Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
1034/18.4T8MAI-D.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: JOSÉ NUNO DUARTE
Descritores: RECLAMAÇÕES DE ATOS OU DECISÕES DO AGENTE DE EXECUÇÃO
EXECUÇÃO PARA PRESTAÇÃO DE FACTO
Nº do Documento: RP202511241034/18.4T8MAI-D.P1
Data do Acordão: 11/24/2025
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA PARCIAL
Indicações Eventuais: 5ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I – Ainda que se admita que a regra da irrecorribilidade das decisões do juiz sobre as reclamações de actos ou decisões do agente da execução, prevista no artigo 723.º, n.º 1, al.c), do Código do Processo Civil, seja interpretada restritivamente quando estejam em causa actos ou decisões vinculados susceptíveis de que afectarem de forma relevante os direitos substantivos das partes em conflito, isso não deve acontecer quando estão em causa actos funcionais do agente de execução destinados a assegurar, meramente, o cumprimento de decisões judiciais.
II – Depois de ser proferido despacho a determinar a conversão de uma execução para prestação do facto nos termos previstos no artigo 869.º do Código do Processo Civil e a ordenar o prosseguimento da execução para efeitos de penhora de bens necessários para o pagamento da quantia apurada para que o facto devido seja prestado por outrem, inexiste fundamento legal para conceder aos executados qualquer prazo destinado a permitir que eles prestem, conforme requerem, a obrigação exequenda.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo: 1034/18.4T8MAI-D.P1

Relator: José Nuno Duarte; 1.º Adjunto: Manuel Fernandes; 2.ª Adjunta: Ana Paula Amorim.

Acordam os juízes signatários no Tribunal da Relação do Porto:

I – RELATÓRIO
AA instaurou execução para prestação de facto contra BB e CC, apresentando como título executivo a sentença, proferida em 19 de Agosto de 2014 nos autos da acção declarativa de condenação de processo sumário que, sob o nº …, correu termos no 2º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Santo Tirso, já transitada em julgado, que condenou os aí Réus, ora executados, entre o mais, a “reconstruírem o muro de suporte que destruíram e que fazia a divisão de ambos os prédios”.
Os executados deduziram oposição à execução mediante embargos de executado, invocando, entre o mais, que a sentença dada em execução é inexequível na parte referente à reconstrução do muro e que, devido a isso, importa fazer a demarcação correcta dos prédios, peticionando, a final, que “… a presente oposição, por embargos, deve ser julgada por procedente e provada e em consequência declarar a suspensão da presente execução ou declarar que a obrigação de reconstrução do muro é inexequível ou declarar que existe uma impossibilidade objetiva decorrente da topografia irregular do terreno. Se assim não for entendido, deve ser fixado o prazo de 120 dias para o efeito”.
Estes embargos foram liminarmente indeferidos, por despacho proferido no dia 11 de Abril de 2018 do qual foi interposto recurso para o Tribunal da Relação do Porto. Tal apelação foi julgada improcedente por acórdão proferido em 22 de Outubro de 2018 e no qual foi expresso, entre o mais, que “[d]iferentemente do alegado pelos recorrentes, os prédios encontram-se demarcados, tendo a separá-los um muro de suporte em pedra; está definido o início e o fim do muro; não se percebendo o alegado quanto à topografia do terreno pois, para além de não ter sido impeditivo da destruição do muro, deviam ter pensado nessa questão antes da sua destruição. / Aliás, tendo os embargantes destruído o muro de suporte existente na extrema dos dois prédios, naturalmente que sabem o que reconstruir, onde e como”; e também que “[n]ão existem dúvidas quanto à demarcação dos terrenos, encontrando-se os seus limites claramente definidos na sentença apresentada como título executivo. A qual, naturalmente, vincula ambas as partes, nada mais havendo, a propósito, a discutir entre elas”.
Prosseguindo a execução, foi proferido aí, em 7 de Maio de 2019, despacho judicial que fixou em 29 dias o prazo para a prestação aludido nos artigos 874.º e 875.º, nº 1, do Código de Processo Civil.
Posteriormente, por despacho proferido em 24 de Setembro de 2019, foi indeferido o requerimento que os executados apresentaram a pedir a suspensão da execução até ao trânsito em julgado da decisão final do processo que, com vista à demarcação do caminho existente entre os prédios, haviam dado entrada no Juízo Local Cível de Santo Tirso e do qual juntaram certidão. Interposto recurso deste despacho, o Tribunal da Relação, por acórdão de 19 de Maio de 2020, depois de afirmar, entre o mais, que “[a] questão incidental suscitada, pela sua irrazoabilidade, só serviu para retardar o prosseguimento da execução e, consequentemente, entorpecer a sua normal tramitação e a realização de justiça”, deliberou julgar totalmente improcedente a apelação e confirmar o despacho recorrido.
Após, em 1 de Fevereiro de 2024, por despacho já transitado em julgado, foi decidido o seguinte: «a) Determino a conversão da presente execução para prestação de facto em execução para pagamento de quantia certa; / b) Liquido o valor da execução no montante de € 3.975,00 (três mil e novecentos e setenta e cinco euros); / c) Determino o prosseguimento da execução com a penhora de bens dos executados necessários para o pagamento da quantia apurada».
Em 16-09-2024, o sr. agente da execução, nos termos do disposto nos artigos 849.º, n.º 1, al. b) e 779.º, n.º 4, al. b) do CPC e art.º 25 do RCJ, lavrou nos autos um “Termo de Liquidação de Julgado” com os cálculos das quantias monetárias que, face aos montantes já penhorados e depositados nos autos e aos valores dos encargos processuais a satisfazer, careciam ainda de ser cobradas.
Os executados, no dia 2 de Outubro de 2024, reclamaram do “Termo de Liquidação de julgado” lavrado pelo sr. agente da execução, mais tendo, no articulado que apresentaram para tal efeito, anunciado que “…irão dar entrada amanhã de uma execução para prestação de facto, destinada a que os exequente neste processo procedam à demarcação dos referidos limites constantes da sentença, que, como se disse, não se encontram definidos nos termos da mesma”; nessa sequência, os executados formularam, ainda, um pedido para que os autos sejam suspensos “…até que seja realizada a definição do caminho, para proceder à conclusão do muro que separa os dois prédios”.
A exequente, 14 de Outubro de 2024, pugnou pela improcedência do requerimento dos executados de 2-10-2024 e peticionou a condenação destes como litigantes de má fé.
Os executados, através de requerimento datado de 28 de Outubro de 2024, vieram defender-se do pedido de condenação por litigância de má fé e, depois de, nesse âmbito, reforçarem que “para que os executados possam proceder à construção do muro que faz a divisão dos dois prédios, é imprescindível que os exequentes procedam à demarcação do caminho” e que “após a demarcação do caminho (largura e comprimento), os executados necessitam de pelo menos 20 dias para procederem à construção do muro divisório de ambos os prédios”, requereram a concessão de um prazo de 20 dias “para a construção do muro que fará a divisão dos dois prédios, após a demarcação do muro conforme descrito na douta sentença”.
Após, tanto a exequente como os executados, através de sucessivos articulados, continuaram a esgrimir nos autos os seus argumentos, sede em que:
- em 26-11-2024, os executados reiteraram que, para cumprirem o que a sentença dada em execução determinou, é necessário que seja feita a demarcação entre os dois prédios e, por isso, requereram que “…o Tribunal ordene se proceda à referida demarcação, para a mesma desde já indicam um técnico de cadastro predial, o qual se encontra devidamente inscrito com o nº ..., o Exmo. Senhor DD, com domicílio profissional na Rua ..., ..., ... Braga - cuja nomeação requerem”, “ou, caso assim não entenda, deverá aguardar-se que a delimitação seja efectuada no âmbito da execução para prestação de facto que corre termos sob o nº ..., nos Juízos de Execução da Maia - Juiz 1”, mais peticionando, a final, a concessão do prazo de vinte dias “…para a construção do muro que fará a divisão dos dois prédios, após a demarcação dos mesmos…”;
- em 12-12-2024, os executados reiteraram o pedido de concessão do prazo de vinte dias “…para a construção do muro que fará a divisão dos dois prédios, após a demarcação do caminho conforme descrito na douta sentença” e, mais, requereram “…que a Exequente seja condenada como litigante de má fé em multa e indemnização exemplares, que o Tribunal prudentemente fixar, porquanto está a passar com um tractor sobre o terreno dos Executados, a fim de aluir o muro destes, assim como impede a possibilidade de construir o muro divisório, ao não demarcar devidamente a respectiva localização”.
Finalmente, em 13-02-2025, foi proferido despacho decisório com a seguinte parte dispositiva:
«a) Julgo improcedente a reclamação apresentada pelos executados contra a liquidação efectuada pelo Sr. Agente de Execução;
b) Absolvo a exequente da instância dos pedidos formulados pelos requeridos de concessão de prazo de vinte dias para a construção do muro que fará a divisão dos dois prédios, após a demarcação dos mesmos, bem como de nomeação de perito que indicam para que este indique dia e hora para fazer a demarcação.
*
Custas do incidente pelos executados, fixando-se a taxa de justiça em 5 (cinco) UC’s, face ao carácter manifestamente dilatório e destituído de fundamento dos requerimentos apresentados, nos termos do disposto nos arts. 527º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil e 7º, nº 4, do Regulamento das Custas Processuais.»
-
Os executados vieram recorrer deste último despacho, apresentando alegações que foram finalizadas com as seguintes conclusões:
(…)
-
Os exequentes apresentaram contra-alegações, formulando, no final, as seguintes conclusões:
(…)
-
O recurso foi admitido por despacho, que o classificou como sendo de apelação e lhe atribuiu efeito meramente devolutivo, ordenando a sua subida imediata, em separado, a este Tribunal da Relação, mais sendo consignado nesse despacho o seguinte:
«Esclarece-se que, contrariamente ao que parece ser o entendimento dos recorrentes, o despacho recorrido não os condenou em qualquer taxa sancionatória excepcional, mas apenas nas custas do incidente, face ao carácter manifestamente dilatório e destituído de fundamento do mesmo.
A esse título, no despacho recorrido escreveu-se apenas que “Deste modo, pese embora os termos em que os executados requereram novamente que se procedesse à demarcação, não se pode concluir que tivessem litigado de má fé, motivo pelo qual não se condenam com tal, sem prejuízo de, a continuarem com a dedução de novos incidentes infundados, vir o Tribunal a ponderar a aplicação da taxa sancionatória excepcional, a que alude o art. 531º, do Código de Processo Civil.”

Recebido nesta Relação os autos do recurso, foi proferido despacho pelo relator a ordenar, nos termos do disposto no artigo 655.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, a notificação das partes para, querendo, se pronunciarem sobre a possibilidade de, face à irrecorribilidade prevista no artigo 723.º, n.º 1, al. c), do Código do Processo Civil, não ser conhecido o objecto do recurso na parte em que este incide sobre a decisão da reclamação que os executados apresentaram contra o “Termo de Liquidação de Julgado” lavrado pelo Sr. Agente de Execução.
Os recorrentes exerceram contraditório, dizendo, em suma, que não se verifica qualquer irrecorribilidade, já que a sua reclamação incidiu sobre um Termo, elaborado pelo Senhor Escrivão Auxiliar, não se tendo, pois, tratado de um acto praticado por Agente de Execução.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
***
II – DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO
Conforme resulta do relatório acima efectuado, o despacho objecto do recurso encerra três decisões:
- a decisão de indeferimento da reclamação que os executados apresentaram em 2-10-2024 contra o “Termo de Liquidação de Julgado” lavrado nos autos em 16-09-2024 pelo sr. agente da execução;
- a decisão que indeferiu os pedidos formulados pelos executados nos requerimentos incidentais de 2-10-2024, 28-10-2024, 26-11-2024 e 12-12-2024, no sentido de lhes ser concedido um “prazo de vinte dias para a construção do muro que fará a divisão dos dois prédios, após a demarcação dos mesmos”, bem de o tribunal proceder à “nomeação de perito que indicam para que este indique dia e hora para fazer a demarcação”;
- a decisão que condenou os executados no pagamento de custas incidentais, fixando a respectiva taxa de justiça em 5 (cinco) UC’s.
Sucede que resulta expressamente do artigo 723.º, n.º 1, al. c), do Código do Processo Civil que a decisão judicial proferida sobre a reclamação de actos ou impugnação de decisões do agente de execução é irrecorrível. Pretende-se com esta norma que o controlo jurisdicional da decisão tomada pelo agente de execução seja exercido apenas em um grau (ou seja, pelo juiz de execução), opção legislativa que se mostra conforme com o entendimento, já várias vezes afirmado, inclusive pelo nosso Tribunal Constitucional, de que o direito de acesso aos tribunais consagrado no artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa não implica, necessariamente, a garantia de um duplo grau de jurisdição, isto é, do direito de recurso da decisão de um tribunal para um tribunal superior.
Não se olvida que parte da nossa doutrina e jurisprudência aceita que, ainda assim, seja possível fazer uma interpretação restritiva da regra da irrecorribilidade prevista na al. c) do n.º 1 do artigo 723.º, do Código do Processo Civil para não se incorrer restringir desproporcionalmente o direito constitucional ao recurso quando estejam em causa actos ou decisões vinculados dos agentes de execução susceptíveis de afectarem de forma relevante os direitos substantivos das partes em conflito. Tal não acontece, porém, no caso dos autos, pois o “Termo de Liquidação de Julgado” que o sr. agente da execução lavrou em 16-09-2024 foi elaborado com base no disposto nos artigos 849.º, n.º 1, al. b), e 779.º, n.º 4, al. b), do Código do Processo Civil e no artigo 25º do Regulamento das Custas Processuais apenas para assegurar o andamento do processo nos moldes daquilo que foi determinado pela decisão, já transitada em julgado, que converteu a execução para prestação de facto em execução para pagamento de quantia certa.
Como tal, não deve ser conhecido o objecto do recurso na parte em que o mesmo incide sobre a decisão que julgou improcedente a reclamação que os executados apresentaram contra o “Termo de Liquidação de Julgado” lavrado pelo Sr. Agente de Execução em 16-09-2024 [1].
Consequentemente e dado que o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação dos recorrentes, sem prejuízo da apreciação por parte do tribunal ad quem de eventuais questões que se coloquem de conhecimento oficioso, bem como da não sujeição do tribunal à alegação das partes quanto à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito (cf. artigos 5.º, n.º 3, 608.º, n.º 2, 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1, do Código do Processo Civil), as questões que cumpre tratar são as seguintes:
a) da pertinência dos pedidos deduzidos pelos executados nos requerimentos de 2-10-2024, 28-10-2024, 26-11-2024 e 12-12-2024;
b) da manutenção ou revogação da decisão que condenou os executados no pagamento de 5 (cinco) UC’s de taxa de justiça.
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III – FUNDAMENTAÇÃO
1. Sendo a factualidade relevante para a decisão a proferir aquela que consta do relatório deste acórdão, impõe-se apreciar, em primeiro lugar, a questão de saber se existe fundamento para que, tal como requereram os ora recorrentes em sucessivos articulados, conceder um prazo de pelo menos 20 dias aos executados para que, após a demarcação do caminho (a efectuar pelos exequentes [cf. requerimentos de 2-10-2024 e 28-10-2024] e/ou por ordem do tribunal com prévia nomeação do perito que indicam [cf. requerimento de 26-11-2024), possam proceder à construção do muro divisório dos dois prédios.
No que diz respeito à concessão aos executados de um prazo para a construção do muro, é óbvio que, na fase em que já se encontra a execução em curso, inexiste fundamento legal para que tal aconteça. Os executados foram condenados, através da sentença dada em execução, a “reconstruírem o muro de suporte que destruíram e que fazia a divisão de ambos os prédios”; por não terem cumprido voluntariamente essa obrigação, foi movida contra si a execução dos autos, destinada a obter a prestação do facto em que haviam sido condenados; já depois de ter transitado em julgado a decisão que indeferiu os embargos deduzidos pelos executados, foi proferido despacho, que também transitou em julgado, que, nos artigos 874.º e 875.º, nº 1, do Código de Processo Civil, fixou em 29 dias o prazo para os executados prestarem o facto em que foram condenados; como tal aconteceu, em 1-02-2024, por despacho igualmente transitado em julgado, foi determinada, conforme previsto nos artigos 869.º e 870.º do Código do Processo Civil, a conversão da execução para prestação de facto em execução para pagamento de quantia certa e liquidado o valor da execução no montante de € 3.975,00 (três mil e novecentos e setenta e cinco euros), mais se determinando o prosseguimento da execução com a penhora de bens dos executados necessários para o pagamento da quantia necessária para a prestação do facto por outrem. Neste contexto, não há qualquer fundamento legal para que se conceda aos executados qualquer prazo adicional para cumprirem a obrigação em que foram condenados e que, reiteradamente, não cumpriram.
Em relação ao pedido que os executados também deduziram para que a construção do muro divisório dos dois prédios aguarde a realização de operações de demarcação do caminho que se desenvolve entre os dois prédios, é manifesto também que o mesmo não pode ser acolhido. Essa é uma pretensão que, há muito, os executados deduziram nos autos, mas que foi objecto já de decisões que a negaram, como aconteceu quando, no ano de 2018, foram indeferidos os embargos em que, entre o mais, foi suscitada a questão da alegada necessidade de demarcação dos limites dos prédios e, depois, quando, em 2019, foi indeferido o requerimento que os executados apresentaram a pedir a suspensão da execução com vista à definição da demarcação do caminho. Destas duas decisões, aliás, os executados interpuseram recurso e sempre lhes foi negada qualquer razão pelo Tribunal da Relação, tendo até sido evidenciado no texto dos acórdãos que apreciaram tais recursos, entre o mais, que “[d]iferentemente do alegado pelos recorrentes, os prédios encontram-se demarcados, tendo a separá-los um muro de suporte em pedra; está definido o início e o fim do muro; não se percebendo o alegado quanto à topografia do terreno pois, para além de não ter sido impeditivo da destruição do muro, deviam ter pensado nessa questão antes da sua destruição” e que“[n]ão existem dúvidas quanto à demarcação dos terrenos, encontrando-se os seus limites claramente definidos na sentença apresentada como título executivo. A qual, naturalmente, vincula ambas as partes, nada mais havendo, a propósito, a discutir entre elas” (cf. Ac. RP de 22-10-2018), bem como que “[a] questão incidental suscitada, pela sua irrazoabilidade, só serviu para retardar o prosseguimento da execução e, consequentemente, entorpecer a sua normal tramitação e a realização de justiça” (cf. Ac. RP 19-05-2020).

2. Concluindo-se que, pelos motivos que acabam de ser referidos, o tribunal a quo decidiu bem quando indeferiu os pedidos vertidos pelos executados nos seus requerimentos de 2-10-2024, 28-10-2024, 26-11-2024 e 12-12-2024, cumpre agora apreciar se foi correcta a decisão que condenou os mesmos no pagamento de 5 (cinco) UC’s de taxa de justiça.
Quanto a esta questão, mostra-se absolutamente pertinente a observação feita no despacho que admitiu o recurso na primeira instância quanto ao facto de, contrariamente ao afirmado nas alegações da apelação, os recorrentes não terem sido condenados em qualquer taxa de justiça sancionatória excepcional, mas, tão-só, no pagamento da taxa de justiça respeitante ao incidente que espoletaram com os pedidos que formularam e que vieram a ser indeferidos. É isso que resulta do segmento decisório em que se definiu a condenação e, se dúvidas houvesse, as mesmas sempre estariam dissipadas pela passagem do despacho recorrido em que se refere: “…pese embora os termos em que os executados requereram novamente que se procedesse à demarcação, não se pode concluir que tivessem litigado de má fé, motivo pelo qual não se condenam com tal, sem prejuízo de, a continuarem com a dedução de novos incidentes infundados, vir o Tribunal a ponderar a aplicação da taxa sancionatória excepcional, a que alude o art. 531º, do Código de Processo Civil”.
A condenação dos executados, ora recorrentes, na taxa de justiça devida pelo incidente que geraram não merece qualquer censura, pois o artigo 7.º, n.º 4, do Regulamento das Custas Processuais estabelece que os incidentes ou procedimentos anómalos estão sujeitos a taxação e, de acordo com a regra geral em matéria de custas, a responsabilidade pelo pagamento dessa taxa incide sobre a parte vencida (cf. artigo 527.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil). No que concerne, porém, à fixação da taxa de justiça em 5 (cinco) UC’s, constata-se que este valor excede o limite máximo previsto na tabela II anexa ao Regulamento das Custas Processuais (para a qual remete o artigo 7.º, n.º 4), o qual, para «incidentes / procedimentos anómalos» é de 3 UC´s (sendo o valor mínimo de 1 UC). Face a tal, ora se impõe reduzir o valor da taxa de justiça fixado na decisão recorrida para o montante correspondente a 3 UC´s, o qual, mesmo coincidindo com o valor máximo aplicável, se considera ajustado face à persistência dos sucessivos requerimentos que os executados apresentaram para sustentarem a sua pretensão e à complexidade da tramitação e da apreciação do caso que, com isso, geraram.

3. Refira-se, por fim, que apesar da recorrida/exequente ter requerido que os executados/recorrentes sejam condenados como litigantes de má-fé, essa sua pretensão não foi acolhida pelo tribunal a quo, conforme, aliás, expresso no despacho recorrido. Ora, como a exequente, apesar do inconformismo que manifestou nas suas alegações, não recorreu da decisão que, quanto a essa matéria, foi tomada na primeira instância e porque, ao nível da conduta processual observada pelos executados no âmbito do presente recurso, não se detecta qualquer facto que mereça sancionamento por violação dos ditames da boa-fé – já que os mesmos, no essencial, se limitaram a suscitar a apreciação superior da decisão da primeira instância que lhes havia sido desfavorável –, não há fundamento para agora dirigir aos executados qualquer sanção que deva acrescer à condenação nas custas do incidente que espoletaram.
Quanto às custas do recurso, porque os executados saem vencidos quanto a tudo quanto apelaram, com excepção da questão atinente à redução da taxa de justiça que lhe foi aplicada (a qual, porém, não importa o vencimento da contraparte e, por isso, convoca a aplicação do critério do proveito previsto na parte final do n.º 1 do artigo 527.º do Código do Processo Civil), devem os mesmos suportar a totalidade das custas da apelação (cf. artigo 527.º, n.ºs 1 e 2, do Código do Processo Civil).
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IV – DECISÃO
Pelos fundamentos expostos, acorda-se em:
a) não conhecer do objecto do recurso na parte em que o mesmo incide sobre a decisão que julgou improcedente a reclamação que os executados apresentaram contra o “Termo de Liquidação de Julgado” lavrado pelo Sr. Agente de Execução em 16-09-2024;
b) reduzir o valor da taxa de justiça a pagar pelos executados devido à condenação que lhes foi dirigida no despacho recorrido para o montante correspondente a 3 UC´s (três unidades de conta);
c) negar, quanto ao mais, provimento à apelação e, consequentemente, confirmar a decisão recorrida;
d) condenar os recorrentes no pagamento das custas do recurso.

Notifique.
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SUMÁRIO
(Elaborado pelo relator nos termos do artigo 663.º, n.º 7, do C.P.C.)
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Acórdão datado e assinado electronicamente
(redigido pelo primeiro signatário segundo as normas ortográficas anteriores ao Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990)

Porto, 24/11/2025
José Nuno Duarte
Manuel Domingos Fernandes
Ana Paula Amorim
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[1] Apesar do acto em causa ter sido praticado por oficial de justiça, o mesmo exercia funções próprias de agente de execução, tal como previsto no artigo 722.º do Código do Processo Civil, e, por isso, aplicavam-se aos actos que levava a cabo nessa qualidade as normas legais aplicáveis à actividade dos agentes de execução.