Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
881/16.6JAPRT-BA.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: CRAVO ROXO
Descritores: RECUSA DE JUÍZ
DESPACHOS PROCESSUAIS
PRESSÃO MEDIÁTICA
Nº do Documento: RP20170720881/16.6JAPRT-BA.P1
Data do Acordão: 07/20/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: INCIDENTE DE RECUSA DE JUIZ
Decisão: INDEFERIDO
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO, (LIVRO DE REGISTOS N.º 42/2017, FLS.13-22)
Área Temática: .
Sumário: I – A interpretação e aplicação da lei, tal como emerge dos despachos processuais, em desconformidade com o entendimento da parte, não constitui motivo para questionar a honra e profissionalismo do juiz, pondo em causa a sua imparcialidade.
II – A pressão social e mediática dos factos submetidos a julgamento não constitui motivo para suspeitar da imparcialidade do juiz.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo n.º 881/16.6JAPRT-BA.P1.
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Acordam no Tribunal da Relação do Porto:
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No processo comum nº 881/16.6JAPRT-BA.P1, do 2º Juiz do Juízo de Instrução Criminal do Porto, vieram os arguidos B… e C… suscitar o incidente de recusa de Juiz, relativamente à Meritíssima Juíza que não identificam, mas que se depreende ser a Senhora Dra. D…, alegando sumariamente que:
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Do 1º arguido:
O valor essencial da imparcialidade, como condição e qualidade estrutural da função de julgar está, desde logo, consagrada na CEDH (Convenção Europeia dos Direitos do Homem), onde no seu artigo 6.° se lê: "qualquer pessoa tem direito a que a sua causa seja examinada ( ... ) por um tribunal (...) imparcial (... )."
Os princípios e os direitos fundamentais dos Homens, próprios do Estado de Direito Português, porque democrático, visam assegurar a imparcialidade dos tribunais.
Para tal exige-se a independência e garantia de imparcialidade dos juízes (nomeadamente artigos 2o, 8o, 20°, 202° e 203° da Constituição da República Portuguesa (doravante designada por C.R.P.); o artigo 6o, 1 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem; o artigo 10° da Declaração Universal dos Direitos do Homem; o artigo 14° n° 1 do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos; e o artigo 47° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia) nas suas decisões.
O processo penal português, atenta a sua estrutura acusatória (artigo 32° n° 5 da C.R.P.), tem uma dimensão deveras importante do princípio das garantias de defesa (artigo 32° n° 1 da C.R.P.) constituindo a imparcialidade do Juiz uma garantia essencial e única, a quem apenas pode recorrer a um tribunal para decidir da sua causa.
«Independência e imparcialidade são verso e reverso da mesma realidade fundamental, e a imparcialidade é uma nota essencial do próprio conceito de tribunal» in Castro Mendes, Nótula, pág. 660.
Como ensina Figueiredo Dias in "Direito Processual Penal, Io vol., Coimbra, 1974, página 315: "não é tanto o facto de, a final, o juiz ter conseguido ou não manter a sua imparcialidade, mas sim defendê-lo da suspeita de a não ter conservado, não dar azo a qualquer dúvida, por esta via reforçando a confiança da comunidade nas decisões dos seus magistrados".
A imparcialidade do Juiz pode ser assegurada através do mecanismo de Recusa, quando nos termos do disposto no artigo 43°, n° 1 do Código de Processo Penal (doravante designado por C.P.P.): "ocorrer motivo, sério e grave, adequado a gerar confiança sobre a sua imparcialidade".
Assim, a demonstração de que, na direção dos actos processuais, o juiz concede um tratamento injustificado e arbitrariamente diferenciado a um sujeito processual, privilegiando-o ou prejudicando-o, inclinando-se desde logo, num determinado sentido de decisão da causa, implica a sua suspeição e fica comprometida a sua imparcialidade.
Com efeito, o arguido nos presentes autos, advogado, que usa o nome profissional de E…, foi mandatário de vários arguidos no processo n° 5544/11.6TAVNG-J, que correu termos pelo Tribunal da Comarca do Porto, Instância Central de Instrução Criminal do Porto, 1a Secção, Juiz 3.
10º
A Juiz que presidiu à fase de instrução do processo supra mencionado é a mesma Juiz de Instrução Criminal dos presentes autos.
11°
E, nada haveria a acrescer, não fosse o facto de a imparcialidade objectiva da Sr.a Juiz ora recusada, motivada pelas suas atitudes, motivações e pré-juízos de valor, se encontrar prejudicada pelo que a seguir se descreve, o que de todo não se pode permitir, sob pena de a Justiça ficar desprovida de imparcialidade, seriedade e segurança.
Vejamos:
12°
Em 22 de Maio de 2015, no âmbito do processo supra referenciado (5544/11,6TAVNG) foi proferido o seguinte despacho (de que se transcreve na parte que interessa ao presente Incidente, tendo também sido omitido propositadamente o nome dos arguidos):
"...O Ilustre Mandatário dos arguidos, no debate instrutório veio invocar que a presente instrução padece do vício de irregularidade, por ter ocorrido violação do prazo máximo fixado para esta fase processual no art. 306° do C.P.P., e que é o de 4 meses, uma vez que o debate instrutório na instrução requerida pelos co-arguidos que se encontram em liberdade, só foi realizado cerca de 6 meses depois de 17/10/2014 (altura em que foi proferida a decisão instrutória na instrução requerida pelo arguido, que se encontrava preso preventivamente).
Termina concluindo pela procedência da invocada irregularidade e que em consequência, seja iniciada de novo a fase de instrução. Cumpre decidir.
Efectivamente, dispõe o art. 306° n° 1 do C.P.P. que "O juiz encerra a instrução nos prazo máximos de (...) quatro meses" se não houver arguidos presos ou sob obrigação de permanência na habitação.
O n° 3 da mesma norma prescreve que "Para efeito do disposto nos números anteriores, o prazo conta-se a partir da data de recebimento do requerimento para abertura da instrução". No caso dos autos, a instrução requerida pelos co-arguidos que se encontram em liberdade, foi admitida e declarada aberta por decisão proferida em 17/11/2014.
Foram efectuadas as diligências que o tribunal entendeu pertinentes e ainda o interrogatório judicial de 7 (dos 9 arguidos que o requereram) arguidos, por ter sido por eles requerido e ser diligência obrigatória para o JIC.
Por decisão proferida em 24/2/2015, foi designado o dia 27 de Abril do corrente ano para a realização do debate instrutório.
Ou seja, o referido debate foi designado para data que ultrapassou apenas em 10 dias, o prazo previsto no art. 306° n°s 1 e 3 do C.P.P.
O Ilustre Mandatário dos arguidos foi notificado de tal despacho em 9 de Março de 2015 (cfr. fls. 16153 e art. 113°n°s 1 b) e 2 do C.P.P.) e as arguidas em 14 de Março de 2015 (cfr. fls. 16209, 16214 e art. 113° n°s 1 c), 3 e 13 do C.P.P.).
O art. 123° n° 1 do C.P.P. prescreve que "Qualquer irregularidade do processo só determina a invalidade do acto a que se refere e dos termos subsequentes que possa afectar quando tiver sido arguida pelos interessados no próprio acto ou, se a este tiverem assistido, nos três dias seguintes a contar daquele em que tiverem sido notificados para qualquer termo do processo ou intervindo em algum acto nele praticado".
Nem o Ilustre Mandatário das referidas arguidas, nem estas, estiveram presentes na prolação do despacho que designou o dia 27 de Abril de 2015 para a realização do debate instrutório (cfr. fls. 16138).
E o certo é que também não vieram invocar a suposta irregularidade nos 3 dias seguintes à notificação de tal decisão, conforme prevê o citado preceito legal. Consequentemente, a suposta irregularidade, a ter ocorrido, considera-se sanada, ou seja, mantém-se válida a instrução. Por outro lado, conforme se verifica do exame dos autos, o referido debate instrutório não pode realizar-se no aprazado dia 27/472015 por motivo (não imputável ao tribunal) da falta de comparência dos mandatários constituídos pelos arguidos, atento o disposto no artº 63° n° 1 por referência ao art. 300° n° 1 do C.P.P.
Em observância do disposto no art. 300° n° 4 do C.P.P., realizou-se o debate instrutório, 3 dias depois (30/4/2015).
Note-se ainda que mesmo ultrapassado o prazo previsto no n° 1 do art. 306° do C.P.P., não ocorreu qualquer vício, muito menos o da invocada irregularidade da instrução.
Com efeito, os prazos estabelecidos na referida norma são meramente ordenadores e, portanto, a sua violação não tem por consequência a nulidade ou irregularidade dos actos realizados depois do prazo legal.
Ao invocar a suposta irregularidade, pretendeu o Ilustre Mandatário das arguidas, tal como requereu, que fosse reconhecida e declarada e se iniciasse de novo a instrução, não se vislumbrando, com tal requerimento outro objectivo que não seja o de entorpecer/protelar o andamento do processo, bem sabendo, porque foi notificado do despacho proferido em 26/3/2015 pelo Sr. Juiz do tribunal do julgamento, que o co-arguido —, privado da liberdade, se encontra a condenado ao abrigo do disposto no artigo 521° n° 2 do C.P.P. e não se tratando de actos praticados por pessoa que não seja sujeito processual penal, porquanto os actos praticados pelo Mandatário forense é um acto de parte e sendo o acto que deu origem à multa aplicada está excluído do âmbito da norma do artigo 521°, n° 2 do C.P.P.
15°
A decisão ínsita no Douto Acórdão da Relação do Porto (de 30.09.2015) foi a seguinte (apenas se transcreve a parte final):
"Ora, deste regime decorre que o mandatário constituído nos autos não é o "estranho" ao processo a quem se dirige a previsão do n° 2 do artigo 521° do Código de Processo Penal. E que quando imposta, a taxa sancionatória excecional é da responsabilidade do sujeito processual - mandante - e não de quem o representa no processo- mandatário.
Tenha-se, ainda, presente que o mandatário incorre em obrigação de indemnizar o mandante quando não cumpre ou cumpre defeituosamente o contrato.
E que mesmo quando se reconheça que o mandatário da parte teve responsabilidade pessoal e direta nos atos pelos quais se revelou a má-fé na causa, não compete ao Juiz impor-lhe qualquer sanção, mas sim dar conhecimento de facto à respectiva associação pública profissional, para que esta possa aplicar sanções e condenar o mandatário na quota-parte das custas, multas e indemnização que lhe parecer justa - artigo 545° do Código de Processo Civil. Posto isto, não havendo suporte legal para impor a Mandatário constituído no processo qualquer das taxas consagradas no artigo 521° do Código de Processo Penal, o recurso procede.
Decisão.
Em face do exposto e concluindo, decide-se conceder provimento ao recurso e, em consequência, revogar a decisão que condena o ora Recorrente, na qualidade de mandatário de indivíduos que figuram como arguidos no processo, no pagamento de taxa de justiça.
16°
E como não se bastasse, a mesma Sr.a Juiz da Instância Central de Instrução Criminal da Comarca do Porto, 1a Secção, Juiz 3 (à altura), ora Sr.a Juiz recusada, enviou oficio para o Conselho de Deontologia do Porto da Ordem dos Advogados (recebido em 21.07.2015) dando conta do despacho referente à sua supra aludida decisão instrutória, "para os fins previstos no artigo 545° do C.P.C."
O processo disciplinar teve o n° 598/2015,
18°
E teve a seguinte decisão em 31.12.2015:
"Não pode concluir-se da certidão, que não tivesse sido possível manter o presumível inocente privado da liberdade, e por isso não é temerário concluir que apesar da actuação do Senhor Advogado Participado, que, repetimos, tanto nervosismo processual causou, mantiveram-se satisfeitas as doutas promoções do Digno representante do Ministério Público e as não menos doutas decisões do Meritíssimo Juiz.
Do que resulta do processo e da certidão apensa, conclui-se que o Senhor Advogado Participado não praticou factos desconformes ao exercício da advocacia. Antes pelo contrário. Tudo indica que praticou factos que a sua qualidade de advogado lhe impôs praticar, e que se deixasse de praticar, provavelmente violaria o disposto no artigo 84° do Estatuto da ordem dos Advogados. Nunca as mãos lhe doam para continuar a requerer e a alegar tudo o que a sua consciência lhe imponha e a sua PROFISSÃO exige.
Pelo exposto conclui-se pela inexistência de infracção disciplinar, devendo o processo ser arquivado, o que se propõe.
19°
O Mandatário a quem a Sr. Juiz ora recusada condenou no pagamento de 3 Uc, ao abrigo do disposto no artigo 521° n° 2 do C.P.P., tratando-o como se de um estranho à lide fosse, e não como um sujeito processual penal, desprezando o estatuto, função e seriedade daquele, porquanto os actos praticados pelo Mandatário forense são actos de parte,
20°
sem qualquer fundamento, motivação ou razão de ser, numa atitude gratuita, desprovida de seriedade, bom senso, justiça e legalidade,
21°
tendo o referido Mandatário, aqui arguido, sido absolvido em sede judicial e disciplinar sem reservas,
22°
É o mesmo que nos presentes autos figura como arguido e que tem a mesma Sr.a Juiz a presidir à Instrução do seu processo.
É pois todo um passado, que diga-se, deveras anormal e demonstrativo da perseguição que ao arguido foi movida, repita-se, sem razão ou fundamento, que colocam em causa a necessária imparcialidade do julgador,
24°
Pois toda a decisão, proferida nos presentes autos estará inquinada pelo já sucedido, por um passado, por um juízo de valor já formado, que coloca em causa a necessária imparcialidade do julgador, imparcialidade essa que deve ser objectiva e que dissipe todas as dúvidas ou reservas, o que não sucede, tendo em consideração a situação objetiva derivada de uma determinada posição do juiz em relação ao arguido.
25°
É certo que «não tipifica a lei quais sejam os casos que justificariam tal juízo de suspeição, mas tratar-se-á de factos objectivos e exteriorizados, os quais porque respeitantes a situações pessoais, atinentes ao magistrado a relações sociais ou familiares que o envolvam a situações de tipo ideológico ou filosófico que funcionem como preconceitos quanto aos factos em análise ou a situações do foro psíquico, ainda que não patológico, possam colidir com o auto domínio ou ponderação da sua intervenção processual, enfim com a serenidade isenta e descomprometida que é apanágio da arte de julgar» - cfr. José António Barreiros, in Sistema e Estrutura do Processo Penal Português, Lisboa, 1997, vol. II, pág. 46.
26°
In Ac. da RE, de 5/12/2000, in CJ, ano XXV, tomo V, pág. 284, traduzindo entendimento pacífico (ver também Ac. da RG de 20/10/2008, proc.°l400/08-2, in www.dgsi.pt) no sentido que: «O motivo sério e grave, adequado a gerar desconfiança sobre a imparcialidade do julgador, há-de resultar de objectiva justificação, avaliando as circunstâncias invocadas pelo requerente, não pelo convencimento subjectivo deste, mas pela valoração objectiva das mesmas circunstâncias, a partir do senso e experiência comuns, conforme juízo do cidadão de formação média da comunidade em que se insere o julgador; o que importa é, pois, determinar se um cidadão médio, representativo da comunidade, pode, fundadamente, suspeitar que o juiz, influenciado pelo facto invocado deixe de ser imparcial e injustamente o prejudique.».
27°
Ora, resultando que a Sr. Juiz ora recusada tem já formada uma convicção sobre o arguido, antes do momento próprio, motivada pela atitude persecutória que demonstrou ao longo do referido processo (5544/11.6TAVNG), ao ter sancionado o Mandatário, à altura, por este ter defendido os interesses dos seus clientes e ter discordado e reclamado, legitimamente das irregularidades e nulidades que entendeu por convenientes,
28°
não se conformando a Sr.a Juiz ora recusada, com a mera aplicação do direito à causa, de forma imparcial, não cumpre os requisitos de imparcialidade necessários para a justa condução do julgamento, o que sucede in casu, pelo que deve ser recusada.
29°
Os factos sérios vindos de descrever colocam em causa, de forma séria, grave e objectiva, a necessária imparcialidade do julgador, susceptível de determinar a recusa do mesmo, o que se pretende, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 43.° n 1 do C.P.P.,
30°
Porquanto, quer quanto aos factos em análise quer quanto às situações do foro psíquico, as atitudes demonstrada pela Sr.a Juiz ora recusada, colidem com o auto domínio, ponderação e intervenção processual nos presentes autos, dado a sua predisposição psicológica se encontrar antecipadamente formada pelos factos supra enumerados,
31°
pelo que, deve ser recusado todo o juiz de quem se possa temer uma falta de imparcialidade, para preservar a confiança da sociedade democrática que os tribunais devem oferecer aos cidadãos.
TERMOS EM QUE deve o presente incidente de recusa de Juiz, ser julgado procedente por provado e, em consequência ser decretada a cessação da intervenção da Senhora Juiz ora recusada nos autos supra referenciados.
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Do 2º arguido:
1º - O presente processo questão foi distribuído ao juízo de Instrução Criminal do Porto - J 2..
2º- A fls. 9000, a Exma. Juiz de Instrução Criminal agendou o interrogatório dos co-arguidos B… e F… para o dia 01 de Fevereiro de 2011, sem que tivesse para o efeito notificado os restantes arguidos e seus defensores para, querendo, estarem presentes.
3º- Não obstante esta factualidade, o aqui requerente arguiu a nulidade desses interrogatórios com base no artigo n° 120 n° 2 al. c) do CPP.
4º- A Exma. Juiz de Instrução, no Debate Instrutório agendado para o dia 13 de Fevereiro de 2017, entendeu (conforme consta da acta dessa diligência), que se tratava de "uma mera irregularidade".
5°- Assim, agendou para o dia 20 de Fevereiro de 2017 novo interrogatório dos co arguidos.
6°- Acontece que desta vez não notificou os arguidos para, querendo, estar presentes.
7º- O aqui requerente e o co-arguido G…, arguiram (mais uma vez} a nulidade no próprio acto desse interrogatório, com o mesmo fundamento do primeiro interrogatório, artigo n° 120 n° 2 al. c) do CPP,
8º- A juiz de Instrução porém proferiu o seguinte despacho:
"Convêm sempre referir, relembrar, que a instrução é uma fase com regras muito próprias e os poderes do juiz de instrução em sede de instrução são poderes muito diferentes da fase de julgamento. Portanto, o juiz de instrução tem poderes amplos na direcção da instrução, como todos sabem, decorre dos artigos 289° e ss.. Relativamente, a este artigo 289º n° 2, como todos saberão também, isto é um artigo relativamente recente e, muito depois deste artigo ter ficado inserido no Código de Processo Penal, há jurisprudência no sentido, mesmo depois desta nova redacção, que o arguido e o seu defensor não têm direito a participar na instrução, no acto de inquirição de testemunha e também nos outros actos subsequentes, este é um Acórdão da Relação de Março de 2005.
Relativamente, à obrigatoriedade de estarem cá os arguidos que os Srs. Drs. representam, o Sr. Procurador já disse, e bem: a lei prevê no artigo 113° quais as notificações que tem de ser feitas obrigatoriamente no pessoa do arguido. Essas notificações, nos termos do n° 10, que tem de ser teifas obrigatoriamente ao arguido são as notificações respeitantes : à acusação, à decisão instrutória, à designação de dia para o julgamento e à sentença, bem como as relativas às medidas de coação e de garantia patrimonial (...)
7º- O aqui requerente e o co-arguido G…, arguiram (mais uma vez) a nulidade no próprio acto desse interrogatório, com o mesmo fundamento do primeiro interrogatório, artigo n° 120 n° 2 al c) do CPP.
8º- A juiz de Instrução porém proferiu o seguinte despacho:
"Convêm sempre referir, relembrar, que a instrução é uma fase com regras muito próprias e os poderes do juiz de instrução em sede de instrução são poderes muito diferentes da fase de julgamento. Portanto, o juiz de instrução tem poderes amplos na direcção da instrução, como todos sabem, decorre dos artigos 289° e ss.. Relativamente, a este artigo 289° n° 2, como todos saberão também, isto é um artigo relativamente recente e, muito depois deste artigo ter ficado inserido no Código de f Processo Penal, há jurisprudência no sentido, mesmo depois desta nova redacção, que o arguido e o seu defensor não têm direito a participar na instrução, no acto de inquirição de testemunha e também nos outros actos subsequentes, este é um Acórdão da Relação de Março de 2005.
Relativamente, à obrigatoriedade de estarem cá os arguidos que os Srs. Drs. representam, o Sr. Procurador já disse, e bem, a lei prevê no artigo 113° quais as notificações que tem de ser feitas obrigatoriamente na pessoa do arguido. Essas notificações, nos termos do n° 10, que tem de ser feitas obrigatoriamente ao arguido são as notificações respeitantes à acusação, à decisão instrutória, à designação de dia para julgamento e à sentença, bem como as relativas às medidas de coação e de garantia patrimonial (...)
Portanto, nos termos do artigo 113° n° 10, esta notificação não tinha que ser feita na pessoa do arguido, mesmo considerando o disposto no artigo 114º que trata de arguidos detidos, que é o caso, a notificação tem de ser requisitada ao Director do Estabelecimento Prisional. Mas, quando esteja em causa o próprio interrogatório do arguido, e estejam, também, em causa situações do artigo 113° n° 10.
Portanto, a notificação tinha apenas que ser feita na pessoa do seu defensor.
Como compreenderão se eu achasse que havia algum entendimento diverso ou duvidoso, relativamente a este respeito, considerando que qualquer coisa que se faça aqui é sindicado nos termos em que tem sido, obviamente, que traria cá os arguidos sem problema absolutamente nenhum.
Portanto, o interrogatório do arguido, e isto é uma anotação ao artigo 289° n° 2, pelo Vinicio Ribeiro no Código Processo Penal anotado, página 803, "o interrogatório do arguido, mesmo os autos sendo públicos (...), como é o caso.. (...) não está sujeito à publicidade", é o sentido desta anotação. E, como eu já disse no início, mesmo relativamente ao facto deste artigo 289, n° 2, introduzir alguma contraditoriedade, na instrução o único acto completamente contraditório e obrigatório é o debate instrutório. Sendo certo que, como também muitos autores defendem, existe até alguma contradição neste artigo 289°, entre o n° 1 e o n° 2. No n° 1 diz-se que o instrução tem, obrigatoriamente um debate instrutório oral e contraditório, e não diz que essa obrigatoriedade existe nos demais actos de instrução. No n° 2 não diz isso. portanto, tudo isto é discutível, mas relativamente aos vícios que os Srs, Drs.. para já, invocam, eu entendo que esses vícios não se verificam. Sem prejuízo dos Srs. Dr.s recorrerem e a Relação entender como conveniente."
9º- Tendo em conto esta posição o aqui requerente e o co-arguido G…, interposeram recurso dessa decisão.
10º- Importa referir, que o interrogatório do co-arguido E… coloca o aqui requerente no palco principal do crime e veiculou o despacho de pronúncia.
11º- No despacho de pronúncia consta:
"Por último o relevantíssimo dado fornecido pelo seu irmão B…, que no interrogatório judicial, em sede de instrução, por si requerido, disse, sem qualquer reserva, e sem que tal lhe fosse perguntado, dado o laço familiar que os une que este arguido, "participou no crime", sendo que este facto lhe foi transmitido pessoalmente por ele (ouvir CD da gravação), vemos assim que, segundo diz o arguido B…, seu irmão, este arguido confessou o seu envolvimento nos factos."
12º- Sucede que, o processo seguiu a sua marcha processual, tendo-se encontrado em fase de julgamento no Juízo Central Criminal do Porto - juiz 6.
13º- No entanto, no dia 31 de Maio de 2017, foi preferido um acórdão do Tribunal da Relação do Porto, que declarou, conforme o aqui requerente pugnava, nulo o interrogatório previamente aludido, e por conseguinte, revogou o despacho recorrido e todos os actos subsequentes.
14o- Tendo como efeito o retrocesso dos aulos para a fase de Instrução para repetição desse interrogatório e dos actos que dele dependam.
15º- Então, a Juiz de Instrução a fls. 1424, agendou para o dia 04 de Julho de 2017 os ditos interrogatórios, mesmo contrariada (note-se a fls. 11426 "A diligência a realizar é um acto instrução, reguada pelo disposto nos artigos 2892, e 113°, 10, ambos do CPP, dos quais resulta que os arguidos podem assistir aos actos de instrução por qualquer deles requeridos, podendo a notificação para o acto ser efectuada na pessoa do seu Defensor.
Porém, dado o teor do Acordão do Tribunal da Relação do Porto, datado de 31/5/2017, proferido no âmbito destes autos, a que devo obediência, notifique para o referido acto de instrução, o M°P°. todos os arguidos, todos os assistentes, bem como todos os respectivos Mandatários/Defensores, nos termos e para os efeitos do art.° 289, do CPP.").
16º- Então, no passado dia 04 de Julho de 2017, o co- arguido B… REMETEU-SE AO SILÊNCIO.
17º- O problema agora surge, quando na altura da decisão instrutória, se a Exma. Juiz não vai ser inconscientemente influenciada, salvaguardando sempre o devido respeito, pelos dois interrogatórios que tiveram de se repetir, tal como pelo novo ao qual já se procedeu, sendo certo que o teor dos mesmos não foi o mesmo.
18º- Pois bem, com o retrocesso processual para se efectuarem os devidos actos instrutórios que foram revogados, criou-se um problema que afecta a imparcialidade do juiz, que neste mesmo processo, procedeu por três vezes ao interrogatório dos arguidos B… e F…, e repita-se o desfecho não foi o mesmo.
19º- O "peso" destes três interrogatórios não é algo que possa ser facilmente afastado em consciência, e na decisão de julgar, mais concretamente, na decisão instrutória que irá ser proferida, pois um despacho de pronúncia ou não pronúncia é algo que pode ser prejudicial para os arguidos, que tal como é indicado na Constituição da República Portuguesa, no artigo 32°, "todo o arguido se presume inocente até ao trânsito em julgado da sentença de condenação".
20º- Não obstante, o pedido de escusa não ser algo que possa ser tomado de ânimo leve, pois temos princípios tais como a inamovibilidade do juiz e o "juiz natural".
21º- Na verdade, no caso sub judice, existiram três interrogatórios com declarações que não foram iguais - nos dois primeiros o arguido B… imputou factos ao arguido aqui requerente, na terceira vez não.
22º- Indubitavelmente, e pelo teor o despacho de pronúncia revogado, pode levar a que se crie uma convicção prévia e vincada que poderá toldar a imparcialidade do julgador, e no caso em apreço, não estão reunidas as condições para que exista uma convicção de imparcialidade plena e objectiva, que assegure com certeza a imparcialidade.
23º- Conforme se pode constatar no Acórdão do Supremo Tribunal de justiça, de 05-07-2007, relator Simas Santos, disponível em www.dgsi.pt,: " É necessária, na verdade, uma imparcialidade objectiva que dissipe todas as dúvidas ou reservas, pois as aparências podem ter importância, devendo ser concedida a escusa a todo o juiz de quem se possa temei uma falta de imparcialidade, para preservar a confiança que, numa sociedade democrática, os tribunais devem oferecer aos cidadãos.".
Acresce que,
24º- O pedido de recusa não tem como fundamento restritamente apenas aos três interrogatórios e à previa decisão instrutório, agora revogada,
25º- Encontra, também, fundamento no facto de existir uma enorme atenção e pressão social e mediática neste processo, não só pelos (alegados) contornos do crime tal qual é sustentado na acusação, mas também por ter existido um enorme alarme social na sociedade e na imprensa, quando foi divulgada pelos media a notícia que o processo em causa iria voltar á fase instrutória e que conotaram este retrocesso de "falha jurídica".
26º- A pressão neste momento para que não exista mais nenhuma falha, o que salvaguardando sempre o devido respeito poderá acontecer, pois "errar é humano", é enorme e estará sempre sobre o escrutínio público,
27º- Contudo, a tensão em redor sobre a Exma. Juíza de Instrução é palpável, o facto de ter existido aquela "falha jurídica", causa uma agitação ainda maior, pois pelo escrutínio de quem não tem uma educação versada sobre a justiça e a lei, leva ao raciocínio precipitado e por muitas vezes ilógico que toda a justiça está mal e que só comete erros, o que não é verdade!!!
28º- Esta é uma dimensão que a lei não define, que é a seriedade dos motivos e todo o complexo desenrolar de situações, que leva a que a avaliação dos sérios motivos de escusa seja também feita porintermédio de uma ponderação baseada em senso-comum.
29º- Conforme refere o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 05- 12-2012, relator Oliveira Mendes,disponível em www.dgsi.pt : " a lei não define nem caracteriza a seriedade e a gravidade dos motivos, peio que será a partir do senso e da experiência comuns que tais circunstâncias deverão ser ajuizadas".
30º- E todo o alarido mediático, com televisões em directo constantemente, com os contornos de todo o processo criam uma forte pressão social per si. Mas a gravidade da pressão é ainda maior depois do processo ler passado da fase de julgamento, para a instrução novamente, de modo a que exista nova decisão instrutória, e não pode ser levado com ânimo leve que a decisão instrutória será igual
31º- Deste modo, além da questão dos três actos instrutórios díspares na sua essência factual, existe também uma tremenda pressão social sobre a Exma. Juíza de Instrução, que para protecção da mesma este pedido de Recusa deve ser procedente.
Nestes termos, e nos melhores de direito aplicáveis, requer-se aos venerandos juízes desembargadores, que declarem o presente incidente de recusa procedente, devendo ser distribuído a um novo juiz de instrução em detrimento da juiz de instrução actual, só assim farão sã Justiça!
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Respondeu, nos termos do Art. 45º, nº 2, do Código de Processo Penal, a Senhora Juíza ora recusada, nos seguintes termos:
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Incidente de recusa apresentado pelo arguido B…, a fls. 11742 e sgs:
Em cumprimento do disposto no art.° 45°, 2, do CPP, pronuncia-se a visada sobre os fundamentos alegados pelo arguido, de forma breve, dado o pedido de recusa assentar em pressupostos que não correspondem à verdade.
Com efeito, a visada não presidiu à instrução a que o arguido se refere, nem é a autora da decisão instrutória junta, nunca tendo condenado o arguido, enquanto advogado, em qualquer taxa processual, muito menos participado disciplinarmente contra o mesmo, sendo que nunca exerceu funções como "juiz 3".
O arguido, certamente, está a confundir a visada com a sua colega, Ex.a Sr.a Dr.a H…, que exerce funções neste tribunal como "juiz 3" e a quem corresponde a rubrica aposta no final da decisão, conforme a mesma confirmou, informalmente.
Aos arguidos assiste todo o direito de procederem conforme entenderem, caso duvidem da imparcialidade da signatária. Porém, o mínimo que lhes seria exigido, com todo o respeito, era confirmar a identidade da magistrada em causa.
É o que me cumpre informar.
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Decidindo:
Questão prévia: considerando a resposta da Senhora Juíza, seríamos tentados a entender que a flecha terá errado o alvo (a identificação da Juíza “recusada”), o que permitiria uma decisão com fundamento no Art. 45º, nº 4, princípio (recusa do requerimento, por manifestamente infundado).
Mas como ambos os requerimentos deste episódio se referem à Senhora Juíza nº 2, será de todo conveniente avaliar o incidente com as cautelas habituais, fundadas na lei aplicável, dando como seguro que, apesar da falta de identificação, estamos em presença de um incidente de recusa deduzido contra a Sra. Dra. D….
E assim será feito.
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O incidente de recusa de Juiz está previsto nos Arts. 43º a 47º do Código de Processo Penal.
Dispõe o nº 1 do Art. 43º, do Código de Processo Penal, que o juiz pode ser recusado, quando se verificarem as condições dos seus números 1 e 2:
"A intervenção de um juiz no processo pode ser recusada quando correr o risco de ser considerada suspeita, por existir motivo sério e grave, adequado a gerar desconfiança sobre a sua imparcialidade".
O motivo sério e grave, adequado a gerar desconfiança sobre a imparcialidade do julgador, há-de resultar de objectiva justificação, avaliando as circunstâncias invocadas pelo requerente, não pelo convencimento subjectivo deste, mas pela valoração objectiva das mesmas circunstâncias, a partir do senso e experiência comuns, conforme juízo do cidadão de formação média da comunidade em que se insere o julgador; o que importa é, pois, determinar se um cidadão, representativo da comunidade pode, fundadamente, suspeitar que o juiz, influenciado pelos factos invocados, deixe de ser imparcial e injustamente o prejudique, ou beneficie.
É, assim, imprescindível a ocorrência de um motivo sério e grave, do qual ou no qual resulte inequivocamente um estado de forte desconfiança sobre a imparcialidade do juiz (propósito de favorecimento ou prejuízo de certo sujeito processual - arguido, assistente, parte civil, Ministério Público - em detrimento de outro), a avaliar concreta e objectivamente.
Motivo sério e grave será, assim, uma razão ponderosa, que impeça o exercício da função de julgar com a imparcialidade esperada e a independência exigível, constitucionalmente prevista e legalmente regulada.
Nesta vertente, tem-se presente e cita-se o sumário do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, proferido em 14 de Julho de 2004 (processo nº 2837/04-3), no qual o nosso Alto Tribunal defende:
Na ponderação dos motivos relevantes do pedido (de escusa ou recusa, acrescentamos nós) de magistrado judicial, deve ser avaliado, não só o aspecto da imparcialidade subjectiva, mas ainda, face à nova sensibilidade e à atenção redobrada dos cidadãos perante o modo de administração da Justiça, o da imparcialidade objectiva; esta impõe a averiguação, independentemente da conduta do juiz, da existência de factos que permitem pôr em causa a imparcialidade; nesta matéria, podem as aparências revestir importância, tendo em conta a confiança que, numa sociedade democrática, os tribunais devem inspirar.
No mesmo sentido vai o Ac. do Supremo Tribunal de Justiça, de 13 de Abril de 2005, processo nº 05P1138, dgsi.pt.
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A tendência de algumas franjas da sociedade, de pretender atribuir ao Juiz uma mera função de amanuense da lei e de funcionário não pode ser sufragada: o Juiz é, antes de mais, aquele que diz e aplica a Justiça em nome do Povo e o único a quem o Povo, através da lei fundamental legitimadora, atribui o poder soberano de julgar e decidir sobre os litígios que lhe são apresentados, com a competência e a independência que constituem o seu suporte e a sua verdadeira legitimação.
Montesquieu escreveu que o Juiz é a boca que profere a lei.
Mas terá de ser mais que isso: terá de a saber pensar, interpretar e aplicar, de forma independente, serena e justa.
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Mas não só: na prática, ao Juiz cabe ainda o papel de orientar e gerir os processos à sua guarda, usando das suas capacidades humanas de disciplina, de forma a analisar, com a tranquilidade e seriedade necessárias, a prova que o há-de levar a uma decisão justa, em qualquer momento de um certo processo a seu cargo, seja qual for o momento processual.
Mas essas serenidade e seriedade, a validação legal dos referidos poderes impõem também o respeito dos restantes actores judiciários, quer no modo como se relacionam com os Magistrados, quer na forma como se conduzem na vida processual – o que aliás resulta dos diversos estatutos que regulam o seu exercício, quer em sede procedimental, quer em sede deontológica e de boas práticas.
Ao Juiz cabem diversos poderes, para além daqueles que já ficaram referidos, sendo um deles a direcção do processo e do seu normal curso: e desde que a mesma seja feita com correcção, consideração, constância, educação, respeito, firmeza e segurança, nada mais lhe é exigível: trata-se da emanação visível da sua independência e da sua imparcialidade.
Pretender que o uso deste poderes no domínio da lei aplicável e no âmbito de contexto legalmente previsto é uma manifestação de parcialidade poderá mesmo ser entendido como uma tentativa de condicionar o juiz – o que nunca seria aceitável, nem compreensível pela sociedade (e que, desde já se adianta, nenhum efeito provoca).
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Dos presentes autos – trata-se da segunda tentativa de afastamento da magistrada, embora com outros actores – constam todos os elementos necessários à sua decisão.
Nomeadamente, todas as certidões ordenadas, todos os requerimentos, todos os documentos apresentados, bem como a audição do Juiz recusado, nos termos do disposto no Art. 45º, nº 3, do mesmo diploma legal.
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Recordemos:
Desde já se dirá que não é nestes autos de recusa de juiz que iremos apreciar ou decidir das razões jurídicas dos indeferimentos e dos sucessivos requerimentos, nem sequer das diferentes interpretações da lei e decisões já proferidas: não é aqui que tais questões serão resolvidas.
Importa rememorar que o princípio do juiz natural é uma regra de observância normal e impositiva, na nossa ordem processual penal.
Interessa-nos, tão-só, descortinar se, no seu íntimo, a intervenção do magistrado identificado pode ser considerada suspeita, por ser notória a existência de motivo sério e grave, adequado a gerar desconfiança sobra a sua imparcialidade: Art. 43º, nº 1, do já citado Código de Processo Penal.
Analisados os argumentos dos requerentes (todos eles, aliás, de mera suspeição, sem qualquer facto demonstrado ou mesmo demonstrável), avaliada a legislação aplicável, não se descortina qualquer situação para duvidar da imparcialidade ou independência da Juíza “recusada”: não se vislumbra, nestes autos, sinal de qualquer motivo sério e grave, adequado a gerar desconfiança sobre a sua imparcialidade, em qualquer dos momentos em que interveio nestes autos.
Não se encontra, por muito que se procure, qualquer atitude persecutória que demonstre preconceitos relativamente a qualquer um dos intervenientes processuais, seja qual for a natureza das suas funções.
Não se antevê qualquer má vontade, muito menos pré-juízos ou falta de imparcialidade, quer nos diversos interrogatórios efectuados, quer nas decisões dos diversos requerimentos, quer nas tomadas de posição contra qualquer eventual intemperança decorrente dos actos processuais praticados.
Pelo contrário, atendendo à especial complexidade deste processo, a Senhora Juíza tem gerido o mesmo de forma hábil e serena, o que aliás é bem visível nos seus despachos, nas suas intervenções e nas tomadas de posição referentes aos inúmeros incidentes que o mesmo já conta.
E acrescentamos, repetindo-nos: a magistrada em causa limita-se, em todo o percurso processual destes autos, a aplicar a lei, naturalmente com a sua interpretação da mesma; mas a discordância de qualquer destas atitudes legítimas não pode levar a duvidar da sua imparcialidade: tratando-se de aplicação e interpretação da norma, as discordâncias serão necessariamente dirimidas e decididas pelos Tribunais Superiores, em sede de recurso (não, assim, em sede de dúvida sobre a idoneidade da julgadora).
Mal andaria a Justiça se a interpretação da lei e a sua aplicação de forma diferente ou divergente servisse para questionar, por si só, a honorabilidade e o profissionalismo dos Juízes.
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Nunca se deverá esquecer que o Juiz, para além de titular de um Órgão de Soberania que é o pilar do Estado de Direito, também é humano; e verificados os autos (pelo menos o que consta deste apenso) damos conta da notável calma, ponderação, segurança e determinação, que só demonstra e dá fé da total imparcialidade da Juíza “recusada”.
Alegar que a pressão social e mediática a que a Senhora Juíza está sujeita a condiciona é esquecer que os Juízes estão preparados para suportar tal pressão; e se este pecadilho (inexistente) fosse impedimento desta Juíza, também o seria de qualquer outro Juiz do mesmo Tribunal.
A dar razão aos argumentos dos dois incidentes – ou à sua carência – estaria encontrada a fórmula de eternizar um processo, ou de ultrapassar a regra do Juiz natural (o que não seria nunca aceitável).
Tal não pode, nem deve ocorrer.
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É, assim, infundamentada a preocupação dos requerentes do incidente, que poderão manter, com toda a certeza, a confiança na Justiça e nos seus Juízes, incluindo nesta magistrada.
O que significa, como corolário de tudo o que acima se expõe, que o pedido de recusa, porque não demonstrado, nem fundamentado, nem minimamente ilustrado e provado não poderá ser deferido: inexiste, pois, esteio para servir de alicerce à tese da recusa de Juiz.
Assim sendo, de harmonia com o disposto no Art. 45º, nº 4, do Código de Processo Penal, nada havendo a ordenar ou a realizar, terá este incidente de ser indeferido.
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Decisão.
Pelo exposto, nos termos do Art. 45º, nº 4, do Código de Processo Penal, acordam nesta Relação em indeferir os requerimentos de recusa da Senhora Juíza Dra. D…, que assim se mantem como titular dos presentes autos.
Custas do incidente pelos requerentes, com taxa de Justiça de 5 UC.
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Porto, 20 de Julho de 2017 (turno).
Cravo Roxo
Paula Leal de Carvalho