Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
2568/21.9T8MAI.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: JERÓNIMO FREITAS
Descritores: PROVA DE UM FACTO
CONTRATO DE TRABALHO A TERMO
MOTIVO JUSTIFICATIVO
RENOVAÇÃO DO CONTRATO
EXIGÊNCIAS LEGAIS
Nº do Documento: RP202303202568/21.9T8MAI.P1
Data do Acordão: 03/20/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: RECURSO IMPROCEDENTE; CONFIRMADA A SENTENÇA
Indicações Eventuais: 4. ª SECÇÃO (SOCIAL)
Área Temática: .
Sumário: I - Para que um facto se considere provado é necessário que, à luz de critérios de razoabilidade, se crie no espírito do julgador um estado de convicção, assente na certeza relativa do facto
II - A exigência legal da indicação do motivo justificativo é uma consequência do caráter excepcional que a lei atribui à contratação a termo e do princípio da tipicidade funcional que se manifesta no art.º 140.º: o contrato só pode ser (validamente) celebrado para certos fins e na medida em que estes o justifiquem.
III - A indicação do motivo justificativo da celebração de contrato de trabalho a termo constitui uma formalidade ad substantiam, tendo que integrar, forçosamente, o texto do contrato, pelo que a insuficiência de tal justificação - por não ter sido feita com menção expressa dos factos que o integram, não permitindo assim estabelecer-se a necessária relação de causalidade entre a justificação invocada e o termo estipulado - não pode ser suprida por outros meios de prova e tem como consequência considerar-se o contrato sem termo.
IV - A violação do artigo 149.º, no que respeita às renovações, leva a que o contrato se converta sem termo.
V - A renovação contrato pelo mesmo período de um ano, está sujeita às mesmas exigências quanto à possibilidade de celebração, ou seja, na realidade visar dar “satisfação [a] necessidades temporárias, objetivamente definidas pela entidade empregadora e apenas pelo período estritamente necessário à satisfação dessas necessidades” [n.º1, do art.º 140.º], bem assim de indicação do motivo justificativo devidamente fundamentado.
VI - Se a Ré justificou o primeiro contrato aludindo a “um aumento pontual de necessidades” e referiu, que “Em contraponto com este aumento de necessidades prevê-se a desativação a médio prazo de parte da produção em virtude da descontinuação de alguns produtos em final de vida [..]”, como é que se explica que esse “aumento pontual” continue a verificar-se na renovação por mais um ano, assim como a previsão da “desativação a médio prazo de parte da produção [..]?
VII - Há uma manifesta incoerência, arredando a hipótese da contratação, máxime a renovação, visar a “satisfação de necessidades temporárias” resultantes de um “acréscimo excepcional da actividade da empresa”, nos termos do n.º2, alínea f), do art.º 140.º, CT/09, ou seja, a norma invocada no motivo justificativo que consta do contrato.
VIII – Assim, só pode concluir-se que o motivo justificativo não permite retirar o que é exigível, ou seja, “a verificação externa da conformidade da situação concreta com a tipologia do art.º 140.º; e a realidade e a adequação da própria justificação face à duração estipulada
Reclamações:
Decisão Texto Integral: APELAÇÃO n.º 2568/21.9T8MAI.P1
SECÇÃO SOCIAL



ACORDAM NA SECÇÃO SOCIAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO

I.RELATÓRIO

I.1 AA instaurou contra A... Lda a presente ação de processo comum emergente de contrato de trabalho, pedindo que julgada a acção procedente seja esta condenada no seguinte:
a) a reconhecer a autora como sua trabalhadora subordinada, no âmbito do contrato de trabalho sem termo, com início em 1-10-2018 (conforme desistência parcial do pedido admitida a fls. 57 e 58);
b) a reconhecer a ilicitude do despedimento da autora;
c) a pagar à autora todas as prestações pecuniárias que ela deixar de auferir desde a data do despedimento até à data do trânsito em julgado da decisão a proferir nos autos;
d) a readmitir a autora no seu posto e local de trabalho; ou se esta assim optar,
e) Pagar-lhe a indemnização por antiguidade no valor que vier a ser fixado, por decisão final.
f) Pagar juros de mora, à taxa legal, desde a data da citação até efetivo e integral pagamento.
Alegou, no essencial, que o motivo indicado para a celebração do contrato a termo, que se manteve aquando da sua renovação, não obedece aos requisitos legais. Devendo essa justificação ser concretizada com indicação de elementos concretos e objetivos, que assumam carácter de excecionalidade, e não se reportem ao normal desenvolvimento da actividade do empregador, no caso a justificação aposta mais não é que uma consideração genérica e que resulta da cópia do texto da lei. Por essa razão, deve o contrato ter-se como celebrado sem termo, assumindo-se a comunicação da Ré de caducidade do contrato como despedimento ilícito.
Acresce que, à data da sobredita comunicação a A. encontrava-se no gozo de licença parental em virtude do nascimento da sua filha, oportunamente comunicado à R. que não se coibiu de operar a cessação do contrato de trabalho, sem solicitar o parecer prévio à CITE.
Designado dia para a audiência de partes, procedeu-se a este acto, mas sem que se tenha conseguido alcançar o acordo entre as partes.
A Ré contestou, pugnando pela improcedência da ação, para o que invocou, também em síntese, que foram observados os requisitos essenciais, quer de forma quer de substância, que permitem que recorresse à contratação da Autora sob a forma contratual utilizada. Aditou ainda ter pago à A. a quantia de 519,20€ a título de compensação pela cessação do contrato por caducidade. Por fim, rejeitou que aquando da não renovação do contrato a A. se encontrasse grávida, desconhecendo se estaria a amamentar, pelo que não impendia sobre sai a obrigação de solicitar parecer ao CITE.
Foi proferido despacho saneador, que verificou da regularidade da instância.
A acção prosseguiu a sua tramitação, tendo sido realizada audiência de julgamento. No âmbito desse acto, a trabalhadora optou, em caso de procedência da acção, pela reintegração nos termos do disposto na alínea b) do nº 1 do art.º 389º do CT.
I.2 Subsequentemente foi proferida sentença, fixando os factos e aplicando o direito, concluída com a decisão seguinte:
- «Na desinência do exposto, julgo procedente, por provada, a presente acção e em consequência, condeno a Ré A... Lda.:
a) a reconhecer a Autora AA como sua trabalhadora subordinada, no âmbito do contrato de trabalho sem termo, desde 1-10-2018;
b) a reconhecer a ilicitude do despedimento da Autora;
c) a readmitir a Autora no seu posto e local de trabalho, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade;
d) a pagar à Autora todas as prestações pecuniárias que esta deixou de auferir desde os 30 dias anteriores à propositura da acção (15-5-2021) até à data do trânsito em julgado da presente decisão, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde o trânsito em julgado da liquidação que venha a ser efetuada das referidas quantias, deduzidas do valor de 519,20€ pago pela R. à A. a título de compensação pela caducidade do contrato de trabalho e das demais importâncias que a trabalhadora tenha auferido com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento e do subsídio de desemprego que tenha sido atribuído à trabalhadora desde os 30 dias anteriores à propositura da acção (15-5-2021) até à data do trânsito em julgado da presente decisão, devendo a empregadora entregar essa quantia à segurança social.
Custas, na proporção de 9/10, a cargo da A. e R., sem prejuízo da isenção que beneficia a A. - artº527º, nºs 1 e 2 do CPC.
Notifique e comunique à Segurança Social.
(..)».
I.3 Não concordado com a sentença, a Ré interpôs recurso de apelação, o qual foi admitido com o modo de subida e efeito adequados. As alegações foram concluídas nos termos seguintes:
1. Vem o presente recurso de apelação interposto da sentença que julgou procedente a presente acção e em consequência condenou a ré:
a) a reconhecer a Autora como sua trabalhadora subordinada, no âmbito do contrato de trabalho sem termo;
b) a reconhecer a ilicitude do despedimento da Autora;
c) a readmitir a Autora no seu posto e local de trabalho;
d) a pagar à Autora todas as prestações pecuniárias que ela deixou, e deixar, de auferir desde os 30 dias anteriores á propositura da acção até à data do trânsito em julgado da presente decisão, acrescida de juros de mora.
2. A ré discorda da sentença, quer no julgamento da matéria de facto, quer de direito.
3. Quanto à matéria de facto a ré discorda da sentença por entender que, não foi dado como provado um facto relevante, que a ré alegou nos termos do disposto do art. 5.º do CPC, pois deveria ter sido dado como provado que: “A autora, desde janeiro de 2022 que se encontrar a trabalhar e a fazer descontos como trabalhadora em regime de contrato de trabalho subordinado para a empresa B..., UNIPESSOAL,LDA
4. Facto este que a ré requereu que fosse adicionado e tomado em consideração nos termos e para os efeitos do art. 5 do CPC, e que está provado pelo documentos junto aos autos pela segurança social com ref. citius 31401450 e 31435658 (extrato dos descontos efectuados pela trabalhadora, juntos aos autos por iniciativa do tribunal);
5. Esse facto resulta ainda provado pelo depoimento da testemunha BB, referido na gravação no trecho com referência 20220210111029_15977106_2871520 com início no minuto 11:21 e termo ao minuto 11:44, onde esta, respondendo a perguntas do advogado, disse o seguinte:
Pergunta do advogado da ré: “Tem conhecimento de qual é a situação dela («da autora») neste momento?
Resposta da testemunha BB: ”neste momento sei qual é a situação dela”.
Pergunta:” Qual é a situação dela?
Resposta:… …gravação inaudível...…
Pergunta: está a trabalhar?
Resposta:” Não. Neste momento está com baixa porque torceu um pé
Pergunta: sabia que estava a trabalhar noutra empresa?
Resposta Sim, sei que ela está a trabalhar noutra empresa”.
Pergunta: desde quando?
Resposta: Não sei”
6. Uma vez provado este facto, e mesmo na hipótese de a acção proceder, ou seja de o termo certo do contrato ser considerado inválido, então não poderia ser atendido a opção pela reintegração na empresa uma vez que tendo sido celebrado entretanto um novo contrato de trabalho, e não sendo possível a coexistência de dois contratos de trabalho sobre o mesmo objecto, se deverá entender que esta celebração deste segundo contrato faz caducar essa pretensão, e equivale a uma necessária opção pelo direito á compensação.
7. Estando a autora já empregada e com um vínculo laboral com outra empresa ocorre a impossibilidade por caducidade do restabelecimento do vínculo com a ora ré, e nos termos do disposto no art. 343 do C. Trabalho, que entendemos que na decisão recorrida foi violado.
8. Caso assim não se entende somos de opinião que a opção da autora pela reintegração, numa altura em que já se encontra ao serviço de outra entidade patronal, configura uma situação e abuso de direito, na medida e que é contrária ao fim económico e social do exercício do direito, pois a trabalhadora já se encontra empregada e a trabalhar, sendo assim violado o disposto no art. 334 do Código Civil.
9. A ré sustenta que o contrato de trabalho a termo, na sua cláusula 12º está suficientemente fundamentado, cumpre minimamente com as obrigações prevista no art. 141 do código do Trabalho, pelo que o Meritíssimo Sr Juiz do Tribunal a quo não deveria desde já pelo menos no despacho saneador, e sem que prova fosse produzida, decidir do mérito da questão.
10. É o seguinte o teor da cláusula 12 do contrato de trabalho: “O presente contrato tem como fundamentação principal e primária a produção de componentes electrónicos para automóveis que regista um aumento pontual de necessidades, nomeadamente para as seguintes linhas de produção:
Cliente C...:
D..., D1..., E..., E1..., E2....,
F...,G...,H...,G...
CLIENTE I...:
J..., K..., L....
Cliente M...:
N..., N1..., N2..., N3..., N4...
; M1....
Cliente O...:
P..., P1...
Cliente Q....
Em contraponto com este aumento de necessidades prevê-se a desativação a médio prazo de parte da produção em virtude da descontinuação de alguns produtos em final de vida na A..., Lda.
Esta decisão estratégica de assegurar os recursos necessários à produção de componentes electrónicos para automóveis, tem como consequência imediata e por um período de tempo que não se prevê superior a um ano, um “acréscimo excecional de atividade da empresa”, e em especial na Produção Automóvel, tendo o seu fundamento legal na alínea f) n.º 2 do artigo 140.º do Código do Trabalho.”
11.Da leitura da cláusula 12º resulta que está indicado e concretizado um fundamento embora se utilize uma linguagem esquemática, todavia um intérprete ou normal declaratório percebe perfeitamente o sentido da comunicação transmitida, e da qual resulta que a autora ia ser, e foi contratada apenas por um período limitado de tempo, devidamente datado no contrato, e que é de 12 meses, e que essa contratação é feita para a atalhar a uma necessidade pontual da empresa de assegurar o fornecimento de peças a um grupo particular e restrito dos clientes da ré, e num conjunto de linha de produção que estão devidamente identificadas.
12.Por outro lado, no texto da cláusula sexta estabelece-se a relação entre a justificação invocada e o termo aposto no contrato, quando se diz que a trabalhadora será contratada para as linhas onde surgiram as necessidades decorrentes do aumento pontual que não será superior a um ano, que é o prazo pelo qual o contrato foi celebrado e aposto o termo.
13.Assim e em conclusão, a sentença do tribunal a quo fez uma errada interpretação e aplicação do disposto no art. 141 do C.T designadamente do seu nº 3, e do art. 147. nº 1 alínea c) do C.T., pelo que deve ser revogada.
NESTES TERMOS, concedendo provimento ao presente recurso, deve a sentença ser revogada, e substituída por outra que julgue a acção improcedente.
I.4 A A apresentou contra-alegações que finalizou com as conclusões seguintes:
1.ª A indicação do motivo justificativo da celebração dos contratos de trabalho a termo constitui uma formalidade ad substantiam, tendo que integrar obrigatoriamente o texto do contrato, pelo que a insuficiência de tal justificação, não pode ser suprida pro quaisquer outros meios de prova a posteriori.
2.ª O que a ora apelante fez constar no contrato de trabalho da ora apelada é severamente insuficiente, pois apesar da extensão da cláusula 12.ª do contrato de trabalho, a verdade é que ela se traduz num enorme nada.
3.ª Tal cláusula não esclarece de modo suficiente quais os concretos factos que traduzem o carácter excecional do acréscimo da atividade da apelante, nem a que encomendas se pretende referir no contrato, nem tão pouco quais os componentes eletrónicos em causa.
4.ª Muito menos faz sentido a formulação constante da cláusula 12.ª quando em se diz que em contraponto com este aumento de necessidades prevê-se a desativação a médio prazo de parte da produção em virtude da descontinuação de alguns produtos em final de vida na A..., Lda..
5.ª A falta de concretização do motivo justificativo ou a sua insuficiência não pode ser suprida pela alegação de factos na contestação e/ou alegações, uma vez que a indicação e concretização do motivo justificativo no contrato de trabalho constitui formalidade ad substanciam.
6.ª Por isso, a falta de concretização do motivo justificativo pelo recurso a expressões vagas, genéricas ou imprecisas, acarreta a invalidade do termo acordado, tendo que se considerar que o contrato foi celebrado por tempo indeterminado”, considerando-se consequentemente sem termo o contrato de trabalho nos termos do disposto no artº147º, nº1, alínea c), do CT.
Termos em que a presente apelação deverá ser julgada improcedente, mantendo-se e confirmando-se na íntegra a sentença proferida.
I.5 O Ministério Público junto desta Relação teve visto nos autos, para os efeitos do art.º 87.º3 do CPT, tendo emitido parecer no sentido de se manter inalterada a matéria de facto e ser julgado o recurso improcedente.
I.6 Foram colhidos os vistos legais e determinou-se a inscrição do processo em tabela para ser submetido a julgamento.
I.7 Delimitação do objecto do recurso
Sendo o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das alegações apresentadas, salvo questões do conhecimento oficioso, as questões colocadas para apreciação pelo recorrente consistem em saber se o Tribunal a quo errou o julgamento quanto ao seguinte:
- Por não ter considerado provado que: “A autora, desde janeiro de 2022 que se encontrar a trabalhar e a fazer descontos como trabalhadora em regime de contrato de trabalho subordinado para a empresa B..., UNIPESSOAL,LDA”.
- Ao julgar que o motivo justificativo aposto no contrato de trabalho a termo celebrado com a A. é inválido, não satisfazendo as exigências do n.º 3, do art.º 141.º do CT.

FUNDAMENTAÇÃO
II.1 MOTIVAÇÃO DE FACTO
O Tribunal a quo fixou o elenco factual que adiante se passa a transcrever:
1) A A. foi admitida ao serviço da R., sociedade comercial que se dedica à produção de sistemas eletrónicos e eletromecânicos para a indústria automóvel,
2) Por força de um contrato de trabalho, a termo certo, celebrado entre a A. e a a R., em 1 de Outubro de 2018, que foi objecto de renovação em 1 de Outubro de 2019.
3) Assim, a partir de 1-10-2018, a A. passou a exercer a sua actividade profissional remunerada, por conta e sob a direcção e fiscalização da R..
4) A A. estava classificada profissionalmente pela R. como operadora especializada de 3.ª,
5) Auferindo uma retribuição mensal de 649,00€, acrescida de um subsídio de refeição, no valor diário, de 5,95€.
6) Ao contrato de trabalho e respectiva renovação foi aposto um termo certo de 12 meses.
7) Para justificar a sua necessidade de contratar a prazo, a R. no contrato de trabalho que celebrou com a A., na sua cláusula 12.ª (cuja epígrafe é “fundamento do contrato”) referiu que:
O presente contrato tem como fundamentação principal e primária a produção de componentes eletrónicos para automóveis que regista um aumento pontual de necessidades, nomeadamente para as seguintes linhas de produção:
Cliente C...: D..., D1..., E..., E1..., E2... , F..., G..., H..., G....
CLIENTE I...: J..., K..., L...
Cliente M...: N..., N1..., N5..., N3..., N4... ; M1....
Cliente O...: P..., P1...
Cliente Q....
Em contraponto com este aumento de necessidades prevê-se a desativação a médio prazo de parte da produção em virtude da descontinuação de alguns produtos em final de vida na A..., Lda.
Esta decisão estratégica de assegurar os recursos necessários à produção de componentes electrónicos para automóveis, tem como consequência imediata e por um período de tempo que não se prevê superior a um ano, um “acréscimo excecional de atividade da empresa”, e em especial na Produção Automóvel, tendo o seu fundamento legal na alínea f) n.º 2 do artigo 140.º do Código do Trabalho”.
8) Por carta datada de 2-9-2020, a R. comunicou à A. a caducidade do contrato de trabalho celebrado entre ambos, com efeitos em 30/9/2020.
9) Desde esta data, não mais a R. permitiu que a A. reocupasse o seu posto de trabalho,
10) Em ordem a prestar o serviço para que fora contratada.
11) Não foi elaborado prévio procedimento disciplinar.
12) Em 16-6-2020 nasceu a filha da A..
13) A A. beneficiou de licença de parentalidade a partir dessa data.
14) A R. não solicitou parecer prévio ao CITE.
15) A R. procedeu ao pagamento à autora do montante de 519,20€, a título de compensação pela cessação do contrato, sob a designação de Indemnização despedimento.
*
Factos não provados
Não se provaram quaisquer outros factos para além ou em contrário dos anteriormente referidos.

II.2 Reapreciação da matéria de facto
Insurge-se a ré contra a decisão sobre a matéria de facto, em razão do tribunal a quo não ter considerado provado que “A autora, desde janeiro de 2022 que se encontrar a trabalhar e a fazer descontos como trabalhadora em regime de contrato de trabalho subordinado para a empresa B..., UNIPESSOAL, LDA”.
Alega que requereu, nos termos do disposto do art. 5.º do CPC, que esse facto fosse adicionado e tomado em consideração nos termos e para os efeitos daquele normativo, resultando o mesmo provado pelo documentos junto aos autos pela segurança social com ref. citius 31401450 e 31435658 (extrato dos descontos efectuados pela trabalhadora, juntos aos autos por iniciativa do tribunal) e pelo testemunho de BB.
A autora contra-alegou, mas não se pronuncia quanto a esta pretensão da Ré.
Diga-se, desde já, que se mostram integralmente observados os ónus de impugnação estabelecidos no art.º 640.º do CPC.
Sucede, porém, como de seguida passamos a explicar, que esta pretensão recursiva suscita uma questão prévia.
Na acta da audiência de julgamento lê-se o seguinte:
Reaberta a audiência pelas 09:50 horas, face à documentação apresentada pela Segurança Social em 21-02-2022, com refa 31435658 e do qual os ilustres mandatários disseram considerarem-se notificados, a Mm.a Juiz concedeu-lhes a palavra para, querendo, se pronunciarem sobre a mesma.
Nessa sequência,
Pelo ilustre mandatário da autora foi requerido se consignasse a opção desta pela reintegração; pelo ilustre mandatário da ré foi dito que durante a audiência de julgamento, assim como pela documentação junta pela Segurança Social por iniciativa do Tribunal, resultam provados factos não alegados pela ré na contestação apresentada, por desconhecimento e porque na data ainda não existiam, factos esses que têm relevância para o objeto da presente ação e que se afiguram à ré que devem ser tomados em consideração. Tal consiste no facto da autora a partir de Janeiro de 2022 se encontrar a trabalhar e a fazer descontos como trabalhadora da empresa B.... Mais se afigura à ré que o mesmo, que constitui matéria de defesa qualificada como matéria de exceção, terá relevância para efeitos de apreciação do pedido de reintegração da trabalhadora que, mesmo no caso da ação proceder, não pode ser atendido, uma vez que tendo sido celebrado novo contrato de trabalho e não sendo possível a coexistência de dois contratos de trabalho sobre o mesmo objeto, se deverá entender que a celebração do segundo contrato faz caducar essa pretensão e equivale a uma opção pelo direito à compensação, pelo que requereu que esse facto fosse tido em consideração e dado como provado.
O mesmo ficou gravado digitalmente no sistema informático H@bilus Media Studio desde as 09h52m29s até às 09h55m52s
*
Pelo ilustre mandatário da autora foi dito entender que não faz sentido o alegado e requerido pela ré, uma vez que, uma das consequências da apreciação judicial do despedimento e da sua regularidade ou licitude em caso de ser julgado ilícito o despedimento, é a condenação na reintegração do trabalhador, sem prejuízo da categoria e antiguidade. Mais disse não caber à ré decidir se a reintegração pode operar ou não, independentemente da trabalhadora estar atualmente a trabalhar por conta de outro empregador.
Mais foi manifestada, pelo ilustre mandatário da autora, a opção desta pela reintegração.
O mesmo ficou gravado digitalmente no sistema informático H@bilus Media Studio desde as 09h55m55s até às 09h57m26s
*
Seguidamente, a Mm.a Juiz proferiu um despacho nos termos do qual considerou que o ora requerido pelo ilustre mandatário da ré bem como a demais prova serão considerados para a decisão a proferir».
Como se retira do requerimento formulado pelo ilustre mandatário da Ré, não só foi requerido ao Tribunal a quo que considerasse provado o facto em causa, como para além disso, foi expressamente afirmada a pretensão de não poder ser atendido o pedido de reintegração, sob o argumento de que “ uma vez que tendo sido celebrado novo contrato de trabalho e não sendo possível a coexistência de dois contratos de trabalho sobre o mesmo objeto, se deverá entender que a celebração do segundo contrato faz caducar essa pretensão e equivale a uma opção pelo direito à compensação”.
O Tribunal a quo proferiu despacho dizendo que o “requerido pelo ilustre mandatário da ré bem como a demais prova serão considerados para a decisão a proferir”, mas o certo é que percorrida a fundamentação da sentença, quer na parte em motiva a decisão sobre matéria de facto quer quando procede à aplicação do direito, não se encontra a mínima pronúncia a propósito do que foi requerido, ou seja, quer sobre as razões que levaram a não considerar o facto provado, quer sobre o efeito que foi requerido.
Significa isso, salvo melhor opinião, que a sentença enferma de nulidade por omissão de pronúncia, nos termos do art. º 615.º n.º 1 al. d), do CPC.
Com efeito, estabelece o n.º2, do art.º 608.º do NCPC: “O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras; não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras”.
Em consequência desse princípio, como flui do art.º 615.º, n.º 1, alínea d), do CPC, a sentença padece do vício da nulidade quer no caso de o juiz deixar de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar, quer quando conheça de questões de que não podia tomar conhecimento.
Por «questões» entende-se «os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e excepções invocadas e todas as excepções de que oficiosamente lhe cumpre [ao juiz] conhecer (…)» [Lebre de Freitas, Montalvão Machado, e Rui Pinto, Código de Processo Civil Anotado, Coimbra Editora, vol. II, 2ª edição, pg. 704].
Por outras palavras, as questões a que se reporta a alínea d) do nº 1 do artigo 615.º do CPC, vistas na perspectiva do direito substantivo, são os pontos de facto e ou de direito relevantes no quadro do litígio, ou seja, os concernentes ao pedido, à causa de pedir e às excepções.
O incumprimento desta limitação conduz à nulidade da sentença, dizendo-se que esta é por omissão de pronúncia se o juiz não resolver questões que lhe competia conhecer; ou, por excesso de pronúncia, quando o juiz vá para além do que lhe era permitido conhecer.
Ora, como resulta do nº 4 do mesmo art.º 615.º, a arguição de nulidades (salvo a respeitante à falta de assinatura do juiz) deve ser feita perante o tribunal que proferiu a decisão, se esta não admitir recurso ordinário. No caso contrário, o recurso pode ter como fundamento qualquer dessas nulidades.
Por conseguinte, em rigor, a recorrente deveria ter arguido expressamente a nulidade da sentença.
Não obstante, não estando o tribunal vinculado à qualificação jurídica atribuída pelas partes às questões suscitadas, perante a pretensão deduzida e face à argumentação apresentada pela recorrente, designadamente, alegando “a impossibilidade por caducidade do restabelecimento do vínculo com a ora ré, e nos termos do disposto no art. 343 do C.” e a violação desse normativo pela sentença, e para o caso de assim não se entender, que a pretensão da A. configura uma situação e abuso de direito, nos termos do art.º 344.º do Código Civil” [cfr. conclusões 6 a 8], afigura-se-nos que nos cumpre conhecer da questão.
Passando a apreciá-la, devemos dizer de antemão que a pretensão da Ré quanto à alteração da matéria de facto não pode ser atendida.
Como elucidam Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, para que um facto se considere provado é necessário que, à luz de critérios de razoabilidade, se crie no espírito do julgador um estado de convicção, assente na certeza relativa do facto. A prova “assenta na certeza subjectiva da realidade do facto, ou seja, no (alto) grau de probabilidade de verificação do facto, suficiente para as necessidades práticas da vida” [Manual de Processo Civil, 2.ª Edição, Coimbra Editora, Coimbra, 1985, p. 436].
Essa certeza subjectiva, com alto grau de probabilidade, há-de resultar da conjugação de todos os meios de prova produzidos sobre um mesmo facto, ponderando-se a coerência que exista num determinado sentido e aferindo-se esse resultado convergente em termos de razoabilidade e lógica. Se pelo contrário, existir insuficiência, contradição ou incoerência entre os meios de prova produzidos, ou mesmo se o sentido da prova produzida se apresentar como irrazoável ou ilógico, então haverá uma dúvida séria e incontornável quanto à probabilidade dos factos em causa serem certos, obstando a que se considere o facto provado.
O documento junto aos autos pela segurança social consiste num “extracto das remunerações e ou equivalências registadas em seu nome [da autora] no Sistema de Solidariedade e Segurança Social, no período de 2008/01 a 2022/01”, do mesmo contando no que aqui releva, que relativamente ao mês de Janeiro de 2022, foram feitos e entregues descontos para a Segurança Social, respeitantes ao período de 30 dias, sobre a remuneração base de €720,00, pela sociedade B..., UNIPESSOAL LDA. Não se sabe que tipo de relação contratual foi firmada e na hipótese de ser a termo certo por quanto tempo, nem em qualquer caso pode excluir-se a hipótese de uma ou outra parte terem feito cessar a relação laboral, p. ex., durante o período experimental.
Por outro lado, também não é suficiente o testemunho prestado por BB para se alcançar a necessária certeza relativa sobre o facto que a Ré pretende ver provado. Do extracto invocado apenas se retira que a testemunha afirmou que nessa altura a Autora não estava a trabalhar por estar “com baixa porque torceu um pé”, que disse “sei que ela está a trabalhar noutra empresa”, mas não saber desde quando.
É um testemunho impreciso, desde logo, por não ter referido qual a empresa, nem em que condições contratuais prestava a Autora trabalho, nem ter explicado como têm o conhecimento do que relatou, de modo a poder ter-se uma noção sobre a correspondência desse relato com a realidade da vida da autora.
Por conseguinte, a pretensão da recorrente não pode ser atendida.
Mas para que não lhe subsista dúvida, num breve parêntesis, sempre se dirá que ainda que se provasse o facto, não poderia ser atendida a posição da Ré. A lei laboral não veda ao trabalhador a possibilidade de optar pela reintegração quando após o despedimento cuja ilicitude quer ver reconhecida, logra dar início a uma nova relação de trabalho subordinado. A razão parece-nos evidente: em regra, o trabalhador está dependente da retribuição que aufere como contrapartida da prestação de trabalho para satisfazer as necessidades com natureza económica inerentes à sua subsistência e do agregado familiar. Seria um absurdo e, também, uma clara violação do direito constitucional ao trabalho, estabelecido no art.º 58.º 1, da CRP, ao dispor “Todos têm direito ao trabalho”, sujeitar o trabalhador que pretende ser reintegrado a manter-se sem trabalho e sem meios de subsistência até ver o desfecho da acção, acrescendo que sem poder ter a certeza de o mesmo lhe ser favorável.
Nesses casos, o trabalhador apenas terá que por termo à relação laboral que entretanto contratou, de modo a poder concretizar a reintegração. Como bem se percebe, subjacente a uma opção nesses termos estarão, em regra, razões de ordem pessoal.
Concluindo, improcede a impugnação da decisão sobre a matéria de facto.

II.3 Motivação de direito
Vem a Ré sustentar que o Tribunal a quo errou na aplicação do direito aos factos por ter julgado que o motivo justificativo aposto no contrato de trabalho a termo celebrado com a A é inválido, não satisfazendo as exigências do n.º 3, do art.º 141.º do CT.
Após enquadrar juridicamente a questão, o Tribunal a quo pronunciou-se nos termos seguintes:
Descendo ao caso vertente, o texto da cláusula 12ª do contrato a termo celebrado não esclarece de modo suficiente, quais eram os factos ou circunstâncias que acarretaram o acréscimo “excepcional” da actividade da R., qual o “aumento pontual de necessidades” das linhas de produção identificadas de componentes electrónicos para automóveis nem concretiza o aí invocado que “Em contraponto com este aumento de necessidades prevê-se a desativação a médio prazo de parte da produção em virtude da descontinuação de alguns produtos em final de vida na A..., Lda”.
Apesar da identificação, ainda que codificada, das linhas de produção em causa no aumento pontual de necessidades registado na produção de componentes electrónicos, queda por compreender se esse aumento se inscreve no normal desenvolvimento da actividade empresarial da ré, que é precisamente a da produção de sistemas eletrónicos e eletromecânicos para a indústria automóvel, com a progressão natural do volume de encomendas dos seus clientes C..., I..., M..., O... e Q..., consabidamente marcas automóveis extremamente prestigiadas e com uma sólida implementação no mercado mundial (que resistiu, ou quiçá consolidou, ao contexto de pandemia vivenciado no período em causa nos autos), determinativo do aumento das necessidades de produção da empresa aqui ré ou se resulta de uma intensificação das necessidades de reconversão e evolução tecnológica, que neste sector é evidente e quase vertiginosa, também natural (e, até, eventualmente programada) da sua actividade.
Veja-se que a utilização do termo “pontual” na frase “produção de componentes electrónicos para automóveis que regista um aumento pontual de necessidades”, não permite saber - pela ausência a uma referência concreta a determinada encomenda ou encomendas dos clientes referidos ou a determinado modelo automóvel, ou componente automóvel, e por que período - a que “aumento pontual de necessidades” se pretende referir no contrato, dificilmente se compaginando a expressão “aumento pontual de necessidades” ao período de um ano e posterior renovação do contrato verificada.
E contrapondo-se em tal cláusula 12ª que “Em contraponto com este aumento de necessidades prevê-se a desativação a médio prazo de parte da produção em virtude da descontinuação de alguns produtos em final de vida na A..., Lda”, não se mostra suficientemente concretizado e, por conseguinte, susceptível de verificação que parcela da produção da Ré será descontinuada e dentro de que período temporal, que o contrato qualifica como “médio prazo”, por forma a aferir se esta desactivação contende sequer com a duração do contrato.
Do exposto se conclui que o motivo justificativo aposto no contrato a termo em causa nos autos, e posterior renovação, não está alicerçado em factos que permitam a sua sindicabilidade e a verificação externa da conformidade da situação invocada com a hipótese legal mencionada no contrato. Além do mais, igualmente não permite a conformação e adequação da justificação invocada com a duração estipulada.
De sublinhar que neste mesmo sentido, apreciando situações fácticas semelhantes à dos presentes autos, se vem sistematicamente pronunciando o Tribunal da Relação do Porto, nos acórdãos proferidos nos processos 4458/19.6T8MAI e 229/20.5T8MAI, este último datado de 22-02-2021, in www.dsgi.pt, que acompanhamos de perto: «Para que se possa afirmar a validade do termo resolutivo aposto ao contrato é necessário que se explicitem no seu texto os factos que possam reconduzir ao motivo justificativo indicado e que tais factos tenham correspondência com a realidade. A invocação no contrato, para justificar a aposição do termo certo, de um “aumento pontual de necessidades, nomeadamente para as seguintes linhas de produção” e que “prevê-se a desativação a médio prazo de parte da produção em virtude da descontinuação de alguns produtos em final de vida”, sem mais qualquer concretização, constitui uma justificação genérica e vaga que não permite ao tribunal efetuar um juízo de adequação da justificação à hipótese legal e à duração certa estipulada para o contrato. Considera-se celebrado por tempo indeterminado o contrato a termo e respetivas renovações quando o respetivo texto não concretiza com factos os acréscimos temporários de trabalho que foram invocados.»
Em suma, estamos perante um contrato de trabalho por tempo indeterminado, celebrado entre a Autora e a Ré a 1-10-2018, cumprindo aferir da causa da sua cessação.».
Discorda a recorrente, argumentando que na cláusula 12º está indicado e concretizado um fundamento embora se utilize uma linguagem esquemática. Um intérprete ou normal declaratório percebe perfeitamente o sentido da comunicação transmitida, e da qual resulta que a autora ia ser, e foi contratada apenas por um período limitado de tempo, devidamente datado no contrato, e que é de 12 meses, e que essa contratação é feita para a atalhar a uma necessidade pontual da empresa de assegurar o fornecimento de peças a um grupo particular e restrito dos clientes da ré, e num conjunto de linha de produção que estão devidamente identificadas.
Defende, ainda, que no texto da cláusula sexta estabelece-se a relação entre a justificação invocada e o termo aposto no contrato, quando se diz que a trabalhadora será contratada para as linhas onde surgiram as necessidades decorrentes do aumento pontual que não será superior a um ano, que é o prazo pelo qual o contrato foi celebrado e aposto o termo.
Respondeu a recorrida, defendendo que contrariamente ao alegado pela Recorrente, a cláusula é severamente insuficiente, pois apesar da sua extensão, a verdade é que ela se traduz num enorme nada. Não esclarece de modo suficiente quais os concretos factos que traduzem o carácter excecional do acréscimo da atividade da apelante, nem a que encomendas se pretende referir no contrato, nem tão pouco quais os componentes eletrónicos em causa. Muito menos faz sentido, quando diz que em contraponto com este aumento de necessidades prevê-se a desativação a médio prazo de parte da produção em virtude da descontinuação de alguns produtos em final de vida na A..., Lda..
II.3.1 Afigurando-se-nos pertinente começar por uma breve incursão na evolução legislativa relativa ao contrato de trabalho a termo, buscando a origem e as razões subjacentes à exigência da indicação do “motivo justificativo”, nesse percurso seguiremos a fundamentação que deixámos expressa nos Acórdãos de 23-04-2018 e 8 de Março de 2019 [respectivamente, nos proc.º 3524/16.4T8MAI.P1 e 18476/17.5T8PRT.P1, ambos relatados pelo aqui relator e com intervenção do 1.º adjunto, disponíveis em www.dgsi.pt].
O contrato de trabalho a prazo foi admitido pela nossa legislação, primeiramente pelo Decreto-lei n.º 781/76, de 28 de Outubro, e depois, sob a designação de contrato de trabalho a termo, pelos artigos 41.º e seguintes do Decreto-lei n.º 64-A/89 de 27 de Fevereiro.
O regime jurídico introduzido pelo Decreto-lei n.º 781/76, de 28 de Outubro, resultou da necessidade de atenuar as restrições introduzidas ao regime jurídico dos despedimentos no pós 25 de Abril, através de uma liberalização do regime dos contratos a prazo. Com efeito, o contrato a prazo (ou a termo, como posteriormente designado) veio proporcionar a prestação de trabalho durante um certo período temporal, decorrido o qual cessava, permitindo uma desvinculação fácil da relação contratual, com relativamente poucos encargos.
Como escreve Bernardo da Gama Lobo Xavier, «(..) a radicalização da legislação sobre despedimentos em 1976 foi de certa forma” compensada” por uma liberalização do regime dos contratos a prazo, acabando a contratação a prazo por constituir o instrumento patronal que se revelou mais apto para conseguir a flexibilização dos contratos de trabalho. Pode mesmo dizer-se que durante anos a contratação por tempo determinado passou a representar a forma corrente de admissão de trabalhadores nas empresas, calculando-se que as admissões a prazo representavam mais de 70% do total das empresas» [Bernardo da Gama Lobo Xavier, Iniciação ao Direito do Trabalho, 2.ª ed., Editorial Verbo,1999, p. 288].
O Decreto-lei n.º 781/76, de 28 de Outubro, veio a ser revogado pelo Decreto-lei n.º 64-A/89, de 27 de Fevereiro, usualmente denominado por LCCT, o qual introduziu alterações substanciais ao regime anterior dos contratos a prazo, que passaram a ser denominados a termo. No essencial essas alterações visaram dificultar significativamente a contratação a prazo, só a permitindo em certos e determinados casos expressamente indicados na lei (artigos 41.º a 53.º).
Procurou, assim, afirmar-se o carácter excepcional a admissibilidade do contrato de trabalho a prazo, imposto pelo princípio da segurança no emprego, consagrado no artigo 53.º da Constituição, como um direito fundamental inserido nos direitos, liberdades e garantias dos trabalhadores, de que decorre, como corolário, a vocação da perenidade da relação de trabalho. No preâmbulo da LCCT, mais precisamente na parte relativa à contratação a termo, pode ler-se “Relativamente ao contrato a termo passa a restringir-se a situações rigorosamente tipificadas, das quais umas resultam de adaptação das empresas às flutuações de mercado ou visam criar condições para absorção de maior volume de emprego, favorecendo os grupos socialmente mais vulneráveis, e outras atendem a realidades concretas pacificamente aceites como justificativas de trabalho de duração determinada”.
Visando dar concretização a esse propósito, o art.º 41.º dispunha que “(..) a celebração de contrato a termo só é admitida nos casos seguintes”, assim reafirmando o carácter excepcional do contrato a prazo, depois enumerando um conjunto de situações, possíveis de arrumar em dois grupos de casos: i) um de carácter objectivo, para satisfação de necessidades temporárias da empresa e pelo período estritamente necessário à satisfação dessas necessidades; ou para lançamento de uma nova actividade de duração incerta; ou início de laboração de uma empresa ou estabelecimento; ii) Outro de carácter mais subjectivo, relacionado com situações específicas dos trabalhadores (p. ex. substituição temporária de trabalhador).
Com a finalidade de permitir um maior controlo dos requisitos substantivos e demais condicionalismos legais, a lei veio estabelecer, na expressão de Bernardo da Gama Lobo Xavier, “severos requisitos formais” para a estipulação do contrato a termo [Op. cit., p. 290].
Assim, relativamente à correspondente norma do DL 781/76, isto é, ao art.º 6.º, o art.º 42.º do novo diploma veio introduzir a obrigatoriedade de outras novas menções no contrato reduzido a escrito, entre elas surgindo, então, “a indicação do motivo justificativo” [n.º1, al e)], cuja falta de menção passou a ser uma das causas para se considerar o contrato sem termo [n.º3].
Como lapidarmente se afirma em Acórdão do STJ de 9 de Fevereiro de 1993, a exigência legal da indicação do motivo justificativo é uma consequência do carácter excepcional que a lei atribui à contratação termo [publicado em Acórdãos Doutrinais 379, 831].
Contudo, a realidade revelou que essa exigência era facilmente iludida, tendo sido prática generalizada a mera reprodução das fórmulas genéricas do n.º1, do art.º 41.º, mencionando-se que o contrato a termo era celebrado devido a “acréscimo temporário ou excepcional da actividade da empresa”, ou “para execução de tarefa ocasional”, etc.
Ciente dessa realidade e para obstar à legitimação artificiosa do contrato a termo, manifestamente contrária ao pretendido “carácter excepcional” da contratação a termo, o legislador procurou tornar aquela exigência mais rigorosa, intervindo na LCCT através da Lei n.º 38/96, de 31 de Agosto, dispondo o seu artigo 3.º (com a epígrafe “Motivo justificativo na celebração do contrato de trabalho a termo”), o seguinte:
-[1] «A indicação do motivo justificativo da celebração de contrato de trabalho a termo, em conformidade com o n.º 1 do artigo 41.º e com a alínea e) do n.º 1 do artigo 42.º do regime jurídico da cessação do contrato individual de trabalho e da celebração e caducidade do contrato de trabalho a termo, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 64-A/89, de 27 de Fevereiro, só é atendível se mencionar concretamente os factos e circunstâncias que integram esse motivo».
Importa notar, como o faz António Monteiro Fernandes, que “Assim, tornou-se claro aquilo que, de algum modo, já se podia deduzir das formulações iniciais da lista de situações justificativas, como condição como condição de consistência e efectividade dessa exigência legal”, para assinalar que esse era já o “entendimento corrente na jurisprudência”, citando os acórdãos seguintes: da Rel. Évora, de 8/11/94, CJ 94, 5,298 e de 8/12/94, BMJ 442,277; da Rel. Porto, de 20/3/95, CJ 95, 2, 246 e de 11/3/96, CJ 96, 2, 255; e, da Rel. de Lisboa, de 13/7/95, CJ 95, 4, 152 [Direito do Trabalho, 14.ª edição, Almedina, Coimbra, 2009, p. 328 e nota 2].
Pese embora aquela alteração, alguns anos volvidos veio o legislador a considerar necessário uma nova intervenção, mais uma vez com o propósito de reforçar a exigência da indicação do motivo justificativo para assim melhor salvaguardar o carácter excepcional do contrato a termo. Essa intervenção foi operada pela Lei n.º 18/ 2001, de 3 de Julho, alterando a LCCT e a Lei n.º 38/96, de 31 de Agosto. Assim, através do artigo 3.º daquela primeira, o art.º 3.º desta última foi alterado para passar a ter a redacção seguinte:
[1] «A indicação do motivo justificativo da celebração de contrato de trabalho a termo, em conformidade com o n.º 1 do artigo 41.º e com a alínea e) do n.º 1 do artigo 42.º do regime jurídico da cessação do contrato individual de trabalho e da celebração e caducidade do contrato de trabalho a termo, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 64-A/89, de 27 de Fevereiro, só é atendível se mencionar concretamente os factos e circunstâncias que objectivamente integram esse motivo, devendo a sua redacção permitir estabelecer com clareza a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado».
Com a entrada em vigor do Código do Trabalho /03, aprovado pela Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto, foi revogada a generalidade da legislação laboral então existente e dispersa numa pluralidade de diplomas, expressamente mencionada na norma revogatória constante do art.º 12.º da referida lei, entre eles se contando o Decreto-Lei n.º 64-A/89, de 27 de Fevereiro (LCCT),
Nesse primeiro Código do Trabalho, a disciplina relativa ao contrato de trabalho a termo certo ou incerto, consta dos artigos 127.º a 145.º, relevando mencionar os artigos 129.º [Admissibilidade do contrato], 130.º [Justificação do termo] e 131.º [Formalidades], posto que no actual Código do Trabalho de 2009, aqui aplicável, àqueles normativos correspondem os seus artigos 140.º, 141.ºe 147.º, sem que haja alteração em termos substantivos.
Assim, na mesma linha da anterior disciplina da LCTT, o contrato de trabalho a termo só pode ser celebrado “para satisfação de necessidade temporária da empresa e pelo período estritamente necessário à satisfação dessa necessidade” [n.º1 do art.º 140.º CT/09], constando depois o n.º2 do mesmo artigo, numa enumeração não taxativa, mas praticamente exaustiva, um conjunto de situações que se consideram “necessidade temporária da empresa”. Mas para além dessas, conforme disposto no n.º4, do mesmo artigo, admite-se ainda a celebração de contrato de trabalho a termo certo nos casos seguintes:
a) Lançamento de nova actividade de duração incerta, bem como início de laboração de empresa ou de estabelecimento pertencente a empresa com menos de 750 trabalhadores;
b) Contratação de trabalhador à procura de primeiro emprego, em situação de desemprego de longa duração ou noutra prevista em legislação especial de política de emprego.
Inserindo-se também na linha da anterior disciplina, decorre do artigo do n.º1, do art.º 141.º CT/09, que o contrato deve observar a forma escrita e conter determinadas menções, mencionadas nas alíneas a) a f), nomeadamente as seguintes:
[a] Identificação, assinaturas e domicílio ou sede das partes;
[b] Atividade do trabalhador e correspondente retribuição;
[c] Local e período normal de trabalho;
[d] Data de início do trabalho;
[e] Indicação do termo estipulado e do respectivo motivo justificativo;
[f] Datas de celebração do contrato e, sendo a termo certo, da respectiva cessação.
No que respeita à exigência da alínea e), vem depois o nº 3, do mesmo artigo, dispor que “Para efeitos da alínea e) do n.º1, a indicação do motivo justificativo do termo deve ser feita com menção expressa dos factos que o integram, devendo estabelecer-se a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado”.
Para o caso releva ainda o regime da renovação do contrato de trabalho a termo certo, importando atentar no art.º 140.º do CT/03, que dispunha o seguinte:
-[140.º/CT03]
1- Por acordo das partes, o contrato a termo pode não estar sujeito a renovação.
2- O contrato renova-se no final do termo estipulado, por igual período, na falta de declaração das partes em contrário.
3- A renovação do contrato está sujeita à verificação das exigências materiais da sua celebração, bem como às de forma no caso de se estipular prazo diferente.
4-Considera-se sem termo o contrato cuja renovação tenha sido feita em desrespeito dos pressupostos indicados no número anterior.
5- Considera-se como único contrato aquele que seja objecto de renovação.
Corresponde-lhe parcialmente o artigo 149.º do actual CT/09, dispondo:
1- As partes podem acordar que o contrato de trabalho a termo certo não fica sujeito a renovação.
2- Na ausência de estipulação a que se refere o número anterior e de declaração de qualquer das partes que o faça cessar, o contrato renova-se no final do termo, por igual período se outro não for acordado pelas partes.
3 – A renovação do contrato está sujeita à verificação da sua admissibilidade, nos termos previstos para a sua celebração, bem como a iguais requisitos de forma no caso de se estipular período diferente.
4- Considera-se como único contrato aquele que seja objecto de renovação.
Nos termos do artigo 147.º CT/09, a inobservância das exigências decorrentes do n.º 1 e de algumas das alíneas do artigo 141.º CT/09, importam que o contrato se considere sem termo; e, a violação do artigo 149.º, no que respeita às renovações, leva a que o contrato se converta sem termo. Mais pormenorizadamente, dispõe o aludido artigo o seguinte:
1. Considera-se sem termo o contrato de trabalho:
a) Em que a estipulação do termo tenha por fim iludir as disposições legais que regulam o contrato sem termo.
b) Celebrado fora dos casos previstos nos n.ºs 1, 3 ou 4 do artigo 140.º;
c) Em que falte a redução a escrito, a identificação ou a assinatura das partes, ou, simultaneamente, as datas de celebração do contrato e de início do trabalho, bem como aquele em que se omitam ou sejam insuficientes as referências ao termo celebrado e ao motivo justificativo;
d) (..)
2. Converte-se em contrato sem termo:
a) Aquele cuja renovação tenha sido feita em violação do disposto no artigo 149.º;
(..).
Por último, releva também referir que o legislador, acolhendo o que já vinha sendo entendido pacificamente pela jurisprudência, consagrou expressamente recair sobre o empregador o ónus de prova dos factos que justificam a celebração de contrato a termo [n.º4, do art.º 41.º do DL 64-A/89; n.º1 do art.º 130.º do CT/03; e, n.º5, do art.º 140.º do CT/09].
Concluindo esta notas, como elucida Monteiro Fernandes, reportando-se às normas do vigente CT/09, «(..) o art.º 141.º/3 CT exige a “menção expressa dos factos” que integram o motivo, “devendo estabelecer-se a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado”. Assim, não basta referir-se um “acréscimo temporário de actividade”, é exigido que se concretize esse tipo de actividade em que se verifica a intensificação e a causa desta. É necessário, em suma, que a indicação requerida permita duas coisas: a verificação externa da conformidade da situação concreta com a tipologia do art.º 140.º; e a realidade e a adequação da própria justificação face à duração estipulada para o contrato. Na verdade, a exigência legal da indicação do motivo justificativo é uma consequência do caráter excepcional que a lei atribui à contratação a termo e do princípio da tipicidade funcional que se manifesta no art.º 140.º: o contrato só pode ser (validamente) celebrado para certos fins e na medida em que estes o justifiquem» [Op. cit., 328/329].
Atento esse duplo objectivo da exigência legal do motivo justificativo, como consequência do carácter excepcional da contratação a termo, só admitindo que o contrato a termo possa ser validamente celebrado para certos fins e na medida em que estes o justifiquem, há sempre que justificar o recurso a esse tipo de contratação, cabendo tal ónus à entidade empregadora, como decorre da conjugação do disposto na al. e), do n.º1 e n.º3, do art.º 141.º CT/09, sob pena de conversão do contrato a termo em contrato sem termo [n.º 1, al. c) do artigo 147.º CT/09].
Este é igualmente o entendimento pacífico da jurisprudência dos tribunais superiores, mormente do Supremo Justiça, como se retira do Acórdão dessa instância, de 22-02-2017 [Proc.º n.º 236/15.0T8AVR.P1.S1, Conselheiro Gonçalves Rocha, disponível em www.dgsi.pt], em cuja fundamentação se exara o seguinte:
-«(..)
Assim, e conforme se decidiu no acórdão deste Supremo Tribunal de 2/12/2013, Processo n.º 273/12.6T4AVR.C1.S1, 4ª Secção, consultável em www.dgsi.pt, a indicação do motivo justificativo da celebração de contrato de trabalho a termo constitui uma formalidade “ad substantiam”, tendo que integrar, forçosamente, o texto do contrato, pelo que a insuficiência de tal justificação não pode ser suprida por outros meios de prova.[2]
Donde ser de concluir que as fórmulas genéricas constantes das várias alíneas do nº 2 do art. 140º do Código do Trabalho têm de ser concretizadas em factos que permitam estabelecer a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado, por forma a permitir a verificação externa da conformidade da situação concreta com a tipologia legal e que é real a justificação invocada e adequada à duração convencionada para o contrato.
Por isso, tal indicação deve ser feita de forma suficientemente circunstanciada para permitir o controlo da existência da necessidade temporária invocada pela empresa no contrato, possibilitando também, quanto àquelas necessidades temporárias, que se comprove que o contrato a termo é celebrado pelo período estritamente necessário à satisfação dessas necessidades[3], cabendo ao empregador a prova dos factos que justificam a celebração de contrato de trabalho a termo, conforme prescreve o n.º 5 do mencionado artigo 140º».
Refira-se, ainda, que o entendimento afirmado é unânime e pacifico, designadamente nesta secção, como também o evidencia o Ac. de 22-02-2021, invocado pelo Tribunal a quo [proc.º 229/20.5T8MAI-A.P1, relatado pelo aqui 1.º adjunto, disponível em www.dgsi.pt], em cujo sumário se consignou o que segue:
I - Para que se possa afirmar a validade do termo resolutivo aposto ao contrato é necessário que se explicitem no seu texto os factos que possam reconduzir ao motivo justificativo indicado e que tais factos tenham correspondência com a realidade.
II - A invocação no contrato, para justificar a aposição do termo certo, de um “aumento pontual de necessidades, nomeadamente para as seguintes linhas de produção” e que “prevê-se a desativação a médio prazo de parte da produção em virtude da descontinuação de alguns produtos em final de vida”, sem mais qualquer concretização, constitui uma justificação genérica e vaga que não permite ao tribunal efetuar um juízo de adequação da justificação à hipótese legal e à duração certa estipulada para o contrato.
III - Considera-se celebrado por tempo indeterminado o contrato a termo e respetivas renovações quando o respetivo texto não concretiza com factos os acréscimos temporários de trabalho que foram invocados».
II.3.2 Revertendo ao caso, os factos relevantes são os seguintes:
2) Por força de um contrato de trabalho, a termo certo, celebrado entre a A. e a a R., em 1 de Outubro de 2018, que foi objecto de renovação em 1 de Outubro de 2019.
7) Para justificar a sua necessidade de contratar a prazo, a R. no contrato de trabalho que celebrou com a A., na sua cláusula 12.ª (cuja epígrafe é “fundamento do contrato”) referiu que:
- “O presente contrato tem como fundamentação principal e primária a produção de componentes eletrónicos para automóveis que regista um aumento pontual de necessidades, nomeadamente para as seguintes linhas de produção:
Cliente C...: D..., D1..., E..., E1..., E2... , F..., G..., H..., G....
CLIENTE I...: J..., K..., L...
Cliente M...: N..., N1..., N5..., N3..., N4... ; M1....
Cliente O...: P..., P1...
Cliente Q....
Em contraponto com este aumento de necessidades prevê-se a desativação a médio prazo de parte da produção em virtude da descontinuação de alguns produtos em final de vida na A..., Lda.
Esta decisão estratégica de assegurar os recursos necessários à produção de componentes electrónicos para automóveis, tem como consequência imediata e por um período de tempo que não se prevê superior a um ano, um “acréscimo excecional de atividade da empresa”, e em especial na Produção Automóvel, tendo o seu fundamento legal na alínea f) n.º 2 do artigo 140.º do Código do Trabalho”.
Está em causa aferir da validade do motivo justificativo aposto no contrato de trabalho a termo certo, celebrado entre a A. e a a R., em 1 de Outubro de 2018, que foi objecto de renovação em 1 de Outubro de 2019, é válido face às exigências impostas pelo n.º 3, do artigo 141.º e art.º 149.º n.º 3, do CT, este último aplicável à renovação. Ou seja, cabe verificar se a indicação do motivo justificativo do termo está feita “com menção expressa dos factos que o integram, devendo estabelecer-se a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado”.
Sendo certo, como se deixou dito, que nos termos do artigo 147.º CT/09, a inobservância das exigências decorrentes do n.º 1 e de algumas das alíneas do artigo 141.º CT/09, importam que o contrato se considere sem termo; e, do mesmo modo, a violação do artigo 149.º, no que respeita às renovações, leva igualmente a que o contrato se converta sem termo.
Como os fundamentos que acima constam transcritos, concluiu o Tribunal a quo que “o motivo justificativo aposto no contrato a termo em causa nos autos, e posterior renovação, não está alicerçado em factos que permitam a sua sindicabilidade e a verificação externa da conformidade da situação invocada com a hipótese legal mencionada no contrato. Além do mais, igualmente não permite a conformação e adequação da justificação invocada com a duração estipulada”.
Concordamos, no essencial, com a fundamentação que sustentou a decisão e, por decorrência lógica, com o juízo do Tribunal a quo. Com o devido respeito, a tese da recorrida não merece, diremos mesmo, manifestamente, acolhimento.
A justificação aposta no contrato, pese embora sua extensão, acaba por ser vaga e imprecisa, nada concretizando. Por um lado, não há menção dos factos necessários para permitir concluir pela verificação da existência real de uma necessidade de carácter temporário; e, por outro, nem tão pouco permite estabelecer uma relação lógica entre a justificação e o período de contratação por um ano.
Mas acresce uma outra razão, que melhor evidencia o afirmado, retirando de todo qualquer validade à posição da recorrente.
Nos termos do n.º 2, alínea f), do art.º 140.º, CT/09, ou seja, a norma invocada pela requerente, considera-se necessidade temporária da empresa o “Acréscimo excepcional da actividade da empresa”.
Ora, convém não esquecer que houve uma renovação, pelo mesmo período de um ano, como se disse sujeita às mesmas exigências quanto à possibilidade de celebração, ou seja, na realidade visar dar “satisfação [a] necessidades temporárias, objetivamente definidas pela entidade empregadora e apenas pelo período estritamente necessário à satisfação dessas necessidades” [n.º1, do art.º 140.º], bem assim de indicação do motivo justificativo devidamente fundamentado.
Ora, se a Ré justificou o primeiro contrato aludindo a “um aumento pontual de necessidades” e referiu, que “Em contraponto com este aumento de necessidades prevê-se a desativação a médio prazo de parte da produção em virtude da descontinuação de alguns produtos em final de vida na A..., Lda”, como é que se explica que esse alegado “aumento pontual” continue a verificar-se na renovação por mais um ano, assim como a previsão da “desativação a médio prazo de parte da produção [..]?
Como cremos ser de incontornável evidência, há uma manifesta incoerência, arredando a hipótese da contratação, máxime a renovação, visar a “satisfação de necessidades temporárias” resultantes de um “acréscimo excepcional da actividade da empresa”.
Por conseguinte, só pode concluir-se que o motivo justificativo não permite retirar o que é exigível, ou seja, parafraseando Monteiro Fernandes, “a verificação externa da conformidade da situação concreta com a tipologia do art.º 140.º; e a realidade e a adequação da própria justificação face à duração estipulada para o contrato”.
Concluindo, improcede o recurso.

III. DECISÃO
Em face do exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar o recurso improcedente, confirmando a sentença.

Custas do recurso a cargo da Ré, atento o decaimento (art.º 527.º do CPC.


Porto, 20 de Março de 2020
Jerónimo Freitas
Nelson Fernandes
Teresa Sá Lopes