Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
14752/16.2T8PRT.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: TERESA SÁ LOPES
Descritores: CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO
QUESTÃO PREJUDICIAL
SUSPENSÃO DA INSTÂNCIA
CADUCIDADE
CONVENÇÃO COLECTIVA DE TRABALHO
SOBREVIGÊNCIA
PUBLICAÇÃO
AVISO
Nº do Documento: RP2018101114752/16.2T8PRT.P1
Data do Acordão: 10/11/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROVIDO PARCIALMENTE
Indicações Eventuais: 4ªSECÇÃO (SOCIAL),(LIVRO DE REGISTOS N.º283, FLS.263-286)
Área Temática: .
Sumário: I - “A suspensão da instância, ao abrigo do disposto no art. 92º, nº 1, do CPC, pressupõe a existência de uma questão que, constituindo um pressuposto necessário da decisão de determinada causa (questão prejudicial), seja da competência do tribunal criminal ou do administrativo”.
II - “Ao contrário do que acontece com a situação prevista no art. 92º, nº 1 – em que a mera constatação da existência de uma questão prejudicial, que seja da competência do tribunal criminal ou administrativo, legitima o juiz a sobrestar na sua decisão para que as partes promovam, junto do tribunal competente, a resolução dessa questão –, a suspensão da instância, ao abrigo do disposto no art. 272º, nº 1, 1ª parte, do CPC pressupõe que já se encontre pendente uma outra acção onde se discute uma determinada questão da qual depende a decisão da causa, independentemente da natureza dessa questão e independentemente de ela se integrar ou não no âmbito de competência do tribunal da causa”.
III - Tendo a Autora, na pendência da presente ação, instaurado ação de natureza administrativa, tendo em vista a concretização da publicação do aviso de caducidade do CTT, aquela última não pode ser entendida como tendo subjacente uma questão essencial para o desfecho dos autos, sendo a questão da natureza de tal publicação controversa quanto ao seu efeito constitutivo ou meramente declarativo.
IV - “Estabelecendo o art. 7º, nº 1 da Lei 7/2009 de 12/02 que o Código do Trabalho aprovado por esta lei apenas não é aplicável à validade e aos efeitos de factos totalmente passados em data anterior à entrada em vigor dessa lei, o regime de caducidade e sobrevigência das convenções coletivas à data vigentes e que não preencham os requisitos estabelecidos no art. 10º da mesma lei, fica sujeito ao estabelecido no Código do Trabalho de 2009, nomeadamente o no seu art. 501º”.
V - A publicação do aviso caducidade de um CCT é constitutiva da caducidade, pelo que só depois de efectuada se produz o correspondente efeito.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº 14752/16.2T8PRT.P1
Origem: Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo do Trabalho do Porto – Juiz 1
4ª Secção
Recorrente: Federação dos Sindicatos dos Trabalhadores B…
Recorrido: C…
Relatora: Teresa Sá Lopes
1ª Adjunta: Desembargadora Fernanda Soares
2º Adjunto: Desembargador Domingos Morais
Acordam na secção social desta Relação
1. Relatório:
C…, associação patronal, intentou a presente ação declarativa sob a forma comum contra Federação dos Sindicatos dos Trabalhadores B…, associação sindical, peticionando o reconhecimento judicial da caducidade a partir do dia 1 de dezembro de 2015 do Contrato Coletivo de Trabalho celebrado entre autora e ré, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego (BTE), 1.ª série, nº 42, de 15 de novembro de 2006, das suas diversas alterações, publicadas sucessivamente no BTE, 1ª série, nº 8, de 29 de fevereiro de 2008, nº 3, de 22 de janeiro de 2011 e nº 35, de 22 de setembro de 2011, da alteração ao CCT, publicada no BTE, 1ª série, nº 3, de 22 de janeiro de 2011, onde se procedeu à revisão global do CCT, e da alteração publicada no BTE 1ª série nº 35, de 22 de setembro de 2011.
Invocou para o efeito, em suma, ter este contrato sido por si denunciado, tendo decorrido os prazos previstos no artigo 501º, nºs 3 e 4 do Código do Trabalho (na redação estabelecida pela Lei 7/2009, de 12 de Fevereiro), sem que se tivesse alcançado acordo sobre a extensão da sua vigência ou outro, malgrado a intervenção da Direção-Geral do Emprego e das Relações de Trabalho (DGERT), decorrendo daí a caducidade a que apela.
Foi realizada a audiência de partes, não se tendo logrado obter acordo entre elas.
A Ré contestou, invocando em primeiro lugar, a preterição de litisconsórcio necessário, por falta de intervenção dos sindicatos outorgantes da convenção, com denúncia a cada um deles, a circunstância de correr ação administrativa que, de acordo com a sua posição, teria cariz prejudicial ao presente pleito, suscitando ainda o caráter de retrocesso social da caducidade invocada, a integração nos contratos individuais dos efeitos da convenção caducada, a reserva de caducidade contida no nº 4 da cláusula 2ª da convenção, a falta de vontade séria negocial por parte da autora, representativa de um abuso de direito, na vertente de venire contra factum proprium, a necessidade de publicação do aviso de caducidade por parte da DGERT e a recusa legítima desta nessa publicação, para além da inconstitucionalidade do artigo 501º do Código do Trabalho (CT), para pugnar pela improcedência da ação.
Respondeu a autora, rejeitando a esgrimida prejudicialidade bem como o litisconsórcio invocado pela ré.
Em sede de audiência prévia apresentaram as partes acordo sobre a matéria de facto a submeter à ponderação do tribunal, declarando ainda prescindir da produção de prova e das respetivas alegações de facto e de direito.
Em 22.09.2017, foi proferida sentença, em cujo dispositivo consta:
“(…) julga-se a presente ação procedente, reconhecendo-se e determinando-se a caducidade a partir do dia 1 de dezembro de 2015 do Contrato Coletivo de Trabalho celebrado entre autora e ré, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego (BTE), 1.ª série, nº 42, de 15 de novembro de 2006, das suas diversas alterações, publicadas sucessivamente no BTE, 1.ª série, n.º 8, de 29 de fevereiro de 2008, n.º 3, de 22 de janeiro de 2011 e n.º 35, de 22 de setembro de 2011, da alteração ao CCT, publicada no BTE, 1ª série, n.º 3, de 22 de janeiro de 2011, onde se procedeu à revisão global do CCT, e da alteração publicada no BTE 1ª série n.º 35, de 22 de setembro de 2011.
Custas pela ré, sem prejuízo da isenção de que beneficia.
Valor da ação: €30.000,01.
Registe e notifique.”».
Inconformada a Ré interpôs
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Por despacho de 18.12.2017, o recurso foi admitido.
Recebidos os autos neste tribunal, apresentados os mesmos ao Ministério Público, pelo Exm.º Procurador-Geral Adjunto foi emitido parecer, no sentido de:
- Quanto à nulidade da decisão que resulta da invocação do Acórdão da Relação de Lisboa, a ser verdade que o Tribunal se equivocou sobre o sentido ali defendido, a única consequência é a da falta daquele concreto apoio jurisprudencial.
- No que respeita à necessidade de intervenção dos 13 sindicatos representados pela Ré na outorga do CCT, pelos motivos indicados na decisão do Tribunal a quo, a decisão de mérito dos autos não deixa de vincular os sindicatos filiados pelos mesmos motivos por que se obrigaram ao clausulado no CCT outorgado somente pela Ré.
- Não deve ser decretada a caducidade do CCT, aderindo à tese jurisprudencial de que a publicação do aviso é constitutiva da caducidade, pelo que só depois de efectuada se produz o correspondente efeito.
Notificado do mesmo parecer, a Ré veio invocar a falta de fundamentação da sentença por não desenvolver qualquer explicação jurídica ou doutrinária para concluir pela desnecessidade de publicação.
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3.2.3. Da prejudicialidade do contencioso administrativo:
Sobre a existência de causa prejudicial, entendeu o Tribunal a quo «ser efetivamente nesta sede que se deve conhecer da questão suscitada da vigência da convenção em causa, não tendo a lide administrativa a virtualidade de a dirimir, e destarte o caráter de prejudicialidade que se suscita, pelo que se afasta também aqui a invocada prejudicialidade.».
A este propósito, a aduziu que:
- O Estado, através da entidade competente para as relações colectivas de trabalho - Direção-Geral do Emprego e das Relações de Trabalho (DGERT) -, tomou a decisão administrativa de indeferir expressamente o pedido de publicação do aviso da cessação da vigência deste CCT por caducidade formulado pela Autora porque o CCT não tinha caducado.
- O tribunal especializado competente para alterar tal decisão é o Tribunal Administrativo — e a Autora instaurou no Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga Unidade Orgânica, o Pº 1734/16.3BEBRG, ação administrativa contra o Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social em que a causa de pedir é a caducidade do CCT e onde se peticiona que se revogue a decisão administrativa e se ordene a publicação do aviso da cessação da vigência deste CCT por caducidade.
- Se o Tribunal Administrativo vier a confirmar a decisão de não caducidade da DGERT teríamos duas decisões judiciais contraditórias e opostas em vigor: uma decisão que vincularia apenas Autora e Ré e outra decisão de não caducidade que vincularia Autora, Ré e Estado.
- E como a caducidade não seria publicada em BTE, a Inspeção do Trabalho continuaria obrigada a cumprir hierarquicamente a decisão administrativa e a levantar os autos de contra-ordenação às empresas que não cumpram o CCT,
Por seu turno, sobre esta questão, foi alegado pela Autora, nas contra alegações que apresentou:
- Sendo a questão dita prejudicial da competência do foro administrativo, a suspensão da instância prevista no artigo 92º do CPC é uma faculdade do tribunal e o seu não uso traduz o exercício de um poder legal discricionário e insusceptível de recurso.
- Consoante resulta do n.º 2 do mesmo artigo 92º, o juiz da causa tem competência para resolver a questão prejudicial (ainda que com o alcance restrito de caso julgado formal) sem ter que aguardar pelo veredicto do tribunal administrativo.
- Foi o que o aconteceu no caso, ao decidir-se que a publicação do Aviso não tem efeitos constitutivos, declarando-se a caducidade do CCT e condenando-se a Ré a assim reconhecê-lo.
- Também em face do regime do artigo 272º do CPC, inexiste fundamento para decretar a suspensão instância por não se verificar a alegada prejudicialidade entre a presente ação que tem como causa de pedir a denúncia do CCT e visa a declaração de caducidade dessa convenção e aquela que pende no Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, tendo como fundamento a omissão de publicação do Aviso da cessação da vigência do CCT, visando-se a condenação da Administração Pública à prática desse acto.
- Dada a diferença de objetos processuais e dos fins prosseguidos pelas duas ações, não se verifica a existência de um nexo de prejudicialidade que justifique a suspensão dos presentes autos.
- Sendo diferentes as partes, o pedido e a causa de pedir, não há possibilidade de vir a existir contradição de julgados.
Examinemos:
Prevê o artigo 92º do CPC, sob a epígrafe “Questões prejudiciais”:
«1. Se o conhecimento do objecto da ação depender da decisão de uma questão que seja da competência do tribunal criminal ou do tribunal administrativo, pode o juiz sobrestar na decisão até que o tribunal competente se pronuncie.
2 - A suspensão fica sem efeito se a ação penal ou a ação administrativa não for exercida dentro de um mês ou se o respetivo processo estiver parado, por negligência das partes, durante o mesmo prazo; neste caso, o juiz da ação decidirá a questão prejudicial, mas a sua decisão não produz efeitos fora do processo em que for proferida.».
Acompanhamos aqui as considerações feitas no Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 15.09.2015, in www.dgsi.pt, “Podendo definir-se a questão prejudicial como sendo aquela cuja resolução constitui um pressuposto necessário da decisão de mérito que importa proferir em determinada ação, o que se determina na norma supra citada é que, caso a decisão dessa questão seja da competência do tribunal criminal ou do tribunal administrativo, o juiz tem a faculdade de sobrestar na decisão – suspendendo a instância – até que tal questão seja decidida pelo tribunal competente. Trata-se, no entanto, de uma faculdade do juiz – como decorre da utilização da expressão “pode” – pelo que, ao invés de sobrestar na decisão, também lhe será permitido conhecer dessa questão com vista à decisão da causa e ficando mesmo obrigado a tal apreciação, caso se verifique a situação prevista no nº2, ainda que, nessa parte, a decisão não produza efeitos fora do processo (cfr. nº 2 da norma citada).
(…)
Refira-se que a questão prejudicial, para efeitos da norma que estamos a analisar, não corresponde a causa ou acção prejudicial, já que, para efeitos de suspensão ao abrigo do art. 92º, não é necessário que se encontre pendente, no tribunal competente (criminal ou administrativo) uma qualquer causa ou ação que tenha como objecto essa questão; o que releva, para efeitos de funcionamento da norma citada, é a mera existência de uma questão que deva ser qualificada como prejudicial e que esta seja da competência do tribunal criminal ou administrativo; verificada esta situação, pode o juiz sobrestar na decisão, remetendo as partes para o tribunal competente, onde deverão requerer a resolução da questão (caso ainda não o tenham feito) no prazo de um mês (porquanto, não o fazendo nesse prazo, a suspensão fica sem efeito e a questão será apreciada pelo juiz da acção, embora com eficácia limitada a esse processo – cfr. nº 2 da norma citada).”, (realce e sublinhado nossos).
Em concreto, saber se a recusa da publicação do aviso de cessação da vigência do CCT por caducidade teve fundamento legal, é questão da competência do tribunal administrativo.
Porém, a resolução de tal questão não é necessária à decisão a proferir na presente causa.
Com efeito, o reconhecimento e declaração de caducidade do CCT, não depende necessariamente da decisão que a respeito daquela questão venha a ser proferida já que a referida publicação não tem de ser considerada como condição de eficácia da caducidade da convenção, tendo sido aliás esse o entendimento do Tribunal a quo que não usou da aludida faculdade.
A idêntica conclusão chegamos, enquadrando a questão no âmbito do disposto no artigo 272º do CPC, o qual, sob a epígrafe “Suspensão por determinação do juiz ou por acordo das partes”, preceitua:
«O tribunal pode ordenar a suspensão quando a decisão da causa estiver dependente do julgamento de outra já proposta ou quando ocorrer outro motivo justificado».
Voltando a acompanhar o citado Acordão da Relação de Coimbra de 15.09.2015, “Ao contrário do que acontece com a situação prevista no art. 92º, o que está aqui em causa já não é – pelo menos necessariamente – uma questão prejudicial que seja da competência de um tribunal administrativo ou criminal, mas sim uma questão que já se encontra autonomizada como objecto de uma outra causa que se encontra pendente. Ou seja, o que está subjacente à suspensão prevista no art. 92º é a circunstância de o tribunal da causa ser, em princípio, incompetente em razão da matéria (porque essa competência está legalmente atribuída aos tribunais criminais ou aos tribunais administrativos) para decidir uma questão cuja resolução é necessária para a decisão da causa, por isso se permitindo ao juiz da causa que determine a suspensão para que as partes promovam, junto do tribunal competente, a resolução dessa questão; o que está subjacente à suspensão prevista no art. 272º já não é a incompetência do tribunal para apreciar uma questão de natureza criminal ou administrativa, mas sim a mera circunstância de estar já pendente uma outra acção onde se discute uma determinada questão (independentemente da sua natureza e independentemente de ela se integrar ou não no âmbito de competência do tribunal da causa) da qual depende o julgamento que aqui importa efectuar. Em suma, e como refere o Prof. Alberto dos Reis (…), na situação prevista no art. 92º, “…o juiz reconhece-se incompetente em razão da matéria para conhecer da questão prejudicial…”, ao passo que, na situação prevista no art. 272º, “…não é por uma razão de incompetência que o juiz suspende a instância, é por uma razão de conveniência. Uma vez que está pendente a causa prejudicial, julga-se conveniente aguardar que ela seja decidida. O juiz da causa subordinada pode ser normalmente competente para decidir a causa prejudicial; mas como esta está proposta e o julgamento dela pode destruir a razão de ser da outra causa, considera-se razoável a suspensão da instância subordinada”.
Para que a suspensão possa ser decretada, ao abrigo da primeira parte do art. 272º, é necessário, em primeiro lugar, que exista uma outra causa/acção pendente e é necessário, em segundo lugar, que exista entre ambas as acções uma relação de dependência ou prejudicialidade.
Nas palavras do Prof. José Alberto dos Reis, “uma causa é prejudicial em relação a outra quando a decisão da primeira pode destruir ou modificar o fundamento ou a razão da segunda…”(…), referindo ainda que “sempre que numa acção se ataca um acto ou facto jurídico que é pressuposto necessário de outra acção, aquela é prejudicial em relação a esta”(…).
(…)
Entende-se, assim, por causa prejudicial aquela onde se discute e pretende apurar um facto ou situação que é elemento ou pressuposto da pretensão formulada na causa dependente, de tal forma que a resolução da questão que está a ser apreciada e discutida na causa prejudicial irá interferir e influenciar a causa dependente, destruindo ou modificando os fundamentos em que esta se baseia.”, (sublinhado nosso).
No caso sub judice, como ficou já dito, a publicação do aviso de cessação da vigência do CCT por caducidade, não foi entendida pelo Tribunal a quo como um pressuposto para que se verifique a caducidade do CCT, nem tinha forçosamente o mesmo tribunal que ter tido entendimento diverso (trata-se de “questão reconhecidamente controversa”) pelo que a ação instaurada pela Autora no Tribunal Administrativo de Braga, para a condenação da DGERT a efetuar tal publicação, não pode ser entendida como tendo subjacente uma questão essencial para o desfecho dos presentes autos, não sendo como tal prejudicial a estes.
Inclusivé, como se lê na decisão do Tribunal a quo “(…), torna-se de alguma forma incompreensível a reação à decisão administrativa de indeferimento, porquanto a prudência poderia justamente aconselhar o prosseguimento destes autos para, posteriormente, de acordo com o aqui determinado, se obter a dita publicação em BTE.”.
Em conformidade, improcede também nesta parte o recurso da Ré.
3.2.4. Caducidade do Contrato Coletivo de Trabalho:
Na sentença, a este propósito, além do mais, ficou referido:
« (…), considerando a data da denúncia, 25 de março de 2014, acima referida, a data em que foi comunicado o insucesso do processo negocial entre os contratantes à tutela (DGERT), 1 de outubro de 2015 (v. 19), o decurso dos prazos contidos nos números 3 e 4 do art.º 501.º, com o insucesso da intervenção externa nos 60 dias seguintes à citada comunicação em alcançar um acordo ou uma solução, verifica-se que realmente no dia 1 de dezembro de 2015 a CCT em causa caducou.
Invoca-se que o processo de mediação não chegou a findar porque não teriam ocorrido “novas comunicações e desde que o processo negocial esteja encerrado sem acordo - o que inclui ainda a mediação, se requerida -e não haja acordo sobre a passagem a arbitragem voluntária.”
O cumprimento do disposto no n.º 4 do art.º 501.º do CT, a inequivocidade da declaração da autora de que não vê viabilidade no processo de conciliação a encetar pela DGERT, refletida nas várias missivas que desse aquele cumprimento foram sendo remetidas à ré e à DGERT, e que culminou na missiva de 9 de dezembro de 2015 – inexistindo qualquer compulsividade na possibilidade de intervenção estadual no processo de mediação ou conciliação, mas tão somente uma extensão por 60 dias da sobrevigência do CCT para permitir uma qualquer atuação ministerial, nomeadamente de cariz político –, leva o tribunal a concluir que efetivamente a convenção em causa caducou no dia 1 de dezembro de 2015.
Não encontra o tribunal nesta solução qualquer retrocesso social a apreciar – desde logo atendendo à salvaguarda prevista no n.º 6 do art.º 501.º do CT –, ou inconstitucionalidade a conhecer – desde logo porque a sua inconstitucionalidade foi apreciada em sede de fiscalização no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 338/2010, publicado em Diário da República, 1.ª S. – N.º 216, de 8 de Novembro.
Não se vislumbra ainda fundamento legal ou constitucional para nesta sede considerar que as regras convencionais agora caducadas têm os seus efeitos protegidos por via de uma integração nos contratos individuais dos efeitos da convenção caducada.
Paralelamente, não descobre o tribunal nos factos apurados motivo para considerar que neste processo a autora não se comportou seriamente, com espírito negocial aberto, agindo em abuso de direito, na vertente de venire contra factum proprium.
Sobre a necessidade de publicação do aviso de caducidade por parte da DGERT e a recusa legítima desta nessa publicação, como já se mencionou nos autos, entende-se tal publicação como ausente de efeitos constitutivos sobre a caducidade do CCT, (…), pelo que nenhum efeito aqui se extrai dessa falta de publicação.”.
A a este propósito, concluiu em suma:
- A caducidade só é eficaz com a publicação, sendo a publicação um elemento necessário e constitutivo.
- O tribunal não podia considerar que o CCT caducou em 1/12/2015 (antes até do decurso do prazo mínimo de 5 anos previsto no 501º/1 após a última publicação) quando, em Junho de 2016, ainda decorriam negociações entre as partes para a revisão do CCT.
- Como “negociação” a lei (nº 3 do art. 501º) inclui, para além das negociações directas, a conciliação, a mediação e a arbitragem — e só depois de tudo terminado é válida a comunicação referida no nº 4 do artigo 501º.
- A douta sentença na sua leitura dos factos comete três erros: 1º erro: exclui na contagem dos prazos a intervenção externa nas negociações (conciliação e mediação); 2º erro: desconsidera o sucesso parcial da intervenção do DGERT que convenceu a Autora a apresentar uma nova proposta melhorada para revisão do CCT (o que aconteceu em 21 de Março de 2016) e, em 27/06/2016, convenceu as partes a prosseguirem as negociações directas; 3º erro: Para ser válida a comunicação formal exigida pelo nº 4 do artigo 501º, tinha de ocorrer uma nova comunicação após o encerramento do processo negocial que se mantinha em 27 de Junho de 2016 onde.
- Nos termos do artigo 278º do Código Civil, as partes estipularam que os efeitos deste CCT um termo temporal: cessariam no momento da sua substituição pelas partes, não sendo legítimo fazer cessar o contrato unilateralmente antes desse termo final livremente acordado.
- E foi esse o acordo celebrado pelas partes em não quererem que esse grupo de 10 matérias só podia ser substituído por acordo das partes e manter-se-iam em vigor até à sua substituição pelo que o tribunal de 1ª instância não podia afastar tal acordo, violando o direito à contratação colectiva.
- A caducidade desse acordo e da cláusula 2ª/4 do CCT é nula por violar o direito de negociação colectiva a que o Estado português está obrigado por força da Convenção nº 98 da OIT e artigo 8º da CRP.
- A caducidade desse acordo e da cláusula 2ª/4 do CCT é nula por violar os artigos 18º e os nºs 3 e 4 do artigo 56º da Constituição uma vez que o direito de contratação colectiva que constitui um direito fundamental, a que se aplica o regime do artigo 18º da CRP e a caducidade da convenção pelo artigo 501º não visa salvaguardar outro direito constitucional protegido — nem o legislador o disse, nem a douta sentença recorrida o invoca.
- Existe o princípio constitucional de proibição do retrocesso social. Percorrendo o texto normativo do CCT, podemos detectar dezenas de situações mais favoráveis aos trabalhadores que não constam do regime do Código do Trabalho e uma dezena com implicação directa no rendimento mensal do trabalhador que para a sobrevivência familiar necessita dos acréscimos monetários previstos no CCT.
- A caducidade do CCT (cessação unilateral) por aplicação do artigo 501º, ao implicar um retrocesso social e sendo uma violação do direito de negociação colectiva e da liberdade sindical, será inconstitucional se não for substituído por um outro que consagre medidas de idêntico grau.
- Ao requerer a caducidade dessas matérias, criando-se um vazio na negociação colectiva, a recorrente não age com a lealdade devida, defraudando as legitimas expectativas e a confiança gerada na Ré, nos sindicatos e nos trabalhadores beneficiados com este CCT — há um manifesto comportamento contraditório da autora que objectivamente viola o princípio da boa-fé e constitui um abuso de direito.
- Foram violadas, entre outras, as seguintes normas jurídicas: os artigos 8º, 18º e 56º da Constituição, as Convenções 98º e 154º da OIT, artigo 6º da Carta Social Europeia e artigos 278º, 334º, 401º e 406º do Código Civil.
Por seu turno a Autora nas contra alegações referiu, em síntese:
- A proposta de celebração de convenção colectiva de trabalho apresentada pela A. em 21-03-2016, por decisão que foi só sua, tem como pressuposto, que a negociação que se seguiu à denúncia do CCT estava irreversivelmente concluída e que o CCT tinha caducado.
- A apresentação dessa proposta e tudo o que a ela se seguiu, e que, com ela, possa estar relacionado, diz apenas respeito a um novo processo negocial destinado à celebração de uma convenção colectiva de trabalho.
- O processo negocial que resultou da denúncia do CCT terminou em 01.10.2015, quando a A. notificou a Ré e a DGERT, nos termos e para os efeitos do disposto no n° 4 do artigo 501° do Código do Trabalho (CT).
- Nessa mesma data, findou o período de sobrevigência previsto no nº 3 do artigo 501º do CT, iniciando-se o período adicional de 60 dias de sobrevigência até se operar a caducidade do CCT (art. 501º, nº 4, do CT).
- À luz do regime estabelecido no CT, o pressuposto primordial para a cessação de vigência por caducidade de uma CCT (que é um efeito dirigido à globalidade da convenção) é que haja uma declaração de denúncia e que essa declaração seja acompanhada de uma proposta negocial global (arts. 500º, nº 1 e 501º, nº 3 do CT).
Com a apresentação da proposta inicia-se o processo de negociação (art. 486º, nº 1, do CT), iniciando-se um prazo de 30 dias para a apresentação da resposta (art. 487º, nº 1, do CT).
Após esta fase, segue-se a de negociação directa que o CT deixa na disponibilidade das partes, não interferindo na sua tramitação, impondo apenas às partes o dever de negociar de boa-fé e com celeridade (art. 489º, nºs 1 e 2, do CT).
- Outro dos pressupostos que o CT impõe para que possa ocorrer a cessação de vigência do CCT é que se esgote o período de sobrevigência da convenção, durante o qual a convenção continua a produzir os seus efeitos enquanto se desenrola a negociação ou se promovam os mecanismos de conciliação, mediação ou arbitragem voluntária.
Esse regime de sobrevigência encontra-se regulado no artigo 501º do CT.
A fase da sobrevigência da convenção colectiva tem, pois, uma duração temporal limitada. Ela inicia-se no termo da vigência da convenção e cessará por uma de duas vias: pelo acordo das partes ou, na falta desse acordo, pela caducidade da convenção, que ocorre decorridos 60 dias após a comunicação da ruptura das negociações ao Ministério e à outra parte, devendo, em qualquer caso, esse prazo de 60 dias começar a contar decorridos dezoito meses sobre o início do regime de sobrevigência, para as situações previstas no art. 501º, nº 3, do CT.
- Em relação à fase inicial da sobrevigência, que é a que está em causa, não há, no entanto, qualquer obrigação para as partes negociarem ou, sequer, de desencadearem os processos de conciliação, arbitragem ou mediação, podendo mesmo recusar-se a negociar (v. g. 523, nº 3, al. b), do CT).
- Da factualidade alegada constata-se que a A. denunciou o CCT em 25-03-2014 e, apesar de a Ré não ter apresentado qualquer contraproposta, as negociações directas iniciaram-se a 15-10-2014. Tendo terminado, irreversivelmente, a 18-09-2015.
A 1-10-2015, dando cumprimento ao preceituado no art. 501º, nº 4, do CT, a A. notificou a Ré e a DGERT, dando notícia que o processo de negociação destinado à celebração de um contrato colectivo de trabalho se encontrava encerrado e, por essa via, o CCT do sector caducava, findo que fosse o prazo de 60 dias contados a partir dessa notificação.
Ou seja, com essa notificação iniciou-se a fase subsequente, mantendo-se o CCT em vigor por, apenas, mais 60 dias, ocorrendo, então, a sua caducidade.
Nas notificações em apreço, a A. teve o cuidado de explicitar que considerava não estarem reunidos os pressupostos mínimos que justificassem o recurso a um processo de conciliação, mediação ou arbitragem e, por conseguinte, não aceitava, nem aceitou, desencadear tais procedimentos.
Mais referiu que o processo de negociação se encontrava encerrado sem que tivesse sido possível celebrar-se uma nova convenção, sendo certo que estavam também decorridos os 18 meses de período mínimo da sobrevigência do CCT denunciado, pelo que se achavam cumpridos todos os pressupostos enunciados do nº 3 do artigo 501º do CT.
- O nº 3 do art. 501º do CT não impõe que a fase inicial de sobrevigência do CCT só cessaria desde que tivessem decorrido 18 meses, as partes tivessem tido negociações directas e tivessem sido desencadeados os procedimentos de conciliação, mediação e arbitragem.
- As negociações directas entre A. e Ré terminaram sem acordo 19-09-2014.
- Após o termo das negociações directas, A. e Ré não tiveram mais contactos nem efectuaram quaisquer diligências no sentido de despoletar qualquer processo de resolução extrajudicial do conflito.
- A 01-10-2015 a A. notificou a Ré a DGERT nos termos do nº 4 do art. 501º do CT. O prazo de 60 dias, contados sobre a comunicação (nº 6 do art. 501º do CT) é um prazo de caducidade e, de acordo com o art. 328º do CC, não se suspende nem se interrompe senão nos casos em que a lei expressamente o determine.
- O que o artigo 501º, nº 8, do CT, determina em relação a essa matéria é apenas e tão só que: “As partes podem acordar, durante o período de sobrevigência, a prorrogação da vigência da convenção por um período determinado, ficando o acordo sujeito a depósito e publicação”.
No caso dos autos, tal não ocorreu. Consequentemente, o prazo de 60 dias terminou em 30 de Novembro de 2015.
Assim se pondo termo ao regime de sobrevigência do CCT e operando-se a sua caducidade (art. 502º, nº 1, al. b)).
- A partir de 01-10-2015, todos os expedientes de que a Ré e a DGER se socorreram (conciliação e mediação) para tentarem “adiar” a caducidade do CCT, sobre serem abusivos, são inquestionavelmente ilícitos.
- Os prazos de vigência da convenção colectiva de trabalho estão contemplados no art. 499º do CT, sendo eles de dois tipos: (i) prazo convencional, quando estabelecido pelas partes; e (ii) prazo legal supletivo, no caso de não ter havido fixação de prazo.
- No que toca ao CCT celebrado entre A. e Ré, a cláusula 2ª, nº 3, estipulava que o clausulado vigorava por um período de dois anos e a tabela salarial e subsídio de refeição por um período inferior a esses dois anos.
- As partes não convencionaram qualquer modo de renovação do CCT.
- Face ao preceituado no nº 2 do artigo 501º do CCT, no termo do prazo de vigência, mantém-se ainda em regime de sobrevigência até que qualquer das partes o denuncie, mediante comunicação escrita dirigida à outra parte, acompanhada de proposta negocial (artigo 500º, nº 1, do CT).
- Depois de ter havido denúncia, a caducidade do CCT só pode operar depois de decorrido o período de vigência previsto nos nºs 3 e 4 do artigo 501º do CT.
- O nº 2 do artigo 500º do CT estabelece que não se considera denúncia a mera proposta de revisão de convenção, não determinando a aplicação do regime de sobrevigência e caducidade.
- Se as partes negociarem e acordarem qualquer revisão do clausulado o CCT, manter-se em vigor para além do período de vigência fixado.
- No que toca ao CCT celebrado entre A. e Ré, na publicação integral do texto ocorrida em 22-01-2011 no BTE nº 3, a cláusula 2ª, nº 3, estipulava que o clausulado vigorava por um período de dois anos e a tabela salarial e subsídio de refeição por um período inferior a esses dois anos.
- A A. denunciou o CCT em 25-03-2014 e deu cumprimento a todos os procedimentos exigidos para esse acto. Essa denúncia foi válida e cobrou imediatamente plena eficácia.
- Sendo esse acto – de natureza discricionária, unilateral, reptícia e não retroactivo - necessário e suficiente para se tivesse operado a cessação de vigência do CCT por caducidade.
- O que se pode extrair da cláusula 2ª é que, no seu nº 3, em matéria de vigência, o que as partes contratantes pretenderam foi apenas consagrar que todo o clausulado do CCT vigorasse por dois anos.
- No nº 4 e seguintes da cláusula 2ª o que se pretendeu foi apenas regular o processo de arbitragem, dele se excluindo algumas matérias.
- As regras estabelecidas no nº 4 e seguintes da cláusula 2ª valem apenas para uma eventual revisão do CCT, e enquanto não ocorrer a sua caducidade.
- O CT apenas prevê, em termos que não podem ser modificados pelos IRCT, a denúncia e a caducidade da convenção colectiva (ut arts. 501º e 502º do CT).
- A caducidade é uma causa extintiva e automática das situações jurídicas, reconduzindo à cessação de situações jurídicas em virtude da superveniência de um facto a que uma fonte de Direito atribuiu tal efeito.
- A fonte de Direito é o artigo 501º do CT, ao consagrar a caducidade da convenção colectiva (e não de parte ou partes dela) e da “cláusula de sobrevigência da convenção colectiva”, pelo que não é possível pretender-se, a um momento, que possa caducar apenas uma parte de uma convenção e, a outo momento, caduquem as suas restantes cláusulas.
- Inexistindo cláusula de sobrevigência do CCT, a sua denúncia e caducidade têm necessariamente de ser avaliados apenas à luz das disposições do artigo 501º, nºs 3, 4, 5, 6, 7, 8 e 9, do CT.
- Aa caducidade do CCT ocorreu em 1 de Dezembro de 2015.
- A caducidade opera independentemente da publicação do aviso; este limita-se a declarar e tornar público esse facto jurídico já ocorrido.
- O Tribunal Constitucional apreciou já a conformidade do artigo 501º do CT com os preceitos constitucionais, decidindo pela sua constitucionalidade.
Finalmente, o parecer do Ministério Público foi no sentido de a publicação do aviso é constitutiva da caducidade, pelo que esta não deve ser decretada.
Vejamos:
Antes de mais importa averiguar qual o regime jurídico a atender para se aferir do efeito extintivo da denúncia do CCT.
Para tal impõe-se efectuar uma breve excursão sobre os regimes que antecederam o actual, co que concerne ao âmbito temporal das convenções colectivas de trabalho.
Socorremo-nos para o efeito do Acórdão do S.T.J. de 13.10.2016, publicado na Colectânea de Jurisprudência, Ano XXIV, Tomo III/2016, página 208 e seguintes e disponível também in www.dgsi.pt, onde se lê:
“A evolução do regime legal português “demonstra uma tendência para sobrevalorizar a estabilidade da contratação colectiva, através da introdução de mecanismos que permitiram a perpetuação de instrumentos de regulamentação colectiva, através da introdução de mecanismos que permitiram a perpetuação de instrumentos de regulamentação coletiva e a cristalização dos respectivos regimes. “(…).
O Decreto-Lei nº 519-C1/79 de 29/12 (LRCT) estipulava no art. 11º, nº1 quwe “as convenções coletivas e as decisões arbitrais vigoram pelo prazo que delas constar expressamente”, determinando o nº2 do mesmo preceito que “o prazo de vigência não poderá ser inferior a dois anos...”.
Este prazo mínimo de vigência constituía apenas um limite à possibilidade de denúncia e alteração, uma vez que o nº5 do mesmo preceito estabelecia que aquelas “mantêm-se em vigor até serem substituídas por outro instrumento de regulamentação colectiva”, não podendo “ser denunciadas antes de decorridos vinte meses (artigo 16º, nº2), devendo a “Direcção-Geral do Trabalho” recusar o depósito de nova convenção “se não tiver decorrido o prazo mínimo legal de vigência da convenção que se visa alterar ou substituir” (art.24º, nº3, al. d).
Destas normas resulta a inexistência da caducidade pelo decurso do prazo de vigência, uma vez que a convenção colectiva se mantinha em vigor até ser substituída por outra, o que conduzia a “uma sobrevigência ou ultra-actividade potencialmente ilimitada da convenção (…).
Visando pôr cobro a “esta cristalização da contratação colectiva”, o Código do Trabalho de 2003 (aprovado pela Lei n.º 99/2003, de 27.08), “introduziu várias medidas tendentes a promover a renovação das convenções colectivas existentes e a instituir a revisão periódica destes instrumentos”(…).
Estabeleceu o legislador no art. 13º da Lei 99/2003:
Convenções vigentes
Os instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho negociais vigentes aquando da entrada em vigor do Código do Trabalho podem ser denunciados, com efeitos imediatos, desde que tenha decorrido, pelo menos, um ano após a sua alteração ou entrada em vigor.”.
“O objetivo desta norma era conferir à denúncia – ato discricionário, unilateral e não retroactivo, que faz cessar relações duradouras – uma eficácia imediata, ou seja, não obrigar, por exemplo, uma das partes, no caso de convenção colectiva com prazo, a esperar pelo termo deste, podendo, deste modo, mediante comunicação à outra parte denunciar o instrumento convencional vigente. Dito de outro modo: apesar da norma se referir à denúncia ‘com efeitos imediatos’, tal expressão não tinha a intenção de prejudicar a aplicação das regras decorrentes da denúncia” (…).
A Lei nº9/2006 de 20/03, veio, porém, estabelecer que ”a eficácia derrogatória da denúncia prevista no artigo 13.º da lei preambular do Código do Trabalho cessa, para os instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho ainda não denunciados, seis meses após a entrada em vigor da presente lei”.
Por outro lado, o CT/2003 estabeleceu no art. 541º, al. d), que “as convenções coletivas de trabalho devem, designadamente, regular o âmbito temporal, nomeadamente a sobrevigência e o prazo de denúncia”, devendo o prazo de vigência, caso exista, constar obrigatoriamente da convenção coletiva [art.523, al. f)], sendo de um ano o prazo mínimo de vigência (art. 556º, nº1).
Decorrido o prazo de vigência… a convenção coletiva renova-se nos termos nela previstos. Caso a matéria da renovação não tenha sido regulada a convenção renova-se sucessivamente por períodos de um ano até que seja denunciada. Ocorrendo a denúncia (…), a convenção colectiva renova-se por um período de um ano e, estando as partes em negociação, por novo período de um ano, mantendo-se em vigor, desde que se tenha iniciado a conciliação ou a mediação, até à conclusão do respectivo procedimento, não podendo a sua vigência durar mais de seis meses, após o que a convenção cessa os seus efeitos (art. 557º, na sua versão primitiva).
A Lei 9/2006 de 20/03 alterou o art. 557º do CT/2003, tendo alargado os prazos de sobrevigência da convenção. A par disso, ocorrida a caducidade da convenção, regime que foi mantido, acautelaram-se, preservando-os, diversos efeitos da convenção no âmbito dos contratos de trabalho dos trabalhadores por ela abrangidos (…).”Este diploma colocou, pois, o regime legal nesta matéria a meio caminho entre o regime da LRCT e o regime do Código do Trabalho de 2003, na versão originária, não sendo nem tão rígido como o primeiro nem tão flexível quanto o segundo”(…).
Este regime veio a ser alterado pela Lei 7/2009 de 12/02, que aprovou o CT/2009.
(…)”.
O regime de sobrevigência e caducidade da convenção colectiva ficou consagrado no artigo 501º do CT, nos seguintes termos:
«Artigo 501.º
Sobrevigência e caducidade de convenção colectiva
1 - A cláusula de convenção que faça depender a cessação da vigência desta da substituição por outro instrumento de regulamentação colectiva de trabalho caduca decorridos cinco anos sobre a verificação de um dos seguintes factos:
a) Última publicação integral da convenção;
b) Denúncia da convenção;
c) Apresentação de proposta de revisão da convenção que inclua a revisão da referida cláusula.
2 - Após a caducidade da cláusula referida no número anterior, ou em caso de convenção que não regule a sua renovação, aplica-se o disposto nos números seguintes.
3 - Havendo denúncia, a convenção mantém-se em regime de sobrevigência durante o período em que decorra a negociação, incluindo conciliação, mediação ou arbitragem voluntária, ou no mínimo durante 18 meses.
4 - Decorrido o período referido no número anterior, a convenção mantém-se em vigor durante 60 dias após qualquer das partes comunicar ao ministério responsável pela área laboral e à outra parte que o processo de negociação terminou sem acordo, após o que caduca.
5 - Na ausência de acordo anterior sobre os efeitos decorrentes da convenção em caso de caducidade, o ministro responsável pela área laboral notifica as partes, dentro do prazo referido no número anterior, para que, querendo, acordem esses efeitos, no prazo de 15 dias.
6 - Após a caducidade e até à entrada em vigor de outra convenção ou decisão arbitral, mantêm-se os efeitos acordados pelas partes ou, na sua falta, os já produzidos pela convenção nos contratos de trabalho no que respeita a retribuição do trabalhador, categoria e respectiva definição, duração do tempo de trabalho e regimes de protecção social cujos benefícios sejam substitutivos dos assegurados pelo regime geral de segurança social ou com protocolo de substituição do Serviço Nacional de Saúde.
7 - Além dos efeitos referidos no número anterior, o trabalhador beneficia dos demais direitos e garantias decorrentes da legislação do trabalho.
8 - As partes podem acordar, durante o período de sobrevigência, a prorrogação da vigência da convenção por um período determinado, ficando o acordo sujeito a depósito e publicação.
9 - O acordo sobre os efeitos decorrentes da convenção em caso de caducidade está sujeito a depósito e publicação.”, (sublinhado nosso).
Este artigo 501º, foi alterado pela Lei nº55/2014 de 25/08, que não é aplicável à convenção em causa nestes autos, como estabelecido no seu art. 4º, uma vez que a mesma, como vem provado, foi denunciada antes de 31 de maio de 2014, ou seja em 25.03.2014 (data do recebimento da denúncia pela Ré), tratando-se de uma declaração recetícia).
Continuando a acompanhar o citado Acórdão do STJ:
“A questão que de imediato se coloca é a de saber se o disposto no transcrito art.501º é aplicável à convenção dos autos.
Estabelece o art. 7º, nº1, da Lei 7/2009 de 12/02: ”Sem prejuízo do disposto no presente artigo e nos seguintes, ficam sujeitos ao Regime do Código do Trabalho aprovado pela presente lei os contratos de trabalho e os instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho celebrados ou adotados antes da entrada em vigor da referida lei, salvo quanto a condições de validade e a efeitos de factos ou situações totalmente passados anteriormente aquele momento.”.
Parece-nos indubitável que, não estando em causa como efectivamente não estão, quaisquer condições de validade ou efeitos de factos ou situações totalmente passados anteriormente a 17 de Fevereiro de 2009, data da entrada em vigor da Lei 7/2009 e do Código de Trabalho por ela aprovado, será aplicável ao caso o regime estabelecido no transcrito art. 501º.
É certo, porém, que o diploma em causa consagrou no seu art. 10º um “regime transitório de sobrevigência e caducidade de convenção coletiva“, mas que não é aplicável à convenção dos autos, (…)”.
É esta a redacção do mesmo artigo 10º da Lei 7/2009:
«Artigo 10.º
Regime transitório de sobrevigência e caducidade de convenção colectiva
1 - É instituído um regime específico de caducidade de convenção colectiva da qual conste cláusula que faça depender a cessação da sua vigência de substituição por outro instrumento de regulamentação colectiva de trabalho, de acordo com os números seguintes.
2 - A convenção colectiva caduca na data da entrada em vigor da presente lei, verificados os seguintes factos:
a) A última publicação integral da convenção que contenha a cláusula referida no n.º 1 tenha entrado em vigor há, pelo menos, seis anos e meio, aí já compreendido o período decorrido após a denúncia;
b) A convenção tenha sido denunciada validamente na vigência do Código do Trabalho;
c) Tenham decorrido pelo menos 18 meses a contar da denúncia;
d) Não tenha havido revisão da convenção após a denúncia.
3 - A convenção referida no n.º 1 também caduca, verificando-se todos os outros factos, logo que decorram 18 meses a contar da denúncia.
4 - O disposto nos n.os 2 e 3 não prejudica as situações de reconhecimento da caducidade dessa convenção reportada a momento anterior.
5 - O aviso sobre a data da cessação da vigência da convenção é publicado:
a) Oficiosamente, caso tenha havido requerimento anterior cujo indeferimento tenha sido fundamentado apenas na existência da cláusula referida no n.º 1;
b) Dependente de requerimento, nos restantes casos.».
Ora, o CCT celebrado entre a Autora e a Ré foi publicado no Boletim do Trabalho e Emprego (BTE), 1.ª série, nº 42, de 15 de novembro de 2006 e foi objeto de diversas alterações, publicadas sucessivamente no BTE, 1.ª série, n.º 8, de 29 de fevereiro de 2008, n.º 3, de 22 de janeiro de 2011 e n.º 35, de 22 de setembro de 2011, (item 4 dos factos assentes).
«A cláusula 2ª do CCT, epigrafada de “Vigência e denúncia”, estabelecia que:
“1 - Este contrato entra em vigor cinco dias após a publicação no Boletim do Trabalho e Emprego.
2 - A tabela salarial e o subsídio de refeição (anexos VII e VIII), independentemente da data da sua publicação, produzem efeitos a partir de:
Tabela I - 1 de Janeiro de 2010 até 30 de Junho de 2010;
Tabela II - 1 de Julho de 2010 até 31 de Dezembro de 2010.
3 - O restante clausulado vigorará por um período de dois anos.
4 - As matérias a seguir indicadas estão excluídas do âmbito da arbitragem, só podendo ser revistas por acordo e mantendo-se em vigor até serem substituídas pelas partes:
a) Capítulo I - área, âmbito, vigência e denúncia;
b) Capítulo II - admissão e carreira profissional;
c) Capítulo III - direitos, deveres e garantias das partes;
d) Capítulo IV prestação do trabalho;
e) Capítulo VI - retribuição do trabalho, salvo tabela salarial e subsídio de refeição;
f) Capítulo VII - suspensão do contrato de trabalho;
g) Capítulo VIII — segurança, higiene e saúde no trabalho;
h) Capítulo IX - formação profissional;
i) Capítulo XIV - livre exercício da atividade sindical;
j) Anexos I, II, III, IV e V relativos às categorias profissionais;
5 - A arbitragem voluntária é requerida por acordo das partes e será realizada por três árbitros, um indicado pela C… e outro indicado pela Ré. O terceiro árbitro será sorteado de uma lista conjunta de seis árbitros.
6 - No prazo de seis meses cada uma das partes indicará à outra os nomes de três árbitros para a lista conjunta.
7 - No prazo de 30 dias e para efeitos do disposto no n.º 6 desta cláusula, cada parte pode vetar um ou mais dos árbitros indicados pela outra parte, que deverão ser substituídos no prazo de 15 dias.
8 - Na falta de nomeação, o terceiro árbitro será sorteado da lista oficial da concertação social.
9 - Nos quatro anos após a publicação do presente contrato, as matérias relativas ao Clausulado não podem ser submetidas à arbitragem voluntária ou obrigatória, no intuito da consolidação do contrato coletivo de trabalho.”» (item 8 dos factos assentes, realce nosso)).
Ou seja, não há que aplicar-se o regime transitório uma vez que o CCT em causa não incluia nenhuma cláusula que fizesse depender a cessação da sua vigência de substituição por outro instrumento de regulamentação colectiva.
Afere-se assim ser aplicável ao caso o estatuído no transcrito artigo 501º do CT/2009.
Assim foi também entendido pelo Tribunal a quo na sentença.
Relativamente à invocada pela Ré violação do direito à contratação colectiva e inconstitucionalidade deste preceito, tal como referido na sentença, o Tribunal Constitucional pronunciou-se já a esse respeito, concluindo no Acórdão nº338/2010, publicado no D.R. 1ª série, nº216, de 08.11. que “o artigo 501.º do Código do Trabalho e o artigo 10.º da Lei n.º 7/2009, não violam o direito de contratação colectiva (artigo 56.º, n.ºs 3 e 4, da Constituição) não padecendo, por isso, de qualquer vício de inconstitucionalidade.”, (sublinhado nosso).
Igualmente se nos afigura não existir qualquer comportamento contraditório da Autora que viole o princípio da boa-fé ou traduza um abuso do direito ao ter despoletado o processo tendo em vista a caducidade do CT, já que tal atuação teve respaldo no citado artigo 501º do CT/2009.
Por último, não se equaciona a ocorrência de retrocesso social atento o previsto no nº 6 do mesmo artigo 501º, onde expressamente se prevê:
«Após a caducidade e até à entrada em vigor de outra convenção ou decisão arbitral, mantêm-se os efeitos acordados pelas partes ou, na sua falta, os já produzidos pela convenção nos contratos de trabalho no que respeita a retribuição do trabalhador, categoria e respectiva definição, duração do tempo de trabalho e regimes de protecção social cujos benefícios sejam substitutivos dos assegurados pelo regime geral de segurança social ou com protocolo de substituição do Serviço Nacional de Saúde.», (sublinhado e realces nossos).
O Tribunal a quo decidiu ainda, depois de cotejar a cláusula 2ª do CTT, e de acordo com o defendido pela Autora a respeito da por si invocada caducidade deste último que o n.º 4 da mesma cláusula, “tem como finalidade primordial destrinçar as matérias afastadas do âmbito arbitral, cingindo a admissibilidade da sua alteração aos mecanismos aí previstos, de revisão por acordo ou por nova convenção substitutiva, porquanto, à exceção do previsto no n.º 2, todo o clausulado teria como limite de vigência os dois anos estatuídos no n.º 3, (…)”.
Desde já se refere que também interpretamos o nº 9 da cláusula 2ª do CTT no sentido de não resultar da mesma que foi propósito das partes que o clausulado vigorasse por um período mínimo de quatro anos. Antes e tão só visaram aquelas excluir da arbitragem voluntária ou obrigatória, as matérias relativas ao clausulado, prevendo-se sim, como claramente resulta do nº3 da mesma cláusula que com exceção do previsto no nº2, o restante clausulado vigorará por um período de dois anos.
Igualmente acompanhamos a interpretação do nº4 da cláusula 2ª do CTT a que chegou o Tribunal a quo.
Lê-se no mesmo segmento da sentença o seguinte:
“No que se refere ao teor da cláusula em causa, (…) n.º 4, a sua leitura aponta desde logo para a conclusão de que as matérias aí contidas, pela sua relevância, têm reservado um tratamento específico, “mantendo-se em vigor até serem substituídas pelas partes”, que demanda a presença de um acordo direto entre as partes, e não arbitrado, para a sua modificação.
E é efetivamente no campo do afastamento do regime arbitral, com interferência de terceiros, árbitros, que o n.º 4 da cláusula deve ser lido e sobretudo conjugado com os números seguintes, também referentes ao processo arbitral”, (sublinhado nosso).
Vejamos então se pode concluir-se pela caducidade do CTT, aquilatando ainda da valia da denúncia do CTT efetuada pela Autora, enquanto facto jurídico conducente à caducidade.
Na verdade, da matéria assente resulta que:
- O CCT foi publicado no Boletim do Trabalho e Emprego (BTE), 1.ª série, nº 42, de 15 de novembro de 2006 e foi objeto de diversas alterações, publicadas sucessivamente no BTE, 1.ª série, n.º 8, de 29 de fevereiro de 2008, n.º 3, de 22 de janeiro de 2011 e n.º 35, de 22 de setembro de 2011.
- 8. A cláusula 2ª do CCT, epigrafada de “Vigência e denúncia”, estabelecia que:
“1 - Este contrato entra em vigor cinco dias após a publicação no Boletim do Trabalho e Emprego.
2 - A tabela salarial e o subsídio de refeição (anexos VII e VIII), independentemente da data da sua publicação, produzem efeitos a partir de:
Tabela I - 1 de Janeiro de 2010 até 30 de Junho de 2010;
Tabela II - 1 de Julho de 2010 até 31 de Dezembro de 2010.
3 - O restante clausulado vigorará por um período de dois anos.
4 - As matérias a seguir indicadas estão excluídas do âmbito da arbitragem, só podendo ser revistas por acordo e mantendo-se em vigor até serem substituídas pelas partes:
a) Capítulo I - área, âmbito, vigência e denúncia;
b) Capítulo II - admissão e carreira profissional;
c) Capítulo III - direitos, deveres e garantias das partes;
d) Capítulo IV - prestação do trabalho;
e) Capítulo VI - retribuição do trabalho, salvo tabela salarial e subsídio de refeição;
f) Capítulo VII - suspensão do contrato de trabalho;
g) Capítulo VIII - segurança, higiene e saúde no trabalho;
h) Capítulo IX - formação profissional;
i) Capítulo XIV - livre exercício da atividade sindical;
j) Anexos I, II, III, IV e V relativos às categorias profissionais.
5 - A arbitragem voluntária é requerida por acordo das partes e será realizada por três árbitros, um indicado pela C… e outro indicado pela Ré. O terceiro árbitro será sorteado de uma lista conjunta de seis árbitros.
6 - No prazo de seis meses cada uma das partes indicará à outra os nomes de três árbitros para a lista conjunta.
7 - No prazo de 30 dias e para efeitos do disposto no n.º 6 desta cláusula, cada parte pode vetar um ou mais dos árbitros indicados pela outra parte, que deverão ser substituídos no prazo de 15 dias.
8 - Na falta de nomeação, o terceiro árbitro será sorteado da lista oficial da concertação social.
9 - Nos quatro anos após a publicação do presente contrato, as matérias relativas ao Clausulado não podem ser submetidas à arbitragem voluntária ou obrigatória, no intuito da consolidação do contrato coletivo de trabalho.”
- A carta onde a Autora denunciou o CCT foi recebida pela Ré em 25.03.2014, (itens 11 e 12).
- A instâncias da Autora, em 15.10.2014, encetaram-se negociações entre as partes, destinadas à celebração de um novo CCT, não tendo na última reunião realizada em 18.09.2015, sido possível o acordo para o efeito (itens 15º e 16º).
- As cartas onde a Autora notificou a Ré e a DGERT que o processo de negociação terminou sem acordo e de que o mesmo se encontrava encerrado, caducando o CTT, findo o prazo de 60 dias contados a partir de tais notificações, foram por estas últimas recebidas em 01.10.2015, (itens 18 e 19);
- Por carta datada de 07.10.2015 e recepcionada por telecópia nesse dia e a 09.10.2015 por via postal, a Ré comunicou à Autora que ia requerer a conciliação, tendo esta por carta datada de 08.10.2015 e recebida pela Ré a 12.10.2015, respondido a reiterar que não aceitava o processo de conciliação, (itens 23º e 24º).
- No prazo de 60 dias, contados desde 01.10.2015, o ministro responsável pela área laboral, não notificou as partes para acordarem os efeitos decorrentes da convenção, após a caducidade, (item 22).
- Não houve acordo entre as partes sobre os efeitos decorrentes da convenção após a sua caducidade, (item 21).
De tal factualidade resulta que a denúncia que desencadeou o processo para a caducidade do CCT, foi efectuada pela Autora em 25.03.2014, decorrido o referido prazo estipulado de vigência de dois anos, previsto na cláusula 2ª, nº3 (supra transcrita).
Ou seja, a denúncia determinou a entrada imediata do CCT em regime de sobrevigência uma vez que terminara já o prazo de vigência convencionado.
Melhor dito, aquando da denúncia o CTT estava já em sobrevigência.
Como refere António Monteiro Fernandes, in Direito Do Trabalho, 17ª edição, página 747, citado na nota 16 do referido Acórdão do STJ de 29.09.2016, “Parece dever entender-se que este prazo [18 meses – artigo 501º/3] se conta a partir da data da denúncia (isto é, da receção dela [pelo] destinatário), pois é esse o momento-chave para o desencadeamento do processo que pode conduzir à substituição ou à caducidade da convenção. Mas essa ‘leitura’ está subordinada à condição de que tenha decorrido o prazo de vigência estipulado ou, na sua falta, o prazo supletivo do art.499º/2 – isto é, em suma, que a convenção se encontra já em sobrevigência”.
Por outro lado, atento o disposto no transcrito artigo 501º, nº4 do CT/2009 (versão aplicável) e estando provado que na sequência da denúncia efectuada pela Autora e recebida pela Ré em 25.03.2014, decorreram negociações entre as partes tendo em vista a celebração de um novo CTT, sem que tal se tenha logrado, tendo a Autora comunicado o insucesso do processo negocial por cartas recebidas pela Ré e pela DGERT em 01.10.2015, a conclusão a que chegamos é a de que volvidos 60 dias, isto é, no dia 01 de dezembro de 2015, o CCT caducou.
A tal não obsta, o facto de a Ré por carta datada de 07.10.2015, ter comunicado à Autora que ia requerer a conciliação, uma vez que o insucesso do processo negocial, havia já sido nessa altura manifestado por aquela última à tutela e à Ré.
O entendimento diverso, permitiria como refere a Autora, protelar indefinidamente um processo de conciliação que a própria lei prevê seja balizado no tempo, ainda que instituindo um prazo/limite mínimo para o efeito (artigo 501º, nºs 3 e 4 do CT/2009, redação aplicável).
Provou-se, porém, que a DGERT rejeitou a publicação do aviso de caducidade.
Preceitua o artigo 502.º do CT 2009:
1 - A convenção colectiva pode cessar:
a) Mediante revogação por acordo das partes;
b) Por caducidade, nos termos do número anterior.
(…)
4 – O Serviço competente do ministério responsável pela área laboral procede à publicação no Boletim do Trabalho e Emprego de aviso sobre a data da cessação de vigência de convenção colectiva, nos termos do número anterior”, (sublinhado nosso).
Ora, pugna a , em sede do presente recurso, não ser possível concluir-se pela caducidade do CTT porque a caducidade só é eficaz com a publicação, sendo a publicação um elemento necessário e constitutivo.
Tal, refere, é a mais recente interpretação jurisprudencial (unânime) do artigo 501º do CT (acórdãos da Relação de Lisboa de 17/02/2016, de 30/11/2016 e de 11/01/2017).
A este respeito, alegou a Autora que o efeito extintivo decorrente da caducidade ocorre independentemente de o aviso da cessação de vigência da convenção colectiva ser publicado, aduzindo para tal que:
Visando manifestamente uma finalidade publicistica, o Aviso em questão insere-se nessa categoria ampla de registos públicos.
Ao publicar o Aviso, a Administração Publica (em concreto, a DGERT) não visa (nem tão pouco está investida no correspondente poder jurídico) extinguir o CCT, limitando-se a declarar e a reconhecer um facto jurídico pré-existente.
A extinção por caducidade de um CCT não tem a sua causa na publicação do Aviso, o qual não produz efeitos jurídicos próprios, sendo puramente instrumental em relação ao facto jurídico que está na sua origem (denúncia do CCT) e seus efeitos jurídicos (a caducidade do mesmo CCT).
O efeito extintivo de um CCT decorre, directa e exclusivamente da lei, uma vez denunciada a convenção, encerrado o processo negocial e cumprida a notificação referida no n.º 4 do artigo 501.º do CT 2009.
O efeito extintivo automático que pontifica no instituto da caducidade encontra o seu fundamento em razões objectivas de certeza e de segurança jurídica.
O nº 4 do artigo 502º do CT 2009 apenas habilita a DGERT a declarar a data da cessação da convenção colectiva.
A publicação do acto só é requisito de eficácia nos casos excepcionais expressamente previstos na lei, pelo que nada se prescrevendo quanto à caducidade, esta forma de cessação vale independentemente da publicação do aviso.
Sendo o aviso publicado em momento necessariamente posterior ao da verificação do facto jurídico (caducidade) por ele publicitado, ver nessa comunicação uma condição de eficácia teria a consequência insustentável de se lhe atribuir um efeito retroactivo, o qual é inconciliável com a regra legal de que a caducidade opera imediata e automaticamente por força da lei.
A atribuição de um efeito constitutivo ao aviso tem como consequência inevitável que no período de tempo compreendido entre a ocorrência da caducidade da convenção colectiva e a publicação haja uma situação de vazio legal.
Se, em matéria de caducidade da convenção colectiva, a vontade do legislador fosse a de atribuir ao aviso o valor de eficácia constitutiva, tê-lo-ia expressamente dito, à semelhança do que consignou relativamente à elaboração e revogação dos instrumentos de regulamentação colectiva.
O Ministério Público emitiu parecer no sentido de que não deve ser decretada a caducidade do CCT, aderindo à tese jurisprudencial de que a publicação do aviso é constitutiva da caducidade, pelo que só depois de efectuada se produz o correspondente efeito.
Na sentença a este respeito ficou referido:
“Sobre a necessidade de publicação do aviso de caducidade por parte da DGERT e a recusa legítima desta nessa publicação, como já se mencionou nos autos, entende-se tal publicação como ausente de efeitos constitutivos sobre a caducidade do CCT, (…), pelo que nenhum efeito aqui se extrai dessa falta de publicação.”.
A questão, já catalogada como controversa, em análise, incide em apreciar-se se tem natureza constitutiva ou meramente declarativa a publicação do aviso de caducidade de convenção colectiva.
Trata-se pois de aferir sobre o momento da eficácia da caducidade de tal instrumento.
O artigo 502º, nº4 do CT de 2009, prevê a publicação de aviso sobre a data da cessação de vigência de convenção colectiva, no Boletim do Trabalho e Emprego pelo Serviço competente do ministério responsável pela área laboral.
Conforme é referido no recente Acórdão da Relação de Évora de 15.02.2018, (in www.dgsi.pt),Tribunal da Relação de Évora, “ (…) a jurisprudência que se conhece vem entendendo (…) que a publicação do aviso da caducidade é condição da sua eficácia: assim se decidiu, designadamente, nos acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa de 17-02-2016, de 30-11-2016 e de 11-01-2017 (Procs. n.ºs 8303/14.0T8LSB-L1-4, 1748/14.8T8CSC.L1-4 e 6106/15.4T8SNT-4, respectivamente, encontrando-se os dois últimos disponíveis em www.dgsi.pt)”, (sublinhado nosso).
No mesmo acórdão da Relação de Évora, sobre a doutrina, é feita referência ao entendimento do Prof. Doutor Romano Martinez, o qual “(…) sustenta que a não publicação do aviso de caducidade do CCT não é impeditiva da produção da sua eficácia, ou seja, entende que a caducidade opera automaticamente”.
Mais concretamente a um parecer do mesmo Autor, no qual são aduzidos “(…) no essencial, três argumentos: (i) ao contrário do que se verifica noutras situações, no caso da caducidade a lei não faz qualquer divisão entre validade e eficácia, pelo que verificando-se a caducidade do IRCT, a falta de publicação da mesma não impede a produção dos seus efeitos; (ii) a lei, maxime nos n.ºs 1 do artigo 519.º e n.º 2 do artigo 502.º, ambos do Código do Trabalho, condiciona a eficácia dos actos à sua publicação e aí se prevê especificamente quanto à elaboração de instrumentos de regulamentação colectiva e respectiva revogação, mas não à caducidade; (iii) a referida publicação é uma incumbência da DGERT, que não pode ter consequências para os interessados, tanto mais que se trata de um aviso que dá publicidade de situações ocorridas no passado, não tendo efeitos retroactivos e não precludindo a produção de efeitos”.
Não nos afastamos, porém, daquele que tem sido o entendimento da jurisprudência já citada, cuja fundamentação foi cirurgicamente coligida no referido acórdão da Relação de Évora de 15.02.2018 e que transcrevemos aqui por nada mais termos a acrescentar à mesma.
“Escreveu-se no referido acórdão de 30-11-2016:
«Sendo esta uma questão reconhecidamente controversa, cremos poder dizer que as referidas razões de certeza e segurança jurídicas apontam para que se considere a publicação do aviso da caducidade como constitutiva, relevando, não o esqueçamos, a circunstância do CCT também ser um repositório de normas dirigidas a um universo pessoal que transcende o dele subscritor e que, a ser de outro modo, ficaria praticamente impossibilitado de a conhecer.[…]
Por outro lado, a equiparação da relevância entre o início dos efeitos do IRC e o da sua cessação é por demais evidente, o que de resto vem assim evidenciado por Luís Gonçalves da Silva: "A suspensão e a revogação estão sujeitas a depósito, bem como a publicação no Boletim do Trabalho e Emprego (n.º 4 do artigo 502.º, cfr. anotação aos artigos 494.º, 495.º e 519.º), o que facilmente se compreende, uma vez que se trata de suspender ou fazer cessar os efeitos da convenção, cuja relevância é idêntica ao início de vigência";[…] daí que, conclui, "isso mesmo explica que o aviso de cessação seja também publicado no Boletim do Trabalho e Emprego (n.º 6)".[…]».
Reforçando tal entendimento, escreveu-se no também já referido acórdão do mesmo tribunal, de 11-01-2017:
« [O] Artº 519º/1 do CT faz depender a eficácia do instrumento de regulamentação coletiva da sua publicação no Boletim do Trabalho e Emprego. Por outro lado, sendo certo que o Artº 502º/2 apenas reporta à necessidade de publicação da revogação, também é evidente que no nº 4 se reporta à publicação do aviso sobre a data da cessação da vigência de convenção coletiva, cessação de vigência que, como já tivemos ocasião de expressar, ocorre por uma de duas vias - revogação ou caducidade (Artº 502º/1). Situação distinta ocorria em presença do Código de 2003 no qual se prescrevia que os instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho, bem como a revogação, são publicados no Boletim do Trabalho e Emprego (Artº 581º). Já então Monteiro Fernandes anunciava que a lei se preocupava “com a certeza do momento em que as convenções cessam a sua vigência”, razão pela qual “o CT incumbe o Ministério do Trabalho de publicar avisos de que constem as respetivas datas” (Direito do Trabalho, 12ª edição, Almedina, 798). Assim, introduzida, em 2009, nova forma de cessação de vigência idêntica preocupação se deve manter».
Embora numa solução não isenta de dúvidas, atendendo, por um lado, que resultando dos normativos constantes das citações que antecedem a equiparação da relevância entre o início dos efeitos do IRCT e o da sua cessação e, por outro, a necessidade de certeza e segurança jurídica, entende-se que a caducidade do IRCT só se tornará eficaz com essa mesma publicação.
Sendo a convenção colectiva uma fonte laboral específica de direito do trabalho, isto é, um modo particular de revelação de regras laborais na ordem jurídica, constituindo um instrumento por excelência do exercício da autonomia colectiva, que revela regras jurídicas aplicáveis às situações laborais e colectivas que existem ou que venham a constituir-se no âmbito da sua esfera de incidência própria, as cláusulas que a compõem revestem as características de generalidade e abstracção típicas da norma jurídica (cfr. Maria do Rosário Palma Ramalho, Direito do Trabalho, Parte I, 2.ª Edição, Almedina, págs. 241-242).
Dito de outro modo: a convenção colectiva contém regras gerais e abstractas aplicáveis a um universo indeterminado de destinatários, tanto mais quando a mesma, por via de portaria de extensão, se aplica a empregadores e trabalhadores não filiados nas entidades outorgantes.
Ora, até por causa da(s) portaria(s) de extensão (…) mais imperiosa se torna a publicação da caducidade do CCT: de outro modo, os sujeitos abrangidos pelo CCT, designadamente por virtude de portaria de extensão, ficam sem saber se o mesmo ainda lhes é ou não aplicável».
No caso concreto, como ficou já expresso a caducidade do CCT ocorreu em 01 de Dezembro de 2015.
Não obstante, a DGERT não procedeu à publicação do aviso de caducidade.
Assim e nada tendo sido estipulado pelas partes sobre os efeitos da caducidade do CCT e considerando a fundamentação transcrita e jurisprudencialmente assumida, a conclusão a que chegamos só pode ser a de que a falta da publicação do aviso de caducidade compromete a eficácia desta última.
Em conformidade, tem de improceder a pretensão da Autora para que os efeitos da caducidade do CTT se produzirem desde 01 de dezembro de 2015.
Ao invés, a caducidade do CCT operará tão só com e após a respetiva publicação.
De resto, a Autora acionou já via de reação de natureza administrativa, tendo em vista assegurar a concretização de tal publicação (itens 66º e 67º da factualidade assente).
4. Dispositivo:
Em conformidade com tudo o exposto, julga-se parcialmente procedente o recurso interposto pela Ré, revogando-se também parcialmente a sentença recorrida, e em conformidade:
a) Declara-se que o Contrato Coletivo de Trabalho celebrado entre a Autora e a Ré, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego (BTE), 1.ª série, nº 42, de 15 de novembro de 2006, com as suas subsequentes alterações, publicadas sucessivamente no BTE, 1ª série, nº 8, de 29 de fevereiro de 2008, nº 3, de 22 de janeiro de 2011 e nº 35, de 22 de setembro de 2011, no BTE, 1ª série, nº 3, de 22 de janeiro de 2011, onde se procedeu à revisão global do CCT, com a alteração publicada no BTE 1ª série nº 35, de 22 de setembro de 2011, caducou em 01 de Dezembro de 2015;
b) Os efeitos da caducidade do mesmo Contrato Coletivo de Trabalho, operam com e após a respetiva publicação.
Custas pela Autora e pele Ré, na proporção de metade.
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Porto, 11 de Outubro de 2018.
Teresa Sá Lopes
Fernanda Soares
Domingos Morais