Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
2138/10.7TBPRD.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: CARLOS GIL
Descritores: MATÉRIA CONCLUSIVA
JUÍZOS DE FACTOS PERICIAIS
JUÍZOS SOBRE A CAUSALIDADE DE UMA CONDUTA
PROVA PERICIAL
USO
ACIDENTE DE VIAÇÃO
CULPA DO LESADO
Nº do Documento: RP201402032138/10.7TBPRD.P1
Data do Acordão: 02/03/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA A DECISÃO
Indicações Eventuais: 5ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - É matéria conclusiva toda aquela que não consiste na percepção de uma ocorrência da vida real, trate-se de um facto externo ou interno, mas antes constitui um juízo acerca de certa realidade factual.
II - Dentro da matéria conclusiva devem distinguir-se os juízos de facto periciais, dos juízos de facto comuns passíveis de serem emitidos por qualquer pessoa com base nos seus conhecimentos.
III - O juízo sobre a causalidade de certa conduta activa ou omissiva é por natureza conclusivo, já que não incide sobre factos concretos passíveis de serem percepcionados, constituindo antes uma decorrência de certos factos concretos e da ligação que por via do raciocínio é possível estabelecer entre eles.
IV - Por isso, o juízo sobre a causalidade de certa conduta é apenas eventualmente passível de prova pericial ou com base em presunção natural, tendo em conta as regras da experiência comum.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: 2138/10.7TBPRD.P1

Sumário do acórdão proferido no processo nº 2138/10.7TBPRD.P1 elaborado pelo seu relator nos termos do disposto no artigo 663º, nº 3, do Código de Processo Civil:
1. É matéria conclusiva toda aquela que não consiste na percepção de uma ocorrência da vida real, trate-se de um facto externo ou interno, mas antes constitui um juízo acerca de certa realidade factual.
2. Dentro da matéria conclusiva devem distinguir-se os juízos de facto periciais, dos juízos de facto comuns passíveis de serem emitidos por qualquer pessoa com base nos seus conhecimentos.
3. O juízo sobre a causalidade de certa conduta activa ou omissiva é por natureza conclusivo, já que não incide sobre factos concretos passíveis de serem percepcionados, constituindo antes uma decorrência de certos factos concretos e da ligação que por via do raciocínio é possível estabelecer entre eles.
4. Por isso, o juízo sobre a causalidade de certa conduta é apenas eventualmente passível de prova pericial ou com base em presunção natural, tendo em conta as regras da experiência comum.
5. As lesões que o lesado sofreu na cabeça não são de modo algum de todo em todo indiferentes ao não uso de capacete de protecção e, ao invés, são uma consequência normal e típica dos sinistros envolvendo veículos de duas rodas, quando esse mecanismo de protecção não é usado, pelo que, nessas circunstâncias, deve considerar-se existir culpa do lesado relativamente a tais lesões.
6. É adequada a indemnização pelo dano patrimonial futuro da perda de capacidade de ganho no montante de cento e sessenta e cinco mil euros relativamente a lesado com vinte e dois anos de idade, na data da consolidação das lesões, que ficou afectado de uma Incapacidade Permanente Geral de 48 pontos que o impede de exercer a sua actividade profissional habitual, sendo no entanto compatível com outras profissões da área da sua preparação técnico profissional, desde que utilize unicamente o membro superior esquerdo.
7. É adequada a compensação de quarenta e cinco mil euros por danos não patrimoniais relativamente a lesado que sofreu traumatismo crânio-encefálico grave, pneumotórax hipertensivo bilateral, traumatismo cervical, com fractura das apófises transversas C4 e D1 e achatamento da C4, fractura da omoplata direita, fractura do 2º e 3º metacarpo da mão direita, politraumatismos, esplenectomia do baço, perfuração do pulmão, perfuração do intestino, lesão do plexo braquial direito C5 e C6, múltiplas escoriações pelo corpo, lesões que demandaram para consolidação setecentos e vinte e nove dias de doença e que determinaram dores de grau cinco, numa escala de zero a sete e prejuízo estético de grau quatro, numa escala de zero a sete, resultando dessas lesões uma Incapacidade Permanente Geral de 48 pontos.
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Acordam, em audiência, os juízes abaixo-assinados da quinta secção, cível, do Tribunal da Relação do Porto:

1. Relatório[1]
A 06 de Julho de 2010, no Tribunal Judicial da Comarca de Paredes, com o benefício de apoio judiciário na modalidade de dispensa de pagamento de taxa de justiça e demais encargos com o processo, B… intentou a presente acção declarativa, sob a forma ordinária, contra a “C… – Companhia de Seguros …, S.A.”, pedindo a condenação desta a pagar-lhe a quantia de € 590.790,85, acrescida de juros à taxa legal anual de 4 % desde a citação até efectivo pagamento e a pagar-lhe, ainda, a quantia que se vier a liquidar em incidente de liquidação ou execução de sentença, caso o autor venha a ter que realizar outras intervenções cirúrgicas reconstrutivas.
Para tanto, alega que no dia 2 de Julho de 2009, cerca das 22 horas e 30 minutos, já de noite, na …, …, Paredes, na Estrada Nacional nº …, circulava no motociclo de marca Yamaha …, modelo …, particular de matrícula “..-..-RN”, tripulado por D…, no sentido … – … e no qual seguia como passageiro, sentado imediatamente atrás do condutor. Este, em plena recta, despistou-se, saiu da faixa de rodagem, entrando na valeta existente do lado direito da via, atento o sentido …-…, tendo depois embatido num poste de iluminação pública e num suporte do sinal de perigo A23.
Todos os ocupantes, incluindo o autor, foram projectados violentamente contra o
poste de iluminação pública e suporte do sinal de perigo A23 e, de seguida, ao solo, sofrendo por causa disso danos cuja reparação o autor pretende obter nesta acção.
Conclui, alegando que o acidente ficou a dever-se a culpa exclusiva e grave do condutor do “..-..-RN”, dado conduzir sob a influência do álcool e sob o efeito de estupefacientes, circulando a velocidade nunca inferior a 100Km/h, sendo que a responsabilidade civil por danos causados a terceiros com a intervenção daquele veículo estava transferida para a ré.
Efectuada a citação da “C… – Companhia de Seguros …, S.A.”, esta contestou impugnando os factos articulados pelo autor, tal como os danos por aquele invocados por serem exagerados, referindo que o condutor do motociclo circulava a uma velocidade de cerca de 60 Km/h, sendo a velocidade máxima permitida no local de 90 Km/h, não existindo aí obras; no decorrer da marcha terá perdido o controlo do motociclo, entrando em despiste, tendo posteriormente embatido no poste de iluminação pública existente no local.
Em consequência do referido despiste resultaram as mortes do condutor do motociclo e de E…, passageiro do motociclo e ferimentos no também passageiro, B…, aqui autor.
O veículo interveniente no sinistro em apreço nos autos é um motociclo com lotação máxima de duas pessoas, dispondo unicamente de dois assentos, um destinado ao condutor e outro destinado a um passageiro e nele faziam-se transportar três pessoas, isto é, fora dos assentos existentes, com um total de peso dos três passageiros superior a 250 Kgs., sendo a tara máxima aconselhável de 180 Kgs.. O excesso de lotação fez com que o motociclo se desequilibrasse e o seu condutor tivesse perdido o controlo do mesmo, violando o disposto no artigo 54º, nºs 3 e 4 do Código da Estrada.
O condutor do motociclo e os passageiros circulavam na via conversando uns com os outros, tendo-se distraído e também, por via disso, perdido o controlo do veículo que conduzia, violando o disposto no artigo 3.º, n.º 2 do Código da Estrada.
O condutor do motociclo não estava legalmente habilitado a conduzir o veículo uma vez que não possuía carta de condução, o que terá também provocado o acidente por falta de destreza para manter o domínio da marcha, violando o disposto nos artigos 121.º e seguintes do Código da Estrada.
O condutor do motociclo conduzia sob a influência de álcool e substâncias psicotrópicas, apresentando uma taxa de álcool no sangue de 0,58 g/l e apresentando THC-COOH de 14,81 ng/ml, correspondendo a metabolito inactivo de canabinóides. O condutor do motociclo conduzia o mesmo com uma sensação de euforia, com um aumento de tempo de reacção e com perturbações nas reacções motrizes, facto este que foi também determinante para a eclosão do sinistro, atenta a falta de habilidade e destreza do condutor, violando o preceituado no artigo 81.º do Código da Estrada.
O condutor e os passageiros do motociclo circulavam no mesmo sem que fossem portadores de capacete de protecção, violando o disposto no artigo 82.º n.º 3 do Código da Estrada.
Afirma que o acidente ocorreu por falha humana, tanto do condutor como dos transportados, já que o autor encontrara-se com o condutor e o outro passageiro num café e sabia que o condutor havia ingerido bebidas alcoólicas e inalado substâncias psicotrópicas que lhe haviam provocado efeitos psicológicos, diminuindo a sua capacidade e destreza.
O autor sabia que o condutor não estava habilitado para a condução do motociclo e aceitou transportar-se em excesso de lotação, fazendo-se transportar sem usar capacete de protecção, sofrendo “TCE grave, com edema difuso, hemorragia sub-aracnoideia na cisura interpedencular e sobre a tenda do cerebelo”.
O lesado é responsável pela produção dos danos que em concreto sofreu, sendo essa responsabilidade imputável a título de culpa, nos termos do artigo 488º, nº 2, a contrario, do Código Civil. Aplicando-se o disposto no n.º 1, do art. 570º do Código Civil devendo, em função da culpa do lesado, a indemnização ser excluída ou eventualmente reduzida numa proporção nunca inferior a 50%.
Termina, pugnando por que a acção seja julgada em conformidade com a prova que vier a produzir-se na audiência de discussão e julgamento.
Na réplica, o autor mantém os factos por si alegados referindo, ainda, que mesmo que não levasse capacete, não existiria nexo de causalidade entre as lesões por si sofridas e a falta de uso de capacete. Afirma ainda que desconhecia que o condutor não tinha carta de condução, que tinha ingerido bebidas alcoólicas e inalado substâncias psicotrópicas e que não conversavam quando circulavam na via.
A 30 de Novembro de 2010, o autor deduziu incidente de liquidação, alegando que em 11 de Outubro de 2010 se submeteu a uma intervenção cirúrgica reconstrutiva, pelo que relativamente à alínea b) do pedido principal peticiona a condenação da ré a pagar-lhe a quantia de € 6.257,17, acrescida de juros à taxa legal anual de 4%, desde a notificação da ré deste incidente até integral pagamento.
A ré deduziu oposição ao incidente de liquidação, dizendo que o mesmo deve ser julgado improcedente por não provado.
Dispensou-se a realização de audiência preliminar, proferiu-se despacho saneador tabelar e procedeu-se à condensação da factualidade considerada relevante para a boa decisão da causa, por remissão, discriminando-se os factos assentes, dos controvertidos, estes últimos a integrar a base instrutória.
Seguidamente, as partes ofereceram provas e requereram a gravação da audiência final.
Realizou-se a prova pericial requerida por ambas as partes.
Efectuou-se a audiência de discussão e julgamento em quatro sessões, a última das quais para responder à matéria vertida na base instrutória.
Seguidamente foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente condenando a ré ao pagamento da quantia global de € 201.445,61, a título de danos patrimoniais, acrescida de juros legais contados desde a citação da ré até integral pagamento, bem como da quantia de € 42.750,00, a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros legais contados desde a prolação da sentença até integral pagamento.
Inconformada com a sentença, a ré interpôs recurso de apelação terminando as suas alegações de recurso com as seguintes conclusões:
“1.ª As presentes alegações de recurso visam a revogação da douta sentença porquanto se discorda da atribuição de responsabilidade exclusiva ao condutor do veiculo seguro bem como da percentagem de redução da indemnização, por aplicação da indemnização contida no art. 570.º, n.º do Código Civil.
2.ª No que a esta questão concerne o Tribunal a quo entendeu que “não existindo qualquer outra causa que determinasse a ocorrência do despiste(…) o despiste se deveu em exclusivo à actuação do condutor do ciclomotor sem os reflexos e concentração devida por causa do álcool e dos canabinóides que este acusava, e o que o impediu de controlar o veículo que conduzia, agindo de forma temerária, irresponsável e negligente.”
3.ª Ora, com o devido respeito, não podemos sufragar a conclusão do Tribunal quando conclui pela responsabilidade exclusiva do condutor do veículo seguro porquanto estaria sem os reflexos e concentração devida por causa do álcool e dos canabinóides que este acusava e pela sua falta de cuidado, imprevidência e imperícia.
4.ª Está provado que o veículo interveniente no sinistro em apreço nos autos é um motociclo de marca Yamaha modelo …, com lotação máxima de duas pessoas, dispondo unicamente de dois assentos de transporte, um destinado ao condutor e outro destinado a um passageiro e que aquando do acidente nele faziam-se transportar três pessoas – sendo que duas delas faleceram.
5.º Isto é, está provado que o motociclo circulava com excesso de lotação, isto é, transportando três jovens, e com um total de peso dos três passageiros superior à tara máxima aconselhável de 180 Kg.
6.ª Ora tal facto terá sido determinante para que o motociclo se desequilibrasse e o seu condutor tivesse perdido o controlo do mesmo, não mais o conseguindo controlar atento esse excesso de lotação.
7.ª Aliás, é a explicação mais plausível para o despiste de um motociclo que circula a uma velocidade superior a 59 km/h, numa recta em que não circulava qualquer outro veículo.
8.ª E o Autor aceitou transportar-se em excesso de lotação, de forma contra ordenacional, conforme este bem sabia.
9.ª Pelo que a responsabilidade na produção do acidente não é exclusiva do condutor, mas deste e dos dois passageiros.
10.ª Tendo ficado provado a relação causal entre o facto do lesado e a produção ou agravamento dos danos, e, contrariamente ao decidido pelo Tribunal a quo, da matéria de facto dada como provada resulta inequivocamente que o excesso de lotação foi “conditio sine qua non” do acidente.
11.ª Em suma, o transporte em excesso de lotação foi concausal do sinistro, sendo a responsabilidade do Autor deveria ser reduzida em 33,3%.
12.ª Caso assim não se entenda, e ainda quanto à redução da responsabilidade do Autor por se transportar, em veículo destinado apenas a duas pessoas, com mais duas pessoas.
13.ª No caso em apreço é inquestionável que perante os factos provados sob os n.º 44 a 48 que a circunstância de o Autor fazer a viagem em excesso de lotação e sem capacete agravou as lesões que sofreu em consequência do acidente.
14.ª Afigura-se de igual modo incontroverso que a conduta do autor, para além de ilícita, é culposa.
15.ª O Autor conhecia da proibição e do perigo de se fazer transportar num ciclomotor com dois assentos acompanhado de mais duas pessoas, obviamente que não podia deixar de saber que ao tomar a resolução de viajar nas circunstâncias em que o fez se expunha ao risco acrescido (e tragicamente verificado) de em caso de acidente sofrer lesões mais graves do que teria sofrido se circulasse como a lei determina.
16.ª E, assim sendo, a conduta do Autor terá agravado os seus danos devendo este ser responsabilizado em pelo menos 15% dos danos, por aplicação do disposto no artº 570º, nº 1, do CC.
17.ª Quanto ao de o autor circular no motociclo sem que fosse portador de capacete de protecção, tendo o Autor sofrido TCE grave, com edema difuso, hemorragia subaracnoideia na cisura interpedencular e sobre a tenda do cerebelo, apagamento dos sulcos corticais e sangue intaventricular nos trigonos e cornos occipitais, entendemos que, nos termos do art. 570.º Do Código Civil, a responsabilidade do autor nos danos deveria ser de pelo menos 20%.
18.ª Nestes termos a sentença recorrida violou, designadamente, o art.º 483.º e 507.º do Código Civil.
19.ª As presentes Alegações de Recurso visam a revogação da douta sentença porquanto se discorda das indemnizações fixadas ao recorrido a título de danos patrimoniais futuros, decorrente da IPP de que ficou a padecer e a título de danos não patrimoniais.
20.ª A indemnização atribuída ao Autor recorrido a título de danos patrimoniais futuros é excessiva.
21.ª Tratam-se de danos futuros, de difícil quantificação, sendo apenas ressarcíveis caso sejam seguros e previsíveis, dependendo de múltiplos elementos, tais como a evolução da economia, a evolução da vida pessoal do lesado e o desempenho profissional futuro daquele.
22.ª Elementos esses que o julgador desconhece, sendo convocado à realização de um juízo de prognose, que por sua vez, deve orientar-se de acordo com as regras da experiência comum e, na ausência de elementos precisos e exactos de medida, de acordo com critérios de equidade.
23.ª Nesse sentido, importa não impor ao devedor um esforço indemnizatório desajustado, prevenindo-se o locupletamento do lesado, porquanto é certo que estamos perante um dano patrimonial do qual não emerge qualquer perda de aquisição de rendimento.
24.ª Isto é, da concreta situação de IPG não decorre uma efectiva diminuição na percepção de salários ou rendimentos por parte do Autor, não se reflectindo essa IPG em concretos e efectivos danos patrimoniais. Circunstância esta, que o tribunal não pode deixar de atender, bem como às máximas da experiência comum.
25.ª É que, não está provado que o lesado esteja impedido de exercer a profissão respectiva e obter outras remunerações e o relatório médico-legal é claro, o recorrido apenas sofreu um dano corporal que o afecta ao nível de uma incapacidade funcional, digamos, um "handicap" no qual, a repercussão negativa se centra apenas na diminuição da condição física, resistência e capacidade por parte do mesmo. Isto é, daí apenas lhe advém uma deficiente e imperfeita capacidade de utilização do corpo e no desenvolvimento das actividades pessoais, em geral.
26.ª E ao decidir como decidiu, o tribunal recorrido, salvo o devido respeito, que é muito, confunde incapacidade parcial permanente com perda de capacidade aquisitiva, que são realidades distintas.
27.ª Não somos com isto a afirmar, que não existe um direito do recorrido a receber um montante indemnizatório pelo dano físico que sofreu, no entanto, à luz das regras da experiência comum, o tribunal não pode ignorar que o nível de rendimento do lesado não se encontra afectado pela lesão sofrida.
28.ª Pelo que, não podemos concordar com a atribuição de tal montante que julgamos injusto, inadequado e desproporcionado, porquanto o tribunal “a quo” decidiu como se de incapacidade efectiva de ganho se tratasse, conforme se pode constatar do teor da decisão recorrida.
29. ª Não obstante as doutas considerações do aresto recorrido, que, em termos de equidade consideramos justa a importância de € 1000.000,00, a título de indemnização pela IPG.
30.ª A indemnização atribuída ao Autor a título de danos não patrimoniais é manifestamente excessiva.
31.ª Não se discute que os danos provados ostentam aquela gravidade que reclama a tutela do direito.
32.ª No entanto, a ausência de critérios exactos, que permitam identificar o valor do dano a reparar, conduz à emergência de tópicos auxiliares na tarefa de concretização da indemnização, que radicam na experiência da jurisprudência e nas regras da experiência comum.
33.ª Sendo certo que tais danos são indemnizáveis e nessa medida merecedores da tutela do direito, somos a reiterar, por tudo o exposto, em termos de equidade que consideramos justa a importância de € 25.000,00 a atribuir ao Autor/lesado, não obstante as doutas considerações do aresto recorrido.
34.ª Ao decidir como decidiu, o aresto recorrido violou o disposto nos artigos 483.°, 494°, 496.º, n.º 3, 562.º, n.º 3 e 564.°, n.º 2, todos do Código Civil.”
Notificado do recurso de apelação interposto pela ré, o autor contra-alegou pugnando pela total improcedência desse recurso e, por sua vez, interpôs recurso subordinado contra a sentença, findando as suas alegações de recurso com as seguintes conclusões:
“1./ O quesito 75º e a respectiva resposta enfermam de 3 vícios que determinam a sua nulidade.
2./ É quesito conclusivo, no sentido de encerra em si, não só matéria de direito, como juízos de valor e, por essa razão, sobre ele não deveria o Tribunal “ a quo” ter proferido qualquer resposta, nos termos do n° 4 do art. 646° do Código de Processo Civil.
3./Nos termos do art. 646 nº 4 CPC, estando-se perante matéria conclusiva, a consequência será a de se considerar «não escrita» a resposta ao quesito 75º.Por outro lado,
4./A resposta ao quesito 75º é excessiva ou exorbitante, já que se pronunciou sobre matéria de facto que não foi alegada e por isso, também não foi quesitada.
5./A resposta acrescenta ao texto e matéria do quesito o segmento “as lesões cerebrais descritas na alínea a) do facto 5º não assumiriam a mesma gravidade”, não só se lhe acopla uma excrescência também não articulada ou alegada, inserindo-se na resposta conteúdo diferente do perguntado.
6./Nos termos do art. 664º, 2ª parte do CPC o juiz só pode servir-se dos factos alegados pelas partes.
7./Assim, por analogia com o disposto no Art. 646 n.º 4 do C.P.C. deve ter-se por não escrita a resposta ao quesito nessa parte, isto é, a partir de “...os danos sofrido…”
8./Finalmente a resposta ao quesito 75º é equivoca pois face à resposta ficamos sem saber se as lesões não assumindo a mesma gravidade se seriam mais ou menos graves
9./Concluindo deve alterar-se a resposta ao quesito para “ não se responde por se tratar de matéria conclusiva” ou considerar-se a resposta não escrita
QUANTO AO DIREITO
10./ Sem prescindir,
11./A sentença recorrida entendeu ter ocorrido concorrência de culpas entre o A/Recorrente e o condutor do motociclo na proporção de 5% e de 95% em razão do A./Recorrente não ser portador de capacete de protecção.
Porém,
12./Desde logo nenhum nexo de causalidade existe ou foi demonstrado (máxime provado) entre as lesões sofridas pelo A./Recorrente e a falta de uso de uso do capacete de protecção.
13./O uso do capacete de protecção imposto aos passageiros dos motociclos, visa a sua protecção física e não afastar dos causadores de acidentes a responsabilidade pelos danos sofridos por aqueles quando não sejam portadores de tal utensílio de protecção.
14./Pelo que a responsabilidade na verificação no acidente deve ser totalmente imputada ao Segurado da Recorrida/Seguradora
15./Por outro lado,
16./Para indemnizar estes danos patrimoniais a sentença arbitrou ao A./recorrente uma indemnização de €165.000,00.Porém, face à gravidade dos danos patrimoniais o justo seria atribuir ao A./Recorrente a este título a quantia de €250.000,00
17./A sentença recorrida arbitrou ao A./Recorrente uma indemnização por danos não patrimoniais de €42.750,00.Porém face à dimensão e gravidade dos danos não patrimoniais seria justo compensar o A./Recorrente com a quantia de €60.000,00.
18./Revogando-se a sentença recorrida acolhendo-se as conclusões precedentes se fará justiça”.
A ré não contra-alegou.
Os recursos foram admitidos como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.
Colhidos os vistos legais e nada obstando ao conhecimento dos objectos dos recursos, cumpre apreciar e decidir.
2. Questões a decidir tendo em conta os objectos dos recursos delimitados pelos recorrentes nas conclusões das suas alegações (artigos 635º, nº 3 e 639º, nºs 1 e 3, ambos do Código de Processo Civil, na redacção aplicável a estes autos[2]), por ordem lógica e sem prejuízo da apreciação de questões de conhecimento oficioso, observado que seja, quando necessário, o disposto no artigo 3º, nº 3, do Código de Processo Civil
2.1 Do recurso independente:
2.1.1 Da culpa do lesado por aceitar fazer-se transportar com excesso de lotação e da elevação da contribuição do lesado para os danos em virtude de circular sem capacete de protecção;
2.1.2 Do excesso da indemnização por danos patrimoniais futuros;
2.1.3 Do excesso da compensação por danos não patrimoniais.
2.2 Do recurso subordinado:
2.2.1 Do carácter conclusivo, excessivo e ambíguo da resposta ao artigo 75º da base instrutória;
2.2.2 Da culpa exclusiva do condutor do motociclo;
2.2.3 Da insuficiência do montante arbitrado a título de danos patrimoniais futuros;
2.2.4 Da insuficiência do montante arbitrado a título de compensação por danos não patrimoniais[3].
3. Fundamentos de facto
3.1 Do carácter conclusivo, excessivo e ambíguo da resposta ao artigo 75º da base instrutória
O recorrente subordinado suscita o carácter conclusivo, excessivo e ambíguo da resposta ao artigo 75º da base instrutória, pretendendo que em consequência de tais patologias seja declarada não escrita a aludida resposta.
Cumpre apreciar e decidir.
No artigo 75º da base instrutória verteu-se o artigo 70º da contestação, com o seguinte teor:
- “Na verdade, caso tivesse sido utilizado capacete de protecção os danos sofridos não assumiriam a dimensão que a final se verificou.”
Esta alegação da ré vinha antecedida das seguintes alegações:
- “O facto de o Autor seguir num motociclo sobrelotado agravou as lesões que sofreu no sinistro” (artigo 67º da contestação);
- “Bem como o facto de se fazer transportar sem usar capacete de protecção” (artigo 68º da contestação);
- “Daí que o Autor tenha sofrido grave traumatismo “TCE grave, com edema difuso, hemorregia [sic] sub-araccnoideia [sic] na cisura interpedencular [sic] e sobre a tenda do cerebelo” (artigo 69º da contestação).
O tribunal a quo respondeu ao artigo 75º da base instrutória nos seguintes termos:
- “Provado apenas que caso o autor tivesse utilizado capacete de protecção as lesões cerebrais descritas na alínea a) do artigo 5º não assumiriam a mesma gravidade.”
O primeiro vício que o recorrente subordinado imputa à resposta ao artigo 75º da base instrutória é a sua natureza conclusiva, vício que teria como terapêutica a aplicação analógica do artigo 646º, nº 4, do Código de Processo Civil, na redacção que vigorava quando foi proferida a aludida resposta.
Como já escrevemos no acórdão relatado no processo nº 793/10.7TBLMG.P2, a 04 de Novembro de 2013 e que passamos a transcrever “[n]os termos do disposto no artigo 646º, nº 4, do Código de Processo Civil, na data em que foi proferida a decisão recorrida, “[t]êm-se por não escritas as respostas do tribunal colectivo sobre questões de direito e bem assim as dadas sobre factos que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados, quer por documentos, quer por acordo ou confissão das partes.”
Esta previsão legal desapareceu no Código de Processo Civil que presentemente vigora, tal como desapareceu a cisão entre os julgamento da matéria de facto e a decisão sobre a matéria de direito, pois que é na sentença que se procede ao julgamento da matéria de facto (artigo 607º, nº 4, do Código de Processo Civil), seguindo-se depois, na mesma peça processual, a decisão da matéria de direito com a indicação, interpretação e aplicação das normas jurídicas pertinentes (artigo 607º, nº 3, do Código de Processo Civil).
Não obstante estas alterações legais, tanto antes quanto agora, não oferece dúvidas que, ressalvado o caso especial do direito consuetudinário, local ou estrangeiro (artigo 348º do Código Civil), apenas factos são objecto de prova (vejam-se o artigo 341º do Código Civil e o artigo 513º do Código de Processo Civil, na redacção que vigorava na data em que foi proferida a decisão sob censura e a que corresponde, actualmente, com alterações, o artigo 410º do Código de Processo Civil).
Por isso também, apesar da eliminação do nº 4 do artigo 646º do Código de Processo Civil, o Supremo Tribunal de Justiça continua a sindicar a violação de disposição expressa da lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova (veja-se o artigo 722º, nº 3 do Código de Processo Civil, na redacção que vigorava na data da prolação da decisão sob censura e a que corresponde o nº 3 do artigo 674º do Código de Processo Civil, na redacção que actualmente vigora).
Daí que se possa concluir, com segurança, que em face dos dados legislativos que se acabam de enunciar, a fundamentação de facto não deve, em regra[4], incidir sobre matéria de direito.
A distinção entre a matéria de direito e a matéria de facto não é em muitos casos uma tarefa fácil, tanto mais que a linguagem comum vai assimilando alguns termos jurídicos, como que os factualizando, assim permitindo a sua referenciação em sede probatória[5]. No entanto, fora desta zona cinzenta de absorção da conceptologia jurídica pela linguagem comum, a distinção permanece com suficiente clareza e operacionalidade.”
No caso em análise, importa aferir se a matéria indicada pelo recorrente subordinado constitui, na totalidade ou em parte, matéria conclusiva.
“A identificação da matéria conclusiva e da terapêutica adequada ao seu tratamento quando seja incluída na base instrutória é problema recorrente nos tribunais e que nem sempre tem tido soluções uniformes, advogando alguns a aplicação directa ou analógica do disposto no já citado artigo 646º, nº 4, do Código de Processo Civil, quando seja objecto de prova matéria dessa natureza[6], enquanto outros, na senda da posição sustentada pelo Sr. Professor Antunes Varela[7], defendem a inaplicabilidade do citado normativo ao caso[8], havendo ainda quem sustente que não devendo essa matéria ser objecto de prova, não deve pura e simplesmente ser respondida.
Na nossa perspectiva, é matéria conclusiva toda aquela que não consiste na percepção de uma ocorrência da vida real, trate-se de um facto externo ou interno[9], mas antes constitui um juízo acerca de certa realidade factual. Dentro desta matéria conclusiva, devem em nosso entender, distinguir-se os juízos de facto periciais[10], dos juízos de facto comuns passíveis de serem emitidos por qualquer pessoa com base nos seus conhecimentos[11].
Esta distinção justifica-se, em nosso entender, porque pode ser objecto de prova pericial a apreciação de factos[12], quando para tanto sejam necessários conhecimentos especiais que os julgadores não possuam, ou quando os factos, relativos a pessoas, não devam ser objecto de inspecção judicial (artigo 388º do Código Civil).
Assim, é a própria lei substantiva a determinar que a prova pericial pode consistir na emissão de juízos de valor sobre certos factos. Desta configuração substantiva da prova pericial há que, salvo melhor opinião, retirar as necessárias consequências do ponto de vista processual, nomeadamente, no que tange a delimitação do objecto da prova que, em consonância, no que respeita a prova pericial, não se poderá restringir aos “factos relevantes para o exame e decisão da causa” ou “aos temas de prova enunciados ou, quando não tenha de haver lugar a esta enunciação, os factos necessitados de prova” (artigos 513º do Código de Processo Civil, na redacção que vigorava aquando da prolação da decisão sob censura e 410º do mesmo diploma legal, na versão aprovada pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho e que presentemente vigora), devendo também abarcar a apreciação de factos por peritos[13], dada a vocação instrumental do direito adjectivo. A não se proceder assim, não se perceberia qual a utilidade probatória da emissão de juízos de valor pelos peritos” [14].
Munidos das linhas de rumo que precedem, debrucemo-nos sobre o concreto ponto que o recorrente subordinado pretende ver excluído da fundamentação de facto, em razão de constituir matéria conclusiva.
O conteúdo do artigo 75º da base instrutória envolve a formulação de um juízo de causalidade. Ora, o juízo sobre a causalidade de certa conduta activa ou omissiva é por natureza conclusivo, já que não incide sobre factos concretos passíveis de serem percepcionados, constituindo antes uma decorrência de certos factos concretos e da ligação que por via do raciocínio é possível estabelecer entre eles. Por isso, esse juízo é apenas eventualmente passível de prova pericial ou com base em presunção natural, tendo em conta as regras da experiência comum. Acresce que o concreto figurino da causalidade é variável, consoante o concreto domínio em que se aplica, o que envolve, nesta vertente, verdadeiras questões de direito[15].
No caso em apreço, o tribunal a quo fundamentou a resposta que deu ao artigo 75º da base instrutória, nos seguintes termos:
- “A matéria restritiva constante do facto 75º baseou-se no facto de a maior parte das lesões sofridas pelo autor não se localizarem na zona da cabeça, pelo que não poderiam assumir maior gravidade caso o autor tivesse utilizado capacete de protecção.”
Assim, tudo sopesado, vertendo-se no artigo 75º da base instrutória matéria conclusiva para cuja resposta não são necessários conhecimentos especiais determinantes da necessidade de produção de prova pericial, deve a resposta que foi dada com base numa simples valoração do julgador, por apelo às regras da experiência comum, extirpar-se da matéria dada como provada, sem prejuízo desse juízo poder e dever ser formulado, em sede de fundamentação jurídica.
Procede assim, nesta parte, esta questão suscitada pelo recorrente.
3.2 Fundamentos de facto exarados na sentença recorrida, ordenados logicamente e extirpados do segmento conclusivo nos termos antes decididos, não se divisando razões nem fundamento legal para a alteração oficiosa da referida factualidade
3.2.1
No dia 2 de Julho de 2009, cerca das 22 horas e 30 minutos, já de noite, na …, …, Paredes, na Estrada Nacional nº …, ocorreu um acidente de viação (alínea A da factualidade assente).
3.2.2
Foram intervenientes: o motociclo de marca Yamaha …, modelo …, particular de matrícula ..-..-RN, tripulado por D…, no sentido … – … e no qual seguia como passageiro o autor, sentado no motociclo imediatamente atrás do condutor (alínea B da factualidade assente).
3.2.3
A Estrada Nacional, no local e na altura do acidente, tinha iluminação pública, configurava uma recta ladeada por valetas; a via era dividida ao meio por uma linha longitudinal descontínua branca pintada no pavimento com dois sentidos de trânsito; a faixa de rodagem tinha uma largura de 6,70 metros; o piso era em alcatrão, que se encontrava seco, sem óleo ou areia na altura do acidente e em regular estado de conservação (alínea C da factualidade assente).
3.2.4
Assim, na referida hora, data e local, quando o referido D… tripulava o ..-..-RN, no sentido … – …, em plena recta despistou-se, saiu da faixa de rodagem, entrando na valeta existente do lado direito da via atento o sentido …-…, tendo acto contínuo embatido num poste de iluminação pública e num suporte do sinal de perigo A23 ali existentes (alínea D da factualidade assente).
3.2.5
Todos os ocupantes do ..-..-RN, incluindo o autor, foram projectados violentamente contra o poste de iluminação pública e suporte do sinal de perigo A23 e, de seguida, ao solo (alínea E da factualidade assente).
3.2.6
A conduta do condutor do ..-..-RN era consequência, ou pelo menos foi agravada pelo facto de na altura do acidente o D… tripular o ..-..-RN com uma TAS de 0,58 g/l e ainda com e sob um efeito de droga canabinoica THC-COOH (ácido delta-9-tetrahidrocanabinoico) correspondente a um metabolito canabinóico na quantidade de 14/81 ng/ml (alínea F da factualidade assente)[16].
3.2.7
A natureza do referido acidente foi de um despiste de um motociclo, propriedade e conduzido por D… (resposta ao artigo 38º da base instrutória).
3.2.8
E no decorrer da marcha o condutor do motociclo perdeu o controlo do motociclo, entrando em despiste tendo posteriormente embatido no poste de iluminação pública existente no local (resposta ao artigo 41º da base instrutória).
3.2.9
Em consequência do referido despiste resultaram as mortes do condutor do motociclo supra identificado (resposta ao artigo 42º da base instrutória).
3.2.10
A morte de E…, passageiro do motociclo (resposta ao artigo 43º da base instrutória).
3.2.11
O local do acidente é caracterizado por ser uma recta com 6,70 metros de largura de faixa de rodagem (resposta ao artigo 44º da base instrutória).
3.2.12
Atento o sentido de circulação do motociclo, a via é ladeada por postes de iluminação em betão armado (resposta ao artigo 45º da base instrutória).
3.2.13
Para além dos postes de iluminação que ladeiam a via onde ocorreu o acidente, na berma existe uma valeta de escoamento de águas pluviais cujo perfil é diferente do perfil transversal da faixa de rodagem (resposta ao artigo 46º da base instrutória).
3.2.14
Relativamente à rugosidade do pavimento, este é caracterizado por ser constituído por betão betuminoso regular que se encontrava seco à data do sinistro (resposta ao artigo 47º da base instrutória).
3.2.15
A velocidade máxima permitida no local é de 50 Km/h. (resposta ao artigo 48º da base instrutória).
3.2.16
À data do acidente não existiam obras sobre o lado direito da via, atendendo ao sentido de circulação do motociclo, pelo que a valeta de escoamento encontrava-se completamente desimpedida de detritos, possuindo apenas matéria vegetal (resposta ao artigo 49º da base instrutória).
3.2.17
O veículo interveniente no sinistro em apreço nos autos é um motociclo de marca Yamaha modelo …, com lotação máxima de duas pessoas (resposta ao artigo 50º da base instrutória).
3.2.18
Dispondo unicamente de dois assentos de transporte, um destinado ao condutor e outro destinado a um passageiro (resposta ao artigo 51º da base instrutória).
3.2.19
Acontece que aquando do acidente nele faziam-se transportar três pessoas, fora dos assentos existentes (respostas aos artigos 52º e 53º da base instrutória).
3.2.20
O total do peso dos três passageiros era superior à tara máxima aconselhável de 180 Kgs. (resposta aos artigos 54º e 55º da base instrutória).
3.2.21
O condutor do motociclo não possuía carta de condução (resposta ao artigo 61º da base instrutória).
3.2.22
O grau de alcoolemia e de canabinóides que o condutor do motociclo acusava retirou-lhe reflexos, concentração, bem como lhe provocou uma excessiva confiança na sua condução, encontrando-se aquele em tal estado quando ocorreu o despiste referido no facto 41º (resposta aos artigos 66º, 67º, 68º e 69º, todos da base instrutória).
3.2.23
O condutor e os passageiros do mesmo circulavam no motociclo sem que fossem portadores de capacete de protecção (resposta ao artigo 70º da base instrutória).
3.2.24
O autor encontrara-se com o condutor e o outro passageiro num café (resposta ao artigo 71º da base instrutória).
3.2.25
O autor aceitou transportar-se em excesso de lotação (resposta ao artigo 74º da base instrutória).
3.2.26
O veículo “..-..-RN” circulava a velocidade não concretamente apurada mas nunca inferior a 59 Km/h (resposta ao artigo 2º da base instrutória).
3.2.27
O veículo “..-..-RN” antes de embater no poste de iluminação em betão e suporte de sinal, numa posição normal de marcha, circulou na valeta de escoamento de águas pluviais, situada no lado direito da via, atento o sentido de marcha daquele veículo (resposta ao artigo 3º da base instrutória).
3.2.28
Na altura do acidente o autor tinha 20 anos de idade (nasceu a 01 de Abril de 1989) (alínea H da factualidade assente).
3.2.29
Por causa do embate a que se alude no facto 3º, o autor foi projectado ao solo sofrendo lesões (resposta ao artigo 4º da base instrutória).
3.2.30
Essas lesões consistiram em:
a) TCE grave, com edema difuso, hemorragia sub-aracnoideia na cisura interpeduncular e sobre a tenda do cerebelo, apagamento dos sulcos corticais e sangue intraventricular nos trígonos e cornos occipitais.
b) EC Glasgow-13.
c) Pneumotórax hipertensivo bilateral.
d) Traumatismo cervical, com fractura das apófises transversas C4 e D1 e achatamento da C4.
e) Fractura da omoplata direita.
f) Fractura do 2º e 3º metacarpo da mão direita.
b) Politraumatismos.
c) Esplenectomia do baço.
d) Perfuração do pulmão.
e) Perfuração do intestino.
f) Lesão do plexo braquial direito C5 e C6.
g) Múltiplas escoriações pelo corpo (resposta aos artigos 5º e 6º da base instrutória).
3.2.31
Mercê dessas lesões, o autor:
a) Foi assistido pelo INEM no local do acidente.
b) Transportado de imediato ao Hospital de S. João no Porto, local onde esteve internado na UCI durante 27 dias.
c) Nesta unidade hospitalar, foi operado com anestesia geral e em coma induzido durante um período de 15 dias.
d) Realizou múltiplos tratamentos de fisioterapia e recuperação quer no Hospital de S. João quer no Centro de Saúde …, quer no Hospital de Santa Maria no Porto quer no Centro Hospitalar do Tâmega e Sousa, EPE.
e) No dia 19/03/2010 foi submetido a cirurgia reconstrutiva e paliativa do plexo braquial direito no F…, Lda., G…, Lda, concretamente à lesão alta do plexo braquial direito e neurotização intra plexoal do nervo cesório para espinhal, neurotização do ramo cubital para músculo cutâneo, neurotização do braquial com ramo do mediano.
f) Está totalmente incapacitado para o trabalho desde a data do acidente, sendo que esteve totalmente incapacitado para o trabalho 729 dias (resposta ao artigo 7º da base instrutória).
3.2.32
O autor apresenta uma incapacidade permanente fixável em 48 pontos, sendo tais sequelas impeditivas do exercício da actividade profissional habitual, mas compatíveis com outras profissões da área da sua preparação técnico profissional[17] (resposta ao artigo 8º da base instrutória).
3.2.33
Na altura do acidente o autor era um adulto perfeito e saudável (resposta ao artigo 9º da base instrutória).
3.2.34
O autor, em Fevereiro de 2009, trabalhava para a H…, na qualidade de trabalhador temporário, como técnico de manutenção de informática, auferindo a quantia líquida de € 658,37 (resposta ao artigo 10º da base instrutória).
3.2.35
O autor necessitará também de acompanhamento médico, medicamentoso e de fisioterapia no qual, em média, mensalmente, despenderá quantia nunca inferior a € 30,00 (resposta ao artigo 15º da base instrutória).
3.2.36
Em medicamentos, colar cervical e suspensão do membro superior com banda torácica, tudo decorrente do acidente em questão nestes autos, despendeu o autor a quantia de € 157, 54 (resposta ao artigo 16º da base instrutória).
3.2.37
No internamento, estadia, ocupação da sala de operações instrumentos e materiais cirúrgicos o autor pagou na G…, Lda. a quantia de € 2.499,79 (resposta ao artigo 17º da base instrutória).
3.2.38
Ao cirurgião Prof. I… que efectuou a cirurgia referida no artigo 14, alínea e) da petição inicial, incluindo uma consulta, pagou € 3.025,00 (resposta ao artigo 18º da base instrutória).
3.2.39
Ao anestesista Dr. J… pagou € 780,00 (resposta ao artigo 19º da base instrutória).
3.2.40
Ao 1º cirurgião ajudante Dr. K… pagou € 520,00 (resposta ao artigo 20º da base instrutória).
3.2.41
Ao 2º cirurgião ajudante Dr. L… pagou € 260,00 (resposta ao artigo 21º da base instrutória).
3.2.42
À enfermeira instrumentista M… pagou € 260,00 (resposta ao artigo 22º da base instrutória).
3.2.43
Numa consulta de ortopedia no Dr. N…os no Hospital de Santa Maria Porto o autor pagou € 65,00 (resposta ao artigo 23º da base instrutória).
3.2.44
Enquanto o autor esteve internado, se submeteu a consultas, tratamentos, cirurgias, o autor permanentemente teve necessidade de acompanhamento do seu pai, que para se transportar despendeu em combustíveis e portagens a quantia de € 1.326,44, quantia esta que o autor teve de pagar a seu pai (resposta ao artigo 24º da base instrutória).
3.2.45
O acidente, os ferimentos, os tratamentos a que o autor teve de submeter-se causaram-lhe fortíssimas dores, tristeza e medo (resposta ao artigo 26º da base instrutória).
3.2.46
O autor sente dores quando há mudanças de tempo ou efectua esforços (resposta ao artigo 27º da base instrutória).
3.2.47
O autor perdeu uma parte da capacidade de inter-relacionamento social, sentindo-se mais constrangido e intimidado (resposta aos artigos 28º e 29º da base instrutória).
3.2.48
O autor era pessoa alegre e bem disposta e após o acidente ficou mais triste (resposta ao artigo 30º da base instrutória).
3.2.49
Em virtude das sequelas deixou de poder realizar gestos e praticar actividades desportivas que impliquem o uso do membro superior direito (resposta aos artigos 31º e 32º da base instrutória).
3.2.50
Por causa das sequelas o autor ficou com um dano estético permanente fixável no grau 4/7 (resposta aos artigos 34º e 35º da base instrutória).
3.2.51
No dia 11 de Outubro de 2010, o autor, na sequência do acidente em questão nos autos, teve que se submeter a intervenção cirúrgica reconstrutiva que consistiu no transplante do músculo trapézio para abdutor e estabilizador do ombro direito e imobilização com aparelho toraco-braquial (resposta ao artigo 76º da base instrutória).
3.2.52
No internamento, estadia, ocupação da sala de operações instrumentos e materiais cirúrgicos o autor pagou na G…, Lda a quantia de € 2.376,33 (resposta ao artigo 77º da base instrutória).
3.2.53
Ao cirurgião Prof. I… que efectuou a cirurgia referida no artigo 3 deste requerimento[18], incluindo a utilização de Pattel, pagou € 2.300,00 (resposta ao artigo 78º da base instrutória).
3.2.54
Ao anestesista Dr. O… pagou € 600,00 (resposta ao artigo 79º da base instrutória).
3.2.55
Ao 1º cirurgião ajudante Dr. K… pagou € 400,00 (resposta ao artigo 80º da base instrutória)
3.2.56
Ao 2º cirurgião ajudante Dr. L… pagou € 200,00 (resposta ao artigo 81º da base instrutória).
3.2.57
Ao enfermeiro instrumentista P… pagou € 200,00 (resposta ao artigo 82º da base instrutória).
3.2.58
Em medicamentos e tratamento na G…, Lda. pagou € 46,84. Enquanto o autor esteve internado, se submeteu a consultas, tratamentos, cirurgias, o autor permanentemente teve necessidade de acompanhamento do seu pai, que para se alojar em Coimbra, cidade onde se situa a G…. em que o autor esteve internado pagou € 134,00, quantia esta que o autor teve de pagar a seu pai. (resposta ao artigo 83º da base instrutória).
3.2.59
D…, residente na Rua …, ….-…, …, Paredes, dono e legítimo proprietário do ..-..-RN, transferiu para a ré seguradora a responsabilidade por acidente de viação causados pelo ..-..-RN, através da apólice nº …….. (alínea G da factualidade assente).
3.2.60
No âmbito da sua actividade, a ora ré celebrou com D… um contrato de seguro do ramo automóvel titulado, pela apólice n.º …….., em que este transferiu para aquela a responsabilidade civil emergente da circulação rodoviária de um motociclo de matrícula ..-..-RN (alínea I da factualidade assente).
3.2.61
Pelo referido contrato o tomador de seguro transferiu para a ora ré a responsabilidade civil emergente da circulação rodoviária do referido veículo, com cobertura de responsabilidade civil de € 1.800.000,00, sendo € 1.200.000,00 por acidente para os danos corporais e € 600.000,00 por acidente para os danos materiais (alínea J da factualidade assente).
4. Fundamentos de direito
4.1 Da culpa exclusiva do condutor do motociclo ou, ao contrário, da culpa do lesado por aceitar fazer-se transportar com excesso de lotação e da elevação da contribuição do lesado para os danos em virtude de circular sem capacete de protecção
A recorrente independente, sem enjeitar o preenchimento dos pressupostos da obrigação de indemnizar relativamente ao seu segurado, pugna pela redução da indemnização devida, em montante até 53,3 %, em virtude do lesado ter contribuído para os danos verificados ao aceitar ser transportado com excesso de lotação e sem capacete de protecção.
Ao invés, o recorrente subordinado pugna pela culpa exclusiva do segurado da ré, posição que arrima na eliminação da resposta conclusiva ao artigo 75º da base instrutória.
Cumpre apreciar e decidir.
Recorde-se que quando “um facto culposo do lesado tiver concorrido para a produção ou agravamento dos danos, cabe ao tribunal determinar, com base na gravidade das culpas de ambas as partes e nas consequências que delas resultaram, se a indemnização deve ser totalmente concedida, reduzida ou mesmo excluída” (artigo 570º, nº 1, do Código Civil).
“Se a responsabilidade se basear numa simples presunção de culpa, a culpa do lesado, na falta de disposição em contrário, exclui o dever de indemnizar” (artigo 570º, nº 2, do Código Civil).
“Ao facto culposo do lesado é equiparado o facto culposo dos seus representantes legais e das pessoas de quem ele se tenha utilizado” (artigo 571º, do Código Civil).
No caso em apreço, segundo uma linha lógica de raciocínio, importa começar por verificar se a responsabilidade pelos danos derivados do sinistro deve ser exclusivamente imputada ao segurado da ré.
Na perspectiva do recorrente subordinado, esta conclusão decorre, necessariamente, da eliminação da resposta ao artigo 75º da base instrutória.
Será assim?
Não o cremos, pelas razões que passamos a expor.
A eliminação da resposta ao artigo 75º da base instrutória resultou de se ter entendido estar em causa matéria conclusiva para a qual não eram necessários conhecimentos especiais e, além disso, porque a configuração do nexo causal implica forçosamente o manejo de formulações trabalhadas pela dogmática jurídica.
No entanto, logo se referiu que a eliminação então decidida não contendia com o dever de nesta sede se formularem as necessárias conclusões, de facto e de direito, em face dos factos concretos provados.
No caso em apreço, resultou provado que o recorrente subordinado, por força do acidente em que esteve envolvido sofreu, entre outras, as seguintes lesões:
- traumatismo cranio-encefálico[19] grave, com edema difuso, hemorragia sub-aracnóideia na cisura interpeduncular e sobre a tenda do cerebelo, apagamento dos sulcos corticais e sangue intraventricular nos trígonos e cornos occipitais (veja-se a alínea a), da resposta ao artigo 5º da base instrutória, no ponto 3.2.30 dos fundamentos de facto deste acórdão).
Mais se provou que o “condutor e os passageiros do mesmo circulavam no motociclo sem que fossem portadores de capacete de protecção (resposta ao artigo 70º da base instrutória, constante do ponto 3.2.23 dos fundamentos de facto deste acórdão).
É do conhecimento comum que o capacete de protecção tem como finalidade precípua a protecção da cabeça do respectivo utente. Trata-se de um equipamento de segurança, de uso obrigatório em ciclomotores, motociclos, com ou sem carro lateral, triciclos e quadriciclos e sujeito a aprovação oficial (veja-se o artigo 82º, nº 3, do Código da Estrada na redacção vigente na data do acidente).
Neste circunstancialismo, parece lícito concluir que o uso de capacete de protecção por parte do recorrente subordinado teria feito com que as lesões que sofreu na cabeça não tivessem a gravidade que tiveram. De facto, as lesões que o recorrente subordinado sofreu na cabeça não são de modo algum de todo em todo indiferentes ao não uso daquele acessório de protecção e, ao invés, são uma consequência normal e típica dos sinistros envolvendo veículos de duas rodas, quando esse mecanismo de protecção não é usado.
No quadro que se acaba de enunciar, há que concluir, como se concluiu em primeira instância, que o recorrente subordinado, ao não usar capacete de protecção e ao fazer-se assim transportar num motociclo se expôs a um risco acrescido de lesões na parte superior do seu corpo, como efectivamente veio a suceder, devendo por isso ser também considerado responsável pelos danos ocorridos nessa zona do corpo. Nesta medida, improcede a pretensão do recorrente subordinado de que o segurado da ré seja considerado único e exclusivo culpado pelo sinistro verificado.
Antes ainda de proceder à fixação do grau de contribuição para tais danos por parte do recorrente subordinado, analisemos o outro título de imputação de “responsabilidade” ao sinistrado invocado pela recorrente independente.
A recorrente independente sustenta que face à factualidade provada no que respeita a lotação do veículo envolvido no acidente, existe culpa do lesado.
Na decisão recorrida, citando-se extensamente o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, alegadamente de uniformização de jurisprudência[20], de 20 de Janeiro de 2010, relatado pelo Sr. Juiz Conselheiro João Bernardo, no processo nº 346/1998.P1.S1, conclui-se pela inexistência de factualidade provada que permita concluir que o excesso de lotação foi causal do despiste ocorrido.
No que respeita esta questão suscitada pela recorrente independente provou-se:
- No dia 2 de Julho de 2009, cerca das 22 horas e 30 minutos, já de noite, na …, …, …, Paredes, na Estrada Nacional nº …, ocorreu um acidente de viação (alínea A da factualidade assente, ponto 3.2.1 dos fundamentos de facto deste acórdão).
- Foram intervenientes: o motociclo de marca Yamaha …, modelo …, particular de matrícula ..-..-RN, tripulado por D…, no sentido … – … e no qual seguia como passageiro o autor, sentado no motociclo imediatamente atrás do condutor (alínea B da factualidade assente, ponto 3.2.2 dos fundamentos de facto deste acórdão);
- O veículo interveniente no sinistro em apreço nos autos é um motociclo de marca Yamaha modelo …, com lotação máxima de duas pessoas (resposta ao artigo 50º da base instrutória, ponto 3.2.17 dos fundamentos de facto deste acórdão);
- Dispondo unicamente de dois assentos de transporte, um destinado ao condutor e outro destinado a um passageiro (resposta ao artigo 51º da base instrutória, ponto 3.2.18 dos fundamentos de facto deste acórdão);
- Acontece que aquando do acidente nele faziam-se transportar três pessoas, fora dos assentos existentes (respostas aos artigos 52º e 53º da base instrutória, ponto 3.2.19 dos fundamentos de facto deste acórdão);
- O total do peso dos três passageiros era superior à tara máxima aconselhável de 180 Kgs. (resposta aos artigos 54º e 55º da base instrutória, ponto 3.2.20 dos fundamentos de facto deste acórdão);
- O autor aceitou transportar-se em excesso de lotação (resposta ao artigo 74º da base instrutória, ponto 3.2.25 dos fundamentos de facto deste acórdão);
- O veículo “..-..-RN” antes de embater no poste de iluminação em betão e suporte de sinal, numa posição normal de marcha, circulou na valeta de escoamento de águas pluviais, situada no lado direito da via, atento o sentido de marcha daquele veículo (resposta ao artigo 3º da base instrutória, ponto 3.2.27 dos fundamentos de facto deste acórdão).
Antes ainda de entrar na dilucidação desta questão deve notar-se que a matéria de facto constante do ponto 3.2.19 dos fundamentos de facto deste acórdão não pode ser interpretada à letra, ou seja, não pode ser entendida como se o condutor do motociclo e qualquer dos dois passageiros se fizessem transportar fora dos assentos do motociclo[21]. O sentido dessa factualidade é antes o de que havendo apenas dois assentos no veículo, um dos passageiros ia necessariamente fora de um assento.
A factualidade provada permite-nos concluir, de forma inequívoca, que o transporte do autor, no momento do acidente, se efectuava com violação do disposto no nº 3, do artigo 54º do Código da Estrada.
Indo o recorrente subordinado sentado imediatamente atrás do condutor do motociclo, é lícito presumir que iria sentado num assento do veículo e que apenas o segundo passageiro iria na totalidade ou em parte fora de qualquer assento. Não é verosímil que o condutor do motociclo se fizesse transportar fora do assento, eventualmente sobre o depósito do veículo, já que isso, salvo se se tratasse de pessoa com uma altura muito grande, o impediria de accionar o travão de pé e as mudanças do motociclo.
Porém, não resulta da factualidade provada que o sinistro tenha sido causado pelo excesso de lotação ou pela circulação fora dos assentos. Desconhece-se a medida do excesso da tara do motociclo, pois apenas se provou que o condutor e os dois passageiros pesavam mais de cento e oitenta quilogramas, sendo a tara máxima do veículo de cento e oitenta quilogramas.
A dinâmica do sinistro não dá nota de qualquer desequilíbrio ou dificuldade na condução resultante do excesso de lotação do veículo, tanto mais que se provou que o motociclo, “antes de embater no poste de iluminação em betão e suporte de sinal, numa posição normal de marcha, circulou na valeta de escoamento de águas pluviais, situada no lado direito da via, atento o sentido de marcha daquele veículo.”
Por outro lado, relativamente aos danos verificados, não existe factualidade provada que permita inferir que a violação da lotação do motociclo foi pelo menos concausal deles.
Assim, tudo sopesado, conclui-se, como o tribunal a quo, não se ter provado que o excesso de lotação do veículo sinistrado teve alguma incidência quer no acidente propriamente dito, quer nos danos verificados na pessoa do recorrente subordinado, não devendo tal circunstância ser relevada em sede de culpa do lesado.
É tempo agora de graduar a contribuição da culpa do lesado decorrente de se fazer transportar no momento do sinistro sem usar capacete de protecção.
Na decisão recorrida, no que respeita esta questão escreveu-se o seguinte:
“Assim, devemos socorrer-nos de regras de experiência – presunções judiciais – para concluir que, tendo as lesões ocorrido na cabeça, a falta de capacete agravou-as, sendo esse agravamento de imputar ao próprio autor que circulava no motociclo sem capacete.
Se assim não fosse, talvez aquelas lesões sofridas no acidente não tivessem tido aquela gravidade, ou pelo menos, a cabeça da vítima não estaria exposta ao perigo da maneira que esteve. Portanto, há que considerar a contribuição da vítima para o resultado que consistiu nos ferimentos sofridos na cabeça.
A falta de capacete de protecção por parte dos motociclistas, em caso de colisão com outros veículos, pode ocasionar, nos próprios, graves traumatismos cranianos (por vezes, fatais), sendo tal facto uma concausa do dano, em concorrência com a condução negligente do condutor do motociclo a que nos referimos anteriormente.
A dúvida sobre se os ferimentos sofridos pela vitima na zona da cabeça teriam ocorrido caso esta tivesse protegido a cabeça usando o capacete legal, não é susceptível de pôr em crise o nexo de causalidade adequada existente entre a conduta do condutor do motociclo e os ferimentos apresentados pelo autor.
Nenhuma circunstância estranha, anormal, interrompeu o nexo causal entre a conduta do condutor do motociclo e o resultado, pelo que dúvidas não há de que os ferimentos da vítima se devem considerar como consequência necessária daquela [Como é sabido, a nossa lei acolheu a doutrina da causalidade adequada (art. 563 do C. Civil). Sobre esta doutrina (e suas formulações positiva e negativa), v., com muito interesse, Ac. do STJ de 1 de Fevereiro de 2000, BMJ n.º 494 e segs. e respectivas anotações.].
É certo que o autor circulava no motociclo sem levar colocado na cabeça o capacete de protecção, em infracção, portanto, ao disposto no art. 82, n.º 2 do C. da Estrada.
Todavia, como tem sido entendimento dominante na jurisprudência, o uso deste não tem a ver com as normas estradais que regulam a forma de circulação dos veículos de modo a evitar a eclosão dos acidentes.
A norma do art. 82, n.º 2 do C. da Estrada visa, apenas, a protecção física dos condutores e passageiros de motociclos Neste sentido, Ac. do STJ de 6.10.82, BMJ n.º 320, p. 319; Ac. da RP de 27.11.95, BMJ n.º 451, p. 501. Cfr., também, o Ac. Do STJ de 15.12.98, CJ ACS do STJ, VI, III, 156, no qual, se entendeu que “Em acidente de viação a falta de capacete de protecção da vitima só releva, para efeitos do n.º 1 do art. 570º do C.Civil, quando o acidente é imputável ao condutor do veículo de duas rodas (e já não quando o mesmo é da responsabilidade de terceiro)” -ponto I do Sumário. No sentido de que “A vitima concorre para a produção do acidente, se conduzia o velocípede motorizado sem levar capacete e foram lesões crânio-encefálicas que lhe causaram a morte”, decidiu, no entanto, o Ac. da RP de 12.11.86, CJ XI, V, 248 (ponto IV do Sumário).].
O autor sofreu TCE grave, com edema difuso, hemorragia sub-aracnoideia na cisura interpedencular e sobre a tenda do cerebelo, apagamento dos sulcos corticais e sangue intaventricular nos trigonos e cornos occipitais ( ponto 13 a) ) e caso tivesse utilizado capacete de protecção estas lesões cerebrais não assumiriam a mesma gravidade ( ponto 54 ).
Porém, não podemos ignorar que a maior parte das lesões sofridas pelo autor não se situam na zona da cabeça, nomeadamente EC Glasgow-13, Pneumotórax hipertensivo bilateral, traumatismo cervical, com fractura das apófises transversas C4 e D1 e achatamento da C4, fractura da omoplata direita, fractura do 2 e 3 metacarpo da mão direita, politraumatismos, esplenectomia do baço, perfuração do pulmão, perfuração do intestino, lesão do plexo braquial direito C5 e C6, múltiplas escoriações pelo corpo ( cfr. ponto 13 da matéria de facto provada ) e, como tal, não podiam ser evitadas ou serem menos gravosas pelo uso de capacete.
Termos em que face ao exposto, considera este Tribunal que existiu uma concorrência de culpas do autor e do condutor do motociclo no que se reporta à produção das lesões numa proporção, respectivamente, de 5% e de 95%, em conformidade com o disposto no art. 570º do C.Civil.”
As lesões do autor que se apresentam em relação de causalidade com a falta de uso de capacete de protecção são logicamente as que sofreu na cabeça.
Porém, como justamente se observa na decisão recorrida, estas lesões constituem apenas parte das lesões sofridas pelo lesado, sendo certo que as que tiveram maior projecção em termos de sequelas para o autor foram as que se verificaram noutras zonas do corpo, que não a cabeça, especialmente as que afectaram o membro superior activo do autor e que são impeditivas do exercício da profissão que desempenhava na data do sinistro.
Há que reconhecer que não existem dados de facto que permitam quantificar de forma exacta o “peso” relativo que as lesões sofridas pelo autor na sua cabeça têm no total dos danos que padeceu e das respectivas sequelas. No entanto, é esmagador o “peso” relativo dos restantes danos e sequelas face aos mencionados danos na cabeça, pelo que, num tal quadro, revela-se ajustada a proporção encontrada pelo tribunal a quo: 5% para o lesado e 95% para o segurado da ré.
Assim, no que respeita estas questões suscitadas quer em sede de recurso independente, quer no recurso subordinado, improcedem ambos os recursos, mantendo-se o que foi decidido pelo tribunal a quo.
4.2 Do excesso da indemnização arbitrada a título de danos patrimoniais futuros ou, ao invés, da sua insuficiência
A recorrente independente suscita a questão do excesso da indemnização arbitrada a título de danos patrimoniais futuros, pugnando pela sua redução para o montante de cem mil euros. Esta recorrente firma fundamentalmente a sua posição na afirmação de que a IPG que afecta o recorrido e recorrente subordinado não contende com a sua capacidade de ganho, por não estar provado que o lesado esteja impedido de exercer a sua profissão e de obter outras remunerações.
Pelo contrário, o recorrente subordinado pugna pela elevação da indemnização arbitrada a título de danos patrimonial futuro, entendendo que para o efeito é adequado o montante de duzentos e cinquenta mil euros. Este recorrente firma esta sua pretensão, quer em sede de alegações, quer em sede de conclusões, na simples afirmação de que “face à gravidade dos danos patrimoniais o justo seria atribuir ao A./Recorrente a este título a quantia de €250.000,00.”
Na decisão recorrida, a propósito deste dano cuja quantificação é questionada por ambas as partes escreveu-se o seguinte:
- “Pede o autor a quantia de € 450.000,00 (alínea c)) por ter ficado a padecer de uma I.P.G. de 80 pontos.
No caso dos autos resulta que o autor apresenta uma incapacidade permanente fixável em 48 pontos, sendo tais sequelas impeditivas do exercício da actividade profissional habitual, mas compatíveis com outras profissões da área da sua preparação técnico profissional (ponto 15).
Cumpre dizer que esta incapacidade (Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica) refere-se à afectação definitiva da integridade física e / ou psíquica da pessoa, com repercussão nas actividades da vida diária, incluindo as familiares e sociais, e sendo independente das actividades profissionais, corresponde ao dano que vinha sendo tradicionalmente designado por incapacidade permanente geral, nomeadamente como dano biológico. Este dano é avaliado relativamente à capacidade integral do individuo (100 pontos), considerando a globalidade das sequelas (corpo, funções e situações de vida).
Ora, a incapacidade sofrida acarreta a perda de rendimentos do trabalho já que o autor ficou impossibilitado de exercer a sua actividade profissional habitual.
Esta incapacidade permanente geral de 48 pontos de que a demandante ficou a padecer é um dano corporal, o chamado dano biológico, que consiste «na diminuição ou lesão da integridade psico-física da pessoa, em si e por si considerada, e incidindo sobre o valor homem em toda a sua concreta dimensão» - João António Álvaro Dias, “Dano Corporal, Quadro Epistemológico e Aspectos Ressarcitórios”, Colecção Teses, Almedina, Coimbra, 2001, p. 272.
A jurisprudência, maioritariamente, atribui cariz patrimonial ao dano biológico [v., entre outros, Ac.STJ de 19/5/2009 e 7/6/2011, in www.dgsi.pt].
Em abono deste entendimento, o acento é posto no esforço suplementar que uma limitação funcional implica, tornando mais penosa a vida da pessoa afectada. «Mesmo não havendo uma repercussão negativa no salário ou na actividade profissional do lesado – por não se estar perante uma incapacidade para a sua actividade profissional concreta - pode verificar-se uma limitação funcional geral que terá implicações na facilidade e esforços exigíveis o que integra um dano futuro previsível, segundo o desenvolvimento natural da vida, em cuja qualidade se repercute.» -Ac.STJ de 27/10/2009, proc.560/09.0YFLSB, in www.dgsi.pt Porém, também é licito defender-se que o ressarcimento do dano biológico deve ser feito em sede de dano não patrimonial. Como se escreveu no citado Ac.STJ de 27/10/2009 «Nesta perspectiva, há que considerar, desde logo, que o exercício de qualquer actividade profissional se vai tornando mais penoso com o decorrer dos anos, o desgaste natural da vitalidade (paciência, atenção, perspectivas de carreira, desencantos …) e da saúde, tudo implicando um crescente dispêndio de esforço e energia.
E esses condicionalismos naturais podem é ser agravados, ou potenciados, por uma maior fragilidade adquirida a nível somático ou em sede psíquica.
Ora, tal agravamento, desde que não se repercuta directa – ou indirectamente – no estatuto remuneratório profissional ou na carreira em si mesma e não se traduza, necessariamente, numa perda patrimonial futura ou na frustração de um lucro, traduzir-se-á num dano moral.
Isto é, o chamado dano biológico tanto pode ser ressarcido como dano patrimonial, como compensado a título de dano moral. A situação terá de ser apreciada casuisticamente, verificando se a lesão origina, no futuro, durante o período activo do lesado ou da sua vida e, só por si, uma perda da capacidade de ganho ou se traduz, apenas, uma afectação da sua potencialidade física, psíquica ou intelectual, para além do agravamento natural resultante da idade. E não parece oferecer grandes dúvidas que, no caso em apreço, a lesão implica uma perda da capacidade de ganho já que o autor não pode voltar a exercer a sua actividade profissional habitual, sendo difícil que consiga encontrar um trabalho compatível com outras profissões da área da sua preparação técnico profissional que utilize unicamente o membro superior esquerdo (conforme se refere na perícia elaborada pelo I.M.L. a fls.364v.), o que a acontecer implica um maior esforço da sua parte.
Isto posto, e considerando tal factualidade temos que, em nosso entender, não estamos perante uma mera necessidade de um maior dispêndio de esforço e de energia, ou seja, de esforços suplementares, traduz-se numa perda efectiva de rendimento já que o autor está impedido de exercer a sua actividade habitual, o que implica uma privação da sua capacidade de ganho.
E mesmo que venha a exercer uma actividade da área da sua preparação técnico profissional onde utilize unicamente o membro superior esquerdo, tal poderá implicar uma menor retribuição salarial.
Embora o lesado se encontre apenas parcialmente privado da capacidade de exercício da sua profissão, certo é que, em concreto, não vem provado o seu exercício de outra profissão da área da sua preparação técnico-profissional.
Concedendo-se, mesmo por raciocínio a possibilidade que poderá ter o lesado de se reconverter profissionalmente, sempre o facto será mais penoso para quem se encontra diminuído e sempre um ónus que lhe foi imposto, que não uma opção livre assumida sem que para tanto haja contribuído.
Nos cálculos a ter em conta sempre se dirá que quanto à esperança de vida aquela que importa não é a esperança da vida activa mas a esperança média de vida. O número de anos que importa ter em conta não é o número de anos que falta atingir para a idade da reforma, mas sim para a idade correspondente à esperança média de vida da vítima (isto é, o que importa é o tempo provável de vida da vítima). A referência ao tempo provável de vida da vítima foi opção seguida pelo acórdão do STJ de 28/9/1995, publicado na CJ.STJ.95.III, pág. 36 (: “finda a vida activa do lesado não é razoável ficcionar que também a vida física desaparece no mesmo momento e com ela todas as necessidades do lesado e, por outro lado, geralmente, continua a receber remunerações, ou como pensão de aposentação da própria profissão, ou como prestação da segurança social”) e nos acórdãos do STJ de 16/3/1999, CJ.STJ.99.I.167, de 25/7/2002, na CJ.STJ.2002.II.128. E passou a ser seguida por grande parte da jurisprudência, principalmente a partir do momento em que tal referência foi adoptada no parecer do Provedor de Justiça a propósito do caso da ponte de Entre-os-Rios (parecer de 19/03/2001, publicado no Diário da República, II série, nº. 96, de 24/4/2001, págs. 7139 e segs., especificamente ponto 38, nota 17):
De todo o modo, no que respeita ao cálculo da respectiva indemnização, não pode deixar de se atentar na circunstância de, à semelhança do que se passa na fixação do montante da indemnização correspondente aos danos não patrimoniais, serem decisivos os critérios de equidade (cfr. o art. 496º, nº3, do C.Civil).
Na verdade, tratando-se de um dano futuro no âmbito de um longo período de previsão, no caso concreto com perda ou diminuição da remuneração, mas apenas um esforço acrescido para se manterem os mesmos níveis de ganho, é manifesta a dificuldade de cálculo da respectiva indemnização, pelo que, é fundamental a ampla utilização de juízos de equidade, tendo-se em conta os pertinentes elementos de facto apurados. Note-se que a indemnização em dinheiro tem como medida a diferença entre a situação patrimonial do lesado na data mais recente que puder ser atendida pelo tribunal e a que ele teria então se não tivesse ocorrido o dano, e que, não podendo ser determinado o seu valor exacto, o tribunal julgará equitativamente dentro dos limites que tiver por provados (art.566º, nºs 2 e 3, do C.Civil). (vide in d.g.s.i.pt - Ac. do Tribunal da Relação de Lisboa, sendo o seu Relator Roque Nogueira).
No caso em apreço, considerando as sequelas com que ficou o autor em consequência das lesões, e tendo 20 anos aquando dos factos, o salário que o mesmo auferia, afigura-se justa e adequada a indemnização pelo dano biológico no montante de € 165.000,00.”
Cumpre apreciar e decidir.
É jurisprudência corrente assente no direito processual civil vigente (artigos 635º, nº 4 a 639º, nºs 1 e 3, ambos do Código de Processo Civil, na redacção actualmente vigente) que, não estando em causa matéria de conhecimento oficioso do tribunal, as conclusões de recurso balizam os poderes de cognição do tribunal ad quem.
Este preâmbulo vem a propósito, em primeiro lugar, da total falta de razões invocadas pelo recorrente subordinado para peticionar o aumento da indemnização por perda da capacidade de ganho futura. Na verdade, alegar-se, sem mais, como alegou este recorrente, que face à gravidade dos danos patrimoniais o justo seria atribuir a tal título a importância de duzentos e cinquenta mil euros é uma mera asserção infundamentada, sem qualquer aptidão para desencadear a reapreciação do juízo efectuado pelo tribunal a quo para fixar esta indemnização.
Neste circunstancialismo, por força da inocuidade das alegações e conclusões do recurso do recorrente subordinado, nesta vertente, não estando em causa matéria de conhecimento oficioso deste tribunal, há que concluir que não estão reunidas as condições legais para que este tribunal proceda a uma efectiva reapreciação do juízo do tribunal a quo, no que tange esta questão e no que respeita a insuficiência do montante arbitrado a título de dano patrimonial futuro.
Em segundo lugar, tanto as alegações como as conclusões da recorrente independente relativamente a esta questão assentam num pressuposto indemonstrado, ou seja, o pressuposto de que a IPG que afecta o recorrido e recorrente subordinado não contende com a sua capacidade de ganho, por não estar provado que o lesado esteja impedido de exercer a sua profissão e de obter outras remunerações, estando até demonstrado um pressuposto contrário a um daqueles que são invocados pela recorrente independente.
Na verdade, provou-se que o “autor apresenta uma incapacidade permanente fixável em 48 pontos, sendo tais sequelas impeditivas do exercício da actividade profissional habitual, mas compatíveis com outras profissões da área da sua preparação técnico profissional”[22] (resposta ao artigo 8º da base instrutória, ponto 3.2.32 dos fundamentos de facto deste acórdão).
Neste circunstancialismo, está provado o impedimento do recorrente subordinado para exercer a sua actividade profissional habitual e a consequente projecção económica negativa resultante desse impedimento.
A possibilidade de exercício de outras profissões da área da sua preparação técnico profissional é uma afirmação genérica e de duvidosa concretização futura na medida em que exigirá que não seja utilizado o membro superior direito do lesado[23].
Soçobrando as razões aduzidas pela recorrente independente para fundamentar a sua pretensão de redução da indemnização arbitrada a título de dano patrimonial futuro, na falta de qualquer outra crítica que a sustente, há que concluir pela manutenção do valor fixado pelo tribunal a quo.
No entanto, acautelando entendimentos díspares do sustentado nesta decisão quanto à amplitude do dever de cognição deste tribunal, no que tange a questão do dano patrimonial futuro, sempre se dirá mais o seguinte, reproduzindo, com as necessárias adaptações o que se deixou escrito no acórdão proferido no processo nº 125/09.7TBBAO.P1, a 25 de Novembro de 2013 e também subscrito pelos Colegas Juízes-adjuntos.
A determinação do montante indemnizatório devido pela perda da capacidade de ganho é uma operação melindrosa e é-o tanto mais quanto maior é o horizonte temporal a ter em conta e a maior ou menor instabilidade da situação envolvente. Em ordem a imprimir uma maior objectividade na fixação dos montantes indemnizatórios, dando execução ao imperativo de justiça e legal de uma tendencial aplicação uniforme do direito (artigo 8º, nº 3, do Código Civil), a jurisprudência tem-se mostrado favorável à adopção de critérios matemáticos[24], temperados pelas regras da equidade, sobretudo tendo em consideração casos análogos anteriormente decididos.
Neste contexto, as tabelas financeiras, tal como as tabelas constantes das Portarias nº 377/2008, de 26 de Maio e nº 679/2009, de 25 de Junho, podem servir de indicador[25] e definir o patamar inferior da indemnização a arbitrar[26].
Os princípios fundamentais adoptados pelo Supremo Tribunal de Justiça nesta matéria, resumidos na citação[27] constante do acórdão de 05 de Julho de 2007, no processo nº 07A1734, relatado pelo Sr. Juiz Conselheiro Nuno Cameira, acessível no site da DGSI, são os seguintes:
“1ª) A indemnização deve corresponder a um capital produtor do rendimento que a vítima não auferirá e que se extingue no final do período provável de vida;
2ª) No cálculo desse capital interfere necessariamente, e de forma decisiva, a equidade, o que implica que deve conferir-se relevo às regras da experiência e àquilo que, segundo o curso normal das coisas, é razoável;
3ª) As tabelas financeiras por vezes utilizadas para apurar a indemnização têm um mero carácter auxiliar, indicativo, não substituindo de modo algum a ponderação judicial com base na equidade;
4ª) Deve ser proporcionalmente deduzida no cômputo da indemnização a importância que o próprio lesado gastaria consigo mesmo ao longo da vida (em média, para despesas de sobrevivência, um terço dos proventos auferidos), consideração esta que somente vale no caso de morte;
5ª) Deve ponderar-se o facto de a indemnização ser paga de uma só vez, o que permitirá ao seu beneficiário rentabilizá-la em termos financeiros; logo, haverá que considerar esses proveitos, introduzindo um desconto no valor achado, sob pena de se verificar um enriquecimento sem causa do lesado à custa alheia;
6ª) Deve ter-se preferencialmente em conta, mais do que a esperança média de vida activa da vítima, a esperança média de vida, uma vez que, como é óbvio, as necessidades básicas do lesado não cessam no dia em que deixa de trabalhar por virtude da reforma (em Portugal, no momento presente, a esperança média de vida dos homens já é de sensivelmente 73 anos[28], e tem tendência para aumentar; e a das mulheres chegou aos oitenta)”.
No caso em apreço, afigura-se-nos que a indemnização a arbitrar a título de redução da capacidade de ganho há-de ser encontrada entre o máximo obtido pelo critério matemático simples correspondente à capitalização da redução patrimonial ficcionada no período da esperança de vida laboral que o lesado teria e o patamar mais elevado fornecido pelas tabelas financeiras, tendo em conta a mesma esperança de vida, ou seja, varia entre € 212.363,8272 (€ 4.424,464 x 48 anos) e € 116.339,227926704 (coeficiente de 26,294536 x € 4.424,464). Estes valores devem ser majorados dado que o termo da vida laboral não é em condições normais o termo da vida das pessoas, devendo para tanto considerar-se um período de pelo menos mais sete anos.
No caso decidendo, importa reter a idade do autor à data da consolidação das lesões (vinte e dois anos), a data previsível em que iria sair do mercado de trabalho (setenta anos), pelo que para o termo da sua vida laboral, distam quarenta e oito anos, o seu rendimento anual de € 9.217,18 (€ 658,37 x 14)[29] e a incapacidade parcial genérica de quarenta e oito pontos.
Ponderam-se ainda, em termos comparativos[30], as circunstâncias concretas dos lesados no processo nº 756/08.2TBVIS.C1, do Tribunal da Relação de Coimbra[31], no processo nº 4129/06.3TBSXL.L2-2, do Tribunal da Relação de Lisboa[32], bem como as de todos os lesados que vêm referenciados neste último acórdão, isto é, acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 07 de Junho de 2011, no processo nº 524/07.9TCGMR.G1.S1[33], acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 07 de Outubro de 2010, no processo nº 839/07.6TBPFR.P1.S1[34], acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16 de Fevereiro de 2012, proferido no processo nº 1043/03.8TBMCN.P1.S1[35], acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 06 de Outubro de 2011, no processo nº 733/06.8TBFAF.G1.S1[36], acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 25 de Junho de 2009, proferido no processo nº 08B3234[37], acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 26 de Janeiro de 2010, proferido no processo nº 220/2001-7.S1[38], acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 07 de Junho de 2011, proferido no processo nº 3042/06.9TBPNF.P1.S1[39], acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 2011, proferido no processo nº 52/06.0TBVNC.G1.S1[40], acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 07 de Junho de 2011, proferido no processo nº 160/2002.P1.S1[41], acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 01 de Junho de 2011[42], acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17 de Maio de 2011[43] e o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29 de Junho de 2011, proferido no processo nº 345/06.PTPDL.L1.S1[44]. Ponderam-se ainda para o efeito já indicado os seguintes acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça proferidos já no decurso dos anos de 2012 e 2013:
- de 19 de Abril de 2012, no processo nº 3046/09.0TBFIG.S1[45];
- de 02 de Maio de 2012, no processo nº 1011/2002.L1.S1[46];
- de 08 de Maio de 2012, no processo nº 3492/07.3TBVFR.P1[47];
- de 02 de Julho de 2012, no processo nº 3243/09.9TBVNG.P1.S1[48];
- de 10 de Outubro de 2012, no processo nº 632/2001.G1.S1[49];
- de 21 de Março de 2013, no processo nº 565/10.9TBVPL.S1[50];
- de 06 de Junho de 2013, no processo nº 303/09.9TBVPA.P1.S1[51].
Assim, tudo sopesado, tendo em conta que o valor arbitrado pelo tribunal a quo já envolve uma redução de quase 33 % do montante correspondente à capitalização da perda anual estimada e que os valores referenciais obtidos devem ser majorados considerando um período de mais sete anos, correspondente à esperança média de vida depois do termo da vida laboral, nenhuma razão se divisa para que o valor encontrado pelo tribunal recorrido ainda seja mais reduzido, considerando-se adequada a indemnização de cento e sessenta e cinco mil euros arbitrada pelo tribunal a quo.
Pelo exposto, conclui-se que no que respeita estas questões suscitadas quer em sede de recurso independente, quer no recurso subordinado, improcedem ambos os recursos, mantendo-se o que foi decidido pelo tribunal a quo.
4-3 Do excesso da compensação arbitrada a título de danos não patrimoniais ou, ao invés, da sua insuficiência
A recorrente independente sustenta que, face à factualidade provada relativamente aos danos não patrimoniais sofridos pelo recorrido, a compensação de tais danos deve ser fixada em vinte e cinco mil euros, em vez dos quarenta e cinco mil euros arbitrados na sentença sob censura.
Ao invés, o recorrente subordinado sustenta que para a compensação dos mesmos danos não patrimoniais é adequada a importância de sessenta mil euros.
Na decisão recorrida, a propósito da compensação devida pelos danos não patrimoniais sofridos pelo autor escreveu-se o seguinte:
“Passemos agora à consideração dos danos não patrimoniais.
Preceitua o art. 496º, nº 1, do C.Civil, que na fixação da indemnização devem atender-se ao danos não patrimoniais que pela sua gravidade mereçam a tutela do direito.
Tem-se entendido doutrinal e jurisprudencialmente, que a merecem, aqueles danos que “espelham uma dor, angustia, desgosto ou sofrimento”.
Entende-se igualmente, que é pecuniariamente compensável o abalo moral sofrido pelo receio natural pela integridade física.
Da factualidade provada resulta que o autor esteve em coma induzido durante um período de 15 dias, submeteu-se, no dia 19/03/2010, a cirurgia reconstrutiva e paliativa do plexo braquial direito e no dia 11 de Outubro de 2010, submeteu-se a nova intervenção cirúrgica reconstrutiva que consistiu no transplante do músculo trapézio para abdutor e estabilizador do ombro direito e imobilização com aparelho toraco-braquial (ponto 55).
Os ferimentos e tratamentos a que o autor teve de submeter-se causaram-lhe fortíssimas dores, tristeza e medo (ponto 28). Sente dores quando há mudanças de tempo ou efectua esforços (ponto 29), perdeu uma parte da capacidade de inter-relacionamento social, sentindo-se mais constrangido e intimidado, sendo que era pessoa alegre e bem disposta e após o acidente ficou mais triste (pontos 30 e 31).
Em virtude das sequelas deixou de poder realizar gestos e praticar actividades desportivas que impliquem o uso do membro superior direito (ponto 32). Por causa das sequelas o autor ficou com um dano estético permanente fixável no grau 4/7 (ponto 33)
Ora, não restam dúvidas que este abalo moral sofrido pelo autor se analisa num dano não patrimonial relevante - merecedor da tutela do direito - quer se opte pela formulação negativa, que inclui nesta categoria todos aqueles que não atingem os bens materiais do sujeito passivo ou que, de qualquer modo, não alterem a sua situação patrimonial - cfr. De Cupis, II Danno, Teoria Generale della Responsabilitá Civile, I, 2ª ed., Milano, 1966, págs. 44 e ss. -, quer pela formulação positiva, segundo a qual, o dano não patrimonial ou dano moral, tem por objecto um bem ou interesse sem conteúdo patrimonial, insusceptível em rigor, de avaliação pecuniária. A indemnização não visa então propriamente ressarcir, tornar indemne o lesado, mas oferecer-lhe uma compensação que contrabalance o mal sofrido - cfr. A. Varela, Das Obrigações em Geral, 4ª ed., pg. 560 e Rui Alarcão, Direito das Obrigações, Coimbra, 1983, pg. 270.
O montante da indemnização correspondente aos danos não patrimoniais deve ser calculado, em qualquer caso (haja dolo ou mera culpa do lesante), segundo critérios de equidade, atendendo ao grau de culpabilidade do responsável, à sua situação económica e à do lesado e do titular da indemnização - art. 494º, “ex vi” do art. 496º, nº 3 do C.Civil -, aos padrões de indemnização geralmente adoptados na jurisprudência, às flutuações do valor da moeda etc., sendo fundamental que tal compensação seja significativa, e não meramente simbólica ou miserabilista.
Aplicando as considerações expostas ao caso vertente e atendendo ao disposto no art. 494º do C.Civil, fixa-se a indemnização peticionada pelos danos morais sofridos pelo autor no montante de € 45.000,00.”
Que dizer?
Pela sua própria natureza, os danos não patrimoniais não são passíveis de reconstituição natural e, por outro lado, nem em rigor são indemnizáveis mas apenas compensáveis pecuniariamente.
A compensação arbitrada nestes casos não é o preço da dor ou de qualquer outro bem não patrimonial, mas sim uma satisfação concedida ao lesado para minorar o seu sofrimento, paliativo que numa sociedade que deifica o dinheiro assume naturalmente esta feição.
Importa ainda não perder de vista que apenas são compensáveis os danos não patrimoniais merecedores de tutela jurídica, estando afastados do círculo dos danos indemnizáveis os simples incómodos (artigo 496º, n.º 1, do Código Civil).
A compensação por danos não patrimoniais é fixada equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494º do Código Civil (primeira parte do nº 3, do artigo 496º do Código Civil). Também nesta vertente importa não perder de vista o disposto no artigo 8º, nº 3, do Código Civil, em ordem a uma aplicação, tanto quanto possível, uniforme do direito.
No caso em apreço, a título de dano não patrimonial sofrido pelo autor deve relevar-se a seguinte matéria de facto:
- na altura do acidente o autor tinha 20 anos de idade (nasceu a 01 de Abril de 1989) (alínea H da factualidade assente, ponto 3.2.28 dos fundamentos de facto deste acórdão);
- por causa do embate a que se alude no facto 3º, o autor foi projectado ao solo sofrendo lesões (resposta ao artigo 4º da base instrutória, ponto 3.2.29 dos fundamentos de facto deste acórdão);
- essas lesões consistiram em:
a) TCE grave, com edema difuso, hemorragia sub-aracnoideia na cisura interpeduncular e sobre a tenda do cerebelo, apagamento dos sulcos corticais e sangue intraventricular nos trígonos e cornos occipitais.
b) EC Glasgow-13.
c) Pneumotórax hipertensivo bilateral.
d) Traumatismo cervical, com fractura das apófises transversas C4 e D1 e achatamento da C4.
e) Fractura da omoplata direita.
f) Fractura do 2º e 3º metacarpo da mão direita.
b) Politraumatismos.
c) Esplenectomia do baço.
d) Perfuração do pulmão.
e) Perfuração do intestino.
f) Lesão do plexo braquial direito C5 e C6.
g) Múltiplas escoriações pelo corpo (resposta aos artigos 5º e 6º da base instrutória, ponto 3.2.30 dos fundamentos de facto deste acórdão);
- mercê dessas lesões, o autor:
a) Foi assistido pelo INEM no local do acidente.
b) Transportado de imediato ao Hospital de S. João no Porto, local onde esteve internado na UCI durante 27 dias.
c) Nesta unidade hospitalar, foi operado com anestesia geral e em coma induzido durante um período de 15 dias.
d) Realizou múltiplos tratamentos de fisioterapia e recuperação quer no Hospital de S. João quer no Centro de Saúde …, quer no Hospital de Santa Maria no Porto quer no Centro Hospitalar do Tâmega e Sousa, EPE.
e) No dia 19/03/2010 foi submetido a cirurgia reconstrutiva e paliativa do plexo braquial direito no F…, Lda., G…, Lda, concretamente à lesão alta do plexo braquial direito e neurotização intra plexoal do nervo cesório para espinhal, neurotização do ramo cubital para músculo cutâneo, neurotização do braquial com ramo do mediano.
f) Está totalmente incapacitado para o trabalho desde a data do acidente, sendo que esteve totalmente incapacitado para o trabalho 729 dias (resposta ao artigo 7º da base instrutória, ponto 3.2.31 dos fundamentos de facto deste acórdão);
- o autor apresenta uma incapacidade permanente fixável em 48 pontos, sendo tais sequelas impeditivas do exercício da actividade profissional habitual, mas compatíveis com outras profissões da área da sua preparação técnico profissional (resposta ao artigo 8º da base instrutória, ponto 3.2.32 dos fundamentos de facto deste acórdão);
- na altura do acidente o autor era um adulto perfeito e saudável (resposta ao artigo 9º da base instrutória, ponto 3.2.33 dos fundamentos de facto deste acórdão);
- o acidente, os ferimentos, os tratamentos a que o autor teve de submeter-se causaram-lhe fortíssimas dores[52], tristeza e medo (resposta ao artigo 26º da base instrutória, ponto 3.2.45 dos fundamentos de facto deste acórdão);
- o autor sente dores quando há mudanças de tempo ou efectua esforços (resposta ao artigo 27º da base instrutória, ponto 3.2.46 dos fundamentos de facto deste acórdão);
- o autor perdeu uma parte da capacidade de inter-relacionamento social, sentindo-se mais constrangido e intimidado (resposta aos artigos 28º e 29º da base instrutória, ponto 3.2.47 dos fundamentos de facto deste acórdão);
- o autor era pessoa alegre e bem disposta e após o acidente ficou mais triste (resposta ao artigo 30º da base instrutória, ponto 3.2.48 dos fundamentos de facto deste acórdão);
- em virtude das sequelas deixou de poder realizar gestos e praticar actividades desportivas que impliquem o uso do membro superior direito (resposta aos artigos 31º e 32º da base instrutória, ponto 3.2.49 dos fundamentos de facto deste acórdão);
- por causa das sequelas o autor ficou com um dano estético permanente fixável no grau 4/7 (resposta aos artigos 34º e 35º da base instrutória, ponto 3.2.50 dos fundamentos de facto deste acórdão);
- no dia 11 de Outubro de 2010, o autor, na sequência do acidente em questão nos autos, teve que se submeter a intervenção cirúrgica reconstrutiva que consistiu no transplante do músculo trapézio para abdutor e estabilizador do ombro direito e imobilização com aparelho toraco-braquial (resposta ao artigo 76º da base instrutória, ponto 3.2.51 dos fundamentos de facto deste acórdão).
Em ordem à realização do desiderato de uma tendencial igualdade na aplicação do direito, à semelhança do que se fez neste acórdão relativamente ao dano patrimonial futuro, importa destacar algumas das decisões mais recentes do nosso Supremo Tribunal de Justiça nesta matéria e que servirão para aferir da correcção do decidido.
Assim, no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 06 de Junho de 2013, proferido no processo nº 303/09.9TBVPA.P1.S1, confirmou-se a fixação pelo Tribunal da Relação de uma compensação de cento e dez mil euros para os danos não patrimoniais sofridos por um lesado com 30 anos de idade, que ficou afectado com uma incapacidade permanente genérica de 52,025 pontos.
Deste acórdão destacam-se ainda as seguintes referências a outras decisões do Supremo Tribunal de Justiça, em matéria de compensação por danos não patrimoniais:
“Pelo acórdão de 20 de Novembro de 2003, proc. nº 03A3450 (www.dgsi.pt), foi atribuída a indemnização de € 32.421,86 a uma lesada que, tendo a idade de 25 anos no momento do acidente, ficou em estado de coma, foi submetida a diversas intervenções cirúrgicas e sofreu lesões graves lesões por todo o corpo, que lhe provocaram cicatrizes profundas e visíveis;
– No acórdão de 15 de Janeiro de 2004, proc. nº 03B926 [53] (www.dgsi,pt), foi arbitrada uma indemnização de € 10,951,92 [54] a uma lesada que tinha 24 anos à data do acidente, à qual foi atribuída uma IPP de 10%, mas que ficou a sofrer de lesões graves e visíveis;
– No acórdão de 4 de Dezembro de 2007, proc. nº 07A3836 (www.dgsi,pt), foi arbitrado o montante de € 35.000 por danos morais a um lesado com 44 anos à data do acidente, na sequência do qual esteve em conta e em perigo de vida durante vários dias e sofreu diversas sequelas, e ao qual foi fixada uma IPP de 47%;
– No acórdão de 24 de Setembro de 2009 (www.dgsi.pt, proc. nº 09B0037) fixou-se em € 40.000 a indemnização por danos não patrimoniais sofridos por um lesado, com 33 anos de idade à data do acidentes, que ficou afectado de uma incapacidade parcial permanente de 18,28% (mas que, no caso, se traduziu em incapacidade total para o trabalho, o que também releva do ponto de vista da indemnização por danos não patrimoniais), que sofreu dores e danos físicos extensos que deixaram sequelas graves, foi sujeito a diversas intervenções cirúrgicas com os consequentes internamentos e períodos de recuperação e de dependência de terceiros, e teve de realizar sucessivos tratamentos, que se prolongaram no tempo;
– No acórdão de 25 de Junho de 2009 (www.dgsi.pt, proc. nº 08B3234), foi atribuída uma indemnização de € 40.000 por danos não patrimoniais a uma jovem de 21 anos, vítima de atropelamento, que sofreu diversas intervenções cirúrgicas, tratamentos e recuperação, ficando afectada de uma incapacidade absoluta durante 12 meses, foi sujeita a diversas intervenções cirúrgicas e teve de realizar sucessivos tratamentos, nomeadamente de recuperação, que se prolongaram no tempo, sofreu danos físicos extensos que deixaram sequelas irreversíveis e gravosas, físicas e emocionais e ficou afectada de uma incapacidade parcial permanente de 50%, com aumento previsto de 3%.;
– Pelo acórdão de 5 de Julho de 2007 (www.dgsi.pt, proc. nº 07A1734), fixou-se “uma indemnização de 85 mil euros por danos morais ao lesado que, bombeiro de profissão, ficou aos 42 anos de idade definitivamente impossibilitado de exercer essa actividade por causa dum acidente de viação de que não foi culpado e cujas consequências foram, entre outras de gravidade paralela, deixar-lhe o braço esquerdo de todo inutilizado (dependurado, preso por uma cinta) até ao final dos seus dias, impossibilitando-lhe a realização, sozinho, de tarefas como vestir-se e lavar-se, e tornar-lhe o andar notoriamente claudicante por virtude da fractura duma rótula” (sumário respectivo).”
Por apresentarem bastantes semelhanças com o caso dos autos, relevam-se ainda os já citados acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça proferidos a 21 de Março de 2013, no processo nº 565/10.9TBVPL.S1 e a 10 de Outubro de 2012, no processo nº 632/2001.G1.S1, ambos acessíveis no site da DGSI.
Tudo sopesado, conclui-se que a compensação arbitrada pelo tribunal a quo, no montante de quarenta e cinco mil euros, é adequada à extensão e gravidade dos danos não patrimoniais sofridos pelo autor e consonante com os valores que em casos similares o nosso Supremo Tribunal de Justiça tem vindo a arbitrar, razão pela qual inexistem razões para alterar a decisão sob censura, improcedendo ambos os recursos também relativamente a esta questão.
Pelo exposto, não obstante a procedência do recurso subordinado relativamente à questão que colocou em sede de matéria de facto, o resultado final dos dois recursos é a improcedência, mantendo-se intocado o dispositivo da sentença sob censura, nos segmentos impugnados.
As custas dos recursos são a cargo de cada um dos recorrentes, por ambos terem decaído[55] (nºs 1 e 2 do artigo 527º do Código de Processo Civil), mas sem prejuízo do apoio judiciário de que goza o recorrente subordinado.
5. Dispositivo
Pelo exposto, em audiência, os juízes abaixo-assinados da quinta secção, cível, do Tribunal da Relação do Porto acordam na parcial procedência do recurso subordinado interposto por B… em declarar não escrita a resposta ao artigo 75º da base instrutória, extirpando-se esta matéria dos fundamentos de facto da decisão recorrida, julgando-se no mais improcedente o recurso subordinado, bem como o recurso independente interposto por “C… – Companhia de Seguros …, S.A.”, deste modo se confirmando a sentença recorrida proferida a 07 de Fevereiro de 2013, nos segmentos impugnados.
Custas de cada um dos recursos a cargo de cada um dos recorrentes, sendo aplicável a secção B, da tabela I, anexa ao Regulamento das Custas Processuais, às taxas de justiça dos recursos, sendo a condenação tributária do recorrente subordinado sem prejuízo do apoio judiciário que lhe foi concedido.
***
O presente acórdão compõe-se de quarenta e quatro páginas e foi elaborado em processador de texto pelo primeiro signatário.

Porto, 03 de Fevereiro de 2014
Carlos Gil
Carlos Querido
Soares de Oliveira
______________
[1] Segue-se, de perto, o relatório da sentença recorrida.
[2] Tratando-se de acção declarativa instaurada após 01 de Janeiro de 2008, visto o conteúdo do artigo 7º, nº 1, da Lei nº 41/2013, de 26 de Junho, tendo ainda presentes os ensinamentos doutrinais contidos na segunda edição do Manual de Processo Civil, da autoria de Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Coimbra Editora 1985, número 19 C), páginas 55 a 57 e sendo estes autos distribuídos neste tribunal já após 01 de Setembro de 2013, é aplicável ao presente recurso, no que respeita as formalidades de preparação, instrução e julgamento do recurso, o regime emergente do Código de Processo Civil aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho, sendo aplicável a lei vigente à data de interposição do recurso no que tange as condições de admissibilidade do recurso. Anote-se que a solução defendida por estes autores relativamente à aferição da admissibilidade de recurso em consequência da alteração das alçadas está proscrita pelo artigo 24º, nº 3, da Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais, aprovada pela Lei nº 3/99, de 13 de Janeiro, solução também acolhida nos artigos 31º, nº 3, da Lei nº 52/2008, de 28 de Agosto e 44º, nº 3, da Lei nº 62/2013, de 26 de Agosto.
[3] Não obstante a enunciação separada das questões suscitadas nas conclusões do recurso independente e do recurso subordinado, o seu conhecimento será feito por ordem lógica. Assim, conhecer-se-á, em primeiro lugar, da questão do carácter conclusivo, excessivo e ambíguo da resposta ao artigo 75º da base instrutória; seguidamente, apreciar-se-á, da culpa exclusiva do condutor do motociclo, bem como da culpa do lesado por aceitar fazer-se transportar com excesso de lotação e da elevação da contribuição do lesado para os danos em virtude de circular sem capacete de protecção; depois, apreciar-se-á se a indemnização arbitrada a título de danos patrimoniais futuros é excessiva ou, ao invés, se é insuficiente; finalmente, apreciar-se-á se a compensação arbitrada a título de danos não patrimoniais é excessiva ou, ao invés, se é insuficiente.
[4] Esta reserva visa salvaguardar o regime aplicável ao direito consuetudinário, local e estrangeiro.
[5] Esta possível inclusão de conceitos jurídicos em sede de decisão da matéria de facto quando sejam do conhecimento comum das pessoas, sempre dependerá de não serem objecto de controvérsia entre as partes (veja-se a exposição exemplar desta problemática in Direito Processual Civil Declaratório, Volume III, Almedina 1982, Artur Anselmo de Castro, páginas 268 a 270).
[6] No sentido da aplicação ao caso do disposto no artigo 646º, nº 4, do Código de Processo Civil, vejam-se os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 23 de Setembro de 2009, proferido no processo nº 238/06.7TTBGR.S1, de 09 de Dezembro de 2010, proferido no processo nº 838/06.5TTMTS.P1.S1 e de 19 de Abril de 2012, proferido no processo nº 30/80.4TTLSB.L1.S1.
[7] Em anotação ao acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 08 de Novembro de 1984, publicada na Revista de Legislação e Jurisprudência, Ano 122, páginas 213 a 224, especialmente a partir da página 219, nº 8.
[8] Neste sentido vejam-se, os acórdãos da Relação de Coimbra de 22 de Junho de 2004, proferido no processo nº 1861/04, de 18 de Janeiro de 2005, proferido no processo nº 2545/04 e de 26 de Janeiro de 2011, proferido no processo nº 221/08.8TBVGS.C1, todos acessíveis no respectivo site da DGSI.
[9] Referimo-nos aos factos psíquicos.
[10] Como exemplos destes juízos periciais de facto podem referir-se a incapacidade para o trabalho, o perigo de ruína (artigo 1226º nº 1 do Código Civil) e a graduação do quantum doloris e do dano estético.
[11] Incluir-se-ão nestes os factos hipotéticos ou conjecturais que não careçam de conhecimentos especiais para serem emitidos, como sucede relativamente à vontade hipotética ou conjectural das partes (artigos 292º, parte final, 293º, parte final e 2202º, parte final, todos do Código Civil.
[12] Não se objecte contra esta afirmação que os juízos de valor não são passíveis de prova, sendo apenas fundados ou infundados, como afirma Michele Taruffo in La Prueba de los Hechos, Editorial Trotta, cuarta edición, páginas 118 e 129, pois é a própria lei substantiva que inclui na matéria da instrução a apreciação de factos em sede de prova pericial. Assim, incluindo-se estes juízos periciais de facto na matéria passível de instrução, esta destinar-se-á a determinar se são fundados ou não, não sendo de excluir que possa incidir sobre juízos periciais de facto contraditórios, destinando-se a instrução, entre outras finalidades, precisamente à determinação do juízo que se reputa fundado ou mais fundado.
[13] Neste sentido veja-se, Manual de Processo Civil, 2ª edição revista e actualizada, de Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Coimbra Editora 1985, página 409, nota 1.
[14] Citámos de novo o acórdão relatado no processo nº 793/10.7TBLMG.P2, a 04 de Novembro de 2013. Apenas a numeração das notas de rodapé não corresponde ao acórdão que temos vindo a citar, alteração decorrente da falta de coincidência do número de notas naquele acórdão e neste.
[15] Atente-se por exemplo, na questão da formulação da teoria da causalidade aplicável ao caso, se a formulação dita positiva, se a formulação denominada negativa. Sobre esta matéria, por todos, veja-se, Das Obrigações em Geral, 6ª edição, Almedina 1989, Volume I, João de Matos Antunes Varela, página 855 a 871, especialmente a página 861.
[16] No Relatório final do INML, nas observações, escreveu-se o seguinte: “Foi detectada a presença de acetaldeido em sangue. A substância detectada, THC-COOH (ácido delta-9-tetrohidrocanabinoico), corresponde a um metabolito inactivo dos canabinóides, nada se podendo prever quanto ao estado de influenciado do indivíduo” (o sublinhado é nosso) De acordo com o Dicionário de Termos Médicos, da Porto Editora, 2005, da autoria de Manuel Freitas e Costa, página 770, coluna da esquerda, um metabolito é uma substância produzida durante os processos metabólicos.
[17] No Relatório final do exame médico efectuado ao autor, em sede de discussão, relativamente à repercussão das lesões na actividade profissional (folha 364 verso), escreveu-se o seguinte: “Repercussão Permanente na Actividade Profissional (corresponde ao rebate das sequelas no exercício da actividade profissional habitual da vítima – actividade à data do evento, isto é, na sua vida laboral, para utilizar a expressão usada na Portaria nº 377/2008, de 26 de Maio, tratando-se do parâmetro de dano anteriormente designado por Rebate profissional). Neste caso, as sequelas são impeditivas do exercício da actividade profissional habitual, sendo no entanto compatíveis com outras profissões da área da sua preparação técnico profissional de que utilize unicamente o membro superior esquerdo.”
[18] Esta referência é ao articulado inicial do incidente de liquidação deduzido pelo autor.
[19] No Dicionário de Termos Médicos, da autoria de Manuel Freitas e Costa, edição da Porto Editora 2005, página 296, coluna da direita, escreve-se “craniencefálico”.
[20] Na decisão recorrida, na senda de referência constante do descritor da base de dados da DGSI, afirma-se que se trata de um acórdão de uniformização de jurisprudência, sendo certo que na identificação do meio processual nesta base de dados consta, correctamente, que se trata de uma revista. Atentando no conteúdo do citado acórdão, constata-se que não consta do mesmo qualquer dispositivo uniformizador de jurisprudência e, além disso, está apenas subscrito por três juízes conselheiros, não tendo havido intervenção do plenário das secções cíveis, como é de lei, no caso de acórdãos de uniformização de jurisprudência (veja-se o artigo 732º-A, nº 1, do Código de Processo Civil, na redacção anterior às alterações introduzidas pelo decreto-lei nº 303/2007, de 24 de Agosto). Acresce ainda que o citado acórdão nunca foi publicado na primeira série do Diário da República, como está legalmente previsto, relativamente aos acórdãos de uniformização de jurisprudência (artigo 732º-B, nº 4, do Código de Processo Civil, na redacção anterior às alterações introduzidas pelo decreto-lei nº 303/2007, de 24 de Agosto).
[21] Aliás, em termos práticos, não sendo o autor e as restantes pessoas transportadas no motociclo acrobatas, mal se vê como poderiam três pessoas circular num motociclo, todas fora dos assentos do veículo.
[22] No Relatório final do exame médico efectuado ao autor, em sede de discussão, relativamente à repercussão das lesões na actividade profissional, escreveu-se o seguinte: “Repercussão Permanente na Actividade Profissional (corresponde ao rebate das sequelas no exercício da actividade profissional habitual da vítima – actividade à data do evento, isto é, na sua vida laboral, para utilizar a expressão usada na Portaria nº 377/2008, de 26 de Maio, tratando-se do parâmetro de dano anteriormente designado por Rebate profissional). Neste caso, as sequelas são impeditivas do exercício da actividade profissional habitual, sendo no entanto compatíveis com outras profissões da área da sua preparação técnico profissional de que utilize unicamente o membro superior esquerdo.”
[23] No relatório pericial afirma-se que o lesado é destro (veja-se folhas 205 destes autos).
[24] Uma operação matemática expedita para encontrar um valor nestes casos consiste no apuramento da perda de rendimento correspondente ao número de anos tidos em conta. No caso dos autos, anualmente, o lesado teria uma perda de € 4.424,464 (658,37 x 48% = 316,0176; 316,0176 x 14 meses = 4.424,464), se se entender que ainda tem uma capacidade laboral reduzida de 48%, correspondendo a tal valor, no período de quarenta e oito anos, correspondente ao termo da vida activa (70 anos) (este período determina-se tendo em conta o tempo que medeia desde a data da consolidação das lesões –14 de Julho de 2011 – até ao termo da vida activa) o capital de € 212.363,8272 (€ 4.424,464 x 48 anos). Este valor é bruto e não entra em consideração com a natureza frutífera do capital.
[25] Neste sentido se orientam o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29 de Março de 2012, relatado pelo Sr. Juiz Conselheiro Sérgio Poças, no processo nº 184/04.9TBARC.P2.S1, embora relativamente a uma hipótese qualificada como de dano biológico e o do Tribunal da Relação de Lisboa, relatado pelo Sr. Juiz Desembargador Jorge Leal, no processo nº 4129/06.3TBSXL.L2-2, ambos acessíveis no site da DGSI.
[26] Aplicando as tabelas financeiras editadas pela Universidade Católica Portuguesa, Lisboa 1981, a uma taxa de 3 % (ver página 26, terceira coluna a contar da direita), para um período temporal de quarenta e oito anos, tem-se um coeficiente de 25,26671 que multiplicado pela perda anual de € 4.424,464, totaliza € 111.791,64879344. Aplicando o coeficiente que consta das Portarias nºs 377/2008 e 679/2009, para um período de quarenta e oito anos (coeficiente de 26,294536), obtém-se o capital de € 116.339,227928704. Estes valores devem ser tomados como patamares inferiores da indemnização a arbitrar porque ponderam já a disponibilidade imediata do capital.
[27] Informa o Sr. Juiz Conselheiro Nuno Cameira que a citação é extraída do seu acórdão de 22 de Março de 2007, proferido na Revista nº 499/07, decisão a que não conseguimos aceder por via electrónica.
[28] Actualmente a esperança de vida para os homens, fazendo fé nos dados constantes da Pordata, situa-se nos setenta e sete anos vírgula três.
[29] No caso dos autos não se determinou se este valor era líquido ou ilíquido. Na Portaria nº 377/2008, numa lógica de persistente cerceamento dos direitos do lesado em face da prática jurisprudencial anterior, determina-se que para cálculo do dano patrimonial futuro se terão em conta os rendimentos líquidos.
[30] Os dados que de seguida se enunciam não podem ser comparados acriticamente pois os critérios utilizados nas diversas decisões que se citam, os dados relevados e a qualificação do dano ressarcido não são coincidentes. Assim, a título de mero exemplo, nuns casos toma-se como referência o salário líquido, noutros casos o salário ilíquido, enquanto noutras situações não se sabe se se trata de salário líquido ou ilíquido; nuns casos fixa-se o termo da perda da capacidade de ganho no fim da vida activa, fixada por vezes em sessenta e cinco anos e noutras vezes em setenta anos, enquanto noutros casos se faz coincidir esse termo com a esperança média de vida do lesado, esperança de vida variável em função do sexo e também em função dos dados estatísticos existentes na data em que é proferida a decisão.
[31] Lesado com vinte e seis anos de idade, à data do sinistro, com um vencimento ilíquido de € 836,34 e uma incapacidade permanente parcial de quinze pontos, tendo em conta o termo da vida activa aos setenta anos, sendo fixada, por maioria, uma indemnização de € 40.000,00, por força de contingências processuais (veja-se a nota 23 do citado acórdão, acessível na base de dados da DGSI).
[32] Lesada com trinta e seis anos de idade, à data do sinistro, vencimento ilíquido de € 797,00, tendo-se tomado como referência o vencimento líquido de € 575,00, uma incapacidade parcial permanente de 18,65 pontos e a esperança média de vida de oitenta e dois anos, sendo fixada, por maioria, uma indemnização de € 45.000,00 (acórdão acessível na base de dados da DGSI).
[33] Acórdão relatado pelo Sr. Juiz Conselheiro Azevedo Ramos e referente a um lesado em acidente ocorrido em 2004, com vinte e três anos de idade, à data do sinistro, com o 12º ano de escolaridade e com o estágio de desenhador gráfico, que ia começar a trabalhar com a retribuição de € 600,00 e que ficou incapacitado para qualquer profissão, paraplégico, para tudo dependente de terceiros, sendo fixada a indemnização pelo dano patrimonial futuro no montante de € 300.000,00.
[34] Acórdão relatado pelo Sr. Juiz Conselheiro Lopes do Rego e referente a um lesado em acidente ocorrido em 2004, com vinte e oito anos de idade, à data do sinistro, com uma incapacidade permanente geral de 80%, totalmente impossibilitado de exercer para o resto da vida qualquer actividade profissional, que auferia um rendimento mensal de € 350,00, fixando-se a indemnização pelo dano patrimonial futuro no montante de € 120.000,00.
[35] Acórdão relatado pelo Sr. Juiz Conselheiro João Bernardo e referente a um lesado em acidente ocorrido em 2001, com cinquenta e um anos de idade, à data do sinistro e que nessa data exercia a profissão de pedreiro, auferindo € 6.500,00 por ano e que ficou totalmente incapacitado para o trabalho e totalmente dependente de terceiros para o dia-a-dia, tendo-se entendido não ser exagerada a quantia de € 100.000,00, a título de danos patrimoniais futuros.
[36] Acórdão relatado pelo Sr. Juiz Conselheiro Orlando Afonso e referente a um lesado em acidente ocorrido em 2005, com cinquenta e quatro anos de idade, à data do sinistro, cantoneiro de profissão, a quem foi atribuída uma incapacidade permanente parcial de 20 %, mas com total incapacidade para a profissão habitual, bem como para todas as actividades que exijam esforços físicos, arbitrando-se a indemnização de € 65.000,00.
[37] Acórdão relatado pela Sra. Juíza Conselheira Maria dos Prazeres Beleza e referente a uma lesada em acidente ocorrido em 1996, com vinte e um anos de idade, à data do sinistro, estudante, residente em França, afectada de uma incapacidade parcial permanente de 50 %, com aumento previsível de 3 %, tendo-se considerado adequada a indemnização por danos patrimoniais futuros no montante de € 110.000,00.
[38] Acórdão relatado pelo Sr. Juiz Conselheiro João Bernardo e referente a um lesado em acidente ocorrido em 2000, com vinte e oito anos de idade, à data do sinistro, pedreiro, que auferia € 6.181,70 por ano e ficou com uma incapacidade parcial permanente de 30 %, com mais 10 % a título de dano futuro e com rebate na actividade profissional, implicando esforços acrescidos, arbitrando-se a quantia de € 80.000,00 pela perda da capacidade de ganho.
[39] Acórdão relatado pelo Sr. Juiz Conselheiro Lopes do Rego e referente a um lesado em acidente ocorrido em 2004, com trinta e um anos de idade, à data do sinistro, economista com elevada qualificação profissional e expectativas de ascensão na carreira, com um rendimento mensal líquido de € 2.200,00, afectado de incapacidade parcial genérica de 29,55 %, com agravamento previsto de mais 10 %, atribuindo-se a indemnização por danos patrimoniais futuros de € 225.000,00.
[40] Acórdão relatado pelo Sr. Juiz Conselheiro Lopes do Rego e referente a uma lesada em acidente ocorrido em 2003, com trinta e dois anos de idade, à data do sinistro, inactiva nessa data, mas tencionando ingressar no mercado laboral como empregada fabril, afectada de uma incapacidade permanente geral de € 20 %, acrescida de um previsível agravamento futuro de mais 10 %, tendo-se fixado a indemnização por danos patrimoniais futuros em € 60.000,00.
[41] Acórdão relatado pelo Sr. Juiz Conselheiro Granja da Fonseca e referente a um lesado em acidente ocorrido em 2000, com vinte e seis anos de idade, à data do sinistro, sócio gerente de uma sociedade, com um rendimento bruto anual de 960.000$00, afectado de uma incapacidade permanente geral de 16 %, sendo as sequelas compatíveis com o exercício da sua actividade profissional, mas com esforços suplementares, negando-se revista, manteve-se a indemnização de € 23.000,00, considerando-se a mesma exígua.
[42] Acórdão relatado pelo Sr. Juiz Conselheiro Manuel Braz e referente a um lesado em acidente ocorrido em 2000, com vinte e dois anos de idade, à data do sinistro, com o 9º ano de escolaridade, com boas perspectivas de seguir carreira militar na classe dos sargentos, auferindo o vencimento mensal de € 1.194,49, afectado de uma incapacidade parcial permanente de 15 %, futuramente ampliada em mais 10 %, tendo-se atribuído o montante de € 100.000,00, a título de dano patrimonial futuro.
[43] Acórdão relatado pelo Sr. Juiz Conselheiro Gregório de Jesus e referente a um lesado em acidente ocorrido em 2003, com trinta e seis anos de idade, à data do sinistro, que auferia € 510,00 líquidos por mês, tendo ficado afectado de uma incapacidade parcial genérica de 15 %, futuramente acrescida de 5 %, tendo-se negado revista confirmando a indemnização de € 31.500,00 arbitrada pelas instâncias a título de dano biológico.
[44] Acórdão relatado pelo Sr. Juiz Conselheiro Maia Costa e referente a um lesado em acidente ocorrido em 2006, com dezanove anos de idade, à data do sinistro, estudante, afectado com uma incapacidade permanente geral de 11,73 %, em que se considerou excessiva a indemnização por danos patrimoniais futuros no montante de € 20.000,00, reduzindo-se a mesma para o montante de € 15.000,00.
[45] Acórdão relatado pelo Sr. Juiz Conselheiro Serra Batista e referente a um lesado em acidente ocorrido em 2006, com dezanove anos de idade então, estudante e a frequentar um curso de formação profissional, afectado de uma incapacidade permanente genérica de 13 pontos, com tendência a agravar-se para o futuro, tendo em atenção uma esperança de vida média de setenta e oito anos e a data provável em que o lesado entrará no mercado de trabalho, fixando-se o dano patrimonial futuro no montante de € 35.000,00.
[46] Acórdão relatado pelo Sr. Juiz Conselheiro Fonseca Ramos e referente a um lesado em acidente ocorrido em 1997, com vinte e oito anos de idade à data do sinistro, empresário da construção civil, pedreiro e ladrilhador, com rendimento anual de valor não concretamente apurado, afectado de uma incapacidade genérica parcial permanente de 40 %, com rebate profissional e a exigir esforços acrescidos, estimando-se o termo da vida activa aos sessenta e cinco anos, fixando-se a indemnização por danos futuros no montante de € 120.000,00.
[47] Acórdão relatado pelo Sr. Juiz Conselheiro Nuno Cameira e referente a um lesado em acidente ocorrido em 2005, com dezanove anos de idade à data do sinistro, estudante e a frequentar o 12º ano, afectado de uma incapacidade genérica parcial de 7 %, acrescida de 2 % de dano futuro, confirmou-se a decisão das instâncias de fixação do dano patrimonial futuro no montante de € 25.000,00.
[48] Acórdão relatado pelo Sr. Juiz Conselheiro João Camilo e referente a um lesado em acidente ocorrido em 2005, com sessenta anos de idade à data do sinistro, electricista não colectado, auferindo mensalmente a importância de € 500,00, afectado de uma incapacidade genérica permanente de 11 %, mas sem conseguir exercer a profissão habitual, calculando-se o termo da vida activa aos setenta anos, arbitrou-se a título de dano patrimonial futuro a quantia de € 30.000,00.
[49] Acórdão relatado pelo Sr. Juiz Conselheiro Lopes do Rego e referente a uma lesada em acidente ocorrido em 2000, com dezanove anos de idade, à data do sinistro, empregada de limpeza com o vencimento mensal de € 473,86, afectado de uma IPG de 17,06%, com agravamento futuro previsto de 5%, considerando-se uma esperança média de vida de setenta e nove anos, em que foi arbitrada a importância de € 50.000,00, a título de perda de capacidade de ganho e € 10.000,00, a título de dano biológico.
[50] Acórdão relatado pela Sr. Juiz Conselheiro Salazar Casanova e referente a um lesado em acidente ocorrido em 2009, afectado de uma incapacidade parcial permanente de 15 %, sem reflexos nos ganhos laborais, com um rendimento bruto anual de € 17.575,00, tendo-se considerado adequada a indemnização por danos patrimoniais futuros no montante de € 60.000,00.
[51] Acórdão relatado pela Sra. Juíza Conselheira Maria dos Prazeres Beleza e referente a um lesado em acidente ocorrido em 2003, com trinta anos de idade, à data do sinistro, empresário no sector da restauração, com um rendimento mensal médio no mínimo de € 3.958,19, afectado de uma incapacidade parcial permanente de 52,036 %, tendo-se considerado adequada a indemnização por danos patrimoniais futuros no montante de € 963.475,75, sustentando-se não se justificar no caso concreto qualquer redução do capital, em função da disponibilidade imediata de valores que o lesado apenas iria percebendo ao longo do tempo e revogando-se a decisão do Tribunal da Relação que havia fixado esse dano no montante de € 691.920,00.
[52] No relatório final do Instituto Nacional de Medicina Legal, o quantum doloris foi fixado no grau 5 numa escala de 0 a 7 (veja-se folhas 365 destes autos).
[53] O número correcto do processo é o 03B3926.
[54] A compensação efectivamente arbitrada foi de € 19.951,92.
[55] A procedência da questão suscitada pelo recorrente subordinado em sede de matéria de facto é inócua em sede de decisão final do caso, razão pela qual a procedência desta sua pretensão, não se traduz em qualquer benefício ou vantagem para si e, por isso, deve entender-se que para efeitos tributários, decaiu integralmente.