Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
6304/15.0T8VNG-A.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: ANABELA DIAS DA SILVA
Descritores: INSOLVÊNCIA
ADMINISTRADOR DA INSOLVÊNCIA
NOMEAÇÃO
Nº do Documento: RP201601126304/15.0T8VNG-A.P1
Data do Acordão: 01/12/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO, (LIVRO DE REGISTOS N.º 698, FLS.33-39)
Área Temática: .
Sumário: I - Em princípio, a lei não exige, qualquer fundamentação por parte do decisor, no acto de nomear um administrador de uma insolvência, pois que tal nomeação seja efectuada por sorteio informático, ou seja, por processo aleatório, que produz, por natureza, uma escolha não fundamentada.
II - Como é sabido, tais aplicações informáticas não se encontram disponibilizadas e regulamentadas, mas dúvidas não há de que a nomeação do administrador da insolvência (AI) e do AJP, é da competência do juiz, como o preceitua o n.º 1 do art.º 52.º do CIRE.
III - A faculdade de o requerente da insolvência indicar a pessoa que deverá ser nomeada para AI, e a consequente possibilidade de o juiz atender a essa indicação, está restringida aos casos de processos em que seja previsível a existência de actos de gestão que requeiram especiais conhecimentos.
IV - Só naqueles casos especiais (processos em que seja previsível a existência de actos de gestão que requeiram especiais conhecimentos por parte do administrador) é que o juiz, nomeando AI/AJP diferente do proposto ou indicado, designadamente pelo devedor, deverá fundamentar a sua discordância, em conformidade com o disposto nos citados artigos 32.º, n.º l e 52.º do CIRE.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Apelação
Processo n.º 6304/15.0 T8VNG-A.P1
Comarca do Porto – Vila Nova de Gaia – Instância Central – 2.ª Secção Comércio – J2
Recorrente – B…, SA
Relatora – Anabela Dias da Silva
Adjuntas – Desemb. Ana Lucinda Cabral
Desemb. Maria do Carmo Domingues

Acordam no Tribunal da Relação do Porto (1.ªsecção cível)

I – B..., S.A., sociedade comercial anónima com sede social na Rua…, Porto, deu entrada na Comarca do Porto – Vila Nova de Gaia – Instância Central – 2.ª Secção Comércio de um requerimento, nos termos do disposto no art.º 17.º-C, n.º 3, al. a) do CIRE, pelo qual comunicou que pretende dar início às negociações conducentes à sua recuperação.
Para tanto, juntou declarações escritas, datadas e assinadas, previstas nos art.ºs
17.º-A, n.º 2 e 17.º-C, n.º 1 CIRE; a documentação prevista no art.º 24.º, n.º 1, “ex vi” do art.º 17.º-C n.º 3, al. c) CIRE; e certidão comercial.
Alegou a requerente ainda que várias sociedades do ramo imobiliário integrantes do denominado Grupo C…, grupo empresarial de facto com que a devedora se relaciona, estão simultaneamente a apresentar-se a PER e que todas elas, tal como a aqui devedora, têm como maior e praticamente único credor, o D…, S.A.
Mais referiu que os activos e os passivos de cada uma dessas sociedades, e também na sua globalidade, ascendem a vários milhões de euros, pelo que a revitalização de todas e cada uma dessas sociedades dependerá de planos de viabilização relativamente complexos, sendo previsível a necessidade da prática de actos de gestão com especiais conhecimentos, designadamente, do ramo do direito societário e do ramo imobiliário, como sejam eventuais fusões, promessas ou efectivas compras e vendas ou outras operações sobre imóveis, bem como, sobre participações sociais, incluindo a criação de novos veículos jurídicos ou financeiros, entre outros, e que afectarão esta devedora, a par das demais sociedades referidas. Essas questões demandam, pela sua especificidade, valor e complexidade, competências técnicas e experiência profissional acima da média, por parte do Administrador Judicial Provisório a designar, o que aconselha uma efectiva e muito ponderada transversalidade, com acentuada partilha e concertação das operações, recursos e decisões a tomar, em sede de cada um dos respectivos processos especiais de revitalização das empresas do grupo, interessando ao maior credor das empresas do grupo, o D…, S.A., articular a sua posição junto do mesmo interlocutor – o mesmo AJP, e na medida em que várias dessas empresas também são credoras umas das outras, por empréstimos e contratos em execução, continua a interessar haver um único AJP.
Termina pedindo a instauração do competente Processo Especial de Revitalização, com a nomeação imediata de administrador judicial provisório com poderes para assistir a devedora na administração do seu património, cfr. art.ºs 17.º-C, n.º 3, al. a), e 33.º, n.º 2 CIRE e, porque todas as referidas sociedades indicam em PER o mesmo AJP, a saber, o Exmo. Sr. Dr. E…, que é, reconhecidamente, pessoa especialmente preparada, séria, competente, idónea e experiente na condução de processos deste tipo, natureza e complexidade, pediu, por igual forma, a nomeação de tal AJP.
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De seguida foi proferido, em 6.07.2015, o seguinte despacho:
”(…)
Decorre do disposto no n.º 1, do artigo 17.º-C, da Lei n.º 16/2012, de 20 de Abril, que “O processo especial de revitalização inicia-se pela manifestação de vontade do devedor e de, pelo menos, um dos seus credores, por meio de declaração escrita, de encetarem negociações conducentes à revitalização daquele por meio da provação de um plano de recuperação”.
Acrescenta o n.º 2 que “A declaração referida no número anterior deve ser assinada por todos os declarantes, da mesma constando a data da assinatura”.
Por sua vez, decorre da alínea a), do n.º 3 que “Munido da declaração a que se referem os números anteriores, o devedor deve, de imediato, adotar os seguintes procedimentos: Comunicar que pretende dar início às negociações conducentes à sua recuperação ao juiz do tribunal competente para declarar a sua insolvência, devendo este nomear, de imediato, por despacho, administrador judicial provisório, aplicando-se o disposto nos artigos 32.º a 34.º, com as necessárias adaptações”.
Assim, encontrando-se reunidos os respectivos pressupostos legais nomeia-se como administrador judicial provisório a Sr.ª Dr.ª F…, com endereço na Avenida…, Santa Maria da Feira, nomeada segundo critérios de aleatoriedade e em ordem a garantir a repartição equitativa dos processos de revitalização entre os senhores administradores judiciais.
Registe, Notifique e publicite nos termos legais – cf. artigos 17.º-C, n.º 4, 37.º e 38.º do CIRE”
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Não se conformando com tal decisão dela veio a executada recorrer de apelação pedindo a revogação da decisão recorrida e a sua substituição por outra que nomeie como administrador judicial provisório a pessoa indicada pela devedora.
A apelante juntou aos autos as suas alegações que terminam com as seguintes conclusões:
1. A decisão recorrida violou o artigo 154.º, n.º 1 do NCPC, ao não fundamentar o não acolhimento da indicação do administrador judicial provisório por parte da devedora, no concreto contexto empresarial e de facto por ela especificado.
2. A decisão recorrida é nula, nos termos do artigo 615.º, n.º 1, al. b) NCPC, por falta de fundamentos de facto e de direito que a justificam.
3. No concreto caso sub judice, impunha-se ao juiz fundamentar, de facto e de direito – e certamente de forma clara, completa e sindicável – a não consideração da indicação de AJP pela devedora.
4. A doutrina e a jurisprudência convergem no sentido de que os art.ºs 32.º, n.º 1 e 52.º, n.º 1 do CIRE aconselham a que em casos específicos e designadamente quando estejam em causa processos em que seja previsível a existência de actos de gestão que requeiram especiais conhecimentos por parte do administrador da insolvência – como é precisamente o caso –, o Juiz não só pode, como inclusivamente deve atender à indicação feita pelos requerentes, apreciando o respectivo pedido e fundamentando a opção de nomeação – coisa que o Mmo. Juiz a quo não fez.
5. Com efeito, parece ser o caso exemplar de dever atender à indicação de AJP pela devedora aquele em que várias sociedades de um mesmo grupo e até do mesmo ramo económico, se apresentam simultaneamente à revitalização, com previsibilidade da prática de actos de gestão que requeiram especiais conhecimentos, tanto sobre as sociedades como sobre os seus activos – como de resto veio aconteceu nos demais três PER intentados contemporaneamente ao presente, por sociedades do mesmo grupo e ramo económico.
6. A decisão sempre será nula, nos termos do art.º 615.º, n.º 1, al. c) NCPC, porquanto, ainda que se considere existir algum nível – e muito ténue será – de fundamentação, forçoso será concluir pela sua obscuridade, já que não comporta em si mesma nem remete para qualquer elemento de facto, concreto e sindicável, que permita aferir do acerto e bondade da escolha da Exma. AJP nomeada, em detrimento do AJP indicado pela devedora – sendo certo que as decisões judiciais não podem ser apodíticas, tal como, salvo o devido respeito, a presente decisão recorrida aparenta ser nos seus termos.
7. As menções “nomeada segundo critérios de aleatoriedade e em ordem a garantir a repartição equitativa dos processos de revitalização entre os senhores administradores judiciais”, únicas identificáveis na decisão recorrida como reconduzíveis a uma fundamentação da discordância do Mmo. Juiz face à indicação do AJP pela devedora, são manifestamente conclusivas, incomprovadas e incomprováveis.
8. Justamente porque se a preocupação do Mmo. Juiz era garantir a observância de critérios de aleatoriedade e de repartição equitativa de processos de revitalização pelos administradores judiciais, a decisão teria que: a) evidenciar de que forma concreta se observou a aleatoriedade da escolha e b) demonstrar que, com a escolha determinada, se contribuiu, e em que medida concreta, para a distribuição de PERs entre os dois AJP em confronto – o que não ocorreu, dando origem à alegada nulidade.
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O M.ºP.º juntou aos autos as suas contra-alegações onde pugna pela confirmação da decisão recorrida.
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Em vista do suprimento da invocada nulidade por falta de fundamentação do despacho recorrido, foi proferido, em 10.08.2015, o seguinte despacho:
“Tendo em consideração as alegações de recurso e suprindo, eventual, falta de fundamentação sempre se dirá:
Estatui o artigo 17.º, n.º 3, alínea a) do CIRE que, apresentado pedido de revitalização deve o juiz nomear administrador judicial provisório, aplicando-se o disposto nos artigos 32.º a 34.º, com as necessárias adaptações.
Segundo o artigo 32.º, n.º 1, “ a escolha do administrador judicial provisório recai em entidade inscrita na lista oficial de administradores da insolvência, podendo o juiz ter em conta a proposta eventualmente feita na petição inicial no caso de processos em que seja previsível a existência de atos de gestão que requeiram especiais conhecimentos”.
Já o artigo 52.º, n.º 2, estabelece que se aplica “à nomeação do administrador da insolvência o disposto no n.º 1 do artigo 32.º, podendo o juiz ter em conta as indicações que sejam feitas pelo próprio devedor ou pela comissão de credores, se existir, cabendo a preferência, na primeira designação, ao administrador judicial provisório em exercício de funções à data da declaração da insolvência”.
Do Estatuto do Administrador da Insolvência, aprovado pela Lei n.º 22/2013, releva o artigo 13.º segundo o qual “sem prejuízo do disposto no n.º 2 do artigo 52.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, a nomeação a efetuar pelo juiz processa-se por meio de sistema informático que assegure a aleatoriedade da escolha e a distribuição em idêntico número dos administradores da insolvência nos processos”.
Da análise do regime legal parece impor-se a conclusão que o administrador é, por regra, nomeado pelo juiz - sem qualquer consideração pelas indicações feitas pelo requerente ou devedor - por forma a assegurar a aleatoriedade da escolha e a idêntica distribuição dos processos aos administradores. Apenas quando estejam em causa processos em que seja previsível a existência de actos de gestão que requeiram especiais conhecimentos por parte do administrador - e apenas neste caso -, deve o juiz atender à proposta feita na petição inicial ou à indicação efectuada pelo devedor, em conformidade com o disposto nos artigos 32.º, n.º 1 e 52.º, n.º 1.
Tratando-se o presente processo de um processo especial de revitalização nada nos permite concluir que estamos perante um processo em que seja previsível a existência de actos de gestão que requeiram especiais conhecimentos por parte do administrador - que não actos que todos os Senhores Administradores possam e estejam aptos a prática - e, por consequência, não assume qualquer relevo a sugestão da requerente.
Assim sendo, impera a regra geral, por cuja observância se respeita o critério de nomeação com base na lista oficial de administradores judiciais inscritos na Comarca de Porto, assegurando-se a aleatoriedade da escolha e a distribuição equitativa dos administradores judiciais nos processos.
Face ao exposto, mantém-se a decisão proferida nos autos.
Notifique.
Oportunamente, nos pronunciaremos sobre a admissão do recurso interposto”.

II – Os factos relevantes para a decisão do presente recurso são os que estão enunciados no supra elaborado relatório, pelo que, por razões de economia processual, nos dispensamos de os reproduzir aqui.

III – Como é sabido o objecto do recurso é definido pelas conclusões dos recorrentes (art.ºs 5.º, 635.º n.º3 e 639.º n.ºs 1 e 3, do N.C.P.Civil), para além do que é de conhecimento oficioso, e porque os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, ele é delimitado pelo conteúdo da decisão recorrida.
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Ora, visto o teor das alegações da apelante são questões a decidir no presente recurso:
1.ª – Da alegada nulidade da decisão recorrida por falta de fundamentação.
2.ª – Da nomeação do AJP.
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Compulsados os autos temos que a apelante se insurge contra o despacho judicial que deu provimento ao seu requerimento no sentido da abertura de processo especial de revitalização (PER) e de nomeação de um administrador judicial provisório, na parte em que não foi nomeada a pessoa que a mesma havia indicado na petição inicial para desempenhar tal cargo e foi nomeada outra.
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1.ªquestão – Da alegada nulidade da decisão por falta de fundamentação.
Diz a apelante que a decisão de não acolhimento da indicação que fez no requerimento inicial de um concreto AJP não se encontra fundamentada, sendo por isso nula. Mais alega que, ainda que se considere que é subsumível à fundamentação racional de uma eventual discordância ou desatendimento face à indicação de AJP pela requerente, os critérios de aleatoriedade e a garantia de repartição equitativa de PERs entre administradores judiciais, referidos expressamente na decisão recorrida, certo é que tais critérios não se encontram ancorados a quaisquer factos concretos, nem podem considerar-se “fundamentação”, desde logo, porque nenhum destinatário da decisão recorrida consegue aferir se a mesma é apta a cumprir aqueles dois critérios.
Vejamos.
A decisão recorrida depois de consignar linhas gerais sobre o processo especial de revitalização e respectivo requerimento inicial, termina afirmando: “Assim, encontrando-se reunidos os respectivos pressupostos legais nomeia-se como administrador judicial provisório a Sr.ª Dr.ª F…, com endereço na Avenida…, Santa Maria da Feira, nomeada segundo critérios de aleatoriedade e em ordem a garantir a repartição equitativa dos processos de revitalização entre os senhores administradores judiciais”.
Certo é que na 1.ª instância, de harmonia com o disposto no n.º1 do art.º 641.º do C.P.Civil, houve pronúncia sobre a arguida nulidade de falta de fundamentação da decisão recorrida, tendo-se nesse despacho depois de se chamar à colação as normas contidas nos art.ºs 17.º n.º3, al. a), 32.º n.º1 e 52.º n.º 2 do CIRE e o art.º 13.º do Estatuto do Administrador da Insolvência, aprovado pela Lei n.º 22/2013, conclui-se que o administrador é, por regra, nomeado pelo juiz - sem qualquer consideração pelas indicações feitas pelo requerente ou devedor - por forma a assegurar a aleatoriedade da escolha e a idêntica distribuição dos processos aos administradores e apenas quando estejam em causa processos em que seja previsível a existência de actos de gestão que requeiram especiais conhecimentos por parte do administrador, deve o juiz atender à proposta feita na petição inicial ou à indicação efectuada pelo devedor, em conformidade com o disposto nos artigos 32.º, n.º 1 e 52.º, n.º 1.
Depois consigna-se que no caso vertente nada permitia concluir que se estava perante um processo em que fosse previsível a existência de actos de gestão que demandassem especiais conhecimentos por parte do administrador, pelo que não assumiu qualquer relevo a sugestão feita pela requerente, tendo-se seguido a regra f.
Assim sendo, impera a regra geral, por cuja observância se respeita o critério geral na nomeação do AJP.
Vejamos.
Como é sabido o dever de fundamentação da decisão decorre primordialmente dos princípios consagrados nos art.ºs 205.º n.º 1 da C.R.Portuguesa, segundo o qual “as decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei” e 154.º n.º 1 do C.P.Civil, que preceitua que “as decisões proferidas sobre qualquer pedido controvertido ou sobre alguma dúvida suscitada no processo são sempre fundamentadas”, compreendendo-se essa exigência, uma vez que as partes, destinatárias da decisão, com vista a aquilatarem da bondade ou não da mesma e a decidirem da sua eventual impugnação, precisam, antes de mais, de conhecer a sua base fáctico-jurídica.
Porém, conforme referem Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, in “Manual de Processo Civil”, pág. 669, “para que a sentença careça de fundamentação, não basta que a justificação da decisão seja deficiente, incompleta, não convincente; é preciso que haja falta absoluta, embora esta se possa reportar só aos fundamentos de facto ou só aos fundamentos de direito”.
Por seu turno, ensina Alberto dos Reis, in “Código do Processo Civil Anotado”, vol.V, pág. 140 que: “Há que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade.”
Ou seja, a falta de fundamentos implica a total omissão de factos ou de direito. Este mesmo entendimento, segundo o qual a falta de fundamentação capaz de conduzir à anulação de uma decisão, cfr. art.º 615.º n.º 1 al. b) do C.P.Civil, é apenas a absoluta falta de fundamentação e não quando esta seja diminuta ou deficiente, mostra-se unânime tanto na nossa doutrina como na jurisprudência.
Por outro lado, também é entendimento assente que na apreciação das questões que são postas para decisão não tem de se esgotar todos os argumentos em sustentação do decidido ou apreciar toda a argumentação das partes, pois que naquela decidem-se questões e não razões. Ou seja, não é o laconismo da decisão que se censura mas a completa a ausência de fundamentação.
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In casu” vendo o teor da decisão recorrida, parece-nos óbvio que da mesma decorre que a 1.ª instância decidiu nomear para os autos determinada AJP, o que consigna ter feito segundo os critérios aludidos para a dita escolha pelos art.ºs 11.ºal. c) e 13.º do Estatuto do Administrador da Insolvência, aprovado pela Lei n.º 22/2013, de 26.02, sem se referir expressamente a estas normas.
Logo, a decisão em apreço, não obstante estar muito próxima da inexistência de fundamentação, apresenta uma motivação assaz escassa e muito deficiente, como atrás se referiu, não se olvidando ainda que nela se ignorou, por completo, a indicação de AJP que havia sido feita pela requerente, sem se ter dignado, como devia, a indicar as razões pelas quais se não teve em consideração tal indicação.
Apesar de tudo, do ponto de vista formal, cremos que não estamos em face de uma decisão que careça, em absoluto, de fundamentação, quer de facto quer de direito, logo não se verifica a nulidade prevista na al. b) do n.º1 do art.º 615.º do C.P.Civil.
Improcedem as respectivas conclusões da apelante.
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2.ªquestão – Da nomeação do AJP.
Por via do presente recurso defende a apelante, para além da questão formal da falta de fundamentação da decisão recorrida, a questão de fundo da não aceitação pela 1.ª instância do AJP que indicou no seu requerimento inicial para desempenhar o cargo nos autos.
Na realidade, e como acima já se deixou consignado, no seu requerimento inicial a devedora, ora apelante, para além de indicar pessoa para desempenhar o cargo de AJP, alegou que várias sociedades do ramo imobiliário integrantes do denominado Grupo C…, grupo empresarial de facto com que a devedora se relaciona, estão simultaneamente a apresentar-se a PER e que todas essas sociedades, tal como ela própria, têm como maior e praticamente único credor, o D…, SA. Que os activos e os passivos de cada uma dessas sociedades, ascendem a vários milhões de euros, pelo que a revitalização de todas e, de cada uma dessas sociedades dependerá de planos de viabilização relativamente complexos, sendo previsível a necessidade da prática de actos de gestão com especiais conhecimentos, designadamente, do ramo do direito societário e do ramo imobiliário, como sejam eventuais fusões, promessas ou efectivas compras e vendas ou outras operações sobre imóveis, bem como, sobre participações sociais, incluindo a criação de novos veículos jurídicos ou financeiros, entre outras, e que afectarão esta devedora, a par das demais referidas, questões, essas, que demandam, pela sua especificidade, valor e complexidade, competências técnicas e experiência profissional acima da média, por parte do AJP a designar.
Toda esta situação aconselha a uma efectiva e muito ponderada transversalidade, com acentuada partilha e concertação das operações, recursos e decisões a tomar, em sede de cada um dos respectivos processos especiais de revitalização das empresas do grupo, pelo que interessa ao maior credor das empresas do grupo, (D…, S.A), articular a sua posição junto do mesmo AJP. E porque várias dessas empresas também são credoras umas das outras, por empréstimos e contratos em execução, também deve haver um único AJP.
Finalmente, todas as referidas sociedades indicaram no seu requerimento de PER o mesmo AJP - o Exmo. Sr. Dr. E… - que é, reconhecidamente, pessoa especialmente preparada, séria, competente, idónea e experiente na condução de processos deste tipo, natureza e complexidade.
E como resulta do teor dos documentos juntos com estas alegações pela ora apelante, três dessas empresas que se apresentaram ao PER requereram e viram ser deferida a nomeação de E… como AJP dos respectivos processos.
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Vejamos.
Preceitua o art.º 36.º al. d) do CIRE que: “Na sentença que declara a insolvência o juiz nomeia o administrador da insolvência, com indicação da sua sede ou residência”.
Segundo o art.º 32.º n.º 1 do mesmo diploma, “a escolha do administrador judicial provisório recai em entidade inscrita na lista oficial de administradores da insolvência, podendo o juiz ter em conta a proposta eventualmente feita na petição inicial no caso de processos em que seja previsível a existência de actos de gestão que requeiram especiais conhecimentos”.
Por seu turno, o art.º 52.º n.º 2 do CIRE estabelece que se aplica “à nomeação do administrador da insolvência o disposto no n.º 1 do artigo 32.º, podendo o juiz ter em conta as indicações que sejam feitas pelo próprio devedor ou pela comissão de credores, se existir, cabendo a preferência, na primeira designação, ao administrador judicial provisório em exercício de funções à data da declaração da insolvência”.
Finalmente, resulta do Estatuto do Administrador da Insolvência, aprovado pela Lei n.º 32/04, de 22 de Julho, actualizada pelo DL n.º 282/2007, de 7 de Agosto, art.º 2.º n.º 2, que: “sem prejuízo do disposto no n.º 2 do artigo 52.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, a nomeação a efectuar pelo juiz processa-se por meio de sistema informático que assegure a aleatoriedade da escolha e a distribuição em idêntico número dos administradores da insolvência nos processos”. E segundo o que preceitua o art.º 13.º do referido Estatuto.
1 - Sem prejuízo do disposto no artigo 53.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, apenas podem ser nomeados administradores judiciais, aqueles que constem das listas oficiais de administradores judiciais.
2 - Sem prejuízo do disposto no n.º 2 do artigo 52.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, a nomeação a efectuar pelo juiz processa-se por meio de sistema informático que assegure a aleatoriedade da escolha e a distribuição em idêntico número dos administradores judiciais nos processos.
3 - Não sendo possível ao juiz recorrer ao sistema informático a que alude o número anterior, este deve pugnar por nomear os administradores judiciais de acordo com os princípios vertidos no presente artigo, socorrendo-se para o efeito das listas a que se refere a presente lei.”
Sendo todos estes preceitos aplicáveis ao processo especial de revitalização por força do disposto no art.º 17.º n.º 3, al. a) do CIRE, segundo o qual, apresentado pedido de revitalização deve o juiz nomear administrador judicial provisório, aplicando-se o disposto nos art.ºs 32.º a 34.º, com as necessárias adaptações.
O Processo Especial de Revitalização (PER) foi introduzido no ordenamento jurídico português pela Lei n.º 16/2012, de 20 de Abril e, como resulta da exposição de motivos da Proposta de Lei n.º 39/XII, de 30.12.2011, “pretende assumir-se como um mecanismo célere e eficaz que possibilite a revitalização dos devedores que se encontrem em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente mas que ainda não tenham entrado em situação de insolvência atual”, uma vez que “A presente situação económica obriga, com efeito, a gizar soluções que sejam, em si mesmas, eficazes e eficientes no combate ao “desaparecimento” dos agentes económicos, visto que cada agente que desaparece representa um custo apreciável para a economia, contribuindo para o empobrecimento do tecido económico português, uma vez que gera desemprego e extingue oportunidades comerciais que, dificilmente, se podem recuperar pelo surgimento de novas empresas”.
Trata-se pois de um processo que “representa uma grande mudança de filosofia em relação à conceção original do CIRE”, quando “a crise financeira internacional demonstrou o gravíssimo erro que foi a aprovação desse diploma, responsável pelo encerramento de inúmeras empresas do nosso país”, cfr. Luís Manuel Teles de Menezes Leitão, in “A responsabilidade pela abertura indevida do processo especial de revitalização”, II Congresso de Direito da Insolvência, Coordenação: Catarina Serra, pág. 143. Podemos considerar ainda que é “um procedimento híbrido, no sentido em que, para alcançar a sua finalidade última, a recuperação do devedor, se trata de um processo extrajudicial, mas que exige a intervenção do tribunal em três momentos chave: no seu início, na decisão da impugnação da lista provisória de créditos e no final, para tornar gerais os efeitos do acordo ou para extrair as devidas consequências da não aprovação do mesmo”, cfr. Fátima Reis Silva, in “Processo Especial de Revitalização, Notas Práticas e Jurisprudência Recente”, pág.17.
O Administrador Judicial Provisório (AJP), em linhas gerais, é nomeado no início do processo especial de revitalização, cfr. al. a) do n.º 3 do art.º 17.º-C do CIRE, norma, essa, que logo preceitua que se aplica, com as necessárias adaptações, o disposto no art.ºs 32.º a 34.º do CIRE, e compete-lhe, além do mais, participar, orientar e fiscalizar o decurso dos trabalhos e a regularidade das negociações (tal como definir as regras dessas negociações, na falta de acordo entre devedor e credores), cfr. art.º17.º-D, n.ºs 8 e 9 do CIRE.
Perante o que ficou consignado, podemos desde já concluir que, em princípio, a lei não exige, qualquer fundamentação por parte do decisor, no acto de nomear um administrador de uma insolvência, pois que tal nomeação seja efectuada por sorteio informático, ou seja, por processo aleatório, que produz, por natureza, uma escolha não fundamentada.
Todavia e, como é sabido, tais aplicações informáticas não se encontram disponibilizadas e regulamentadas, dúvidas não há de que a nomeação do administrador da insolvência (AI) e do AJP, é da competência do juiz, como o preceitua o n.º 1 do art.º 52.º do CIRE. Sendo que em anotação ao art.º 52º, Carvalho Fernandes e João Labareda, in CIRE Anotado, pág. 244, referem que o recurso ao sistema informático de escolha e distribuição dos administradores pelos processos só ocorre no caso de não haver indicação do devedor ou da comissão de credores, quando esta seja viável, e o juiz a ela atender, ou quando não se verifique a preferência pelo administrador judicial provisório.
Não se pode ignorar que os art.ºs 32.º n.º1 e 52.º do CIRE foram alteradas pelo DL n.º 282/2007, de 7 de Agosto. Na sua redacção inicial, o art.º 52.º dispunha que: “1. A nomeação do administrador da insolvência é da competência do juiz.
2. Aplica-se à nomeação do administrador da insolvência o disposto no n° l do artigo 32°, devendo o juiz atender igualmente às indicações que sejam feitas pelo próprio devedor ou pela comissão de credores, se existir, e cabendo a preferência, na primeira designação, ao administrador judicial provisório em exercício de funções à data da declaração da insolvência.
3. (…)”. E também na sua redacção de original, constava do art.º 32.º n.º1 que: “A escolha do administrador judicial provisório recai em entidade inscrita na lista oficial de administradores da insolvência, tendo o juiz em conta a proposta eventualmente feita na petição inicial”.
Face ao teor daquelas normas, no passado, não havia dúvida aceitável de que na nomeação do AI, o juiz devia atender às indicações e às propostas que, para esse efeito, tivessem sido feitas pelo requerente, pelo devedor ou pela comissão de credores.
Mas onde se previa que o juiz devia ter em conta, actualmente, prevê-se a mera possibilidade de o juiz atender à proposta efectuada no requerimento inicial.
Sobre esta questão, referem Luís Carvalho Fernandes e João Labareda, in obra citada, pág. 178, a propósito do art.º 32.º do CIRE, que: “na sua redacção primitiva, o n.º 1 deste preceito dispunha que o juiz escolhe o administrador judicial provisório «tendo em conta a proposta eventualmente feita na petição inicial». Na sua nova versão, foi alargado o poder decisório do juiz nesta matéria por duas vias: quando passou a dizer-se que o juiz pode ter em conta a proposta eventualmente contida na petição inicial; e, sobretudo, quando limita a atendibilidade dessa proposta aos casos de processos «em que seja previsível a existência de actos de gestão que requeiram especiais conhecimentos”.
Esta alteração atribui, desde logo, maior liberdade do juiz na nomeação do AI, mas não só, pois também limita a possibilidade de o juiz atender à proposta feita no requerimento inicial ao caso de processos em que seja previsível a existência de actos de gestão que requeiram especiais conhecimentos. Sendo que esta restrição é expressamente salientada no preâmbulo do DL n.º 282/2007, onde se diz que: “é restringida a possibilidade de designação de um administrador da insolvência na petição inicial aos casos em que seja exigida a prática de actos que requeiram especiais conhecimentos”.
Logo, perante a actual redacção das referidas normas, temos de concluir que a faculdade de o requerente da insolvência indicar a pessoa que deverá ser nomeada para AI, e a consequente possibilidade de o juiz atender a essa indicação, está restringida aos casos de processos em que seja previsível a existência de actos de gestão que requeiram especiais conhecimentos. E conjugando aquelas novas versões de tais normas com o disposto no art.º 2.º do Estatuto do Administrador da Insolvência, poderemos concluir que o AI é, por regra, nomeado pelo juiz, sem qualquer consideração pelas indicações feitas pelo requerente ou devedor, por forma a assegurar a aleatoriedade da escolha e a idêntica distribuição de processos aos administradores. E apenas quando estejam em causa processos em que seja previsível a existência de actos de gestão que requeiram especiais conhecimentos por parte do administrador, pode/deve o juiz atender à proposta feita no requerimento inicial ou à indicação efectuada pelo devedor, em conformidade com o disposto nos citados art.ºs 32.º n.º l e 52.º do CIRE.
Consequentemente, entendemos que só naqueles casos especiais (processos em que seja previsível a existência de actos de gestão que requeiram especiais conhecimentos por parte do administrador) é que o juiz, nomeando AI/AJP diferente do proposto ou indicado, designadamente pelo devedor, deverá fundamentar a sua discordância, em conformidade com o disposto nos citados artigos 32.º, n.º l e 52.º do CIRE.
Todavia, é como é sabido que não há unanimidade na nossa Jurisprudência nem Doutrina quanto ao grau de influência da indicação no requerimento inicial de pessoa para exercer o cargo de AI/AJP sobre a decisão do juiz.
Segundo uns a nomeação do AI/AJP é feita apenas segundo o prudente critério do juiz, cabendo no seu poder discricionário, sendo decisão, por isso, irrecorrível, cfr. Ac. da Rel. de Coimbra de 26.02.2013 e Acs. da Rel. de Lisboa de 15.12.2011 e de 19.06.2012, todos in www.dgsi.pt.
Para outros, excepto no casos em que seja previsível a existência de actos de gestão que requeiram conhecimentos especiais, o juiz pode limitar-se a nomear o administrador de forma aleatória sem qualquer consideração pela indicação feita, designadamente pelo devedor no seu requerimento inicial e sem necessidade de qualquer fundamentação específica relativamente à não consideração dessa indicação, cfr. Acs. da Relação do Porto de 31.01.2012, de 7.07.2011, ambos in www.dgsi.pt.
Para outros ainda, o juiz, se não acolher a indicação que lhe é feita, designadamente pelo devedor ou pela comissão de credores, deve especificar a motivação que presidiu à nomeação que efectuou. Todavia, para uns, é suficiente uma motivação sucinta, cfr. Ac. da Rel. Lisboa de 21.03.2013, para outros a decisão deve ser fundamentada fáctica e juridicamente, sob pena de nulidade, cfr. Ac. da Rel. do Porto de 22.10.2013, ambos in www.dgsi.pt.
Finalmente, há outros que, reconhecendo que o juiz deve optar pela nomeação aleatória e equitativa do administrador da insolvência, não havendo justificação para nomear um terceiro, deverá acolher a indicação do requerente, devedor ou da comissão de credores cfr. Acs. da Rel. Do Porto de 21.10.2013 e de 28.01.2014, ambos in www.dgsi.pt.
Na Doutrina, encontramos Luís M. Martins, segundo o qual “em qualquer dos casos, quando não acolher as indicações (…) o juiz deve fundamentar esse não acolhimento e as razões que o levaram a nomear uma terceira pessoa/entidade”, pois que “se a lei permite a indicação do Administrador de Insolvência por parte dos interessados no processo para ser considerada pelo juiz então, não cabe ao juiz afastar essa possibilidade sem qualquer fundamentação” in “Processo de Insolvência” pág. 214.
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Revertendo para o caso em apreço, não podemos concordar com a afirmação feita em 1.ª instância no despacho que conheceu da arguida nulidade de falta de fundamentação da decisão recorrida, segundo a qual “…(n)o presente processo (…) nada nos permite concluir que estamos perante um processo em que seja previsível a existência de actos de gestão que requeiram especiais conhecimentos por parte do administrador – que não actos que todos os Senhores Administradores possam e estejam aptos a prática – e, por consequência, não assume qualquer relevo a sugestão da requerente”.
Na verdade, perante um requerimento inicial de PER será difícil ao juiz aquilatar, com toda a latitude, se nele será previsível a necessidade de realização de actos de gestão que requeiram especiais conhecimentos por parte do administrador judicial provisório. Daí que o juiz se terá de ancorar no alegado para o efeito pelo requerente, e no teor dos documentos, necessariamente, juntos aos autos.
Ora, “in casu” a requerente, ora apelante, alegou de forma até quase exaustiva e fundamentada a necessidade, quanto a ele, da nomeação de determinada pessoa para desempenhar o cargo de AJP nos autos. Tais alegações, vistas à luz do teor dos documentos juntos aos autos, parecem-nos plausíveis e como tal fundamentadoras da conclusão de que nos presentes autos é, além do mais, previsível a existência de actos de gestão que requeiram especiais conhecimentos – designadamente a necessidade da prática de actos de gestão com especiais conhecimentos, designadamente, do ramo do direito societário e do ramo imobiliário, como sejam eventuais fusões, promessas ou efectivas compras e vendas ou outras operações sobre imóveis, bem como, sobre participações sociais, incluindo a criação de novos veículos jurídicos ou financeiros, entre outros, e que afectarão a devedora a par das demais referidas sociedades que com ela constituem um grupo empresarial de facto, denominado Grupo C… e, que têm como maior e praticamente único credor, o D…, SA.
Donde somos de concluir que no caso vertente, a 1.ª instância poderia-deveria ter atendido à indicação do AJP feito pela requerente, ora apelante, por a situação se enquadra na previsão do art.º 32.º n.º1 do CIRE, e caso decidisse não aceitar a proposta feita, então tinha o dever de fundamentar, de facto e de direito, as razões por que desconsiderava tal indicação e seguia a regra geral.
Como se viu, entendemos que o caso em apreço se subsume à previsão da parte final do n.º1 do art.º 32.º do CIRE, pelo que, em 1.ª linha deveria a 1.ª instância teracolhido a indicação de AJP feita pela requerente, ora apelante. E como tal não sucedeu, era dever do juiz fundamentar a sua discordância, o que também não foi efectuado.
Pelo que, resta-nos, depois do que se deixou consignado, revogar a decisão recorrida, na parte em que nomeou AJP para os presentes autos, e em sua substituição, acolhendo a indicação feita pela requerente, ora apelante, uma vez que, face ao alegado e ao teor dos documentos juntos aos autos, é previsível a existência de actos de gestão que requeiram especiais conhecimentos - designadamente a necessidade da prática de actos de gestão com especiais conhecimentos, designadamente, do ramo do direito societário e do ramo imobiliário, como sejam eventuais fusões, promessas ou efectivas compras e vendas ou outras operações sobre imóveis, bem como, sobre participações sociais, incluindo a criação de novos veículos jurídicos ou financeiros, entre outros, e que afectarão a devedora a par das demais referidas sociedades que com ela constituem um grupo empresarial de facto, denominado Grupo C… e, que têm como maior e praticamente único credor, o D…, SA, nomear como AJP, o Exmo. Sr. Dr. E…, Administrador de Insolvência, inscrito na lista oficial dos Administradores da Insolvência - Especialmente habilitado a praticar actos de gestão, desde 1995, com domicílio profissional na Rua… Braga, telf: +…………/+…………, fax: ………, e-mail: ….@nadv.pt.

Sumário – I - Em princípio, a lei não exige, qualquer fundamentação por parte do decisor, no acto de nomear um administrador de uma insolvência, pois que tal nomeação seja efectuada por sorteio informático, ou seja, por processo aleatório, que produz, por natureza, uma escolha não fundamentada.
II - Como é sabido, tais aplicações informáticas não se encontram disponibilizadas e regulamentadas, mas dúvidas não há de que a nomeação do administrador da insolvência (AI) e do AJP, é da competência do juiz, como o preceitua o n.º 1 do art.º 52.º do CIRE.
III - A faculdade de o requerente da insolvência indicar a pessoa que deverá ser nomeada para AI, e a consequente possibilidade de o juiz atender a essa indicação, está restringida aos casos de processos em que seja previsível a existência de actos de gestão que requeiram especiais conhecimentos.
IV - Só naqueles casos especiais (processos em que seja previsível a existência de actos de gestão que requeiram especiais conhecimentos por parte do administrador) é que o juiz, nomeando AI/AJP diferente do proposto ou indicado, designadamente pelo devedor, deverá fundamentar a sua discordância, em conformidade com o disposto nos citados artigos 32.º, n.º l e 52.º do CIRE

IV – Pelo exposto acordam os Juízes desta secção cível em julgar a presente apelação procedente e em revogar a decisão recorrida, e em sua substituição nomear como administrador judicial provisório o Exmo. Sr. Dr. E….
Sem custas.

Porto, 2016.01.12
Anabela Dias da Silva
Ana Lucinda Cabral
Maria do Carmo Domingues