Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
2038/09.3TBGDM.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: PEDRO LIMA COSTA
Descritores: EXPROPRIAÇÃO
JUSTA INDEMNIZAÇÃO
Nº do Documento: RP201410092038/09.3TBGDM.P1
Data do Acordão: 10/09/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: ALTERADA
Indicações Eventuais: 3ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - Se bem que a justa indemnização pela expropriação deva corresponder, em princípio, ao valor real e corrente do bem expropriado no mercado, a equivalência de tais valores não pode ser tida como absoluta, sendo apenas tendencial: com efeito, o livre comércio de prédios está sujeito a numerosas limitações – logo a começar pela mera vontade de vender e de comprar – que implicam adaptações de premissas menores para se proceder à equiparação entre esse comércio e a realidade da expropriação, ou seja é necessário ajustar algumas premissas para se alcançar equiparação válida entre negócios de utilidade particular pautados pela concordância de vontades e a aquisição potestativa para fins de utilidade pública.
II - Esta transição conceptual pode ser complexa e é nela que radica a maior parte das discordâncias que chegam a tribunal, uma vez que a definição da justa indemnização quase invariavelmente pondera elementos conjecturais, decompondo-se em juízos de plausibilidade.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo 2038/09.3TBGDM
Juiz Relator: Pedro Lima da Costa
Primeiro Adjunto: Araújo Barros
Segundo Adjunto: Pedro Martins

Acordam os Juízes do Tribunal da Relação do Porto.
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Nestes autos de expropriação litigiosa por utilidade pública é expropriante o Município … e expropriado B….
Por despacho de 2/6/2008 do Secretário de Estado Adjunto e da Administração Local, publicado sob extracto de declaração número 217-A/2008 no Diário da República, 2ª série, parte C, de 19/6/2008, foi declarada a utilidade pública, com carácter de urgência, da expropriação de uma parcela de terreno – designada parcela 113, ou singelamente por “parcela” – com a área de 4.476,60 metros quadrados (m2), a qual corresponde à integralidade de um prédio rústico que pertence ao expropriado.
Tal parcela destina-se à criação de uma área verde de lazer num trecho de uma margem do C….
Procedeu-se à vistoria ad perpetuam rei memoriam em 16/7/2008, com auto de Julho de 2008.
O expropriante tomou posse administrativa da parcela em 8/9/2008.
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Na arbitragem de 15/1/2009, os Senhores Árbitros decidiram por unanimidade classificar a parcela como “solo apto para construção, aplicando-se os critérios estabelecidos no art. 26 do Código das Expropriações, em concreto o nº 12 do mesmo”, e fixaram a indemnização em 112.592,77€, a qual inclui um valor líquido de 14.600€ relativo a benfeitorias.
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Recebido o processo em tribunal no dia 1/6/2009, por despacho de 3/6/2009 foi adjudicada ao expropriante a propriedade da parcela.
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O expropriante recorreu da decisão arbitral, pugnando pela fixação da indemnização em 66.776€, a qual inclui um valor de 22.100€ relativo a benfeitorias.
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O expropriado recorreu da decisão arbitral, pugnando pela fixação da indemnização em 688.284€, a qual inclui um valor de 35.730€ relativo a benfeitorias.
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O expropriado respondeu ao recurso do expropriante, concluindo pela improcedência desse recurso.
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O expropriante respondeu ao recurso do expropriado, concluindo pela improcedência desse recurso.
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Procedeu-se à avaliação pericial prevista no art. 61 nº 2 do Código das Expropriações (CE), tendo sido apresentadas três avaliações:
-a avaliação subscrita pelos três peritos indicados pelo tribunal classifica a parcela como “solo apto para outros fins” que serviria como terreno de logradouro e lazer de uma possível construção do outro lado da estrada que lhe dá acesso, concluindo por um valor unitário do terreno de 25€/m2, com indemnização de 126.815€, a qual inclui um valor de 14.900€ relativo a benfeitorias;
- a avaliação subscrita pelo perito indicado pelo expropriante, classifica a parcela como “solo apto para outros fins” que serviria como terreno de parqueamento provisório a céu aberto, nomeadamente para expor materiais ou para implantar estruturas de publicidade compatíveis com a proximidade a uma estrada nacional, concluindo por um valor unitário do terreno de 25€/m2 e pela mesma indemnização por que tinham concluídos os três peritos indicados pelo tribunal, ou seja 126.815€, com um valor de 14.900€ relativo a benfeitorias;
- a avaliação subscrita pelo perito indicado pelo expropriado, classifica a parcela como “solo apto para construção” e aplica os critérios de valorização estabelecidos no art. 26 nº 12 do CE, concluindo por um valor unitário do terreno de 239,24€/m2 e pela indemnização de 1.103.231,80€, a qual inclui um valor líquido de 32.250€ relativo a benfeitorias.
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O expropriado apresentou alegações ao abrigo do art. 64 do CE, onde conclui pela indemnização de 1.222.264,58€, ao mesmo tempo que invoca “aqui é feita ampliação do pedido”.
O expropriante apresentou alegações ao abrigo do mesmo art. 64, reiterando que a indemnização deve ser fixada em 66.776€.
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Na sentença julgou-se parcialmente procedente o recurso do expropriado e improcedente o recurso do expropriante, fixando-se a indemnização em 403.766€, a qual será actualizada, desde a data da publicação da declaração de utilidade pública até à data do trânsito em julgado da sentença, de acordo com o índice de preços no consumidor, com exclusão da habitação.
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O expropriante apelou da sentença, para o que formula as seguintes conclusões:
1. No processo de expropriação o encerramento da discussão ocorre com a apresentação pelas partes das alegações.
2. O expropriado apresentou as suas alegações no dia 15 de Janeiro e a expropriante no dia 16 de Janeiro, pelo que nessa data terminou o encerramento da discussão.
3. Assim sendo, o pedido de ampliação é extemporâneo.
4. A recorrente concorda com a classificação da parcela como solo para outros fins, uma vez que um terreno integrado na REN, com as suas inerentes limitações do jus edificandi, não confere ao expropriado qualquer expectativa de edificação que possa ser avaliada para efeitos de indemnização por expropriação, como solo apto para construção.
5. Contudo não pode concordar com a aplicação do disposto do nº 12 do artigo 26.
6. A interpretação dada pela sentença viola o artigo 13 da CRP, pelo que é inconstitucional.
7. O Tribunal Constitucional já se pronunciou na situação de terrenos RAN, referindo que “…. considerar-se como terreno apto para construção, …. um terreno onde o proprietário não pode construir, por força da sua integração na RAN, conduz não só à atribuição de uma indemnização que não corresponde ao seu “justo valor” ... mas também a uma intolerável desigualdade em relação a todos os restantes proprietários de terrenos integrados naquela Reserva que não tenham sido contemplados com a expropriação.
8. Por sua vez, o Acórdão do STJ de 10 de Maio de 2012 refere que não é possível aplicar analogicamente o disposto no nº 12 do art. 26 do Código das Expropriações, aos casos de expropriação de terrenos integrados na RAN (Reserva Agrícola Nacional).
9. Referindo “a analogia pressupõe que existe a mesma razão de decidir e que existe lacuna na regulamentação de uma determinada realidade. Como vimos em 2, a aplicação directa do nº 12 do art. 26 visa prevenir uma manipulação de mercado, possível através do sistema da “dupla expropriação””.
10. “No caso da RAN não existe esse problema. Trata-se de um ordenamento substancial do território que nada tem a ver com as futuras expropriações, que possam ocorrer nos terrenos integrados nessa Reserva. Nesta última hipótese, o valor da indemnização é calculado sobre um valor de mercado, com o qual nada tem a entidade expropriante”.
11. “Por outro lado, não se pode comparar o carácter de mera ordenação administrativa de um plano municipal, que justifica a especial protecção do expropriado, com uma intervenção substancial no ordenamento do território como a integração na Reserva Agrícola Nacional”.
12. No mesmo sentido refere o acórdão do Tribunal da Relação de 22 de Janeiro de 2013 “a proibição de construir que incide sobre os solos integrados na RAN/REN é consequência da vinculação situacional da propriedade, sendo uma manifestação da hipoteca social que onera a propriedade privada - consubstanciada na imposição, por via legal, aos particulares de restrições, decorrentes da natureza intrínseca dos terrenos, e que se mostram necessárias e funcionalmente adequadas para acautelar uma reserva de terrenos agrícolas que propiciem o desenvolvimento da actividade agrícola, o equilíbrio ecológico e outros e fundamentais interesses públicos”.
13. Acrescentado que “e, por outro, que “a inclusão de certos terrenos no âmbito das zonas verdes e equiparadas (zonas de lazer ou destinadas a diferentes infra-estruturas urbanísticas) tem uma base meramente regulamentar – radicando no plano municipal de ordenamento do território – e depende decisivamente, não das características intrínsecas dos terrenos em causa, da sua natureza e vocação económica, mas antes de juízos de oportunidade, amplamente discricionários, das entidades administrativas responsáveis pela urbanização e ordenamento do território; e é precisamente essa ampla discricionariedade da Administração na ordenação subjacente aos planos municipais de ordenamento do território – e os riscos acrescidos de manipulação das regras urbanísticas por quem os elabora – que está na base do especial regime que consta do referido nº 12 do art. 26, conferindo tutela aos particulares que sendo já proprietários dos terrenos ulteriormente expropriados à data da edição daquele plano, acabam por ver determinados terrenos, em resultado do exercício de uma ampla discricionariedade administrativa, incluídos no âmbito reservado pelo plano a zonas verdes, com isso podendo resultar substancialmente afectada a consistência do seu direito à justa indemnização devida pela expropriação”.
14. Por tudo o exposto, a finalidade para aplicação do nº 12 do art. 26 não está preenchida, pelo que a avaliação deve ser efectuada com base no artigo 27 do CE.
15. Nos terrenos incluído na REN apenas podem ser autorizados acções insusceptíveis de prejudicar o uso ecológico dessa área, não devendo ser consideradas eventuais usos não compatíveis com aquele regime.
16. A sentença não identifica nenhum das excepções referidas no anexo do DL 180/2006, pelo que o regime “regra” não pode ser afastado.
17. Se juridicamente não é possível concretizar o referido nos relatórios dos peritos, o tribunal a quo não pode aderir aos seus fundamentos.
Sem prescindir do exposto.
18. A sentença recorrida, relativamente ao terreno que, antes da inserção REN, não possuía capacidade construtiva, decidiu aplicar o critério adoptado pelos peritos do tribunal e do expropriante, contudo não só esses relatórios constituem violação do DL 93/90, conforme supra exposto, como foram emitidos com base noutras premissas.
19. A avaliação do perito da expropriante não pode ser aplicada à situação descrita na sentença.
20. A avaliação partiu do pressuposto de ser possível, na área total expropriada, promover um parqueamento provisório a céu aberto, colocar publicidade, que se tornou impossível face à construção na restante parcela.
21. Não faz qualquer sentido compensar o expropriado pela perda das árvores, uma vez que já foi contabilizada na determinação do correspondente valor na avaliação.
22. Por fim o risco deve ser de 15% e não de 5%, conforme consta dos esclarecimentos prestado, os peritos do tribunal aplicaram uma taxa de rico de 5% no caso de se trata de uma construção de moradia, no caso de se tratar de um bloco de habitações o risco seria máximo e na época actual o valor de 15% de risco era insuficiente.
23. Face ao exposto, andou mal a sentença recorrida, tendo violado o disposto nos arts. 23, 25, 26 nº 1, nº 10 e nº 12, 27 e 64 do CE, conjugado com o art. 273 do CPC, bem como violou o art. 13 da CRP, na interpretação/aplicação que fez do nº 12 do art. 26 do CE.
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O expropriado apelou da sentença, a fim de a mesma ser revogada e a indemnização ser fixada em 917.005,54€, para o que formula as seguintes conclusões:
1ª- Estão os factos apurados pela douta sentença (veja-se desenvolvimento desta conclusão e elenco no ponto 3. destas alegações).
2ª- O objecto do recurso é o seguinte:
2A- A- O erro, e/ou falta de fundamentação, e/ou insuficiência da decisão da matéria de facto provada, nomeadamente no que se refere aos seguintes factos dados como provados ou omitidos na decisão da matéria de facto provada:
2B- 5) De acordo com o Plano de Urbanização de … e …, publicado no Diário da República nº 141, 1 Série-E, de 20-06-2001, em vigor à data da DUP, o terreno da parcela encontrava-se classificado na Planta de Condicionantes como zona de Reserva Ecológica Nacional e na Planta de Ordenamento como Área Verde de Protecção;
2C- 26) A cércea dominante neste local, verificado na proximidade da parcela de terreno, classificadas como solo urbano ou urbanizável pelo Plano de Urbanização é de moradias unifamiliares de cave rés-do-chão e andar, existindo ainda alguns blocos de edificação multifamiliar no raio de 300 metros (D…), de acordo com o Plano de Urbanização de …/… actualmente em vigor, a cércea prevista para esta zona em novas edificações é de 2 pisos;
2D- 25) Dentro do limite de 300 metros de distância das extremas da parcela encontram-se várias urbanizações unifamiliares mas também colectiva, que foram construídas em conformidade com PDM o qual definia índices máximos de construção de 0,70 m2 ou então construídas ainda antes da entrada em vigor do PDM, regendo-se pelo disposto no RGEU.
2E- 28) O valor de mercado de venda de construção por metro quadrado no local é de €950,00 por metro quadrado;
2F- B- A classificação do solo;
2G- C- A aplicação do critério do art. 26º-12 do CExp. a apenas parte da área da parcela;
2H- D- Factor correctivo pela inexistência de risco – art. 26º-10 CExp.;
2I- E- O montante indemnizatório.
3ª- Ocorre erro, e/ou falta de fundamentação, e/ou insuficiência da decisão da matéria de facto provada (veja-se desenvolvimento desta conclusão nos pontos 5. a 12. destas alegações):
3A- Porque a inclusão da parcela em REN só se veio a verificar, em data muito posterior à DUP e à entrada em vigor daquele Plano de Urbanização, pela entrada em vigor da “correcção material das folhas A, B, e C da carta de Reserva Ecológica Nacional do município …” levada a cabo pelo Aviso n.º 12062/2011, de 24.05.2011, e que procede à sua republicação no DR., 2ª série, nº 107, de 02.06.2011 (cf. DR., 2ª série, nº 107, de 02.06.2011, Aviso nº 12062/2011, de 24.05.2011);
3B- E porque no cálculo da justa indemnização devem tomar-se em conta as normas em vigor à data da publicação do acto de DUP (art. 122 da CRP e arts. 12 e 13 do C. Civil).
3C- Decidindo em contrário, incorreu o Tribunal a quo em erro de julgamento e erro de aplicação da lei, a impor a alteração da decisão da matéria de facto, no que aquele facto se refere, excluindo dos factos provados constantes do ponto 5) que à data da DUP a parcela se encontrasse integrada em REN... pois não estava.
3D- E, nestes termos, deve o ponto 5) dos factos dados como provados passar a ter a seguinte formulação: “5) De acordo com o Plano de Urbanização de … e …, publicado no Diário da República nº 141, 1 Série-E, de 20-06-2001, em vigor à data da DUP, o terreno da parcela encontrava-se classificado na Planta de Ordenamento como Área Verde de Protecção”.
4ª- Com aquele erro, e/ou falta de fundamentação, e/ou insuficiência da decisão da matéria de facto provada a decisão recorrida violou o disposto no art. 122 da CRP e arts. 12 e 13 do C. Civil; 23 nº 1, 25 e 26 nº 12 do C.Exp.; bem como no art. 13 e 62 nº 2 da CRP; arts. 2 e 23 nº 1 e 5 do C.Exp.; arts. 485 e 607 nº 5 do CPC e 61 nº 1 do CExp..
5ª- Verifica-se, portanto, erro de julgamento e erro de aplicação da lei (veja-se desenvolvimento desta conclusão nos pontos 5. a 11. destas alegações).
6ª- Verifica-se também omissão quanto à decisão da matéria de facto dada como provada (veja-se desenvolvimento desta conclusão nos pontos 13. a 23. destas alegações):
6A- Porque foram dados por provados os factos 25) e 26) e ainda o Tribunal a quo entendeu ainda resultar provado nos autos que, no limite de 300 m das estremas da parcela, se encontram edificados blocos de edificação multifamiliar, ou colectiva, construídas ainda antes da entrada em vigor do PDM, regendo-se pelo disposto no RGEU.
6B- Não obstante, o Tribunal a quo não fez incluir na matéria de facto dada como provada qual o índice de construção concreto daquelas edificações multifamiliares ou colectivas, nada dizendo quanto às respectivas cérceas, o que tem manifesto interesse para a decisão da causa.
6C- Assim, é evidente a necessidade de saber concretamente, e fazer constar da matéria provada, qual o índice de construção e cércea dessas edificações que se encontram naquele circunstância espacial face à parcela expropriada, e não apenas o índice de construção das moradias unifamiliares que se encontram também naquela área.
6D- Dos autos constam também já elementos que permitem dar resposta a tal questão, ou, melhor dito, que impõem que seja dada resposta àquela questão factual num determinado sentido.
6E- Assim sendo, como é, impõe-se o aditamento da matéria de facto constante do ponto 25) e 26) daquela decisão, aí acrescentando-se que as edificações que se encontram num raio de 300m da estrema da parcela existem algumas que têm índice de construção de 0,75 m2, que a média deste se encontra ligeiramente acima do 0,70 m2, e que essas edificações têm cérceas de 3 a 5 pisos (documentação desenvolvida nas alegações).
6F- Sugere-se, por isso, que tal matéria factual seja integrada num novo ponto a inserir na decisão da matéria de facto provada com a seguinte redacção: «26)a) as edificações que se encontram num raio de 300m da estrema da parcela, referidas em 25) e 26) supra, existem algumas que têm índice de construção de 0,75 m2, sendo que a média destes se encontra ligeiramente acima do 0,70 m2, e que essas edificações têm cérceas de 3 a 5 pisos».
7ª- Verifica-se vício de fundamentação quanto à decisão da matéria de facto provada, com a consequente nulidade da sentença (veja-se desenvolvimento desta conclusão nos pontos 24. a 70. destas alegações):
7A- O Tribunal a quo deu ainda como provado no ponto 28) que o valor de mercado de venda de construção por metro quadrado no local é de €950,00, com os fundamentos que constam da decisão de facto.
7B- Essa fundamentação (ou falta dela) é o do Laudo dos Srs. Peritos do Tribunal, com desprezo pelo Laudo do Sr. Perito designado pelo Exp.te.
7C- Parece evidente que o critério valorativo dos Srs. Peritos do Tribunal nomeados nos presentes autos não pode ser seguido, pois que jamais daria origem à obtenção da justa indemnização, escopo final, e constitucional (CRP, art. 62 nº 2) e da lei comum, sendo certo que a determinação do valor indemnizatório a fixar ao Recorrente, caso tivesse na base aquele valor de construção referido pelos Srs. Peritos nomeados pelo Tribunal nos presente autos, sempre levaria a um resultado claramente violador do princípio de igualdade, legal e constitucionalmente consagrado (arts. 13 e 62-2 CRP e art.s 2 e 23-1 e 5 CExp.), pela indevida interpretação da dita norma do art. 26-4 CExp..
7D- Acresce que, fundamentando o Tribunal a quo a decisão da matéria de facto provada, no que especificamente se refere ao ponto 28), no que consta do relatório pericial e esclarecimentos prestados pelos Srs. Peritos nomeados pelo Tribunal, resulta claro que a fundamentação para aquela decisão é inexistente ou, pelo menos, insuficiente (veja-se desenvolvimento nas alegações).
7E- E são também os Srs. Peritos nomeados pelo Tribunal que não deram qualquer fundamento válido para a consideração de uma percentagem de 25% para encargos e lucro do empreendedor, mesmo quando notificados para o esclarecer.
7F- Daquelas afirmações resulta claro que o valor indicados pelos Srs. Peritos nomeados pelo Tribunal não teve em consideração concretamente a área em que a parcela se insere, como teve em consideração as concretas características da parcela e sua configuração espacial, nomeadamente factos constantes dos pontos 2), 3) e 20) da decisão factual, designadamente, não foi tida em consideração na indicação daquele valor de custo de construção pelos Srs. Peritos nomeados pelo Tribunal a concreta circunstância em que aquela parcela se encontra por exemplo relativamente ao C…, ou o facto de ser contígua a este, até porque esses aspectos são exactamente os elementos essenciais para determinar a procura e oferta disponível de parcelas naquelas condições.
7G- Verifica-se pois que é manifestamente insuficiente a fundamentação da decisão de dar como provado o ponto 28) da matéria de facto quanto ao valor do metro quadrado de construção para a parcela.
7H- Mais: dos elementos constantes dos autos, o único valor de metro quadrado de construção para a parcela que se mostra sustentado é o valor indicado pelo Sr. Perito nomeado pelo Recorrente.
7I- Por tudo quanto vem de se expor, impõem a alteração da matéria de facto dada como provada, à luz dos elementos que constam dos autos, em especial de fls. 766, no confronto com os esclarecimentos prestados pelos Srs. Peritos nomeados pelo Tribunal em 05.12.2011 e em 16.05.2012, em ambos os casos a fls. 2 desses esclarecimentos, e doc. 2 junto com as alegações apresentadas pelo requerente ao abrigo do art. 64. do CExp, até sob pena de nulidade ou anulabilidade da decisão por vício de fundamentação, bem como por violação do princípio de igualdade e do princípio da justa indemnização, legal e constitucionalmente consagrado.
7J- Deve, por isso, a redacção do ponto 28) dos factos provados, com a procedência do presente recurso, passar a ser a seguinte: «28) O valor de mercado de venda de construção por metro quadrado no local é de €1.550,00 por metro quadrado».
7K- Não pode entender-se como fundamentação válida para que o Tribunal a quo siga, sem mais, o critério apontado pelos Srs. Peritos nomeado pelo Tribunal, a invocação de que entre estes existiu sempre unanimidade, serem em maior número, e que estes não representariam o interesse de qualquer das partes, daí retirando que ofereceriam maiores garantias de imparcialidade e isenção, como fez o Tribunal a quo na sentença recorrida, nenhuma razão havendo, de natureza legal, que legitime apreciação diversa dos laudos periciais no que se refere à isenção e imparcialidade dos seus autores.
7L- O Tribunal não está vinculado aos laudos periciais, mas apenas à lei, por forma a garantir-se que seja assegurada ao expropriado uma indemnização justa (art. 62 da CRP).
7M- E o laudo pericial proferido no presente processo pelos Srs. Peritos do Tribunal não se fundamentou em critérios legais e adequados, em especial e concretamente no que se refere ao facto que veio a ser vertido no ponto 28) dos factos provados (valor do metro quadrado de construção), limitando-se os Srs. Peritos nomeados pelo Tribunal a proferir juízos conclusivos e genéricos (como, aliás, fizeram em tantas outras questões que abordaram naquele relatório e esclarecimentos), pelo que nunca poderia ser adoptado tal critério in casu, sob pena de ilegalidade e erros de julgamento.
7N- O princípio da liberdade na apreciação da prova pericial, expressamente consagrado no art. 607 nº 5 do CPCiv. (anterior 655), determina que a apreciação e valoração das provas é feita livremente pelo Tribunal, sem submissão a quaisquer regras a não ser as regras de experiência e da livre convicção (sem prejuízo das regras de prova de factos dependentes de meio de prova vinculado), não podendo ser marginalizadas ou postergadas as posições oportunamente assumidas pelas partes (cf. art. 485 do CPCiv., anterior 587), nomeadamente nas “conclusões constantes do requerimento de interposição de recurso e das alegações apresentadas”, como faz a sentença recorrida (cf. art. 61-2 do CExp.) (vejam-se citações de doutrina e jurisprudência).
7O- Assim sendo como é, ao fundamentar a opção de seguir apenas o que consta do relatório pericial elaborados pelos Srs. Peritos nomeados pelo Tribunal, excepto quanto à classificação do solo que estes consideraram para a parcela e desconsiderando, além do mais, os contributos dos restantes Srs. Peritos e das partes, incorreu o Tribunal a quo em vício de fundamentação, a inquinar a decisão quanto à matéria de facto, em especial no que se refere ao ponto 28).
7P- E mais incorreu igualmente, e salvo o devido respeito, em vício de apreciação da prova, nomeadamente na apreciação dos relatórios periciais e respectivos esclarecimentos, prestados pelos Srs. Peritos nomeados pelo Tribunal, nomeado pelo requerente e nomeado pelo requerido.
7Q- Assim sendo, como é, fundamentando o Tribunal a quo a decisão da matéria de facto, em especial o ponto 28) desta, apenas naquele relatório pericial, e com os fundamentos que o faz, incorreu em erro de julgamento, a implicar a sua alteração nos termos já supra expostos.
8ª- Verifica-se, bem assim, vício de apreciação da prova e consequente erro de julgamento (veja-se desenvolvimento desta conclusão nos pontos 24. a 52., 55. a 59., 62. e 69. destas alegações, já constantes do resumo na conclusão anterior).
9ª- Deve a decisão da matéria de facto provada ser alterada por outra que não enferme dos vícios apontados, bem como ser aditada nos termos expostos, dando-se como provado, designadamente, o que se deixou dito nas conclusões precedentes.
10ª- Deve o ponto 5) dos factos provados ser alterado nos termos que se deixaram expostos nas conclusões 3ª a 5ª e 9ª supra, dando-se como provado:
10ª- «5) De acordo com o Plano de Urbanização de … e …, publicado no Diário da República nº 141, 1 Série-E, de 20-06-2001, em vigor à data da DUP, o terreno da parcela encontrava-se classificado na Planta de Ordenamento como Área Verde de Protecção».
11ª- A alteração ao ponto 5) dos factos dados por provados impõe-se da análise à «correcção material das folhas A, B, e C da carta de Reserva Ecológica Nacional do município …» levada a cabo pelo Aviso nº 12062/2011, de 24.05.2011, e que procede à sua republicação do plano de Urbanização de …, no DR., 2ª série, nº 107, de 02.06.2011 (cf. DR., 2ª série, nº 107, de 02.06.2011, Aviso nº 12062/2011, de 24.05.2011);
12ª- Deve ser aditada à matéria de facto dada como provada, na sequência do que consta dos seus pontos 25) e 26), como se deixou atrás concluído e aqui se repete, dando-se como provado:
12ª- «26)a) as edificações que se encontram num raio de 300m da estrema da parcela, referidas em 25) e 26) supra, existem algumas que têm índice de construção de 0,75 m2, sendo que a média destes se encontra ligeiramente acima do 0,70 m2, e que essas edificações têm cérceas de 3 a 5 pisos».
13ª- O aditamento à decisão da matéria de facto vinda de referir impõe-se da análise às respostas ao quesito 34 formulado pelo Exp.do; esclarecimentos prestados às respostas dadas; fls. 787, 788, 798, 799, 800; fls. 1 dos esclarecimentos prestados pelo Sr. Perito do Exp.do em 08.04.2011; fls. 7 e 8 dos esclarecimentos prestados pelos Srs. Peritos do Tribunal e da Exp.te em 08.04.2011; fls. 4 dos esclarecimentos prestados pelos Srs. Peritos do Tribunal e da Exp.te em 21.06.2011; e fls. 1 dos esclarecimentos prestados pelo Sr. Perito do Exp.do em 08.04.2011;
14ª- Deve o ponto 28) da decisão quanto aos factos provados ser alterada, nos termos destas conclusões 7ª e 8ª e 9ª supra, dando-se como provado:
14A- «28) O valor de mercado de venda de construção por metro quadrado no local é de €1.550,00 por metro quadrado».
15ª- A alteração à decisão dos factos provados vinda de referir impõe-se pela análise dos elementos probatórios constantes de fls. 766, no confronto com os esclarecimentos prestados pelos Srs. Peritos nomeados pelo Tribunal em 05.12.2011 e em 16.05.2012, em ambos os casos a fls. 2 desses esclarecimentos, doc. 2 junto com as alegações apresentadas pelo requerente ao abrigo do art. 64 do C. Exp, e pontos 2), 3) e 20 dos factos dados como provados.
16ª- Ocorreu errada qualificação do solo, o que corresponde a erro na qualificação dos factos e de aplicação da lei (veja-se desenvolvimento desta conclusão nos pontos 73. a 79. e já 5. a 12. destas alegações):
16A- O Tribunal a quo, com base na decisão factual supra citada, entendeu que a parcela deve ser classificada como “solo apto para outros fins”, o que fez com o exclusivo fundamento de que a parcela se encontraria, à data da DUP, integrada em REN.
16B- Mas a integração da parcela em REN apenas ocorreu em momento posterior à DUP.
16C- Assim sendo, como é, e devendo ser aplicada a legislação em vigor à data da DUP para a determinação do valor indemnizatório devida ao expropriado.
16D- Inexistindo nessa data qualquer instrumento legislativo que integrasse a parcela em REN, a parcela deve ser classificada como “solo apto para construção”, com todas as consequência que daí advêm.
16E- Deve a sentença recorrida ser revogada, e substituída por outra que classifique a parcela nos referidos termos.
17ª- Assim a decisão recorrida violou, salvo o devido respeito, o disposto no art. 122 da CRP, art. 12 e 13 do C. Civil e art. 1, 2, 23 nº 1 e 25 do C. Exp. e 62 nº 2 da CRP,
18ª- além de corresponder a interpretação inconstitucional do disposto no art. 2, 23 e 25 do CExp., por violação do disposto nos arts. 122 e 62 da CRP.
Sem prescindir:
19ª- Ocorreu erro na aplicação do critério estabelecido no art. 26 nº 12 do C.Exp., pela sua aplicação a apenas parte da área da parcela (veja-se desenvolvimento desta conclusão nos pontos 80. a 85. e 90. a 101. destas alegações), o que corresponde a erro na qualificação dos factos e erro na aplicação da lei:
19A- Ainda que se entendesse que a parcela devesse ser classificada como “solo apto para outros fins” – o que não se concede –, sempre a indemnização a fixar ao Recorrente deverá seguir os critérios previstos no art. 26 nº 12 do CExp., como, aliás, bem viu o Tribunal a quo (vejam-se também as transcrições da douta sentença ali feitas).
19B- Verifica-se contradição entre os fundamentos invocados e a decisão proferida, como ali também se transcreveu: o Tribunal a quo invoca para fundamentar a posição assumida acórdão proferido por este douto Tribunal da Relação do Porto, de 14.03.2013, cujo teor atrás se transcreveu, para afinal concluir que, quanto à parcela expropriada, em que se verificam, relativamente a toda a parcela, todos os requisitos previstos no art. 25 nº 2 do CExp. apenas parte desta deveria ser avaliada com base naquele critério definido no art. 26 nº 12 do CExp., o que é uma contraditio in terminis.
19C- Esta contradição entre os fundamentos e a decisão constitui fundamento de nulidade da sentença proferida, nos termos previstos no art. 615-1-c) do CPCiv. [anterior 668-1-c)] – o que se argui para todos os efeitos legais.
19D- Ainda que assim não se entendesse, a decisão proferida, determinando a aplicação do critério previsto no art. 26 nº 12 do CExp. apenas a parte da área da parcela expropriada sempre constituiria violação da lei, nomeadamente aquele art. 26 nº 12 e 25 nº 2 do CExp., além de resultar de uma interpretação daquelas normas em clara violação do princípio da justa indemnização, legal e constitucionalmente consagrado (art. 62 nº 2 da CRP e art. 1 do CExp.), sendo certo que não é isso que resulta do disposto da referida norma do 26 nº 12 do CExp., nem é isso que resulta da jurisprudência deste douto Tribunal da Relação do Porto vertida no acórdão citado na sentença recorrida.
19E- Não se diga que é via impedida de atribuição de capacidade edificativa à área da parcela que à data da DUP se encontrava inserida em Área Florestal de Protecção na Planta de Ordenamento do PDM, com base nessa integração, desde logo porque tal condição, não impede, nos termos legais, que seja atribuída possibilidade construtiva naquela área.
19F- A limitação edificativa, mesmo nas zonas integradas em REN e RAN, é apenas a regra, pois que mesmo nesses regimes efectivamente restritivos das possibilidades edificativas, a construção é, ainda assim, possível nas circunstâncias especialmente previstas na lei.
19G- Tal limitação edificativa não se verifica nas áreas tidas como área florestal de protecção, em que a construção é possível, sendo certo que, quando esteja em causa a aplicação do art. 26-12 do CExp., haverá que aferir exclusivamente se, à data da DUP se verificam os pressupostos previstos no art. 25-2 do CExp. na parcela expropriada e não outros.
19H- Estabelecer aquele pressuposto limitativo na base do cálculo indemnizatório sempre constituiria limitação que o legislador pretendeu excluir precisamente quando previu o critério definido no art. 26-12 do CExp..
20ª- E com o que o Tribunal a quo violou o disposto nos arts. 26 nº 12, 25 nº 2 e arts. 1, 2 e 23 do C. Exp., bem como arts. 13 e 62 nº 2 da CRP, além de corresponder a interpretação inconstitucional do art. 26 nº 12 e 25 nº 2 do CExp., por violação do disposto no art. 13, 62 e 122 da CRP.
21ª- E além de se verificar vício de fundamentação, por contradição entre os fundamentos e decisão, a implicar a nulidade da sentença nos termos previstos no art. 615 nº 1 c) do CPC., como se demonstrou nos pontos 80. a 89. destas alegações, para onde se remete e aqui se dá por transcrito.
Sempre sem prescindir:
22ª- Ocorreu erro na aplicação do factor correctivo previsto no art. 26 nº 10 do C. Exp. (veja-se desenvolvimento desta conclusão nos pontos 102. a 114. destas alegações), o que corresponde a erro na aplicação dos factos e erro de aplicação da lei;
23ª- Com o que o que o Tribunal a quo violou o disposto no art. 26 nº 10 do C. Exp. e arts. 1, 2 e 23 do C. Exp. e 13 e 62 nº 2 da CRP,
24ª- e de corresponder a interpretação inconstitucional do art. 26 nº 10 do C. Exp., por violação dos disposto no art. 13 e 62 da CRP:
24A- Não há nenhum empreendedor imobiliário, prudente e avisado, que não proceda ao respectivo estudo económico antes de decidir comprar um terreno e proceder à sua negociação.
24B- Esse estudo económico é feito com base na fórmula: V = (T+Et) + (C+Ec) + (Evc+Lc), sendo as siglas atrás explicadas.
24C- Os “Encargos Conexos com a Construção” daquela fórmula são as despesas de montagem do estaleiro, as despesas de administração da obra, os sempre prováveis trabalhos a mais e imprevistos, a previsão de uma margem de risco etc. e só depois deste aprofundado estudo é que o promotor avança para a negociação do terreno, o proprietário, quando vende, já está desprovido de qualquer margem da inexistência do risco e do esforço inerente à actividade construtiva, ou seja, o promotor já o considerou no seu cuidadoso estudo a que tem de proceder antes da decisão de negociar, facto notório.
24D- Não havendo qualquer facto nos autos referente a especial circunstância que determine risco ou esforço de construção especialmente a considerar no caso concreto, a aplicação cega e automática do nº 10 do art. 26 é uma disposição abusiva e inconstitucional por violar o princípio da igualdade na sua vertente externa (comparando em situações idênticas a posição do expropriado com a de um não expropriado).
24E- São os próprios Srs. Peritos nomeados pelo Tribunal, nos esclarecimentos que prestam, e parca fundamentação que dão ao factor de risco que entenderam aplicar, que reconhecem que no caso concreto o risco é diminuto, ou mesmo inexistente, tendo em consideração a localização, tipo de construção e o facto de, por regra, já ter destinatário definido.
25ª- Também por isso ocorreu vício de fundamentação, por contradição entre os fundamentos e decisão (veja-se desenvolvimento desta conclusão nos mesmos pontos 102. a 114. e ainda nos 115. a 118. destas alegações), a implicar a anulação da decisão nos termos previstos no art. 615-1-c) do CPC., a acrescer:
25A- Também o próprio Tribunal a quo afirma, no que se refere ao factor correctivo a que alude o art. 26 nº 10 do CExp.: «no caso fixa-se em 9,5% perante a ausência de risco de esforço na construção, como mencionam os peritos indicados pelo Tribunal» – isto é, com base na consideração de que inexiste risco na construção, o Tribunal entendeu considerar um factor de risco que corresponde a praticamente dois terços do máximo legalmente admissível, o que vai no sentido diametralmente oposto ao que o mesmo Tribunal a quo afirmou quanto à inexistência de risco.
25B- Assim sendo, como é, com a procedência do presente recurso o factor de risco previsto no art. 26 nº 1 do CExp. aplicável ao caso concreto deverá ser de 0%, ou, pelo menos, não superior a 1%, face à inexistência de risco na construção como reconhecidamente ocorre in casu.
26ª- Ocorreu erro na determinação do valor indemnizatório a que o requerente tem direito (veja-se desenvolvimento desta conclusão nos pontos 119. a 123. destas alegações),
27ª- com o que a decisão recorrida viola o disposto nos arts. 122 da CRP, 12 e 13 do C. Civil, 13 e 62 da CRP, 25 e 26 do C. Exp., 17 e 18 da CRP,
28ª- além de corresponder a interpretação inconstitucional do art. 26 nº 12 do C. Exp., por violação dos arts. 13, 17, 18 nº 2 e 62 da CRP:
28A- No cálculo da justa indemnização devem tomar-se em conta as normas em vigor à data da publicação do acto de DUP, pelo que in casu deverão aplicar-se as disposições legais constantes do Código das Expropriações, bem como dos instrumentos de organização territorial, que vigoravam naquela data.
28B- O montante indemnizatório fixado na sentença recorrida, viola frontalmente os princípios da igualdade e da justa indemnização, constitucionalmente consagrados (arts. 13 e 62 da CRP), bem como o disposto nos arts. 25 e 26 do CExp., bem como constitui o menos cabo das regras de restrição dos direitos, liberdades e garantias face aos arts. 17 e 18-2 da CRP, além de representar uma interpretação inconstitucional do nº 12 do art. 26 CExp., violadora daqueles mesmos princípios – como tudo largamente se demonstrou e foi objecto das presentes conclusões.
28C- Deve, na procedência do presente recurso, com a consequente declaração de nulidade ou revogação da decisão recorrida, nos termos pretendidos e supra exposto, ser prolatada nova decisão que não padeça daqueles vícios.
28D- Essa decisão deverá fixar indemnização justa considerando, além do mais, o seguinte:
a) Que o solo deve ser classificado como solo apto para construção, desconsiderando-se que veio, posteriormente à DUP, a ser integrado em REN;
b) Que, ainda que assim não fosse, sempre seria de aplicar o critério definido no art. 26 nº 12 do CExp.;
c) Que, quer por um, quer por outro critério, o valor indemnizatório a fixar deverá ser idêntico para toda a área da parcela;
d) Que o valor do metro quadrado de construção para a área da parcela não poderá ser inferior a €1.550,00/m2;
e) Que o factor de risco previsto no art. 26 nº 10, a considerar no caso concreto, deverá ser igual a zero, face à inexistência de risco.
28E- Com base nos referidos pressupostos, o valor indemnizatório a fixar não poderá ser inferior a €917.005,535, decomposto nos seguintes termos:
*€1.550,00 x 0,185 x 0,7 = €200,725
*€200,725 x 4.476,60m2 = €898.565,535 (indemnização referente à parcela)
*€898.565,535 + €18.440,00 (referente ao global das benfeitorias)
*= €917.005,535
29ª- Deve assim ser declarada nula ou revogada a decisão recorrida, substituindo-se esta por outra que não enferme dos vícios apontados, com as consequências indemnizatórias constantes da anterior conclusão.
30ª- O valor de indemnização a fixar ao requerente não pode ser inferior a €917.005,535, assim decomposto:
*€1.550,00 x 0,185 x 0,7 = €200,725
*€200,725 x 4.476,60 m2 = €898.565,535 (indemnização referente à parcela)
*€898.565,535 + €18.440,00 (referente ao global das benfeitorias)
*= €917.005,535.
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Nas únicas contra-alegações admitidas, o expropriante defende que o recurso do expropriado “deve ser rejeitado”.
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Foram colhidos os vistos legais.
As questões a decidir prendem-se com a ampliação do pedido feita pelo expropriado nas alegações deduzidas ao abrigo do art. 64 do CE, com a fixação da matéria de facto provada, com a aplicabilidade da norma do art. 26 nº 12 do CE, com a classificação do terreno como solo apto para construção ou solo para outros fins e com o valor da indemnização.
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Na sentença consideraram-se provados os seguintes factos:
1) Por despacho de 2/6/2008 do Secretário de Estado Adjunto e da Administração Local, inserto na Declaração (extracto) 217-A/2008 da Direcção Geral das Autarquias Locais, publicado no Diário da República 117, II Série, de 19/6/2008, foi declarada a utilidade pública da parcela 113, área de terreno com 4.476,60m2, sita no …, freguesia …, concelho de Gondomar, correspondente ao prédio rústico descrito na Conservatória de Registo Predial de Gondomar sob o número 1836/200499 e inscrito na matriz predial sob o artigo 262.
2) A parcela de terreno confronta a Norte com Estrada Nacional …, a Nascente com caminho, a Sul com C… e a Poente com E….
3) A parcela corresponde a uma faixa, de largura variável, entre a estrada nacional e o leito do C…. Trata-se de um terreno com forte inclinação no sentido Norte/Sul, ocupado por espécies arbóreas, vedado na estrada nacional. O muro Norte apresenta altura de 0,75m e desenvolvimento de 128m e o muro Nascente apresenta altura de 0,50m e desenvolvimento de 52m, com a espessura constante para as duas partes de cerca de 28cm, estando realizado em perpeanho de granito. Tem incorporado, sensivelmente a meio da primeira parte, um portão em ferro de 2 folhas, com 1,5m por 2,4m cada uma, ladeado por 2 tranqueiros em pedra trabalhada, rematados por acrotério em bola. Apresenta um muro de vedação e suporte a Sul, construído em alvenaria seca de granito, com altura média de 2m e desenvolvimento de 100m, em mau estado de conservação.
4) À data da vistoria ad perpetuam rei memoriam, na parcela encontravam-se plantadas 4 austrálias com diâmetro à altura do peito de 50cm, 27 austrálias com diâmetro à altura do peito de 40cm, 14 austrálias com diâmetro à altura do peito de 30cm, 6 austrálias com diâmetro à altura do peito de 20cm, 2 eucaliptos com diâmetro à altura do peito de 80cm, 6 eucaliptos com diâmetro à altura do peito de 60cm, 6 eucaliptos com diâmetro à altura do peito de 50cm, 5 eucaliptos com diâmetro à altura do peito de 20cm, 3 eucaliptos com diâmetro à altura do peito de 10cm, 2 plátanos com diâmetro à altura do peito de 50cm, 3 plátanos com diâmetro à altura do peito de 40cm, 5 plátanos com diâmetro à altura do peito de 30cm, 1 sobreiro com diâmetro à altura do peito de 50cm, 1 sobreiro com diâmetro à altura do peito de 40cm, 3 sobreiros com diâmetro à altura do peito de 30cm, 1 carvalho com diâmetro à altura do peito de 40cm, 1 freixo com diâmetro à altura do peito de 40cm e 1 freixo com diâmetro à altura do peito de 30cm.
5) De acordo com o Plano de Urbanização de … e …, publicado em Diário da República de 20/6/2001, em vigor à data da declaração de utilidade pública, o terreno da parcela encontra-se classificado na planta de condicionantes como zona de Reserva Ecológica Nacional e na planta de ordenamento como Área Verde de Protecção.
6) A parcela confronta com via pavimentada em betuminoso e dotada de infra-estruturas, electricidade, telefone, saneamento e águas pluviais.
7) A parcela dista 12m da Rua …, perpendicular ao arruamento confrontante com a parcela, a qual é servida de rede de gás.
8) A parcela dista menos de 2.000m do centro de saúde e de duas farmácias.
9) A parcela dista menos de 1.000m de rede de transportes públicos para a cidade do Porto e de Gondomar.
10) A parcela dista menos de 3.000m de acesso a auto-estrada, com direcção a Norte e Sul.
11) A parcela dista menos de 2.000m de uma escola primária com centro de actividades de tempos livres.
12) A parcela dista menos de 1.000m da F….
13) A parcela dista menos de 3.000m do G….
14) A parcela dista menos de 2.000m das piscinas municipais.
15) A parcela dista menos de 1.000m de estabelecimentos de comércio e serviços, nomeadamente de restauração e abastecimento de combustíveis.
16) A parcela dista menos de 1.000m da igreja paroquial, do cemitério e da Casa Paroquial.
17) A parcela dista menos de 2.000m do quartel dos bombeiros voluntários, do lar de idosos, do centro de dia, da esquadra da PSP, da Junta de Freguesia … e do cais de atracagem para barcos do C….
18) A parcela dista menos de 300 metros das instalações da H…, a qual dispõe de estabelecimentos comerciais de bar e restaurante.
19) A parcela possui boa exposição e situa-se à face da Estrada Nacional …, com trânsito e poluição inerentes à circulação rodoviária no local, existindo a 300m a estação de tratamento de águas residuais de …, ao passo que no terreno confinante existe uma unidade de armazenagem pirotécnica.
20) A parcela possui vistas desafogados para o C….
21) O expropriado adquiriu a parcela em 15/4/1999 e registou tal aquisição na Conservatória de Registo Predial de Gondomar em 20/4/1999.
22) À data de 15/4/1999, de acordo com o Plano Director Municipal (PDM) de …, o terreno em questão encontrava-se em área “predominantemente residencial nível 3” e em “área florestal de protecção”, isso na planta de ordenamento do PDM, ao passo que na planta de condicionantes do PDM uma parte do terreno se encontrava em “zona reservada de albufeira” e a outra parte se encontrava em faixa de protecção à Estrada Nacional …, conforme descrito a folhas 683 a 691.
23) Na planta de ordenamento do PDM de 1995, a zona que se encontra em área predominantemente residencial é da ordem de dois terços da área da parcela, conforme esclarecimentos de folhas 916.
24) O Programa Polis de …, prevê para a parcela 113 a manutenção de zona verde, de lazer e a instalação de infra-estruturas e equipamentos públicos.
25) Dentro do limite de 300m de distância das extremas da parcela encontram-se várias urbanizações unifamiliares mas também colectiva, que foram construídas em conformidade com PDM, o qual definia índices máximos de construção de 0,70m2, ou então construídas ainda antes da entrada em vigor do PDM, regendo-se pelo disposto no Regulamento Geral das Edificações Urbanas.
26) A cércea dominante neste local, verificado na proximidade da parcela de terreno e classificado como solo urbano ou urbanizável pelo Plano de Urbanização, é de moradias unifamiliares de cave, rés-do-chão e andar, existindo ainda alguns blocos de edificação multifamiliar no raio de 300 metros, a D…; de acordo com o Plano de Urbanização de … e … actualmente em vigor, a cércea prevista para esta zona em novas edificações é de 2 pisos.
27) De acordo com a descrição da vistoria ad perpetuam rei memoriam, a parcela estava recoberta de vegetações herbáceas e arbustivas espontâneas.
28) O valor de mercado de venda de construção no local é de 950€ por metro quadrado.
29) O valor do possível rendimento do prédio, calculado segundo o critério do solo para outros fins, é de 25€ por metro quadrado.
30) Aquela zona não tem quaisquer focos poluidores susceptíveis de referência, a nível tóxico, visual ou acústico, excepto o que resulta da proximidade da EN ….
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No recurso da decisão arbitral o expropriado sustentou uma indemnização de 688.284€, tendo passado, nas primeiras alegações que deduziu ao abrigo do art. 64 do CE, a concluir pela indemnização de 1.156.095,56€, tal como voltou a alterar a indemnização pretendida, agora nas segundas alegações que deduziu ao abrigo do mesmo art. 64, sustentando aí o valor de 1.222.264,58€.
Sucede que as ditas segundas alegações foram deduzidas em tempo correcto, concretamente em 5/2/2013, uma vez que tanto o expropriante como o expropriado recorreram a título principal da decisão arbitral e, nesse caso, estabelece o nº 3 do art. 64 do CE que quem alega em primeiro lugar é o expropriante, tendo o expropriado o prazo de 20 dias – referido no nº 1 do art. 64 do CE – para apresentar a sua alegação, contando-se esses 20 dias desde o dia em que o expropriante alegou, acto ocorrido em 16/1/2013.
Confirma-se o entendimento da sentença no sentido de se aplicar ao assunto da admissibilidade da ampliação do pedido a norma do art. 273 nº 2 do antigo Código de Processo Civil, tal como se confirma que a diligência do citado art. 64 marca o fim da produção de prova – mesmo em âmbito decisório que, no tribunal de comarca, não é um âmbito de primeira instância – e ainda se confirma que o valor de 1.222.264,58€ corresponde a desenvolvimento plausível da pretensão que tinha sido fixada em 688.284€.
Improcede a objecção do expropriante quanto à admissão da ampliação do pedido do expropriado para 1.222.264,58€.
O expropriado invoca nulidades da sentença, mas essas nulidades não passam de erros de julgamento que o expropriado entende existirem, isso sem contradição internas entre premissas e conclusões e sem omissões de pronúncia cometidas na sentença, sendo certo que alguns desses supostos erros de julgamento ficarão com o respectivo conhecimento prejudicado pela circunstância de se entender que a indemnização não é arbitrada à luz dos critérios do art. 26 nº 12 do CE e que o terreno da parcela é avaliado pelo critério básico do art. 27 nº 3 do CE, ou seja como puro solo para outros fins.
Assim sendo, improcedem e ficam prejudicadas as objecções de nulidade da sentença apontadas pelo expropriado.
O expropriado discorda dos seguintes factos considerados provados na sentença e entende que tais factos devem ter a seguinte formulação:
- para o facto “5) De acordo com o Plano de Urbanização de … e …, publicado em Diário da República de 20/6/2001, em vigor à data da declaração de utilidade pública, o terreno da parcela encontra-se classificado na planta de condicionantes como zona de Reserva Ecológica Nacional e na planta de ordenamento como Área Verde de Protecção” entende o expropriado que a formulação deve ser “5) De acordo com o Plano de Urbanização de … e …, publicado no Diário da República nº 141, I série-E, de 20/6/2001, em vigor à data da declaração de utilidade pública, o terreno da parcela encontrava-se classificado na Planta de Ordenamento como Área Verde de Protecção”. Entende o expropriado que a integração na Reserva Ecológica Nacional (REN) só se operou com uma correcção da carta da REN que veio a ser publicada num Diário da República de 2/6/2011. Ora, tendo-se sobreposto a planta que tinha sido publicada em 20/6/2001 – na Resolução do Conselho de Ministros 70/2001, a qual ratifica parcialmente o Plano de Urbanização de … e … – com a planta rectificada da REN publicada em 2/6/2011, constata-se que as manchas de zonamento que marginam o C…, na área que ora interessa, não sofreram alteração alguma. Acresce que a fls. 24 e 25 constam as plantas de condicionantes e de zonamento do Plano de Urbanização de … e …, ambas com datas de 18/6/2007, constando nas duas plantas que a parcela 113 se encontra totalmente abrangida pela REN. Anota-se que a identificação do código gráfico que assinala a REN só consta na legenda da planta de condicionantes e não na legenda da planta de zonamento, mas, a outro tempo, o código gráfico sobreposto ao espaço em causa que surge nesta planta de zonamento corresponde ao código gráfico identificativo da REN que constava na legenda da planta de condicionantes, sem que, a um terceiro tempo, corresponda ao código gráfico que na planta de zonamento identifica as áreas verdes de protecção. Como aqueles documentos de 18/6/2007 são anteriores à rectificação publicada em 2/6/2011, confirma-se que tal rectificação em nada alterou a REN na área da parcela 113, tal como foi definida na Resolução 70/2001. Assim sendo, a redacção da alínea 5) será alterada para conciliar os referidos códigos gráficos na única acepção comum à planta de condicionantes e à planta de zonamento, mas isso sem que se confirme a tese do expropriado no sentido de ter ocorrido alteração da REN, a abranger a parcela, só desde a publicação de 2/6/2011. A nova redacção será “5) De acordo com o Plano de Urbanização de … e …, publicado em Diário da República de 20/6/2001, em vigor à data da declaração de utilidade pública, o terreno da parcela encontra-se classificado como zona de Reserva Ecológica Nacional”;
- em coordenação com o facto “25) Dentro do limite de 300m de distância das extremas da parcela encontram-se várias urbanizações unifamiliares mas também colectiva, que foram construídas em conformidade com PDM, o qual definia índices máximos de construção de 0,70m2, ou então construídas ainda antes da entrada em vigor do PDM, regendo-se pelo disposto no Regulamento Geral das Edificações Urbanas” e com o facto “26) A cércea dominante neste local, verificado na proximidade da parcela de terreno e classificado como solo urbano ou urbanizável pelo Plano de Urbanização, é de moradias unifamiliares de cave, rés-do-chão e andar, existindo ainda alguns blocos de edificação multifamiliar no raio de 300 metros, a D…; de acordo com o Plano de Urbanização de … e … actualmente em vigor, a cércea prevista para esta zona em novas edificações é de 2 pisos”, entende o expropriado que se deve formular um novo facto, o qual terá o número 26A) e a redacção “26A) As edificações que se encontram num raio de 300m da extrema da parcela, referidas em 25) e 26), existem algumas que têm um índice de construção de 0,75m2, sendo a média destas ligeiramente acima dos 0,70m2, tendo tais construções cérceas de 3 a 5 pisos”. Sendo medianamente correcta a objecção do expropriado no sentido de o elenco dos factos considerados provados não indicar com certeza, dentro do raio de 300m exterior à parcela, o índice médio de ocupação efectiva do solo com construção, assinala-se que nos fundamentos da sentença, quanto a um trecho de 2.978,40m2 de terreno, acabou por se considerar o valor (máximo admissível pelo PDM) de 0,70m2/1m2 como índice de ocupação de construção por cada metro quadrado de terreno. Entende-se como correcto acrescentar o facto provado 26A, com a seguinte redacção: “26A) As edificações que se encontram num raio de 300m desde a extrema da parcela, referidas em 25) e 26), ocupam em média 0,70m2 por cada metro quadrado de terreno, tendo os blocos de edificação multifamiliar da D… cérceas de 3 a 5 pisos”;
- para o facto “28) O valor de mercado de venda de construção no local é de 950€ por metro quadrado” entende o expropriado que a formulação deve ser “28) O valor de mercado de venda de construção no local é de 1.550€ por metro quadrado”. Antes do mais e sem desconsideração dos valores que vigorariam numa compra e venda em condições de mercado, tal como adiante se definirão, cumpre referir que o valor que interessa, ou poderia interessar, para o cálculo da indemnização seria o custo da própria construção e não o valor de mercado de venda de construção acabada. Com efeito, o nº 4 do art. 26 do CE define que o valor do terreno se afere pelo “custo da construção” e as “condições normais de mercado” a que aí também se aludem não são as condições de venda de construções acabadas e sim condições normalizadas de custo da própria construção. Para o que ora interessa, o valor do terreno não pode ser incorporado no custo da construção, antes sendo decorrência do custo da construção, sem que se possam verificar redundâncias entre esses valores, além de o preço de venda de uma construção acabada não ter – muitas vezes nem de perto – de corresponder à soma do valor do terreno e do valor da própria construção. Balizado o valor que porventura interessaria e recuando à situação de mercado que vigoraria no dia da publicação da declaração de utilidade pública, o dia 19/6/2008, entende-se como mais ajustada a avaliação extrapolada do custo – sem valor do terreno – da construção de casas unifamiliares que teriam tipologia idêntica às casas unifamiliares que já estavam construídas a Norte da estrada nacional, tudo de acordo com a tese dos Senhores Peritos nomeados pelo tribunal ao definirem a indemnização em 126.815€, ou seja a perícia de Junho de 2010, inserta a fls. 665 a 669. O custo de construção aí definido é de 650€/m2 para os pisos de rés-de-chão e primeiro andar, no total de 300m2, e de 450€/m2 para a cave, com 150m2, o que corresponde à média de 583,33€/m2. O custo de construção de blocos idênticos aos blocos de edificação multifamiliar da D… seria inferior a 583,33€/m2, uma vez que se aproveitariam estruturas comuns divididas por cérceas médias superiores aos 3 pisos das casas unifamiliares. Os Senhores Peritos nomeados pelo tribunal não desmentem o referido custo de 583,33€/m2 quando, num outro relatório entregue em 5/12/2011 (fls. 915 a 918), indicam um valor arredondado de 950€/m2, uma vez que esse valor é o resultado de um exercício para que o expropriado convocou os ditos peritos, sem que seja a tese dos mesmos peritos. Com efeito, de um exercício a uma tese vai a diferença que separa premissas indicadas aos Senhores Peritos pelo expropriado, para que os peritos laborem sobre elas, das premissas que são assumidas pelos Senhores Peritos, por as considerarem correctas. Veja-se que ao valor de 950€/m2 os mesmos peritos atribuem o qualificativo “simulação”, a fls. 967. Repete-se que a tese dos Senhores Peritos nomeados pelo tribunal se encontra no relatório de Junho de 2010, inserto a fls. 665 a 669, não se confundindo essa tese com exercícios a que os mesmos peritos foram chamados pelo expropriado, sendo certo que os peritos em causa nunca assumiram – em premissas que passariam a assumir como próprias – que a indemnização devia ser distinta de 126.815€, ou que o terreno da parcela devia ser valorizado a razão diferente da de 25€/m2, como tinham advogado no dito relatório de Junho de 2010. Já o valor de 1.550€/m2 que consta no parecer do Senhor Perito nomeado pelo expropriado (fls. 696 a 706) para chegar ao valor unitário do terreno de 239,24€/m2, é indicado com base em “média aritmética dos valores correntes na zona, conforme foi possível constatar pelo aqui perito em sites comerciais dos prédios em venda na envolvente e por informação desses valores pelos agentes imobiliários”. Sucede que esse valor de 1.550€/m2 nada tem a ver com custo corrente da própria construção, antes sendo um preço de venda de construções acabadas. O valor de 1.550€/m2 está desintegrado para os efeitos que interessam, além de conduzir a redundância na ponderação de 239,24€/m2 para o terreno, redundância essa não conforme com o citado art. 26 nº4. Não perdendo de vista que a Portaria 1426-B/2007 fixou o custo de construção em 721,28€/m2, ainda assim entende-se como claramente mais correcta a tese dos Senhores Peritos nomeados pelo tribunal quanto ao custo da construção plausível, afinada em função do valor pertinente acolhido no art. 26 nº 4 do CE. Assim, o facto 28 passará a ter a seguinte redacção: “28) O valor de mercado de custo de construção no local é de 583,33€ por metro quadrado”.
No item 29 dos factos provados ficou a constar que “O valor do possível rendimento do prédio, calculado segundo o critério do solo para outros fins, é de 25€ por metro quadrado”.
Trata-se de conclusão articulada com premissas de direito, as quais sempre estiverem em discussão e continuam a ser questionadas nas duas apelações: o expropriante (conforme valor que atribuiu à sua apelação) para contrapor o valor de 10€/m2 – com lapso recorrente na consideração de 4.467,60m2 em vez dos correctos 4.476,60m2 – e o expropriado para contrapor 200,725€/m2.
Por ter teor conclusivo e ser resultado que incorpora premissas que teriam de ser escrutinadas e sustentadas na fundamentação estritamente jurídica da sentença, quase a decisão de uma sentença, suprimir-se-á o item 29 dos factos provados.
Assim, a matéria de facto provada passará a ser a seguinte:
1) Por despacho de 2/6/2008 do Secretário de Estado Adjunto e da Administração Local, inserto na Declaração (extracto) 217-A/2008 da Direcção Geral das Autarquias Locais, publicado no Diário da República 117, II Série, de 19/6/2008, foi declarada a utilidade pública da parcela 113, área de terreno com 4.476,60m2, sita no …, freguesia …, concelho de Gondomar, correspondente ao prédio rústico descrito na Conservatória de Registo Predial de Gondomar sob o número 1836/200499 e inscrito na matriz predial sob o artigo 262.
2) A parcela de terreno confronta a Norte com Estrada Nacional …, a Nascente com caminho, a Sul com C… e a Poente com E….
3) A parcela corresponde a uma faixa, de largura variável, entre a estrada nacional e o leito do C…. Trata-se de um terreno com forte inclinação no sentido Norte/Sul, ocupado por espécies arbóreas, vedado na estrada nacional. O muro Norte apresenta altura de 0,75m e desenvolvimento de 128m e o muro Nascente apresenta altura de 0,50m e desenvolvimento de 52m, com a espessura constante para as duas partes de cerca de 28cm, estando realizado em perpeanho de granito. Tem incorporado, sensivelmente a meio da primeira parte, um portão em ferro de 2 folhas, com 1,5m por 2,4m cada uma, ladeado por 2 tranqueiros em pedra trabalhada, rematados por acrotério em bola. Apresenta um muro de vedação e suporte a Sul, construído em alvenaria seca de granito, com altura média de 2m e desenvolvimento de 100m, em mau estado de conservação.
4) À data da vistoria ad perpetuam rei memoriam, na parcela encontravam-se plantadas 4 austrálias com diâmetro à altura do peito de 50cm, 27 austrálias com diâmetro à altura do peito de 40cm, 14 austrálias com diâmetro à altura do peito de 30cm, 6 austrálias com diâmetro à altura do peito de 20cm, 2 eucaliptos com diâmetro à altura do peito de 80cm, 6 eucaliptos com diâmetro à altura do peito de 60cm, 6 eucaliptos com diâmetro à altura do peito de 50cm, 5 eucaliptos com diâmetro à altura do peito de 20cm, 3 eucaliptos com diâmetro à altura do peito de 10cm, 2 plátanos com diâmetro à altura do peito de 50cm, 3 plátanos com diâmetro à altura do peito de 40cm, 5 plátanos com diâmetro à altura do peito de 30cm, 1 sobreiro com diâmetro à altura do peito de 50cm, 1 sobreiro com diâmetro à altura do peito de 40cm, 3 sobreiros com diâmetro à altura do peito de 30cm, 1 carvalho com diâmetro à altura do peito de 40cm, 1 freixo com diâmetro à altura do peito de 40cm e 1 freixo com diâmetro à altura do peito de 30cm.
5) [nova redacção] De acordo com o Plano de Urbanização de … e …, publicado em Diário da República de 20/6/2001, em vigor à data da declaração de utilidade pública, o terreno da parcela encontra-se classificado como zona de Reserva Ecológica Nacional.
6) A parcela confronta com via pavimentada em betuminoso e dotada de infra-estruturas, electricidade, telefone, saneamento e águas pluviais.
7) A parcela dista 12m da Rua …, perpendicular ao arruamento confrontante com a parcela, a qual é servida de rede de gás.
8) A parcela dista menos de 2.000m do centro de saúde e de duas farmácias.
9) A parcela dista menos de 1.000m de rede de transportes públicos para a cidade do Porto e de Gondomar.
10) A parcela dista menos de 3.000m de acesso a auto-estrada, com direcção a Norte e Sul.
11) A parcela dista menos de 2.000m de uma escola primária com centro de actividades de tempos livres.
12) A parcela dista menos de 1.000m da F….
13) A parcela dista menos de 3.000m do G….
14) A parcela dista menos de 2.000m das piscinas municipais.
15) A parcela dista menos de 1.000m de estabelecimentos de comércio e serviços, nomeadamente de restauração e abastecimento de combustíveis.
16) A parcela dista menos de 1.000m da igreja paroquial, do cemitério e da Casa Paroquial.
17) A parcela dista menos de 2.000m do quartel dos bombeiros voluntários, do lar de idosos, do centro de dia, da esquadra da PSP, da Junta de Freguesia … e do cais de atracagem para barcos do C….
18) A parcela dista menos de 300 metros das instalações da H…, a qual dispõe de estabelecimentos comerciais de bar e restaurante.
19) A parcela possui boa exposição e situa-se à face da Estrada Nacional …, com trânsito e poluição inerentes à circulação rodoviária no local, existindo a 300m a estação de tratamento de águas residuais de…, ao passo que no terreno confinante existe uma unidade de armazenagem pirotécnica.
20) A parcela possui vistas desafogados para o C….
21) O expropriado adquiriu a parcela em 15/4/1999 e registou tal aquisição na Conservatória de Registo Predial de Gondomar em 20/4/1999.
22) À data de 15/4/1999, de acordo com o Plano Director Municipal (PDM) de …, o terreno em questão encontrava-se em área “predominantemente residencial nível 3” e em “área florestal de protecção”, isso na planta de ordenamento do PDM, ao passo que na planta de condicionantes do PDM uma parte do terreno se encontrava em “zona reservada de albufeira” e a outra parte se encontrava em faixa de protecção à Estrada Nacional …, conforme descrito a folhas 683 a 691.
23) Na planta de ordenamento do PDM de 1995, a zona que se encontra em área predominantemente residencial é da ordem de dois terços da área da parcela, conforme esclarecimentos de folhas 916.
24) O Programa Polis de … prevê para a parcela 113 a manutenção de zona verde, de lazer e a instalação de infra-estruturas e equipamentos públicos.
25) Dentro do limite de 300m de distância das extremas da parcela encontram-se várias urbanizações unifamiliares mas também colectiva, que foram construídas em conformidade com PDM, o qual definia índices máximos de construção de 0,70m2, ou então construídas ainda antes da entrada em vigor do PDM, regendo-se pelo disposto no Regulamento Geral das Edificações Urbanas.
26) A cércea dominante neste local, verificado na proximidade da parcela de terreno e classificado como solo urbano ou urbanizável pelo Plano de Urbanização, é de moradias unifamiliares de cave, rés-do-chão e andar, existindo ainda alguns blocos de edificação multifamiliar no raio de 300 metros, a D…; de acordo com o Plano de Urbanização de … e … actualmente em vigor, a cércea prevista para esta zona em novas edificações é de 2 pisos.
26A) [acrescentado] As edificações que se encontram num raio de 300m desde a extrema da parcela, referidas em 25) e 26), ocupam em média 0,70m2 por cada metro quadrado de terreno, tendo os blocos de edificação multifamiliar da D… cérceas de 3 a 5 pisos.
27) De acordo com a descrição da vistoria ad perpetuam rei memoriam, a parcela estava recoberta de vegetações herbáceas e arbustivas espontâneas.
28) [nova redacção] O valor de mercado de custo de construção no local é de 583,33€ por metro quadrado.
29) [suprimido].
30) Aquela zona não tem quaisquer focos poluidores susceptíveis de referência, a nível tóxico, visual ou acústico, excepto o que resulta da proximidade da EN 108.
Dispõe o art. 23 nº 1 do CE que “A justa indemnização não visa compensar o benefício alcançado pela entidade expropriante, mas ressarcir o prejuízo que para o expropriado advém da expropriação, correspondente ao valor real e corrente do bem de acordo com o seu destino efectivo ou possível numa utilização económica normal à data da publicação da declaração de utilidade pública, tendo em consideração as circunstâncias e condições de facto existentes naquela data”.
O nº 5 do mesmo art. 23 adensa esse conceito de “valor real e corrente (...) numa utilização económica normal” com a seguinte definição: “Sem prejuízo do disposto nos nº 2 e 3 do presente artigo, o valor dos bens calculado de acordo com os critérios referenciais constantes dos arts. 26 e ss. deve corresponder ao valor real e corrente dos mesmos numa situação normal de mercado (...)” [acerca da determinação do valor dos bens, prescreve o nº 2 desse art. 23: “Na determinação do valor dos bens expropriados não pode tomar-se em consideração a mais-valia que resultar da própria declaração de utilidade pública da expropriação, de obras ou empreendimentos públicos concluídos há menos de cinco anos, de benfeitorias voluptuárias ou úteis ulteriores à notificação a que se refere o nº 5 do art. 10, de informações de viabilidade, licenças ou autorizações administrativas requeridas ulteriormente à notificação a que se refere o nº 5 do art. 10”, acrescentando o nº 3 do mesmo art. 23 que “Na fixação da justa indemnização não são considerados quaisquer factores, circunstâncias ou situações criadas com o propósito de aumentar o valor da indemnização”].
Esse art. 23 contem os critérios primários de definição da indemnização em expropriação, uma vez que reconstitui os critérios de justeza que o art. 62 nº 2 da Constituição da República Portuguesa impõe para a indemnização: é uma das normas primordiais do CE e a compreensão do núcleo do critério de atribuição de indemnizações reside na articulação entre a norma desse art. 23, a qual corporiza o critério matriz, por um lado, e as normas dos arts. 25 a 32 do CE, por outro lado.
Mais: o transcrito art. 23 nº 1 também é, muitas vezes, critério de reconstituição do destino que o imóvel teria se não fosse expropriado, na medida em que define que o “destino (...) possível” é aquele que se encontraria numa situação normal de mercado.
Resulta primariamente do que se cita que o princípio da justa indemnização tem de ser olhado em concreto, devendo o expropriado receber aquilo que conseguiria obter pelo imóvel como se não tivesse ocorrido expropriação: a indemnização deve corresponder ao valor do mercado do bem expropriado, de modo a ser reposto no património do expropriado o valor equivalente ao do bem de que ficou privado, ou seja, a quantia que teria sido paga pelo bem se tivesse sido objecto de um livre contrato de compra e venda (cfr. nesse sentido o ac. da RP de 14/2/1989, CJ t. 1º, p. 190; ac. RP de 21/9/1989, CJ t. 4º, p. 200; ac. RP de 13/10/1976, CJ t. 3º, p. 644; ac. RL de 18/10/1990, CJ t. 4º, p. 153; ac. RL de 24/3/1994, CJ t. 2º, p. 98; ac. RP de 12/4/1994, CJ t. 2º, p. 109; ac. RC de 21/5/1991, CJ t. 3º, p. 73; ac. RE de 30/1/1992, CJ t. 1º, p. 269; Alves Correia, Garantias do Particular na Expropriação por Utilidade Pública, p. 129 ss. e O Plano Urbanístico e o Princípio da Igualdade, p. 546 ss. e Gama Prazeres, Código das Expropriações, Anotado e Actualizado, p. 49).
Se bem que a justa indemnização deva corresponder, em princípio, ao valor real e corrente do bem expropriado no mercado, a equivalência de tais valores não pode ser tida como absoluta, sendo apenas tendencial: com efeito, o livre comércio de prédios está sujeito a numerosas limitações – logo a começar pela mera vontade de vender e de comprar – que implicam adaptações de premissas menores para se proceder à equiparação entre esse comércio e a realidade da expropriação, ou seja é necessário ajustar algumas premissas para se alcançar equiparação válida entre negócios de utilidade particular pautados pela concordância de vontades e a aquisição potestativa para fins de utilidade pública.
Esta transição conceptual pode ser complexa e é nela que radica a maior parte das discordâncias que chegam a tribunal, uma vez que a definição da justa indemnização quase invariavelmente pondera elementos conjecturais, decompondo-se em juízos de plausibilidade.
Mesmo assim, adaptando premissas menores, importa caracterizar negócio plausível em mercado livre para a parcela 113, repetindo-se que na busca da equiparação à solução conferida pelo mercado se adaptam premissas menores em ordem a encontrar situações plausíveis, uma vez que não se pode encontrar a justa indemnização numa situação que não corresponda a um negócio razoável à luz das regras de mercado.
Chegados aqui, importa ponderar a norma do art. 26 nº 12 do CE: “Sendo necessário expropriar solos classificados como zona verde, de lazer ou para instalação de infra-estruturas e equipamentos públicos por plano municipal de ordenamento do território plenamente eficaz, cuja aquisição seja anterior à sua entrada em vigor, o valor de tais solos será calculado em função do valor médio das construções existentes ou em que seja possível edificar nas parcelas situadas numa área envolvente cujo perímetro exterior se situe a 300 m do limite da parcela expropriada”.
A apelação do expropriante quase se resume à não aplicação da norma desse art. 26 nº 12 ao cálculo da indemnização.
O art. 26 nº 12 incorpora norma de excepção que surgiu para evitar que os municípios classificassem – nos planos directores municipais, ou noutros planos municipais de ordenamento do território, como é o Plano de Urbanização de … e ... – imóveis particulares como zonas verdes, de lazer ou para instalação de infra-estruturas e equipamentos públicos, com o objectivo pré-determinado de os virem a desvalorizar em aquisição amigável ou potestativa, por vezes até com a intenção prévia de os destinarem a fim distinto do descrito no plano municipal.
Esta norma, agora de utilidade duvidosa – mas com constitucionalidade salvaguardada no recente acórdão 93/2014 do Tribunal Constitucional –, surgiu na sequência do acórdão do Tribunal Constitucional 267/97, in DR, II série, de 21/5/1997, que declarou a inconstitucionalidade do art. 24 nº 5 do CE de 1991 (aprovado pelo DL 438/1991, de 9/11) por força da violação dos princípios da justiça e da igualdade, ou seja declarou que o citado art. 24 nº 5 era inconstitucional enquanto interpretado de forma a excluir da classificação como “solo apto para construção” os solos integrados na reserva agrícola nacional que foram expropriados justamente com a finalidade de neles se proceder a construção urbana.
Acórdãos posteriores do Tribunal Constitucional – ac. 20/2000, DR, II série, de 28/4/2000; ac. 247/00; ac. 219/01, DR, II série, de 6/7/2001; ac. 243/01, DR, II série, de 4/7/2001; ac. 121/02, DR, II série, de 12/12/2002; ac. 417/02, DR, II série, de 17/12/2002; ac. 155/02, DR, II série, de 30/12/2002; ac. 347/03 e ac. 144/03 – vieram limitar muito a eficácia daquele acórdão 267/97, concluindo pela constitucionalidade, na maior parte dos casos, da norma do citado nº 5 do art. 24, uma vez que os princípios constitucionais da justa indemnização e da igualdade só são afectados quando se exclui da classificação de solo apto para construção um terreno integrado na reserva agrícola nacional que seja desafectado com vista à implantação de edificação, mas já não quando a expropriação não visa a construção de prédios urbanos e sim a construção, por exemplo, de uma via de comunicação.
Caracterizemos a condição da parcela entre a data da respectiva compra pelo expropriado, 15/4/1999, e o dia 20/6/2001 em que o Plano de Urbanização de … e … entrou em vigor.
O PDM do Município de … é vigente desde 18/5/1995.
Na parte superior da parcela, na área de 2.984,40m2, o PDM permitia a construção de cariz predominantemente residencial, com índice de ocupação do solo de 0,7 m2 de construção por cada metro quadrado de solo, tratando-se na nomenclatura do PDM do “nível 3” de ocupação.
A informação de 21/5/2010, inserta a fls. 683 a 691, faz sobrepor a faixa de servidão non aedificandi de 20 metros de largura inerente à vizinhança com a estrada nacional – contada desde o eixo da estrada e prevista no art. 5 al. c) do Decreto-Lei 13/94, de 15/1 – com parte da faixa da parcela onde o PDM permitia a construção.
De acordo com a matéria de facto provada, essa faixa onde era permitida a construção tem área na ordem dos dois terços da área da parcela, o que significa os 2.984,40m2 supra referidos, tendo a parcela frente para a estrada nacional na ordem dos 128m.
Aquela sobreposição entre uma proibição legal de construir e uma permissão legal de construir parece incongruente, mas prende-se com a possibilidade de a então Junta Autónoma das Estradas levantar a servidão legal non aedificandi, isso se tal levantamento lhe fosse requerido e a Junta concordasse na inexistência de prejuízo com esse levantamento.
Por isso, a servidão non aedificandi inerente à estrada nacional é entendida no PDM como condicionante à implementação de construção, sem que o PDM assuma tal servidão como efectiva proibição de construção.
Em todo o caso, fica assinalado que parte da faixa da parcela onde o PDM permitia a construção tinha importante restrição construtiva inerente a uma servidão legal non aedificandi, já que essa servidão poderia não ser levantada se a Junta Autónoma das Estradas não autorizasse.
A dita informação de 21/5/2010 comporta um lapso: a faixa da parcela 113 realçada a azul não é zona reservada de albufeira, pela simples razão de que o C… não está represado em frente à parcela.
Não existe servidão inerente à proximidade de suposta albufeira, a qual teria uma largura de 50 metros desde o nível pleno de armazenamento – “NPA” na informação.
Em todo o caso e conforme arts. 10 nº 2 e 11 nº 2 da Lei 54/2005, de 15/11, a maior parte da parcela integra o conceito legal de “margem”, o qual já vigorava na data da declaração de utilidade pública e se define numa faixa com 50 metros de largura contada desde a linha da água do C… na máxima maré alta equinocial: o local está sujeito à influência de marés e está sob jurisdição de autoridades marítimas.
A integração em zona legal de margem, já antes da entrada em vigor da Lei 54/2005, determinava novas restrições legais e administrativas, com inerentes autorizações administrativas quanto a usos que se quisessem dar à parcela, sendo, por exemplo, restringida a movimentação de terras, seja para não alterar o enquadramento paisagística e evitar a desnaturalização do espaço, seja para evitar o agravamento da influência deletéria das cheias noutros prédios ribeirinhos. Por isso, em margens submergíveis por cheias as administrações municipais e do domínio hídrico sempre restringiram a execução de aterros e de muros de suporte destinadas à elevação das cotas de soleira de construções.
O estudo de cheias centenárias atinge a cota de 13,5m na área da parcela, conforme se informa a fls. 966. A cheia centenária é fenómeno extremo, não amenizado pelas barragens do C…. A cheia centenária e a sua influência em planos de ordenamento territorial vem referida no art. 3 do Decreto-Lei 364/98, de 21/11.
Àquela cota de 13,5m as águas submergiriam mais de 90% da área da parcela, como se constata nas referências altimétricas da planta de fls. 470.
A memória descritiva para a obra que justificou a presente expropriação apoia-se numa cota média de cheia de 8,3m (fls. 460), a qual abrange menos de um terço da área da parcela – o terreno da parcela é muito inclinado.
A cota média de cheia plausível num estudo de viabilidade da construção de habitações teria de ser ponderada em nível superior ao nível de 8,3m, o qual foi adoptado na referida memória descritiva em função de estruturas artificiais que convivem relativamente bem com cheias, contrariamente ao que acontece com casas de habitação.
Ou seja, a valia construtiva da parcela, dentro da sub-área que na informação de 21/5/2010 é indicada como tendo tido aptidão para construção predominantemente residencial, é limitada pela eventualidade de cheias.
Essa eventualidade minorava o valor da parcela na citada sub-área, mas entende-se que não seria impeditiva de um negócio de compra e venda da parcela para que aí se construíssem habitações.
A existência de um armazém pirotécnico num terreno confinante, se correspondesse a instalação licenciada, provavelmente estabelece nova servidão non aedificandi, mas os elementos dos autos são inconclusivos quanto a essa restrição.
Abstraindo de qualquer uma das restrições legais, administrativas e naturalísticas apontadas e sabendo-se que um estudo de um espaço que só é atingido em cheias de padrão centenário não dissuade quase ninguém de aí construir e comprar casas de habitação, a proximidade do C…, numa primeira linha de construção e com vistas desafogadas, bem como a relativa boa centralidade dentro da área metropolitana do Porto, a qual tem bem mais de um milhão de habitantes, tornariam a indicada área superior da parcela, com 2.984,40m2, um espaço magnífico para construir habitações, sendo a sub-área inferior – 1.492,20m2, classificada no PDM como área florestal de protecção – um espaço de logradouro florestal das habitações, estendendo-se o domínio de benefício habitacional quase até à margem do rio. Note-se que a parcela não chega até ao nível normal da água do rio na máxima maré alta, a ponto de na vistoria ad perpetuam rei memoriam se referir que a maior parte da extrema Sul confrontava com um caminho público dotado de postes de iluminação pública, tendo esse caminho a largura média de 6 metros.
A contrapor a essa aptidão abstractamente magnífica para construir habitações, não se deixa de constatar que a parcela nunca teve qualquer construção de habitação e que na compra e venda de 15/4/1999 o preço declarado foi equivalente a 67.337,72€, ou cerca de 14,03€ por metro quadrado (num pressuposto de 4.800m2), o qual, mesmo a preços de 1999, seria muito baixo para uma perspectiva sólida de urbanização habitacional.
Os valores do negócio de 15/4/1999 não indiciam viabilidade evidente de construção.
Ponderando os prós e os contras apontados, os autos revelam que já à data da compra da parcela pelo expropriado a efectiva possibilidade de conversão urbanística para construção era muito remota.
Ou seja, mesmo estando a maior parte da parcela classificada como solo para construção predominantemente residencial, não há nos autos registo algum de tentativa de obtenção de autorização para loteamento urbano ou para construção de uma única casa. Ao contrário, os autos revelam forte oposição autárquica e de outra entidade administrativa à mais pequena intervenção do expropriado sobre qualquer elemento da parcela, incluindo oposição a mera limpeza arbustiva.
Com efeito, a vistoria ad perpetuam rei memoriam documenta a fls. 315 e ss. que poucos meses decorridos desde a compra da parcela pelo expropriado os fiscais do expropriante suspenderam trabalhos de limpeza e de reconstrução de alicerces de muro; que em 9/9/1999 o expropriante embargou a construção de um muro de vedação e de suporte, com 37m, à face da estrada nacional; que em 18/4/2001 o expropriante voltou a estabelecer embargo, agora de uma obra de aterro dentro da parcela. A Direcção Regional do Ambiente e do Ordenamento do Território de Geral, prevalecendo-se da abrangência pela condição legal de margem do rio à luz de ordenamento anterior ao da Lei 54/2005, também se opôs a esse aterro, com expediente escrito para a reposição das cotas naturais. A Assembleia de Freguesia local, em 6/4/2001, questionou movimentações de terras dentro da parcela e outras obras, não especificadas, aí desenvolvidas, além de fazer sentir que estaria atenta a avanços fundiários do expropriado, particularmente na delimitação a Sul.
Estas reacções são a forma de expressão da oposição administrativa e autárquica a que o expropriado tirasse o mais pequeno benefício urbanístico da parcela, sendo instrumento para esvaziar perspectiva, aparentemente válida à luz do PDM, para que na parcela se construísse.
Embora se venha a concluir que a condição relevante da parcela era a de solo para outros fins e que não tem aplicação o disposto no art. 26 nº 12 do CE ao assunto dos autos, entende-se como útil delimitar a expectativa de construção na parcela já à luz da plena vigência do PDM, constatando-se que já antes de 20/6/2001 eram muitos mais os obstáculos a que se pudesse construir do que as facilidades para se consumar tal objectivo.
Caracterizemos agora a condição da parcela desde 20/6/2001.
Nesse dia 20/6/2001, a Resolução do Conselho de Ministros 70/2001 ratificou um plano de ordenamento territorial e urbanístico que prevalece sobre o PDM do Município …, o Plano de Urbanização de … e ….
O Plano de Urbanização passou a classificar toda a parcela como REN e inviabiliza qualquer aproveitamento urbanístico na parcela, revogando aquela classificação do PDM de área para construção predominantemente residencial, até então vigente na maior parte da parcela – 2.984,40m2.
Esta reclassificação da aptidão de uso da parcela, com proibição de construção do que quer que seja, constitui o elemento determinante para o valor da indemnização.
O art. 48 do Regulamento do Plano de Urbanização, inserido na secção com a epígrafe “zona verde”, define as áreas REN como espaços não urbanizáveis, proibindo especificadamente que aí se desenvolvam loteamentos urbanos, além de proibir destaque de uma qualquer parte de uma área REN. O art. 55 do mesmo Regulamento remete para a legislação geral da REN, o Decreto-Lei 93/90, de 19/3, (vigente à data da publicação da declaração da utilidade pública da parcela), a qual reforça aquelas proibições.
Chegados aqui e tendo em atenção o entendimento supra exposto quanto às situações em que se aplica a norma do art. 26 nº 12 do CE, a questão essencial dos autos é a de averiguar se a alteração da classificação da maior parte da área da parcela, por forma a aí se passar a proibir a construção urbana, corresponde a objectivo pré-determinado do município ora expropriante para desvalorizar a parcela, no âmbito de aquisição amigável ou por expropriação.
A reclassificação prende-se com aquisição que o ora expropriante já divisava na altura em que propôs ao Governo a ratificação do Plano de Urbanização?
Em formulação antinómica: o expropriante reclassifica para desvalorizar em interesse próprio, agindo com reserva mental/desvio de poder, ou, ao invés, reclassifica para adaptar administrativamente o uso do espaço a verdadeiros motivos de reserva ambiental, agindo nessa reclassificação sem intenção pré-determinada de desvalorização em interesse próprio?
Para reforçar a primeira vertente da questão antinómica anota-se que o expropriante não precisa da classificação como REN para o aproveitamento da margem do rio que veio a determinar, uns 7 anos depois, a declaração de utilidade pública ora em causa, ao passo que a segunda vertente da questão se reforça com a desnecessidade que o expropriante tinha de adquirir a privados terrenos na margem do C… para preservar ambientalmente essa margem, uma vez que essa preservação se logra por via da vigilância e das restrições legais e administrativas a usos que particulares dêem ou queiram dar a prédios particulares.
É aquela antinomia que poderá determinar a aplicação da norma do transcrito art. 26 nº 12 ao assunto dos autos.
Antes do mais, cumpre recordar que o expropriado adquiriu a parcela em 15/4/1999, sendo esta data anterior ao dia 20/6/2001 em que passou a vigorar a proibição de construção e em que a maior parte da parcela passou a ser zona verde, pelo que o expropriado reúne o requisito do art. 26 nº 12 do CE que se prende com a aquisição anterior à entrada em vigor do plano de urbanização que reclassificou a maior parte da área da parcela como zona verde.
Na resposta à questão antinómica, verifica-se que o diploma que institui o Plano de Urbanização e o respectivo regulamento não têm qualquer referência ao vastíssimo empreendimento na margem do C… ora em causa, o que é bom índice de que nos trabalhos preparatórios da Resolução 70/2001 ainda não se perspectivava tal aproveitamento. Com efeito, trata-se de empreendimento com valor totalmente estruturante na composição urbanística e ambiental de … e de …, pelo que o mais provável era que tivesse tradução perceptível no Plano de Urbanização, isso se já estivesse previsto quando foram desenvolvidos aqueles trabalhos preparatórios. O Regulamento do Plano de Urbanização chega a especificar, no art. 58 al. 3), que a faixa ribeirinha do C… limitada pela Estrada Nacional … tem valor ambiental, mas, a outro tempo, escapa-lhe totalmente a motivação que determinou a declaração de utilidade pública publicada em 19/6/2008: propiciar um espaço de lazer para a população.
Os espaços bio-físicos das margens de rios têm valor ambiental superior na preservação de qualquer ecossistema, com específicas espécies – denominadas ripícolas – da flora e da fauna que só se desenvolvem nessa transição terra água, pelo que a classificação de margens de rios como REN constitui um paradigma do alcance desse instituto legal. Ou seja, à luz dos objectivos da preservação ambiental REN, é normalíssima a reclassificação em causa.
Antes da publicação da declaração de utilidade pública tiverem de ocorrer extensos trabalhos de concepção preliminar, de deliberação e de definição afinada do empreendimento, mas não há nos autos qualquer indício de que a ideia preliminar do empreendimento já estivesse estruturada uns 7 anos antes da publicação de 19/6/2008.
A fls. 277 dos autos consta a referência mais recuada ao empreendimento, ou seja um despacho do Secretário de Estado do Ordenamento do Território e das Cidades de 14/3/2006.
A diferença temporal na ordem dos 4 ou 5 anos entre uma intenção que teria de ocorrer antes da alteração vigente desde 20/6/2001 e a notícia mais remota dos autos, ocorrida em 14/3/2006, onde se retrata a necessidade de o expropriante adquirir terrenos particulares para realizar o empreendimento, revela com suficiente segurança que o expropriante não reclassificou a parcela para vir a pagar menos por ela.
Concluindo: a resposta às questões supra enunciadas é a de que o expropriante procedeu à reclassificação de 20/6/2001 sem intenção pré-determinada de desvalorização da parcela em interesse próprio.
Essa resposta afasta a aplicação da norma do art. 26 nº 12 do CE ao assunto dos autos, sendo certo que não se vê na sentença qualquer abordagem à desaplicação da norma por inexistência de desvio de poder municipal na reclassificação.
Cumpre deixar claro que – com o advento do Governo, através do Conselho de Ministros – o expropriante tem prerrogativa inteiramente legal de reclassificar o uso que se pode dar à parcela. Ora, a tese da sentença aproxima-se a uma penalização do expropriante como se tivesse agido ilicitamente na reclassificação, embora na sentença nem se afirme que tal ilicitude ocorreu, nem se afirme que a reclassificação não correspondeu a autênticas intenções e objectivos de preservação ambiental.
A norma do art. 26 nº 12 transcrita destina-se apenas a limitar o efeito de desvalorização inerente a reclassificação de uso fundiário em casos totalmente excepcionais, nos quais se demonstra desvio de poder do município, consubstanciado numa desvalorização querida para uma aquisição que se projecta. De tão excepcional e de aplicação que se quer muitíssimo restrita, essa norma não se aplica às reclassificações de uso fundiário determinados em planos de ordenamento não municipais, quando o certo é que organismos integrados na administração das Regiões Autónomas e do Governo têm poderes próprios e vinculativos de ordenamento do território, encontrando-se tais administrações das Regiões Autónomas e do Governo em condições em que podem actuar com o citado desvio de poder, uma vez que também promovem aquisições de prédios por utilidade pública. É norma que só vale para os municípios num contexto de existência de outros organismos públicos que podem ter interesses idênticos de desvalorização através da reclassificação de imóveis.
Como se entende que a reclassificação de 20/6/2001 foi regular, correspondendo a intenção real de condicionamento legal e administrativo de uso da parcela baseado em fundados motivos de reserva ambiental, a indemnização não pode ser calculada à luz dos critérios do transcrito art. 26 nº 12, antes sendo calculada pelo critério do puro solo para outros fins do art. 27 nº 3 do CE.
Essencialmente procede a apelação do expropriante.
Assim sendo, à data da declaração de utilidade pública, 19/6/2008, e por reclassificação operada 7 anos antes, o destino plausível de toda a parcela tinha de se conciliar com o impedimento administrativo e legal a que aí se construísse o que quer que fosse e até a que aí se alterassem as cotas naturais do terreno ou se estabelecessem outros trabalhos de alteração paisagística irreversíveis, salvaguardando a possibilidade de o expropriado cortar árvores, sem ser em corte raso.
Esse destino plausível retratar-se-á no preço de um negócio de compra e venda em condições regulares de mercado, ao mesmo tempo que se abstrai totalmente de perspectiva de expropriação e da realização do empreendimento que justificou a declaração de utilidade pública (a conclusão 20 do expropriante é errada, uma vez que o cálculo da indemnização tem de abstrair do empreendimento que motiva a expropriação e até abstrair da possibilidade de alguma vez a parcela vir a ser expropriada).
Para que serviria o terreno da parcela?
Vejamos as avaliações feitas nos autos, devendo ter-se em atenção que os valores que se seguem só se reportam ao valor do terreno e nada têm a ver com benfeitorias.
Os Senhores Árbitros aplicaram o critério do art. 26 nº 12 do CE, com extrapolação de índice de ocupação do solo por construção de apenas 0,2m2/m2, com valor unitário de 21,89€/m2 para o terreno.
Entende-se que a essa tese obsta a não aplicação do dito art. 26 nº 12, mas nem por isso se enjeita o acerto do valor unitário.
Os três peritos indicados pelo tribunal – na tese que sempre defenderam e que não se confunde com os exercícios que o expropriado lhes deu para fazerem – entenderam que se trata de solo para outros fins, mas integram o terreno na categoria de logradouro de lazer de casas unifamiliares que já estão construídas a Norte da estrada nacional. Trata-se de uma solução híbrida, uma vez que à primeira vista parece ser de valorização de solo para outros fins, mas efectivamente concretiza os critérios do art. 26 do CE vigentes na avaliação de solo apto para construção. Nessa solução híbrida alcançam o valor unitário de 25€/m2.
Entende-se que essa tese naufraga no carácter contraditório de uma avaliação que efectivamente é de terreno para construção depois de se afirmar como pressuposto que o terreno se não pode destinar a construção. Com efeito, a interposição da estrada nacional entre o terreno que é índice do valor, a Norte, e o terreno avaliando, a Sul, retira sustentação ao entendimento de que este último terreno poderia ser a continuação do logradouro existente naquele terreno índice, não se aceitando como razoável um conceito de logradouro único cortado por uma estrada nacional: um logradouro urbano é uma extensão contínua de terreno. Mas nem por isso se enjeita o valor unitário de 25€/m2.
O perito indicado pelo expropriante entende que se trata de solo para outros fins, concedendo que terá valor superior àquele que teria se a sua única utilidade fosse agrícola ou florestal, tudo para concluir que a parcela serviria para parqueamento provisório a céu aberto, nomeadamente para expor materiais ou para implantar estruturas de publicidade compatíveis com a proximidade a uma estrada nacional, sem qualquer construção e sem alteração significativa da topografia. Empregando rendimento desse tipo de parqueamento, exposições e publicidade no valor de 1,80€/m2/ano, repetido numa capitalização de 14,28 anos, obtém, por arredondamento, o mesmo valor unitário de 25€/m2, estando claro que as premissas que conduzem ao mesmo resultado são completamente diferentes das premissas que tinham sido adoptadas pelos três peritos indicados pelo tribunal.
Entende-se que a tese do perito indicado pelo expropriante é frágil, na medida em que a área total da parcela – 4.476,60m2 – é demasiado vasta para se lograr uma ocupação remunerada de toda ela para parqueamento provisório a céu aberto, nomeadamente para expor materiais ou para implantar estruturas de publicidade, além de corresponder a uso que sempre significaria deterioração ambiental e paisagística, o qual é incompatível com a classificação REN e contaria com oposição da administração, nomeadamente por destruição extensa do revestimento vegetal. Também não se divisa esteio sólido nos valores instrumentais de 1,80€/m2/ano e capitalização em 14,28 anos. A exemplo do que já se referiu sobre o valor de 25€/m2, nem por isso se enjeita o valor unitário a que chegou o perito indicado pelo expropriante.
O valor que se enjeita totalmente é o de 10€/m2 que o expropriante sustenta, face à localização magnífica da parcela, entre outros elementos de valorização.
O perito indicado pelo expropriado aplica de forma quase automática o critério do art. 26 nº 12 do CE, a ponto de afirmar nem sequer considerar que antes da aprovação do Plano de Urbanização de … e de … o PDM tinha atribuído à parcela valia construtiva.
Numa aplicação do critério do dito art. 26 nº 12, o perito indicado pelo expropriado alcança o valor de 239,24€/m2.
Entende-se que a essa tese obsta a não aplicação do dito art. 26 nº 12 e rejeita-se, em absoluto, o valor unitário de 239,24€/m2, o qual se entende ser exorbitante mesmo para os terrenos já ocupados com construção situados no raio de 300m da extrema da parcela. Entre outros valores, entende-se como exorbitante e desintegrada dos critérios legais operantes a premissa de 1.550€/m2 para as construções existentes naquele raio.
Também não se concorda com o entendimento da sentença na parte em que aplica o critério do art. 26 nº 12 do CE a uma área de 2.978,40m2 (queria escrever-se 2.984,40m2) e ao enveredar por um valor, totalmente inaceitável, de 116,87375€/m2. A principal razão da discordância radica na inadmissibilidade do critério do art. 26 nº 12 do CE ao assunto dos autos, como se vem sustentando, mas seria valor que também não se aceitaria se não tivesse ocorrido a reclassificação de 20/6/2001. A sentença revela incongruência interna ao oscilar dos 116,87375€/m2, aplicados a uma parte da parcela, para uns incomparavelmente modestos 25€/m2, aplicados na parte restante, uma vez que nos pressupostos de equiparação a uma solução construtiva essa parte restante teria valor económico como continuação do logradouro da parte superior. Ou seja, numa ocupação funcional integrada de toda a parcela, uma parte do logradouro não teria uma quebra de valores tão acentuada como a que vai de 116,87375€ para 25€.
Na apelação, o expropriado considera que não tem qualquer eficácia a reclassificação operada pelo Plano de Urbanização de … e de …, uma vez que tal reclassificação só se tornou operante depois da publicação, de 19/6/2008, da declaração de utilidade pública, concretamente em 2/6/2011, por via da publicação num Diário da República de uma rectificação da carta REN.
Essa tese não é acolhida, seja porque se entendeu supra, na redefinição da matéria de facto provada, que nada foi alterado no assunto dos autos com a rectificação publicada em 2/6/2011, estando a classificação REN vigente desde 20/6/2001 – o mesmo é dizer vigente no dia 19/6/2008 em que foi publicada a declaração de utilidade pública –, seja porque se entendeu que não ocorreu irregularidade alguma na reclassificação como REN operada em 20/6/2001.
Na apelação e em tese subsidiária, ainda assim moderando os valores de indemnização que tinha indicado na segunda alegação feita ao abrigo do art. 64 do CE, o expropriado invoca o critério do art. 26 nº 12 do CE para encontrar o valor de 200,725€/m2 para o terreno da parcela.
Não se aceita a aplicação do critério do dito art. 26 nº 12.
Mas mesmo num exercício apoiado nesse critério, também chegaríamos a um valor muito inferior a 200,725€/m2, o qual parte de um valor de 1.550€/m2, uma vez que se entendeu supra que o custo de construção atendível é 583,33€/m2.
À luz de negócio plausível de compra e venda em 19/6/2008, entende-se como exorbitante o valor unitário de 200,725€/m2, como totalmente inaceitável já era o valor de 116,87375€/m2.
Regressando à questão “para que serviria o terreno da parcela?” e ao destino plausível que determinaria o preço de uma compra e venda em 19/6/2008, entendem os Juízes que, na necessária e crucial conciliação ambiental com as limitações de REN, a parcela teria uma utilidade directa como espaço de lazer particular, sem ser logradouro de prédio urbano algum e sem construção alguma, tudo numa perspectiva de preservação do espaço natural tal como existe, sem alteração de qualquer elemento físico existente, só com salvaguarda do corte episódico de uma ou outra árvore – não é espaço de exploração florestal tendencialmente lucrativa ou para implementação de nova afectação cultural – e da conservação corrente das vedações existentes, incluindo o desbaste moderado dos excessos de vegetação arbustiva.
Aceita-se um incremento desse valor de gozo consistente num valor de reputação económica, o qual influiria no preço de uma compra e venda e adviria da ostentação junto de terceiros da titularidade do direito de propriedade relativo a prédio de lazer particular, com situação e área magníficas, inerentes à proximidade com o C… e localização às portas da cidade do Porto, bem como se aceita incremento inerente a uma valia de diversificação das aplicações patrimoniais, a qual é útil para pessoas abastadas.
A conjugação da aptidão de uso estrito para lazer, de reputação económica do proprietário e de diversificação das aplicações patrimoniais define o solo da parcela como solo para outros fins, com aplicação do disposto no art. 27 nº 3 do CE na definição do valor da indemnização.
Tendo ainda em atenção a área global de 4.476,60m2 e a conformação geométrica relativamente regular da parcela, com excelentes acessos desde a estrada nacional, sem deixar de ponderar a circunstância de a parcela se desenvolver em terreno muito inclinado, entende-se como justo o valor de 22€ para cada metro quadrado de terreno, o que conduz ao valor de 98.485,20€.
Acresce a esse valor a verba de 18.440€, definida na sentença para benfeitorias, verba essa que não é questionada nas duas apelações.
A indemnização total ascende a 116.925,20€ [98.485,20€ + 18.440€].
O índice de preços no consumidor, sem habitação, que vem previsto, a título de actualização monetária, no art. 24 nº 1 do CE, é indicado pelo Instituto Nacional de Estatística, no site www.ine.pt, entre Junho de 2008 e Agosto de 2014 (o último mês disponível) como tendo o multiplicador 1,05072097114727, o que redunda na indemnização actualizada de 122.855,76€ (tem-se em atenção que não foi entregue ao expropriado a verba de 66.776€ em que tinha ocorrido acordo).
A diferença de 122.855,76€ para os 112.592,77€ já depositados, ou 10.262,99€, tem de ser depositada pelo expropriante à ordem do juiz de primeira instância dos presentes autos dentro dos dez dias que se sucedem ao trânsito em julgado do presente acórdão, sendo os atrasos nesse depósito sancionados com a taxa de juro moratório de 4% ao ano, conforme art. 70 nº 2 do CE.
O pagamento do que quer que seja ao expropriado depende da prévia averiguação, no tribunal de primeira instância, de eventual penhora do presente crédito de 122.855,76€ à ordem dos expedientes executivos e criminais 6261/06.4YYPRT, melhor identificado a fls. 74 e 520, 3190200701083708, melhor identificado a fls. 56 e 521, 4837/08.4TBGDM, melhor identificado a fls. 495 e 496, 1247/08.7TBPRD, melhor identificado a fls. 520, 1591/08.3TBVLG, melhor identificado a fls. 521, 1899200501020900, melhor identificado a fls. 521, e 252/05.0IDPRT, melhor identificado a fls. 1007.
Sumário previsto no art. 663 nº 7 do Código de Processo Civil:
1- Se bem que a justa indemnização pela expropriação deva corresponder, em princípio, ao valor real e corrente do bem expropriado no mercado, a equivalência de tais valores não pode ser tida como absoluta, sendo apenas tendencial: com efeito, o livre comércio de prédios está sujeito a numerosas limitações – logo a começar pela mera vontade de vender e de comprar – que implicam adaptações de premissas menores para se proceder à equiparação entre esse comércio e a realidade da expropriação, ou seja é necessário ajustar algumas premissas para se alcançar equiparação válida entre negócios de utilidade particular pautados pela concordância de vontades e a aquisição potestativa para fins de utilidade pública.
2- Esta transição conceptual pode ser complexa e é nela que radica a maior parte das discordâncias que chegam a tribunal, uma vez que a definição da justa indemnização quase invariavelmente pondera elementos conjecturais, decompondo-se em juízos de plausibilidade.
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Em face do exposto, acordam os Juízes em julgar parcialmente procedente a apelação deduzida pelo expropriante e em julgar improcedente a apelação deduzida pelo expropriado, pelo que alteram a sentença e fixam a indemnização, já actualizada, em 122.855,76€, tal como fixam em dez dias, a contar do trânsito em julgado do presente acórdão, o depósito pelo expropriante, à ordem do juiz de primeira instância dos presentes autos, do remanescente de 10.262,99€.
O próprio expropriado será informado que a verba de 122.855,76€ só lhe será paga depois de se apurarem, no tribunal de primeira instância dos presentes autos, os desenvolvimentos de eventual penhora desse crédito de 122.855,76€ à ordem dos expedientes executivos e criminais 6261/06.4YYPRT, melhor identificado a fls. 74 e 520, 3190200701083708, melhor identificado a fls. 56 e 521, 4837/08.4TBGDM, melhor identificado a fls. 495 e 496, 1247/08.7TBPRD, melhor identificado a fls. 520, 1591/08.3TBVLG, melhor identificado a fls. 521, 1899200501020900, melhor identificado a fls. 521, e 252/05.0IDPRT, melhor identificado a fls. 1007.
O expropriante pagará custas, na fase de apelação, calculadas sobre o valor tributário de 50.149,20€, ao passo que o expropriado pagará custas, na fase de apelação, calculadas sobre o valor tributário de 800.080,34€.

Porto, 9/10/2014
Pedro Lima da Costa
José Manuel de Araújo Barros
Pedro Martins