado na alínea b) do artigo 3º da p.i., e por isso, propriedade exclusiva da Ré De todo o modo, a Ré declarou não se opôr a que se proceda à demarcação entre o prédio dos AA. identificado no artigo 1º e os prédios da Ré, identificados no artigo 3º, ambos da petição inicial, nos termos e de acordo com o que ficou alegado na contestação e nos documentos a ela anexos, ou de acordo com a prova que viesse a ser produzida. 3. Realizada audiência prévia, foi proferido despacho saneador, no âmbito do qual foi fixado o objecto do litígio, bem como os temas de prova, que não foram objecto de reclamação. 4. Realizada a audiência de julgamento, foi proferida sentença, nos seguintes termos: “Pelo acima exposto, julga-se a presente ação procedente, condenando-se a ré: I. A reconhecer que do prédio referido em 1 faz parte a faixa de terreno mencionada em 16 que a ré ocupou com a rede ali descrita; II. A reconhecer que o limite sul do prédio referido em 1, na confinância com os prédios da ré, se faz pela linha reta imaginária que se referencia em 7 e em 16; III. A reconhecer aos autores o direito de propriedade sobre a nitreira atrás referida e solo onde se encontrava o coberto; IV. A remover a rede referida, bem como os esteios e colunas que a seguram, colocados no solo do prédio dos autores e sobre a nitreira referida; V. A abster-se da prática de quaisquer atos que estorvem ou perturbem o direito de propriedade e posse dos autores sobre o prédio dos autores, nomeadamente sobre a parcela de terreno atrás referida, nitreira e solo onde se encontrava o coberto; VI. Reconhecendo ainda que a demarcação entre o prédio referido em 1 e os prédios da ré é definida pela linha reta imaginária que se referencia em 7 e em 16. Custas pela ré. Registe e notifique.” 5. Inconformada, a Ré/Apelante interpôs recurso de apelação da sentença final, formulando as seguintes CONCLUSÕES 1.ª -A Ré/recorrente não se conforma com o teor da douta sentença, e dela interpõe o presente recurso ordinário de apelação para o Venerando Tribunal da Relação do Porto, ao abrigo do disposto nos artigos 627º, 629º, 631º, 637º, 638º, nºs 1 e 7 – porque se impugna a matéria de facto e se pretende obter a respetiva reapreciação, tendo o recurso por objeto também a reapreciação da prova grava -, 639º, nº 1 e 640º, nºs 1 e 2, todos do Código de Processo Civil, está em tempo, tem legitimidade e a decisão é recorrível.2.ª -Entende a Apelante que o Tribunal a quo não analisou corretamente toda a documentação junta aos autos, nomeadamente todos os elementos de prova documentais, testemunhais e inspeção e reinspecção judicial realizadas: 3.ª - A nitreira, está implantada em terreno que integra o prédio rústico da Ré do artigo 568 (antigo 34) e não em terreno do prédio dos AA. referido no artigo 1º da inicial; 4.ª - O “coberto”, situado a Poente da referida nitreira, está, estava inserido e fazia e faz parte do terreno do prédio da alínea b) do artigo 3º da p.i. – propriedade da Ré/recorrente – e o mesmo não se situa dentro da delimitação que os AA. peticionaram; 5.ª - e, em consequência, deveria ter absolvido a Ré/Recorrente dos pedidos formulados sob as alíneas a), b), c), d), e); 6.ª -e, deveria ainda a douta sentença ter decidido, pois os autos contêm elementos probatórios mais do que suficientes para tal, no sentido de que: 7.ª - A demarcação entre o prédio identificado no artigo 1º da inicial e os prédios da Ré, deve ser efetuada pela linha que delimita o prédio dos AA., identificado no artigo 1º da inicial, dos prédios da Ré, identificados no artigo 3º, alíneas a, b e c, da inicial, que consta da planta topográfica junta como doc. nº 1, da contestação – DOC. 1, DOC. 2 e DOC. 6 -, por onde se verifica igualmente que quer o dito “coberto” quer a dita “nitreira” estão inseridos, e integram solo ou terreno que faz parte e se integra exclusivamente nos prédios da Ré/recorrente, nomeadamente do prédio rústico identificado na alínea b) do artigo 3º da inicial. 8.ª -Dos docs. nºs 2 e 6 (juntos com a contestação), constituídos por imagens obtidas no google Earth, onde estão identificados os artigos matriciais dos prédios dos AA. e dos prédios da Ré, e onde está identificada a linha recta que delimita, e que sempre delimitou, os prédios dos AA. dos prédios da Ré, na parte em que confrontam entre si, e patente também na linha divisória das árvores que separavam os prédios e por um conjunto de vides em bardo, que separavam o prédio do artigo 1º dos AA. dos prédios do artigo 3º, alíneas a), b) da Ré – o que igualmente se observa do cotejo dos documentos juntos pela Ré, e pelos AA., e da inspeção ao local e fotos integrantes da mesma, e dos depoimentos das testemunhas da Ré, a factos de que diretamente e há mais de vinte e trinta anos têm conhecimento pessoal, que a colocação da malha sol intervalada e segura com colunas foi efetuada pela Ré/Recorrente, respeitando exatamente essa linha divisória, que sempre existiu, há mais de trinta, quarenta e cinquenta anos, e por isso, a demarcação deve ser efetuada por essa linha (doc. 6) integrando-se assim, a nitreira e o coberto, no terreno do prédio da Ré/Recorrente, cuja propriedade exclusiva da Ré que os AA. expressamente reconheceram e confessaram no artigo 3º da inicial. 9.ª -A ação intentada pelos AA. constitui mais uma (a segunda) tentativa para tornear e incumprir o que foi já decidido judicialmente, com trânsito em julgado, pois que, a pretexto de uma ação de delimitação de prédios que intentaram, o que os AA. Verdadeiramente pretendem, para além de reclamarem a propriedade da nitreira e do coberto, que não lhes pertence, é vir a obter um acesso (criar um caminho de servidão) desde a Rua ..., através do prédio da Ré para a dita nitreira e coberto e daí para o seu prédio identificado no artigo 1º da p.i.. 10.ª -Sobre essa matéria de facto (caminho de servidão) existe, aliás, e foi proferida já uma decisão judicial, com trânsito em julgado, no processo nº 2525/18.5T8PNF do Juízo Central Cível de Penafiel – Juiz 4, que foi confirmada por decisão do Tribunal da Relação do Porto, que não reconheceu a existência do falado caminho, cfr. doc. 3 junto com a petição inicial. 11.ª - E, em consequência do referido supra, a Ré deveria ter sido também absolvida do pedido de remoção da rede referida, e proferida decisão de manutenção dos esteios e colunas que seguram a rede, colocados que estão no solo do prédio da Ré, e não em prédio dos autores. 12.ª - Do prédio referido em 1 (dos Recorridos) NÃO faz parte a faixa de terreno mencionada em 16 que a ré ocupou com a rede ali descrita; 13.ª - O limite sul do prédio referido em 1 (dos recorridos), na confinância com os prédios da ré, NÃO se faz pela linha reta imaginária referenciada em 7 e em 16, dos factos dados por provados; 14.ª - Os autores/recorridos NÃO têm direito de propriedade sobre a nitreira e nem sobre solo onde está construída, nem sobre o solo onde se encontrava o coberto; 15.ª - A demarcação entre o prédio referido em 1 (dos recorridos) e os prédios da ré/recorrente NÃO é definida pela linha reta imaginária referenciada em 7 e em 16., dos factos provados. IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO RELATIVA À MATÉRIA DE FACTO 16.ª -A apelante discorda da decisão relativa à matéria de facto dada por provada, concretamente, dos pontos 7, 8, 9, 10, 11, 14, 15 e 16, que considera incorretamente julgados, e que nos termos do disposto no artigo 640º, nº 1, alínea a) do C.P.C. Concretos meios probatórios, constantes do processo, quer documentais, quer diligências de inspeção e reinspecção do local e quer da gravação da prova testemunhal, que a, nosso ver, impunham decisão sobre os pontos de facto da matéria impugnada, diversa da recorrida, e que nos termos do disposto no artigo 640º, nº 1, alínea b) se passam a indicar: PROVA DOCUMENTAL: DOCUMENTO 1 DA CONTESTAÇÃO 17.ª - O documento 1 da contestação - levantamento topográfico -corresponde exatamente aos prédios de AA. e Ré, identifica-os, mostra a sua localização, a área respetiva de cada um, e demonstra qual a linha de delimitação que divide o prédio dos Recorridos identificado em 1 dos prédios da recorrente identificados e 3 a e b, e inclusive o prédio identificado em 3 c. 18.ª - A prova produzida não foi suscetível de impugnar a veracidade deste documento, sendo certo que o mesmo quanto à localização e identificação de todos os prédios de uns e outros corresponde exatamente às imagens que Recorridos e Recorrente juntaram aos autos. 19.ª - As linhas delimitadoras dos prédios de ambas as partes, por todos os seus lados, surgem com reais no documento a que nos reportamos, e evidenciam a lógica da linha divisória ser aquela que a Recorrente defendeu como a verdadeira linha delimitadora do prédio dos Recorridos em relação aos prédios da Recorrente. DOCUMENTO 2 DA CONTESTAÇÃO 20.ª -O documento nº 2 da contestação corresponde à visão global e real dos prédios de recorridos e Recorrente, contendo a sua identificação matricial e a indicação de quem é o respetivo proprietário. 21.ª -Neste documento, que mais não constitui que uma foto, uma imagem extraída da aplicação GooggleEarth, e que, portanto, não é alterável, é patente a verificação da linha divisória que delimita o prédio dos Recorridos em relação aos prédios da Recorrente. 22.ª -A existência de vegetação, exatamente na linha divisória entre os prédios, conforme a versão da Recorrente, é verificável como evidente neste documento. 23.ª -Nessa imagem a linha que delimita o prédio dos Recorridos dos prédios da recorrente, não sofre os desvios e a estranha configuração que são patentes nas imagens juntas pelos Recorridos, do doc. 16, e do mesmo doc. denominado 16 rectificado pelos Recorridos (por requerimento que juntaram aos autos em 21/04/2022). 24.ª -Nenhum acordo, escrito, verbal, ou outro foi celebrado entre Recorridos e Recorrente, nem entre os irmãos de ambos, para alterar a linha delimitadora dos prédios. DOCUMENTO 6 DA CONTESTAÇÃO 25.ª -O documento nº 6, junto com a contestação, demonstra de forma evidente o mesmo que o documento nº 15 junto pelos Recorridos: A linha marcada como linha divisória e que delimita os prédios e onde a rede foi colocada pela Recorrente, constitui a delimitação normal, racional, e que se mostra totalmente alinhada com a linha que se inicia na via pública, entre dois prédios urbanos (da Recorrente, o mais próximo, e dos Recorridos o menos próximo), com o muro existente entre o prédio urbano da recorrente e a traseira da nitreira, com a esquina do muro designado de FF. 26.ª -Desse alinhamento evidente, se pode constatar que quer o espaço de terreno ocupado pela nitreira, quer o espaço onde esteve o coberto, constituem espaços que integram clara e objetivamente terreno que se integra nos prédios da recorrente identificados em 3 a e b. 27.ª -Os Recorridos, por requerimento de 21/04/2022 e documentos 1 e 2 juntos, vieram alegar: «… Os AA. na sequencia da observação que pode fazer in loco, a partir do interior do prédio da ré , da rede por esta colocada na inspeção ao local no dia de ontem, vem apresentar documentos 15 e 16, retificados de acordo com a observação agora feita, mais retificando o artigo 26º da PI no sentido que a área ocupada pela ré é de cerca de 55 m2 e não de 130 m2»(sublinhado e negrito nossos). 28.ª -A certeza dos Recorridos quanto à área que dizem pertencer ao seu prédio, e quanto à linha delimitadora é, era, tal, que, pasme-se, passaram de uma área reivindicada de 130 m2, para uma área que depois reivindicam ser só de 55 m2. REAPRECIAÇÃO DA PROVA TESTEMUNHAL Dos AA. 29.ª -As testemunhas dos AA./recorridos, todos familiares directos destes, GG, filha dos autores, com depoimento prestado no dia 27/04/2022, com início às 10:09 horas e fim às 11:02 horas, HH, filho dos Autores com depoimento prestado no dia 27/04/2022, com início às 11:02 horas e fim às 11:31 horas, II, irmão de autor e ré com depoimento prestado no dia 27/04/2022, com início às 11:34 horas e fim às 12:10 horas, JJ, cônjuge da anterior testemunha com depoimento prestado no dia 27/04/2022, com início às 12:11 horas e fim às 12:34 horas e KK, irmã de autor e ré, com depoimento prestado no dia 27/04/2022, com início às 15:09 horas e fim às 15:57 horas, depuseram no sentido que melhor convinha aos AA., 30.ª -Os seus depoimentos focaram-se nas conclusões e não em factos concretos, porquanto sendo embora verdade que em 2007, antes da realização das compras efetuadas por AA. e Ré e que foi tentado (ainda que sem êxito) um acordo diverso de divisão de todos os prédios em novos prédios, ou melhor, em lotes, que alteravam as áreas dos prédios e a delimitação e cada um, a final, os prédios foram adjudicados aos AA. e à Ré da forma que se mostra descrito nos factos provados 1, 2 e 3 e igualmente nos autos de ação declarativa a que se refere o facto provado 4. 31.ª -Não houve, não foi celebrado, por escrito ou verbalmente, entre AA. E Ré qualquer acordo de alteração da divisão dos prédios, nem qualquer alteração das suas áreas e da sua delimitação, que se mantiveram exatamente com antes se encontravam, e ainda encontram. 32.ª -As testemunhas dos AA., familiares directos destes, filha, filho, e irmãos e cunhada, depuseram de forma manifestamente não coincidente com a realidade factual. ANÁLISE DO DEPOIMENTO PRESTADO PELAS TESTEMUNHAS DA RÉ/RECORRENTE: 33.ª -As testemunhas da Ré/Recorrente, sobre quem o Tribunal a quo referiu serem “testemunhas da vizinhança, naturalmente sem intervenção naquele processo de divisão, demonstraram saber da realidade em discussão elementos parcelares, indiretos, desconexos e desenquadrados daquele processo, não merecendo, dessa forma, o necessário crédito.”, e referiu, ainda: “Cumpre ainda referir o evidente e intenso distanciamento relacional com o autor dos caseiros e da testemunha DD, percebendo-se uma latência de conflituosidade que não ajudou à sua credibilidade.” 34.ª -O tribunal avaliou mal os depoimentos prestados pelas testemunhas da Ré/Recorrente. 35.ª -Todas as testemunhas da Ré/Recorrente, são testemunhas que conhecem pessoalmente os prédios de AA. e Ré há mais de 40 anos: o DD, com depoimento prestado no dia 27/04/2022, com início às 15:58 horas e fim às 17:01 horas, foi claro ao declarar que é vizinho de AA. e Ré, vive e reside há muitíssimos anos na casa que fica por trás do muro do FF, e conhece de forma directa, pessoal a divisão dos prédios. 36.ª -Particularmente importante no depoimento desta testemunha é o que ela refere desde o minuto 01,50 ao minuto 27,40, tendo explicado qual a divisória dos terrenos e que era delimitada com uma rede que ia dar a esse muro do sapateiro, …, que vinha delimitada das traseiras da casa pequenina e que ia em direção à esquina do muro do sapateiro. 37.ª -E especialmente das declarações prestadas desde o minuto 01.05 ao minuto 26,12, ao declarar que é vizinho de AA. e Ré, vive e reside há muitíssimos anos na casa que fica por trás do muro do FF, e conhece de forma directa, pessoal a divisão dos prédios. 38.ª -O seu depoimento, prestado no dia 27/04/2022, com início às 15:58 horas e fim às 17:01, deverá ser ouvido na sua totalidade, porquanto importa ouvir que, não obstante esta testemunha não ter boa relação pessoal com o A. marido, prestou um depoimento objectivo, conciso, preciso, exacto, quanto aos limites e à delimitação dos prédios de Recorridos e Recorrente, e mais foi preciso quanto à localização da nitreira e do coberto, no sentido de que o solo onde tais elementos se encontram (o coberto já não se encontra) integra os prédios da Ré/Recorrente, atenta a linha divisória que delimita os prédios e que a testemunha afirmou perentoriamente ser a que consta do documento nº 1 e 6 juntos com a contestação. 39.ª -O depoimento desta testemunha, mesmo reconhecendo espontaneamente que não tem boa relação com o A. marido, por razões que nada têm que ver com a situação e factos dos autos, depôs de forma isenta, desinteressada, não procurando privilegiar qualquer das partes, limitando-se aos concretos factos da localização, disposição e delimitação dos prédios. 40.ª -Da sua propriedade visualiza directamente as propriedades que hoje são dos Recorridos e da Recorrente. 41.ª -Esclareceu de forma clara qual a localização da delimitação entre os prédios referidos em 1 e os prédios referidos em a e b de 3. 42.ª -Estabeleceu e indicou ao Tribunal qual a linha divisória, referindo concretamente no seu depoimento que essa linha divisória é a linha indicada pela Recorrente, coincidente com a indicação que se verifica e visualiza nos docs. 1 e 6 juntos com a contestação da Ré/Recorrente. 43.ª -A Testemunha LL, depoimento prestado no dia 28/04/2022 com início às 09:59 horas e fim às 10:42 horas, o qual deverá ser ouvido na sua totalidade, porquanto se trata do proprietário do terreno vizinho, conhecedor da realidade predial dos prédios dos Recorridos e da Recorrente há mais de 40 anos. 44.ª -Particularmente importante no depoimento desta testemunha é o que ela refere desde o minuto 01,50 ao minuto 27,40, tendo explicado qual a linha divisória dos terrenos, e explicado que era delimitada com uma rede que ia dar a esse muro do sapateiro, …, que vinha delimitada das traseiras da casa pequenina e que ia em direção à esquina do muro do sapateiro, e considerando o facto de o prédio de que a testemunha é proprietária, e que foi adquirido por seu pai, ter integrado conjuntamente com os prédios da Recorrente, referidos em a e b de 3., um só prédio, tendo sido depois divididos entre o pai da testemunha e o pais do Recorrido marido e a da Recorrente, demonstram bem o conhecimento pessoal e direto dos factos por esta testemunha. 45.ª -Trata-se ainda de pessoa que sempre ali viveu, quer com os pais, quer após se autonomizar. 46.ª -Esclareceu de forma clara qual a localização da delimitação entre os prédios referidos em 1 e os prédios referidos em a e b de 3. 47.ª -Estabeleceu e indicou ao Tribunal qual a linha divisória, referindo concretamente no seu depoimento que essa linha divisória é a linha indicada pela Recorrente, coincidente com a indicação que se verifica e visualiza nos docs. 1 e 6 juntos com a contestação da Ré/Recorrente. 48.ª -Foi preciso quanto à localização da nitreira e do coberto, no sentido de que o solo onde tais elementos se encontram (o coberto já não se encontra) integra os prédios da Ré/Recorrente. 49.ª -Questionado acerca da linha divisória indicada pelos AA. Recorridos, e que o Tribunal veio a dar como provada nos factos 7, 8, 9, 10, 11, 14, 15 e 16, foi perentório ao declarar que o solo onde está implantada a nitreira e onde esteve implantado o coberto integram e fazem parte dos prédios da Recorrente descritos em a e b do facto 3. 50.ª -MM, depoimento no dia 28/04/2022 com início às 10:44 horas e fim às 11:29 horas e marido NN, depoimento no dia 28/04/2022, com início às 11:51 horas e fim às 12:43 horas, os quais deverão ser ouvidos na sua totalidade, caseiros da Ré/Recorrente há mais de trinta anos, os quais depuseram de forma manifestamente credível, isenta e objetiva, demonstrando um conhecimento pormenorizado dos factos, por serem quem habita o prédio urbano referido em 3 c, e terem uma observação directa dos prédios e da delimitação entre eles, de forma diária, ininterrupta, sendo assim observadores privilegiados, da realidade física dos prédios, das construções, dos usos e da razão de ser dos mesmos. 51.ª -Especialmente das declarações prestadas desde o minuto 01,56 ao minuto 11,34 e 12,50 ao minuto 24, da testemunha BB. E, 52.ª -Especialmente das declarações prestadas pelo marido da anterior testemunha desde o minuto 01,34 ao minuto 2,30, nas quais explicaram que “… eles mesmos haviam guardado ali uma viatura sua, que o marido havia colocado um aloquete e um dia o sr. AA tirou o aloquete, ligou à senhoria e ela disse que se iria resolver, … que quando tomou conta dos anexos tomou conta da garagem, … a nitreira e o coberto estão situados no terreno de baixo.” (leia-se o da recorrente). 53.ª -Esclareceram de que forma clara e manifestamente verdadeira, porque credível, nos seus depoimentos que, o uso que os Recorridos faziam do espaço da nitreira não era exercido na qualidade de proprietários, que nunca foram, mas apenas por mera cedência, por favor e condescendência da Recorrente para ali guardarem alguns materiais e em tempos uma viatura. 54.ª -Que o Recorrido marido, se havia apoderado da nitreira, mudou a fechadura, e a Recorrente porque o mesmo era seu irmão e em face do uso que o Recorrido marido dava ao espaço, que apenas era para guardar materiais, foi tolerando o referido uso. 55.ª -Estabeleceram e indicaram ao Tribunal qual a linha divisória, referindo concretamente no seu depoimento que essa linha divisória é a linha indicada pela Recorrente, coincidente com a indicação que se verifica e visualiza nos docs. 1 e 6 juntos com a contestação da Ré/Recorrente 56.ª -Fizeram alusão clara à circunstância fática que a dividir os prédios existiu uma ramada, no local onde sensivelmente se encontra agora colocada a rede pela Recorrente, e que a rede está colocada no local correcto. 57.ª -Foram precisos quanto à localização da nitreira e do coberto, no sentido de que o solo onde tais elementos se encontram (o coberto já não se encontra) integra os prédios da Ré/Recorrente, atenta a linha divisória que delimita os prédios. 58.ª -Comprovaram pela explicação que fizeram das imagens com que foram confrontados, que a linha que delimita os prédios é a que está indicada nos documentos 1 e 6 juntos com a contestação, e foram perentórios ao afirmar com a firmeza e segurança de quem sabe o que diz e fala do que conhece, que a linha que delimita os prédios de Recorridos e Recorrente é a indicada por esta e não é a que o Tribunal a quo deu como provada, nos factos 7, 8, 9, 10, 11, 14, 15 e 16. 59.ª -OO, depoimento no dia 28/04/2022 com início às 10:01 horas e fim às 10:51 horas, e especialmente do minuto 22,00 ao minuto 22,23, quando declarou que a divisória era clara que ia da traseira da casa dos caseiros até à esquina do muro do sapateiro, que o terreno da nitreira e do coberto sempre fez parte do prédio de baixo (da Recorrente), trata-se de pessoa que conhece bem os terrenos de Recorrentes e recorridos, porque durante muitos anos foi quem efetuou serviços com tractor ao falecido pai de Recorrido marido e Recorrente. 60.ª -Explicou por onde acedia ao prédio identificado em 1, referindo que esse acesso era efetuado pelo espaço existente para o efeito em terreno do prédio dos Recorridos identificado em 2, passagem que o Recorrido marido tapou com a construção de uma arrecadação. 61.ª -Explicou a linha que delimita os prédios é a que está indicada nos documentos 1 e 6 juntos com a contestação, e foi perentório ao afirmar com firmeza e segurança de quem sabe o que diz e fala do que conhece, porque mostrou ser conhecedor do local, pessoalmente, referindo que a linha que delimita os prédios de Recorridos e Recorrente é a indicada pela Recorrente, e assim não é a aquela que o Tribunal a quo veio a dar como provada, nos factos 7, 8, 9, 10, 11, 14, 15 e 16. AVALIAÇÃO DA PROVA RESULTANTE DA INSPEÇÃO e da REINSPECÇÃO AO LOCAL, com a visualização do interior da referida nitreira (descrição e fotos): 62.ª -A realização da inspeção ao local, atentas as fotos obtidas, e a descrição efetuada pelo Tribunal, a imagem da nitreira e parcela de terreno em discussão, tirada da esquina noroeste da casa situada a sul da parcela, na direção norte, a imagem tirada junto à parede da casa atrás referida, da nitreira e parcela de terreno, na direção norte; na imagem da parcela e nitreira tirada na sua extrema aproximadamente norte, na direção sul, visionando-se ao fundo a nitreira, imagem tirada do canto noroeste da nitreira para o restante espaço de terreno em discussão nos autos, na direção norte, imagem da entrada da nitreira a que se alude nos autos, revela que o terreno onde se encontra implantada a nitreira e onde esteve implantado o coberto, integram de facto terreno que faz parte dos prédios da Recorrente. 63.ª -O acesso ao terreno da nitreira e do coberto, a configuração do terreno –como bem decidido na ação judicial referida no facto 4 -, a inexistência do, então reclamado caminho de servidão, supostamente localizado ao lado da casa onde as testemunhas MM e NN residem, o muro divisório existente situado do lado direito, após a casa dos caseiros, e o alinhamento desse muro com o restante muro do prédio identificado em 2, e por sua vez com o alinhamento com a esquina do muro do FF, afigura-se como o alinhamento normal, recto, constituindo assim essa linha recta a verdadeira linha que delimita os prédios dos Recorridos dos prédios da recorrente, total qual se mostra visível e evidente da análise dos docs. 1 e 6 juntos com a contestação. 64.ª - Certo é que, nem aquando das aquisições de AA, e Ré dos respetivos prédios, ficou escrito quer nos títulos, quer em qualquer outro documento, que a zona da nitreira e do coberto pertenciam ao prédio urbano dos AA., nem mesmo que passariam a pertencer a esse prédio. 65.ª - Dos documentos 1, 2 e 6, juntos com a petição, e da análise visual no local aquando da inspeção, percebem-se perfeitamente os sinais de uma demarcação nos termos e localização constantes do levantamento topográfico (doc. 1) a foto do doc. 2 e 6 da contestação, pois no local ainda se encontram vestígios das árvores, e de arames de ramadas presos no tronco das árvores, a denunciar a existência de uma ramada na linha divisória que a Ré sustenta e defende. 66.ª – Da inspeção constata-se também que a linha de demarcação que os AA. defendem não tem qualquer sentido, nem consistência, pois desenham ali um triangulo/retângulo, que não termina no prédio urbano da Ré, mas a cerca de dois metros dele, ali ficando um espaço entre a casa e a nitreira, espaço que os AA. até alegam ser da Ré. 67.ª - Como de facto é. MAS, do mesmo modo, o prolongamento desse espaço pela zona da nitreira e do coberto aparenta claramente pertencer e integrar o prédio da Ré/Recorrente. 68.ª - Uma análise do muro que divide os dois prédios urbanos dos AA. e da Ré, que se iniciam junto à Rua ..., entre os quais existe um coberto em chapas, permite-nos ver que esse muro é alinhado pela parte norte do prédio urbano da Ré (o arrendado) desde a via pública está orientado em linha recta até à esquina do muro do FF. 69.ª - O que indica claramente, que a demarcação dos prédios se faz da forma defendida e alegada pela Ré/Recorrente na sua contestação. 70.ª - Não resulta da inspeção um só sinal, um só vestígio, que aponte, indique, ou indicie sequer, que a linha de demarcação dos prédios de AA. e Ré seja feita pela linha imaginária alegada pelos AA. 71.ª - Essa linha imaginária defendida pelos AA. é mesmo imaginária, porque nenhum sinal físico foi possível constatar na inspeção que comprovasse a tese dos AA. 72.ª - Da inspeção, como se referiu resultam antes sinais evidentes de que a demarcação se faz exatamente como o defende a Recorrente, precisamente no local onde está a rede, esteios e colunas colocados, sendo bem visível o seu alinhamento com a esquina do muro do FF, com as árvores, com os sinais da antiga ramada, seguindo em linha recta, sem desvios oblíquos, até à parede traseira da casa da Ré, arrendada, e alinhado com o resto do muro divisório que da casa segue até à estrada. Muro este que aliás nunca os AA. puseram em causa. 73.ª -Importa, em face do que antecede, referir-se que, os factos 7, 8, 9, 10, 11, 14, 15 e 16, este no que concerne à área de 55 m2 (e não 130 m2), deveriam ter sido considerados como factos não provados, pois que toda a prova produzida nos autos, documental (documentos juntos por AA. e Ré), por inspeção judicial e complementada com a prova testemunhal produzida, nomeadamente no que concerne às testemunhas da Ré, cujos depoimentos gravados nos dias e horas indicados, deverão ser ouvidos na integra para completa e cabal compreensão da dimensão e precisão dos seus testemunhos, mesmo quando inquiridas pelo Ilustre mandatário dos Recorridos e pelo Meritíssimo Juiz a quo. 74.ª - Da prova produzida, apenas se pode concluir que a ocupação ou uso que os Recorridos vinham fazendo da nitreira, não corresponde a um uso de possuidor em nome próprio, mas apenas de mera detenção, permitida por mero favor e condescendência da Recorrente. 75.ª -Apenas se verifica nessa detenção por parte dos Recorridos um elemento material, o corpus, que se identifica com a atuação material sobre a coisa, com o exercitar dos poderes fácticos sobre aquela, mas não se verifica o elemento psicológico, o animus, traduzido na intenção subjetiva de proceder como titular do direito real correspondente aos atos praticados, 76.ª -Intenção esta que não se surpreende da prova produzida, mormente a testemunhal, tendo as testemunhas da Recorrida sido unânimes, sem vacilar, neste conspecto, ao declarar que o A. marido bem sabia que nem a nitreira, nem o coberto e nem o solo que tais objectos ocupavam fazia parte ou integrava prédio dele, antes sabendo que o usou durante alguns anos por mero favor e condescendência da sua irmã, a ora Recorrente, e por isso, sem qualquer animus, ou seja, sem intenção subjetiva de proceder como titular do direito real correspondente aos atos praticados. 77.ª -Não se verificando, como não se verifica, o exercício da posse por parte dos Recorridos sobre a dita parcela de 55 m2 (e não de 130 m2), o instituto da usucapião não é aplicável - a mera detenção ou uso por mera condescendência da Recorrente não conduz à aquisição por usucapião a favor dos Recorridos dessa área de 55m2. 78.ª -O período de tempo de posse exigido para que se possa verificar a aquisição do direito por usucapião só pode verificar-se se a posse consubstanciar o corpus e o animus, o que in casu não ocorreu, quanto ao último dos requisitos. 79.ª -O bem aqui em causa é imóvel e não tendo havido actos de posse exercidos em termos do direito real de propriedade correspondente, havendo apenas mera detenção, não há posse, e muito menos posse titulada. 80.ª -Resulta, não dos factos dados por provados nos presentes autos, mas dos factos que deveriam ter sido dados por não provados, com as respostas negativas à matéria dos factos 7, 9, 9, 10, 11, 14, 15 e 16, que os autores vinham a utilizar o terreno em causa até à colocação da rede, exercendo atos materiais subsumíveis a um corpus, mas não próprio de caracterizadores de uma situação de posse, mas tão só de mera detenção, por mero favor e condescendência da Recorrente, não agindo na convicção de serem os seus proprietários – com o animus de proprietários. 81.ª -A sua atuação teve a oposição conhecida pela implantação da vedação. 82.ª -Face à matéria referida e prova produzida os factos 7, 8, 9, 10, 11, 14, 15 e 16 deveriam ter sido dados como não provados, não deveria ter sido reconhecido o direito dos autores a propriedade do solo da referida parcela de 55 m2, e não se haveria de ter ordenado a reposição da parcela no seu estado anterior, com o levantamento da rede, nada havendo que restituir aos Recorridos, no que à dita parcela concerne. 83.ª -Finalmente, refira-se que existe ainda erro notório quanto ao facto constante do ponto 16, ao determinar como ocupada uma área de cerca de 130 m2, quando os recorridos no pedido de rectificação que apresentaram por requerimento de 21/04/2022 e doc.16 rectificado, vêm confessar, referir e peticionar que essa área é de apenas 55 m2. 84.ª -O tribunal, neste particular, cometeu ou caiu em vício de excesso de pronúncia – condenação em quantidade superior ou em objecto diverso do que foi pedido –incorrendo em violação do disposto no artigo 609º do CPC. 85.ª -A douta sentença ao dar a resposta como factos provados, nos termos em que deu aos factos 7, 8, 9, 10, 11, 14, 15 e 16, fez errada e incorrecta interpretação e análise dos elementos probatórios documentais, testemunhais e da inspeção, existentes e obtidos nos autos. 86.ª -A alteração da redação dos factos dados por provados no sentido em que se defende neste recurso e a consideração como não provada da matéria de facto relativa à linha de demarcação reclamada pelos AA./Recorridos, dando-se por provado que a linha de demarcação entre os prédios de Recorridos e Recorrente, no limite sul do prédio do artigo 1º(dos AA.) e o limite norte do prédio do artigo 3º, alínea a) (da Ré) se faz pela linha recta que se inicia na esquina do muro divisório do prédio de DD (muro do FF) sensivelmente a Poente do prédio da Ré, em direção ao lado nascente até à esquina norte do prédio da alínea c) do artigo 3º da p.i., ou seja, até à esquina da parte traseira do prédio identificado na alínea c) do artigo 3º da p.i., propriedade da Recorrente. 87.ª -A linha que delimita o prédio identificado em 1 dos prédios da Ré/Recorrente, tal como se referiu na contestação e também neste articulado, está assim identificada pela visualização dos documentos nºs 1, 2 e 6 (especialmente este último), juntos com a contestação, como sendo essa a linha da respetiva demarcação entre os prédios, o que importará a alteração da sentença recorrida para outra que declare a total improcedência da ação e a improcedência dos pedidos nela formulados, com a consequente absolvição da apelante de todos os pedidos, e a decisão de demarcação dos prédios nos termos referidos supra, como se impõe. 88.ª -Face à matéria dos pontos 7, 8, 9, 10, 11, 14, 15 e 16, que deveria ter sido dada como não provada, não deveria ser reconhecido o direito dos autores/recorridos, nem ordenada a reposição da parcela no seu estado anterior, nem o levantamento da rede. 89.ª -A douta sentença nunca poderia decidir o ponto 16 dos factos provados, considerando a área de cerca de 130 m2, quando os recorridos no pedido de retificação que apresentaram por requerimento de 21/04/2022 e doc. 16 retificado, vêm referir e peticionar que essa área é de apenas 55 m2, ocorrendo assim manifesto erro por excesso de pronúncia –condenação em quantidade superior ou em objeto diverso do que foi pedido, tendo sido violado o disposto no artigo 609º do C.P.C. Concluiu, pedindo que seja julgado procedente por provado o presente recurso de apelação e, em consequência, julgada a ação integralmente improcedente, absolvendo-se a Ré/Apelante de todos os pedidos contra si formulados, e decidindo-se que a delimitação/demarcação dos prédios se efetua nos termos invocados e provados pela Recorrente, pela linha constante do documento nº 6 junto com a contestação e documento nº 15 dos recorridos (rectificado), nos termos apontados nas conclusões precedentes. 6. Não foram apresentadas contra-alegações. 7. Foram observados os vistos legais. * II. DELIMITAÇÃO do OBJECTO do RECURSO:O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso - cfr. artigos 635º, nº 3, e 639º, n.ºs 1 e 2, do CPC. Por outro lado, ainda, sem prejuízo das matérias de conhecimento oficioso, o tribunal de recurso não pode conhecer de questões não antes suscitadas pelas partes perante o Tribunal de 1ª instância, sendo que a instância recursiva, tal como configurada no nosso sistema de recursos, não se destina à prolação de novas decisões, mas à reapreciação pela instância hierarquicamente superior das decisões proferidas pelas instâncias. [1] * As questões a decidir no presente recurso são as seguintes:1ª- Impugnação da decisão sobre a matéria de facto. 2ª-Limites dos prédios de Apelante e Apelados e definição da linha divisória. ** III. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO:1. O Tribunal de 1ª instância julgou provados os seguintes factos: 1. Os autores são donos e legítimos possuidores do prédio urbano sito em ..., União de freguesias ..., ... e ... do concelho de Lousada, descrito na CRP sob o número ... de ..., com inscrição de aquisição a seu favor em ap. ... de 2007/08/06 e ap ... de 2010/05/06, inscrito na matriz sob o artigo ... urbano da referida união de freguesias e anteriormente sob o artigo ... da freguesia ... extinta. 2. São os autores ainda donos e legítimos possuidores do prédio urbano casa de habitação de dois pisos anexo e logradouro, sito na Avenida ..., com o n.º ... na porta, União de freguesias ..., ... e ... do concelho de Lousada, descrito na CRP sob o numero ... de ..., Lousada, com inscrição de aquisição a seu favor em ap. ... e ... de 06/05/2010 , inscrito na matriz sob o artigo ... urbano da referida união de freguesias e anteriormente sob o artigo ... da freguesia ... extinta. 3. A ré é dona e legitima possuidora dos seguintes prédios: a. Urbano Edifico de r/c e anexo, sito na Rua ..., da União de freguesias ..., ... e ... do concelho de Lousada, descrito na CRP sob o numero ... de ..., inscrito na matriz sob o artigo ..., urbano da referida união de freguesias e anteriormente sob o artigo ... da freguesia ... extinta. b. Rústico denominado Quintal no lugar de ..., da União de freguesias ..., ... e ... do concelho de Lousada, descrito na CRP sob o numero ...: de ..., a confrontar a Sul com PP, nascente com Estrada (Rua ...) e poente com QQ, inscrito na matriz sob o artigo ..., rustico da referida união de freguesias e anteriormente sob o artigo ... da freguesia ... extinta. c. Urbano sito na Rua ..., da União de freguesias ..., ... e ... do concelho de Lousada, descrito na CRP sob o numero ... de ..., inscrito na matriz sob o artigo ..., urbano da referida união de freguesias e anteriormente sob o artigo ... da freguesia ... extinta. 4. Na descrição predial do prédio referido em 1 foi consagrada a localização do prédio como sendo Rua ..., por ter sido considerado que o mesmo tinha entrada por aí, o que foi julgado que assim não seria no processo que correu termos sob o número 2525/18.5 T8PNF, do juízo Central Cível 4 de Penafiel. 5. Os prédios referidos em 1, 2 e 3 foram desde as décadas 60 e 70, pertença dos pais do autor e ré, RR e SS, tendo ficado a pertencer em comum aos autores, ré e mais cinco irmãos de ambos, na proporção de 1/7 para cada um, por escritura de partilha por óbito da mãe do autor e da ré de 22 de março de 1994 em regime de compropriedade da raiz ou nua propriedade e usufruto a favor do pai RR. 6. Em 2007, por escrituras de compra e venda autor, ré e demais irmãos puseram fim à compropriedade, tendo o autor adquirido as 6/7 partes da ré, dos seus 4 irmãos e do cônjuge sobrevivo e descendentes do irmão entretanto falecido, RR na parte referente aos prédios referidos em 1 e 2, entre outros, por escritura de 14 de setembro de 2007 a fls. 88 do livro ...... da Notária TT e a ré adquirido do autor e demais irmãos e herdeiros do referido falecido irmão RR, as 6/7 partes dos prédios referidos em 3 por outra escritura celebrada no mesmo dia. 7. Em 2007, na composição dos lotes com vista à divisão de coisa comum operada pelas referidas compras, acordaram entre si que a delimitação do prédio referido em 1 com os prédios constantes das alíneas a e b de 3 se fazia por uma linha reta desde a esquina sudeste do muro divisório com o proprietário confinante a poente do prédio referido em 1 (atualmente DD e anteriormente EE – sapateiro) em direção à esquina poente do muro fronteiro do prédio constante da alínea c de 3, virado a sul para a Rua ... , onde se inicia o vão de entrada ou portão com n.º ... da Rua ..., portanto à esquina adjacente à coluna ou pilar direito do portão com o n.º ... da Rua .... 8. Essa delimitação foi aceite pelo autor, ré e demais irmãos, para efeitos da divisão, antes das escrituras de compra e venda de 2007. 9. Dentro dessa delimitação, na zona sudeste do prédio referido em 1, existe uma antiga nitreira que o autor passou a ocupar em exclusivo a partir de 2007 com a compra, tendo recebido do seu irmão II e mulher JJ – que até então faziam uso da mesma como arrecadação e garagem para o veículo – as respetivas chaves, como consequência da compra. 10. Nessa nitreira, que passou a funcionar como arrecadação, a filha do autor com autorização deste, guardava de forma continuada durante os anos entre 2007 e 2011, artigos e produtos para a indústria alimentar e posteriormente guardou o autor os restos de materiais de construção resultantes da obra de recuperação que fez do prédio referido em 2 e mais tarde do prédio referido em 1, assim funcionando como arrecadação do autor em exclusivo desde março de 2007 até à presente data. 11. Dentro dessa delimitação existia a poente da referida nitreira um coberto que era utilizado para a prensagem de uvas e onde posteriormente a partir de 2007, o autor abrigou também materiais de construção, nomeadamente pedras, e seus filhos parqueavam os seus veículos, quando iam ao prédio referido em 1 ou para gerar energia para abastecimento do sistema de frio, do prédio referido em 1, onde a filho do autor tinha instalado um armazém de produtos para a industrial alimentar. 12. Em março de 2018, a ré interrompeu a passagem do autor para o prédio referido em 1, através do n.º ... da Rua ..., substituindo o portão velho por um portão novo de ferro com painéis em chapa, colocando uma fechadura e fechando o portão. 13. Assim, desde março de 2018 até há cerca de 10 meses atrás, o acesso à nitreira e coberto atrás referido passou a poder fazer-se apenas passando pelo interior duma arrecadação com paredes e teto de chapa existente no prédio referido em 2, mediante autorização dos respetivos inquilinos. 14. Desde 2007 que os autores utilizam a referida nitreira, nela guardando, colocando e retirando coisas suas, fechando-as à chave, como quem exerce poderes sobre coisa que lhes pertence e nessa convicção, com exclusão de outrem, sem qualquer interrupção, na ignorância de lesarem direitos ou interesses alheios e sem oposição de ninguém até há cerca de 10 meses antes da propositura desta ação. 15. E desde 2007 que os autores utilizam o referido coberto dele extraindo todas as utilidades, nele guardando, colocando e retirando coisas suas, nomeadamente pedras de construção e veículos automóveis, até março de 2018 quanto a estes, como quem exerce poderes sobre coisa que lhes pertence, e nessa convicção, com exclusão de outrem, sem qualquer interrupção, na ignorância de lesarem direitos ou interesses alheios e sem oposição de ninguém até há cerca de 10 meses antes da propositura desta ação. 16. Fisicamente nunca foi feita qualquer marcação entre os prédios até que cerca de 10 meses antes da propositura desta ação, a ré destruiu o referido coberto e colocou uma rede de malha sol intervalada e segurada com colunas, no local assinalado a amarelo na fotografia do Google Earth junta com a petição como documento 15 (retificado), impedindo os autores de aceder à nitreira e a uma área de cerca de 130 m2, conforme fotografia junta a fls. 89 verso. IV. FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA. 1ª Questão- Impugnação da decisão sobre a matéria de facto Perante as exigências estabelecidas no art. 640º do CPC, constituem ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto, a seguinte especificação: a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas. “Quer isto dizer que recai sobre a parte Recorrente um triplo ónus: Primeiro: circunscrever ou delimitar o âmbito do recurso, indicando claramente os segmentos da decisão que considera viciados por erro de julgamento; Segundo: fundamentar, em termos concludentes, as razões da sua discordância, concretizando e apreciando criticamente os meios probatórios constantes dos autos ou da gravação que, no seu entender, impliquem uma decisão diversa; Terceiro: enunciar qual a decisão que, em seu entender, deve ter lugar relativamente às questões de facto impugnadas. Ónus tripartido que encontra nos princípios estruturantes da cooperação, da lealdade e boa fé processuais a sua ratio e que visa garantir, em última análise, a seriedade do próprio recurso instaurado, arredando eventuais manobras dilatórias de protelamento do trânsito em julgado da decisão.”[2] São as conclusões das alegações de recurso que estabelecem os limites do objecto da apelação e, consequentemente, do poder de cognição do Tribunal de 2ª instância, de modo que, na impugnação da matéria de facto devem constar das conclusões de recurso necessariamente os concretos pontos de facto impugnados e a decisão alternativa que o recorrente propõe para cada um dos factos impugnados, admitindo-se, tal como alguma jurisprudência e doutrina, que a análise pormenorizada dos concretos meios probatórios possa constar apenas do corpo das alegações ou motivação propriamente dita, tal como as passagens das gravações ou transcrições dos depoimentos de que o recorrente se socorra. Analisadas as conclusões deste recurso concluímos que tais ónus de impugnação da matéria de facto foram suficientemente cumpridos pela Apelante, ao fazer constar das conclusões de recurso, os factos impugnados, a decisão alternativa e os concretos meios de prova, quer documental, quer testemunhal, constantes do processo e de gravação nele realizada, que em seu entender, sustentam a pretendida alteração da decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, tendo feito referência aos exactos segmentos da gravação dos depoimentos invocados. Segundo o disposto no art. 662º nº 1 do CPC, “A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”. Ora, no âmbito do recurso de impugnação da decisão de facto, o Tribunal da Relação pode e deve realizar uma efectiva reapreciação da prova produzida, levando em consideração, não só os meios de prova indicados no recurso, como outros que relevem para a decisão relativa aos pontos da matéria de facto impugnada, com vista a formar a sua própria convicção, aferindo se da fundamentação vertida na sentença recorrida resulta evidente algum erro de apreciação dos factos controvertidos à luz das regras de experiência ou de prova vinculada. Não obstante, temos presente a importância do princípio da imediação da prova, estando o Juiz de 1ª instância, sem dúvida, melhor posicionado para ter plena percepção da forma como os depoimentos são prestados, as hesitações e linguagem corporal das testemunhas e partes, dificilmente percetível em gravações exclusivamente sonoras. No caso em apreço, a dificuldade é acrescida se considerarmos que a grande maioria da prova testemunhal produzida em julgamento foi acompanhada da visualização pelas testemunhas de fotografias, que embora juntas aos autos, a sua mera visualização não permite, senão com grande esforço, inferir onde se localizam os pontos que as testemunhas terão apontado nas fotografias, quando mencionaram as seguintes referências espaciais “é desta quina aqui até àquela…; da quina de trás…tudo indica que o alinhamento era por ali…a partir daqui até aqui era tudo mata… da esquina do sapateiro à esquina da casa da Nela…”, para mais quando a delimitação que está a ser questionada e, se fez verter no ponto 7 dos factos provados, é bem mais precisa quanto aos pontos de referência da linha divisória dos prédios confinantes. Apesar das referidas dificuldades, para podermos reapreciar a decisão proferida pelo tribunal a quo, em função dos meios probatórios produzidos perante ele e, formarmos a nossa própria convicção, de molde a podermos decidir se se impunha decisão diferente da que foi tomada, socorremo-nos da audição completa e integral da prova gravada e da análise da documentação e fotos junta aos autos, devidamente articulada entre si e analisada à luz das regras de experiência. Feitas estas considerações, importa, pois, apurar se foi produzida prova cabal e consistente que imponha decisão diferente da que foi tomada pelo tribunal a quo, sobre os factos mencionados pela Apelante/Ré nas Conclusões 16ª e 73ª. Nesta sede, cumprindo os mencionados ónus de impugnação da matéria de facto, alegou a Apelante/Ré que, face à prova produzida, encontram-se incorrectamente julgados os pontos 7, 8, 9, 10, 11, 14, 15 e 16 da matéria de facto dada como provada, que, em seu entender, deveriam ter sido considerados como não provados. Como a fundamentação será comum face à similitude das questões suscitadas, agrupamos os factos impugnados vertidos nos pontos 7 a 10 e 14 por um lado, assim como os pontos 11 e 15, finalizando com o ponto 16, os quais, por uma questão de facilidade de exposição e percepção da matéria de facto impugnada, passamos a transcrever: Ponto 7 dos factos provados- “Em 2007, na composição dos lotes com vista à divisão de coisa comum operada pelas referidas compras, acordaram entre si que a delimitação do prédio referido em 1 com os prédios constantes das alíneas a e b de 3 se fazia por uma linha reta desde a esquina sudeste do muro divisório com o proprietário confinante a poente do prédio referido em 1 (atualmente DD e anteriormente EE – sapateiro) em direção à esquina poente do muro fronteiro do prédio constante da alínea c de 3, virado a sul para a Rua ..., onde se inicia o vão de entrada ou portão com n.º ... da Rua ..., portanto à esquina adjacente à coluna ou pilar direito do portão com o n.º ... da Rua ....” Ponto 8 dos factos provados- “Essa delimitação foi aceite pelo autor, ré e demais irmãos, para efeitos da divisão, antes das escrituras de compra e venda de 2007.” Ponto 9 dos factos provados- “Dentro dessa delimitação, na zona sudeste do prédio referido em 1, existe uma antiga nitreira que o autor passou a ocupar em exclusivo a partir de 2007 com a compra, tendo recebido do seu irmão II e mulher JJ – que até então faziam uso da mesma como arrecadação e garagem para o veículo – as respetivas chaves, como consequência da compra.” Ponto 10 dos factos provados- “Nessa nitreira, que passou a funcionar como arrecadação, a filha do autor com autorização deste, guardava de forma continuada durante os anos entre 2007 e 2011, artigos e produtos para a indústria alimentar e posteriormente guardou o autor os restos de materiais de construção resultantes da obra de recuperação que fez do prédio referido em 2 e mais tarde do prédio referido em 1, assim funcionando como arrecadação do autor em exclusivo desde março de 2007 até à presente data.” Ponto 14 dos factos provados- “Desde 2007 que os autores utilizam a referida nitreira, nela guardando, colocando e retirando coisas suas, fechando-as à chave, como quem exerce poderes sobre coisa que lhes pertence e nessa convicção, com exclusão de outrem, sem qualquer interrupção, na ignorância de lesarem direitos ou interesses alheios e sem oposição de ninguém até há cerca de 10 meses antes da propositura desta ação.” Como resulta das alegações de recurso, a Apelante nunca afirmou expressamente que sobre tais factos não tenha sido produzida prova, mormente a prova mencionada pelo tribunal a quo na sua fundamentação, apenas questionou a credibilidade dos depoimentos testemunhais em que o tribunal alicerçou a sua decisão, realçando que são todos familiares directos dos Apelados e, direcionou a questão da demarcação dos imóveis para aquela que alegadamente outrora terá existido, quando o pai da Apelante e do Apelado comprou o dito “terreno de baixo”, que era mato ou monte como foi identificado pelas testemunhas que a Apelante convoca em abono da sua posição. Ora, como é facilmente perceptível, o teor destes factos impugnados não se reporta temporalmente à eventual demarcação antiga que poderia ter existido entre os dois prédios confrontantes antes de passarem a pertencer ao mesmo dono (só passaram a pertencer ambos ao pai de Apelante e Apelado em 1963), mas à delimitação entre os prédios que terá resultado de um acordo que os herdeiros do proprietário terão feito em sede de partilhas, contemporâneo das compras referenciadas no ponto 6 dos factos provados ( facto não impugnado) acordo esse situado já em 2007, pelo qual a delimitação dos prédios que até aí eram usados como um só pelo mesmo dono, terá ficado definida pela forma descrita no ponto 7 dos factos provados e desde aí assumida pelos proprietários confinantes. É inegável que as testemunhas convocadas pela Apelante insistiram que a delimitação é clara e que o alinhamento sempre teria sido feito pela esquina do muro do sapateiro à esquina traseira da casa da caseira da Apelante e, que então era visível pela ramada e/ou rede que outrora lá existira, tal qual visualizado no doc. 2 da contestação, admitindo-se assim ter resultado da prova invocada pela Apelante, porém, essa realidade não invalida que, posteriormente, os herdeiros do proprietário daqueles imóveis, possam ter definido de uma outra forma a linha divisória, destinada a estabelecer os limites físicos de cada um dos prédios comprados quer pela Apelante, quer pelo Apelado aos demais irmãos, uma vez que, até aí o pai deles fizera um uso indistinto, como se de um só se tratasse, como se trata nos pontos impugnados 7 e 8. E sobre o alegado acordo vertido nos pontos 7 e 8 dos factos provados nenhuma das testemunhas a que a Apelante fez referência dele podia falar, como de facto nenhuma falou, tendo-se limitado a dizer que não estiveram presentes na reunião ocorrida entre os herdeiros e da qual resultaram as compras dos quinhões aludidas no ponto 6 dos factos provados, desde logo porque, como afirmaram, nem herdeiros eram, tendo-se limitado a testemunha MM- caseira da Apelante- a dizer que um dos herdeiros já falecido e a sua senhoria/Apelante lhe teriam dito, após as ditas partilhas, que passava a ser inquilina da Apelante e como tal poderia usar o espaço onde se situa a nitreira e se situava o coberto. Isto é, dos factos vertidos nos pontos 7 e 8 dos factos provados nenhuma das testemunhas de que a Apelante se socorreu, tinha qualquer conhecimento directo. Apesar desse desconhecimento, realça-se o facto de ter sido inclusivamente afirmado pelas testemunhas MM e seu marido NN, que desde aquela altura (2007/2008) o Apelado os impediu de utilizarem aquele espaço, mormente a nitreira e, que tendo eles reportado essa conduta à Apelante esta limitou-se a dizer que tudo se iria resolver, apesar de nada ter sido resolvido pelo menos até 2018, confirmando que apenas o Apelado e mormente a sua filha utilizaram, durante todo aquele período, aquele espaço onde se localiza a nitreira, espaço esse que fica dentro dos limites do prédio comprado pelos Apelados em função da linha divisória que o tribunal a quo reconheceu existir no ponto impugnado. Reapreciada a prova no seu conjunto, não resta qualquer dúvida que a prova no sentido vertido nos referidos pontos de facto 7 e 8 foi abundante e merece toda a credibilidade e, não é por serem todos familiares directos do Apelado que se impõe a sua desconsideração como pretende a Apelante, pelo contrário, atrevemo-nos a dizer que, atendendo à matéria de facto em apreço não existiria prova mais consistente e credível que o depoimento dos irmãos e cunhada de Apelante e Apelado, que estiveram presentes na reunião em que ficou decidido o modo de pôr fim à compropriedade de que eram titulares em todos aqueles imóveis, os quais esclareceram de forma segura que a Apelante ficou “com os terrenos da parte de baixo e a casa da BB” e o Apelado “com os terrenos da parte de cima”, tendo sido afirmado pela testemunha KK (irmã da Apelante e Apelado) que o Apelado deu a escolher à Apelante e esta terá escolhido “a parte de baixo” sabendo qual a linha divisória que havia sido acordada entre tais prédios, sendo plausível de acordo com as regras da experiência que nesse momento tenham definido, como afirmaram, os limites dessas ditas “parte de cima” e “parte de baixo”, fazendo-o pelo alinhamento que ficou consignado no ponto 7, assim afirmado de forma segura e coerente por quem esteve presente e nenhum interesse terá no desfecho da presente lide, como o fizeram as testemunhas II, KK e JJ, de que o tribunal a quo se socorreu, e bem, para formar a sua convicção. De todo o modo, seguro é que a Apelante não apresentou qualquer prova que impusesse considerar tais factos vertidos nos pontos 7 e 8 como não provados, já que nenhuma das testemunhas por ela convocadas tinha qualquer conhecimento directo e pessoal do referido acordo, não tendo estado presentes nas partilhas e, nenhum dos documentos 1, 2 ou 6 juntos com a contestação ou qualquer outro documento junto aos autos se reporta ao alegado acordo, apenas traduzirão uma alegada delimitação anterior diferente, que em nada colide com uma posterior alteração acordada entre todos. No que respeito aos pontos 9, 10 e 14 dos factos provados, foi relevante o depoimento da testemunha GG, que embora filha do Apelado, relatou de forma circunstanciada e segura, que se afigurou credível, o uso que fez da nitreira e o período temporal desse uso após a compra pelo pai dos imóveis identificados nos autos, tendo-a deixado de usar sensivelmente em finais de 2015 ( altura da sua separação), altura em que o Apelado lá passou a colocar materiais de construção da obra de recuperação dos prédios urbanos que comprara, resultando das fotos tiradas na inspeção ao local e juntas aos autos, que alguns desses materiais ainda lá hoje estão depositados, uso esse corroborado pelas testemunhas HH, II, JJ e KK, tendo estes últimos afirmado de forma credível, segura e desinteressada, com conhecimento pessoal e directo, que aquando das escrituras de compra mencionadas no ponto 6 dos factos provados a testemunha II entregou as chaves da nitreira ao Apelado e as chaves da casa da agora caseira da Apelante a esta última, à frente de todos os irmãos, que a Apelante não questionou porque sabia que tal nitreira não lhe pertencia, tendo sido uma questão pacífica até 2018, tendo afirmado sem hesitações que do lado do irmão ficou a nitreira, afirmando a testemunha II que a rede que lá viu agora colocada está no sítio errado, não conforme com o que foi combinado nas partilhas. Ora sobre o referido uso exclusivo e detenção das chaves da nitreira houve uma tentativa de impugnação daquela prova por recurso ao depoimento dos caseiros da Apelante, MM e NN, que embora tenham afirmado terem usado também aquela nitreira após a compra pela Apelante da casa e terrenos que utilizam enquanto caseiros, tais depoimentos foram, quanto a nós bem, desconsiderados pelo tribunal a quo, pois que estão eivados de incongruências e contradições entre si, quer quanto ao tipo de uso, quer mesmo quanto ao tempo, evidenciando tais testemunhas manifesta incompatibilidade com os Apelados e interesse no desfecho desta acção, uma vez que a manter-se a linha divisória definida no local pela Apelante serão eles a usufruírem daquele espaço e da referida nitreira, como sempre pretenderam, como ressalta da postura assumida em julgamento no sentido de entenderem que todo aquele espaço é “deles”. Não obstante, aqueles depoimentos tiveram até a virtualidade de reforçar a convicção de que o uso da nitreira foi sendo feito pelo Apelado e sua filha desde a compra em 2007 até 2018, porquanto ambos afirmaram que pouco tempo depois das alegadas partilhas o Apelado pôs uma fechadura na nitreira, colocando cá fora pretensos objectos daquelas testemunhas, passando só ele e a filha GG a terem as chaves, acto demonstrativo do uso exclusivo que dela pretendiam efectuar, impedindo terceiros de o fazer, acto do qual as testemunhas afirmaram terem-se queixado junto da senhoria, sem qualquer resultado, afigurando-se-nos que normal seria, à luz das regras da experiência, que sabedora de tal pretensa intrusão, a Apelante de imediato reagisse, o que não aconteceu senão mais de 10 anos volvidos. Por conseguinte, não tendo a Apelante produzido qualquer prova consistente e coerente que imponha decisão diferente da proferida pelo tribunal a quo e, não merecendo esta última qualquer censura quanto aos meios probatórios de que lançou mão, pelo contrário, encontrando inteiro respaldo nos depoimentos acima referenciados, manter-se-ão os pontos 7, 8, 9, 10 e 14 como provados, indeferindo a impugnação apresentada. Ponto 11 dos factos provados- “Dentro dessa delimitação existia a poente da referida nitreira um coberto que era utilizado para a prensagem de uvas e onde posteriormente a partir de 2007, o autor abrigou também materiais de construção, nomeadamente pedras, e seus filhos parqueavam os seus veículos, quando iam ao prédio referido em 1 ou para gerar energia para abastecimento do sistema de frio, do prédio referido em 1, onde a filha do autor tinha instalado um armazém de produtos para a industria alimentar.” Ponto 15 dos factos provados- “E desde 2007 que os autores utilizam o referido coberto dele extraindo todas as utilidades, nele guardando, colocando e retirando coisas suas, nomeadamente pedras de construção e veículos automóveis, até março de 2018 quanto a estes, como quem exerce poderes sobre coisa que lhes pertence, e nessa convicção, com exclusão de outrem, sem qualquer interrupção, na ignorância de lesarem direitos ou interesses alheios e sem oposição de ninguém até há cerca de 10 meses antes da propositura desta ação.” Relativamente a esta matéria nenhuma das testemunhas mencionadas pela Apelante contrariou tais factos, tendo incidido tais depoimentos essencialmente sobre o uso da nitreira e sobre o alinhamento que outrora teria existido entre os prédios, no tempo do pai de Apelante e Apelado, pouco ou nada tendo referido quanto ao coberto referenciado nestes pontos 11 e 15 impugnados, nada de relevante aportando os documentos juntos aos autos a esse propósito, razão pela qual, resta-nos concluir que os concretos meios probatórios invocados pela Apelante não impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida, indeferindo-se nesta parte a impugnação apresentada. Ponto 16 dos factos provados- “Fisicamente nunca foi feita qualquer marcação entre os prédios até que cerca de 10 meses antes da propositura desta ação, a ré destruiu o referido coberto e colocou uma rede de malha sol intervalada e segurada com colunas, no local assinalado a amarelo na fotografia do Google Earth junta com a petição como documento 15 (retificado), impedindo os autores de aceder à nitreira e a uma área de cerca de 130 m2, conforme fotografia junta a fls. 89 verso.” A propósito deste ponto de facto desde logo impõe-se proceder à rectificação da área de 130 m2 nele mencionado, passando a constar a área de 55 m2, porquanto assim o rectificaram os próprios Apelados aquando da apresentação do requerimento Ref. Citius 7883341 ( de 21.04.2022). No demais, entendemos que da prova produzida resulta o que desse ponto de facto consta, uma vez que efectivamente nenhuma das testemunhas referenciou que tenha sido feita qualquer marcação dos prédios, por forma a ficar estabelecida uma qualquer linha divisória entre os prédios que nas partilhas ficaram a pertencer ao Apelado e à Apelante. Embora tenham aludido a uma anterior demarcação através de uma ramada e porventura vedação em rede, sustentando que a delimitação terá de ser feita conforme outrora a conheceram, situaram-na ao tempo em que o pai de Apelante e Apelado, já então proprietário do prédio de cima, comprou o terreno de baixo que era mato, porém, também afirmaram de forma unânime que após essa compra o pai cultivou indistintamente todo o espaço, fez um uso indiferenciado de todo o espaço, resultando das regras da experiência que faria pouco sentido existirem limites dentro de um espaço pertencente à mesma pessoa e que esta usava como um único espaço, sem que lhe tenha dado destinos distintos aos prédios que o compunham, pelo que, apesar de ser visível da documentação referenciada pela Apelante a existência de arvoredo no local onde a Apelante veio a colocar a rede que lá se encontra, certo é que resultou da prova produzida que actualmente esse arvoredo não existe e não foi produzida prova segura e cabal de quem e quando terá sido derrubada a mencionada ramada que serviria outrora de delimitação. O que resulta sim evidente de todos os depoimentos, é que em 2007 já não existiria qualquer demarcação visível, seja por ramada, ou por rede, tendo sido aludido pelos filhos do Apelado que nessa altura o Apelado terá lá colocado estacas com o propósito de vir a fazer um muro que espelhasse os limites do que era seu, relativamente ao que ficara para a sua irmã, sem que o tenha chegado a concretizar, pelo que, terá de se concluir que, se existiu no tempo do pai de Apelante e Apelado a referida delimitação, a mesma não existia mais aquando das partilhas reportadas a 2007 e, por assim ser e as partes não estarem de acordo quanto aos limites dos prédios que lhes ficaram a pertencer, é que a Apelante terá colocado uma rede do modo que lá se encontra e que impede o Apelado de aceder à nitreira que até aí usava como se fosse sua, o que não aconteceria se a marcação da linha divisória já estivesse fisicamente feita entre os prédios. Por tais motivos, mantém-se este ponto 16 nos factos provados, com a pretendida rectificação da área nele mencionada, do qual passará a constar 55 m2 em vez dos 130 m2. 2ª Questão- Limites entre os prédios de Apelante e Apelados e definição da linha divisória. Em função dos pedidos formulados na petição inicial a presente acção assume laivos quer de acção de reivindicação, quer de demarcação, sendo equívoca a multiplicidade de pedidos formulados pelos aqui Apelados, pois que tanto pedem o reconhecimento dos limites do seu prédio na confinância com os prédios da Apelante e que se proceda à demarcação entre o prédio referido no art. 1º da PI e os prédios da Apelante, como cumulativamente pedem o reconhecimento de que determinada faixa de terreno ocupada pela Apelante lhes pertence e que a aqui Apelante se abstenha de praticar quaisquer actos que estorvem ou perturbem o seu direito de propriedade sobre aquela parcela de terreno, nitreira e coberto lá existentes. A questão em litígio não foi enquadrada juridicamente na sentença recorrida, apesar da abordagem do instituto da aquisição do direito de propriedade por usucapião, nela se tendo concluído que “(…) não só se reconhecerá o direito dos autores, como se ordenará a reposição da parcela no seu estado anterior, com o levantamento da rede, atento o previsto no n.º 1 do art.º 1348.º do Código Civil, restituindo-se desse modo in totum a parcela aos autores – cf. art.º 1311.º, n.º 1, do Código Civil. Será o pedido aceite, ganhando valia a pretensão dos autores de ver reconhecido um direito de propriedade sobre o espaço”, não tendo sido qualificada como acção de demarcação, não obstante constar da parte dispositiva o reconhecimento que “a demarcação entre o prédio referido em 1 e os prédios da ré é definida pela linha reta imaginária que se referencia em 7 e em 16.” A Jurisprudência consolidada, refere de forma reiterada que, a ação de demarcação supõe uma causa de pedir complexa, integrada por factos tendentes a demonstrar cumulativamente os seguintes requisitos: i) existência de prédios confinantes; ii) pertencentes a donos diferentes; iii) incerteza, controvérsia ou mero desconhecimento sobre a linha divisória entre eles. (neste sentido, Ac STJ de 25.05.2023, Proc. Nº 3346/16.2T8GMR.G1.S1; Ac STJ de 20.11.2019, Proc. Nº 841/13.9TJVNF.S1; Ac RP de 14.11.2022, Proc. Nº 1711/19. 192T8PNF.P1; Ac RP de 29.9.2921, Proc. Nº 1229/18.0T8VNG.P1; Ac RP de 13.7.2021, Proc. Nº 500/20. 6T8ALB.P1; Ac RP de 15.12.2021, Proc. Nº 882/12.3TBSJM.P3; Ac RP de 12.9.2022, Proc. Nº 316/13. 6TBAMT.P2, Ac RG 13.6.2019, Proc. Nº 841/13.9TJVNF.G2; Ac RC 13.5.2014, Proc. Nº 3779/10.8TBVIS.C1, todos www.dgsi.pt) A ação de demarcação, prevista no artigo 1353.º do CC, contrariamente à acção de reivindicação, supõe a certeza e indiscutibilidade dos títulos de propriedades dos prédios confinantes, havendo duvidas apenas quanto aos respetivos limites, o que nos parece ser o caso sob apreciação, apesar de os Apelados terem formulado pedido de reconhecimento de que são proprietários de uma faixa de terreno onde a Ré colocou, à sua revelia, uma rede, por considerarem que não é naquele local que se deverá efectuar a demarcação dos prédios confinantes. Tal como resume o recente Ac RP de 9.1.2023, no qual é feita a diferenciação dos dois tipos de acções e respectivas pretensões, “por variadas vicissitudes, como seja a ignorância dos limites dos prédios e a identidade dos confrontantes, seja em consequência do crescente afastamento das pessoas da terra, seja ainda em decorrência de encobertas ações de usurpação, nem sempre a delimitação dos imóveis se acha definida de forma inequívoca e indiscutida, com a existência de marcos respeitados pelos confinantes ou com outros sinais igualmente respeitados, como sejam muros, fragas, ribeiros, etc… Nesta eventualidade, em ordem a dissipar as dúvidas existentes quanto aos limites dos prédios, o proprietário tem o direito potestativo de exigir aos proprietários confinantes que concorram para a demarcação das estremas entre o seu prédio e os deles (artigo 1353º, do Código Civil). De forma sintética, pode dizer-se que enquanto a ação de revindicação pressupõe a definição precisa da coisa imóvel reivindicada, nomeadamente dos seus limites[8], operando a restituição dentro desses limites, a ação de demarcação implica necessariamente uma situação de incerteza ou dúvida quanto a uma ou várias estremas do imóvel a demarcar, destinando-se precisamente à definição precisa das linhas que permitem a determinação dos limites dos prédios em que se regista essa incerteza.”[3] Não temos dúvidas que os Apelados/Autores pretendiam fazer valer nesta ação o direito à demarcação do seu prédio com o prédio da Apelante/Ré, direito esse expressamente previsto no art. 1353.º do CC, segundo o qual “O proprietário pode obrigar os donos dos prédios confinantes a concorrerem para a demarcação das estremas entre o seu prédio e o deles”. Apesar de a Apelante/Ré ter sustentado, em sede de contestação, que a linha divisória já estava definida no local de forma coincidente ao local onde veio a colocar a rede divisória, resulta dos autos que existe controvérsia entre as partes sobre a localização da linha divisória dos prédios pertencentes a um e a outra, uma vez que a Apelante entende que a que actual divisória por si colocada coincide com a que sempre existiu no local, outrora visível por rede e ramadas, enquanto que os Apelados mantêm que a demarcação deve ser feita da forma que descrevem na PI, por ter assim ficado definido por acordo celebrado entre os proprietários confinantes, delimitação essa que insere dentro dos limites do seu prédio a nitreira e o coberto que lá existira, implicando a demarcação lá feita recentemente pela Apelante uma ocupação indevida de uma faixa de terreno de cerca de 55 m2 que os Apelados sustentam fazer parte do seu prédio. Por conseguinte, a diferença entre a delimitação efectuada pela Apelante e aquela que os Apelados pretendem seja feita, determinará dentro de qual dos prédios ficará a reclamada nitreira e o então existente coberto (entretanto destruído), dependendo do alinhamento que seja feito entre tais prédios confinantes. Os apelados pediram que lhes fosse reconhecido o direito de propriedade, sobre a totalidade do prédio identificado no ponto 1 dos factos provados, incluindo a área identificada no ponto 16 dos factos provados, a tal área que inclui a nitreira e o então existente coberto, por ter sido por eles adquirido por usucapião, sustentando que a demarcação seja feita conforme determinado por acordo, no qual participou a Apelante, nos moldes vertidos no ponto 7 dos factos provados, contudo, afigura-se-nos que esse reconhecimento da propriedade da faixa de terreno onde a nitreira e o coberto estão colocados sempre decorrerá automaticamente da definição da demarcação. Numa ação de demarcação não se mostra controvertido o direito de propriedade de cada uma das partes sobre cada um dos prédios confinantes, não havendo, por isso, que declarar incluída num daqueles prédios qualquer área em litígio, apenas importará proceder à definição da linha divisória entre os dois prédios confinantes, demarcando as respectivas estremas no ponto onde confrontam, ainda que haja uma área, por pequena que seja, que constitua ponto da discórdia. Tal como esclareceu devidamente o Ac STJ de 20/11/2019, “Embora conexa com o direito das coisas, a acção de demarcação não é uma acção real, mas pessoal. Por ela não se pretende a declaração de qualquer direito real, ou da sua amplitude, mas unicamente obter que se precisem as estremas de prédios confinantes, estremas essas que, depois de definidas judicialmente, em princípio, foram fixadas como sempre eram, sem porem em dúvida ou afectarem qualquer direito real. As acções de demarcação não têm por objecto o reconhecimento do domínio, embora o pressuponham; o seu fim específico é o de fazer funcionar o direito reconhecido ao proprietário pelo artigo 1353º do Código Civil, de obrigar os donos dos prédios confinantes a concorrerem para a demarcação das estremas respectivas.”[4] Igual entendimento sustenta Mariana Cruz, ao escrever em anotação ao art. 1353º CC que “A ação de demarcação é suscetível de causar dúvidas relativamente à sua diferenciação da ação de reivindicação consagrada no artigo 1311º dado que em qualquer dos casos se discute uma questão de domínio relativamente a uma faixa de terra e muitas vezes o recurso a uma ou a outra ação materializa-se no mesmo objectivo. No entanto, como sumariza Henrique Sousa Antunes (SOUSA ANTUNES, HENRIQUE, 2017:211) na ação de reivindicação está em causa o próprio título de aquisição; na ação de demarcação está em causa apenas a extensão do título possuído. (…)O direito real está fixado nos títulos e o direito de demarcação (de caracter pessoal) visa apenas por fim a dúvidas relativamente à extensão de tal direito real.” Tal como podemos constatar das citações acima reproduzidas e melhor se pode ler no recente Ac STJ de 25.5.2023, “a discussão entre a fronteira entre a ação de reivindicação e a ação de demarcação tem sido cenário para uma profusa produção e discussão jurisprudencial e doutrinária. Sobre esta matéria, este Supremo Tribunal de Justiça tem vindo a propugnar o entendimento, absolutamente unânime, de que a demarcação dos prédios configura um direito potestativo, pressupondo a acção a confinância entre os prédios em confronto e uma incerteza do lugar onde se situa a estrema ou linha divisória entre os mesmos prédios. A ação de demarcação distingue-se, assim, da ação de reivindicação, na medida em que nesta não se discute a localização da referida linha divisória.”[6] Esse mesmo aresto defende o critério para distinguir entre a acção de reivindicação da acção de demarcação, que inteiramente sufragamos, do seguinte modo:“ O critério para distinguir entre a acção de reivindicação (art. 1311º do CC) e a acção de demarcação (art. 1353º do CC) assenta que naquela existe um conflito acerca do título de aquisição, e nesta a dúvida sobre o limite ou conteúdo do direito de propriedade dos prédios confinantes, ou seja sobre relevância do título em relação ao prédio, não estando em causa o título de aquisição do prédio de que faz parte a faixa de terreno que situa entre ou no limiar de contiguidade entre os respetivos terrenos, mas a extensão do prédio possuído.” Não obstante esta distinção não ter sido abordada pelas partes, nem questionada pelo tribunal a quo, foi proferida decisão que reconheceu os direitos de propriedade reclamados pelos aqui Apelados, condenou a aqui Apelante a remover a rede colocada na parcela de terreno que considerou fazer parte do prédio dos aqui Apelados e, finalizou por reconhecer que a demarcação entre o prédio daqueles e os prédios da aqui Apelante é definida pela linha reta imaginária que se referencia nos pontos 7 e 16 dos factos provados. Em face das alegações de recurso apresentadas pela aqui Apelante, que delimitam o objecto deste recurso, a mesma sustenta a revogação da sentença recorrida, com a consequente improcedência de todas as pretensões formuladas pelos aqui Apelados, porque entende que a demarcação dos prédios deve manter-se tal qual a implementou no local, onde colocou esteios e colunas que seguram uma rede, por alegadamente coincidir com a linha recta que sempre delimitou esses prédios há mais de 50 anos, apesar de estar ciente que tal localização da linha divisória dos prédios confinantes não é consensual porque os Apelados sustentam que mais recentemente, em 2007, essa linha divisória foi alterada por acordo e desde essa altura a nova delimitação foi respeitada, discutindo-se, pois, a linha divisória mas não os títulos. Resulta claro que não havendo consenso quanto aos limites de cada um dos prédios, existindo controvérsia sobre a localização da linha divisória, haverá porventura uma faixa de terreno próximo do ponto em que os prédios confinantes se encontram, cujo direito de propriedade poderá ser questionado, dele se arrogando titulares ambas as partes, mas essa incerteza resolver-se-á com a demarcação a efectuar, sem que seja necessário o recurso à acção de reivindicação ainda que esse pedido esteja formulado, pois que, como acima afloramos, o reconhecimento do direito de propriedade sobre a faixa de terreno resultará implicitamente da demarcação que ficar estabelecida. Isso mesmo foi aflorado no mencionado Ac STJ de 25.5.2023, que de forma lapidar esclarece que“(…), a dúvida sobre o limite ou sobre a linha divisória entre os prédios traz sempre consigo uma dúvida sobre o limite/conteúdo do direito de propriedade de uns e outros, o que não se pode confundir com a dúvida sobre a titularidade do direito de propriedade dos prédios em confronto. Assim, na ação de demarcação, como na ação de reivindicação, existem dúvidas sobre a quem pertence uma determinada faixa de terreno, que se situa no limiar de contiguidade entre os mesmos, apenas se desconhecendo com rigor este mesmo limiar, não tendo tal circunstância a virtualidade de tornar inviável o pedido de demarcação, que visa apenas definir, com clareza, a linha divisória e, por inerência, a mais rigorosa extensão do prédio. (…) apenas com a demarcação é possível determinar, com a exigida clareza, qual a rigorosa linha que contigua e divide os prédios dos autores e da ré, de onde advirá a exacta extensão da propriedade dos autores e a exacta extensão da propriedade da ré, bem como, consequentemente, determinar que a ré se encontra a ocupar terreno alheio sem título de ocupação. Como lucidamente se disse no acórdão do STJ, de 24-05-2022 (proc. n.º 882/12.3TBSJM.P3.S1), na ação demarcação visa-se definir a linha de separação, surgindo, depois, a eventual restituição do terreno eventualmente ocupado pelo vizinho confinante como consequência natural da demarcação efetuada, havendo, nesse caso, como que uma ficção legal de que nada se alterou, após a demarcação e a fixação da linha divisória, em substância em relação ao conteúdo do direito de propriedade.” Parece-nos ser o caso em apreciação, no qual está em causa o limite do direito de propriedade dos Apelados- se engloba ou não a faixa de terreno que a ré ocupou quando demarcou os terrenos confinantes sem a colaboração dos Apelados e, segundo estes de forma incorrecta por não respeitar o acordo de demarcação pré-existente- não estando propriamente em causa a titularidade do direito de propriedade, razão pela qual nos parece mais adequado enquadrar este tipo de acção como sendo uma ação de demarcação. Efectivamente, a Apelante sustenta que do prédio dos Apelados não faz parte a faixa de terreno mencionada no ponto 16 dos factos provados que admite ter ocupado com a rede lá descrita, porque o limite sul do prédio referido no ponto 1 dos factos provados ( dos Apelados), na confinância com os prédios que a ela ficaram a pertencer não se faz pela reta imaginária referenciada nos pontos 7 e 16 dos factos provados, discordando da demarcação que ficou reconhecida na sentença recorrida Conforme resulta inequivocamente da factualidade apurada nos autos, ficou demonstrado que os prédios são contíguos, pertenceram a um só proprietário- pai de Apelante e Apelados- mas que desde 2007 pertencem a proprietários diferentes e, que a demarcação que lá foi feita pela Apelante não respeita o acordo que entre eles foi celebrado quanto à delimitação dos prédios que ficaram a pertencer a cada um deles após as aquisições referenciadas no ponto 6 dos factos provados. Apesar de existir desentendimento entre Apelante e Apelados sobre a quem ficou a pertencer a faixa de terreno onde se encontra uma nitreira e existira um coberto, numa área aproximada de 55 m2, perante a linha de demarcação dada como provada no ponto 7 dos factos provados, o reconhecimento do direito de propriedade dos Apelados sobre aquela área acaba por ser uma decorrência da fixação dos limites do seu prédio. A demarcação consubstancia o exercício de um direito potestativo à colaboração dos donos dos prédios confinantes com vista à rigorosa fixação dos limites físicos entre esses prédios quando entre eles existe controvérsia quanto a esses mesmos limites, como no caso sub judice ocorre, até porque a mera reivindicação da parcela de terreno não bastaria, uma vez que a demarcação manter-se-ia, apesar de tudo, por fazer. Não estando em discussão os títulos de aquisição dos prédios confinantes, se os proprietários confinantes não estiverem de acordo quanto à linha divisória dos mesmos, como é o caso, não existindo no local evidências de marcos ou demarcações anteriormente existentes, incumbirá ao tribunal determinar essa demarcação seguindo os critérios estabelecidos no referido art. 1354º do CC, não devendo ser um dos proprietários confinantes a fazê-lo sem a colaboração do outro, sob pena de ser acusado de violar direito de propriedade de outrem, como sucedeu no caso sob apreciação. Quanto ao modo de proceder à demarcação, dispõe o art. 1354.ºCC do seguinte modo: “1 – A demarcação é feita de conformidade com os títulos de cada um e, na falta de títulos suficientes, de harmonia com a posse em que estejam os confinantes ou segundo o que resultar dos meios de prova. 2 – Se os títulos não determinarem os limites dos prédios ou a área pertencente a cada proprietário, e a questão não puder ser resolvida pela posse ou por outro meio de prova, a demarcação faz-se distribuindo o terreno em litígio por partes iguais. 3 – Se os títulos indicarem um espaço maior ou menor do que o abrangido pela totalidade do terreno, atribuir-se-á a falta ou o acréscimo proporcionalmente à parte de cada um.” “Por via da norma do artº 1354º, nº 2, do C. Civ. vê-se que o direito a demarcar prédios depende, não tanto da invocação de uma linha de demarcação, mas antes da própria inexistência de demarcação em si - tudo o mais deve ser conhecido pelo próprio tribunal, aplicando, para efeitos da fixação de uma linha de demarcação, os critérios principal e supletivo previstos no citado artº 1354º. Desde que se verifique a confinância de prédios pertencentes a proprietários diferentes e inexista linha divisória entre eles (seja porque, indiscutida entre os proprietários confinantes, não está marcada, sinalizada no terreno, seja porque ela (isto é, a sua localização), é objecto de controvérsia entre eles, seja porque eles pura e simplesmente desconhecem a sua localização) está aberta a porta para a actuação do direito de demarcação.”[7] Regressando ao caso sub judice, resultou provado nos autos que em 2007, na composição dos lotes com vista à divisão de coisa comum, operada pelas subsequentes compras e vendas entre irmãos, Apelante e Apelados acordaram entre si que a delimitação do prédio referido em 1 com os prédios constantes das alíneas a e b de 3 se fazia por uma linha reta desde a esquina sudeste do muro divisório com o proprietário confinante a poente do prédio referido em 1 (atualmente DD e anteriormente EE – sapateiro) em direção à esquina poente do muro fronteiro do prédio constante da alínea c de 3, virado a sul para a Rua ... , onde se inicia o vão de entrada ou portão com n.º ... da Rua ..., portanto à esquina adjacente à coluna ou pilar direito do portão com o n.º ... da Rua .... Delimitação essa que foi aceite pelo Apelado, pela Apelante e demais irmãos, para efeitos da divisão, antes das escrituras de compra e venda de 2007. Deste modo, temos de concluir que resultou da prova produzida que a demarcação está feita por acordo entre os proprietários nos termos que ficaram consignados no ponto 7 dos factos provados e assim foi reconhecida na sentença recorrida. Acontece que, apesar daquele acordo de delimitação dos prédios, não foi feita qualquer marcação física entre os prédios, até que cerca de 10 meses antes da propositura desta ação, a ré destruiu um coberto e colocou uma rede de malha sol intervalada e segura com colunas, no local assinalado a amarelo na fotografia do Google Earth junta com a petição como documento 15 (retificado), impedindo os autores de aceder à nitreira e a uma área de cerca de 55 m2, conforme fotografia junta a fls. 89 verso, concluindo-se que a Apelante efectuou a demarcação dos prédios em desrespeito do acordo estabelecido com o proprietário confinante, o que implicou a violação do direito de propriedade dos Apelados sobre aquela faixa de terreno onde existe a nitreira, pois que invadiu terreno alheio. Se porventura a linha divisória não tivesse sido determinada por acordo, como efectivamente ficou provado no ponto 7 dos factos provados, existindo incerteza ou dúvida dos limites dos prédios confinantes, perante a ausência de demarcação física entre os prédios de Apelante e Apelados, a mesma sempre seria decidida pelo tribunal apelando aos critérios mencionados no art. 1354º do CC. Deste modo, tendo-se apurado que na zona sudeste do prédio referido em 1, existe uma antiga nitreira que os Apelados passaram a ocupar em exclusivo a partir de 2007 nela guardando, colocando e retirando coisas suas, fechando-as à chave, como quem exerce poderes sobre coisa que lhes pertence e nessa convicção, com exclusão de outrem, sem qualquer interrupção, na ignorância de lesarem direitos ou interesses alheios e sem oposição de ninguém até há cerca de 10 meses antes da propositura desta ação, assim como utilizavam um coberto dele extraindo todas as utilidades, nele guardando, colocando e retirando coisas suas, nomeadamente pedras de construção e veículos automóveis, até março de 2018 quanto a estes, como quem exerce poderes sobre coisa que lhes pertence, e nessa convicção, com exclusão de outrem, sem qualquer interrupção, na ignorância de lesarem direitos ou interesses alheios e sem oposição de ninguém até há cerca de 10 meses antes da propositura desta ação, afigura-se-nos que a demarcação seria determinada segundo o critério da posse. Ora, a ser resolvida a questão da demarcação pelo critério da posse, como durante mais de 10 anos os Apelados actuaram como verdadeiros possuidores da faixa de terreno em litígio, considerando-a inserida dentro dos limites do seu prédio, sem oposição da proprietária confinante, não tendo sido produzida prova suficiente de que o fizessem por mera tolerância, porquanto se presume a posse naquele que exerce o poder de facto ( art. 1252º nº 2 do CC), daí resultaria igualmente que a demarcação fosse determinada de modo a que a área de 55 m2 onde se encontra a nitreira ficasse inserida dentro dos limites do prédio da propriedade dos Apelados descrito no ponto 1 dos factos provados, não podendo a linha divisória ser determinada nos moldes pretendidos pela Apelante. Em jeito de conclusão, a pretensão recursiva baseava-se em exclusivo na pretendida alteração da matéria de facto impugnada no sentido propugnado pela Apelante, pelo que, perante a inalterabilidade dos factos provados resta-nos concluir que a argumentação jurídica por aquela invocada para peticionar a revogação da sentença recorrida não encontra respaldo na factualidade apurada. Uma vez que a demarcação que a Apelante fez no local em que confinam os seus prédios com o dos Apelados não respeita a linha divisória dada como provada nos autos e, assim, viola o direito de propriedade dos Apelados, não merece censura a decisão recorrida, que ao reconhecer que a demarcação entre o prédio dos Apelados e os prédios da Apelante é definida pela linha recta que se referencia nos pontos 7 e 16 dos factos provados, reconhecendo que a faixa de terreno que foi ocupada pela Apelante de cerca de 55 m2 está inserida no prédio dos Apelados, determina que a Apelante remova a rede lá colocada, bem como os esteios e colunas, porquanto não respeita a localização da linha divisória em função da demarcação estabelecida. ** V. DECISÃO:Em razão do antes exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação do Porto, em julgar improcedente o recurso de apelação interposto pela Apelante/Ré, mantendo-se a sentença recorrida. Custas a cargo da Apelante, que ficou vencida-artigo 527º, n.ºs 1 e 2 do CPC. Notifique. Porto, 12 de Setembro de 2023 Maria da Luz Seabra Maria da Graça Mira Rui Moreira (O presente acórdão não segue na sua redação o Novo Acordo Ortográfico) ________________ [1] F. Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 8ª edição, pág. 147 e A. Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2ª edição, pág. 92-93. [2] Cadernos Temáticos De Jurisprudência Cível Da Relação, Impugnação da decisão sobre a matéria de facto, consultável no site do Tribunal da Relação do Porto, Jurisprudência [3] Proc. Nº 41/21. 4T8BAO.P1, www.dgsi.pt [4] Proc. Nº 841/13.9TJVNF.S1, www.dgsi.pt [5] Comentário ao Código Civil, Direito das Coisas, UCP, pág. 273 [6] Proc. Nº 3346/16.2T8GMR.G1.S1, www.dgsi.pt [7] Ac RC de 13/5/2014, Proc. Nº 3779/10.8TBVIS.C1, www.dgsi.pt |