Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
1126/10.8TAVNF-A.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: MARIA DOLORES DA SILVA E SOUSA
Descritores: REGULAMENTO DAS CUSTAS PROCESSUAIS
RECLAMAÇÃO DA CONTA
RECURSO
REGIME APLICÁVEL
Nº do Documento: RP20140701021126/10.8TAVNF-A.P1
Data do Acordão: 07/02/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: DECISÃO SUMÁRIA
Decisão: NAO ADMITIDO O RECURSO
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I – O requerimento apresentado, prolatada a sentença, na sequência de notificação da secretaria para os efeitos do disposto no art.º 15º, n.º 2 do Regulamento das Custas Processuais, por discordar da aplicação da Tabela I-A, anexa ao referido RCP, é de considerar como incidente da reclamação da conta - art.º 29º, n.ºs 4 e 5 do RCP.
II - Da decisão do incidente de reclamação cabe recurso, em um grau, se o montante exceder o valor de 50 Ucs, por ser aplicável à reclamação, não o regime previsto no n° 5 do artigo 157° do CPC, mas o previsto quanto à reclamação da conta de custas, nos termos da legislação sobre custas.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Decisão sumária no proc. 1126/10.8TAVNF-A.P1
Vila Nova de Famalicão.

I.Relatório.
No Proc. n.º 1126/10.8TAVNF do 1º Juízo de competência criminal do Tribunal Judicial de Vila Nova de Famalicão, foi proferida a seguinte decisão judicial:
«Fls. 557 e ss.
Não assiste razão ao requerente quando aplica a tabela I-B para cálculo da taxa de justiça devida, uma vez que o pedido de indemnização civil integra uma verdadeira acção civil, embora enxertada no processo penal, e por isso segue o regime geral estatuído no art. 6º, n.º1 e não pelo art. 12º, nº do RCP.
Os processos previstos na alínea c), do n.º1, do art. 12º, do contencioso da segurança social, referem-se aos litígios dali referidos, onde não se incluem os presentes autos e inscrevem-se aliás na ordem da competência de outros tribunais, como tribunais de trabalho, tribunais administrativos, etc.
Face ao exposto, indefere-se o requerido.
Notifique.»
2. Inconformado com esta decisão dela recorre o Instituto da Segurança Social – I.P. com motivação que consta a 44 a 50 dos presentes autos, a qual remata com as seguintes conclusões:
1.Nos presentes autos, o Instituto da Segurança social, IP/Centro Distrital de Braga deduziu pedido de indemnização civil no montante de € 32.340,55 (trinta e dois mil trezentos e quarenta euros e cinquenta e cinco cêntimos), valor respeitante a quotizações retidas nos salários pagos aos trabalhadores e aos corpos gerentes e não entregues ao Centro Distrital, acrescido dos respectivos juros de mora vencidos até integral pagamento.
2. Por despacho judicial foi admitido o pedido cível formulado.
3.Atento o disposto no art. 15º, 1, d) do RCP, o ora Recorrente não procedeu ao pagamento de taxa de justiça aquando da dedução do pedido de indemnização civil, tendo-a pago logo que notificado para o efeito.
4. O valor da taxa a pagar foi calculado de acordo com a Tabela I-B, atento o disposto no art. 12º, 1, c) do RCP, tendo o ISS liquidado a quantia de € 306,00 (trezentos e seis euros) correspondente a 3 UC,
5 Foi o ISS notificado em 18/03/2014 do despacho de 06/03/2014 que determinou o pagamento da taxa de justiça, nos termos da tabela I-A, ou seja, o pagamento de 6 UC,
6. Despacho este de que agora se recorre.
7 Entende o ISS, que a interpretação efectuada daquele preceito legal e os pressupostos de direito em que o douto despacho assentou não será a correcta.
8. O RCP refere no nº 1 do art. 6º, com a epígrafe "regras gerais" que "A taxa de justiça corresponde ao montante devido pelo impulso processual do interessado e é fixada em função do valor e complexidade da causa de acordo com o presente Regulamento, aplicando-se, na falta de disposição especial, os valores constantes da tabela I-A, que faz parte integrante do presente Regulamento. (sublinhado nosso)'”
9 A al. c) do n.º 1 do art. 12º do RCP, com a epígrafe "fixação do valor em casos especiais", dispõe que se atende ao valor indicado na tabela I-B nos processos de contencioso das instituições de segurança social ou de previdência social e dos organismos sindicais, nos processos para convocação de assembleia geral ou de órgão equivalente, nos processos para declaração de invalidade das respectivas deliberações e nas reclamações de decisões disciplinares (sublinhado nosso).
10 O ISS, IP, um instituto público integrado na administração indirecta do Estado (cfr art. 1º do DL 83/2012 de 30/03) que tem por missão a gestão dos regimes de segurança social cfr art. 14° do DL 167-C/2013.
11 Atento o disposto no art. 9º, 3 do Código Civil, na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador soube exprimir o seu pensamento em termos adequados
12 Aliás, não se considerando o ISS, lP/Centro Distrital de Braga uma instituição de segurança social ou de previdência social, não se vislumbra que instituições o legislador pretenderia abranger com a referida disposição para além da Caixa Geral de Aposentações, tal como decidido no Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Sul de 26/01/20·12, Proc 06230/10, disponível em www.dgsi.pt.
13. O presente processo comum singular também é, também, um processo de contencioso
14 Tendo em conta a unidade do Sistema jurídico e recorrendo também aos elementos de interpretação da lei, nomeadamente, ao elemento sistemático, verifica-se que o Regulamento das Custas Processuais restringe a aplicação de algumas normas a determinados tipos de processo, por exemplo, ao processo penal (cfr. nomeadamente, art. 8°), ao processo administrativo ou tributário (cfr. nomeadamente, art. 15º 1, a).
15 Ao referir-se no seu art. 12°, 1, c) a processos de contencioso, sem especificar se é um contencioso penal, cível, laboral, administrativo, (.), parece que se está a referir a todos os tipos de processo de contencioso, a todos os tipos de litígios em tribunal em que as instituições de segurança social ou de previdência social sejam parte, até porque o ISS, IP pode pleitear em todos os tribunais
16, Neste sentido, o decidido nos Acórdãos do Tribunal Central Administrativo do Sul de 26/01/2012, Proc. 06230/10 e o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 13/11/2013, Proc. 997/1 0,2TAFIG-AC1, igualmente disponível em que, no seu sumário, refere expressamente que "para cálculo da taxa de justiça devida pelo pedido de indemnização civil enxertado no processo penal é aplicável a tabela I A e B, anexa ao Regulamento das Custas Processuais, sem que haja lugar a qualquer fixação judicial prévia, "
Não se entende, a razão que subjaz ao despacho recorrido quando refere que os presentes autos de processo comum singular não estão abrangidos na previsão do art. 12º, 1, c) do RCP, o qual deve, por isso, ser revogado,
Termina pedindo a procedência do recurso, com a revogação do despacho recorrido.
*
Admitido o recurso, conforme despacho de fls. 51 dos autos, veio o Sr. Procurador Adjunto junto do tribunal a quo oferecer a sua resposta, fls. 56 a 58, pugnando pela manutenção da decisão recorrida.
*
Neste Tribunal da Relação, o Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de o recurso não ser admitido, por ser manifesta a sua inadmissibilidade, ou, caso assim se não entenda, no sentido de o mesmo não merecer provimento.
Foi cumprido o artigo 417º, n.º2 do CPP.
*
2.Apreciando.
2.1.Da admissibilidade do recurso.
2.1.1 Elementos de facto relevantes.
1-Em 20.06.2013, foi exarada decisão final no âmbito do presente processo penal onde é demandante civil o Instituto de Segurança Social I.P. em cujo dispositivo além do mais consta o seguinte:
«(...)
Parte Cível:
Julga-se procedente por provado o pedido de indemnização civil formulado e, em consequência:
Absolvem-se os demandados B… e C… do pedido contra eles formulado.
Condena-se o demandado D… a pagar solidariamente ao ISSS a quantia de 25.425,93 euros (Vinte e cinco mil, quatrocentos e vinte e cinco euros e noventa e três cêntimos), acrescida de juros de mora contados á taxa legal, prevista no art. 3º do DL 73/99, de 16.03 e até integral pagamento.
Custas a cargo dos demandados D... e Sociedade» (vide doc. de fls. 11 a 28 destes autos).
2-Com data de 17.01.2014, o ISS.I.P. remeteu nos termos do artigo 25º e 26º do Regulamento das Custas Processuais o DUC (documento único de cobrança) e o comprovativo de pagamento de taxa de justiça devida no processo em epígrafe e a nota justificativa de custas de parte. E fez uma exposição onde entendia que o pagamento que devia efectuar, devia seguir a tabela I-B- e, por isso, a taxa de justiça seria de 3UC, ou seja 306,00€, valor que fez constar do DUC e pagou (vide fls. 27, 28 e 29).
4-Em 14.02.2014, o Sr. Funcionário notificou o ISS-I.P. nos seguintes termos:
«Nos termos do disposto no art. 15º, n.º2, do Regulamento das Custas Processuais deverá, no prazo de 10 dias, proceder à autoliquidação da taxa de justiça devida pelo pedido de indemnização formulado nos presentes autos, esta deverá ser liquidada de acordo com a Tabela I A (artigo n.º1 do RCP).»
5. Com data de 24.02.2014 o ISS-I.P., tendo como referência a notificação efectuada vem, dirigindo-se ao juiz da causa, pugnar pelo entendimento de que o cálculo do valor de taxa de justiça a pagar deve ser feito de acordo com a tabela I-B, atento o disposto no artigo 12º, n.º1 al. c) do RCP e portanto a taxa de justiça no valor de 306,00€.
6. Em 04.03.2014 o Sr. Funcionário abre vista com a seguinte informação:
«Com a informação a Vº Exª que salvo melhor opinião não assiste razão ao reclamante, pois a taxa de justiça no presente caso deve ser calculada de acordo com a tabela 1-A – art. 6º, n.º1 do RCP e não I-B, uma vez que o disposto no artigo 12º, n.º1 al. c) do referido Regulamento só é aplicável aos processos referentes a contencioso, administrativo ou de for laboral o que não é o caso».
7. A Srª Procuradora pronunciou-se nos seguintes termos:
«I- Fls. 557 (remetendo para o teor do documento do ISS-I.P.): reitera-se a posição manifestada pela Exª Srª Escrivã contadora, com a qual se concorda na íntegra, não se reconhecendo razão ao requerido pelo ISS
8-Em 06.03.2014, foi exarado o despacho recorrido, que tem o seguinte teor:
«Fls. 557 e ss.
Não assiste razão ao requerente quando aplica a tabela I-B para cálculo da taxa de justiça devida, uma vez que o pedido de indemnização civil integra uma verdadeira acção civil, embora enxertada no processo penal, e por isso segue o regime geral estatuído no art. 6º, n.º1 e não pelo art. 12º, nº do RCP.
Os processos previstos na alínea c), do n.º1, do art. 12º, do contencioso da segurança social, referem-se aos litígios dali referidos, onde não se incluem os presentes autos e inscrevem-se aliás na ordem da competência de outros tribunais, como tribunais de trabalho, tribunais administrativos, etc.
Face ao exposto, indefere-se o requerido.
Notifique.»
*
2.1.2. O Direito.
Delimitando os termos do presente litígio, vem impugnado o despacho proferido pela Srª juiz, que decidiu que a taxa de justiça a pagar pelo demandante civil – ISS-I.P. devia ser calculada pela Tabela I-A e não pela tabela I-B.
Em causa está, o pagamento da taxa de justiça (que corresponde ao montante devido pelo impulso processual de cada sujeito processual, fixado em função do valor e da complexidade da causa, nos termos do regulamento das custas processuais) pela dedução de pedido de indemnização civil. O demandante aqui reclamante está dispensado do seu pagamento prévio, ao que alega, com base na al. d) do n.º1 do artigo 15º do RCP. O que tem como consequência apenas que a oportunidade do pagamento da taxa de justiça seja adiada, para ser paga, na sequência da prolação da decisão final.
O demandante civil procedeu à auto-liquidação da taxa de justiça, calculando o seu valor com base na tabela I-B, a secretaria entendendo que tal cálculo se devia efectuar pela tabela I-A disso o notificou, e é dessa notificação e entendimento que vem apresentar o requerimento dirigido ao juiz da causa e sobre o qual recaiu o despacho sob recurso.
A questão que se coloca é a de saber como qualificar este incidente, que versa sobre uma questão que normalmente é resolvida pelo mero compulsar das tabelas anexas ao RCP e numa fase inicial do processo.
O requerimento apresentado pela parte (após a notificação da sentença e da secretaria para nos termos do art. 15º, n.º2, do Regulamento das Custas Processuais e no prazo de 10 dias, proceder à auto-liquidação da taxa de justiça devida pelo pedido de indemnização formulado nos presentes autos, a liquidar de acordo com a Tabela I A, enquanto entidade demandada que beneficiou da dispensa de prévio pagamento da taxa de justiça) discordando da aplicação da tabela I-A para efeitos de cálculo do valor da taxa de justiça a pagar, sem a indicação de qualquer norma jurídica ou do diploma legal em que alicerça essa sua posição, deve ser considerado como uma reclamação porque em tudo é aparentada com a reclamação da conta.
Com efeito o artigo 31º do RCP sob a epígrafe reforma e reclamação, ordena o procedimento da reclamação e todos os passos ali previstos – quer os do n.º1 quer os do n.º n.º5 - foram seguidos no presente incidente, que não se referem a uma conta de custas, mas a algo mais simples, à interpretação de normas legais visando, em última análise, calcular o valor da taxa de justiça a pagar.
Com efeito, o n.º6 do artigo 31º prevê a decisão do incidente de reclamação da conta e da decisão proferida sobre as dúvidas do funcionário judicial previamente à sua elaboração (vide artigo 29º, n.º4 do RCP).
E essas dúvidas são susceptíveis de incidir sobre o valor da causa a considerar no acto de contagem, a quantificação da responsabilidade do vencedor, o próprio segmento decisório e a interpretação de qualquer normativo relativo à elaboração da conta – vide Regulamento das Custas Processuais, Anotado, Salvador da Costa, pág. 345.
Assim, porque no presente caso está em causa a interpretação de normas legais visando, em última análise, calcular o valor da taxa de justiça a pagar, entendemos ser de subsumir a pretensão do demandante civil ISS – IP ao incidente da reclamação da conta, nos termos do disposto dos artºs 29º, nº 4 e 5 do RCP, porque se situa dentro do mesmo âmbito normativo.
Mais estabelece o nº 6 do citado preceito – artigo 31º - que da decisão do incidente de reclamação cabe recurso em um grau, se o montante exceder o valor de 50 UC.
Ora, em face do valor do pedido – 25.425,93 acrescida de juros vencidos de 6.914,62, totalizando 32.340,5€ sendo o valor das custas a liquidar inferior a 50 UC, não é admissível recurso do despacho proferido, objecto do presente recurso.
Termos em que, em função do respectivo valor, in casu, inferior a 50 UC, não cabe recurso do despacho impugnado, proferido no âmbito no disposto no art. 31º do RCP.
Afigura-se-nos que o n.º5, do artigo 157º do CPC tem aplicação apenas quando um outro meio, em especial, não regule a situação jurídica em causa, permitindo que se reclame para o juiz de qualquer acto da secretaria. E no caso, a reclamação embora não incida sobre conta de custas, incide sobre um acto de notificação da secretaria que tem flagrante identidade com a reclamação da conta, por determinar o montante da taxa de justiça que em consequência terá de ser paga pelo reclamante, entendendo-se, por isso, que é esse o instituto o aplicável, aplicando-se o regime legal por que se rege tal reclamação, porque dentro do mesmo âmbito normativo.
Em consequência, entendemos ter aplicação à reclamação apresentada pelo ora recorrente, não o regime previsto no nº 5 do artigo 157º, mas o previsto quanto à reclamação da conta de custas, nos termos da legislação sobre custas.
Sem embargo, à mesma solução chegaríamos nos termos das disposições conjugadas dos artigos 400º al. g), 523 do CPP e art. 678º (actual 629º) do CPC, visto que o valor da sucumbência é de 3 UC (306€, resultante da diferença entre a aplicação da tabela I-A e tabela I-B, no caso) e, portanto, muito inferior ao valor mínimo da sucumbência, que é de 2.500,00€.
Resta, finalmente dizer que a decisão que admitiu o recurso em primeira instância não vincula este tribunal superior, atento o disposto no art. 414º, n.º3 do CPP.
*
III Decisão.
Pelo exposto, decide-se não admitir o recurso, por irrecorribilidade do despacho impugnado, mantendo-se, em consequência, o despacho recorrido.
Custas pelo recorrente que se fixam em 3 UC, nos termos do artigo 420º, n.º3 do CPP.
*
Notifique.
Processado em computador e revisto pela relatora – artigo 94º, n.º 2, do CP.P.

Porto, 02 de Julho de 2014.
Maria Dolores Silva e Sousa