Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
9525/15.2T8VNG-A.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: RUI PENHA
Descritores: DESPEDIMENTO ILÍCITO
RESOLUÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO PELO TRABALHADOR
CADUCIDADE
INDEMNIZAÇÃO
Nº do Documento: RP201604079525/15.2T8VNG-A.P1
Data do Acordão: 04/07/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROVIDO
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL), (LIVRO DE REGISTOS N.º237, FLS.393-398)
Área Temática: .
Sumário: Tendo sido solicitada a condenação da empregadora em indemnização por despedimento ilícito e concluindo-se que ocorreu declaração de resolução do contrato de trabalho a termo certo por caducidade, deve conhecer-se de tal pedido como de indemnização nos termos do art. 344º, nº 2, do Código do Trabalho.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo n.º 9525/15.5T8VNG-A.P1
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto

B…, residente na Rua …, Vila Nova de Gaia, patrocinada por mandatário judicial, litigando com apoio judiciário na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo, veio intentar acção declarativa de condenação, com processo comum, contra C…, Lda., com sede na Rua …, Espinho, e D…, residente na Rua ….
Formula os seguintes pedidos:
a) ser declarado ilícito o despedimento da A., promovido pelas RR.;
b) condenar-se a 1ª Ré no pagamento à A. do subsídio de Natal no valor de 267,43 €;
c) condenar-se a 2ª Ré no pagamento à A. do subsídio de Natal no valor de 271,70 €;
d) no pagamento à A. pela 1ª Ré da indemnização por despedimento, prevista no artigo 393º do C.T., pelo qual desde já faz a sua opção, no montante de 1.604,58 €;
e) no pagamento à A. pela 2ª Ré da indemnização por despedimento, prevista no artigo 393º do C.T., pelo qual desde já faz a sua opção, no montante de 1.630,20 €;
f) no pagamento da indemnização dos danos não patrimoniais reclamados a cada uma das RR. de 400,00 € e no valor global de 800,00 €.
g) No pagamento à A. dos juros vincendos, à taxa legal desde a citação, até efectivo e integral pagamento.
Alega que:
1. A A. foi contratada pelas 1ª e 2ª RR. em 30 Setembro 2014, através de contrato de trabalho a termo certo, com início em 01 Outubro 2014, pelo período de seis meses, a tempo parcial, para, sob as ordens de ambas as RR., direcção e fiscalização exercer as funções de empregada de balcão, nos estabelecimentos das RR..
2. A retribuição mensal auferida pela A., compreendendo a retribuição base e subsidio de alimentação é de 267,43 € e 271,70 € liquidadas, respectivamente pelas 1ª e 2ª RR..
3. Ambas as RR. através de cartas registadas com avisos de recepção, datadas de 07 Setembro 2015 que enviaram à A., comunicaram-lhe o seu despedimento, alegando justa causa.
4. Os despedimentos ocorridos, como se demonstrará, são ilícitos.
5. Na verdade, as RR. não comunicaram à A. a instauração de qualquer processo disciplinar;
6. não lhe enviaram nota de culpa;
7. não instauram, nem realizaram qualquer processo disciplinar.
8. Além de que, é totalmente falso e por isso se impugna, o referido nas missivas das RR., de 07 Setembro de 2015, isto é, que a A. tenha “dado quinze dias de faltas injustificadas seguidas..”
9. Pelo que, deve ser declarado ilícito o despedimento promovido pelas RR.
10. Por último, importa salientar que o despedimento ilícito da A., promovido pela RR., causou-lhe danos não patrimoniais, cujo ressarcimento se exige.
11. Na verdade, a A. com tal despedimento ilegal, sentiu-se vexada e humilhada no seu brio profissional e pessoal, pois, era uma funcionária cumpridora e exemplar, o que lhe causou mau estar, depressão, tristeza e descontrolo emocional.
12. A A. viu-se privada dos seus rendimentos de trabalho o que lhe causou embaraços e amargura, pois, teve que recorrer ao crédito para pagar os livros escolares da filha, sentindo-se embaraçada, impotente e triste
Foi proferido despacho inicial, de indeferimento liminar, com o seguinte teor:
Antes de mais e ao abrigo do art. 54º, nº 1, do Cód. Proc. Trabalho, conjugado com o art. 590º, nº 1, do Cód. Proc. Civil, decide-se indeferir liminarmente a petição apresentada pela Autora B… contra os Réus C…, Lda., e D… relativamente aos seguintes pedidos:
“a) ser declarado ilícito o despedimento da A., promovido pelas RR.;
(...)
d) no pagamento à A. pela 1ª Ré da indemnização por despedimento, prevista no artigo 393º do C.T., pelo qual desde já faz a sua opção, no montante de 1.604,58 €;
e) no pagamento à A. pela 2ª Ré da indemnização por despedimento, prevista no artigo 393º do C.T., pelo qual desde já faz a sua opção, no montante de 1.630,20 €;
f) no pagamento da indemnização dos danos não patrimoniais reclamados a cada uma das RR. de 400,00 € e no valor global de 800,00 €”.
Tal indeferimento liminar parcial da petição prende-se com os seguintes fundamentos:
1 – A Autora alega que foi contratada por ambos os Réus em 30/09/2014 e por contratos a termo de 6 meses (contratos cuja validade não põe em causa), pelo que na data de 7 de Setembro de 2015 – em que recebeu as cartas dos RR. a despedi-la – se encontrava em curso a primeira renovação daqueles contratos, ocorrida em 30/03/2015 e até 30/09/2015.
2 – Assim sendo e mesmo não tendo causa justificativa para uma cessação dos contratos por despedimento, ambos os RR. podiam, na referida data de 7/09/2015, fazer cessar os contratos por caducidade, nos termos do art. 344º, nº 1, do Cód. Trabalho.
3 – Ainda que se tratem de formas distintas de cessação do contrato (o despedimento e a caducidade) – cfr. art. 340º do Cód. Trabalho – basta para a caducidade de um contrato a termo que o empregador comunique ao trabalhador “a vontade de o fazer cessar, por escrito” com uma antecedência de “15 dias” relativamente ao “final do termo estipulado ou da sua renovação”.
4 – Ora, ambos os RR. tomaram tal atitude, com as cartas de 7 de Setembro de 2015, em que manifestam a vontade de fazer cessar os contratos de trabalho que tinham com a A. e com uma antecedência até superior a 15 dias relativamente ao final da renovação dos contrato, o qual ocorreria em 30/09/15.
5 – Tal comunicação, ainda que não tenha sido precedida de uma nota de culpa ou processo disciplinar, também não o tinha de ser para operar a cessação do contrato por caducidade, pelo que sempre para este efeito seria e foi forma válida de fazer cessar o contrato.
6 – E, sempre havendo assim de entender-se que o contrato caducou em 30/09/2015, não pode a A. reclamar indemnizações por despedimento ilícito durante mais 6 meses de duração do contrato ou retribuições desde o despedimento até ao trânsito em julgado, como reclama ao abrigo do art. 393º do Cód. Trabalho.
7 – Tal como não pode reclamar indemnizações por danos não patrimoniais, já que também pressuporiam e pressupõem que o contrato não cessou de forma válida ou lícita (no caso, por caducidade), antes por despedimento ilícito (que, no caso, não ocorreu ou não é qualificável como tal) – cfr. art. 389º do Cód. Trabalho.
8 – Acresce, ainda e do ponto de vista processual, que, mesmo que os contratos de trabalho em causa fossem de considerar como tendo cessado por despedimento ilícito, a verdade é que, como resulta do art. 387º, nº 2, do Cód. Trabalho, o trabalhador, para se opor ao despedimento, tem de o fazer “mediante a apresentação de requerimento em formulário próprio, junto do tribunal competente, no prazo de 60 dias contados a partir da recepção da comunicação de despedimento (...)”.
9 – Ou seja, a forma de processo adequada para a A. impugnar o despedimento por parte dos RR. não seria a do processo comum, mas a do processo especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, regulado nos arts. 98º C e segs. do Cód. Proc. Trabalho.
10 – Pelo que e se outro motivo não houvesse para considerar improcedentes os pedidos inerentes ao pretenso despedimento ilícito, sempre haveria que reconhecer, no caso, a existência de um erro na forma de processo empregue pela A., nos termos e com os efeitos do art. 193º do Cód. Proc. Civil.
Inconformada interpôs a autora o presente recurso de apelação, concluindo:
1. O despacho recorrido que indeferiu liminarmente a petição inicial relativamente aos pedidos de despedimento ilícito promovidos pelas RR e consequentes, pagamentos de indemnização por despedimento à A., previstos no artigo 393º do C.T. e bem assim, nos pagamentos de danos não patrimoniais, baseou-se, além do mais, na errónea, aplicação e interpretação da carta de 7 Setembro 2015, enviadas pelas RR. à A.
2 Na verdade, como se extrai destas alegações, estamos perante a celebração de dois contratos de trabalho a termo certo, a seis meses, celebrados pelas RR. em 30/09/2014, sendo que o teor das cartas enviadas pelas RR. à A. em 07 Setembro 2015, não vem declarado, não se extrai, nem se vislumbra, a vontade de fazer cessar os contratos, por caducidade, ou seja, não se pretende impedir a sua renovação, no final do termo.
3. Nas aludidas cartas de 7 Setembro 2015 e transcritas nestas alegações, vem declarado taxativamente, literalmente, cristalinamente, que a A. é despedida, em virtude de ter faltado injustificadamente, por quinze dias seguidos, desde o dia 17 Agosto até 4 Setembro, e como tal deve considerar-se despedida com justa causa, na data de 7 Setembro.
4. Sustentar-se, com base em tal missiva, como vem dito na decisão recorrida, que tal comunicação das RR. é a expressão da vontade destas, em fazer cessar os contratos no final do termo ou da sua renovação, não passa de pura ficção o que, respeitosamente, se afirma.
5. O teor da carta de 7 Setembro 2015 enviada pelas RR. à A., não é confundível, nem permite fazer qualquer confusão, na cessação dos contratos de trabalho, por caducidade ou despedimento.
6. Por outro lado, também não assiste qualquer razão, no despacho recorrido, sob o ponto de vista processual, ao aí defender-se a existência de erro na forma de processo, porquanto, a A. deveria, socorrer-se do processo através de requerimento em formulário próprio, e não o processo comum utlizado.
7. Na verdade, a impugnação do despedimento através de formulário próprio, pressupõe que no despedimento tenha sido adoptado o formalismo próprio, mormente, o cumprimento do formalismo previsto nos artigos 353º do C.T., o que in caso não sucedeu, por parte das RR.
8. Não obstante e sem conceder do exposto, a A. socorreu-se do processo especial de impugnação judicial de regularidade e licitude de despedimento, dando origem ao processo nº 7874/15.9T8VNG–J2, acabando a Meritíssima Juiz desse processo por entender que o meio próprio era o processo comum. Doc.1 que ora junta.
9. Constata-se, pois, que o presente processo comum escolhido pela A. é o adequado, motivo porque deverá o despacho recorrido, também nesta parte, ser revogado.
10. A decisão recorrida violou, entre outras, as disposições contidas nos artigos 54º do C.P.T., 340º, 344º, 393º, 387º, todos do C.T. e 193º do C.P.C.
Juntou um documento.
Citados os réus, não apresentaram alegações.
O Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal teve vista nos autos, tendo emitido parecer no sentido da procedência do recurso, parecer a que as partes não responderam.
Admitido o recurso e colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
Importa começar por apreciar a admissibilidade do documento junto pela autora com as alegações.
Nos termos do art. 651º, nº 1, do CPC, as partes apenas podem juntar documentos às alegações nas situações a que se refere o art. 425º ou no caso de a junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido em 1ª instância.”
No caso vertente, é patente que se verifica a segunda situação, uma vez que a junção do documento não se revelava necessária para a decisão de mérito, apenas surgindo tal necessidade com a prolação do despacho sob recurso
Assim, admite-se a junção do documento.
Como se sabe, o âmbito objectivo dos recursos é definido pelas conclusões do recorrente (artigos 635º, nº 4, e 639º, nº 1, do CPC, por remissão do art. 87º, nº 1, do CPT), importando assim decidir quais as questões naquelas colocadas.
Questões colocadas:
I. Falta de fundamento para os pedidos objecto de indeferimento liminar;
II. Erro na forma do processo.
Os factos a considerar são os que constam do relatório e ainda:
As cartas referidas no art. 3º da petição inicial têm, ambas, o seguinte teor: “na sequência da nossa carta enviada em 27 de Agosto p.p., e dada a ausência de qualquer referência à justificação das faltas que lhe informamos como injustificadas, vimos comunicar que dado ter 15 (quinze) dias de faltas injustificadas seguidas, desde o dia 17 de Agosto até 4 de Setembro, deverá considerar-se despedida com justa causa a partir desta data, 7 de Setembro de 2015.”
Foi proferido despacho nos autos de impugnação judicial de despedimento, com o nº 7874/15.9T8VNG, datado de 26-10-2015, com o seguinte teor:
“B… intentou a presente acção de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento promovido pela Ré C…, Lda ocorrido em 07.09.2015.
Analisando o documento que suporta a presente ação, cremos não se verificarem os requisitos previstos no artigo 98º-C do CPT necessárias para que a acção prossiga esta forma especial de processo, pese embora tratar-se de uma decisão unilateral da entidade patronal do sentido de fazer cessar a relação laboral.
Nos termos citado normativo é necessário que exista uma decisão de “despedimento individual, seja por facto imputável ao trabalhador, seja por extinção do posto de trabalho, seja por inadaptação” que seja comunicado ao trabalhador por escrito pela entidade patronal. Porém, quer da própria decisão, quer dos esclarecimentos prestados pela própria entidade patronal em audiência de partes resulta claro que não foi adotado qualquer formalismo para efeitos de cessação do respetivo contrato de trabalho, nomeadamente, o cumprimento do formalismo previsto nos artigos 353º e ss do CT.
Esta forma especial de processo só é admissível para os casos de despedimento individual, seja, por facto imputável ao trabalhador, seja por extinção do posto de trabalho, seja por inadaptação em que cumpre, naquele caso, analisar e avaliar a verificação e validade dos pressupostos materiais e formais em que assentou a decisão de despedimento, pressupondo que este existiu e obedeceu a algum procedimento (ainda que irregular).
Tanto é assim que na tramitação prevista para esta acção especial está contemplada a junção, pelo empregador, do “procedimento disciplinar ou dos documentos comprovativos do cumprimento das formalidades exigidas” – artigo 98ºI, nº 4, al. a) do CPT – o que pressupõe que houve um procedimento disciplinar ou algum outro dos procedimentos legalmente previstos pata um despedimento individual – cfr. art.s 353º e ss do CT.
Aqui não se enquadra a situação dos autos, pelo que deveria a Autora, para fazer valer os seus intentos, ter instaurado uma acção de processo comum com a tramitação prevista no artigo 54º e ss. do CPT. Ocorre assim um erro na forma do processo nos termos do artigo 193º do CPC ex vi artigo 49º, nº 2 do CPT.
Pese embora o disposto no artigo 193º do Código Processo Civil, donde resulta a necessidade de praticar os actos estritamente necessários para que o processo se aproxime, dentro do possível, da forma estabelecida pela lei, não é possível aproveitar os termos da acção para prosseguimento na forma de processo comum, porquanto não existe, na fase em que se encontra este processo especial, qualquer articulado com a alegação de factos e formulação do pedido do Autor, conforme se impõe para tramitação ulterior na forma correta.
Pelo exposto, ao abrigo do artigo 196º, 278º, al. e) e 577º, al. b) do CPC ex vi artigo 54º, nº 1 do CPT, declaro a nulidade do processado e absolvo a Ré da instância.”
1. Foi liminarmente indeferido parte do pedido formulado pela autora por falta de fundamento para os pedidos relacionados com a invocação de despedimento ilícito.
Nos termos do art. 54º, nº 1, do CPT, recebida a petição, se o juiz nela verificar deficiências ou obscuridades, deve convidar o autor a completá-la ou esclarecê-la, sem prejuízo do seu indeferimento nos termos do disposto no nº 1 do artigo 234º-A do Código de Processo Civil.
Por seu lado, estatui o art. 590º, nº 1, do CPC de 2013 (que substitui o anterior art. 234º-A), que, nos casos em que, por determinação legal ou do juiz, seja apresentada a despacho liminar, a petição é indeferida quando o pedido seja manifestamente improcedente ou ocorram, de forma evidente, exceções dilatórias insupríveis e de que o juiz deva conhecer oficiosamente (...).
Entendeu-se na decisão sob recurso que “(...) havendo assim de entender-se que o contrato caducou em 30/09/2015, não pode a A. reclamar indemnizações por despedimento ilícito durante mais 6 meses de duração do contrato ou retribuições desde o despedimento até ao trânsito em julgado, como reclama ao abrigo do art. 393º do Cód. Trabalho. Tal como não pode reclamar indemnizações por danos não patrimoniais, já que também pressuporiam e pressupõem que o contrato não cessou de forma válida ou lícita (no caso, por caducidade), antes por despedimento ilícito (que, no caso, não ocorreu ou não é qualificável como tal) – cfr. art. 389º do Cód. Trabalho.”
A propósito do indeferimento liminar, considerou-se no acórdão desta Secção Social do Tribunal da Relação do Porto de 7-6-2010:
“A evolução do nosso processo civil, desde há alguns anos a esta parte, tem sido no sentido de reforçar os princípios da economia processual, do inquisitório e da verdade material, entre outros, privilegiando as decisões de mérito. Assim, no que respeita aos pressupostos processuais, deve o juiz agir – mesmo oficiosamente – por forma a suprir a falta deles, quando susceptíveis de sanação, só devendo recorrer ao indeferimento in limine quando se verifiquem excepções dilatórias insupríveis, (...).
“Na verdade, os casos de indeferimento liminar correspondem a situações em que a petição apresenta vícios formais ou substanciais de tal modo graves que permitem prever, logo nesta fase, que jamais o processo assim iniciado terminará com uma decisão de mérito ou de que é inequívoca a inviabilidade da pretensão apresentada pelo autor.
“Isto é, a actividade processual desenvolvida pelas partes, neste caso pelas AA., deve ser aproveitada até ao limite, de forma que todos os esforços deverão ser levados a cabo, quer pelo Juiz, ainda que ex officio, quer pelas partes, por sua iniciativa ou a convite daquele, sempre que seja possível corrigir as irregularidades ou suprir as omissões verificadas, de modo a viabilizar uma decisão de meritis, assim prestando homenagem aos princípios da economia processual e da verdade material.
“Tais princípios, tendo sido consagrados no processo comum nas últimas reformas, desde 1995, já existiam no processo do trabalho desde 1963, pelo menos, tendo a matéria assento no supra transcrito Art. 54º, nº 1 do Cód. Proc. do Trabalho de 2000.
“Assim, a primeira tarefa do juiz no despacho liminar consiste em fazer suprir as insuficiências que detecte na petição inicial, só depois se colocando a questão do eventual indeferimento in limine, apenas aplicável aos vícios que sejam manifestos ou evidentes.”
Analisando o caso vertente, entendemos que o indeferimento liminar resulta de uma qualificação jurídica precoce das declarações das entidades patronais da autora, e consequente configuração jurídica da causa.
Sucede que a qualificação das declarações de “despedimento” dos autos como consubstanciando declaração de cessação dos contratos por caducidade, ou despedimento, é matéria jurídica, relativamente à qual o tribunal não está vinculado à alegação das partes.
Ou seja, para além de ser prematura a análise jurídica efectuada, nada obsta a que a acção prossiga nos termos formulados, uma vez que das declarações em questão consta expressamente “, vimos comunicar que dado ter 15 (quinze) dias de faltas injustificadas seguidas, desde o dia 17 de Agosto até 4 de Setembro, deverá considerar-se despedida com justa causa”.
Embora com consequências jurídicas distintas relativamente aos casos de contrato de trabalho sem termo, pode haver despedimento nos casos de existir um contrato de trabalho a termo.
Por outro lado, ainda que a final se conclua que se verificou uma declaração válida para efeitos de não renovação do contrato por caducidade, como se fez no despacho sob recurso, nada obsta a que se conheça do pedido de indemnização.
Efectivamente, também a cessação do contrato por caducidade confere ao trabalhador o direito a uma compensação financeira, conforme disposto no art. 344º, nº 1 e 2, do Código do Trabalho, sendo o valor da mesma o previsto no art. 366º do mesmo diploma, pela qual o tribunal pode a final optar, com fundamento no pedido efectuado com base no despedimento ilícito.
Assim, nada impede o prosseguimento dos autos para conhecimento dos pedidos formulados.
2. Considerou-se ainda no despacho recorrido:
Acresce, ainda e do ponto de vista processual, que, mesmo que os contratos de trabalho em causa fossem de considerar como tendo cessado por despedimento ilícito, a verdade é que, como resulta do art. 387º, nº 2, do Cód. Trabalho, o trabalhador, para se opor ao despedimento, tem de o fazer “mediante a apresentação de requerimento em formulário próprio, junto do tribunal competente, no prazo de 60 dias contados a partir da recepção da comunicação de despedimento (...)”.
Ou seja, a forma de processo adequada para a A. impugnar o despedimento por parte dos RR. não seria a do processo comum, mas a do processo especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, regulado nos arts. 98º C e segs. do Cód. Proc. Trabalho.
Pelo que e se outro motivo não houvesse para considerar improcedentes os pedidos inerentes ao pretenso despedimento ilícito, sempre haveria que reconhecer, no caso, a existência de um erro na forma de processo empregue pela A., nos termos e com os efeitos do art. 193º do Cód. Proc. Civil.
O Magistrado do Ministério Público defende que, havendo duas decisões contraditórias sobre a mesma matéria deverá ser dada prevalência à primeira, pelo não podia ser abordada de novo a questão.
É certo que o juiz a quo, aquando da prolação do despacho sob recurso, neste aspecto particular, não teria conhecimento do despacho contrário proferido no processo anteriormente intentado pela autora.
Porém, verificando-se a existência do mesmo, não pode deixar de se ter em consideração, devendo prevalecer tal decisão, uma vez que transitada em julgado, conforme bem assinalado pelo Magistrado do Ministério Público.
3. Pelo exposto, acorda-se em julgar procedente a apelação, revogando-se o despacho recorrido, devendo a acção prosseguir os seus termos.
Sem custas.

Porto, 7-4-2016
Rui Penha – relator
Maria José Costa Pinto
António José Ramos
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[1] Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 7-6-2010, processo 477/09.9TTVNG.P1, relator Ferreira da Costa, acessível em www.dgsi.pt/jtrp