Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | JERÓNIMO FREITAS | ||
Descritores: | PROCESSO DE ACIDENTE DE TRABALHO REQUERIMENTO DE PROVA RECURSO EXAME POR JUNTA MÉDICA FUNDAMENTAÇÃO | ||
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Nº do Documento: | RP202309183211/21.1T8PNF.P1 | ||
Data do Acordão: | 09/18/2023 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | RECURSO IMPROCEDENTE; CONFIRMADA A SENTENÇA | ||
Indicações Eventuais: | 4ª SECÇÃO (SOCIAL) | ||
Área Temática: | . | ||
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Sumário: | I - Tendo o Sinistrado requerido, conjuntamente com o requerimento em que formulou quesitos e requereu ser submetido a exame por junta médica, a realização de um estudo do posto de trabalho pelo Centro de Reabilitação ... e a solicitação de parecer ao Instituto do Emprego e Formação, respeitando tal a meios de prova, se porventura discordou daquela decisão que os indeferiu, então cumpria-lhe interpor recurso autónomo, no prazo legal, nos termos previstos no art.º 79.º A, n.º1, al. d), do CPT, normas que acolhem o regime consagrado no art.º 644.º, n.º 2, al d), do CPC. II - Como não o fez, a decisão transitou em julgado e, logo, está vedado a este Tribunal ad quem debruçar-se sobre ela para aquilatar se foi, ou não acertada. III - Verificando-se que os senhores peritos responderam com fundamentação suficiente aos quesitos que foram submetidos ao seu laudo pelo sinistrado, enquadrados pela alegação prévia que apresentou, onde jamais disse desempenhar profissão de marceneiro/entalhador, a discordância do sinistrado não é suficiente para pôr em causa o exame por junta médica, imputando-lhe enfermar de falta de fundamentação e, por consequência, deficiência na fundamentação de facto na sentença. IV - Não tem razão o sinistrado para sustentar que “sendo deficiente o referido exame e dado o disposto no art.º 712.º, n.º 4 do Cód. Proc. Civil [referindo-se certamente por lapso à norma do pretérito CPC, que actualmente tem correspondência no art.º 662., n.º2, al. c), do CPC/2013], deverá o processado ser anulado desde a última Junta Médica, a qual deverá ser repetida, seguindo-se depois a normal tramitação legal, devendo o Tribunal a quo”. | ||
Reclamações: | |||
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Decisão Texto Integral: | APELAÇÃO n.º 3211/21.1T8PNF.P1 SECÇÃO SOCIAL ACORDAM NA SECÇÃO SOCIAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO I.RELATÓRIO I.1 Nos presentes autos de acção declarativa de condenação, sob a forma de processo especial, emergente de acidente de trabalho, em que é sinistrado AA e entidade responsável “A..., S.A.” teve lugar a tentativa de conciliação [29-06-2022] que se frustrou, porquanto o sinistrado não aceitou o resultado do exame médico singular, realizado pelo GML de Penafiel, atribuindo-lhe a IPP de 35,76%, desde a data da alta, fixada em 09 de Novembro de 2021. A fase litigiosa iniciou-se com a apresentação de requerimento pelo sinistrado para ser submetido a exame por junta médica, para o efeito formulando quesitos e requerendo que previamente à Junta Médica, «[..] no sentido de munir a JM com todos os elementos fundamentais para cabalmente responderem aos quesitos apresentados: a) seja solicitado ao Centro de Reabilitação ..., sito na Av. ..., ... ..., a elaboração de um estudo do posto de trabalho no sentido identificar a categoria profissional do sinistrado à data do acidente, a descrição das tarefas que lhe são adstritas e exigências específicas para a realização das tarefas que se enquadram na referida categoria, designadamente condições de execução do trabalho, exigências físicas (posição do trabalho, tipo e intensidade de esforço), exigências sensoriais, psico-motoras e mentais bem como, de acordo com as mesmas, constatar a (in)existência de IPATH; b) e ao Instituto do Emprego e Formação Profissional parecer sobre a efectiva possibilidade de reabilitação do sinistrado, tudo nos termos dos pontos 5.ºA, 10.º e 13.º das Instruções Gerais preambulares da TNI». I.2 Pronunciando-se sobre esse requerimento, a Senhora Juíza proferiu decisão, no que aqui releva, dela constando o seguinte: -«Para realização de exame por junta médica designo o próximo dia 22 de Setembro, pelas 14.30 horas. Solicite ao I.N.M.L.- Gabinete de Penafiel a indicação de perito médico a ser nomeado pelo Tribunal e que não tenha tido ainda qualquer intervenção neste processo. Objecto da perícia: os quesitos indicados no requerimento que antecede. Notifique e dn, advertindo-se as partes que lhes cabe a apresentação dos respectivos peritos médicos até ao início da diligência, sendo que se não o fizerem o tribunal os nomeia oficiosamente – art. 139.º, n.º 5, do Código de Processo do Trabalho. [..]. Consigna-se que para a apreciação da necessidade e oportunidade de requisitar os elementos a que o sinistrado faz alusão, requer especiais conhecimentos ´técnico de que o Tribunal não dispõe, pelo que tal será objecto de apreciação em sede de junta médica. [..]». Notificado dessa decisão, pelo Sinistrado Autor nada foi requerido. I.3 Realizado o exame por junta médica os senhores peritos médicos responderam por unanimidade a parte dos quesitos, nomeadamente, os sob as alíneas a), b) g) e h), fixando ao sinistrado a IPP de 29,3424%. Quanto aos quesitos c), d) e) e f), respeitantes à questão da IPATH, por maioria, pronunciaram-se como segue: -«[..] para dar resposta a estas questões os peritos são de opinião que deve ser realizada Junta Médica de Medicina no Trabalho, considerando-se que este tipo de avaliação, sempre em contexto médico, é a que mais satisfaz o que é questionado, sendo o formato mais adequado para dar resposta ao indicado nas alíneas c), d), e) e f)». Pelo perito médico da seguradora foi dito “que entende que o examinado não se encontra em situação de IPATH mas sim com as limitações condizentes ao valor da IPP fixada”. Notificado do resultado deste exame por junta médica, nada foi requerido pelo sinistrado. I.4 Pelo Tribunal a quo foi designado dia para o exame de Junta Médica, especialidade de Medicina no Trabalho. Nesse acto, os senhores peritos médicos responderam por unanimidade como segue: -«c), d), e) e f) Considera-se que o examinado se encontra capaz para o exercício da sua actividade profissional habitual na proporção do valor da IPP proposto, considerando-se designadamente que está capaz para: executar tarefas de acabamento (Ex. lixar, polir, colar, envernizar, pintar, encerar, lacar), deslocar peças de madeira e tábuas, operar máquinas, comandadas/automatizadas (da sua área) evitando operar com tupias e serras elétricas, consegue aparafusar e aplicar ferragens na proporção do valor de IPP proposto». Notificado desse laudo, o sinistrado apresentou requerimento, culminando com a pretensão seguinte: -«[..] requer-se a anulação da Junta Médica ora realizada, a determinação da realização dos estudos/pareceres solicitados supra em 11.º e solicitados oportunamente com o seu requerimento anterior e designar nova Junta Médica, com peritos distintos atenta a falta de conhecimento dos mesmos tendo em conta a profissão do sinistrado, para responder, justificada e cabalmente, aos quesitos apresentados bem assim a outros que, posteriormente, possam advir como fundamentais para a compreensão do objecto do litígio». Pronunciando-se sobre este requerimento, o Tribunal a quo, em 23-11-22, proferiu a decisão seguinte: -«Vem o sinistrado requerer requer-se a anulação da Junta Médica ora realizada, a determinação da realização dos estudos/pareceres solicitados em 11.º do requerimento em apreço e solicitados oportunamente com o seu requerimento anterior e designar nova Junta Médica, com peritos distintos atenta a falta de conhecimento dos mesmos tendo em conta a profissão do sinistrado, para responder, justificada e cabalmente, aos quesitos apresentados bem assim a outros que, posteriormente, possam advir como fundamentais para a compreensão do objecto do litígio.. Cumpre apreciar e decidir. Requer o sinistrado a anulação da perícia que é um acto processual, embora não invoque que a mesma padece de qualquer invalidade, nulidade ou anulabilidade. Aliás, compulsados os autos, constatamos que a junta médica não padece de quaisquer vícios processuais ou procedimentais. Por outro lado, como se pode ler no sumário do Ac TRG proferido no Proc 447/12.0TTBRG-B.G1, Relatora VERA MARIA SOTTOMAYOR, em 19-01-2017, disponível para consulta em www.dgsi.pt: I - Nos termos do art.º 487º, do CPC, a segunda perícia é o meio de reacção contra inexactidão do resultado da primeira e procura que outros peritos confirmem essa inexactidão e a corrijam. II- Decorre do regime normativo processual referente à acção especial a possibilidade de realização de duas perícias médicas: uma singular (exame médico, com relatório a elaborar nos termos previstos no artigo 106º do CPT), outra colegial quando haja discordância relativamente à primeira (junta médica, que se traduz num segundo exame ao sinistrado em que as sequelas resultantes do acidente voltam a ser examinadas), com regras precisas decorrentes de tal tramitação, razão pela qual, o previsto no artigo 487º do CPC., teria de ser entendido como a realização de uma terceira perícia que não é prevista nem consentida quer pelo CPC., quer pelo CPT. III – No âmbito da acção especial emergente de acidente de trabalho em face da disciplina especialmente prevista no CPT. para a realização da perícia médico-legal, com vista à avaliação da incapacidade para o trabalho de que poderá ser portador o sinistrado, revela-se de inadmissível a realização de uma 2ª perícia colegial, não havendo assim lugar a aplicação do previsto no artigo 487º do CPC. Concordando nós inteiramente com tal alto aresto, julgamos também por esta via legalmente inadmissível o requerido pelo sinistrado – depreendendo-se do seu requerimento a sua não concordância com as conclusões retiradas pelos Exmos Senhores Peritos. Quanto ao seu requerimento no sentido de ser ordenada pelo Tribunal a realização de estudos/pareceres, o mesmo foi já apreciado por nós em 7/9/2022, tendo-se esgotado o nosso poder jurisdicional quanto a tal matéria. Tudo visto, julga-se improcedente a pretensão do sinistrado. [..]». I.5 Subsequentemente, em 20-12-2022, o Tribunal a quo proferiu sentença, nos termos do art.º 140.º do CPT, dela constando, no que aqui releva, o seguinte: -« [..] Por acordo das partes e documentos encontram-se assentes os seguintes factos: 1 - O sinistrado sofreu um acidente no dia 16 de Junho de 2021... 2 - ... Quando trabalhava por conta de BB... 3 - ... Mediante o salário anual de €665,00 x 14 + €100,17 x 11(total anual €10.411,87). 4 – A responsabilidade infortunístico laboral da entidade patronal encontrava-se transferida para a seguradora pelo referido salário anual. 5 – Do acidente resultaram para o sinistrado, como consequência directa e necessária, as lesões e sequelas descritas nos exames médicos de 20/10/2022 e 22/9/2022. 6 – O sinistrado despendeu em deslocações obrigatórias a tribunal a quantia de € 15,00. 8 – O sinistrado nasceu no dia .../.../1967. * Falta decidir apenas a questão da incapacidade que afecta o sinistrado.Apreciando e decidindo: Realizado o exame por junta médica, os Srs. Peritos médicos atribuíram ao sinistrado, por unanimidade, 29,3424% de IPP, sem IPATH e já considerando o factor 1,5 pela idade, desde 09 de Novembro de 2021. Como é sabido, e resulta do disposto no artigo 388.º do Código Civil, a prova pericial tem por fim a percepção ou apreciação de factos por meio de peritos, quando sejam necessários conhecimentos especiais que os julgadores não possuem, ou quando os factos, relativos a pessoas, não devam ser objecto de inspecção judicial. No âmbito de acidente de trabalho, estando em causa a percepção das lesões sofridas pelo sinistrado em consequência do acidente e o apuramento do grau de incapacidade que essas lesões e respectivas sequelas lhe acarretam, a lei manda ao tribunal recorrer a peritos (prevendo a realização de exames médicos), dado que a percepção das lesões e a incapacidade delas decorrentes envolve conhecimentos médicos que o julgador não possui. Ora, no caso presente, os Srs. Peritos médicos, na junta médica genérica e na junta de medicina do trabalho realizada, fixaram, por unanimidade, uma IPP 29,3424% de IPP, sem IPATH, desde 09 de Novembro de 2021. Assim, tendo em conta este parecer unânime e, bem assim, as informações clínicas constantes dos autos sobre a natureza das lesões, a gravidade destas, as suas sequelas, o estado geral, a idade e a profissão do sinistrado, sendo certo que inexiste fundamento que permita um entendimento diverso do sufragado pela unanimidade dos senhores peritos médicos, nos termos do disposto no artigo 140.º do Código de Processo do Trabalho, considero que o sinistrado em consequência do acidente de trabalho ficou afectado de 29,3424% de IPP, sem IPATH, desde 09 de Novembro de 2021. * [..]*** Assim, e nos termos do disposto no artigo 140.º/1 do Código de Processo do Trabalho, reconhecendo-se que o sinistrado foi vítima de um acidente de trabalho do qual lhe resultou uma incapacidade permanente parcial de 29,3424% de IPP, sem IPATH e já considerando o factor 1,5 pela idade, desde 09 de Novembro de 2021, condena-se a entidade responsável a pagar-lhe:1 - o capital de remição da pensão anual de € 2.138,56, devida desde o dia 10 de Novembro de 2021, acrescido de juros de mora, à taxa legal de 4% ano, desde tal data e até efectivo e integral pagamento; 2 - a quantia de € 15,00 de despesas com deslocações obrigatórias a tribunal, acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4% ao ano, desde o dia 29-06-20227-e até efectivo e integral pagamento. * Custas pela seguradora - artigo 446.º/1 e 2 do Código de Processo Civil.Oportunamente, cumpra-se o disposto no artigo 76.º do Código de Processo do Trabalho e calcule-se o capital de remição, nos termos do disposto no artigo 149.º do mesmo diploma legal. Fixo o valor de processo em € 26 738,45 - artigo 120.º do Código de Processodo Trabalho. Registe e notifique. [..]». I.6 Inconformado com essa decisão, o Autor apresentou recurso de apelação, o qual foi admitido e fixados o modo de subida e efeito adequado. As alegações de recurso mostram-se sintetizadas nas conclusões seguintes: 1. O presente recurso escudar-se-á na questão de saber se o sinistrado se encontra, ou não, em situação de incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual (IPATH). 2. Situação que era já colocada em hipótese conforme teor das conclusões do exame pericial singular dos autos. 3. O sinistrado requereu que lhe fosse admitido exame por Junta Médica. Fundamentou-o, juntou quesitos e requereu, previamente à sua realização, a fim de que fossem cabalmente respondidos os referido quesitos, a realização dos seguintes exames periciais: a) ao Centro de Reabilitação ..., sito na Av. ..., ... ..., a elaboração de um estudo do posto de trabalho no sentido identificar a categoria profissional do sinistrado à data do acidente, a descrição das tarefas que lhe são adstritas e exigências específicas para a realização das tarefas que se enquadram na referida categoria, designadamente condições de execução do trabalho, exigências físicas (posição do trabalho, tipo e intensidade de esforço), exigências sensoriais, psico-motoras e mentais bem como, de acordo com as mesmas, constatar a (in)existência de IPATH e; b) ao Instituto do Emprego e Formação Profissional parecer sobre a efectiva possibilidade de reabilitação do sinistrado, tudo nos termos dos pontos 5.ºA, 10.º e 13.º das Instruções Gerais preambulares da TNI. 4. Juntou documento lavrado pela entidade patronal do sinistrado (conforme requerimento datado de 16/07/2022) que refere, com relevo, o seguinte: actualmente não exerce as funções de marceneiro que exercia anteriormente ao acidente de trabalho. 5. Contudo, a juiz a quo indeferiu a sua realização. 6. Apenas foi junto um inquérito profissional de penosa fundamentação, o que equivale à sua inexistência. 7. A Junta Médica que oportunamente se realizou, fixou o estado actual do sinistrado (exame objectivo e queixas) e a IPP atribuível, mas entendeu (maioritariamente) que para resposta dos quesitos c) a f) apresentados pelo sinistrado, acerca da situação de IPATH, devia ser realizada uma Junta Médica de Medicina do Trabalho. 8. Realizada a nova Junta Médica, veio a mesma responder, por unanimidade, aos quesitos apresentados e por responder da seguinte forma: Considera-se que o examinando se encontra capaz para o exercício da sua actividade profissional habitual (de marceneiro/entalhador) na proporção do valor de IPP proposto, considerando que está capaz para: executar tarefas de acabamento (ex: lixar, polir, colar, envernizar, pintar, encerar, lacar), deslocar peças de madeira e tábuas, operar máquinas comandadas/automatizadas (da sua área) evitando operar com tupias e serras eléctricas, consegue aparafusar e aplicar ferragens na proporção do valor de IPP proposto. 9. O sinistrado reagiu e pronunciou-se sobre o teor do exame por Junta Médica, conforme requerimento de 03/11/2022, que aqui sintetizamos, do seguinte modo: a) os Srs. Peritos confundem profissões! b) Porquanto identificam é a profissão de polidor e não a de marceneiro/entalhador. c) Os Srs. Peritos desconheciam a verdadeira essência da profissão de marceneiro/entalhador. Por outro lado, d) Os Srs. Peritos não possuíam informação relevante nos autos que os pudesse orientar quanto à profissão do sinistrado, evitando o erro em que incorreram. e) O sinistrado alegou que se achava incapaz para o exercício da sua profissão habitual. f) Secundou tal alegação com a junção de Declaração subscrita pela sua entidade patronal. g) O inquérito profissional junto aos autos pela entidade patronal e pela R. Seguradora é penosamente pouco aprofundado sendo que do mesmo muito pouco de relevante se retira. h) O sinistrado requereu que, previamente a JM a designar, fossem elaborados os pareceres/estudos, mormente o estudo do posto de trabalho. i) Foi indeferido. j) Acresce que os peritos que integraram as Junta Médicas também não os solicitaram. k) O marceneiro/entalhador é o que trabalha a arte de cortar ou entalhar a madeira, ou seja, é um verdadeiro escultor de madeiras. l) De acordo com o guia da Classificação Portuguesa das Profissões de 2010, emitido pelo INE, a profissão de marceneiro engloba, de forma sucinta, as seguintes áreas: a) Fabricar mobiliário e outros artigos de madeira a partir de modelos, desenhos, outras especificações técnicas ou da sua criação; b) Traçar linhas e pontos para realização da obra, dar forma, serrar, furar, respigar, tornear, moldar e entalhar; c) Armar provisoriamente componentes a fim de efectuar eventuais correcções; d) Montar e ligar definitivamente a obra; Executar grades e aplicar-lhes contraplacados, folheados faceados ou orlados; f) Efectuar acabamentos, afagando, raspando e passando lixa; g) Efectuar manutenção, afiar e afinar ferramentas e equipamentos que utiliza. m) Por seu turno, o sinistrado, além de marceneiro, é-o nomeadamente na subcategoria de entalhador, ou seja, artesão de artigos de madeira, que na referida Classificação assim se refere às áreas de trabalho: a) Executar obra a partir de modelos, fotografias, desenhos ou de acordo com a sua criatividade; b) Escolher e preparar bloco de madeira nas dimensões e qualidade requeridas, face ao trabalho a realizar; c) Traçar contornos da figura a obter e desbastá-la; d) Esculpir figuras e modelos florais e artísticos em madeira, para fins decorativos; e) Efectuar acabamentos necessários e alisar as superfícies. n) Acresce que, neste quadrante, o entalhador opera de forma profundamente manual, sendo que para esculpir vai usando formões para cortes rectos (também conhecidos por cinzel) e para cortes curvos (também conhecidos por goivas), de vários tamanhos e medidas. o) Ou seja, opera com necessário recurso de ambas as mãos. p) In casu, sendo o sinistrado dextro, o entalhador opera normalmente da seguinte forma: com a mão esquerda segura no punho do formão e com a mão direita, ou com uso de martelo de madeira, faz o corte pretendido na madeira. q) Tal operação pode obrigar a mudar os formões de mãos (ou seja, segurar com a mão direita e fazer uso da mão esquerda para o corte pretendido), o que sucede variadíssimas vezes, nomeadamente para fazer de cortes de curvas contrárias à sua lateralidade. Ora, r) Considerando as sequelas do sinistrado, mais dificilmente se compreende como é que as dificuldades ao nível do membro superior esquerdo afectado, ou seja da mão esquerda (com perda de pinça de polegar e em gancho, conforme resulta do auto de exame por Junta Médica por ortopedia) não prejudique o verdadeiro âmago da sua profissão. s) Porquanto a mão esquerda, para o efeito, tornou-se praticamente afuncional ou com muito pouca serventia. t) Todo este circunstancialismo que contende com a natureza das funções próprias do trabalhador, conjugadas com a idade do sinistrado, permite-nos concluir que não só que o sinistrado está afectado de IPATH, como também nos permite concluir que a junta médica teve uma visão generalista, redutora, errada quanto à profissão e não teve em consideração que a incapacidade de que o sinistrado ficou portador não lhe permite realizar o núcleo essencial das funções da sua profissão, conforme resulta manifesto das sequelas visíveis. u) Não dispõe nem foram solicitados posteriormente pela JM, quando esta, face à evidente falta de conhecimento da profissão, deveria tê-lo feito. v) Nessa medida, requer-se a anulação da Junta Médica ora realizada, a determinação da realização dos estudos/pareceres solicitados supra em 11.º e solicitados oportunamente com o seu requerimento anterior e designar nova Junta Médica, com peritos distintos atenta a falta de conhecimento dos mesmos tendo em conta a profissão do sinistrado, para responder, justificada e cabalmente, aos quesitos apresentados bem assim a outros que, posteriormente, possam advir como fundamentais para a compreensão do objecto do litígio. 10. O sinistrado fundamentou as razões da discordância relativamente ao mais do que deficiente exame por Junta Médica, no que concerne ao erro quanto à verdadeira profissão do sinistrado bem como às limitadas respostas e mal fundamentadas em relação à concreta profissão do mesmo. Ou seja, invocou a nulidade do exame. 11. Daí que requeresse a sua anulação, a determinação da realização dos estudos solicitados a fim de se realizar nova Junta Médica. 12. Mas, debalde, com a juiz a quo a indeferir o requerido por entender por legalmente inadmissível do requerido pelo sinistrado e a argumentar o esgotamento do poder jurisdicional no que concerne aos estudos previamente solicitados. 13. Estando em causa saber se a incapacidade do sinistrado é uma incapacidade para o trabalho habitual, importaria que tais respostas se reportassem à actividade concreta desempenhada pelo sinistrado no exercício da sua profissão de marceneiro/entalhador, o que efectivamente não aconteceu. Na verdade, estando o sinistrado afetado de uma incapacidade de quase 30% não se compreende como poderá o sinistrado desempenhar tarefas que exigem grandes esforços e minúcia dos membros inferiores. 14. Por essa razão, ou seja, por o sinistrado ter ficada desprovida dessas qualidades, tal como se acha implícito nas Respostas dadas aos quesitos formulados à Junta Médica, deixou de executar tal profissão. 15. Não foi, por isso, reconvertido. 16. O que implica errada apreciação da decisão proferida em sede de matéria de facto, porquanto aderiu, acriticamente, à posição da JM, de forma seguidista. 17. Mas, importa também referi-lo, no que se reporta à determinação da existência ou não de IPATH, definidas e enquadradas que sejam, na TNI, as lesões que o sinistrado apresente (esta a questão de cariz essencialmente técnico/médico), o juízo a fazer quanto a saber se as mesmas determinam ou não incapacidade absoluta para o trabalho habitual passa, também pela apreciação de diversos outros aspetos, como o tipo de tarefas concretas que a profissão do sinistrado envolve, conjugado, se for o caso, com as regras do conhecimento e experiência comuns, o que extravasa um juízo puramente técnico-científico. 18. É certo que não se mostrando junto o inquérito profissional e o estudo do posto de trabalho, a que se reportam as alíneas a) e b) do n.º 13 das Instruções gerais da Tabela nacional de incapacidades, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 352/2007, de 23 de outubro, não dispunham os Srs. Peritos Médicos dos elementos de cariz profissional do sinistrado. 19. De qualquer modo, o exame por junta médica, é deficiente pois a sua fundamentação não contemplou os aspectos profissionais e do posto de trabalho do sinistrado (antes se quedando em responder à profissão de polidor), mas apenas as suas lesões e enquadramento na tabela, quando todos os aspetos da situação do sinistrado deveriam ter sido levados em conta no respectivo exame. 20. Tal significa que é deficiente a matéria de facto, dada a falta de fundamentação do exame por junta médica, o que impõe a sua repetição. 21. Assim, sendo deficiente o referido exame e dado o disposto no art.º 712.º, n.º 4 do Cód. Proc. Civil, deverá o processado ser anulado desde a última Junta Médica, a qual deverá ser repetida, seguindo-se depois a normal tramitação legal, devendo o Tribunal a quo, previamente, diligenciar pelo cumprimento do disposto nas alíneas a) e b) do n.º 13 das Instruções gerais da Tabela nacional de incapacidades, como acima se referiu, ou seja, solicitar os exames/estudos que o sinistrado previamente solicitou à realização da Junta Médica ora em crise. 22. Vide, este propósito, o Ac. da Relação do Porto, processo n.º 261/10.7TTMAI.P1, datado de 27/02/2012, consultável in www.dgsi.pt, com o seguinte sumário: I – No exame por junta médica, estando em causa saber se a incapacidade do sinistrado é uma incapacidade para o trabalho habitual, importa que as respostas aos quesitos se reportem à atividade concreta por ele desempenhada, no exercício da sua profissão. II – Não se mostrando junto o inquérito profissional e o estudo do posto de trabalho, a que se reportam as alíneas a) e b) do n.º 13 das Instruções gerais da Tabela nacional de incapacidades, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 352/2007, de 23 de outubro, não dispunham os Srs. Peritos Médicos dos elementos de cariz profissional. III – O exame por junta médica é deficiente se a sua fundamentação não contemplar os aspetos profissionais e do posto de trabalho do sinistrado, mas apenas as suas lesões e enquadramento na tabela, quando todos os aspetos da situação do sinistrado devem ser levados em conta, em tal perícia. 23. A douta sentença, directa ou indirectamente violou, entre outras, as disposições legais, o que preceituam o art. 106º. do CPT, o art. 586º. do CPC, o ponto 5.º-A das Instruções Gerais da Tabela Nacional de Incapacidades e, acima de tudo, o art. 389º. do CC. Termos em que se requer a V.ªs Ex.ªs se dignem julgar procedente por provado o presente recurso e, consequentemente, anular a sentença e dado o disposto no art.º 712.º, n.º 4 do Cód. Proc. Civil, anular o processado desde a última Junta Médica, a qual deverá ser repetida, seguindo-se depois a normal tramitação legal, devendo o Tribunal a quo, previamente, diligenciar pelo cumprimento do disposto nas alíneas a) e b) do n.º 13 das Instruções gerais da Tabela nacional de incapacidades, como acima se referiu, ou seja, solicitar os exames/estudos que o sinistrado previamente solicitou à realização da Junta Médica ora em crise, no que confia o humilde recorrente. I.7 A Ré seguradora não apresentou contra-alegações. I.8 O Digno Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal de recurso emitiu o parecer a que alude o art.º 87.º3, do CPT, pronunciando-se, no essencial, como segue: -«[..] Impugna a Recorrente a sentença quanto à atribuição e grau de IPP. 4. No caso presente, os Srs. Peritos médicos, na junta médica genérica e na junta de medicina do trabalho realizada, fixaram, por unanimidade, uma IPP 29,3424% de IPP, sem IPATH, desde 09 de Novembro de 2021. Embora a junta médica se tenha referido às tarefas especificas do sinistrado, entende este que se confundiram as funções próprias da sua profissão. Assim, pretende o Recorrente anular o processado desde a última Junta Médica, a qual deverá ser repetida, seguindo-se depois a normal tramitação legal, devendo o Tribunal a quo, previamente, diligenciar pelo cumprimento do disposto nas alíneas a) e b) do n.º 13 das Instruções gerais da Tabela nacional de incapacidades, como acima se referiu, ou seja, solicitar os exames/estudos que o sinistrado previamente solicitou à realização da Junta Médica ora em crise. Dispõe a Instrução 13 da TNI que, “A fim de permitir o maior rigor na avaliação das incapacidades resultantes de acidente de trabalho e doença profissional, a garantia dos direitos das vítimas e a apreciação jurisdicional, o processo constituído para esse efeito deve conter obrigatoriamente os seguintes elementos: a) Inquérito profissional, nomeadamente para efeito de história profissional; b) Análise do posto de trabalho, com caracterização dos riscos profissionais e sua quantificação, sempre que tecnicamente possível (para concretizar e quantificar o agente causal de AT ou DP); Embora possam não alterar a decisão das juntas médicas, não tendo sido juntos ao processo estes elementos, que obrigatoriamente devia conter, deveriam ser agora solicitados. Com efeito, como decidido no Ac. da Relação do Porto, processo n.º 261/10.7TTMAI.P1, datado de 27/02/2012, citado, consultável in www.dgsi.pt, “No exame por junta médica, estando em causa saber se a incapacidade do sinistrado é uma incapacidade para o trabalho habitual, importa que as respostas aos quesitos se reportem à atividade concreta por ele desempenhada, no exercício da sua profissão. Não se mostrando junto o inquérito profissional e o estudo do posto de trabalho, a que se reportam as alíneas a) e b) do n.º 13 das Instruções gerais da Tabela nacional de incapacidades, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 352/2007, de 23 de outubro, não dispunham os Srs. Peritos Médicos dos elementos de cariz profissional. O exame por junta médica é deficiente se a sua fundamentação não contemplar os aspetos profissionais e do posto de trabalho do sinistrado, mas apenas as suas lesões e enquadramento na tabela, quando todos os aspetos da situação do sinistrado devem ser levados em conta, em tal perícia.” Assim, admitindo que, a falta destes elementos, possa constituir uma limitação do direito do recorrente/sinistrado em avaliar completamente a sua incapacidade, deverão agora ser pedidos e levados em conta na avaliação e determinação do grau de incapacidade do recorrente. 5. Nestes termos, ressalvando sempre diferente e melhor opinião, emite-se parecer no sentido de ser concedido provimento ao recurso». I.9 Na sequência da notificação desse parecer às partes, veio a seguradora, através dos seus serviços, em 24-05-2023, dirigir ao processo um e-mail e, em anexo ao mesmo, juntar o inquérito profissional e estudo do posto de trabalho relativamente ao sinistrado. Refere, no e-mail vir “em cumprimento de notificação de fls…, juntar aos autos Inquérito Profissional do sinistrado AA”. Apreciando esse requerimento, pelo relator foi proferido despacho não admitindo a junção do aludido documento. Na fundamentação, refere-se, no que agora interessa, o seguinte: -«[..] Sucede, que os elementos em causa já se encontram juntos aos autos desde 3-10-2022, data em que foram apresentados pela seguradora, também por anexo a um e-mail. Embora não seja questão que agora releve, é de referir que nessa mesma data o ilustre mandatário foi notificado da junção desses documentos. [..]”. I.10 Foram colhidos os vistos legais e determinou-se que o processo fosse inscrito para ser submetido a julgamento em conferência. I.11 Delimitação do objecto do recurso Sendo o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das alegações apresentadas, salvo questões do conhecimento oficioso [artigos 87.º do Código do Processo do Trabalho e artigos 639.º, 635.º n.º 4 e 608.º n.º2, do CPC, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho], a questão colocada para apreciação consiste em saber se este Tribunal de recurso deve “anular a sentença e dado o disposto no art.º 712.º, n.º 4 do Cód. Proc. Civil, anular o processado desde a última Junta Médica, a qual deverá ser repetida, seguindo-se depois a normal tramitação legal, devendo o Tribunal a quo, previamente, diligenciar pelo cumprimento do disposto nas alíneas a) e b) do n.º 13 das Instruções gerais da Tabela nacional de incapacidades, como acima se referiu, ou seja, solicitar os exames/estudos que o sinistrado previamente solicitou à realização da Junta Médica ora em crise, no que confia o humilde recorrente”. II. FUNDAMENTAÇÃO II.1. MOTIVAÇÃO DE FACTO A matéria de facto com relevo para a apreciação do recurso é a que resulta do relatório. II.2 MOTIVAÇÃO DE DIREITO O recorrente defende que a sentença “directa ou indirectamente violou, entre outras, as disposições legais, o que preceituam o art. 106º. do CPT , o art. 586º. do CPC, o ponto 5.º-A das Instruções Gerais da Tabela Nacional de Incapacidades e, acima de tudo, o art. 389º. do CC.”, para pedir seja anulada “a sentença e dado o disposto no art.º 712.º, n.º 4 do Cód. Proc. Civil, anular o processado desde a última Junta Médica, a qual deverá ser repetida, seguindo-se depois a normal tramitação legal, devendo o Tribunal a quo, previamente, diligenciar pelo cumprimento do disposto nas alíneas a) e b) do n.º 13 das Instruções gerais da Tabela nacional de incapacidades, como acima se referiu, ou seja, solicitar os exames/estudos que o sinistrado previamente solicitou à realização da Junta Médica ora em crise, no que confia o humilde recorrente” Sustenta, no essencial, o seguinte: - Requereu, previamente realização do exame por junta médica, a fim de que fossem cabalmente respondidos os quesitos que apresentou, a realização pelo Centro de Reabilitação ..., de um estudo do posto de trabalho no sentido identificar a categoria profissional do sinistrado à data do acidente, a descrição das tarefas que lhe são adstritas e exigências específicas para a realização das tarefas que se enquadram na referida categoria; e, ao Instituto do Emprego e Formação Profissional parecer sobre a efectiva possibilidade de reabilitação do sinistrado, tudo nos termos dos pontos 5.ºA, 10.º e 13.º das Instruções Gerais preambulares da TNI. - Contudo, a juiz a quo indeferiu a sua realização. - Apenas foi junto um inquérito profissional de penosa fundamentação, o que equivale à sua inexistência. - O sinistrado reagiu e pronunciou-se sobre o teor do exame por Junta Médica da especialidade de Medicina no Trabalho, conforme requerimento de 03/11/2022, com os fundamentos aí constantes – que transcreve – requerendo a anulação da junta médica, a determinação da realização dos estudos/pareceres solicitados oportunamente com o seu requerimento anterior e que fosse designada nova Junta Médica, com peritos distintos atenta a falta de conhecimento dos mesmos tendo em conta a profissão do sinistrado para responder, justificada e cabalmente, aos quesitos apresentados. - A juiz a quo indeferiu o requerido por o entender legalmente inadmissível e argumentou o esgotamento do poder jurisdicional no que concerne aos estudos previamente solicitados. - Tal como se acha implícito nas Respostas dadas aos quesitos formulados à Junta Médica, o sinistrado deixou de executar tal profissão, o que implica errada apreciação da decisão proferida em sede de matéria de facto, porquanto aderiu, acriticamente, à posição da JM. - Não se mostrando junto o inquérito profissional e o estudo do posto de trabalho, a que se reportam as alíneas a) e b) do n.º 13 das Instruções gerais da Tabela nacional de incapacidades, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 352/2007, de 23 de outubro, não dispunham os Srs. Peritos Médicos dos elementos de cariz profissional do sinistrado. - O exame por junta médica, é deficiente pois a sua fundamentação não contemplou os aspectos profissionais e do posto de trabalho do sinistrado (antes se quedando em responder à profissão de polidor), mas apenas as suas lesões e enquadramento na tabela. II.2.1 Passando à apreciação, começaremos por atentar no requerimento apresentado pelo sinistrado, nos termos do art.º 138.º 1 e 2, do CPT, com vista a ser submetido a exame por junta médica, formulando quesitos e requerendo a realização de um estudo do posto de trabalho pelo Centro de Reabilitação ... e que fosse solicitado parecer ao Instituto do Emprego e Formação Profissional sobre a efectiva possibilidade da sua reabilitação profissional. Alega o recorrente, em termos que traduzem uma manifestação de discordância e a afirmação de um argumento para sustentar a pretensão do recurso, que a Senhora juiz a quo indeferiu a requerida realização de um estudo do posto de trabalho pelo Centro de Reabilitação ... e a solicitação do parecer ao Instituto do Emprego e Formação. Sucede, porém, que essa alegação não lhe pode aproveitar, muito menos como argumento para fundamentar o recurso. Esse requerimento que o sinistrado formulou respeitou a meios de prova e, logo, se porventura discordou daquela decisão que os indeferiu, então cumpria ao sinistrado interpor recurso autónomo, no prazo legal, nos termos previstos no art.º 79.º A, n.º1, al. d), do CPT, normas que acolhem o regime consagrado no art.º 644.º, n.º 2, al d), do CPC. Como não o fez, a decisão transitou em julgado e, logo, está vedado a este Tribunal ad quem debruçar-se sobre ela para aquilatar se foi, ou não acertada. Daí que, como se disse, não tenha aqui relevo a alegação em apreço. II.2.2 Em seguida refere o recorrente sinistrado que o inquérito profissional junto aos autos pela Ré seguradora, tem uma “penosa fundamentação, o que equivale à sua inexistência”. Como se percebe, esta alegação pretende constituir mais um argumento para pôr em causa o laudo da junta médica de especialidade e o seu acolhimento pelo Tribunal a quo, nomeadamente, como acima enunciamos, que “Não se mostrando junto o inquérito profissional e o estudo do posto de trabalho, a que se reportam as alíneas a) e b) do n.º 13 das Instruções gerais da Tabela nacional de incapacidades, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 352/2007, de 23 de outubro, não dispunham os Srs. Peritos Médicos dos elementos de cariz profissional do sinistrado”. Pois bem, repondo o rigor das coisas, a Ré seguradora juntou aos autos, em 24-05-2023, o inquérito profissional e estudo do posto de trabalho, relativamente ao sinistrado autor. Sublinha-se que essa junção foi efectuada antes da realização do exame por junta médica da especialidade de medicina no trabalho, bem assim que da mesma foi devidamente notificado o sinistrado, através do seu ilustre mandatário. O documento está datado de 10-12-2021 e assinado pelo representante legal da entidade empregadora – BB -, ao serviço de quem o sinistrado sofreu o acidente de trabalho. Este documento é o que se encontra previsto no n.º 13, das instruções gerais da TNI - DL n.º 352/2007, de 23 de Outubro – cujo teor, na parte que aqui interessa, é o seguinte: -«13 - A fim de permitir o maior rigor na avaliação das incapacidades resultantes de acidente de trabalho e doença profissional, a garantia dos direitos das vítimas e a apreciação jurisdicional, o processo constituído para esse efeito deve conter obrigatoriamente os seguintes elementos: a) Inquérito profissional, nomeadamente para efeito de história profissional; b) Análise do posto de trabalho, com caracterização dos riscos profissionais e sua quantificação, sempre que tecnicamente possível (para concretizar e quantificar o agente causal de AT ou DP); c) … d)..». O documento em causa obedece a um formulário próprio e decompõe-se em duas partes: Inquérito Profissional; e, Estudo do Posto de Trabalho. Resulta do documento junto, no que aqui interessa, o seguinte: o sinistrado autor tem a profissão habitual de marceneiro, que era a excutada à data do sinistro; utiliza como instrumentos de trabalho “máquinas fixas” diversas e “máquinas móveis” diversas; utiliza diversas ferramentas manuais e eléctricas; como matérias/ materiais utilizados no trabalho, são indicados “Madeira, aglomerados, cola, parafusos, ferragens diversas, entre outras”. Como se disse, o notificado o sinistrado, através do seu ilustre mandatário, foi notificado da junção do documento. Ora, não resulta dos autos que tenha suscitado qualquer questão relativamente ao documento e respectivo conteúdo, mal se percebendo que venha agora imputar-lhe uma “penosa fundamentação, o que equivale à sua inexistência”, muito menos que venha defender, fazendo tábua rasa do mesmo, que “não se mostrando junto o inquérito profissional e o estudo do posto de trabalho, a que se reportam as alíneas a) e b) do n.º 13 das Instruções gerais da Tabela nacional de incapacidades, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 352/2007, de 23 de outubro, não dispunham os Srs. Peritos Médicos dos elementos de cariz profissional do sinistrado”. Por conseguinte, também este argumento é destituído de fundamento e, mais do que isso, de invocação extemporânea e descabida. II.2.3 Avançando para o argumento seguinte, o sinistrado insurge-se contra a decisão que indeferiu o seu pedido de anulação da Junta médica da especialidade de Medicina no Trabalho, pedindo a realização de novo exame por junta médica “com peritos distintos atenta a falta de conhecimento“ dos que realizaram aquela junta, bem assim que fosse determinada a realização dos estudos/pareceres que já solicitara com o requerimento anterior. Como se retira da decisão a quo entendeu “que a junta médica não padece de quaisquer vícios processuais ou procedimentais”; aderindo ao entendimento afirmado no acórdão de TRG de 19-01-2017, que cita, não ser admissível a realização de uma segunda perícia médica por junta, no âmbito do processo emergente de acidente de trabalho; e, “Quanto ao seu requerimento no sentido de ser ordenada pelo Tribunal a realização de estudos/pareceres, o mesmo foi já apreciado por nós em 7/9/2022, tendo-se esgotado o nosso poder jurisdicional quanto a tal matéria”. No presente recurso é permitido ao recorrente que use como fundamento e, logo, que se insurja, contra a decisão que indeferiu a arguição da nulidade, no qual pretendia, em consequência do reconhecimento da mesma, ver satisfeitas aquelas pretensões. Refere o recorrente, para expressar a sua discordância [12]. “Mas, debalde, com a juiz a quo a indeferir o requerido por entender por legalmente inadmissível do requerido pelo sinistrado e a argumentar o esgotamento do poder jurisdicional no que concerne aos estudos previamente solicitados”. Nada mais se encontra, desde logo nas conclusões, mas também nas alegações, que se configure com um argumento jurídico para por em causa o decidido e evidenciar o erro na aplicação do direito. Como já afirmámos em casos similares, o direito ao recurso o direito ao recurso não visa conceder à parte um segundo julgamento da causa, mas apenas permitir a discussão sobre determinados pontos concretos, que na perspectiva do recorrente foram incorrectamente mal julgados, para tanto sendo necessário que se enunciem os fundamentos que sustentam esse entendimento, devendo os mesmos consistir na enunciação de verdadeiras questões de direito, as quais lhe compete indicar e sustentar, cujas respostas sejam susceptíveis de conduzir à alteração da decisão recorrida [Cfr, Ac. de 26-06-2023, proc.º 20081/21.2T8PRT.P1, disponível em www.dgsi.pt]. Em poucas palavras, o recorrente deve expor ao tribunal ad quem as razões da sua discordância, procurando convencer da sua pertinência, a fim de que este tribunal se debruce sobre elas e decida se procedem ou não. No mesmo sentido, no acórdão desta Relação e Secção de 17-01-2022 [Proc.º 2157/17.2T8MTS.P1, Desembargador Nelson Fernandes, disponível em www.dgsi.pt] afirma-se o que segue: «III - Impende sobre o recorrente, em sede de recurso, o ónus de invocar, também no domínio da aplicação da lei, os argumentos (jurídicos) que na sua ótica justificam o afastamento dos fundamentos constantes da decisão recorrida para sustentar o modo como interpretou e/ou aplicou a lei, de tal modo que o tribunal superior os possa apreciar, no sentido de lhes dar ou não sustentação – versando o recurso sobre matéria de direito, deve o Recorrente, para além de indicar nas conclusões as normas jurídicas violadas, referir também o sentido que, no seu entender, as normas que constituem o fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas (artigo 639.º, n.º 2, do CPC)”. Em poucas palavras, o recorrente deve expor ao tribunal ad quem as razões da sua discordância, sustentadas em argumentos jurídicos, procurando convencer da sua pertinência, a fim de que este tribunal se debruce sobre elas e decida se procedem ou não. Ora, como resulta do que acima se disse e ressalta à evidência das conclusões, o recorrente limita-se a transcrever o requerimento que foi indeferido e a expressar a sua discordância com o decidido, quando lhe competia evidenciar, com argumentação jurídica, que o Tribunal a quo decidiu mal e, contrariamente ao que fundamentou a decisão, a lei processual aplicável no caso concreto possibilita novo exame por junta médica “com peritos distintos atenta a falta de conhecimento“ dos que realizaram o exame por junta médica posto, bem assim que não se esgotara o poder jurisdicional para ser reapreciado e decidido o pedido de realização dos estudos/pareceres que já solicitara em requerimento anterior e vira indeferidos. Assim sendo, resta concluir pela improcedência desta parte do recurso. II.2.4 Por último [conclusões 13 e segs], alega o recorrente que o exame por junta médica, é deficiente pois a sua fundamentação não contemplou os aspectos profissionais e do posto de trabalho do sinistrado (antes se quedando em responder à profissão de polidor), mas apenas as suas lesões e enquadramento na tabela. Refere antes, que “Estando em causa saber se a incapacidade do sinistrado é uma incapacidade para o trabalho habitual, importaria que tais respostas se reportassem à actividade concreta desempenhada pelo sinistrado no exercício da sua profissão de marceneiro/entalhador, o que efectivamente não aconteceu” Defende que “Tal significa que é deficiente a matéria de facto, dada a falta de fundamentação do exame por junta médica, o que impõe a sua repetição” e, conclui que “sendo deficiente o referido exame e dado o disposto no art.º 712.º, n.º 4 do Cód. Proc. Civil, deverá o processado ser anulado desde a última Junta Médica, a qual deverá ser repetida, seguindo-se depois a normal tramitação legal, devendo o Tribunal a quo[..]». Para a apreciação desta argumentação importa começarmos por atentar nos quesitos que o sinistrado apresentou para serem respondidos pelos senhores peritos médicos, que são os seguintes: a) Quais as lesões resultantes do acidente e sofridas pelo sinistrado? b) Quais as sequelas resultantes do acidente? c) Está o sinistrado incapaz para o exercício da sua profissão habitual? Caso a resposta seja Não, d) Está o sinistrado capaz de exercer a função de marceneiro, conforme 6.º a 15.º supra, atendendo às sequelas com que ficou na sua mão esquerda? e) Está o sinistrado capaz de exercer estas funções somente com a sua mão direita, atendendo às graves sequelas da mão esquerda? f) Caso entendam que sim, justifiquem? g) Beneficia o sinistrado do factor de bonificação de 1,5, nos termos do ponto 5 das Instruções Gerais preambulares da TNI? h) Qual o valor da IPP de que o sinistrado se encontra afectado? Cabe ainda dar nota do teor dos artigos 6.º a 15.º da fundamentação que precedeu os quesitos, para onde remete o quesito sob a alínea d), ai tendo o sinistrado alegado o seguinte: «6. A sua categoria profissional de marceneiro obriga-o a ter agilidade, firmeza, destreza, rapidez e segurança de movimentos, de onde resulta a essencialidade da parte afectada. 7. Na realidade, tais funções afiguram-se, de um modo geral, em executar trabalhos em madeira, nomeadamente para a execução de móveis. 8. O marceneiro é o profissional que executa trabalhos em madeira para a confecção de móveis ou de outros produtos elaborados. É, acima de tudo, um artesão. 9. Por isso, trata-se de uma profissão que requer atenção ao detalhe, gosto pelo perfeccionismo e muita paciência. 10. O trabalho de marceneiro é, acima de tudo, uma arte. Por isso, exige um verdadeiro gosto pelo trabalho com a madeira, além de ser necessário ter talento para essa função, profundamente manual. 11. No domínio do mobiliário, podem fazer, montar ou transformar móveis, bem como outras peças de mobiliário, designadamente para decoração. 12. Um marceneiro também é responsável pela escolha das madeiras e demais matéria-prima a utilizar. 13. A profissão requer ainda apetência para efectuar acabamentos e revestimentos. 14. Contudo, desde que teve o acidente, o sinistrado deixou de executar todos estes trabalhos que representam o núcleo duro da sua actividade. 15. Antes se quedando pelo único acto de lixar os móveis e com recurso ao seu outro membro superior, como, aliás, resulta do vertido no relatório do IML». Percorrendo os quesitos, bem assim os artigos 6 a 15 que os precederam na fundamentação do requerimento apresentado pelo A. para ser submetido a exame médico, constata-se que em parte alguma referiu que exerce a actividade profissional de “marceneiro/entalhador”, sempre se referindo à profissão de marceneiro, definindo-a como “o profissional que executa trabalhos em madeira para a confecção de móveis ou de outros produtos elaborados” e enunciando as tarefas características caracterizadores referindo que “podem fazer, montar ou transformar móveis, bem como outras peças de mobiliário, designadamente para decoração”, “é responsável pela escolha das madeiras e demais matéria-prima a utilizar” e que “A profissão requer ainda apetência para efectuar acabamentos e revestimentos”. Faz-se notar que a alegação dos artigos 6.º a 15.º, não diverge com o que consta do Inquérito Profissional e da Análise do Posto de Trabalho, de onde se retira, como ficou já dito, que o sinistrado autor tem a profissão habitual de marceneiro, que era a executada à data do sinistro; utiliza como instrumentos de trabalho “máquinas fixas” diversas e “máquinas móveis” diversas; utiliza diversas ferramentas manuais e eléctricas; como matérias/ materiais utilizados no trabalho, são indicados “Madeira, aglomerados, cola, parafusos, ferragens diversas, entre outras”. Mais, sublinha-se, ainda, que em parte alguma deste requerimento, bem como dos respectivos quesitos c), d), e) e f), o sinistrado alegou, como depois veio a fazer no requerimento em que pediu a anulação do exame por junta médica da especialidade de Medicina no Trabalho - transcrito nas conclusões deste recurso – que “O marceneiro/entalhador é o que trabalha a arte de cortar ou entalhar a madeira, ou seja, é um verdadeiro escultor de madeiras” e que “o sinistrado, além de marceneiro, é-o nomeadamente na subcategoria de entalhador, ou seja, artesão de artigos de madeira”. Feita esta nota, os quesitos que foram submetidos aos senhores peritos médicos na junta da especialidade de Medicina no Trabalho, que complementou o exame médico por junta por indicação da maioria dos peritos que compunham este, referindo que «[..] para dar resposta a estas questões os peritos são de opinião que deve ser realizada Junta Médica de Medicina no Trabalho, considerando-se que este tipo de avaliação, sempre em contexto médico, é a que mais satisfaz o que é questionado, sendo o formato mais adequado para dar resposta ao indicado nas alíneas c), d), e) e f)», são os seguintes: c) Está o sinistrado incapaz para o exercício da sua profissão habitual? Caso a resposta seja Não, d) Está o sinistrado capaz de exercer a função de marceneiro, conforme 6.º a 15.º supra, atendendo às sequelas com que ficou na sua mão esquerda? e) Está o sinistrado capaz de exercer estas funções somente com a sua mão direita, atendendo às graves sequelas da mão esquerda? f) Caso entendam que sim, justifiquem? Responderam os senhores peritos médicos, por unanimidade, o que segue: -«c), d), e) e f) Considera-se que o examinado se encontra capaz para o exercício da sua actividade profissional habitual na proporção do valor da IPP proposto, considerando-se designadamente que está capaz para: executar tarefas de acabamento (Ex. lixar, polir, colar, envernizar, pintar, encerar, lacar), deslocar peças de madeira e tábuas, operar máquinas, comandadas/automatizadas (da sua área) evitando operar com tupias e serras elétricas, consegue aparafusar e aplicar ferragens na proporção do valor de IPP proposto». Salvo o devido respeito, não tem razão o sinistrado quando afirma que o resultado do exame não é fundamentado, alegando que “importaria que tais respostas se reportassem à actividade concreta desempenhada pelo sinistrado no exercício da sua profissão de marceneiro/entalhador, o que efectivamente não aconteceu”. Os senhores peritos responderam com fundamentação suficiente aos quesitos que foram submetidos ao seu laudo pelo sinistrado, enquadrados pela alegação prévia que apresentou, onde jamais disse desempenhar profissão de marceneiro/entalhador. Acresce relembrar, que o exame por junta médica é realizado com observação directa do sinistrado, como o foi no caso concreto, pelo que seguramente os Senhores peritos ouviram as suas queixas relativas às dificuldades no exercício da sua actividade profissional e este teve oportunidade de se pronunciar. O exame por junta médica inscreve-se no âmbito da denominada prova pericial, regendo-se para além do disposto naquela norma, também pelas que no Código de Processo Civil disciplinam este meio de prova (artigos 467.º e seguintes do CPC). A prova pericial tem por objecto, conforme estatuído no art.º 388.º do CC “(..) a percepção ou apreciação de factos por meio de peritos, quando sejam necessário conhecimentos especiais que os julgadores não possuem” ou quando os factos “relativos a pessoas, não devam ser objecto de inspecção judicial”. Recorrendo à lição do Professor Alberto dos Reis, elucida este que “O verdadeiro papel do perito é captar e recolher o facto para o apreciar como técnico, para emitir sobre ele o juízo de valor que a sua cultura especial e a sua experiência qualificada lhe ditarem” [Código do Processo Civil Anotado Vol. IV, Coimbra Editora, Reimpressão, 1987, pp. 171]. A sua função é a de “auxiliar do tribunal no julgamento da causa, facilitando a aplicação do direito aos factos”, não impedindo tal que seja “um agente de prova e que a perícia constitua um verdadeiro meio de prova” [Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 2.ª Edição, Coimbra Editora, 1985, pp. 578]. Por conseguinte, as respostas aos quesitos dos Senhores peritos médicos e a respectiva fundamentação, são a expressão necessária da sua intervenção nesse meio de prova, isto é, o resultado da avaliação feita com base nos seus especiais conhecimentos médico-científicos, exigindo-se, para que cumpram o seu propósito, que sejam claras, suficientes e lógicas. Justamente por isso, importa não esquecer, o n.º8, do Anexo I, da TNI, estabelece o seguinte: “O resultado dos exames é expresso em ficha apropriada, devendo os peritos fundamentar todas as suas conclusões”. Pese embora a função preponderante deste meio de prova, tal não significa que o julgador esteja vinculado ao parecer dos senhores peritos, já que o princípio da livre apreciação da prova permite-lhe que se desvie do parecer daqueles, seja ele maioritário ou unânime. Como a esse propósito elucida o Professor Alberto dos Reis, “(..) É dever do juiz tomar em consideração o laudo dos peritos; mas é poder do juiz apreciar livremente esse laudo e portanto atribuir-lhe o valor que entenda dever dar-lhe em atenção à análise critica dele e à coordenação com as restantes provas produzidas. Pode realmente, num ou noutro caso concreto, o laudo dos peritos ser absorvente e decisivo (..); mas isso significa normalmente que as conclusões dos peritos se apresentam bem fundamentadas e não podem invocar-se contra elas quaisquer outras provas; pode significar, também que a questão de facto reveste feição essencialmente técnica, pelo que é perfeitamente compreensível que a prova pericial exerça influência dominante.” [Código do Processo Civil Anotado Vol. IV, Coimbra Editora, Reimpressão, 1987, pp. 185/186]. Porém, quer adira ou quer se desvie, para que decida de acordo com a sua livre convicção, em qualquer caso é sempre necessário que o Juiz conte com um resultado do exame pericial devidamente fundamentado, pois é a partir daí que se desenvolverá toda a apreciação com vista à formulação do juízo crítico subjacente à formação da convicção do julgador. Por outras palavras, o laudo, seja ele obtido por unanimidade dos peritos ou apenas por maioria, deve convencer pela sua fundamentação, pois só assim cumpre o propósito de facultar ao juiz os elementos necessários para fixar a natureza e o grau de incapacidade. Em suma, importa é que em face das questões que se colocam em cada caso concreto, o resultado do exame por junta médica se apresente perante o Juiz com a clareza necessária para o habilitar a decidir. No caso concreto, repete-se, os Senhores peritos responderam fundadamente aos quesitos que lhes foram apresentados e ao respectivo enquadramento. A discordância do sinistrado, não é suficiente para pôr em causa o exame por junta médica, imputando-lhe enfermar de falta de fundamentação e, por consequência, deficiência na fundamentação de facto na sentença. Assim sendo, não tem razão o sinistrado para sustentar que “sendo deficiente o referido exame e dado o disposto no art.º 712.º, n.º 4 do Cód. Proc. Civil [referindo-se certamente por lapso à norma do pretérito CPC, que actualmente tem correspondência no art.º 662., n.º2, al. c), do CPC/2013], deverá o processado ser anulado desde a última Junta Médica, a qual deverá ser repetida, seguindo-se depois a normal tramitação legal, devendo o Tribunal a quo”. Concluindo, improcede o recurso. III. DECISÃO Em face do exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar o recurso improcedente. Custas do recurso a cargo do recorrente, atento o decaimento (art.º 527.º do CPC) Porto, 18 de Setembro de 2023 Jerónimo Freitas Nelson Fernandes Rita Romeira |