Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
276/13.3TTSTS.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: JORGE LOUREIRO
Descritores: CONTRATO DE TRABALHO
DEVER DE RESPEITO
DEVER DE LEALDADE
LIBERDADE DE EXPRESSÃO
Nº do Documento: RP20160215276/13.3TTSTS.P1
Data do Acordão: 02/15/2016
Votação: UNANIMIDADE COM 1 DEC VOT
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL), (LIVRO DE REGISTOS N.º235, FLS.191-198)
Área Temática: .
Sumário: I - O direito à liberdade de expressão por parte dos trabalhadores não é absoluto, devendo harmonizar-se com o direito à honra e à imagem do empregador, estando consequentemente limitado pelo dever de respeito, de urbanidade e de probidade legalmente consagrados.
II - Os casos de colisão entre aqueles direitos fundamentais devem resolver-se nos termos gerais enunciados no art. 335º do CC, preferencialmente com a cedência recíproca e equilibrada dos direitos em confronto, ou, se tal não for possível, através da prevalência do direito que, em concreto, se considere superior, devendo levar-se em consideração nessa operação de confronto, entre outros, os seguintes elementos de facto: o contexto das declarações, a motivação ou finalidade das mesmas, o interesse geral dessas declarações, a sua publicação ou não nos meios de comunicação social, ser o autor das mesmas um trabalhador na base da hierarquia ou um trabalhador que desempenha um cargo de direcção, a relevância jurídica dos interesses que se visam proteger, o tipo de instrumentos utilizados e a sua proporcionalidade com a necessidade de tutela dos interesses em jogo, a veracidade dos factos veiculados, e o elemento subjectivo da conduta.
III - Em qualquer caso, não serão dignas de tutela jurídica, designadamente, as expressões qualificativas duras, exageradas e excessivas que se revelem desnecessárias/gratuitas, totalmente infundadas ou destituídas de base factual.
IV - Viola os deveres de respeito e de lealdade para com o empregador, a trabalhadora de uma unidade residencial para idosos que na presença de colgas de trabalho e de um terceiro, sem aparente justificação factual para o efeito, profere a expressão “Não recomendo o C… a ninguém”, pretendendo com isso reportar-se ao estabelecimento onde trabalhava, não podendo essa conduta da trabalhadora encontrar legitimação no seu direito à liberdade de expressão.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Apelação 276/13.3TTSTS.P1

Autora: B…
: C…

Relator: Jorge Manuel Loureiro
1º adjunto: Joaquim Jerónimo Freitas
2º adjunto: Eduardo Petersen Silva

Acordam no Tribunal da Relação do Porto

I - Relatório

A autora propôs contra a ré a presente acção declarativa com a forma de processo comum e emergente de contrato de trabalho pedindo que:
a) se anule a sanção disciplinar de suspensão do trabalho pelo período de 30 dias, com perda de retribuição e antiguidade, que lhe foi aplicada pela ré no âmbito de um processo disciplinar que lhe moveu, com a consequente condenação da ré a retirar tal sanção do livro de registo de sanções;
b) a ré seja condenada a pagar à autora a quantia ilíquida de 587€, a título de vencimento e diuturnidades que lhe foram indevidamente descontados no seu vencimento de Julho de 2012 por consequência da aplicação da referida sanção;
c) a ré seja condenada a pagar à autora a quantia de 5.870€, a título de indemnização pela aplicação abusiva da sanção supra referida;
d) a ré seja condenada a pagar à autora a quantia de 1.500€, a título de indemnização pelos danos morais que lhe causou com a aplicação da referida sanção;
e) a ré seja condenada a pagar à autora juros, à taxa legal, sobre as quantias anteriormente referidas, a contar da citação e até integral pagamento.
Como fundamento da sua pretensão, alegou, em resumo, que a ré lhe imputou falsamente a autoria de determinadas afirmações que estão identificadas na decisão disciplinar impugnada, sendo com esse fundamento factualmente falso que lhe aplicou uma sanção disciplinar de suspensão com perda de retribuição e antiguidade por 30 dias, o que lhe causou vexame e desgosto, bem como elevada preocupação e constrangimentos de ordem pessoal pela perda da retribuição decorrente daquela sanção.
A ré contestou invocando a prescrição do direito de impugnação da sanção disciplinar e sustentando a veracidade dos factos imputados à autora na decisão disciplinar, assim como a proporcionalidade da sanção disciplinar aplicada.
A autora apresentou resposta para, no essencial, pugnar pela improcedência da excepção de prescrição invocada na contestação.
Saneado o processo, com improcedência da aludida excepção de prescrição, fixação do objecto do litígio e dos temas de prova, e selecção dos factos assentes, realizou-se a audiência de discussão e julgamento, logo após o que foi proferida sentença que julgou improcedente a acção.
Inconformada com o assim decidido, apelou a autora, rematando as suas alegações com as conclusões seguidamente transcritas:
1ª- Vem o presente recurso interposto douta sentença de fls. …, que decidiu manter a sanção disciplinar aplicada pelo Recorrido à Recorrente, de 30 dias de suspensão ao trabalho, com perda de retribuição e antiguidade;
2ª- A referida sanção foi aplicada à Recorrente por, alegadamente, ter dito que “não recomendava o C… a ninguém” e que “lhe era indiferente que o C… fechasse ou não pois se este fechasse ia para o fundo de desemprego”;
3ª- A douta sentença recorrida considerou ter ficado provado que a Recorrente proferiu as palavras / frases acima referidas, primordialmente, com base no depoimento da testemunha D…, que qualificou de “mais relevante” e “pessoa estranha” ao Recorrido.
4ª- Resulta do depoimento da testemunha D… (registo áudio) 20150529153128_12498581_2871520) o seguinte:
a)- Em relação à frase: “não recomendava o C… a ninguém”) refere: “… eu não posso dizer com certeza que era ela …”. (Minuto 01:45 a 02:08).
b)- Em relação à frase: “lhe era indiferente que o C… fechasse ou não pois se este fechasse ia para o fundo de desemprego”) refere “… não sei se foi exactamente com essas palavras, …”. (Minuto 05:22 a 05:29).
c)- Em relação a considerar-se uma “pessoa estranha e distante da ré e de seu pessoal, que não conhecia nem conhece a autora”, a testemunha refere: “Estranha não.”. (Minuto 11:10 a 11:14).
5ª- Ou seja, a douta sentença considera “credível” e dá relevância ao depoimento desta testemunha, quando do mesmo resulta expressamente que, a referida D…, em momento algum atribui à Recorrente, de forma directa, objectiva e com razão de ciência, a autoria daquelas palavras / frases.
6ª- Ao fazê-lo, terá de se concluir que a douta sentença recorrida fez uma interpretação desajustada do depoimento da testemunha D…, infringindo dessa forma o disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea d) do C.P.C., o que constitui causa de nulidade.
7ª- Sem prescindir, a douta sentença recorrida considera ainda que as palavras / frases: “não recomendava o C… a ninguém” e que “lhe era indiferente que o C… fechasse ou não pois se este fechasse ia para o fundo de desemprego”, violam “o dever de respeito e lealdade para com, o empregador nos termos em que estes vêm previstos nas alíneas a) e f) do n.º 1 do art. 128.º do Código do Trabalho.”;
8ª- Todavia, analisando o teor das referidas alíneas a) e f) do citado normativo legal, não é legalmente aceitável considerar que aquelas palavras / frases em causa constituam infracção disciplinar e, muito menos, que justifiquem a «aplicação de uma sanção de 30 dias, com perda de retribuição e antiguidade.
9ª- De resto, ainda que tais palavras / frases tivessem sido proferidas pela Recorrente, as mesmas integram-se no seu direito a emitir opinião, desde logo face ao que dispõe o art. 14º do Código do Trabalho em vigor, sob o título “Liberdade de expressão e opinião”;
10ª- Proferir tais palavras não pode, pois, deixar de se enquadrar no legítimo direito que a Recorrente, e qualquer pessoa, tem em dar a sua opinião quando solicitado, como foi o caso;
11ª- Os juízos de valor que aquelas palavras / frases possam ter representado para o Recorrido, não têm a virtualidade de integrar um ilícito disciplinar, desde logo porque não ultrapassam a liberdade de emitir uma opinião, que tem por limite a calúnia que, como é bom de ver, no caso em apreço não existe.
12ª- Desse modo, ao manter a sanção disciplinar aplicada à Recorrente, de 30 (trinta) dias de suspensão, com perda de retribuição e antiguidade, com base na violação da legislação invocada na sua “Fundamentação de Direito”, a douta sentença infringe a Lei, considerando que não interpretou, nem aplicou, de forma correcta, adequada e justa o disposto nos artigos 14.º e 128.º, n.º 1, alíneas a) e f), ambos do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12/02, pelo que deve ser revogada.”.
Respondeu a recorrida, pugnando pela improcedência da apelação.
Nesta Relação, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta entendeu que o recurso não merece provimento (fls. 221 e 222).
*
II - Principais questões a decidir

Sendo pelas conclusões que se delimita o objecto do recurso (artigos 635º/4 e 639º/1/2 do Código de Processo Civil aprovado pela Lei 41/2013, de 26/6 – NCPC – aplicável “ex vi” do art. 87º/1 do Código de Processo do Trabalho – CPT), integrado também pelas que são de conhecimento oficioso e que ainda não tenham sido decididas com trânsito em julgado, são as seguintes as questões a decidir:
1ª) se a matéria de facto se encontra incorrectamente julgada, devendo ser alterada;
2ª) se assistia à ré fundamento para sancionar disciplinarmente a autora nos termos em que o fez.

III – Fundamentação

A) De facto

A.1) Da impugnação da matéria de facto

Primeira questão: se a matéria de facto se encontra incorrectamente julgada, devendo ser alterada.

Da prova oral produzida no decurso da audiência de julgamento, a única que poderia relevar para os efeitos que estão em apreço são os depoimentos de E…, F…, D…, G... e H….
Apreciemos, então, cada um desses depoimentos.
Ouvimos o depoimento da testemunha E…, o qual consta do ficheiro áudio 20150529144605_12498581_2871520.wma, colega de trabalho da autora que estava presente no dia, local e momento em que a recorrente teria praticado o comportamento que lhe foi imputado pela recorrida como fundamento do seu sancionamento disciplinar, sendo que essa testemunha depôs de forma isenta, objectiva, isenta de contradições, desinteressada, revelando conhecimento pessoal e directo dos factos por referência aos quais depôs, e por tudo isso credível.
Essa testemunha garantiu que naquele dia, local e momento a recorrente referiu que não recomendava o C… da recorrida a ninguém, nem mesmo a si própria.
Ouvimos o depoimento da testemunha F…, o qual consta do ficheiro áudio 20150529155110_12498581_2871520.wma, ex - colega de trabalho da autora que estava presente no dia, local e momento em que a recorrente teria praticado o comportamento que lhe foi imputado pela recorrida como fundamento do seu sancionamento disciplinar, sendo que essa testemunha depôs de forma isenta, objectiva, isenta de contradições, desinteressada, revelando conhecimento pessoal e directo dos factos por referência aos quais depôs, e por tudo isso credível.
Essa testemunha garantiu que naquele dia, local e momento a recorrente referiu por mais de uma vez que não recomendava o C… da recorrida a ninguém, do mesmo que referiu que lhe era indiferente que o referido C… encerrasse pois sempre lhe assistiria o direito ao fundo de desemprego.
Ouvimos o depoimento da testemunha D…, o qual consta do ficheiro áudio 20150529153128_12498581_2871520.wma, pessoa que não pertencia ao quadro de trabalhadores da recorrida e que dirigia a acção de formação que decorria no dia, local e momento em que a recorrente teria praticado o comportamento que lhe foi imputado pela recorrida como fundamento do seu sancionamento disciplinar, sendo que essa testemunha depôs de forma isenta, objectiva, isenta de contradições, desinteressada, revelando conhecimento pessoal e directo dos factos por referência aos quais depôs, e por tudo isso credível.
Essa testemunha garantiu que naquele dia, local e momento, uma trabalhadora da recorrida que logo ali foi identificada como sendo a recorrente – identificação essa feita por outras trabalhadoras da recorrida e pela direcção técnica do C… da recorrida – referiu que não recomendava o C… da recorrida a ninguém.
Além disso, essa mesma trabalhadora verbalizou, ainda que por palavras que não conseguia reproduzir com integral exactidão, que não se importava que o lar de idosos da recorrida fechasse, pois nessa eventualidade passaria a beneficiar de subsídio de desemprego.
Quanto às testemunhas G… e H…, que a recorrente invoca a favor da procedência da sua pretensão recursiva fáctica e cujos depoimentos constam, respectivamente, dos ficheiros áudio 20150529143207_12498581_2871520.wma e 20150529145918_12498581_2871520.wma, deve referir-se que os mesmos não podem servir de suporte à pretensão da recorrente no sentido de ser dada como não provada a matéria descrita no ponto 7º) dos factos provados.
Com efeito, apesar de a testemunha G… ter referido que não ouviu a recorrente proferir as expressões ali descritas, acabou por referir que: i) a conversa no âmbito da qual as mesmas teriam sido produzidas não era mantida consigo, mas sim com outras colegas; ii) no momento em que essa conversa se desenrolou a autora não estava junto a si, estando a alguma distância; iii) embora não acreditasse que a recorrente tivesse proferido aquelas expressões, talvez as pudesse ter proferido sem que a testemunha disso se tivesse apercebido.
Por outro lado, apesar de a testemunha H… ter referido que não ouviu a recorrente proferir as expressões ali descritas, acabou por referir que é normal que a recorrente pudesse ter dito, sem a testemunha ouvir, que não recomendava o C… da recorrida a ninguém.
Tendo em conta o acabado de referir e no confronto desse depoimento com os das testemunhas D…, E… e F… que ouviram a recorrente verbalizar o que se deu como provado no referido ponto 7º), evidente se torna que os depoimentos das testemunhas G… e H… não podem lograr o efeito pretendido pela recorrente no sentido de ser dada como não provada aquela matéria de facto.
Mantém-se integralmente, assim, a matéria de facto dada como provada pelo tribunal recorrido, assim improcedendo a pretensão recursiva fáctica da apelante.
*
A.2) Os factos provados

O tribunal recorrido deu como provados os factos seguidamente transcritos:
1. A ré é uma instituição de solidariedade social que se dedica essencialmente ao apoio à terceira idade, tendo como valência principal o acolhimento em regime de internamento de idosos.
2. No exercício da sua actividade, a ré celebrou com a autora um contrato de trabalho, que teve o seu início no dia 1 de Março de 2001, detendo a autora a categoria profissional de Auxiliar de Acção Médica.
3. Pelo trabalho prestado, em 2012, a autora recebia mensalmente da ré o vencimento mensal de € 503,00, acrescido de diuturnidades no valor de €84,00.
4. A autora fora já sancionada pela ré em anteriores processos disciplinares, tendo-lhe sido aplicada:
a) Uma pena de repreensão registada, em 26/06/2009, conforme processo disciplinar junto a fls. 66 a 77, e que aqui se dá como integralmente reproduzido, tendo aí resultado provado que a autora no decurso do mês de Abril de 2009 trocou medicação de utentes, respondendo que “os utentes não levam a mal”, por proferir constantemente em público expressões de “salazarismo” e “ditadura” referindo-se ao C… réu e por ser chamada a atenção passou a virar a cara ao seu vice-presidente;
b) Uma pena de suspensão do trabalho com perda de retribuição e antiguidade pelo prazo de quinze dias, em 03/05/2010, tudo conforme processo disciplinar junto como documento N.º 3 – fls. 88 a 104 -, e que aqui se dá como integralmente reproduzido, por a ré em Fevereiro de 2010 ter misturado num mesmo recipiente para lavagem roupa contaminada com fezes e urina com roupa não contaminada, em contrário a ordens que lhe haviam sido dadas e achando não ter feito mal nenhum após ter sido chamada a atenção por sua superior hierárquica, bem como por no dia seguinte se ter dirigido aos gritos à mesma superior hierárquica sem que para tanto tivesse ocorrido qualquer provocação.
5. No dia 25/06/2012, a ré puniu novamente a Autora com uma suspensão do trabalho com perda de retribuição e antiguidade pelo prazo de trinta dias, no âmbito de processo disciplinar instaurado.
6. No seguimento da pena aplicada, a autora cumpriu a suspensão ao trabalho que a ré lhe aplicou, a partir do dia 25 de Junho de 2012, até ao dia 24 de Julho de 2012.
7. No dia 27 de Fevereiro de 2012, quando a autora, conjuntamente com mais cerca de vinte oito trabalhadoras da ré, se encontravam a participar numa reunião formativa, nas instalações da ré, ministrada por formadora externa aos quadros de pessoal, a autora afirmou, em voz alta que: “não recomendava o C… a ninguém” e ainda que: “lhe era indiferente que o C… fechasse ou não pois se este fechasse ia para o fundo de desemprego”.
8. Por força da referida sanção disciplinar de 30 dias de suspensão ao trabalho, a ré retirou à autora a quantia de €503,00 a título de vencimento e a quantia de €84,00 a título de diuturnidades.
9. A autora vive sozinha e possui apenas o seu salário mensal para fazer face a suas despesas mensais e ficou abalada com a sanção que lhe foi aplicada.
10. A autora é seguida em consulta pelo CHMA – Unidade de Santo Tirso desde 2008 por Síndrome Ansio-Depressivo com muita má resposta às várias terapêuticas tentadas.
11. Expressões como as proferidas pela autora, e descritas supra em 7., atentam contra o bom nome, imagem, honra e consideração social da ré.
12. Tendo sido proferidas perante pelo menos uma pessoa estranha à ré.”.
*
B) De direito

Segunda questão: se assistia à ré fundamento para sancionar disciplinarmente a autora nos termos em que o fez.

Começando pelo dever de dever de lealdade a que a autora estava adstrita para com a ré (art. 128º/1/f do CT/2009), é sabido que no âmbito das relações jurídicas de trabalho subordinado, o trabalhador deve proceder de boa-fé no exercício dos seus direitos e no cumprimento dos seus deveres [arts. 126º/1 CT/2009 e 762º/2 CC – com a ideia de boa-fé estão relacionadas, como é sabido, as ideias de fidelidade, lealdade, honestidade e confiança na realização e cumprimento dos negócios jurídicos (Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, vol. II, Coimbra Editora, 1968, p. 2)], estando sujeito à obrigação de cumprir um conjunto de deveres que estão enunciados no art. 128º/1 do CT/2009, alguns principais, como por exemplo o de realizar o trabalho com zelo e diligência (alínea C), outros secundários, como por exemplo o de velar pela conservação e boa utilização dos bens relacionados com o seu trabalho (alínea G), e ainda outros que são acessórios de conduta, deduzidos do princípio geral da boa-fé supra referido, como por exemplo o de guardar lealdade ao empregador, nomeadamente não negociando por conta própria ou alheia em concorrência com ele, nem divulgando informações referentes à sua organização, métodos de produção ou negócios (alínea F) - Maria do Rosário Palma Ramalho qualifica o referido dever de lealdade e outros, como por exemplo os de respeito e urbanidade e de custódia, como deveres acessórios autónomos, os quais, não dependendo propriamente da prestação principal (a actividade laboral), surgem com a celebração do contrato, mantêm-se ao longo da sua execução, subsistem nas situações de não prestação do trabalho e/ou de suspensão do contrato e perduram mesmo para além da cessação do vínculo (Direito do Trabalho, Parte II, 2010, p. 412).
Por outro lado, é sabido que a confiança entre o empregador e o trabalhador desempenha um papel essencial nas relações de trabalho, tendo em consideração a forte componente fiduciária daquelas; com efeito, a relação juslaboral pressupõe a integridade, lealdade de cooperação e absoluta confiança da/na pessoa contratada.
Do mesmo modo, sabe-se que a subsistência daquela confiança pressupõe a observância do mencionado dever de lealdade do trabalhador para com o empregador, pois que aquela será sempre afectada, podendo mesmo ser irremediavelmente destruída, quando se fere o mencionado dever, sendo que a observância deste é fundamental para o correcto implemento dos fins prático-económicos a que o contrato se subordina.
Em geral, o dever de fidelidade, de lealdade ou de “execução leal” tem o sentido de garantir que a actividade pela qual o trabalhador cumpre a sua obrigação representa de facto a utilidade visada, vedando-lhe comportamentos que apontem para a neutralização dessa utilidade ou que, autonomamente, determinem situações de “perigo”(-) para o interesse do empregador ou para a organização técnico-laboral da empresa(-)…”, sendo que “…o dever geral de lealdade tem uma faceta subjectiva que decorre da sua estreita relação com a permanência de confiança entre as partes (nos casos em que este elemento pode considerar-se suporte essencial de celebração do contrato e da continuidade das relações que nele se fundam)…” e que, encarado de um outro ângulo, “… apresenta também uma faceta objectiva, que se reconduz à necessidade do ajustamento da conduta do trabalhador ao princípio da boa-fé no cumprimento das obrigações…”, “… com o sentido que lhe é sinalizado pelo art. 119.º/1 CT…”, donde promana, “… no que especialmente respeita ao trabalhador, o imperativo de uma certa adequação funcional — razão pela qual se lhe atribui um cariz marcadamente objectivo — da sua conduta à realização do interesse do empregador, na medida em que esse interesse esteja “no contrato”, isto é, tenha a sua satisfação dependente do cumprimento (e do modo do cumprimento) da obrigação assumida pela contraparte.” – Monteiro Fernandes, Direito do Trabalho, 12.ª edição, Almedina, pp. 231 a 234.
O “… dever de lealdade manifesta-se hoje, basicamente, nos deveres de não concorrência e de sigilo profissional, sendo expressão da boa-fé contratual e significando que o trabalhador não deverá aproveitar-se da posição funcional que ocupa na empresa em detrimento do empregador (desviando a sua clientela, revelando segredos à concorrência, etc.)” - Leal Amado, Contrato de Trabalho, 2.ª edição, Coimbra Editora, p. 386.
Trata-se, conforme o exposto, de um dever que numa vertente objectiva se traduz na necessidade do trabalhador ajustar o seu comportamento ao princípio da boa-fé no cumprimento do contrato, e numa vertente subjectiva se reconduz à relação de confiança entre as partes que impõe que a conduta do trabalhador não seja susceptível de abalar tal confiança e, assim, criar no espírito do empregador a dúvida sobre a idoneidade futura do comportamento do trabalhador – cfr. acórdãos do STJ de 14/4/1999, Acs Dout. do Supremo Tribunal Administrativo, Ano XXXVIII, N.º 456, p. 1653, de 17/04/1996 e de 14/01/1998, proferidos, respectivamente, nos processos 4429 e 110/1997.
Como assinala Joana Vasconcelos, em artigo que publicou sobre “O conceito de justa causa de despedimento”, é necessário fazer “um juízo de prognose, de probabilidade sobre a viabilidade futura da relação de trabalho” – Estudos do Instituto de Direito do Trabalho, Vol. II, Almedina, pp. 33/34.
Naturalmente que esse dever de lealdade não apresenta, sempre, o mesmo conteúdo; ao invés, este varia em função da natureza das funções do trabalhador, sendo mais acentuado quanto mais qualificadas forem as funções desempenhadas pelo trabalhador na organização técnico-laboral do empregador; coerentemente com o acabado de afirmar, o juízo de censura dirigido ao trabalhador não tem de ser sempre igual, devendo ser tanto mais severo quanto mais elevado for o grau de confiança estabelecido entre as partes, objectivado nas funções confiadas ao trabalhador na respectiva estrutura organizativa da empresa.
Atente-se, no entanto, em que dado o carácter absoluto do dever de lealdade e a consequente impossibilidade de gradações na perda da confiança[1] (v.g., acórdãos do STJ de 22/1/1992, Ac. Dout. 373º, p.108, de 20/3/1996, Ac. Dout. 416º-417º, p.1069, e de 18/12/1991, BMJ 412, p. 342, acórdãos da Relação do Porto de 10/6/1997, CJ, 1997, T. 4, p. 256, de 5/12/11, proferido na apelação 513/10.6TTMAI.P1, de 12/9/2011, proferido na apelação 787/10.2TTPRT.P1, de 21/5/2012, proferido no âmbito da apelação 1212/09.7TTGMR.P1, da Relação de Lisboa de 8/2/2012, proferido no âmbito da apelação 3061/03.7TTLSB.L1-4, de 26/9/2012, proferido no âmbito da apelação 1004/10.0TTLRS.L1, de 15/1/03, proferido no processo 7777/02; na doutrina pode consultar-se, por exemplo, Menezes Cordeiro, Manual de Direito do Trabalho, pp. 826 a 828, Lobo Xavier, Da Justa Causa de Despedimento no Contrato de Trabalho, p. 19, e José Andrade Mesquita, Direito do Trabalho, 2ª edição, 2004, p. 556), a diminuição de confiança resultante da violação deste dever não está dependente da verificação de prejuízos materiais, nem da existência de culpa grave do trabalhador: por isso, a simples materialidade desse comportamento lesivo do dever em apreço, aliado a um moderado grau de culpa do trabalhador pode, em determinado contexto, levar a um efeito redutor das expectativas de confiança (acórdão do STJ de 11/10/1995, publicado na CJ, tomo III, p. 277).
Como decidiu o STJ no acórdão de 03/04/1987, “Ainda que o prejuízo da entidade patronal seja pequeno, mais que isso releva a quebra de confiança que o comportamento do trabalhador provoca.” (BMJ, n.º 366, p. 425).
Como ensina Júlio Gomes (Direito do Trabalho, vol. I, Relações Individuais de Trabalho, Coimbra Editora, 2007, p. 951), no tocante às consequências da conduta do trabalhador, “…estas deverão consistir num prejuízo grave para o empregador, embora tal prejuízo não seja necessariamente de ordem patrimonial. Com efeito, as consequências perniciosas podem consistir em minar a autoridade do empregador (ou do superior hierárquico), lesar a imagem da empresa ou num dano por assim dizer “organizacional”. Referimo-nos, com isto, ao que vulgarmente se refere pela perda de confiança no trabalhador.”.
Ora, em face dos factos dados como provados, designadamente dos que constam do ponto 7º) dos mesmos, é forçoso concluir que a autora violou a confiança nela depositava pela ré e, consequentemente, o dever de lealdade a que estava obrigado para com ela.
É preciso ter em devida conta que a autora se referiu ao estabelecimento da recorrida afirmando que não o recomendaria a ninguém.
Tenha-se em mente que está em causa uma estrutura residencial para idosos a operar num sector de mercado com oferta crescente e fortemente concorrencial de unidades dessa natureza e com essas funções, razão pela qual nelas devem estar presentes, sob pena da sua exploração económica estar irremediavelmente votada ao insucesso, visão[2], missão[3] e valores[4] específicos.
Ora, ao referir que não recomendaria a ninguém o estabelecimento da recorrida, a recorrente criou e difundiu objectivamente a suspeição de que tal estabelecimento não preenchia os requisitos mínimos de satisfação da visão, missão e valores específicos acabados de aludir, razão pela qual tal estabelecimento não satisfazia as condições mínimas de laboração que devia preencher e sem as quais, aliás, o seu licenciamento de laboração lhe deveria ser cancelado.
Por outro lado, não resultam dos factos provados indícios mínimos, sequer, de que a afirmação da recorrente tivesse a mínima justificação objectiva no sentido da correspondência da mesma à realidade objectiva e quotidiana de laboração do estabelecimento da recorrente.
Além disso, a criação e difusão dessa suspeição por parte da recorrente foi levada a cabo na presença, pelo menos, de uma formadora externa aos quadros de pessoal da recorrida.
Tudo visto, somos a concluir que a recorrente criou e veiculou uma suspeição que objectivamente atenta, sem aparente justificação factual que a suporte, contra o bom nome e imagem comerciais da recorrida enquanto instituição detentora de uma unidade residencial de idosos, assim violando o dever de lealdade a que estava obrigada para com a recorrida.
Na verdade, como resulta do já exposto, esse dever impede que o trabalhador assuma comportamentos de que resultem situações de perigo para o interesse do empregador ou para a organização técnico-laboral da empresa.
Foi esse perigo que, justamente, a autora criou ao afirmar, sem aparente justificação factual, que não recomendaria a ninguém o estabelecimento da recorrida.
Nenhuma censura merece, pois, a decisão recorrida ao afirmar a violação pela recorrente do enunciado dever de lealdade.
+
Por outro lado, é sabido que nos termos do art. 128º/1/a do CT/2009, o trabalhador deve respeitar e tratar com urbanidade e probidade o empregador, os superiores hierárquicos, os companheiros de trabalho e as demais pessoas que estejam ou entrem em relação com a empresa.
Consagra tal dispositivo o denominado dever de respeito e de urbanidade que impende sobre os trabalhadores no contexto das relações de trabalho, e de que são credores o empregador e os superiores hierárquicos do trabalhador, os colegas de trabalho e, ainda, o conjunto de pessoas que entrem em relação com a empresa, justificando-se esta pluralidade de credores pela componente organizacional do contrato de trabalho e pela inserção do trabalhador numa estrutura que ultrapassa a mera relação que se estabelece entre os sujeitos do contrato de trabalho.
O dever em apreço “Aponta genericamente para a necessidade de observância das regras de conduta social adequadas, quer em matéria de tratamento, quer em matéria de apresentação pessoal e de conduta do trabalhador.”[5], carecendo o mesmo de concretização casuística em função do contexto empresarial em que ocorre a prestação de trabalho e das pessoas envolvidas em cada concreta situação.
Tal como refere Maria do Rosário Palma Ramalho, “O critério a reter na qualificação de certa conduta do trabalhador como infracção ao dever de respeito (…) deverá ser o da adequação da conduta do trabalhador no contexto laboral em que está a exercer.”[6].
Está em causa uma norma de conduta social cuja observância é fundamental para o estabelecimento de um bom ambiente de trabalho na comunidade empresarial, devendo considerar-se lesado sempre que o trabalhador ofende a honra, a reputação e o bom nome do empregador, dos superiores hierárquicos do trabalhador, dos colegas de trabalho e daqueles que entrem em relação com a empresa, relevando neste âmbito os “…nossos gestos e atitudes, as nossas palavras e frases, as nossas acções no contexto dos papéis que desempenhamos face aos outros e em correlação com os papéis representados por esses outros.”[7].
Ora, ao criar e ao difundir a suspeição supra referenciada, sem aparente justificação factual que a suportasse, a recorrente pôs inequivocamente em causa o direito ao bom nome e à imagem comerciais da recorrida e nessa medida lesou a reputação e o bom nome da sua empregadora.
Acresce mesmo que por essa mesma via, a recorrente acabou por colocar em causa, mais uma vez sem aparente justificação factual para o efeito, o bom desempenho profissional de todos e cada um dos que trabalhavam na instituição da recorrida, nessa medida atentando contra os respectivos bons nomes e imagens profissionais, lesando em relação a eles, igualmente, o dever de respeito a que estava vinculada.
Nenhuma censura merece, pois, a decisão recorrida ao afirmar a violação pela recorrente do enunciado dever de respeito.
É certo que “Todos têm o direito de exprimir e divulgar livremente o seu pensamento pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio, bem como o direito de informar, de se informar e de ser informados, sem impedimentos nem discriminações.” (art. 37º/1 da CRP), e que “O exercício destes direitos não pode ser impedido ou limitado por qualquer tipo ou forma de censura.” (art. 37º/2 da CRP).
Importa reter, no entanto, que o direito à liberdade de expressão não é um direito absoluto ou ilimitado[8], estando sujeito ao que vem sendo denominado como a “concordância prática” com outros valores e direitos fundamentais de terceiros, entre os quais se contam, pelo seu relevo na situação em análise, os direitos à integridade moral e ao bom nome[9].
Por isso que em concretização, no âmbito da relação laboral, do estatuído nesse art. 37º/1/2, estabelece o art. 14º do CT/2009 que “É reconhecida, no âmbito da empresa, a liberdade de expressão e de divulgação do pensamento e opinião, com respeito dos direitos de personalidade do trabalhador e do empregador, incluindo as pessoas singulares que o representam, e do normal funcionamento da empresa.”.
Como escreve Guilherme Dray[10], “Tais princípios não são absolutos, podendo nalguns casos, e segundo princípios de necessidade, adequação valorativa e proporcionalidade, ser limitados, nomeadamente quando embatam no princípio da liberdade de gestão empresarial.”.
A este mesmo propósito, ensina Maria do Rosário Palma Ramalho[11] que os direitos fundamentais e de personalidade dos trabalhadores, entre os quais se conta o da liberdade de expressão, estão sujeitos a limites extrínsecos decorrentes do relevo de outros interesses ou direitos que com eles colidam, sendo que os casos de colisão devem resolver-se nos termos gerais enunciados no art. 335º do CC, preferencialmente com a cedência recíproca e equilibrada dos direitos em confronto, ou, se tal não for possível, através da prevalência do direito que, em concreto, se considere superior.
Daí que para aferir sobre se determinada conduta ainda pode ter-se por compreendida nos limites de um determinado direito fundamental ao abrigo do qual foi protagonizada ou se pelo contrário tais limites foram ofendidos, há sempre que fazer uso de uma técnica de ponderação/concordância prática dos interesses/direitos em presença, com utilização de critérios de necessidade, proporcionalidade, proibição do excesso e intangibilidade do conteúdo essencial dos direitos fundamentais[12].
Ora, de entre os direitos que podem entrar em colisão com o da liberdade de expressão dos trabalhadores e que podem limitá-lo contam-se o dever de respeito[13] e “…por inerência, de urbanidade e probidade, no que concerne ao tratamento com o empregador, superiores hierárquicos, companheiros de trabalho e pessoas que se relacionam com a empresa, deveres esses que podem e devem ser assumidos como limites legítimos à liberdade de expressão e de opinião.”[14].
Como escreve Júlio Vieira Gomes[15] “O dever de urbanidade não é, como vimos, incompatível com um direito à crítica por parte do trabalhador, desde que essa crítica seja feita, ela própria em termos corteses e educados e não viole um dever de sigilo, nem prejudique a imagem da empresa. A crítica, mormente a interna, que obedeça a estes requisitos poderá ser considerada um facto normal e saudável na vida de uma empresa.”.
A significar que o exercício da liberdade de expressão e do inerente direito à crítica do trabalhador deve ser compatibilizado e harmonizado com o direito à honra e à imagem do empregador[16].
Nos casos de colisão entre a liberdade de expressão dos trabalhadores, por um lado, e os deveres de respeito, de urbanidade e de probidade, por outro lado, a jurisprudência espanhola vem decidindo no sentido de que deve levar-se a efeito uma análise casuística das situações submetidas à apreciação jurisdicional, devendo ter-se presentes, entre outros, os seguintes elementos de facto: o contexto das declarações, a motivação ou finalidade das mesmas, o interesse geral dessas declarações, a sua publicação ou não nos meios de comunicação social, ser o autor das mesmas um trabalhador na base da hierarquia ou um trabalhador que desempenha um cargo de direcção[17] [18].
Por sua vez, em situações do mesmo jaez, a jurisprudência italiana tem vindo a convocar os efeitos da conduta na reputação do empregador, a relevância jurídica dos interesses que se visam proteger, o tipo de instrumentos utilizados e à sua proporcionalidade com a necessidade de tutela dos interesses em jogo, à veracidade dos factos veiculados, bem como ao elemento subjectivo da conduta[19].
Em qualquer caso, não serão dignas de tutela jurídica, designadamente, as expressões qualificativas duras, exageradas e excessivas que se revelem desnecessárias/gratuitas, totalmente infundadas ou destituídas de base factual[20].
Ora, como supra referido, a recorrente criou e veiculou, através de uma expressão desnecessária/gratuita e destituída de base factual demonstrada, uma suspeição que objectivamente atenta, contra o bom nome, a reputação e a imagem comerciais da recorrida enquanto instituição detentora de uma unidade residencial de idosos, assim violando os deveres de lealdade e de respeito que estava obrigada para com a recorrida, assim como pôs em causa o bom desempenho profissional de todos e cada um dos que trabalhavam na instituição da recorrida, nessa medida atentando contra os respectivos bons nomes e imagens profissionais e lesando em relação a eles, igualmente, o dever de respeito a que estava vinculada.
Com esse enquadramento e face ao supra exposto não se pode acolher a pretensão da recorrente no sentido de que a sua conduta deveria ter-se por legitimada à luz do seu direito à liberdade de expressão e de opinião.
+
Nenhuma censura merece, pois, a decisão recorrida ao decidir no sentido de que a recorrente violou os deveres de respeito e de lealdade, tendo por isso assumido um comportamento disciplinarmente relevante que justificava a censura disciplinar que foi dirigida à recorrente pela recorrida.
*
IV - Decisão

Acordam os juízes desta secção social do Tribunal da Relação do Porto no sentido de julgar improcedente a apelação, confirmando-se a sentença recorrida.
Custas pela recorrente.

Porto, 15/2/2016.
Jorge Loureiro
Jerónimo Freitas
Eduardo Petersen Silva (Declaração de voto: Voto a decisão, por considerar que as expressões proferidas, porque perante terceiro, constituem violação do dever de lealdade e por considerar que, face aos antecedentes disciplinares, a pena aplicada foi adequada.)
______________
[1] A confiança existe ou deixa de existir. Deixando de existir, não há o suporte psicológico mínimo para o desenvolvimento da relação laboral.
[2] Serem reconhecidas como instituições prestadoras de serviços e cuidados humanizados, especializados e adequados à problemática biopsicossocial das pessoas idosas, à estimulação de um processo de envelhecimento activo, à promoção da integração social, à criação de condições que permitam preservar e incentivar a relação intrafamiliar, tudo com vista à promoção da qualidade de vida dos seus utentes e à satisfação crescente dos interesses dos mesmos, dos seus familiares e colaboradores.
[3] Participação activa na melhoria da qualidade humana em todos os serviços prestados, com desenvolvimento da actividade empresarial focada no utente e nas suas necessidades, tudo de forma a potenciar a autonomia dos utentes, erradicar ou minimizar factores de exclusão social, maximizar internamente a criação sustentável de valor de modo a contribuir para uma sociedade mais justa e solidária a nível das respostas sociais de apoio a idosos.
[4] Entre os quais se contam os da valorização, qualidade, profissionalismo, dedicação, zelo, competência, busca contínua da excelência, respeito pela pessoa humana, liberdade de consciência, solidariedade, respeito pela individualidade e pela diversidade, dignidade, afectividade, serenidade, flexibilidade, capacidade de ajustamento e de bom relacionamento interpessoal, ética, transparência, honestidade, humildade, inovação.
[5] Maria do Rosário Palma Ramalho, Direito do Trabalho, Parte II – Situações Laborais Individuais, 3.ª Edição, Almedina, 2010, pp. 424 e 425.
[6] Obra citada, p. 425
[7] Batista Machado, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, p. 22.
[8] Martínez Rocamora, Ofensas verbales y libertad de expresión del trabajador (comentario a la STC 106/1996, de 12 de junio), TS n.º 72 (1996), p. 43.
[9] Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, I, 2005, p. 430; Gomes Canotilho, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 5ª edição, pp. 1208 e 1209.
[10] Código do Trabalho Anotado, 2013, p. 141.
[11] Direito do Trabalho, Parte II, 3.ª Edição, Almedina, pp. 432 a 435
[12] José João Abrantes, Contrato de Trabalho e Direitos Fundamentais, 2005, pp. 229 a 234.
[13] Art. 128º/1/a do CT/2009.
[14] Paulo Quintas, Os Direitos de Personalidade Consagrados no Código do Trabalho na Perspetiva Exclusiva do Trabalhador Subordinado – Diretos (Des)figurados, p. 159.
[15] Direito do Trabalho, volume I, Relações Individuais de Trabalho, Coimbra Editora,2007, p. 531.
[16] Goñi Sein, Las ofensas al honor y la repercusión disciplinaria de las proferidas fuera de la empresa, RL T. II, 1987, p. 471
[17] Raquel Vida Fernández, Ofensas verbales y libertad de expresión en el âmbito de las relaciones laborales, in Trabajo y libertades públicas, Madrid, 1999, pp. 403 a 417.
[18] García Ninet, Ofensas verbales o físicas al empresario o a otras personas del entorno empresarial, in Estudios sobre el despido disciplinario, Acarl, Madrid 1992, pp. 168 e ss.
[19] Daniela Mugnaini, Sul diritto di critica del prestatore nei confronti del datores di lavoro, Revista Italiana di Diritto del Lavoro, 1999, parte II, pp. 655 e 656.
[20] Alexandre H. Català I Bas, Libertad de Expresión i Informacion, La Jurisprudencia del TEDH e su recepcion por el Tribunal Constitucional, Valencia, 2001, p. 189 a 194.
___________
Sumário:
I) O direito à liberdade de expressão por parte dos trabalhadores não é absoluto, devendo harmonizar-se com o direito à honra e à imagem do empregador, estando consequentemente limitado pelo dever de respeito, de urbanidade e de probidade legalmente consagrados.
II) Os casos de colisão entre aqueles direitos fundamentais devem resolver-se nos termos gerais enunciados no art. 335º do CC, preferencialmente com a cedência recíproca e equilibrada dos direitos em confronto, ou, se tal não for possível, através da prevalência do direito que, em concreto, se considere superior, devendo levar-se em consideração nessa operação de confronto, entre outros, os seguintes elementos de facto: o contexto das declarações, a motivação ou finalidade das mesmas, o interesse geral dessas declarações, a sua publicação ou não nos meios de comunicação social, ser o autor das mesmas um trabalhador na base da hierarquia ou um trabalhador que desempenha um cargo de direcção, a relevância jurídica dos interesses que se visam proteger, o tipo de instrumentos utilizados e a sua proporcionalidade com a necessidade de tutela dos interesses em jogo, a veracidade dos factos veiculados, e o elemento subjectivo da conduta.
III) Em qualquer caso, não serão dignas de tutela jurídica, designadamente, as expressões qualificativas duras, exageradas e excessivas que se revelem desnecessárias/gratuitas, totalmente infundadas ou destituídas de base factual.
IV) Viola os deveres de respeito e de lealdade para com o empregador, a trabalhadora de uma unidade residencial para idosos que na presença de colgas de trabalho e de um terceiro, sem aparente justificação factual para o efeito, profere a expressão “Não recomendo o C… a ninguém”, pretendendo com isso reportar-se ao estabelecimento onde trabalhava, não podendo essa conduta da trabalhadora encontrar legitimação no seu direito à liberdade de expressão.

Jorge Loureiro