Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
641/19.2T8PVZ.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: JUDITE PIRES
Descritores: FORÇA DE CASO JULGADO
PROPRIEDADE HORIZONTAL
ADMINISTRAÇÃO DO CONDOMÍNIO
ADMINISTRADOR
RESPONSABILIDADE
Nº do Documento: RP20220615641/19.2T8PVZ.P1
Data do Acordão: 06/15/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Indicações Eventuais: 3ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - A força do caso julgado assenta na necessidade de assegurar a certeza das situações jurídicas apreciadas, nos termos em que o foram, que é inerente às decisões definitivamente julgadas, pressupondo a existência de uma conexão que impeça que a primeira decisão, transitada em julgado, seja contraditada pela segunda.
II - A decisão de mérito produzida num determinado processo, confirmando ou constituindo uma situação jurídica, pode, em alguns casos, ser vinculativa noutros processos onde se vise a apreciação ou constituição de outras situações jurídicas com ela conflituantes.
III - Na propriedade horizontal cada condómino é proprietário exclusivo da fracção que lhe pertence e comproprietário das partes comuns do edifício; deste modo, em excepção ao princípio superfícies solo cedit, no mesmo edifício coexistem direitos de propriedade plena sobre as fracções autónomas e de compropriedade sobre as partes comuns.
IV - Cada um dos proprietários da respectiva fracção autónoma é titular exclusivo de um direito real, de natureza absoluta, que lhe permite exigir de qualquer terceiro, seja ele outro condómino, seja ele um terceiro alheio ao edifício em propriedade horizontal, seja ele, ainda, o próprio conjunto dos condóminos, que se abstenha de actos que perturbem ou diminuam o pleno gozo e fruição da sua fracção.
V - O administrador será civilmente responsável pelos danos que cause aos condóminos e a terceiros no exercício da sua actividade, estando sujeito às normas que regem o cumprimento e incumprimento das obrigações em geral.
VI - Causando as patologias nas partes comuns do prédio a privação de uso de fracção autónoma pertencente a um condómino, antes por ele utilizada como sua morada, a fixação do quantum indemnizatório correspondente a tal dano patrimonial deve reger-se por critérios de equidade, ponderando todas as circunstâncias relevantes ao caso, designadamente o valor locativo do imóvel no mercado de arrendamento, mas não podendo este ser o único e automático critério a atender para aquele efeito.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo n.º 641/19.2T8PVZ.P1
Tribunal Judicial da Comarca do Porto
Juízo Local Cível de Póvoa de Varzim – Juiz 2

Acordam no Tribunal da Relação do Porto:

I.RELATÓRIO.
1. AA e mulher, BB, residentes no Largo ..., ..., ..., Vila do Conde, intentaram acção declarativa de condenação contra C..., Lda, com sede na Rua ..., Póvoa de Varzim, Condomínio ..., ..., Póvoa de Varzim, representado pela sua administradora C..., Lda, CC, DD, EE, FF, GG, HH, II e JJ, condóminos titulares das fracções designadas pelas letras “T”, “Q”, “U”, “R”, “S”, “X”, “N” e “O”, respectivamente, pedindo a anulação das deliberações tomadas sob o ponto 5 da Ordem de Trabalho da Assembleia Geral Ordinária de 1 de Fevereiro de 2019 e a condenação solidária dos Réus no pagamento aos Autores da quantia de 400,00 € por mês, desde Dezembro de 2016 até ao termo da obra de reparação e impermeabilização do telhado e da caixa de escadas, esta com pintura.
Alegaram, para tanto, em suma, que correu termos pelo Juízo Local Cível de Póvoa do Varzim, sob o n.º 615/15.2T8PVZ-J3, autos de acção comum nos quais foi proferida sentença que condenou o Réu Condomínio no pagamento da quantia de 3.382,50 €, a título de danos patrimoniais ocorridos na sua fracção, consequentes da falta de obras de conservação do telhado. Mais alegaram que não tendo o Réu procedido às obras necessárias à reparação do telhado nem tendo pago aos Autores o mencionado valor, atendendo ao estado de degradação da sua fracção a mesma tornou-se inabitável, estando os Autores privados do seu uso desde Novembro de 2016.
Regularmente citados, sendo o condomínio e os condóminos na pessoa do administrador do condomínio, apenas a sociedade Ré e o Condomínio contestaram, invocando a sua ilegitimidade passiva, a caducidade do direito de acção e a ineptidão da petição inicial e impugnando os factos alegados pelos Autores, com excepção dos factos documentados nas actas das assembleias de condóminos e nas certidões judiciais, concluindo pela procedência das excepções invocadas e pela sua absolvição do pedido ou pela atribuição da culpa exclusiva aos Autores pela ausência de realização das obras cujo orçamento foi aprovado em 18 de Setembro de 2018 e 15 de Março de 2019 e para os quais os Autores até ao presente não comparticiparam.
À matéria de excepção responderam os Autores, pugnando pela sua improcedência.
Dispensada a realização de audiência prévia, foi proferido despacho saneador em que, conhecidas as excepções invocadas, foram julgadas improcedentes. Simultaneamente, foi fixado o objecto do litígio e enunciados os temas de prova.
Procedeu-se à instrução do processo, no decurso da qual os Réus peticionaram a condenação dos Autores como litigante de má fé, em multa e indemnização não inferior a 2.500,00 €.
Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença com o seguinte dispositivo:
“Pelo exposto, julgo a presente acção parcialmente procedente e em consequência:
Anulo as deliberações tomadas sob o ponto 5 da “ordem de trabalho” da Assembleia Geral Ordinária de 1 de Fevereiro de 2019.
Condeno o Réu Condomínio do Edifício sito à Rua ..., Póvoa de Varzim, a pagar aos Autores uma indemnização à razão de 200,00 €, por mês, desde 1 de Dezembro de 2016 até 30 de Julho de 2019.
Absolvo a Ré C..., Lda, e os Réus CC, DD, EE, FF, GG, HH, II e JJ, do pedido.
Julgo improcedente o pedido de condenação dos Autores como litigantes de má fé e em consequência absolvo-os do pedido.
Condeno Autores e Réu, Condomínio, no pagamento das custas da acção, em partes iguais.
Notifique e Registe.
2.
2.1. Não se resignando o Réu Condomínio do Edifício sito à Rua ..., Póvoa de Varzim, com tal sentença, dela interpôs recurso de apelação para esta Relação, formulando com as suas alegações as seguintes conclusões:
………………………………
………………………………
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Os mesmos Autores/Apelados apresentaram contra-alegações (em resposta às alegações deduzidas pelo apelante Condomínio do Edifício sito à Rua ..., Póvoa de Varzim), pugnando pela rejeição do recurso e, subsidiariamente, pela sua improcedência.
O apelado Condomínio do Edifício sito à Rua ..., Póvoa de Varzim também apresentou contra-alegações, pugnando pela improcedência do recurso interposto pelos Autores, requerendo a condenação dos mesmos como litigantes de má fé em multa e indemnização condigna a favor dos Recorridos.
Colhidos os vistos, cumpre apreciar.

II.OBJECTO DO RECURSO.
A. Sendo o objecto do recurso definido pelas conclusões das alegações, impõe-se conhecer das questões colocadas pelos recorrentes e as que forem de conhecimento oficioso, sem prejuízo daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras, importando destacar, todavia, que o tribunal não está obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista, sendo o julgador livre na interpretação e aplicação do direito.
B. Considerando, deste modo, a delimitação que decorre das conclusões formuladas pelos recorrentes, no caso dos autos cumprirá apreciar:
- se a sentença é nula, nos termos do artigo 615.º, n.º 1, b) do Código de Processo Civil;
- se existe erro na apreciação da prova;
- responsabilidade do réu Condomínio pelos prejuízos sofridos pelos autores com as infiltrações na sua fracção em resultado da não reparação atempada do telhado: pressupostos da responsabilidade por factos ilícitos;
- existência de abuso de direito por parte dos autores;
- medida da indemnização;
- custas devidas pela acção.
- condenação dos autores como litigantes de má fé requerida pelo apelado réu Condomínio nas contra-alegações apresentadas.

III- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO.
III.1. Foram os seguintes os factos julgados provados em primeira instância:
1. O prédio urbano sito à Rua ..., Póvoa de Varzim encontra-se descrito na Conservatória de Registo Predial sob o nº ..., da Póvoa de Varzim e foi constituído em propriedade horizontal, conforme ap. nº ... de 5.6.1991.
2. Os Autores são proprietários da fração “AF” deste prédio, para habitação, tipo T2+1, sito no último andar do prédio - 5º direito, do bloco ... – com garagem na cave, de 18 m2, registada a seu favor na referida Conservatória de Registo Predial, através da ap. nº ..., de 24.8.2001, com o valor patrimonial tributário de 54.040,00 €.
3. Os Réus CC, DD, EE, FF, GG, HH, II e JJ, condóminos titulares das fracções designadas pelas letras “T”, “Q”, “U”, “R”, “S”, “X”, “N” e “O”, respectivamente.
4. A Ré, “C...”, exerce a administração do condomínio deste prédio em propriedade horizontal – bloco ... – desde a sua primeira nomeação, de 24.2.2015.
5. No dia 8 de Abril de 2015 reuniu a Assembleia Geral Extraordinária de Condóminos do Edifício ..., na ausência dos Autores, da qual foi lavrada a acta nº 7, nos termos da qual “(…) Ponto 2: (…) pela administração foram os presentes informados que o valor dos saldos bancários da conta do condomínio à data da cessão de funções da anterior administração era de € 4,88, bem como do facto de até á presente data todo o espólio do condomínio ainda não ter sido entregue à nova administração. Mais foram os presentes informados da inexistência de qualquer conta de obras pelo que as quotas pagas pelos condóminos a este título, conforme orçamento e distribuição anteriormente aprovada pela anterior administração foram aparentemente furtadas pela anterior administração. De seguida, após discussão pelos condóminos foi deliberado por unanimidade não adoptar para já qualquer medida e, ou, providência judicial a tomar contra a sociedade E..., Lda.
Ponto 3: No que respeita ao terceiro ponto da ordem de trabalhos pela administração foram os presentes informados da necessidade de se proceder à execução de obras no edifício, nomeadamente no telhado de cobertura. Após análise passou-se à discussão tendo os presentes deliberado, por unanimidade, que antes de se aprovar qualquer orçamento deverá a administração visitar as fracções autónomas que padecem de infiltrações encontrar as suas origens e fazer um levantamento das obras que são necessárias, urgentes e inadiáveis. (…)”.
6. No dia 18 de Setembro de 2015 reuniu a Assembleia Geral Extraordinária de Condóminos do Edifício ..., na ausência dos Autores, da qual foi lavrada a acta nº 8, nos termos da qual “(…) Relativamente ao segundo ponto da ordem de trabalhos pela administração foram os presentes esclarecidos dos montantes pagos pelos condóminos a título de obras à anterior administração, assim como os condóminos que efectuaram prova de tais pagamentos.
Na sequência de tal explicação pelos condóminos foi deliberado por unanimidade que antes de se proceder à instauração de qualquer acção judicial contra os condóminos que não comprovam o pagamento de tal rubrica assim como das quotas ordinárias de condomínio, deverá a administração notificar novamente os mesmos dando-lhe o prazo máximo de 1 mês para que ajam em conformidade. Caso nada digam ou façam deverá a administração proceder à instauração da competente ação Judicial.
De seguida pela administração foi apresentado um relatório técnico de vistoria e apresentados orçamentos para reabilitação do telhado do edifício.
Após análise dos mesmos passou-se à sua discussão tendo os condóminos deliberado por unanimidade não aprovar aquele orçamento dado a existência dum orçamento que fora anteriormente aprovado para aqueles fins.
Consequentemente, foi deliberado por unanimidade constituir uma comissão de condóminos composta pelo Sr. AA, D. KK e D. II para juntamente com a administração reunir com o empreiteiro, negociar as condições, termos e preços da empreitada e acompanhamento da obra.
Mais se deliberou por unanimidade que o valor da empreitada, que ronda os 20.000,00, mas sujeito a confirmação pelo empreiteiro, será distribuído por todos os condóminos de habitação de acordo com os critérios legais em seis prestações mensais, iguais e sucessivas com início a 30 de Outubro.
Mais se deliberou por unanimidade que o não pagamento duma prestação de obras implica o vencimento das restantes podendo a administração exigir do incumpridor o pagamento integral e usar de todos os meios judiciais para proceder á sua cobrança.
Mais se deliberou por unanimidade que as condóminas KK e II juntamente com a administração do condomínio devem proceder à abertura duma conta para obras a qual só poderá ser movimentada com a assinatura dos três membros em conjunto.(…)
Ponto 3:No que respeita ao terceiro ponto da ordem de trabalho pela administração foram os presentes informados da instauração duma acção judicial apresentada pelo Sr. AA que corre termos no Tribunal Judicial da Póvoa de Varzim, sob o processo nº 615/15.2T8PVZ-J3 onde o mesmo pugna pela realização de obras de reparação no interior da sua fracção autónoma no valor total de 3.382,50 €, assim como o valor de 1.500,00 € a titulo de danos morais. (…)”.
7. O orçamento aprovado em 4 de Maio de 2014, nos termos da acta nº 5, foi apresentado por “T... Ldª”, no valor de 20.216,53 €, c/IVA incluído.
8. Em 2015 os Autores instauraram acção declarativa comum que correu termos por este juízo local sob o nº 615/15.2T8PVZ – J3, contra o Condomínio do Edifício sito na Rua ..., ..., na qual foi proferida sentença, datada de 18.01.2016, transitada em julgado a 22.02.2016, na qual resultaram provados, entre outros, os seguintes factos:
“1. Encontra-se descrita na Conservatória do Registo Predial da Póvoa de Varzim, sob o nº ..., a fracção autónoma designada pelas letras “AF”, destinada a habitação, sita na Rua ..., ..., Póvoa de Varzim.
(…)
6. O telhado do prédio necessita de obras de manutenção e reparação, atento o seu estado de degradação, ao nível das telhas e caleiros, algumas delas partidas.
7. Em reunião de condóminos ocorrida em Maio 2014, reconheceu-se a necessidade da substituição do telhado –em amianto– tendo sido apresentados, para o efeito, três orçamentos.
8. Foi deliberado na referida assembleia de condóminos aprovar um dos orçamentos ficando também deliberado que as obras teriam início em Setembro de 2014.
9. Nessa sequência, os Autores pagaram ao Réu a quota-parte que lhes correspondia em face da permilagem que a sua fracção representava, no valor de 1.189,92 €. (…)
11. Em virtude do mau estado do telhado e das caleiras do prédio, as águas pluviais- e a humidade – entrou na fração autónoma referida em 1”
12. Por via do referido em 11, os tectos da cozinha/marquise, da sala, dos 2 quartos, da despensa, do hall, do corredor da fracção em causa apresentam-se com gotículas de água, húmidos e escurecidos.
13. O piso da fração que é em parquet, foi afectado pela entrada das águas pluviais, levantando os tacos/réguas no corredor, na sala de estar, no hall e nos quartos.
14. De acordo com o empreiteiro que inspecionou, a pedido dos Autores, a fração referida em 1 e avaliou os danos, a reparação desta fração deverá traduzir-se no seguinte: a) picar as massas pobres ou podres dos tectos; b) regularizar os tectos e estucá-los a gesso; c) compor as molduras; d) lixar e pintar os tectos e paredes afectadas pelas infiltrações (pintura com tintas CIN). No pavimento: e) levantar o parquet afectado pelas infiltrações; f) colocar parquet novo; g) lixar, polir e envernizar os dois quartos.
15. O custo estimado da reparação dos danos sofridos em 10, 11, 12 e 13, nos termos referidos em 14, ascende à quantia de € 2.750,00, acrescido de IVA à taxa em vigor, no total de € 3.382,00.
16. Os Autores viveram durante 2014/2015 com gotículas a cair-lhes do tecto e com humidade em casa, o que a tornou fria e desconfortável”.
9. Com base nos factos supra descritos o 2º Réu, Condomínio, foi “condenado a pagar aos Autores a quantia de € 3.382,50, acrescida dos respectivos juros de mora à taxa civil, vencidos desde a citação até integral pagamento”.
10. No dia 5 de Fevereiro de 2016 reuniu a Assembleia Geral Ordinária de Condóminos do Edifício ..., em que os Autores estiveram presentes, da qual foi lavrada a acta nº 9, nos termos da qual, relativamente ao Ponto 1, consta “(…) Deverá a administração questionar o prestador do serviço X... relativamente ao valor cobrado e constante da factura nº ... uma vez que o condómino em questão informou a administração que não houve qualquer entupimento naquela fracção autónoma.
Mais deverá a administração informar os condóminos dos valores recebidos pelo condomínio no último exercício.
Mais se deliberou por maioria que a administração deverá proceder à cobrança das quotas de condomínio aos proprietários das fracções de garagens exteriores.
De seguida pela administração do condomínio foram os presentes informados da sentença proferida no processo instaurado polo condómino da fracção "AF" contra o condomínio, assim como das diligências a tomar. Após dadas as devidas e necessárias explicações foi deliberado que deverá o mandatário do condomínio negociar com a mandatária do condómino em questão a melhor forma de pagamento.
Mais se deliberou que na eventualidade das negociações se frustrarem deverá a administração proceder à instauração da competente acção judicial contra o referido condómino por forma a obter daquele o pagamento das quotas de condomínio ordinárias e extraordinárias vencidas.
Mais se deliberou que caso não exista qualquer acordo deverá a administração proceder ao imediato pagamento, distribuído o valor indemnizatório por todos os condóminos por igualdade.
11. Em 15.03.2016 a administração do Condomínio instaurou a execução que correu termos pelo Juízo de Execução do Porto sob o nº 6374/16.4T8PRT-J1, em nome do condomínio, contra os aqui Autores, juntando como título executivo as Actas nº 8 e nº 9, pedindo aos Autores o pagamento da sua quota-parte das obras de reabilitação do telhado, no montante de 1.239,20 €, acrescido de juros e da sanção pecuniária de 750,00 €, pelo atraso de pagamento.
12. Nesta execução, a aqui 1ª Ré, penhorou o crédito dos Autores sobre o condomínio no valor de 3.382,50 €.
13. Os aqui Autores deduziram embargos, que o Exequente contestou, e a final foi proferida sentença, datada de 2.11.2018, transitada em julgado, na qual resultaram provados os seguintes factos:
“(…)8º- O orçamento aprovado na assembleia de condóminos de 4 de Maio de 2014, a que corresponde a ata n°5, e referida no ponto n°5, é o de LL, segundo o qual tal obra importaria no montante total de 20.216,53€ (vinte mil duzentos e dezasseis euros e cinquenta e três cêntimos), e que se mostra junto de fls. 17 a 21 dos autos de embargos, tendo ficado igualmente aprovado que esse valor seria dividido de modo igual por todos as 17 frações, e não por permilagem.
9º- O condomínio exequente, através da administração em vigor à época, “Administração de Condomínios E...”, enviou aos executados o aviso de cobrança que emitiu em 23/06/2014, (…).
10º- Em 30 de Julho de 2014, os executados, na sequência do aviso de cobrança referido em 9, pagaram à exequente a parte que lhes competia de acordo com o orçamento aprovado e com as condições aprovadas para a sua divisão por todas as frações para as referidas obras à administração então em exercício, nos termos do recibo de quitação emitido pela exequente, (…).
11º - A quantia efetivamente paga pelos executados foi de € 1.189,21 uma vez que a administração ao proceder ao cálculo por fração pensou não estar incluído o IVA, quando o mesmo já estava contabilizado, pelo que posteriormente retirou tal verba.
12º - Os condóminos referidos nos documentos 5 e 6, juntos de fls. 29 e 30, procederam ao pagamento das quantias ali mencionadas à anterior administração do exequente, ou seja, à “E...”.
13º- O pagamento referido em 10 e 11 foi entretanto dado a conhecer à nova administração do condomínio nomeada em 24.02.2015, ou seja, à "C.... (…)”
14. Com base em tais factos foram os embargos julgados procedentes, com a consequente extinção da execução.
15. No dia 20 de Maio de 2016 reuniu a Assembleia Geral Extraordinária de Condóminos do Edifício ..., na ausência dos Autores, da qual foi lavrada a acta nº 10, nos termos da qual, relativamente ao Ponto 1, consta “(…) No que respeita ao primeiro ponto da ordem de trabalhos, pela administração foram os presentes informados da existência de diversos condóminos no edifício que não procedem ao pagamento das prestações para obras.
Mais informou os presentes que tal situação está a inviabilizar a execução total das obras as quais são necessárias e urgentes.
Dadas as devidas explicações pelos condóminos do edifico foi deliberado por unanimidade que deverá a administração proceder á instauração das competentes ações judiciais inclusive ações de insolvência.
Pela administração foi dito que irá proceder conforme o deliberado, contudo não poderá dar inicio às referidas obras, as quais estão orçamentadas e aprovadas, uma vez que o empreiteiro contratado só inicia as mesmas após pagamento.
Pelos condóminos foi dito que compreendem a situação e que aceitam relegar o inicio daquelas mesmas obras para momento posterior.
PONTO 2:
Relativamente ao segundo ponto da ordem de trabalhos pela administração foi comunicado aos presentes que na sequência da sentença proferida no âmbito do processo judicial movido pelo proprietário da fração “AF” foi o condomínio condenado a proceder ao pagamento a titulo de indemnização o valor total de € 3.382,50.
Consequentemente, e dado que o condomínio não tem liquidez para proceder ao pagamento da referida indemnização propõem a distribuição daquele valor por todos os condóminos.
Após discussão foi deliberado por unanimidade distribuir por todas as frações de habitação de forma igual o valor 3.382,50 € em quatro prestações mensais, iguais e sucessivas com inicio a Junho de 2016”.
16. No dia 1 de Fevereiro de 2019, reuniu a Assembleia Geral Ordinária de Condóminos do Edifício ..., em 2ª data constante da convocatória, com a seguinte Ordem de Trabalhos:
“1. discussão e aprovação do relatório e contas do exercício de 1.1.2018 a 31.12.2018.
2. eleição da administração para o exercício de 1.1.2019 a 31.12.2019.
3. discussão e aprovação de orçamento para o exercício de 1.1.2019 a 31.12.2019.
4. discussão e votação do valor do edifício para atualização do contrato de seguro.
5. discussão e votação de outros assuntos de interesse para o condomínio”.
17. Desta Assembleia, em que os Autores estiveram ausentes, foi elaborada a Acta nº 15, tendo os aqui 3.ºs Réus tomado assento na reunião e nela deliberado nos termos constantes da mesma, a qual não se encontra assinada pelo presidente e secretário da mesa.
18. Consta da Acta “(…)Verificada a regularidade da convocatória, efectuada através de carta registada enviada a todos os condóminos, com a antecedência mínima de dez dias sobre a primeira data designada de realização da Assembleia, constatou-se estarem presentes e/ou representados condóminos correspondentes a 219 votos em 470 unidades inteiras em mil do valor total do edifício, montante suficiente à tomada de deliberações, conforme assinatura aposta na lista de presenças e procurações arquivadas no maço de documentos deste edifício.
Aberta a Assembleia, procedeu-se à formação da Mesa que será presidida e secretariada pelos representantes da empresa administradora, por indicação unânime dos condóminos. (…)
PONTO 5:
No que respeita a este ponto da ordem de trabalhos, pela administração do condomínio foi exposto aos condóminos o resultado da sentença nos embargos de executado dos condóminos AA e mulher BB, em que a Juiz de Execução do Porto considerou procedentes os embargos por entender que o pagamento que tais condóminos fizeram da prestação para obras na vigência da administração E..., Lda., e aprovado na assembleia de 04 de maio de 2014, é o correspondente ao orçamento para obras que foi aprovado pela assembleia de 18 de Setembro de 2015, na pendência da administração da C..., Lda., o que não corresponde à verdade, pois que são orçamentos diferentes.
Em virtude dessa decisão, os condóminos AA e mulher BB não pretendem pagar o valor do segundo orçamento, que foi aprovado na assembleia de 18 de Setembro de 2015.
Os demais condóminos, que pagaram a respectiva prestação para obras do primeiro orçamento, de 04 de maio de 2014, na vigência da administração da E..., Lda., e que também pagaram as prestações para obras do segundo orçamento, de 18 de Setembro de 2015, na vigência da administração C..., Lda., comunicaram à administração que estão a pagar duas vezes, para que as obras, que são urgentes, necessárias e inadiáveis, sejam realizadas, e que o Sr. AA e a mulher BB estão a envidar esforços e a colocar obstáculos para que as obras não sejam realizadas atempadamente, pois que não querem pagar o valor e orçamento das obras que foi aprovado na assembleia de 18 de Setembro de 2015.
Em consequência de tal atuação dos condóminos AA e mulher, os condóminos comunicaram á assembleia que não vão pagar orçamentos para obras nos quais não comparticipem os aludidos condóminos.
Foi, por isso, deliberado o seguinte:
a) Revogar a deliberação que aprovou o orçamento para obras de 18 de Setembro de 2015 (apesar de não ser o mesmo que foi aprovado na administração da E..., Lda., na assembleia de 04 de maio de 2014), a Juiz que declarou procedentes os embargos dos condóminos AA e mulher BB considerou que era o mesmo orçamento e, por isso, não vão os outros condóminos pagar duas vezes aquilo que o Sr. AA só quer pagar uma vez);
b) Determinar à administração que arrecade as quantias ainda em falta, correspondentes ao orçamento aprovado na assembleia de 04 de maio de 2014, na vigência da E..., Lda.
c) Determinar à administração que diligencie para cobrar da E..., Lda. os valores de que ela se apoderou, correspondente aos condóminos que pagaram o orçamento para obras que foi aprovado na vigência da administração E..., Lda., aprovado em 04 de maio de 2014 (entre os quais os condóminos AA e mulher, e outros em idêntica circunstância), POIS QUE SEM ESSE DINHEIRO NÃO SE PODERÃO REALIZAR AS OBRAS, QUE SÃO URGENTES.
O SR. AA DIZ QUE JÁ PAGOU À E... E QUE NÃO VOLTA A PAGAR. ENTÃO O SR. AA VAI TER QUE AGUARDAR QUE SE OBTENHA O DINHEIRO DA E..., SENDO QUE ESTA É UMA DECISÃO DELE QUE ESTÁ A CAUSAR PREJUÍZOS GRAVISSIMOS AOS CONDÓMINOS, QUE NÃO A COMPREENDEM.
d) Determinar à administração que restitua aos condóminos que pagaram o orçamento de obras aprovado na assembleia de 18 de Setembro de 2015, da vigência da C..., Lda., as correspondentes prestações (pois que caso contrário tais condóminos estariam a contribuir para um orçamento no qual os condóminos AA e mulher não comparticipam).
Em consequência do anteriormente deliberado foi revogada a adjudicação e realização de obras na cobertura do edifício, pois que não existe dinheiro para as pagar, enquanto não for cobrado o valor de obras que a anterior administração, E..., Lda., se apoderou.
NÃO HÁ ASSIM OBRAS NO TELHADO DO EDIFÍCIO, POIS QUE NÃO HÁ DINHEIRO PARA AS PAGAR.
E NÃO HÁ DINHEIRO PARA PAGAR AS OBRAS PORQUE A E... FICOU INSOLVENTE E PORQUE O SR. AA E A SRA. D. BB NÃO QUEREM PAGAR SOBRE OUTRO ORÇAMENTO PARA OBRAS, POIS QUE DIZEM QUE É O MESMO ORÇAMENTO.
O CONDOMÍNIO E OS CONDÓMINOS QUEREM REALIZAR OBRAS NO TELHADO, QUE SÃO URGENTES, NECESSÁRIAS E INADIÁVEIS E ATÉ JÁ A QUASE TOTALIDADE DOS CONDÓMINOS TINHA PAGO TAIS OBRAS UMA SEGUNDA VEZ (O PRIMEIRO ORÇAMENTO E O SEGUNDO ORÇAMENTO) MAS COMO OS CONDÓMINOS AA E MULHER BB NÃO PARTICIPAM NEM QUEREM PAGAR UM ORÇAMENTO PARA OBRAS (O QUE FOI APROVADO NA ASSEMBLEIA DE 18 DE SETEMBRO DE 2015), INVOCANDO QUE JÁ O PAGARAM, ENTÃO AS OBRAS NO EDIFÍCIO SÓ SERÃO REALIZADAS QUANDO FOR APROVADO OUTRO ORÇAMENTO PARA OBRAS, A SER DISTRIBUÍDO POR TODOS OS CONDÓMINOS, OU QUANDO A ADMINISTRAÇÃO CONSEGUIR RECUPERAR TODO O DINHEIRO PARA TAIS OBRAS QUE A ANTERIOR ADMINISTRAÇÃO, E..., Lda. SE APODEROU.
A RESPONSABILIDADE DE NÃO SE REALIZAREM OBRAS NO TELHADO É DOS CONDÓMINOS AA E MULHER BB, POIS QUE NÃO QUEREM PAGAR UM SEGUNDO ORÇAMENTO DE OBRAS, COMO TODOS OS DEMAIS CONDÓMINOS FIZERAM, E POR ISSO O CONDOMÍNIO FICA SEM O DINHEIRO PARA AS OBRAS. AGORA VAI O CONDOMÍNIO TER QUE AGUARDAR QUE SE OBTENHA DA E..., Lda. ODINHEIRO PARA AS OBRAS DE QUE ELA SE APODEROU, PARA O QUE VAI CONTRATAR UM ADVOGADO. (…)”.
19. No dia 15 de Março de 2019, reuniu a Assembleia Geral Extraordinária de Condóminos do Edifício ..., na ausência dos Autores, da qual foi lavrada a acta nº 16, nos termos da qual, relativamente ao Ponto 1, consta “PONTO 1: No que respeita ao primeiro ponto da ordem de trabalhos, foram apresentados à discussão 3 orçamentos para reparação da cobertura:
Empresa G...: € 24.105,36, já com IVA incluído.
Empresa M...: € 20.659,32, já com IVA incluído.
Empresa P..., Lda.: 21.589,60, já com IVA incluído.
Estes orçamentos em nada estão relacionados com anteriores orçamentos que foram aprovados e distribuídos aos condóminos, designadamente o orçamento de obras de 04 de maio de 2014 e o orçamento de 18 de setembro de 2015.
O valor de 04 de maio de 2014 foi distribuído aos condóminos, para efeitos de comparticipação em obras da cobertura, e foi dissipado pela empresa E..., Lda., entretanto declarada insolvente e, por esse motivo, os condóminos deliberaram em anteriores assembleias, designadamente de ata 13 e 15, que tais valores serão integralmente cobrados a todos os condóminos que ainda não pagaram a correspectiva quota parte e que o dinheiro que se arrecadar ficará a abater/creditar a todos os condóminos em proporção.
O quadro que se expõe no ponto 3 reflete a situação de tais pagamentos e cobranças.
Foi manifestado por todos os condóminos presentes a sua surpresa e estupefacção pelo facto de os condóminos AA e BB reclamarem de infiltrações e não estarem presentes na presente assembleia, em que se pretende deliberar a realização de obras, tendo em vista resolver um problema que eles referem como lhes sendo premente.
Foi deliberado pela unanimidade dos condóminos presentes e/ou representados aprovar o valor de € 20.659,32, apresentado pela empresa M..., para realização das obras da cobertura.
Tal valor será distribuído aos condóminos numa prestação única, com vencimento imediato.
Caso a administração ainda não tenha executado a deliberação da assembleia de condóminos da ata 15 e, por isso, ainda não tenha creditado aos condóminos os valores cobrados para recebimento do orçamento de 18 de setembro de 2015, que foi revogado, deverá transferir as correspondentes importâncias para pagamento do orçamento agora aprovado, devolvendo apenas o remanescente.
A administração deverá propor à empresa P..., Lda. executar a obra pelo mesmo valor da empresa M..., contanto que esta aceite o mesmo valor e se comprometa a executar a obra num prazo curto e a observar uma calendarização de trabalhos que não deverá ultrapassar o mês de julho de 2019”.
20. Em 27.03.2017[1] os Autores procederam ao pagamento da sua quota parte das obras de reparação da fachada das varandas.
21. De 2015 para cá, ocorreu o agravamento do estado do telhado:
- os grampos que fixam as telhas estão todos podres, permitindo o levantamento das telhas com o vento e a consequente entrada de águas das chuvas para o tecto e paredes da fracção dos Autores;
- algumas telhas de lusalite, com amianto, estão partidas ou fissuradas;
- os caleiros estão podres, o que permite a infiltração de águas para o tecto e paredes da fracção dos Autores;
- há também uma grande infiltração no tecto e nas paredes do último lanço de escadas, ficando as paredes todas negras;
22. A fachada e as varandas, a poente do prédio, encontram-se fissuradas, com pedaços a cair, podendo advir daqui também infiltrações para o interior do apartamento dos Autores.
23. Não tendo o condomínio dado início às obras de substituição do telhado, da fachada e das varandas, nem tendo pago o valor para a reparação do seu interior, a habitação dos Autores manteve-se como descrita na sentença proferida nos autos que correram termos sob o nº 615/15.2T8PVZ.
24. Atento o estado de degradação do telhado, do interior da habitação dos Autores e do tecto e paredes do último lanço da caixa de escadas, junto à entrada da habitação dos Autores, em finais de Novembro/2016, os Autores abandonaram a referida fracção e foram viver para o Largo ..., na freguesia ..., Vila do Conde, por falta de condições de habitabilidade.
25. No estado em que se encontra o seu interior e a caixa de escadas, os Autores não conseguem vender o apartamento.
26. Após a sua saída, os Autores chegaram a mostrar o apartamento para arrendamento a vários interessados, mas, depois de o verem, recusaram arrendá-lo, por falta de condições de habitabilidade.
27. O valor locativo do imóvel no mercado de arrendamento é de 400,00 € por mês.
28. Em 23.05.2019 a Ré celebrou um contrato de empreitada para execução das obras de substituição da cobertura as quais terminaram em 30.07.2019.
29. Os Autores estiveram ausentes nas Assembleias Gerais de Condóminos de 08.04.2015 (acta nº 7); 18.09.2015 (acta nº 8); 20.05.2016 (acta nº 10); 02.02.2017 (acta nº 11); 19.03.2018 (acta nº 13); 12.09.2018 (acta nº 14); 1.02.2019 (acta nº 15); 15.03.2019 (acta nº 16).
III.2. A mesma instância considerou não provados os seguintes factos:
1. Os condóminos que comparticiparam no primeiro orçamento, de 04.05.2014, tendo liquidado a totalidade do seu valor, estavam na mesma situação e posição dos Autores, estando obrigados a comparticipar no segundo orçamento, aprovado na assembleia de 18.09.2015.
2. Relativamente aos condóminos que não haviam comparticipado, ou que haviam comparticipado apenas parcialmente nesse orçamento de 04.05.2014, estavam obrigados a pagar os valores em dívida referentes a esse orçamento, e ainda os valores devidos pelo orçamento aprovado e distribuído na assembleia de 18/09/2015.
3. O destino das eventuais verbas remanescentes (ou seja, o saldo que viesse a ser cobrado referente ao orçamento de 04.05.2014 e que não foi dissipado pela anterior administração E...) seria a deliberar em assembleia geral a sua aplicação.
4. O Autor não participou em reuniões com o empreiteiro para negociação dos termos e preço da empreitada e acompanhamento da obra.
5. Os Autores não procederam ao pagamento da sua comparticipação nas obras.
6. A execução (mencionada em 12 dos factos provados) foi instaurada pela administração do condomínio Réu porque os Autores eram devedores, à data da instauração da execução em juízo, da quantia de 2.074,53 €.
7. Os Autores já foram interpelados pelo condomínio Réu para procederem ao pagamento do orçamento mencionado na acta nº 16.
8. Desde então, o Autor marido passou a ir com frequência ao apartamento, mas tão só para o arejar, limpar tectos e paredes, mas em finais de Março de 2019 os Autores viram-se obrigados a retirar de lá os móveis, porque estavam a apodrecer.
9. Até recentemente tal apartamento esteve arrendado e diversas pessoas o ocuparam, designadamente estrangeiros.

IV. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO.
1. Questão prévia: da admissibilidade do recurso interposto pelo réu na parte em que impugna a decisão relativa à matéria de facto.
Nas contra-alegações que apresentam pugnam os autores pela rejeição do recurso interposto pelo réu Condomínio na parte em que impugna a decisão de facto com o argumento de que o mesmo “não especificou “os concretos meios probatórios” sobre cada um dos factos impugnados (individualmente como devia) e nem sequer os especificou sobre cada um dos blocos ou grupos de factos […]”.
De acordo com o n.º 1 do artigo 640.º do Código de Processo Civil, “quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas”.
E de acordo com o n.º 2 do mesmo dispositivo, “no caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respectiva parte, indicar com exactidão as passagens de gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevante”.
Como esclarece Abrantes Geraldes[2], “a rejeição do recurso, na parte respeitante à impugnação da decisão da matéria de facto, deve verificar-se em alguma das seguintes situações:
a) Falta de conclusões sobre a impugnação da decisão da matéria de facto;
b) Falta de especificação nas conclusões dos concretos pontos de facto que o recorrente considera incorrectamente julgados;
c) Falta de especificação dos concretos meios probatórios constantes do processo ou nele registados (v.g. documentos, relatórios periciais, registo escrito, etc.);
d) Falta de indicação exacta das passagens da gravação em que o recorrente se funda, quando tenha sido correctamente executada pela secretaria a identificação precisa e separada dos depoimentos;
e) Falta de apresentação da transcrição dos depoimentos oralmente produzidos e constantes de gravação quando esta tenha sido feita através de mecanismo que não permita a identificação precisa e separada dos mesmos;
f) Falta de especificação dos concretos meios probatórios oralmente produzidos e constantes de gravação quando, tendo esta sido efectuada por meio de equipamento que permitia a indicação precisa e separada, não tenha sido cumprida essa exigência por parte do tribunal;
g) Apresentação de conclusões deficientes, obscuras ou complexas, a tal ponto que a sua análise não permita concluir que se encontram preenchidos os requisitos mínimos para que possa afirmar-se a exigência de algum dos elementos referidos nas anteriores alíneas b) e c)”.
E acrescenta o mesmo autor: “importa observar ainda que as referidas exigências devem ser apreciadas à luz de um critério de rigor, próprio de um instrumento processual que visa pôr em causa o julgamento da matéria de facto efectuado por outro tribunal em circunstâncias que não podem ser inteiramente reproduzidas na 2ª instância. Trata-se, afinal, de uma decorrência do princípio da auto-responsabilidade das partes, impedindo que a impugnação da decisão da matéria de facto se transforme numa mera manifestação de inconsequente inconformismo”[3].
Das normas em causa ressaltam essencialmente duas conclusões:
A primeira reporta-se ao âmbito da impugnação da matéria de facto: só é possível uma impugnação delimitada, discriminada, não sendo admissível uma oposição genérica, indiferenciada do decidido. Como salienta Lopes do Rego[4], «…o alegado “erro de julgamento” normalmente não inquinará toda a decisão proferida sobre a existência, inexistência ou configuração essencial de certo “facto”, mas apenas sobre determinado e específico aspecto ou circunstância do mesmo, que cumpre à parte concretizar e delimitar claramente».
A segunda refere-se à indicação dos meios probatórios que suportam a divergência quanto ao julgamento da matéria de facto: o recorrente deve indicá-los, de forma precisa e individualizada, reportando-os ao concreto segmento da decisão impugnada, pois que não é mister da segunda instância proceder à reapreciação da globalidade dos meios de prova produzidos.
E no caso específico da prova testemunhal gravada, o cumprimento desse ónus reclama, sob pena de imediata rejeição do recurso, a indicação exacta das passagens da gravação em que se funda o recurso.
Percorrendo as alegações de recurso do apelante Condomínio constata-se que foram satisfatoriamente cumpridos os ónus impostos pelo artigo 640.º do Código de Processo Civil, identificando o recorrente os concretos pontos da matéria de facto de cuja apreciação discorda, indicando os meios probatórios constantes do processo ou nele registados que impunham decisão diversa da proferida, transcrevendo parcialmente as provas que foram gravadas e indicando a decisão que, no seu entender, deve ser proferida quanto às questões de facto impugnadas.
É certo que, mesmo no corpo das alegações, o recorrente não indica qualquer meio probatório relativamente aos pontos 21.º e 22.º dados como provados e que, na sua perspectiva, devem considerar-se não provados.
Mas como poderia cumprir tal exigência defendendo, como o faz, que relativamente aos pontos da matéria em causa, cuja apreciação contesta, nenhuma prova foi produzida e daí entender que devem ser julgados não provados?
Têm-se, assim, por satisfatoriamente cumpridos os ónus impostos pelo artigo 640.º do Código de Processo Civil, exigidos para a reapreciação da matéria de facto objecto de impugnação, não havendo, por conseguinte, fundamento para rejeição do recurso. Nulidade da sentença.
2. Nulidade da sentença.
Dispõe hoje o n.º 1 do artigo 615.º do Código de Processo Civil:
É nula a sentença quando:
a) Não contenha a assinatura do juiz;
b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;
d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;
e) O juiz condene em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido.
A nulidade da sentença - ou de despacho - constitui um vício intrínseco da decisão, desde que ocorra alguma das circunstâncias taxativamente previstas no artigo 615.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, que, pela sua gravidade, comprometem a sentença ou o despacho qua tale.
Como o n.º 1 do artigo 668.º do anterior diploma, também o n.º 1 do artigo 615.º do actual Código de Processo Civil contém uma enumeração taxativa das causas de nulidade da sentença[5], nelas não se inserindo o designado erro de julgamento, que apenas pode ser atacado por via de recurso, quando o mesmo for legalmente admissível[6].
Respeita o vício elencado na alínea b) do n.º 1 do artigo 615.º da lei processual civil à omissão de fundamentação, quer de facto, quer de direito, da sentença. Como esclarecem, a propósito, Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora[7]: “para que a sentença careça de fundamentação, não basta que a justificação da decisão seja deficiente, incompleta, não convincente; é preciso que haja falta absoluta embora esta se possa referir aos fundamentos de facto ou só aos fundamentos de direito.
[…] Para que haja falta de fundamentação, como causa de nulidade da sentença, torna-se necessário que o juiz não concretize os factos que considera provados e coloca na base da decisão.
Relativamente aos fundamentos de direito, dois pontos importa salientar:
Por um lado, o julgador não tem que analisar todas as razões jurídicas que cada uma das partes invoque em abono das suas posições, embora lhe incumba resolver todas as questões suscitadas pelas partes: a fundamentação da sentença contenta-se com a indicação das razões jurídicas que servem de apoio a solução adoptada pelo julgador.
Por outro lado, não é indispensável, conquanto seja de toda a conveniência, que na sentença se especifiquem as disposições legais que fundamentam a decisão; essencial é que se mencionem os princípios, as regras, as normas em que a sentença se apoia”[8].
Importa ainda reter que “da falta absoluta de motivação jurídica ou factual - única que a lei considera como causa de nulidade —há que distinguir a fundamentação errada, pois esta, contendendo apenas com o valor lógico da sentença, sujeita-a a alteração ou revogação em recurso, mas não produz nulidade”[9].
Alega o recorrente Condomínio do Edifício sito à Rua ..., Póvoa de Varzim, que “A decisão sobre os pontos 1, 2, 3 e 6 dos factos não provados é nula, por ausência de fundamentação” – ponto 3.º das conclusões.
Tal omissão de fundamentação/motivação não desencadeia, todavia, o vício de nulidade que o recorrente imputa à sentença de que recorre.
Como se afirma no recente acórdão desta Relação de 4.05.2022[10], “Os vícios da sentença não se autonomizam dos vícios da decisão sobre a matéria de facto e, por isso, ainda que tal circunstância não justifique sem mais a aplicação ‘do regime do art. 615 à parte da sentença relativa à decisão sobre a matéria de facto – desde logo porque a invocação dos vários vícios que a esta dizem respeito é feita nos termos do art. 640º e porque a consequência desses vícios não é necessariamente a anulação do acto (cf. os nºs 2 e 3 do art. 662) –, obriga, pelo menos, a ponderar, caso a caso, a possibilidade dessa aplicação’, devendo reconhecer-se, porém, que tal possibilidade fica circunscrita à especificação dos factos que justificam a decisão, não se estendendo à motivação de tal decisão de facto (sendo a esta aplicável o regime do art. 662º, nº 2, d) e 3, b) e d) do CPC)[...].
Do exposto resulta que a arguida falta de motivação da decisão da matéria de facto (falta de fundamentação e omissão de pronúncia) não constitui vício da sentença susceptível de gerar nulidade à luz do art. 615º do CPC, sendo antes patologia que a verificar-se, poderia determinar a aplicabilidade da solução estabelecida no art. 662º, nº 2, d) do CPC”.
Mas nem sequer tem razão o recorrente ao afirmar a falta de motivação dos factos considerados não provados sob os n.ºs 1, 2) e 3 para arguir a nulidade em causa.
Caso tivesse procedido a uma leitura integral e minimamente atenta da sentença na parte em que fundamenta a decisão proferida quanto à decisão relativa à matéria de facto, nela descortinaria a explicação para a circunstância de “darem-se como não provados sob nº 1 a 3, os factos alegados sob os artigos 80º a 82º da contestação”.
Do vício de nulidade que o recorrente Condomínio lhe imputa, não padece, por conseguinte, a sentença recorrida.
3. Reapreciação da matéria de facto.
Não se conformando os recorrentes – autores e réu - com a decisão proferida em primeira instância quanto à matéria de facto submetida a julgamento, reclamam desta instância o reexame da mesma.
Dispõe hoje o n.º 1 do artigo 662.º do Código de Processo Civil que “a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”, estabelecendo o seu nº 2:
A Relação deve ainda, mesmo oficiosamente:
a) Ordenar a renovação da produção da prova quando houver dúvidas sérias sobre a credibilidade do depoente ou sobre o sentido do seu depoimento;
b) Ordenar, em caso de dúvida fundada sobre a prova realizada, a produção de novos meios de prova;
c) Anular a decisão proferida na 1.ª instância, quando, não constando do processo todos os elementos que, nos termos do número anterior, permitam a alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto, repute deficiente, obscura ou contraditória a decisão sobre pontos determinados da matéria de facto, ou quando considere indispensável a ampliação desta”.
Como refere A. Abrantes Geraldes[11], “a Relação deve alterar a decisão da matéria de facto sempre que, no seu juízo autónomo, os elementos de prova que se mostrem acessíveis determinem uma solução diversa, designadamente em resultado da reponderação dos documentos, depoimentos e relatórios periciais, complementados ou não pelas regras de experiência”… “afastando definitivamente o argumento de que a modificação da decisão da matéria de facto deveria ser reservada para casos de erro manifesto” ou de que “não é permitido à Relação contrariar o juízo formulado pela 1ª instância relativamente a meios de prova que foram objecto de livre apreciação”, acrescentando que este tribunal “deve assumir-se como verdadeiro tribunal de instância e, por isso, desde que, dentro dos seus poderes de livre apreciação dos meios de prova, encontre motivo para tal, deve introduzir as modificações que se justificarem”.
3.1. Entende o réu que foi incorrectamente apreciada a matéria dada como provada nos pontos 21), 22) e 25), que deve ter-se por não provada, e a constante dos pontos 1), 2), 3), 4), 5), 6) e 7) considerada não provada que, na sua perspectiva, deve ser julgada provada.
Defende ainda que deve ser considerada provada a matéria dos artigos 30, 47, 119 a 121, 140 a 142, 151, 158 a 161, 163 a 165, 172 a 176, 189, 183, 188 e 193 da contestação.
Para reapreciação da matéria objecto de impugnação, ouviu-se a gravação que contém o registo das declarações/depoimentos prestados em audiência na parte que para a mesma relevam.
- Ponto 21.º: na perspectiva do recorrente, não pode considerar-se provada a matéria em causa por ausência de prova, argumentando o mesmo que “…porque nenhuma testemunha se deslocou ao telhado, nos diferentes dias ou meses desse período, para poder depor sobre tal alegada evolução degenerativa do telhado”, para concluir que “A Mma. Juiz do Tribunal a quo, salvo o devido respeito, excedeu as regras da experiência e decidiu “concluir pelo alegado”, sem qualquer meio probatório nesse sentido, fazendo um juízo conclusivo”.
É certo que à data da realização da perícia já tinha ocorrido a intervenção no telhado e, por virtude dos trabalhos realizados, sanadas as patologias que o mesmo antes apresentava, pelo que o relatório pericial não pode directamente responder à matéria controvertida em questão.
Todavia, se já em 2015, pelo menos, o telhado do prédio necessitava “de obras de manutenção e reparação, atento o seu estado de degradação, ao nível das telhas e caleiros, algumas delas partidas” – ponto 8.º dos factos provados -, não tendo essas obras se concretizado, é dado seguro, de acordo com as mais elementares regras de experiência, que o estado do telhado tenha sofrido agravamento, sofrendo das patologias descritas no ponto 21.º, tanto mais que situando-se o imóvel em zona costeira do norte, o mesmo se acha exposto às agruras dos ventos e à corrosividade da salinidade próprios dessa localização, e aos respectivos efeitos degradativos.
O orçamento de fls. 287, que aponta para a remoção dos elementos metálicos da cobertura do prédio e as fotografias de fls. 426 a 428 constituem ainda elementos coadjuvantes para o reforço da convicção probatória que conduziu ao juízo formulado quanto ao referido segmento factual.
- Ponto 22.º: a matéria nele dada como provada encontra sólido arrimo probatório no teor do relatório pericial junto ao autos, teor da acta n.º 11 da Assembleia Geral Ordinária de Condóminos, realizada a 2.02.2017, na qual foi aprovado o orçamento para a reparação das varandas.
Foram ainda relevantes para a confirmação da matéria em causa as declarações de parte dos autores, do legal representante do condomínio e depoimentos das testemunhas MM, engenheiro civil, que, a pedido dos autores, realizou uma vistoria à fracção pertencente aos mesmos em Dezembro de 2020 e NN, agente imobiliário, que, no âmbito dessa actividade, efectuou visita ao imóvel com vista ao arrendamento da fracção pertencente aos autores, os quais, de modo convergente, aludiram ao estado degradado das varandas e à necessidade de realização de obras de reparação, de forma a impedir infiltrações.
- Ponto 25.º: para além das regras de normalidade e de bom senso permitirem atestar que o estado de degradação em que se acha a fracção dos autores desincentiva qualquer tentativa de compra da mesma, a testemunha OO, amigo dos autores, que acompanhou à fracção um interessado na aquisição da mesma, relatou ter o mesmo se desinteressado do negócio ao confrontar-se com o estado da mesma, conferem consistência probatória à matéria constante do segmento factual em causa, a qual resulta ainda reforçada com os depoimentos das testemunhas PP e QQ, ambos agentes imobiliários.
O recorrente Condomínio também manifesta a sua dissidência com a apreciação da matéria dada como não provada nos pontos 1) a 7), que, na sua perspectiva, deve considerar-se provada.
- Quanto aos pontos 1) a 3), o recorrente convoca as declarações de parte do representante legal da Sociedade Ré e do Condomínio Réu, RR, em parte transcritas no corpo das alegações.
De acordo com o n.º 3 do artigo 466.º do Código de Processo Civil, o tribunal aprecia livremente as declarações das partes, salvo se as mesmas constituírem confissão.
Lebre de Freitas, cujo pensamento se pode reconduzir à tese do carácter supletivo e vinculado à esfera restrita de conhecimento dos factos em termos de valoração das declarações de parte, defende que “a apreciação que o juiz faça das declarações de parte importará sobretudo como elemento de clarificação do resultado das provas produzidas e, quando outros não haja, como prova subsidiária, máxime se ambas as partes tiverem sido efetivamente ouvidas”[12].
Carolina Henriques Martins[13], sustenta, por seu turno que “[...] não é material e probatoriamente irrelevante o facto de estarmos a analisar as afirmações de um sujeito processual claramente interessado no objecto em litígio e que terá um discurso, muito provavelmente, pouco objectivo sobre a sua versão dos factos que, inclusivamente, já teve oportunidade para expor no articulado.
Além disso, [...] também não se pode esquecer o caráter necessário e essencialmente supletivo destas declarações que, na maior parte dos casos, servirá para combater uma fraca ou inexistente prestação probatória.
Caso se considere útil a audição da parte nesta sede quando coexistem outros meios de prova, propomos a sua apreciação como um princípio de prova, equivalente ao mencionado argomenti di prova italiano, que não deixará de auxiliar na persuasão do juiz, mas que apenas o fará em correlação com a restante prova já produzida contribuindo para a sua (des)credibilização, e apenas nesta medida.
Estas são as coordenadas fundamentais para a consideração das declarações de parte no nosso esquema probatório”.
Miguel Teixeira de Sousa, tomando posição sobre a mesma específica questão, escreveu: Se o princípio de prova é o menor grau de prova admissível e se se atribui esse valor às declarações de parte, então o que não teria nenhum valor probatório em si mesmo (nem sequer como mera justificação) passa a poder ter algum valor probatório, ainda que o menor na escala dos valores probatórios. Mais em concreto: se se atribui às declarações de parte relevância como princípio de prova, isso significa que estas declarações, apesar de não serem suficientes para formar a convicção do juiz nem sobre a verdade, nem sobre a plausibilidade ou verosimilhança do facto, ainda assim podem ser utilizadas para corroborar outros resultados probatórios. A conclusão não deixa de ser a mesma, se se pretender defender (…) que as declarações de parte só podem relevar como princípio de prova.
À medida que se baixa nos graus de prova, mais fácil se torna atribuir relevância probatória a um certo meio de prova. Lembre-se o que sucede em sede de procedimentos cautelares. É exatamente com o intuito de facilitar a prova de um facto que o art. 368.º, n.º 1, CPC aceita, no âmbito destes procedimentos, a mera justificação como o grau de prova suficiente.
Assim, em vez de atribuir às declarações de parte o valor de princípio de prova, melhor solução parece ser o de atribuir a estas declarações o grau normal dos meios de prova, que é o de prova stricto sensu ou, nas providências cautelares, o de mera justificação. Isto significa que, de acordo com o critério da livre apreciação da prova, o tribunal tem de formar uma prudente convicção sobre a verdade ou a plausibilidade do facto probando (cf. art. 607.º, n.º 5 1.ª parte, CPC).
Abaixo desta relevância probatória e da convicção sobre a verdade ou a plausibilidade do facto, as declarações de parte não devem ter nenhuma relevância probatória, nem mesmo para corroborarem outros meios de prova. Esta é, aliás, a melhor forma de combater a natural tendência das partes para só deporem sobre factos que lhes são favoráveis”[14].
Já Mariana Fidalgo[15] especifica: “[...] ponto, para nós, assente é que este meio de prova não deve ser previamente desprezado nem objecto de um estigma precoce, sob pena de perversão do intuito da lei e do princípio da livre apreciação da prova. Não olvidando o carácter aparentemente subsidiário das declarações de parte, certo é que foram legalmente consagradas como um meio de prova a ser livremente valorado, e não como passíveis de estabelecer um mero princípio de prova ou indício probatório, a necessitar forçosamente de ser complementado por outros. Assim sendo, e ainda que tal possa naturalmente suceder com pouca frequência na prática, defendemos que será admissível a concorrência única e exclusiva deste meio de prova para a formação da convicção do juiz em determinado caso concreto, sem recurso a outros meios de prova”.
Também convoca o depoimento da testemunha SS, que exerce funções de administrativa por ser administrativa na sociedade ré C....
Ambos se referiram ao que foi deliberado na Assembleia de 18.09.2015, designadamente quanto à contribuição dos condóminos para a realização das obras da cobertura do edifício, incluindo os que, no âmbito da anterior administração, haviam pago integralmente ou parcialmente a respectiva prestação, e o destino a atribuir ao dinheiro que sobrasse.
Porém, o afirmado pelo legal representante legal da Sociedade Ré e do Condomínio Réu, que pela identificada testemunha não encontram qualquer expressão na acta da referida Assembleia de 18.09.2015, da qual não consta qualquer deliberação com o conteúdo que sustentam.
Ora, como detalhadamente, e com pleno acerto, esclarece a sentença recorrida, “...alega a Ré, nos artigos 80º a 82º da contestação que na referida assembleia de 18.09.2015 foi aprovado um segundo orçamento que todos os condóminos deveriam pagar, pois que para igualar a situação dos condóminos que haviam pago o primeiro impunha-se que todos pagassem duas vezes o valor orçamentado.
Resulta do teor da acta que “De seguida pela administração foi apresentado um relatório técnico de vistoria e apresentados orçamentos para reabilitação do telhado do edifício.
Após análise dos mesmos passou-se à sua discussão tendo os condóminos deliberado por unanimidade não aprovar aquele orçamento dado a existência dum orçamento que fora anteriormente aprovado para aqueles fins. (Trata-se do orçamento referido nos factos provados sob nº 7) (…) Mais se deliberou por unanimidade que o valor da empreitada, que ronda os 20.000,00, mas sujeito a confirmação pelo empreiteiro, será distribuído por todos os condóminos de habitação de acordo com os critérios legais em seis prestações mensais, iguais e sucessivas com início a 30 de Outubro”. Com o devido respeito, o teor da acta não revela o que aparentemente foi interiorizado pela administração do condomínio e pelos condóminos ouvidos em audiência.
Na interpretação dos negócios jurídicos formais estabelece artigo 238º, nº 1, do Código Civil, que “a declaração não pode valer com um sentido que não tenha um mínimo de correspondência no texto do respectivo documento, ainda que imperfeitamente expresso”. Tal significa que o que se escreveu não pode ter o sentido do que se pretendeu dizer se tal não resultar minimamente do texto. No caso um declaratário, normal, minimamente diligente, o que retira do texto daquela acta é que manteve-se o orçamento aprovado em Maio de 2014 a distribuir por todos os condóminos de acordo com os critérios legais. Com efeito, nenhuma referência é feita a que tal orçamento deveria ser pago em duplicado e que por isso os Autores estavam obrigados a repetir a sua prestação. E esta interpretação é tão válida que quando executados para pagamento da prestação do orçamento referido na acta de Setembro de 2015 os Autores viram a sua oposição à execução procedente por ali terem provado que já haviam pago a prestação do orçamento aprovado em 2014 que era a este orçamento que a acta se referia e mais nenhum. Ora, tal decisão proferida nos autos de embargos de executado constitui caso julgado em relação a tal questão pois que na referida acção eram parte os aqui Autores e o Réu Condomínio. Daí darem-se como não provados sob nº 1 a 3, os factos alegados sob os artigos 80º a 82º da contestação”.
Não constando da acta da aludida Assembleia qualquer deliberação com o sentido defendido pelo recorrente nos artigos 80.º a 82.º da contestação por si apresentada, a correspondente matéria vertida nos pontos 1), 2) e 3) só podia ser considerada não provada, como decidido em primeira instância, pelas razões que a própria sentença devidamente fundamenta.
Ponto 4): As declarações do autor – único meio de prova convocado pelo recorrente Condomínio para justificar decisão de sentido contrário ao proferido – são manifestamente inconclusivas quanto à participação do mesmo nas reuniões mencionadas no segmento decisório em causa, sendo, por conseguinte, insuficientes para confirmação da matéria em causa.
Pontos 5) e 6): o tribunal recorrido, como refere na fundamentação ao primeiro daqueles segmentos decisórios, “considerou o teor da decisão proferida nos embargos de executado que, como referido, constitui caso julgado quanto a tal questão”.
Tendo o Condomínio ... instaurado execução contra os aqui autores AA e BB deduziram estes oposição contra tal execução, por meio de embargos, com fundamento em que nada devem ao exequente relativamente ao orçamento para reabilitação do telhado do edifício, dado terem já pago a quantia que cabia à fracção de que são proprietários, em discussão também nestes autos.
Nesse processo, que correu termos com o n.º 6374/16.4T8PRT-A, pelo Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo de Execução do Porto – Juiz 1, considerou-se, nomeadamente provado, que “Em 30 de Julho de 2014, os executados, na sequência do aviso de cobrança referido em 9, pagaram à exequente a parte que lhes competia de acordo com o orçamento aprovado e com as condições aprovadas para a sua divisão por todas as frações para as referidas obras à administração então em exercício, nos termos do recibo de quitação emitido pela exequente, que se mostra junto a fls. 28” – ponto 10.º da respectiva sentença – e que “A quantia efectivamente paga pelos executados foi de € 1.189,21 uma vez que a administração ao proceder ao cálculo por fração pensou não estar incluído o IVA, quando o mesmo estava já contabilizado, pelo que posteriormente retirou tal verba” – ponto 11.º.
Na sentença proferida nesses autos a 2.11.2018, transitada em julgado, considerou-se, entre o mais, que “não se mostra exigível o cumprimento da obrigação aos executados embargantes, na justa medida em que efectuaram pagamento liberatório, não estando consequentemente, obrigados a suportar pela segunda vez o mesmo encargo”, julgando, por isso, procedentes os embargos e declarando extinta a execução.
O instituto do caso julgado encerra em si duas vertentes, que, embora distintas, se complementam: uma, de natureza positiva, quando faz valer a sua força e autoridade, que se traduz na exequibilidade das decisões; a outra, de natureza negativa, quando impede que a mesma causa seja novamente apreciada pelo mesmo ou por outro tribunal[16].
De acordo com o acórdão da Relação de Lisboa de 18.4.2013[17], “A autoridade de caso julgado de sentença transitada e a excepção de caso julgado constituem efeitos distintos da mesma realidade jurídica. Enquanto esta tem em vista obstar à repetição de causas e implica a tríplice identidade - de sujeitos, de pedido e de causa de pedir - aquela implica a proibição de novamente ser apreciada certa questão, podendo actuar independentemente da mencionada tríplice identidade.
Nos termos do artigo 581.º, n.º 1 do Código de Processo Civil:
1- Repete-se a causa quando se propõe uma ação idêntica a outra quanto aos sujeitos, ao pedido e à causa de pedir.
2- Há identidade de sujeitos quando as partes são as mesmas sob o ponto de vista da sua qualidade jurídica.
3 - Há identidade de pedido quando numa e noutra causa se pretende obter o mesmo efeito jurídico.
4 - Há identidade de causa de pedir quando a pretensão deduzida nas duas ações procede do mesmo facto jurídico (...).
Na repetição da causa exige a lei processual identidade de sujeitos, sob o ponto de vista da qualidade jurídica dos mesmos. Não se exige uma identidade física ou nominal, mas antes uma mesma identidade na perspectiva dos interesses que se debatem.
O caso julgado confere à decisão caráter definitivo. Uma vez transitada em julgado, a decisão não pode, em princípio[18], ser alterada; antes adquire estabilidade, deixando de ser lícito a parte vencida provocar a sua alteração mediante o uso dos recursos ordinários. E sendo de caso julgado material, relativo ao mérito da causa, a estabilidade ultrapassa as fronteiras do processo, e portanto, além da preclusão operada no processo, produz-se a impossibilidade de a decisão ser alterada mesmo noutro processo. Apenas com a restrição excepcional do recurso de revisão, uma vez transitada em julgado, a sentença passa a definir, de forma definitiva, a relação jurídica sobre que recaiu.
Quer na sua função positiva de autoridade, quer na função negativa, que impede que a mesma causa seja novamente apreciada pelo tribunal[19], é a necessidade de certeza do direito e da segurança das relações jurídicas que se acautela: “desde que uma sentença, transitada em julgado, reconhece a alguém certo benefício, certo direito, certos bens, é absolutamente indispensável, para que haja confiança e segurança nas relações sociais, que esse benefício, esse direito, esses bens constituam aquisições definitivas, isto é, que não lhe possam ser tirados por uma sentença posterior. Se assim não fosse, se uma nova sentença pudesse negar o que a primeira concedeu, ninguém podia estar seguro e tranquilo; a vida social, em vez de assentar sobre uma base de segurança e de certeza, ofereceria o aspecto da insegurança, da inquietação, da anarquia. […] A força e a autoridade derivam […] da necessidade superior de certeza e segurança jurídica [20].
A força do caso julgado assenta, pois, na necessidade de assegurar a certeza das situações jurídicas apreciadas, nos termos em que o foram, que é inerente às decisões definitivamente julgadas, pressupondo a existência de uma conexão que impeça que a primeira decisão, transitada em julgado, seja contraditada pela segunda.
Em regra, o caso julgado forma-se sobre a parte decisória da sentença, não sobre os motivos ou fundamentos da decisão (teoria limitativa). Em princípio, estes não são mais do que elementos interpretativos e definidores do alcance da parte dispositiva da decisão. O julgado sobre os motivos só ganha relevância em relação a aspectos que poderiam ser objecto de processo autónomo, no qual sobre eles se formaria o caso julgado nos termos normais[21]. Todavia, tem-se entendido que a determinação dos limites objectivos do caso julgado e a sua eficácia passam pela interpretação do conteúdo da sentença, nomeadamente, quanto aos seus fundamentos que se apresentem como antecedentes lógicos necessários à parte dispositiva do julgado.[22] Como precisa o acórdão do STJ de 12.1.2010[23], “o caso julgado forma-se, em princípio, sobre a decisão contida na sentença ou no acórdão, e não sobre as razões que determinaram o juiz a atingir as soluções que deu às várias questões que teve de resolver para chegar à conclusão final, a menos que se tenha de recorrer à respectiva parte motivatória para reconstituir e fixar o seu verdadeiro conteúdo, em virtude de a fundamentação da sentença ou do acórdão constituir um pressuposto lógico e necessário da decisão”.
Também J. Alberto dos Reis já defendia que a ideia de que a força do caso julgado se deva limitar à parte dispositiva da sentença tem de sofrer restrições, sustentando que “há que atender aos fundamentos ou motivos para interpretar devidamente a parte dispositiva, isto é, para fixar, com precisão, o sentido e alcance desta parte”.
A autoridade do caso julgado justifica-se/impõe-se pela necessidade da certeza e da segurança nas relações jurídicas. E essa autoridade não é retirada, nem posta em causa mesmo que a decisão transitada em julgado não tenha apreciado correctamente os factos ou haja interpretado e aplicado erradamente a lei: no mundo do Direito tudo se passa como se a sentença fosse a expressão fiel da verdade e da justiça[24].
De extrema pertinência, para a discussão da situação em análise, se revelam os ensinamentos do Prof. Castro Mendes[25], a propósito do efeito preclusivo do caso julgado: “Fora da hipótese de factos objectivamente supervenientes – e esta hipótese reconduz-se à ideia dos limites temporais do caso julgado: a sentença só é válida «rebus sic stantibus» - cremos que os «contradireitos» que o réu podia fazer valer são ininvocáveis contra o caso julgado. O fundamento essencial do caso julgado não é de natureza lógica, mas de natureza prática; não há que sobrevalorizar o momento lógico do instituto, por muito que recorramos a ele na técnica e construção da figura. «O que se converte em definitivo com o caso julgado não é a definição de uma questão, mas o reconhecimento ou não reconhecimento de um bem»”.
E adianta, esclarecidamente, o mesmo autor: “a paz e a ordem na sociedade civil não permitem que os processos se eternizem e os direitos das partes reconhecidos pelo juiz após uma investigação conduzida pelo juiz de acordo com as normas legais voltem a ser contestados sob qualquer pretexto.
Outro problema que se põe é o de saber se esta figura do efeito preclusivo pertence ao instituto do caso julgado, ou lhe é estranha.
A dogmática tradicional e dominante integra-o no caso julgado. Uma regra clássica diz-nos aqui que tantum judicatum quantum disputatum vel disputari debebat, o caso julgado abrange aquilo que foi objecto de controvérsia, e ainda os assuntos que as partes tinham o ónus (não o dever) de trazer à colação; neste último caso, estão os meios de defesa do réu.
(…) Outros autores vêem este efeito preclusivo como efeito da sentença transitada, mas efeito distinto do caso julgado.
(…) Apreciando esta construção, notaremos antes de mais estarmos inteiramente de acordo com Schwab, quando este salienta que «não tem qualquer relevância prática, se os factos são excluídos com fundamento na eficácia do caso julgado ou com fundamento numa preclusão estranha ao caso julgado». O próprio Habscheid reconhece que caso julgado e efeito preclusivo «ambos se completam, ambos prosseguem o mesmo fim», tutela da paz e da segurança jurídica e chama ao efeito preclusivo «princípio-irmão» do caso julgado material.
(…) A indiscutibilidade de uma afirmação, o seu carácter de res judicata, pode resultar pelo contrário tanto de uma investigação judicial, como do não cumprimento dum ónus que acarrete consigo vi legis esse efeito. Sucede isso no processo cominatório pleno, em que faz caso julgado uma questão decidida apenas pela aplicação de normas de direito processual civil. E sucede ainda a respeito das questões que as partes têm o ónus de suscitar, sob pena de serem ulteriormente irrelevantes para impugnar ou defender uma situação jurídica acertada ou rejeitada em termos de caso julgado.”
Mesmo em situações em não se verifique a identidade objectiva, pressuposto da excepção do caso julgado, a autoridade do caso julgado pode impor-se. De acordo com Teixeira de Sousa, a autoridade de caso julgado implica uma aceitação de uma decisão proferida numa acção anterior, decisão esta que se insere, quanto ao seu objecto, no objecto da segunda acção, enquanto questão prejudicial, constituindo, assim, uma vinculação à decisão de distinto objecto posterior: “quando o objecto processual anterior é condição para a apreciação do objecto processual posterior, o caso julgado da decisão antecedente releva como autoridade de caso julgado material no processo subsequente; quando a apreciação do objecto processual antecedente é repetido no objecto processual subsequente, o caso julgado da decisão anterior releva como excepção do caso julgado”[26]. A autoridade do caso julgado realça a impossibilidade da discussão em nova acção de questão que se considera definitivamente resolvida naquela[27].
Assim, a decisão de mérito produzida num determinado processo, confirmando ou constituindo uma situação jurídica, pode, em alguns casos, ser vinculativa noutros processos onde se vise a apreciação ou constituição de outras situações jurídicas com ela conflituantes. Para isso, releva a existência de uma relação entre o objecto de uma e o objecto da outra que implique a possibilidade de confirmação ou de divergência ou contradição da decisão anterior com a decisão a proferir na acção posterior, seja ela de identidade (ocorre nas situações de excepção de caso julgado), seja ela de prejudicialidade ou de concurso (casos de autoridade do caso julgado).
Há que notar a tendência jurisprudencial quanto ao entendimento que uma questão essencial num primeiro processo vincula a decisão do outro tribunal que julgue a segunda acção. Com a autoridade do caso julgado, os tribunais ficam vinculados às decisões uns dos outros, quanto a questões essenciais. Se a decisão em causa foi decisiva para a procedência ou improcedência da acção, impõe-se aquela autoridade, não podendo o tribunal da segunda acção julgá-la em contrário, mesmo que a causa de pedir seja diferente.
As questões essenciais são as que respeitam aos factos judiciais, os factos concretos que são determinados e separados de todos os outros pela norma aplicável e foram tornados certos através da decisão que sobre eles recaiu após transitar em julgado e estando perante as mesmas partes.
Nesta perspectiva, só as questões essenciais poderão ter a autoridade de caso julgado, o que significa que só a terão as decisões sobre questões relativas à causa de pedir da acção transitada. Ainda que a sua causa de pedir seja diferente, aquela autoridade deve impor-se na segunda acção.
Deste modo, acertada se mostra a decisão quanto aos pontos 5) e 6) dos factos não provados com fundamento na autoridade de caso julgado formado com a sentença proferida no identificado processo de embargos de executado.
- Ponto 7.º): Não existe suporte documental que ateste a interpelação em causa, cuja verificação nem sequer é confirmada pela depoimento da testemunha SS, que apenas alude à circunstância de o autor não ter procedido ao pagamento da quota de obras constante da deliberação da acta n.º 16.
Reclama ainda o recorrente Condomínio que aos factos provados seja aditada a matéria constante do por si alegado nos artigos 30, 47, 119 a 121, 140 a 142, 151, 158 a 161, 163 a 165, 172 a 176, 189, 183, 188 e 193 da contestação.
Às partes incumbe alegar os factos essenciais que integrem a causa de pedir que serve de amparo à pretensão formulada, bem como os que suportem as excepções invocadas – artigo 5.º, n.º 1, a) do Código de Processo Civil.
E na decisão sobre a matéria de facto, o tribunal só pode declarar provados [ou não provados] factos alegados pelas partes, ou os factos instrumentais que considere relevantes, como precisa Lebre de Freitas[28]: “[n]a decisão de facto, o tribunal declara quais os factos, dos alegados pelas partes e dos instrumentais que considere relevantes, que julga provados […]”.
Os factos articulados na contestação que o recorrente pretende que sejam adicionados ao acervo factual considerado provado ou são repetição dos que já integram tal acervo, ou constituem duplicação entre si (nomeadamente, artigos 173.º e 174.º da contestação), ou não revelam aquela natureza essencial, sendo desprovidos de relevância para a decisão da causa, segundo as várias soluções jurídicas plausíveis, constituindo alguns deles meras argumentações conclusivas (designadamente, artigo 172.º da contestação).
Daí ter, com acerto, a sentença recorrida considerado que “o demais alegado é meramente conclusivo, sem relevo para a decisão da causa, repetido e, ou, matéria de direito”, razão pela qual não o incluiu no elenco dos factos provados ou dos factos não provados.
Como tal, mantém-se, sem alterações, a decisão relativa à matéria de facto na parte em que é impugnada pelo réu/recorrente Condomínio do Edifício sito à Rua ..., Póvoa de Varzim, improcedendo, nesta parte, o recurso do mesmo.
3.2. Também os autores manifestam a sua discordância quanto à apreciação do ponto 25.º dos factos dados como provados, reclamando a alteração da sua redacção de forma a que, de acordo com a prova produzida, dele passe a constar: “no estado em que se encontra o seu interior e a caixa de escadas, os AA. não conseguem vender e arrendar o apartamento”, indicando os meios de prova em que fundamentam a pretendida alteração daquele segmento decisório.
Os autores alegam, com efeito, no artigo 64.º da petição inicial que “…no estado em que se encontra o seu interior e a caixa de escadas, os AA. também não conseguem dar de arrendamento o apartamento a “terceiros”, como gostariam que acontecesse (muito menos vender a fração)”, para, logo a seguir, acrescentarem (artigo 65.º): “Efetivamente, após a sua saída, os AA, chegaram a mostrar o apartamento para arrendamento a vários interessados, mas, depois de o verem, recusaram arrendá-lo, atentas as indicadas graves deficiências e a falta de condições de habitabilidade”.
O relatório pericial faz alusão às várias patologias detectadas quer no interior da fracção dos autores por virtude de infiltrações a que foi sujeito, e obras necessárias à sua reparação, assim como as patologias que apresentam as fachadas e as varandas do prédio, “fissuradas, apresentando a parte inferior das varandas a armadura de ferro à vista. Pelas fachadas poderão também surgir infiltrações”.
Já depois da reparação do telhado, o mesmo relatório refere que “no tecto e paredes do último lanço de escadas existem sinais evidentes de terem existido infiltrações, apresentando mau aspecto”.
Em audiência, no âmbito dos diversos esclarecimentos que lhe foram solicitadas e a que respondeu, o perito, autor do referido relatório, TT, engenheiro civil, precisou que qualquer pessoa eventualmente interessada no arrendamento da fracção para nela viver, ao inteirar-se daquelas patologias, designadamente o estado em que se encontra a caixa de escadas, desiste de tal negócio.
Também a já indicada testemunha OO esclareceu que qualquer “inquilino normal”, ao ver o aspecto da caixa de escadas e o interior da fracção dos autores, não arrenda.
Também as testemunhas PP e NN, agentes imobiliários, confirmaram terem levado clientes à fracção dos autores, já depois de concretizadas as obras no telhado, nenhum deles tendo aceite celebrar o contrato de arrendamento face ao estado degradado da fracção.
Assim, de acordo com a mencionada prova produzida, altera-se a redacção do ponto 25.º dos factos provados, cujo teor passará a ser o seguinte:
Ponto 25.º: No estado em que se encontra o seu interior e a caixa de escadas, os AA. não conseguem vender ou arrendar o apartamento.
Nesta parte procede, assim, a impugnação recursivamente deduzida pelos autores à decisão relativa à matéria de facto.
4. Do mérito do julgado.
4.1. Da responsabilidade civil por facto ilícito.
Através da acção que propõem contra os réus, reclamam os autores a condenação solidária daqueles no pagamento da quantia mensal de € 400.00, desde Dezembro de 2016 até ao termo da obra de reparação e impermeabilização do telhado e da caixa de escadas, esta com pintura, a título de reparação pelos danos sofridos em consequência da privação de utilização e de rentabilização da fracção de que são proprietários no edifício sito à Rua ..., Póvoa de Varzim.
Como fundamento da pretensão deduzida, alegam que, em virtude da omissão da realização das obras de reparação do telhado e do pagamento da indemnização em que o Réu condomínio foi condenado, tiveram de mudar de habitação dado a sua fracção autónoma não dispor de condições de habitabilidade, circunstância que, aliada à situação do prédio, obsta que consigam interessados na aquisição ou arrendamento da mesma.
Quanto às condições de habitalidade – ou de falta delas – já a sentença de 18.01.2016, transitada em julgado, proferida no processo n.º 615/15.2T8PVZ, que correu termos pela Instância Local, Secção Cível, de Póvoa de Varzim, dava conta que:
- “O telhado do prédio necessita de obras de manutenção e reparação, atento o seu estado de degradação, ao nível das telhas e caleiras, algumas delas partidas”- ponto 6.º dos factos provados;
- “Em virtude do mau estado do telhado e das caleiras do prédio, as águas pluviais – e a humidade – entrou na fração autónoma referida em 1” – ponto 11.º dos factos provados;
- “Por via do referido em 11, os tectos da cozinha/marquise, da sala, dos 2 quartos, da despensa, do hall, do corredor da fracção em causa apresentam-se com gotículas de água, húmidos e escurecidos” – pongo 12.º dos factos provados;
- “O piso da fracção que é em parquet, foi afectado pela entrada das águas pluviais, levantando os tacos/réguas no corredor, na sala de estar, no hall e nos quartos” – ponto 13.º dos factos provados;
- “Os Autores viveram durante 2014/2015 com gotículas a cair-lhes do tecto e com humidade em casa, o que a tornou fria e desconfortável” – ponto 16.º dos factos provados.
- “...a reparação desta fração deverá traduzir-se no seguinte: a) picar as massas pobres ou podres dos tectos; b) regularizar os tectos e estucá-los a gesso; c) compor as molduras; d) lixar e pintar os tectos e paredes afectadas pelas infiltrações (pintura com tintas CIN). No pavimento: e) levantar o parquet afectado pelas infiltrações; f) colocar parquet novo; g) lixar, polir e envernizar os dois quartos”.
Por virtude do referido quadro factual condenou a referida sentença o réu Condomínio a pagar aos autores a quantia de € 3.382,50, acrescida dos respectivos juros de mora, como compensação pelos danos na sua fracção causados pelas infiltrações provenientes do telhado do prédio.
Já em Maio de 2014 a necessidade de realização urgente de obras de reparação do telhado havia sido debatida pelos condóminos, reunidos em assembleia, que, para o efeito, aprovaram um orçamento.
A mesma questão foi sucessivamente discutida em assembleias seguintes, designadamente as realizadas a 8.04.2015, 18.09.2015, 20.05.2016, 1.02.2019 e 15.03.2019, tendo o contrato de empreitada para substituição da cobertura do prédio sido celebrado apenas a 23.05.2019 pela administração do condomínio, tendo os respectivos trabalhos sido concluídos a 30.07.2019.
Entretanto, por falta de condições de habitabilidade da sua fracção, em finais de Novembro de 2016 os autores deixaram de nela terem a sua residência, passando a morar no Largo ..., na freguesia ..., Vila do Conde.
Desde então, e continuando o estado de degradação do telhado edifício a agravar-se, os autores ficaram não só impedidos de usar e fruir da sua fracção autónoma, como ainda de rentabilizar a mesma, por, dado o estado do seu interior e da caixa de escadas, não conseguirem vendê-la ou arrendá-la.
Os autores são titulares do direito de propriedade da fracção designada pela letra “AF”, correspondente ao 5.º andar direito do bloco ..., sita no último piso do prédio urbano sito na Rua ..., ..., Póvoa de Varzim, constituído em propriedade horizontal.
Nos termos do n.º 1 do artigo 1420.º do Código Civil, “Cada condómino é proprietário exclusivo da fracção que lhe pertence e comproprietário das partes comuns do edifício”, sendo que “O conjunto dos dois direitos é incindível; nenhum deles pode ser alienado separadamente, nem é lícito renunciar à parte comum como meio de o condómino se desonerar das despesas necessárias à sua conservação ou fruição” – n.º 2 do mesmo normativo.
Assim, cada condómino é proprietário exclusivo da fracção que lhe pertence e comproprietário das partes comuns do edifício; deste modo, em excepção ao princípio superfícies solo cedit, no mesmo edifício coexistem direitos de propriedade plena sobre as fracções autónomas e de compropriedade sobre as partes comuns.
Como proprietários, em exclusivo, da dita fracção autónoma, os autores gozam “... de modo pleno e exclusivo dos direitos de uso, fruição e disposições das coisas que lhe pertencem, dentro dos limites da lei e com observância das restrições por ela impostas” – artigo 1305.º do Código Civil.
Com efeito, como refere o acórdão da Relação do Porto de 23.04.2018[29]: “na propriedade horizontal coexistem num mesmo edifício formando um conjunto incindível, os direitos de propriedade exclusiva dos condóminos sobre as respectivas fracções autónomas e os direitos dos mesmos condóminos sobre as partes comuns, por princípio definidos segundo o regime da compropriedade – cfr. art. 1420º, n.º 1 do Cód. Civil. Destarte, ao lado de um direito de compropriedade sobre as partes comuns de que todos os condóminos são contitulares, cada condómino é proprietário exclusivo da sua própria fracção autónoma.
Como assim, cada um dos proprietários da respectiva fracção autónoma é titular exclusivo de um direito real, de natureza absoluta, que lhe permite exigir de qualquer terceiro, seja ele outro condómino, seja ele um terceiro alheio ao edifício em propriedade horizontal, seja ele, ainda, o próprio conjunto dos condóminos, que se abstenha de actos que perturbem ou diminuam o pleno gozo e fruição da sua fracção. Este direito resulta do preceituado no art. 1305º do Cód. Civil segundo o qual o proprietário goza de modo pleno e exclusivo dos direitos de uso, fruição e disposição das coisas que lhe pertencem, dentro dos limites da lei e com observância das restrições por ela impostas, sendo que esse direito, enquanto direito real absoluto, é oponível a qualquer terceiro.
Nestes termos e à luz do preceituado no art. 483º do Cód. Civil a violação desse direito subjectivo pode importar a obrigação de o agente da violação indemnizar o lesado, caso se verifiquem os demais pressupostos da responsabilidade civil”.
Viram-se, pois, os autores privados do direito pleno de gozo relativamente à fracção de que são donos, conferido pelo direito de propriedade de que são titulares, com os inerentes prejuízos decorrentes dessa privação, os quais foram causados pela persistente violação do dever do condomínio de executar, nas partes comuns do edifício, designadamente no telhado, as obras necessárias à sua urgente reparação, dado o estado de degradação em que se achava já em 2014, e que com o decorrer do tempo se foi acentuando, pondo, assim, termo às infiltrações causadas na fracção dos autores através do telhado do edifício.
Como já a sentença proferida no aludido processo 615/15.2T8PVZ, que condenou o réu Condomínio em indemnização a favor dos autores pelos danos causados na fracção de que estes são proprietários, referia, “de acordo com o disposto no art. 492.º, n.º 1, do Código Civil [...], o proprietário ou possuidor de edifício ou outra obra que ruir, no todo ou em parte, por vício de construção ou defeito de conservação, responde, pelos danos causados, salvo se provar que não houve culpa da sua parte ou que, mesmo com a diligência devida, se não teriam evitado os danos. Ademais, a pessoa obrigada por lei ou negócio jurídico, a conservar o edifício ou obra responde, em lugar do proprietário ou possuidor, quando os danos forem devidos exclusivamente à falta de conservação (n.º 2 do preceito em apreço.)
Tendo em consideração este preceito legal e os factos provados, podemos concluir que foi a falta de conservação ou de manutenção, ao nível das telhas e das caleiras, que se presume imputável ao Réu (estamos neste preceito legal perante uma presunção legal de culpa e não responsabilidade objectiva do proprietário ou possuidor), a causadora dos danos ocorridos na fracção autónoma dos Autores, desde logo porque este não provou que não houve culpa sua ou que, mesmo com a diligência devida, se não teriam evitado os danos.”.
E essa culpa, cuja presunção o Réu não conseguiu ilidir, mantém-se com o subsequente comportamento omissivo, ao não diligenciar, com a urgência que a situação reclamava, pela reparação do telhado – tendo apenas celebrado o respectivo contrato de empreitada a 23.05.2019, cujos trabalhos ficaram a 30.07.2019 -, o que contribuiu claramente para o avolumar dos danos dos autores, que assim se viram privados do gozo da fracção que lhes pertence.
Segundo o artigo 483.º, n.º 1 do Código Civil que “aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação”.
Da simples leitura do preceito, resulta que, no caso de responsabilidade por facto ilícito, vários pressupostos condicionam a obrigação de indemnizar que recai sobre o lesante, desempenhando cada um desses pressupostos um papel próprio e específico na complexa cadeia das situações geradoras do dever de reparação.
Reconduzindo esses pressupostos à terminologia técnica assumida pela doutrina, podem destacar-se os seguintes requisitos da mencionada cadeia de factos geradores de responsabilidade por factos ilícitos: a) o facto; b) a ilicitude; c) imputação do facto ao lesante; d) o dano; e) e nexo de causalidade entre o facto e o dano.
Assim, antes de mais, para que o facto ilícito gere responsabilidade é necessário que o agente tenha actuado com culpa, pois a responsabilidade objectiva ou pelo risco tem carácter excepcional, como se depreende da disposição contida no nº 2 do citado preceito legal.
Com efeito, a responsabilidade civil, em regra, pressupõe a culpa, que se traduz numa determinada posição ou situação psicológica do agente para com o facto. Aqui operam as fundamentais modalidades de culpa: a mera culpa (culpa em sentido estrito ou negligência) e o dolo, traduzindo-se aquela no simples desleixo, imprudência ou inaptidão, e esta na intenção malévola de produzir um determinado resultado danoso (dolo directo), ou apenas aceitando-se reflexamente esse efeito (dolo necessário), ou ainda correndo-se o risco de que se produza (dolo eventual).
Em termos de responsabilidade civil consagra-se a apreciação da culpa em abstracto, ou seja, desde que a lei não estabeleça outro critério, a culpa será apreciada pela diligência de um bom pai de família (in abstracto), e não segundo a diligência habitual do autor do facto ilícito (in concreto)[30]. Como sustenta o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 29.01.2008[31], “a lei ficciona um padrão ideal de comportamento que seria o que um homem medianamente sensato e prudente adoptaria se estivesse colocado diante das circunstâncias do caso concreto – critério do “bonus pater familias”; irreleva a diligência normalmente usada pelo agente”.
A culpa define-se, para este efeito, na circunstância de uma determinada conduta poder merecer reprovação ou censura do direito, ou seja, importará sempre avaliar se o lesante, face à sua capacidade e às circunstâncias concretas do caso em que actuou, podia e devia ter agido de outro modo[32].
Como precisa a sentença recorrida, “Por regra, a responsabilidade civil e consequente obrigação de indemnizar fundamenta-se na culpa do agente, pela prática de um facto ilícito e danoso, traduzido numa acção ou omissão controlável pela vontade, violadora de direitos subjectivos de outrem, tal como o é o direito de propriedade, a que o caso vertente se reporta.
Ora, no caso dos presentes autos resulta dos factos provados que como consequência de infiltrações pela cobertura do prédio a fracção dos Autores tornou-se inabitável. A omissão de execução de obras destinadas à conservação e reparação do telhado do prédio foi causa da violação do direito de propriedade dos Autores”.
Acham-se, pois, reunidos os pressupostos enunciados no artigo 483.º do Código Civil, o que confere aos autores o direito de serem ressarcidos pelos danos decorrentes da privação do gozo da sua habitação, desde que foram forçados a abandonar a mesma, em finais de Novembro de 2016, por falta de condições de habitabilidade, dado o seu estado de degradação causado pelas sucessivas infiltrações provenientes do telhado do edifício.
4.2. Do alegado abuso de direito invocado pelo Réu Condomínio.
Sustenta o Réu Condomínio nas conclusões com que remata as suas alegações:
7.- [...], foi a atuação dos Autores, em manifesto abuso de direito, que conduziu a que as obras se tivessem atrasado na sua adjudicação e execução.
8.- De resto, se atualmente as obras estão executadas, e se porventura cessou a causa de infiltrações, tal deve-se aos demais condóminos do Réu que não aos Autores, que persistem em não comparticipar para tal obra, sendo uns caloteiros relapsos que, qual sanguessugas, vivem à custa do esforço dos vizinhos.
9.- E para além dos seus vizinhos pagarem, a expensas exclusivas, tais obras, ainda reclamam destes o pagamento de indemnizações pelo decurso do tempo sem as mesmas se terem realizado”.
Segundo o artigo 334.º do Código Civil, “é ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito”.
Para Pires de Lima e Antunes Varela[33], aquele normativo adoptou a concepção objectiva de abuso de direito, não sendo necessária a consciência de se atingir, com o seu exercício, a boa fé, os bons costumes ou o fim social ou económico do direito conferido, bastando que se excedam esses limites.
O normativo em causa traduz, assim, a ideia de que não basta ser titular de um direito para, sem limites, o mesmo poder ser exercido. O exercício de qualquer direito está sujeito a limitações e restrições.
Para Cunha e Sá[34] o abuso de direito constitui um fenómeno revelador de que o direito subjectivo não pode ser abstractamente encarado em termos meramente conceitualistas, pois que em certa e determinada situação, experimentalmente concreta, podemos descobrir concordância com a estrutura formal de um dado direito subjectivo e, simultaneamente, discordância, desvio, oposição, ao próprio valor jurídico que daquele comportamento faz um direito subjectivo, concluindo que “neste encobrir, consciente ou inconscientemente, a violação do fundamento axiológico de certo direito com o preenchimento da estrutura formal do mesmo direito é que reside o cerne, a essência do abuso de direito”.
Defende, a propósito, Castanheira Neves[35], que o abuso de direito é um limite normativamente imanente ou interno dos direitos subjectivos, pelo que no comportamento abusivo são os próprios limites normativos-jurídicos do direito particular que são ultrapassados.
Assim, uma das restrições ao exercício de direitos subjectivos é justamente imposta pela necessidade de salvaguarda da boa fé da parte contrária, estando vedado o exercício do direito cujo titular exceda manifestamente os limites da boa fé.
Não basta, todavia, a existência de uma qualquer atitude ou conduta contraditória para que se recaia na figura do abuso de direito.
Para que este possa ocorrer exige-se que aquele contra quem é invocado tenha criado uma situação objectiva de confiança, isto é, que haja adoptado um comportamento que “objectivamente considerado, é de molde a despertar noutrem a convicção de que ele também no futuro se comportará coerentemente, de determinada maneira (…). Para que a conduta em causa se possa considerar causal em relação à criação da confiança, é preciso que ela directa ou indirectamente revele a intenção do agente de se considerar vinculado a determinada atitude no futuro”[36].
Exige-se ainda que, com base nessa situação de confiança, a contraparte tome “disposições ou organize planos de vida de que lhe surgirão dúvidas, se a sua confiança legítima vier a ser frustrada”[37].
Finalmente, exige-se também a boa fé de que quem confiou.
No caso em apreço, não só não se comprovou que os autores não procederam ao pagamento da sua comparticipação nas obras – ponto 5.º dos factos não provados –, como, ao invés, na já mencionada acção n.º 615/15.2T8PVZ, cuja sentença já transitou em julgado, ficou provado que “...os Autores pagaram ao Réu a quota-parte que lhes correspondia em fac da permilagem que a sua fracção representava, no valor de € 1.189,92 – ponto 9.º dos factos provados, e no processo de embargos que os mesmos deduziram contra a execução que o ora réu contra eles instaurou, que correu termos com o n.º 6374/16.4T8PRT-A, cuja sentença, proferida a 2.11.2018, igualmente transitou em julgado, e nos quais foi considerado provado que:
- Em 30 de Julho de 2014, os executados, na sequência do aviso de cobrança referido em 9, pagaram à exequente a parte que lhes competia de acordo com o orçamento aprovado e com as condições aprovadas para a sua divisão por todas as frações para as referidas obras à administração então em exercício, nos termos do recibo de quitação emitido pela exequente, que se mostra junto a fls. 28 – ponto 10.º da respectiva sentença; e que
- A quantia efectivamente paga pelos executados foi de € 1.189,21 uma vez que a administração ao proceder ao cálculo por fração pensou não estar incluído o IVA, quando o mesmo estava já contabilizado, pelo que posteriormente retirou tal verba” – ponto 11.º da mesma sentença.
De resto, com fundamento nesse comprovado pagamento, foram os embargos julgados procedentes e declarada extinta a execução.
E na mesma sentença diz-se especificamente quanto ao pagamento pelos aqui autores da quota-parte da responsabilidade dos mesmos para a realização das obras no telhado: “Em cumprimento da obrigação para si adveniente do aludido ato colegial, os embargantes satisfizeram a sua dívida condominial a qual, neste contexto, teve a virtualidade de extinguir o seu débito nos termos do disposto nos arts. 767.º e 769.º do Código Civil.
Significa isto, pois, que a circunstância de, no ínterim, ter havido mudança quanto à administração do condomínio é facto que, naturalmente, não pode importar o renascimento do crédito que já se mostrava extinto pelo pagamento.
Nestas condições, restaria, pois, à atual administração do condomínio exigir da anterior administração do condomínio o reembolso das importâncias que recebeu dos embargantes a fim de suportar (juntamente com as demais contribuições condominiais devidas pelos outros condóminos a esse título) as despesas com o pagamento das obras cuja realização foi aprovada na assembleia de condóminos realizada a 4.5.2014 e documentada na ata n.º 5 [...]”.
Não se compreende, assim, que o réu Condomínio, apesar do comprovado pagamento realizado pelos autores, expressamente reconhecido naqueles anteriores processos, insista infundadamente que os autores não satisfizeram o pagamento da quota-parte que lhes era exigível para a realização das obras de reparação do telhado – como se eles tivessem de cumprir duas vezes a mesma prestação pelo facto de a anterior administração do condomínio se haver ilicitamente apoderado dos valores recebidos dos condóminos... – e, pior que isso, use tal argumento, que sabe ser desprovido de verdade, para considerarem abusivo o direito que vieram exercer de reclamar a reparação dos danos causados na sua fracção pelo facto de o réu não haver diligenciado pela realização das obras da reparação do telhado, usando, além do mais, de um vocabulário que deve qualificar-se, no mínimo, de deselegante...
Claramente não foi a actuação dos autores que contribuiu para o atraso na adjudicação e execução das obras, não sendo abusivo o direito que pretendem exercer através da acção instaurada contra, entre outros, o réu Condomínio para serem ressarcidos dos prejuízos que tal atraso lhes causou.
4.3. Da responsabilidade da actual administradora C..., Lda.
Defendem os autores, no recurso que interpõem da sentença que, nomeadamente, absolveu a administradora C..., Lda., que devia a mesma ser condenada solidariamente com o réu Condomínio.
Refere, a propósito, a sentença recorrida: “Quanto à responsabilidade pela omissão na execução das obras a mesma cabe, nos termos dos artigos 1424º, nº 1 e 1430º, nº 1 , do Código Civil ao condomínio no seu conjunto, a quem, através da respectiva assembleia, incumbe a administração das partes comuns, cabendo ao mesmo conjunto de todos os condóminos, na proporção do valor das suas respectivas fracções, suportarem as despesas necessárias à conservação das partes comuns do edifício.
Quanto ao administrador do condomínio poderá ser-lhe assacada responsabilidade civil, a título pessoal, nos termos do artigo 483º, do Código Civil, conquanto ocorram todos os pressupostos da responsabilidade civil extracontratual.
Com efeito, entre o administrador, como órgão do condomínio, e cada um dos condóminos não existe qualquer relação contratual, a título de contrato de mandato ou de administração, mas, quando muito, entre o administrador e o condomínio, enquanto conjunto de todos os condóminos e considerado este como um centro de interesses representativo desse conjunto dos condóminos, diverso e autónomo perante o interesse de cada um dos condóminos, individualmente considerados.
Ora, o administrador do condomínio não está obrigado á realização de obras de reparação das partes comuns, salvo deliberação da assembleia de condóminos nesse sentido e contribuição financeira dos condóminos para esse efeito.
No caso dos autos não vemos, em face do teor das deliberações tomadas pela assembleia de condóminos, que a administração do condomínio tenha qualquer responsabilidade na omissão da execução das obras”.
A administração da fracção autónoma é da competência exclusiva do condómino titular do respetivo direito de propriedade. Já a administração das partes comuns do prédio constituído em propriedade horizontal cabe à assembleia de condóminos e ao administrador, de acordo com o n.º 1 do artigo 1430.º do Código Civil.
Nos termos do preceito em causa, a administração do condomínio cabe à assembleia de condóminos, como órgão deliberativo, e a um administrador, como órgão executivo, prevendo o artigo 1431.º do citado diploma a obrigatoriedade de realização de uma assembleia anual de condóminos, bem como a possibilidade de convocação de assembleia extraordinária quando necessário.
O artigo 1436.º do mesmo diploma legal, por seu lado, contém a enumeração exemplificativa das funções do administrador.
Da conjugação das citadas disposições legais resulta que cabe à assembleia de condóminos deliberar sobre a realização de obras nas partes comuns do prédio, cabendo ao administrador executar essas mesmas deliberações (cfr. art.º 1436, al. h), do CC).
À actuação do administrador são aplicáveis as regras do contrato de mandato previstas nos artigos 1157.º e seguintes do Código Civil, por força do disposto no artigo 1156.º do mesmo diploma.
O administrador será civilmente responsável pelos danos que cause aos condóminos e a terceiros no exercício da sua actividade, estando sujeito às normas que regem o cumprimento e incumprimento das obrigações em geral. Assim, “O administrador que falta culposamente ao cumprimento das suas obrigações, excede os seus limites ou usa indevidamente os poderes-deveres que a lei lhe confere torna-se responsável pelos prejuízos que causa ao condomínio – art. 798º”[38].
De acordo com o disposto no art.º 1427 do CC, “as reparações indispensáveis e urgentes nas partes comuns do edifício podem ser levadas a efeito, na falta ou impedimento do administrador, por iniciativa de qualquer condómino”.
Podemos então concluir que as obras de reparação do prédio terão de ser ordenadas pela assembleia de condóminos e não pelo administrador, sem esquecer que os condóminos estão obrigados a realizar todas as obras necessárias a preservar a segurança do edifício e de terceiros, sob pena de eventualmente poderem vir a incorrer em responsabilidade civil de harmonia com o art.º 492.º do Código Civil. Quanto ao administrador, embora lhe caiba a execução e não a decisão sobre a realização de obras, não deixa de lhe ser atribuída a função de tomar a iniciativa de levar a efeito as reparações indispensáveis e urgentes, sendo certo que para que uma reparação seja considerada urgente não basta que seja necessária.
Para aferir da eventual co-responsabilidade da administração do condomínio, importa, no caso, atentar no seguinte circunstancialismo fáctico:
- A Ré “C...”, exerce a administração do condomínio deste prédio em propriedade horizontal – bloco ... – desde a sua primeira nomeação, de 24.2.2015.
- No dia 8 de Abril de 2015 reuniu a Assembleia Geral Extraordinária de Condóminos do Edifício ..., da qual foi lavrada a acta nº 7, nos termos da qual “(…) Ponto 2: (…) pela administração foram os presentes informados que o valor dos saldos bancários da conta do condomínio à data da cessão de funções da anterior administração era de € 4,88, bem como do facto de até á presente data todo o espólio do condomínio ainda não ter sido entregue à nova administração. Mais foram os presentes informados da inexistência de qualquer conta de obras pelo que as quotas pagas pelos condóminos a este título, conforme orçamento e distribuição anteriormente aprovada pela anterior administração foram aparentemente furtadas pela anterior administração. De seguida, após discussão pelos condóminos foi deliberado por unanimidade não adoptar para já qualquer medida e, ou, providência judicial a tomar contra a sociedade E..., Lda.
Ponto 3: No que respeita ao terceiro ponto da ordem de trabalhos pela administração foram os presentes informados da necessidade de se proceder à execução de obras no edifício, nomeadamente no telhado de cobertura. Após análise passou-se à discussão tendo os presentes deliberado, por unanimidade, que antes de se aprovar qualquer orçamento deverá a administração visitar as fracções autónomas que padecem de infiltrações encontrar as suas origens e fazer um levantamento das obras que são necessárias, urgentes e inadiáveis. (…)”.
- No dia 18 de Setembro de 2015 reuniu a Assembleia Geral Extraordinária de Condóminos do Edifício ..., da qual foi lavrada a acta nº 8, nos termos da qual “(…) Relativamente ao segundo ponto da ordem de trabalhos pela administração foram os presentes esclarecidos dos montantes pagos pelos condóminos a título de obras à anterior administração, assim como os condóminos que efectuaram prova de tais pagamentos.
Na sequência de tal explicação pelos condóminos foi deliberado por unanimidade que antes de se proceder à instauração de qualquer acção judicial contra os condóminos que não comprovam o pagamento de tal rubrica assim como das quotas ordinárias de condomínio, deverá a administração notificar novamente os mesmos dando-lhe o prazo máximo de 1 mês para que ajam em conformidade. Caso nada digam ou façam deverá a administração proceder à instauração da competente ação Judicial [...].
- No dia 20 de Maio de 2016 reuniu a Assembleia Geral Extraordinária de Condóminos do Edifício ..., da qual foi lavrada a acta nº 10, nos termos da qual, relativamente ao Ponto 1, consta “(…) No que respeita ao primeiro ponto da ordem de trabalhos, pela administração foram os presentes informados da existência de diversos condóminos no edifício que não procedem ao pagamento das prestações para obras.
Mais informou os presentes que tal situação está a inviabilizar a execução total das obras as quais são necessárias e urgentes.
Dadas as devidas explicações pelos condóminos do edifico foi deliberado por unanimidade que deverá a administração proceder á instauração das competentes ações judiciais inclusive ações de insolvência.
Pela administração foi dito que irá proceder conforme o deliberado, contudo não poderá dar inicio às referidas obras, as quais estão orçamentadas e aprovadas, uma vez que o empreiteiro contratado só inicia as mesmas após pagamento.
Pelos condóminos foi dito que compreendem a situação e que aceitam relegar o inicio daquelas mesmas obras para momento posterior [...].
- No dia 1 de Fevereiro de 2019, reuniu a Assembleia Geral Ordinária de Condóminos do Edifício ..., a qual, entre o mais, deliberou:
a) Revogar a deliberação que aprovou o orçamento para obras de 18 de Setembro de 2015 [...];
b) Determinar à administração que arrecade as quantias ainda em falta, correspondentes ao orçamento aprovado na assembleia de 04 de maio de 2014, na vigência da E..., Lda.
c) Determinar à administração que diligencie para cobrar da E..., Lda. os valores de que ela se apoderou, correspondente aos condóminos que pagaram o orçamento para obras que foi aprovado na vigência da administração E..., Lda., aprovado em 04 de maio de 2014 (entre os quais os condóminos AA e mulher, e outros em idêntica circunstância) [...].
d) Determinar à administração que restitua aos condóminos que pagaram o orçamento de obras aprovado na assembleia de 18 de Setembro de 2015, da vigência da C..., Lda., as correspondentes prestações [...].
Em consequência do anteriormente deliberado foi revogada a adjudicação e realização de obras na cobertura do edifício, pois que não existe dinheiro para as pagar, enquanto não for cobrado o valor de obras que a anterior administração, E..., Lda., se apoderou.
Resulta do descrito quadro factual que, embora a administradora C..., Lda tenha sido sucessivamente mandatada, desde que iniciou funções, em 24.02.2015, pelas assembleias de condóminos realizadas, pelo menos até à assembleia de 1.02.2019, para providenciar pela cobrança das prestações em dívida afectas à realização das obras do telhado, interpelando os condóminos faltosos e concedendo-lhes prazo para cumprimento dessa obrigação, instaurando contra eles acções judiciais para obter essa cobrança, do que a administração se comprometeu na assembleia de 20.05.2016, também nessa assembleia a administração informou os condóminos nela reunidos que não poderia dar início às obras orçamentadas e aprovadas uma vez que o empreiteiro contratado fazia depender o início das obras do seu pagamento, tendo os condóminos então aceite “relegar o início daquelas mesmas obras para momento posterior”.
Como explica o citado acórdão desta Relação de 23.04.2018, “O administrador, a esse nível, pode fazer essas obras, mas não está obrigado a substituir-se ao condomínio e à respectiva assembleia e a executá-las, ainda que perante si sejam reclamadas; Ao invés, a responsabilidade pela execução de tais obras nas partes comuns, cabendo ao condomínio no seu conjunto, através da respectiva assembleia, a administração das partes comuns (art. 1430º, n.º 1 do Cód. Civil), e cabendo ao mesmo conjunto de todos os condóminos, na proporção do valor das suas respectivas fracções, suportarem as despesas necessárias à conservação das partes comuns do edifício (art. 1424º, n.º 1 do Cód. Civil), recairá, pois, sobre o condomínio, entendido este como o conjunto de todos os condóminos. Aliás, um tal princípio decorre do preceituado no art. 1411º do Cód. Civil, relativo directamente à compropriedade mas aqui aplicável no que concerne às partes comuns, o qual estabelece que os comproprietários devem contribuir, na proporção das respectivas quotas, [no caso da propriedade horizontal, em função do valor relativo das suas fracções no valor do conjunto do edifício], para as despesas necessárias à conservação ou fruição da coisa comum”.
Assim, ainda que não resulte dos autos que a administração tenha efectivamente providenciado pela instauração das acções ou providências judiciais para que foi mandatada, tendo aquela assembleia deliberado relegar o início das obras para momento posterior, e cabendo àquela a execução de tal deliberação, nenhuma responsabilidade lhe pode ser assacada pelo atraso na realização das obras do telhado, do qual resultou o agravamento dos danos na fracção dos autores, comprometendo as condições de habitabilidade do mesmo.
4.4. Da medida da indemnização.
Entre o mais, peticionam os autores que sejam os réus solidariamente condenados a pagar-lhes “a quantia de 400€ por mês, a contar de Dezembro/2016 até ao termo da obra de reparação e impermeabilização do telhado e da caixa de escadas, esta com pintura”.
O artigo 562.º do Código Civil, que consagra o princípio da reconstituição natural, preceitua que “quem estiver obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação”.
Por dano deve entender-se “a perda in natura que o lesado sofreu em consequência de certo facto nos interesses (materiais, espirituais ou morais) que o direito viola ou a norma infringida visam tutelar”[39].
Podendo os danos ser patrimoniais ou não patrimoniais, os primeiros compreendem, por sua vez, o dano emergente e o lucro cessante, abrangendo este último “os benefícios que o lesado deixou de obter por causa do facto ilícito mas a que ainda não tinha direito à data da lesão”[40].
Não sendo possível a reconstituição natural, não reparando ela integralmente os danos ou sendo excessivamente onerosa para o devedor, deve a indemnização ser fixada em dinheiro[41].
Com relevo para a determinação da medida compensatória pela privação do uso da fracção de que são proprietários os autores em virtude do estado de degradação nela causado pelas infiltrações provenientes do telhado do edifício deve ponderar-se a seguinte factualidade apurada nos autos:
- “24. Atento o estado de degradação do telhado, do interior da habitação dos Autores e do tecto e paredes do último lanço da caixa de escadas, junto à entrada da habitação dos Autores, em finais de Novembro/2016, os Autores abandonaram a referida fracção e foram viver para o Largo ..., na freguesia ..., Vila do Conde, por falta de condições de habitabilidade.
25. No estado em que se encontra o seu interior e a caixa de escadas, os Autores não conseguem vender ou arrendar o apartamento.
26. Após a sua saída, os Autores chegaram a mostrar o apartamento para arrendamento a vários interessados, mas, depois de o verem, recusaram arrendá-lo, por falta de condições de habitabilidade.
27. O valor locativo do imóvel no mercado de arrendamento é de 400,00 € por mês.
28. Em 23.05.2019 a Ré celebrou um contrato de empreitada para execução das obras de substituição da cobertura as quais terminaram em 30.07.2019”.
Escreveu-se na sentença recorrida: “No nosso ordenamento jurídico, a mera privação do uso, sem qualquer repercussão negativa no património do lesado, ou seja, se dela não resultar um dano específico, emergente ou na vertente de lucro cessante, é insusceptível de fundar a obrigação de indemnização no quadro da responsabilidade civil. Não obstante, se a privação do uso não justificar a atribuição de uma indemnização por danos patrimoniais já poderá justificar que seja atribuída ao lesado uma compensação pelo impedimento do uso e fruição do seu património, aqui com recurso à equidade.
No caso dos autos a fracção constituía a casa de morada de família dos Autores.
Não era destinada a arrendamento nem podia ser depois da saída dos Autores uma vez que a mesma não tinha condições de habitabilidade, sendo este o motivo pelo qual se mudaram. Os Autores não tiveram, assim, um prejuízo na vertente de lucros cessantes, mas sim pelo facto de se verem impedidos de retirar da fracção a sua utilidade. Não faz sentido, por isso, utilizar como critério aferidor da equidade o valor que os Autores presumivelmente poderiam obter com o arrendamento da fracção. Assim, em termos de equidade afigura-se-nos adequado o valor mensal de 200,00 € por forma a compensar os Autores do dano sofrido entre Dezembro de 2016 e 30 de Julho de 2019, data em que foi terminada a execução das obras do telhado. Com efeito, pese embora seja necessário reparar as fachadas do prédio e estas poderem ser causa de infiltrações na fracção dos Autores o pedido formulado limita-se à reparação e impermeabilização do telhado e da caixa de escadas. Ora, reparado o telhado necessariamente que a caixa de escadas deixou de ter infiltrações. Os Autores peticionam o pagamento da indemnização até ao termo da obra e pintura da caixa de escadas. Ora, não obstante se reconheça necessidade de proceder a tal pintura afigura-se-nos excessivo estabelecer como data limita de indemnização a pintura da caixa de escadas quando se sabe que é mais urgente proceder à reparação das fachadas e que o condomínio está a diligenciar pela execução desta obra”.
E diz-se, a propósito da determinação do valor indemnizatório e dos critérios a atender para o efeito no citado acórdão da Relação do Porto de 23.04.2018, expressamente para o efeito convocado pelos autores recorrentes: “Em situações como a que resulta da factualidade provada em que o titular do direito de propriedade sobre a coisa (imóvel) se pretende aproveitar das vantagens que o seu uso normal lhe proporcionava – nomeadamente, através do seu arrendamento e obtenção da respectiva renda, como vinha sucedendo e se pretendia que continuasse – existe, a nosso ver, em termos manifestos, um prejuízo ou dano decorrente dessa privação do uso.
Na verdade, como se refere no AC STJ de 14.07.2016 [...], é de considerar como «suficientemente demonstrada a realidade do dano, traduzido na privação do uso de um bem, quando o lesado concretizou e fundamentou, em termos factuais, qual a concreta utilidade que pretendia extrair do bem, especificando o concreto dano sofrido com a impossibilidade de locação do imóvel, por via dos defeitos que o afectavam, imputáveis a comportamentos da R - traduzindo-se tal utilidade específica, em consonância com o destino que lhe vinha sendo dado há vários anos, na colocação no mercado de arrendamento para fins comerciais, alegando-se qual o lucro cessante que em concreto se verificava: o montante das rendas de que o locador ficou privado em consequência do estado de conservação do locado.»
No caso dos autos, uma vez que o bem se encontrava arrendado e era destinado pela autora a tal mercado do arrendamento e, portanto, a sua utilidade concreta era a obtenção do valor da renda mensal, colhe sentido utilizar como critério orientador, em termos de equidade, na fixação da indemnização devida o valor que presumivelmente a autora poderia obter com o arrendamento da fracção em causa, ou seja os aludidos €500,00 mensais.
No entanto, trata-se de um critério meramente orientador, de referência, e não um estrito critério matemático calculado por referência à data de Julho de 2014, como é pretensão da Recorrente Autora, pois que existem outros elementos que, para efeitos de fixação equitativa da indemnização devida, não podem deixar de ser também ponderados.
Desde logo, quanto ao termo inicial do período relevante para efeitos indemnizatórios, é de ponderar que a aprovação das obras de reparação das partes comuns e das deteriorações existentes na própria fracção “ E “por parte do condomínio implicaria a indispensável convocação da respectiva assembleia extraordinária e a recolha de orçamentos para sua posterior aprovação; Como assim, para vir a ter lugar a recolha de tais orçamentos e a convocação de tal assembleia, segundo um critério de razoabilidade e conforme à realidade das coisas, é de estimar que seria necessário, no mínimo, um prazo de cerca de 2 meses a partir da recepção da carta da carta da Autora de 2.06.2014, período este em que inelutavelmente a fracção da Autora – ainda que fossem cumpridas as obrigações que impediam sobre a administração do condomínio quanto às diligências tendentes à aprovação pela assembleia das obras em causa [recolha de orçamentos e convocação da assembleia de condóminos e sua realização] - não reuniria condições para ser dada de novo em arrendamento por parte da Autora.
Por outro lado, neste conspecto, é ainda de considerar que, em face das obras em causa, seja de reparação da própria fracção “E”, seja de reparação das partes comuns (terraço de cobertura e fachadas), após a sua aprovação e adjudicação pelo condomínio, para a sua efectiva realização e conclusão, segundo um critério de normalidade e de experiência, sempre seria necessário um prazo de cerca de 2 meses, a partir da respectiva aprovação e adjudicação.
Mais acresce que, após a realização dessas obras e voltando, pois, a fracção em causa a reunir condições para ser dada, de novo, em arrendamento pela própria Autora, era suposto, ainda, que a mesma viesse a conseguir obter novos interessados no arrendamento da fracção em causa pelo valor acima referido de €500,00 mensais.
Ora, na conjuntura económica do ano de 2014/2015, marcada ainda por um ambiente de recessão da actividade económica e do comércio em geral (com alguns sinais de retoma), numa perspectiva que temos por razoável e prudente, é de crer que, mesmo possuindo a fracção, após as obras, plenas condições para ser dada de arrendamento, a autora não lograria de imediato celebrar um novo arrendamento sobre a mesma e pelo valor de €500,00, antes sendo expectável, segundo um critério de normalidade, que apenas o viesse a conseguir decorridos cerca de 10 meses após o
terminus das obras e consequente colocação no mercado de arrendamento.
Por outro lado, ainda, quanto ao montante da renda de € 500,00 mensais, é de ponderar que sempre haveria que descontar a este valor bruto da renda provavelmente auferida o valor dos encargos tributários que, em termos de imposto sobre rendimentos prediais, necessariamente lhe correspondem e têm imperativamente de ser saldados pelo senhorio. [...]
Por último, ainda, importa valorar que, no caso dos autos, o locador não esteve privado totalmente do gozo e fruição do imóvel, como sucede nos casos mais frequentes de total desapossamento do prédio: tal gozo e fruição foram apenas restringidos, em termos prático económicos, pelo facto de o imóvel se encontrar deteriorado, dificultando a sua colocação no mercado de arrendamento, sem o investimento traduzido na sua reparação adequada.
Na verdade, como se refere no citado Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14.07.2016 e que aqui se acompanha de perto, não parece que – apesar da realidade do dano sofrido pelo locador – esta situação deva ser plenamente equiparada aos casos em que ele esteve totalmente desapossado do bem e absolutamente privado do exercício de qualquer poder sobre ele – caso em que efectivamente poderia ser razoável e proporcional ressarci-lo da privação do uso através da atribuição de montante correspondente ao integral valor locativo perdido: impõe-se, assim, neste circunstancialismo, proceder, também por esta via, a uma redução equitativa do valor indemnizatório por referência ao estrito valor locativo do imóvel.
Por conseguinte, valorando, em termos de equidade todos estes factores e circunstâncias, procurando fixar-se indemnização equilibrada e proporcional, conforme às regras do bom senso prático e da justa medida e reflectindo, na medida possível, as realidades da vida, considera-se adequada a fixação de indemnização correspondente a €300,00 (trezentos euros) por mês, com início no mês de Setembro de 2015 e até à data da efectiva realização das obras de reparação das deteriorações existentes na fracção “ E “ e de reparação das partes comuns (fachadas e terraço de cobertura), a que acrescem os juros de mora, à taxa legal, desde a citação e até integral efectivo pagamento”.
No caso aqui concretamente apreciado, embora tenha resultado demonstrado que o valor locativo do imóvel no mercado de arrendamento é de 400,00 € por mês, não poderá ser este o valor a fixar como medida indemnizatória pelo dano da privação do gozo do imóvel, quando este não foi absoluto, e os autores, antes dos prejuízos sofridos na sua fracção, que comprometeu as respectivas condições de habitabilidade, não o destinavam ao mercado de arrendamento, nem sequer à sua rentabilização económica, designadamente, através da venda, antes fazendo dele uso como morada própria, que abandonaram em finais de Novembro/2016, tendo ido viver para o Largo ..., na freguesia ..., Vila do Conde, por falta de condições de habitabilidade, desconhecendo-se, por não ter sido alegado, se tiveram de suportar algum encargo para ocuparem a nova habitação.
Mostra-se, pois, ajustada a decisão recorrida de não atender, para efeitos de determinação do montante indemnizatório com recurso às regras de equidade, ao valor locativo da fracção no mercado. E ponderando os factores apontados pelo aludido acórdão da Relação do Porto de 23.04.2018, a serem atendíveis para a fixação equitativa da indemnização devida pela privação do gozo pleno da fracção, conclui-se ser equilibrado o valor fixado na sentença.
É certo que os autores pedem que a indemnização devida pela privação da sua fracção seja fixada “a contar de Dezembro/2016 até ao termo da obra de reparação e impermeabilização do telhado e da caixa de escadas, esta com pintura”, sendo certo que a reparação da caixa de escadas não se mostra ainda concretizada.
Sendo os estragos causados na fracção dos autores pelas infiltrações provenientes do telhado, pelo estado de degradação em que o mesmo se encontrava, designadamente, com telhas partidas, o que dava azo às referidas infiltrações e aos danos causados no interior da habitação, concluída a reparação do telhado em 30 de Julho de 2019, não se afigura razoável, designadamente pelas razões indicadas na sentença recorrida, que tenha o Réu de continuar a satisfazer a indemnização fixada para além da conclusão da reparação do telhado, não obstante se achar ainda por concretizar a obra na caixa de escadas, com pintura da mesma, não constituindo tal patologia da parte comum do prédio risco de futuras infiltrações.
Deve, por conseguinte, manter-se a medida da indemnização fixada na sentença impugnada, mostrando-se a mesma razoável e equilibrada face à natureza da tutela devida ao direito do lesado.
4.5. Da responsabilidade pelas custas da acção.
A sentença recorrida condenou “Autores e Réu, Condomínio, no pagamento das custas da acção, em partes iguais”.
Justifica deste modo tal condenação: “A decisão que julgue a acção condenará em custas a parte que a elas houver dado causa, entendendo-se como tal a parte vencida, na proporção em que o for, conforme resulta do artigo 527º, do Código de Processo Civil.
No caso atendendo a que os Autores decaem na parte relativa à indemnização peticionada e à condenação da sociedade Ré e dos Réus condóminos, afigura-se-nos adequado fixar o decaimento dos Autores e do Réu Condomínio em partes iguais.”.
Sustentam, todavia, os autores que, tendo peticionado a anulação das deliberações sob o ponto n.º 5 da Acta de 1 de Fevereiro de 2019, tomada pelos 3.ºs réus, que, ao revogarem a deliberação de fazer obras, mais contribuiu para o atraso na eliminação das infiltrações das águas pluviais na sua habitação, deviam os mesmos também ser condenados em custas.
Embora a sentença haja concluído pela anulabilidade das deliberações tomadas sob o ponto 5.º da dita assembleia, pelas custas daí resultantes não poderiam nunca responder, a título de responsabilidade individual, qualquer daqueles condóminos, tratando-se, como efectivamente se tratam, de deliberações tomadas por um órgão deliberativo.
Nenhuma censura merece a sentença quanto à repartição da responsabilidade das custas devidas pela acção.
5. Da litigância de má fé.
Em resposta às alegações dos autores, o recorrido Condomínio pede que sejam aqueles “condenados como litigantes de má fé, em multa e indemnização condigna a favor dos Recorridos.
É deveras ultrajante e perversa a forma como os Recorrentes se pretendem locupletar à custa dos Recorridos seus vizinhos, não comparticipando nas obras que aqueles seus vizinhos pagaram e procurando a todo o custo obter indemnizações à custa de factos falsos”.
5.1.Dos pressupostos da litigância de má fé.
De acordo com o n.º 1 do artigo 542.º do Código de Processo Civil, “tendo litigado de má fé, a parte é condenada em multa e numa indemnização à parte contrária, se esta a pedir”.
Por sua vez, o n.º 2 do mesmo dispositivo legal delimita o conceito de litigante de má fé nos seguintes termos: “diz-se litigante de má fé quem, com dolo ou negligência grave:
a) Tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar;
b) Tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa;
c) Tiver praticado omissão grave do dever de cooperação;
d) Tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objectivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a acção da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão”.
Os pressupostos da litigância de má fé encontram-se, assim, regulados no artigo 542.º do Código de Processo Civil, podendo distinguir-se aqueles que têm natureza subjectiva daqueles que têm natureza objectiva. Há litigância de má fé quando estão simultaneamente reunidos pressupostos das duas mencionadas naturezas.
Relativamente aos pressupostos subjectivos da litigância de má fé, exigiam tradicionalmente a actuação dolosa de uma das partes para o seu preenchimento e para justificar a condenação a esse título.
Depois de 1 de Janeiro de 1997 - e como corolário da maior relevância atribuída aos deveres de cooperação aquando das alterações introduzidas pela Reforma de 1995/1996 - os pressupostos subjectivos da litigância de má fé alargaram-se, passando a abarcar também a actuação a título de negligência grosseira.
Como se afirma no Acórdão da Relação do Porto de 15.12.2010[42], “o regime instituído após a última reforma do direito processual civil traduz uma substancial ampliação do dever de boa fé processual, alargando-se o tipo de comportamentos que podem integrar má fé processual, quer substancial, quer instrumental, tanto na vertente subjectiva como na objectiva. A condenação por litigância de má fé pode fundar-se, além de, numa situação de dolo, em erro grosseiro ou culpa grave”.
Quanto aos pressupostos objectivos da condenação por litigância de má fé, é de distinguir a má fé substancial da má fé instrumental: existe má fé substancial se "o litigante usa de dolo ou má fé para obter decisão de mérito que não corresponde à verdade e à justiça" e má fé instrumental se "a parte procura sobretudo cansar e moer o seu adversário, ou somente pelo espírito de fazer mal, ou na expectativa condenável de o desmoralizar, de o enfraquecer, de o levar a uma transacção injusta"[43].
Como elucidam Lebre de Freitas, Montalvão Machado e Rui Pinto[44],”é corrente distinguir má fé material (ou substancial) e má fé instrumental. A primeira relaciona-se com o mérito da causa: a parte, não tendo razão, actua no sentido de conseguir uma decisão injusta ou realizar um objectivo que se afasta da função processual. A segunda abstrai da razão que a parte possa ter quanto ao mérito da causa, qualificando o comportamento processualmente assumido em si mesmo”.
A litigância de má fé pode levar à aplicação de duas sanções: a multa e a indemnização.
Dará lugar à aplicação de uma multa processual, que pode ser decidida oficiosamente ou a requerimento da contraparte.
Tal multa deve ser fixada pelo juiz, ponderando, designadamente, os efeitos sancionatórios por ela prosseguidos em função da violação da lei na regular tramitação do processo, a situação económica do sujeito passivo e as repercussões da sanção no seu património.
Por outro lado, a litigância de má fé pode também conduzir à condenação no pagamento de uma indemnização.
A indemnização atribuída pode assumir duas modalidades distintas.
Numa primeira modalidade, usualmente designada por indemnização simples, quem for condenado como litigante de má fé deverá liquidar à contraparte o valor das despesas originadas pela litigância de má fé, incluindo os honorários dos advogados e dos técnicos; e
Numa segunda modalidade, normalmente designada por indemnização agravada, a indemnização deverá abarcar essas despesas e os demais prejuízos sofridos pela parte contrária como consequência directa ou indirecta da má fé[45].
Tanto num caso como noutro só serão indemnizáveis as despesas e os prejuízos em que se tenha incorrido em virtude de um comportamento gravemente negligente ou doloso da contraparte.
O juiz deve optar entre as duas modalidades de indemnização referidas com base na gravidade da infracção perpetrada, sendo irrelevante nesta sede a condição económica do litigante de má fé.
Quando haja negligência grosseira, o juiz deve atribuir a indemnização simples e quando se demonstre que houve dolo, o juiz deve optar pela indemnização agravada[46].
Em relação aos autores não se vê em que termos, em sede de recurso, eles hajam litigado de má fé, não se achando sequer minimamente indiciado que os mesmos procuram a todo o custo obter indemnizações à custa de factos falsos, insistindo, ao invés, o recorrido Condomínio na tese de que os autores não comparticiparam nas obras, facto que desmentido por três sentenças, proferidas em distintos processos!...
Não, há, pois, qualquer fundamento para condenar os autores como litigantes de má fé, assim indo absolvidos dos correspondentes pedidos.
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Síntese conclusiva:
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Nestes termos, acordam os juízes desta Relação, em:
- Julgar procedente a impugnação deduzida pelos recorrentes AA e BB relativamente à decisão sobre a matéria de facto, alterando-se o ponto 25.º dos factos provados nos termos que oportunamente se deixaram expostos;
- No mais, julgar improcedentes os recursos interpostos pelos mesmos recorrentes, e pelo recorrente Condomínio ..., ..., Póvoa de Varzim, confirmando, em consequência, a sentença recorrida.
Custas das apelações: por cada um dos apelantes.
[Acórdão elaborado pela primeira signatária com recurso a meios informáticos]

Porto, 15.06.2022
Judite Pires
Aristides Rodrigues de Almeida
Francisca Mota Vieira
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[1] Após rectificação do erro de escrita de que enfermava.
[2] “Recursos em Processo Civil, Novo Regime”, págs. 146, 147.
[3] Cfr. ainda acórdão da Relação de Coimbra de 11.07.2012, processo nº 781/09.6TMMGR.C1, www.dgsi.pt.
[4] “Comentários ao Código de Processo Civil”, vol. I, pág. 608.
[5] Cf. Alberto dos Reis, “Código de Processo Civil anotado”, vol. V, pág. 137.
[6] Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, “Manual de Processo Civil”, 2ª ed., pág. 686.
[7] “Manual de Processo Civil”, 2ª ed., pág. 687 e segs.
[8] Cf. em idêntico sentido, Acórdão STJ de 19/03/02, “Rev. nº 537/02-2ª sec., Sumários, 03/02”; Acórdão Relação de Coimbra de 16/5/2000, www.dgsi.pt; Acórdão STJ de 13/01/00, “Sumários, 37-34”; Acórdão Relação Lisboa, de 01/07/99, BMJ 489-396.
[9] Anselmo de Castro, “Direito Processual Civil Declaratório”, vol. III, pág. 141.
[10] Processo n.º 14614/21.1T8PRT.P1, www.dgsi.pt.
[11] “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 2013, Almedina, pág. 224 e 225.
[12] “A Acção Declarativa Comum, À Luz do Processo Civil de 2013”, Coimbra Editora, 2013, pág. 278.
[13] “Declarações de Parte”, Universidade de Coimbra, 2015, pág. 58.
[14] https://blogippc.blogspot.pt/2017/01/jurisprudencia-536.html#links, texto publicado a 20.01.2017.
[15] “A Prova por Declarações de Parte”, FDUL, 2015, pág. 80.
[16] Alberto dos Reis, “Código de Processo Civil Anotado”, Vol. III, pág. 93.
[17] Proc. n.º 2204/10.9TBTVD.L1-2, www.dgsi.pt.
[18] Podendo ser modificada através de recurso extraordinário.
[19] A que aqui nos interessa.
[20] Código de Processo Civil anotado, vol. III, páginas 94 e 95.
[21] Anselmo de Castro, Direito Processual Civil Declaratório, Almedina, 1982, vol. III, págs. 392 e 398.
[22] Acórdão do STJ de 12.07.2011, in dgsi.pt.
[23] www.dgsi.pt.
[24] Alberto dos Reis, ob. cit., pág. 94.
[25] “Limites Objectivos do Caso Julgado em Processo Civil”, págs. 178 e segs.
[26] “O Objecto da Sentença e o Caso Julgado Material”, BMJ n.º 325, pág. 171.
[27] Artigos 580.º, n.º 2 e 621.º do Código de Processo Civil.
[28] “A acção declarativa comum…”, 3ª edição, Coimbra Editora, 2013, pág. 315.
[29] Processo 972/14.8T8GDM.P1, www.dgsi.pt.
[30] Acórdão do STJ, 18.05.2006, procº nº 06B1644, www.dgsi.pt. [31] www.dgsi.pt.
[32] cf. Antunes Varela, “Revista de Legislação e Jurisprudência”, ano 102º, pág. 8 e ss.
[33] “Código Civil Anotado”, vol. I, 4ª ed., pág. 286.
[34] “Abuso de Direito”, pág. 456.
[35] “Questão de facto – Questão de direito”, nota 46, pág. 526.
[36] Baptista Machado, “Tutela da Confiança e Venire contra Factum Proprium”, RLJ, ano 118º, págs. 171, 172.
[37] Ibid.
[38] Cfr. J. Aragão Seia, “Propriedade Horizontal”, Almedina, pág. 202.
[39] Antunes Varela, “Das Obrigações em Geral”, vol. I, 7ª ed., pág. 591.
[40] Ibid, pág. 593.
[41] Artigo 566º, nº1 do Código Civil.
[42] Processo nº 225/08.0TBVLC-A.P1, www.dgsi.pt.
[43] Cfr. Alberto dos Reis, “Código de Processo Civil anotado”, vol. II, págs. 263-264.
[44] “Código de Processo Civil anotado”, Coimbra Editora, vol. 2º, 2ª ed., págs. 220, 221.
[45] Artigo 543º, n.º 1, al. b), do Código de Processo Civil.
[46] Cfr. Abrantes Geraldes, “Temas Judiciários”, vol. I, pág. 335.