Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
3547/09.0TBMAI-A.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: GUERRA BANHA
Descritores: INDEFERIMENTO LIMINAR
EXCEPÇÃO DILATÓRIA
OMISSÕES
PETIÇÃO INICIAL
Nº do Documento: RP201103223547/09.0TBMAI-A.P1
Data do Acordão: 03/22/2011
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO.
Decisão: REVOGADA A DECISÃO.
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO
Área Temática: .
Legislação Nacional: ARTºS 208º, 265º E 508º DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL
Sumário: I - O regime regra das excepções dilatórias é o da sua sanação ou suprimento, tal como prevêem os n.°s 2 e 3 do art. 288.º do Código de Processo Civil.
II - “As excepções dilatórias só subsistem enquanto a respectiva falta ou irregularidade não for sanada” (n.° 3) e “quando a falta ou irregularidade tenha sido sanada”, o juiz deve abster-se de declarar a excepção dilatória e de absolver o réu da instância (n.° 2).
III - Foi, aliás, com essa finalidade que o n.° 2 do art. 265º do Código de Processo Civil, introduzido pelo Decreto-Lei n.° 329-A/95, de 12/12, veio impor ao juiz o dever de “providenciar pelo suprimento da falta de pressupostos processuais susceptíveis de sanação” e “a realização dos actos necessários à regularização da instância”.
IV - Com a mesma finalidade, o n.° 1 do art. 508.° do Código de Processo Civil impõe-lhe que, findos os articulados, profira despacho destinado a: “a) Providenciar pelo suprimento de excepções dilatórias, nos termos do n.° 2 do artigo 265º”.
V - Em regra, as excepções dilatórias só podem subsistir e serem declaradas pelo tribunal se não forem supridas oportunamente.
VI - Sendo supríveis as omissões apontadas à petição inicial da requerente, o indeferimento liminar não podia ter lugar sem que previamente à parte fosse dada oportunidade de as suprir.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Proc. n.º 3547/09.0TBMAI-A.P1
Recurso de Apelação
Distribuído em 08-02-2011
Relator: Guerra Banha
Adjuntos: Des. Anabela Dias da Silva e Des. Sílvia Maria Pires

Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto.

I – RELATÓRIO
1. B…, LDA, com sede na …, em Viseu, deduziu oposição mediante embargos de terceiro à penhora de bens realizada na acção executiva que corre termos no Juízo de Execução da comarca da Maia com o n.º 3547/09.0TBMAI, em que é exequente C…, LDA, e executada D…, S.A.
Alegou, em síntese, que os bens penhorados não pertencem à executada, mas à ora embargante, os quais diz ter adquirido em 05-11-2008 e serem instrumentos de trabalho indispensáveis ao exercício da sua actividade comercial, e juntou, para prova da aquisição dos bens, o documento que consta a fls. 6 a 14.
Pediu, que, recebidos os embargos, seja suspensa a execução e que, sendo julgados procedentes, seja ordenado o levantamento da penhora.
Autuada a petição de embargos, foi conclusa ao Sr. Juiz para despacho liminar, em cumprimento de ordem verbal deste (fls. 19), o qual, por despacho proferido a fls. 20-22, indeferiu-a liminarmente, com a seguinte fundamentação:
«Vejamos se os presentes embargos de terceiro podem, desde já, prosseguir.
Os embargos de terceiro constituem uma modalidade especial de oposição espontânea, ou seja, um incidente da instância.
Destinam-se, pois a permitir a reacção de um terceiro, ou seja, de quem não é parte na causa, contra um acto judicial que ordena a apreensão ou a entrega de bens e que ofende a sua posse ou qualquer direito incompatível com a realização ou o âmbito da diligência, nos termos do disposto no n.º 1 do art. 351.º, do Código de Processo Civil.
Sob a epígrafe "Fundamentos dos embargos de terceiro", preceitua o art. 351.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, que "se a penhora, ou qualquer acto judicialmente ordenado de apreensão ou entrega de bens, ofender a posse ou qualquer direito incompatível com a realização ou o âmbito da diligência, de que seja titular quem não é parte na causa, pode o lesado fazê-lo valer, deduzindo embargos de terceiro".

Finalmente, sob a epígrafe "Processamento subsequente ao recebimento dos embargos", preceitua o art. 357.º, n.º 1, do mesmo diploma, que "recebidos os embargos, são notificados para contestar as partes primitivas, seguindo-se os termos do processo ordinário ou sumário de declaração, conforme o valor".
Compulsada a petição inicial, verifica-se que a embargante deduziu os presentes embargos de terceiro sem que tivesse indicado o ou os réus ou requeridos contra quem os mesmos foram deduzidos e sem que tivesse indicado o valor da causa.
Na petição com que propõe a acção, deve o autor identificar as partes, indicando os seus nomes, domicílios e sempre que possível, profissões e locais de trabalho (neste caso tratando-se, obviamente, de pessoas singulares), conforme resulta do disposto no art. 467.º, n.º 1, a), do Código de Processo Civil, disposição que é aplicável aos incidentes da instância.
Por outro lado, deve ainda indicar o valor da causa, atento o disposto na alínea f), da mesma disposição legal.
A omissão da identificação das partes e dos elementos a que alude a alínea a), do n.º 1, do art. 467.º, bem como da indicação do valor da causa, constituem motivo de recusa do recebimento da petição pela secretaria, conforme preceitua o art. 474.º, b) e e), do mesmo diploma. Mas, não tendo sido a petição inicial recusada pela secretaria, subsiste uma excepção dilatória inominada de conhecimento oficioso, obsta a que o Tribunal conheça do mérito da causa e sendo conhecida em despacho liminar, dá lugar ao indeferimento liminar da petição inicial, conforme resulta do disposto nos arts. 234.º-A, n.º 1, 288.º, n.º 1, e), 493.º, n.ºs 1 e 2, e 495.º, do Código de Processo Civil.
Deverá por isso conhecer-se da referida excepção dilatória inominada e indeferir-se liminarmente a petição inicial.
Pelo exposto:
Julgo procedente a excepção dilatória inominada e em consequência, indefiro liminarmente a petição inicial.»

2. A requerente apelou dessa decisão, concluindo as suas alegações do seguinte modo:
1.º - A p.i. dos Embargos não foi recusada pela secretaria. 2.º - A douta sentença indeferiu liminarmente a p.i.
3.º - O Tribunal a quo, ao concluir que a recorrente não identificou os requeridos, ignorou o alegado em 1.º da p.i.
4.º - O Tribunal a quo, ao concluir que o embargante não indicou o valor dos embargos, ignorou que os mesmos correm por apenso à acção principal de execução, pelo que teriam necessariamente o seu valor.
5.º - Também não foi dada, oportunidade à recorrente para fazer uso do previsto no art. 476.º do CPC, já que não foi notificado nem da recusa pela secretaria da p.i., nem do despacho a confirmar tal recusa.
6.º - O Tribunal a quo violou assim o previsto no art. 476.º do CPC.
Contra-alegou a embargada/exequente, concluindo pela improcedência do recurso e a confirmação da decisão recorrida.

II – FUNDAMENTOS
3. Constitui objecto deste recurso apreciar se, no requerimento inicial, foi omitida a identificação das partes contra quem foram deduzidos os presentes embargos de terceiro e a indicação do valor da causa e, na afirmativa, se tais omissões dão lugar a indeferimento liminar sem que, previamente, à parte seja dada oportunidade de as suprir.
Interessam à apreciação dessa questão os seguintes factos atestados pelos documentos constantes do processo:
1) No cabeçalho do requerimento inicial de embargos de terceiro foram feitas as seguintes menções: "Tribunal Judicial da Maia"; "Proc. 3547/09.0TBMAI"; "Juízo de Execução"; "Oposição/Embargos de Terceiro, nos termos do art. 351.º do CPC, à penhora que apresenta B…, Lda, nos termos seguintes", seguindo-se o articulado.
2) Desse cabeçalho não consta a indicação do ou dos requeridos, mas sob os n.ºs 1 e 2 do articulado é dito o seguinte: "Na execução em referência, em que é exequente a C…, Lda, e executada D…, S.A., de que os presentes embargos são dependência…".
3) No dito requerimento não foi mencionado o valor da causa atribuído aos embargos.
4) O dito requerimento foi remetido ao Tribunal por via electrónica.
5) Na execução onde foi realizada a penhora embargada figuram como exequente C…, LDA, e como executada D…, S.A. (fls. 69-70).
6) O valor da causa atribuído à execução é de 27.650,81€ (fls. 69).
7) A soma dos valores atribuídos aos bens penhorados perfaz 4.600,00€ (fls. 77-81).

4. Tendo em conta esta factualidade, importa apreciar se é legalmente admissível o indeferimento liminar da petição inicial dos embargos de terceiro nos termos em que foi decidido, ou se impunha decisão diferente que, previamente, permitisse à requerente suprir as apontadas omissões.
E a resposta parece-nos óbvia neste último sentido, tendo em conta as normas legais que regulam a normal tramitação desta acção, formalmente caracterizada como incidente de uma outra acção já pendente e assim também qualificada no despacho recorrido.
Com efeito, a própria recorrente admite que lhe competia indicar no requerimento inicial quer a identificação dos requeridos quer o valor da causa. Exigência que decorre do art. 467.º, n.º 1, als. a) e f), do Código de Processo Civil, o qual prescreve: "1 - Na petição, com que propõe a acção, deve o autor: a) … identificar as partes, indicando os seus nomes, domicílios ou sedes e, sempre que possível, números de identificação civil e de identificação fiscal, profissões e locais de trabalho; f) Declarar o valor da causa".
Não obstante, não pode deixar de se ponderar que esta exigência é menor quando está em causa uma acção de matriz incidental, instaurada por apenso e na dependência de uma outra causa já pendente, como é o caso dos embargos de terceiro segundo a sistematização e caracterização feitas pelo Decreto-Lei n.º 329-A/95, de 12/12, e actualmente em vigor (cfr. art. 353.º do Código de Processo Civil).
É que, neste tipo de acção, é a própria lei que considera como partes requeridas nos embargos de terceiro "as partes primitivas", ou seja, as partes já identificadas na acção principal. É o que decorre do disposto no n.º 1 do art. 357.º do Código de Processo Civil, segundo o qual, "recebidos os embargos, são notificados para contestar as partes primitivas…". E, por isso, mesmo quando o requerente dos embargos nada diz quanto à identificação dos requeridos, devem considerar-se como tal as partes identificadas na acção onde foi praticado o acto ofensivo da posse ou direito do requerente, sob cuja dependência os embargos são requeridos.
No caso da petição de embargos aqui em apreciação, não pode, em bom rigor, dizer-se que a requerente omitiu a identificação dos requeridos, porquanto, se é verdade que não os indicou no cabeçalho, identificou-os em termos suficientes no n.º 1 do articulado, quer pelo nome, quer pela sua qualidade processual na acção executiva onde foi realizada a penhora embargada.
Quanto ao valor da causa, a omissão é mais evidente e processualmente mais relevante. Mais evidente porque a requerente nada disse. Processualmente mais relevante porque, nos termos do disposto no art. 357.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, é em função desse valor que se determina a forma processual a seguir após a contestação.
Ora, se, como diz a recorrente, é verdade que, nos termos da lei, "o valor dos incidentes é o da causa a que respeitam" (art. 313.º, n.º 1, do Código de Processo Civil), não é menos verdade que a mesma lei logo acrescenta uma importante excepção: "salvo se o incidente tiver realmente valor diverso do da causa, porque neste caso o valor é determinado em conformidade dos artigos anteriores". É, como se irá demonstrar, o que aqui sucede.
Acresce que, como já dissemos em acórdão de 16-12-2009, proferido no proc. n.º 6092/06.1TBVFR-B.P1, os embargos de terceiro, apesar da sua inserção sistemática na subsecção dos incidentes de oposição, determinada pela revisão introduzida ao Código de Processo Civil pelos Decretos-Lei n.º 329-A/95, de 12/12, e n.º 180/96, de 25/09, estrutural e substancialmente, mantêm a fisionomia de acção autónoma de defesa da posse ofendida por penhora ou outro acto judicial de apreensão, agora alargada no seu âmbito à defesa de qualquer direito incompatível com a realização daqueles actos judiciais. E como então justificámos, foi essa a caracterização feita pelo legislador no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 329-A/95, cujo trecho ali transcrevemos, e é também nesse sentido que os caracterizam LEBRE DE FREITAS, em Código de Processo Civil Anotado, vol. 1.º, 2.ª edição, Coimbra Editora, 2008, p. 670, e em "A Acção Executiva (depois da reforma)", 4.ª edição, Coimbra Editora, 2004, p. 207-208, e na 5.ª edição, p. 295, e os acórdãos da Relação de Coimbra de 01-04-2008, 03-06-2008 e 14-10-2008, todos disponíveis em www.dgsi.pt/jtrc.nsf/ procs. n.º 5166/06.3TBLRA-B.C1, 245-B/2002.C1 e 5174/03.6TBAVR-E.C1, da Relação de Évora de 08-03-2007, em www.dgsi.pt/jtre.nsf/ proc. n.º 1417/06-2 e da Relação do Porto de 21-05-2007, em www.dgsi.pt/jtrp.nsf/ proc. n.º 0752000.
E se quanto à identificação das partes, o n.º 1 do art. 357.º do Código de Processo Civil obriga a que "as partes primitivas" na acção principal ocupem nos embargos de terceiro a posição de requeridos, para que possam defender os seus interesses contra a pretensão do embargante em relação aos bens abrangidos pelos embargos, essa relação de dependência não se verifica quanto ao valor da causa.
Com efeito, como prescreve o n.º 1 do art. 305.º do Código de Processo Civil, o valor da causa deve exprimir "a utilidade económica imediata do pedido". Sendo os embargos de terceiro requeridos, na maioria das situações, como aqui sucede, por dependência de uma acção executiva para pagamento de quantia certa, cujo valor da causa há-de corresponder ao valor da quantia que se pretende cobrar (art. 306.º, n.º 1, do CPC), o objecto dos embargos de terceiro nenhuma relação tem com a quantia exequenda, mas sim com o valor dos bens penhorados abrangidos pelos embargos. E, por isso, o valor da causa a atribuir aos embargos de terceiro há-de corresponder à soma do valor desses bens, e não ao valor da execução em causa. É este o critério que decorre dos n.ºs 1 e 4 do art. 311.º do Código de Processo Civil, e era também esse o critério expressamente previsto na al. l) do art. 6.º do Código das Custas Judiciais.
Ora, em razão da aplicação dos referidos critérios, enquanto o valor atribuído à execução era de 27.650,81€, o valor dos bens penhorados que foram embargados perfaz apenas 4.600,00€ [cfr. supra itens 6) e 7) dos factos provados]. O que faz toda a diferença para efeitos do disposto no art. 357.º, n.º 1, do Código de Processo Civil.
Cremos, deste modo, ficar suficientemente esclarecido que ao valor dos embargos de terceiro não se adequa a regra constante do n.º 1 do art. 313.º do Código de Processo Civil, no sentido de que "o valor dos incidentes é o da causa a que respeitam". E, por isso, haveria que exigir que a requente indicasse o valor que atribuía aos embargos que deduziu.

5. Constatada esta exigência processual e não tendo a petição sido recusada pela secretaria com esse fundamento, como devia ter sido, questiona-se então se a consequência de tal omissão implicaria, necessariamente, o indeferimento liminar, como foi decidido, ou, antes, imporia o convite à correcção, como defende a recorrente.
A interpretação que fazemos da lei aponta para esta segunda opção. Assim:
O art. 474.º, n.º 1, als. a) e e), do Código de Processo Civil prescreve que: "A secretaria recusa o recebimento da petição inicial indicando por escrito o fundamento da rejeição, quando ocorrer algum dos seguintes factos: b) Omita a identificação das partes e dos elementos a que alude a alínea a) do nº 1 do artigo 467.º que dela devam obrigatoriamente constar; e) Omita a indicação do valor da causa".
Uma vez recusada a petição, a parte pode apresentar nova petição corrigida, "dentro dos 10 dias subsequentes à recusa de recebimento … considerando-se a acção proposta na data em que a primeira petição foi apresentada em juízo" (art. 475.º do Código de Processo Civil).
Não tendo sido recusada a petição pela secretaria, podia ser indeferida liminarmente?
A resposta que decorre do n.º 1 do art. 234.º-A do Código de Processo Civil, que indica quais os casos em que é admissível o indeferimento liminar, vai em sentido negativo.
Dispõe este preceito que "nos casos referidos nas alíneas a) a e) do número 4 do artigo anterior, pode o juiz, em vez de ordenar a citação, indeferir liminarmente a petição, quando o pedido seja manifestamente improcedente ou ocorram, de forma evidente, excepções dilatórias insupríveis e de que o juiz deva conhecer oficiosamente, aplicando-se o disposto no artigo 476.º", ou seja, "o autor pode apresentar outra petição … dentro dos 10 dias subsequentes ao indeferimento liminar".
Sendo certo que nos embargos de terceiro é admissível o despacho liminar prévio à citação, como prevê o art. 354.º do Código de Processo Civil, para o indeferimento liminar da petição exige a lei, como requisito material, que ocorra uma destas situações: (i) que o pedido seja manifestamente improcedente ou (ii) que ocorra, de forma evidente, alguma excepção dilatória insuprível e de que o juiz deva conhecer oficiosamente.
No caso, o Sr. Juiz considerou que a omissão na identificação das partes, bem como na indicação do valor da causa, "constituem motivo de recusa do recebimento da petição pela secretaria … mas, não tendo sido a petição inicial recusada pela secretaria, subsiste uma excepção dilatória inominada de conhecimento oficioso, que obsta a que o Tribunal conheça do mérito da causa e sendo conhecida em despacho liminar, dá lugar ao indeferimento liminar da petição inicial, conforme resulta do disposto nos arts. 234.º-A, n.º 1, 288.º, n.º 1, e), 493.º, n.ºs 1 e 2, e 495.º, do Código de Processo Civil).
Aceitando que qualquer daquelas omissões possa constituir uma "excepção dilatória inominada", como diz o despacho recorrido, o erro que, em nossa opinião, se detecta na conclusão ali alcançada deve-se ao facto de a lei exigir não só que a excepção seja de conhecimento oficioso mas também que seja "insuprível". E foi este o pressuposto que o julgador desconsiderou na sua conclusão.
Ora, como já sustentámos em recente acórdão de 18-01-2011, proferido no proc. n.º 1016/09.7TBAMT.P1, o regime regra das excepções dilatórias é o da sua sanação ou suprimento, tal como prevêem os n.ºs 2 e 3 do art. 288.º do Código de Processo Civil. No sentido de que "as excepções dilatórias só subsistem enquanto a respectiva falta ou irregularidade não for sanada" (n.º 3) e "quando a falta ou irregularidade tenha sido sanada", o juiz deve abster-se de declarar a excepção dilatória e de absolver o réu da instância (n.º 2).
Foi, aliás, com essa finalidade que o n.º 2 do art. 265.º do Código de Processo Civil, introduzido pelo Decreto-Lei n.º 329-A/95, de 12/12, veio impor ao juiz o dever de "providenciar pelo suprimento da falta de pressupostos processuais susceptíveis de sanação" e "a realização dos actos necessários à regularização da instância", e, com a mesma finalidade, o n.º 1 do art. 508.º do Código de Processo Civil impõe-lhe que, findos os articulados, profira despacho destinado a: "a) Providenciar pelo suprimento de excepções dilatórias, nos termos do n.º 2 do artigo 265.º". De modo que, em regra, as excepções dilatórias só podem subsistir e serem declaradas pelo tribunal se não forem supridas oportunamente.
Ora, no caso, qualquer das duas apontadas omissões são perfeitamente supríveis, seja através de requerimento complementar, seja através da apresentação de novo requerimento, como permite o art. 475.º do Código de Processo Civil, cuja solução é aqui perfeitamente adaptável.
E sendo supríveis as omissões apontadas à petição inicial da requerente, o indeferimento liminar não podia ter lugar sem que previamente à parte fosse dada oportunidade de as suprir.
Consequentemente, procede o recurso.

6. Conclui-se, do exposto:
1) À petição de embargos de terceiro é aplicável a exigência prevista nas als. a) e f) do n.º 1 do art. 467.º do CPC quanto à identificação dos requeridos ou embargados e quanto à indicação do valor da causa atribuído aos embargos.
2) A omissão na identificação das partes e/ou na indicação do valor da causa constitui motivo de recusa do recebimento da petição pela secretaria (art. 474.º, n.º 1, do CPC).
3) Não sendo recusada a petição, a dita omissão pode ser qualificada como "excepção dilatória inominada".
4) Nos termos do disposto no art. 234.º-A, n.º 1, do CPC, só há lugar a indeferimento liminar da petição quando se verificar uma destas situações: (i) que o pedido seja manifestamente improcedente ou (ii) que ocorra, de forma evidente, alguma excepção dilatória insuprível e de que o juiz deva conhecer oficiosamente.
5) O regime-regra das excepções dilatórias estabelecido nos arts. 265.º, n.º 2, 288.º, n.º 1, e), 493.º, n.ºs 1 e 2, e 495.º, do CPC é não só o do seu conhecimento oficioso pelo tribunal mas também o da sua sanação ou suprimento, no sentido de que as excepções dilatórias só subsistem enquanto a respectiva falta ou irregularidade não for sanada e quando a falta ou irregularidade tenha sido sanada o juiz deve abster-se de a declarar.
6) Para o efeito, a lei impõe ao juiz o dever de providenciar pelo suprimento dessas omissões ou irregularidades e só em caso de recusa da parte em supri-las é que poderá declarar a respectiva excepção dilatória.

III – DECISÃO
Pelo exposto, concede-se provimento ao recurso e, em consequência:
1) Revoga-se o despacho recorrido.
2) Determina-se que seja substituído por outro em que se conceda à requerente prazo para suprir as omissões relevantes de que padece a petição inicial que apresentou, designadamente a indicação do valor da causa.
3) Sem custas.
*
Relação do Porto, 22-03-2011
António Guerra Banha
Anabela Dias da Silva
Sílvia Maria Pereira Pires