Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
3311/20.5T8VNG-B.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: ARISTIDES RODRIGUES DE ALMEIDA
Descritores: PROCESSO DE INVENTÁRIO
PROCESSO DE PRESTAÇÃO DE CONTAS
COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DE FAMÍLIA E MENORES
Nº do Documento: RP202402083311/20.5T8VNG-B.P1
Data do Acordão: 02/08/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGAÇÃO
Indicações Eventuais: 3. ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - A acção de prestação de contas pelo cabeça de casal é dependência do processo de inventário onde teve lugar a nomeação.
II - Se os tribunais judiciais foram competentes para o processo de inventário onde o cabeça de casal foi nomeado, são igualmente competentes para a acção de prestação de contas pelo cabeça de casal.
III - Se o processo de inventário, por ser da competência dos tribunais, foi instaurado por apenso a um processo de divórcio que correu termos no Juízo de Família e Menores, este é igualmente o competente para preparar e julgar, por apenso ao processo de inventário, a acção de prestação de contas pelo cabeça de casal.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: RECURSO DE APELAÇÃOECLI:PT:TRP:2024:3311.20.5T8VNG.B.P1
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SUMÁRIO:
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ACORDAM OS JUÍZES DA 3.ª SECÇÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO:


I. Relatório:
No processo especial de prestação de contas (apenso B) que corre termos por apenso ao processo especial de inventário para partilha dos bens comuns do casal (apenso A), o qual, por sua vez, corre termos por apenso à acção de divórcio n.º 3311/20.5T8VNG, que correu termos no Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo de Família e Menores de Vila Nova de Gaia, Juiz 3, foi por este, com data de 18-10-2023, proferida a seguinte decisão:
«[…] Um dos critérios para determinar o tribunal competente para a apreciação de um diferendo é o material, uma vez que, no seio dos tribunais judiciais foi implementada a especialização em função da natureza das questões em litígio.
A competência material dos tribunais de família e menores é aferida por um critério de atribuição positiva e taxativa, resultante do disposto nos artigos 122.º a 124.º da Lei de Organização do Sistema Judiciário (aprovada pela Lei n.º 62/2013, de 26 de Agosto, e doravante LOSJ). É neste diploma são determinadas as causas da competência de tribunais de competência especializada, conforme prevê o artigo 65.º do CPC.
Pertencem, assim, à competência dos juízos de família e menores as causas especificamente descritas nos mencionados artigos 122.º a 124.º da LOSJ.
Ora, tendo em conta essas normas, em particular o disposto no artigo 122.º, n.º 2, suscita-se ao tribunal a questão da sua competência em razão da matéria para conhecer desta causa de prestação de contas.
Tal normativo fixa aos tribunais de família e menores competências nos processos de inventário, instaurados em consequência de separação de pessoas e bens, divórcio, declaração de inexistência ou anulação de casamento civil, bem como nos casos especiais de separação de bens a que se aplica o regime desses processos.
Ou seja, a lei não atribui aos juízos de família e menores competência material para conhecer de outras acções que não as expressamente referidas, mormente das acções de prestação de contas entre ex-cônjuges.
Embora se verifique existir norma processual civil a definir que as contas da administração do cabeça de casal devem ser prestadas por dependência do processo em que a nomeação foi feita (cf. artigo 947.º do CPC), não há norma atribuir o seu conhecimento aos tribunais de família e menores, o que significa que, em princípio, deverá caber à jurisdição cível. Acresce que consideramos que a especificidade, a especial tramitação e a natureza da matéria em discussão nesse processo não se coadunam de modo algum com a função da jurisdição de família e menores (também neste sentido, cf. Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 19/12/2018, relatado por José Rainho, e de 08/10/2020, relatado por Ferreira Lopes, ambos disponíveis em www.dgsi.pt).
A ser assim, somos do entendimento de que o presente Juízo de Família e Menores não é materialmente competente para apreciar a prestação de contas.
A incompetência absoluta em razão da matéria consiste numa excepção dilatória de conhecimento oficioso que implica que o juiz não conheça do pedido e absolva o réu da instância (cf. conjugadamente os artigos. 96.º, al. a), 97.º, n.º 1, 2.ª parte, e n.º 2, 98.º, e 577.º, al. a), 578.º e 278.º, n.º 1, al. a) todos do CPC).
Face ao exposto, declaro a incompetência absoluta em razão da matéria deste Juízo de Família e Menores, com a consequente absolvição do réu da instância.»
Do assim decidido, a requerente interpôs recurso de apelação, terminando as respectivas alegações com as seguintes conclusões:
1. […]. 2. A Recorrente considera, com o devido respeito, que o Tribunal a quo errou: − Ao considerar taxativa a competência atribuída aos juízos de família e menores, pelo do art.122º da LOSJ; − Ao considerar não terem os Juízos de família e menores competência material para conhecerem das acções de prestação de contas entre ex- cônjuges, porque não expressamente referidas na citada disposição legal; − Ao afastar a competência, por conexão para tais acções, decorrente da conjugação do art.947º do CPC com o nº2 do citado art.122º da LOSJ; − E ao declarar a incompetência absoluta em razão da matéria do Juízo de Família e Menores de Vila Nova de Gaia – Juiz 3, absolvendo o Réu da Instância.
2. […] a 9. […]. 10. O Tribunal a quo considerou que, nos termos do disposto no art.122º, da LOSJ, não é atribuída competência material dos juízos de família e menores para tramitar e julgar acções de prestação de contas entre ex-cônjuges.
11. E que, não obstante o disposto no art.947º do CPC, continua a inexistir norma a atribuir o seu conhecimento a estes juízos.
12. Consequentemente, declarou o Juízo de Família e Menores de Vila Nova de Gaia – Juiz 3, absolutamente incompetente em razão da matéria e absolveu o Réu da Instância.
13. A Lei nº117/2019, de13 de Setembro, revogou o regime jurídico do processo de inventário, instituído pela Lei 23/2013, de 5 de Março, aprovando o novo regime do inventário notarial e reintroduzindo no Código de Processo Civil (arts.1082º a 1135) o inventário judicial.
14. O processo de inventário passou, assim, a ser da competência dos tribunais judiciais “sempre que o inventário constitua dependência de outro processo judicial” (art.1083º, nº1, alínea b), do CPC).
15. Por sua vez, estabelece o art.1133º, nº1, do CPC que: “Decretada a separação judicial de pessoas e bens ou o divórcio, ou declarado nulo ou anulado o casamento, qualquer dos cônjuges pode requerer inventário para partilha dos bens comuns”.
16. Ainda, nos termos do nº2 do mesmo dispositivo legal: “As funções de cabeça de casal incumbem ao cônjuge mais velho”.
17. Nos termos do disposto no art.2093º, nº1, do C. Civil, o cabeça de casal está sujeito à obrigação de prestar contas, anualmente.
18. Nos termos do disposto no art.947º, do CPC as contas devidas pelo cabeça de casal “…são prestadas por dependência do processo em que a nomeação haja sido feita”.
19. Como se referiu supra, a nomeação do cabeça de casal teve lugar a 23 de Junho de 2021, no âmbito do processo de inventário (cf. Ref.ª Citius 426094477, do processo nº 3311/20.5T8VNG-A).
20. A articulação do disposto no art.947º, do CPC, com o nº2 do art.122º, da LOSJ, que atribui aos juízos de família e menores as competências que a lei confere aos tribunais nos processos de inventário, gera a convicção de efectiva competência material para tramitação e julgamento da acção de prestação de contas, intentada na dependência de processo de inventário.
21. O legislador excepcionou as contas a prestar pelo cabeça de casal, da necessidade de interposição de uma nova acção, determinando expressamente que essas contas devem ser prestadas por dependência do processo de inventário e não num processo autónomo.
22. É precisamente a dependência e a conexão entre ambos os processos que justifica a competência dos tribunais judiciais, no caso, dos juízos de família e menores.
23. A qual, aliás, mais não faz do que traduzir os princípios da economia e da adequação processual, orientadores do processo civil.
24. E opera o efeito de conexão estabelecido no art.206º, nº2, do CPC, nos termos da qual: “As causas que por lei ou por despacho devam considerar-se dependentes de outras são apensadas àquelas de que dependam”.
25. A ter assim considerado e declarado incompetente, em razão da matéria, o inventário, violou o Tribunal a quo o disposto no art. 947º, do CPC, art. 122º, nº 2, da LOSJ e o disposto no art. 206º, nº 2, do C. Civil.
Termos em que, com o douto suprimento do omitido, deverá ser concedido provimento ao presente recurso, revogando-se a sentença recorrida e determinando a sua substituição por outra que, reconhecendo a competência material do Tribunal de Família e Menores de Vila Nova de Gaia -Juiz 3 para conhecer da acção de prestação de contas, determine o seu seguimento, por apenso ao inventário para partilha de bens do casal, que foi constituído pela Recorrente e Recorrido, e pendente naqueles Juízos.
O recorrido não respondeu a estas alegações.
Após os vistos legais, cumpre decidir.

II. Questões a decidir:
As conclusões das alegações de recurso demandam desta Relação que decida se a competência material para preparar e julgar a acção de prestação de contas que é dependência de processo de inventário a correr termos num Juízo de Família e Menores cabe a este Juízo ou antes aos Juízes Cíveis.

III. Fundamentação de facto:
Para a decisão a proferir relevam os seguintes factos relativos aos actos processuais que os autos documentam:
1. AA e BB celebraram casamento católico, sem convenção antenupcial, em 25 de Julho de 1992.
2. Em 22 de Maio de 2020, a AA instaurou no Juízo de Família e Menores de Vila Nova de Gaia acção de divórcio sem consentimento do outro cônjuge, acção a que foi atribuído o n.º 3311/20.5T8VNG.
3. Por sentença proferida pelo Juízo de Família e Menores de Vila Nova de Gaia, no processo nº 3311/20.5T8VNG, datada de 27 de Janeiro de 2021 e transitada em julgado, foi decretada a dissolução por divórcio do casamento de AA e BB.
4. Em 17 de Junho de 2021, a AA requereu contra o BB inventário para partilha dos bens que constituem o património comum do casal.
5. Esse processo de inventário foi instaurado e corre termos no Juízo de Família e Menores de Vila Nova de Gaia, por apenso ao processo de divórcio, sob o nº3311/20.5T8VNG-A.
6. Por despacho de 23 de Junho de 2021, foi nomeado cabeça de casal nesse inventário o réu BB.
7. Em 22 de Março de 2022, a AA instaurou contra o BB a presente acção especial de prestação de contas.
8. Esta acção foi instaurada no Juízo de Família e Menores de Vila Nova de Gaia – Juiz 3, e corre termos sob o nº 3311/20.5T8VNG-B.


IV. Matéria de Direito:
Conforme atrás se assinalou a questão a decidir versa sobre a competência em razão da matéria para preparar e conhecer a presente acção especial de prestação de contas. Mais especificamente consiste em saber se essa competência é do Juízo de Família e Menores por o processo ser dependência de um processo especial de inventário para partilha dos bens comuns do casal que corre termos no mesmo Juízo por aí ter corrido o processo de divórcio do qual o inventário é dependência.
A competência em razão da matéria dos Juízos de família e menores em questões relativas ao estado civil das pessoas e família encontra-se fixada no artigo 122.º da Lei da Organização do Sistema Judiciário, aprovada pela Lei n.º 62/2013, de 26 de Agosto.
Nos termos do n.º 1 da norma compete aos juízos de família e menores preparar e julgar: a) processos de jurisdição voluntária relativos a cônjuges; b) processos de jurisdição voluntária relativos a situações de união de facto ou de economia comum; c) acções de separação de pessoas e bens e de divórcio; d) acções de declaração de inexistência ou de anulação do casamento civil; e) acções intentadas com base no artigo 1647.º e no n.º 2 do artigo 1648.º do Código Civil; f) acções e execuções por alimentos entre cônjuges e entre ex-cônjuges; g) outras acções relativas ao estado civil das pessoas e família.
Neste elenco não estão incluídas designadamente as acções de prestações de contas entre ex-cônjuges. Contudo, nos termos do n.º 2, os juízos de família e menores são ainda competentes para a prática dos actos que a lei confere aos tribunais nos processos de inventário instaurados em consequência de separação de pessoas e bens, divórcio, declaração de inexistência ou anulação de casamento civil, bem como nos casos especiais de separação de bens a que se aplica o regime desses processos.
Esta competência dos Juízos de Família e Menores para tramitar os processos de inventário, nos casos em que os mesmos sejam da competência dos tribunais e não dos notários ou dos conservadores do registo civil, suscita a questão de saber se por arrastamento aqueles Juízos são igualmente competentes para os processos que sejam dependência dos mencionados processos de inventário, designadamente os processos de prestação de contas pelo cabeça-de-casal do inventário.
Com efeito, nos termos do artigo 947.º do Código de Processo Civil as contas a prestar por representantes legais de incapazes, pelo cabeça de casal e por administrador ou depositário judicialmente nomeados são prestadas por dependência do processo em que a nomeação haja sido feita.
Por outro lado, determina o n.º 2 do artigo 206.º do Código de Processo Civil que «as causas que por lei ou por despacho devam considerar-se dependentes de outras são apensadas àquelas de que dependam».
Afirma-se na decisão recorrida que não obstante o artigo 947.º do Código de Processo Civil, «não há norma atribuir o seu conhecimento aos tribunais de família e menores, o que significa que, em princípio, deverá caber à jurisdição cível», e ainda que «a especificidade, a especial tramitação e a natureza da matéria em discussão nesse processo não se coadunam de modo algum com a função da jurisdição de família e menores».
Com todo o devido respeito, não se pode acompanhar esta leitura.
O artigo 947.º do Código de Processo Civil é uma norma especial que atribui a competência para preparar e julgar as acções de prestações de contas pelo cabeça de casal ao tribunal onde corre termos o processo onde teve lugar a nomeação do cabeça de casal.
Esta disposição, não tendo na sua previsão qualquer restrição em razão da competência material do tribunal que procedeu à nomeação do cabeça de casal, atribui a competência independentemente da matéria, logo também da competência em razão da matéria desse tribunal: ele é competente por ter sido quem procedeu à nomeação do cabeça de casal; logo, se era competente para a nomeação, é competente para a prestação de contas que o nomeado esteja obrigado a fazer por apenso ao processo onde foi nomeado.
A Lei de Organização do Sistema Judiciário e o Código de Processo Civil são diplomas complementares, que se ocupam de questões distintas, mas entre cujas disposições se podem estabelecer relações de exclusão ou de compatibilidade.
Havendo no Código de Processo Civil normas que definem em que tribunal deve correr determinada acção por eleição de um determinado factor ou critério puramente processual (a relação de dependência entre os processos), deve entender-se que, precisamente porque a intenção do legislador foi eleger apenas esse critério para determinação da competência, essas normas se sobrepõem às disposições orgânicas que regulam a competência (em relação da matéria ou do território), excepto se e quando o contrário resultar expressamente das normas legais aplicáveis.
O argumento baseado na especificidade da jurisdição dos juízos de família e menores é totalmente vazio de conteúdo. Com efeito, essa especificidade não é algo que exista de per se, que seja concebível em abstracto, à priori e com efeitos determinantes para tudo o mais, é somente a que resulta das normas legais, aquela que o legislador decidiu atribuir-lhe em resultado da ponderação global que faz da distribuição de competências.
Portanto, se em resultado de uma norma legal a jurisdição de família e menores tem competência para uma determinada acção, naturalmente que as suas finalidades e objectivos são, de acordo com o critério legal, compatíveis com a tramitação e julgamento da mesma e vice-versa.
A decisão recorrida diz apoiar-se nos Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 19-12-2018, proc. n.º 503/14.0TMFUN-D.L1.S1, e de 08-10-2020, proc. n.º 487/19.8T8PMS.S1, in www.dgsi.pt. Mas, com todo o devido respeito, diz mal, porque desde que totalmente lidos nenhum daqueles Acórdãos dá apoio ao decidido.
Em qualquer destes estava em causa uma situação em que o processo de inventário do qual a prestação de contas era dependência, não estava pendente nem era da competência dos tribunais judiciais, pelo que não estando definida a competência dos tribunais para o processo que determinava a tramitação de outros por apenso a ele, a competência em razão da matéria para conhecer dos novos processos tinha de ser determinada ex novo, sem aplicação do disposto, por exemplo, no artigo 947.º do Código de Processo Civil, caso em que a competência dos Juízos Cíveis se mostrava inevitável atento o seu caracter residual.
À mesma solução chegou, para essas situações, o Acórdão da Relação de Lisboa de 28-02-2019, proc. n.º 1743/17.5T8CSC.L1-6, in www.dgsi.pt, no qual se afirma o seguinte a partir do artigo 122.º da LOSJ: « … a lei não prevê a competência material dos juízos de família e menores para tramitar a acção de prestação de contas intentada por um ex-cônjuge contra o outro, não podendo integrar a alínea a) do nº 1, … pois a acção de prestação de contas não é uma acção de jurisdição voluntária … mas sim uma acção de processo especial de jurisdição contenciosa, para a qual têm competência material os juízos cíveis. Inexistindo competência material dos juízos de família e menores para tramitar a acção de prestação de contas, também não existe uma competência por conexão por via do nº 2 do artigo 122º da LOSJ e do artigo 947º do CPC, uma vez que, ao contrário do que acontecia no âmbito do artigo 1419º do CPC anterior e da Lei 3/99 de 13/1 (que, no seu artigo 81º previa a competência material do tribunal de família para tramitar os inventários subsequentes às acções de divórcio), actualmente a competência para tramitar os inventários passou a estar atribuída aos cartórios notariais, … e não aos juízos de família e menores, sem prejuízo da intervenção pontual destes, prevista no nº 2 do artigo 122º da LOSJ (neste sentido acs RL de 5/06/2018 e STJ de 19/12/2018, ambos proferidos no processo 503/14 e os dois em www.dgsi.pt), sendo certo que, nos presentes autos, nem sequer existe inventário intentado».
Ao invés, a decisão que agora se acolhe encontra sim apoio no Acórdão da Relação de Lisboa de 14-11-2019, proc. n.º 4772/04.5TBCSC-L.L1-8, in www.dgsi.pt, no qual se pode ler o que aqui se acompanha e subscreve:
«Acrescenta o artigo 947.º que as contas a prestar (…) pelo cabeça de casal são prestadas por dependência do processo em que a nomeação haja sido feita. Esta norma corresponde à do artigo 1018.º, corpo, da versão primitiva do Código de 39. Esta modalidade de prestação de contas cabe usualmente a designação de “contas por dependência’’. Referindo-se a elas nestes precisos termos dizia Alberto dos Reis: “As contas do cabeça-de-casal, do tutor, do curador e de qualquer outro administrador nomeado judicialmente serão dependência do processo em que tiver sido feita a nomeação (art. 1018.º). quer isto dizer que a petição inicial para estas contas não se distribui; apensa-se, por linha, ao processo em que se tenha feito a nomeação, do tutor, do curador, do administrador (art. 211.º, § único)’’ (Processos Especiais, Vol. I, Coimbra, 1982:323). As contas do cabeça-de-casal são, portanto, apensadas ao processo de inventário. Citando ainda aquele mestre dir-se-á que “desde que o processo de contas tem de ser apensado ao processo em que se fez a nomeação, é claro que a acção de contas, em vez de ser intentada no juízo do domicílio do réu (art. 85.º), há-de sê-lo no juízo em que correu o processo ao qual as contas têm de ser apensadas’’ (ibidem). Independentemente do que se possa dizer a propósito da natureza da competência a que se refere a norma do artigo 947.º, se funcional, como parece, territorial ou material, a verdade é que se nos afigura ser o tribunal recorrido o competente para conhecer da acção».
Procede, assim, o recurso.


V. Dispositivo:
Pelo exposto, acordam os juízes do Tribunal da Relação julgar o recurso procedente e, em consequência, revogam a decisão recorrida, reconhecendo a competência material do tribunal a quo para a presente acção especial de prestação de contas.

Custas do recurso pela recorrente, atento o critério do proveito, mas limitadas ao valor da taxa de justiça que já suportou.
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Porto, 8 de Fevereiro de 2024.

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Os Juízes Desembargadores
Relator: Aristides Rodrigues de Almeida (R.to 799)
1.º Adjunto: António Paulo Vasconcelos
2.º Adjunto: João Venade






[a presente peça processual foi produzida pelo Relator com o uso de meios informáticos e tem assinaturas electrónicas qualificadas]