Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP00043156 | ||
Relator: | MADEIRA PINTO | ||
Descritores: | SEGURO DE VIDA DESIGNAÇÃO IRREVOGÁVEL DE BENEFICIÁRIO TITULAR DO CRÉDITO PENHORA ILEGAL | ||
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Nº do Documento: | RP200911057470/05.9TBVFR-A.P1 | ||
Data do Acordão: | 11/05/2009 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | AGRAVO. | ||
Decisão: | PROVIDO. | ||
Indicações Eventuais: | 3ª SECÇÃO - LIVRO 816 - FLS 10. | ||
Área Temática: | . | ||
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Sumário: | I – No contrato de seguro do ramo “Vida”, com designação irrevogável de beneficiário por parte do tomador do seguro, é aquele e não este o titular do correspondente crédito, na data do respectivo vencimento. II – Daí, que seja ilegal a penhora de tal crédito, como bem integrante do património de terceiro, em execução instaurada apenas contra aquele tomador. | ||
Reclamações: | |||
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Decisão Texto Integral: | Processo nº 7470/05.9TBVFR-A.P1(agravo) 3ª Secção Relator: Madeira Pinto (302) Adjuntos: Amélia Ameixoeira Carlos Portela * 1. Relatório:Na presente execução comum para pagamento de quantia certa, que B………. intenta contra C………. e outros, foi penhorado nos autos o crédito titulado pela apólice de seguro nº 06/…, do Ramo Vida, modalidade Garantia Crescente, na Companhia de Seguros D………., S.A., no montante de €178.191,46, à data de 30.12.2005. Notificada do despacho judicial proferido em 13.07.2006, para efectuar o depósito dessa quantia à ordem do solicitador de execução, veio a referida Companhia de Seguros informar e juntar documentos aos autos, no sentido que o beneficiário aceitante dessa apólice de seguro é o E………., actualmente em virtude de fusão por incorporação, F………., S.A., pelo que não pode efectuar o depósito da referida quantia na presente execução. Em 09.01.2007 foi proferido o seguinte despacho: “Mantém-se a penhora determinada nos autos, no entanto tendo em consideração a existência de terceiro beneficiário (E1……….), o depósito só poderá ser determinado aquando do vencimento do crédito (01.08-2007)”. Deste despacho foi interposto o presente agravo pela referida Companhia de Seguros, admitido com subida imediata, em separado e efeito meramente devolutivo, concluindo nas suas alegações que: …………………………………………… …………………………………………… …………………………………………… Não houve contra alegações. O Sr. Juiz manteve a sua decisão tabelarmente. Colhidos os vistos legais, cumpre decidir. * 2. Fundamentação2.1. os Factos Com relevo para a decisão, consideram-se provados os factos acima referidos decorrentes da tramitação processual, que aqui damos por reproduzidos. Mais se consideram provados, face aos documentos juntos, os seguintes factos: Em 01 de Agosto de 1999, o aqui executado C………. subscreveu a proposta de seguro da Apólice do ramo Vida Individual designada de «Garantia Crescente», da Companhia de Seguros D………., S.A., por um prazo de oito (8) anos e um (1) dia, regulada pelas Condições Gerais, Particulares e Especiais juntas de fls. De fls. 35 a 52 destes autos, tendo efectuado a entrega única de €149.639,37. Depois de emitida, a respectiva Apólice assumiu o nº 06/…/……… . A recorrente remeteu oportunamente ao Sr. Solicitador de Execução G………., as condições da referida apólice e os documentos juntos de fls. 53 a 55 destes autos, que aqui se dão por integralmente reproduzidos. Nos termos da proposta de seguro, para além da condição de «Tomador» e de «Pessoa Segura», C………. designou-se, igualmente, como «Beneficiário» das garantias da Apólice. Porém, por documento escrito remetido à ora recorrente em 07 de Fevereiro de 2000, o referido tomador promoveu a alteração da designação de beneficiário das garantias da Apólice passando então a figurar nessa qualidade o E………., S.A., conforme documento que igualmente se junta, e cujo teor aqui integralmente se reproduz. Tal documento escrito foi acompanhado de uma declaração igualmente escrita do E………., S.A., em que este aceita a qualidade de beneficiário da Apólice em causa, quer em caso de vida, quer em caso de morte da Pessoa Segura, conforme documento que igualmente se junta, e cujo teor aqui integralmente se reproduz. Em 13 de Dezembro de 2005, data em que a recorrente foi notificada da penhora do saldo da conta titulada pela Apólice 06/…/………, sendo executado o tomador de seguro C………., o E………., S.A. era, pois, a beneficiária das garantias da mesma Apólice. Notificado o F………., S.A., veio, em 30.03.2007, juntar requerimento aos autos de execução informando que mantém interesse no benefício da apólice nº 06/……-……… . * 2.2. O DireitoTendo em conta que: O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, sem prejuízo das de conhecimento oficioso – artºs 684º, nº 3 e 690º, nºs 1 e 3, do Código de Processo Civil; Nos recursos apreciam-se questões e não razões; O recurso está limitado pela questão e decisão recorrida, a questão que importa decidir consiste em saber se o despacho recorrido é conforme com a lei. Diga-se que a ora agravante tem interesse no recurso, embora sendo terceiro relativamente à execução, porquanto é a seguradora da apólice ramo vida acima referida e poderá ter que responder perante o beneficiário da referida apólice- artº 680º, nº 2, CPC. O despacho recorrido não pode manter-se, dado que faz uma indevida aplicação do direito aos factos provados e supra descritos. Vejamos. Nos termos das Condições Gerais, Particulares e Especiais, o contrato de seguro subscrito pelo aqui e agora executado é uma Apólice do ramo «Vida», tendo como garantia, em caso de vida da Pessoa Segura, ou em caso de morte da mesma Pessoa Segura durante o período de vigência do contrato, o pagamento do saldo de uma Conta Poupança determinado de acordo com o artº 4º das Condições Especiais. A prestação da Seguradora decorrente do contrato reverte a favor da pessoa singular ou colectiva designada na Apólice como «Beneficiário» (cfr. artº 1º das Condições Gerais). O contrato confere um direito do Tomador ao seu resgate, direito condicionado embora à existência de beneficiários designados nos termos das respectivas Condições (cfr. artºs 10º e 22º das Condições Gerais). E, de acordo com as regras contratuais, o poder do Tomador de Seguro para alterar os beneficiários nomeados cessa no momento em que estes adquiram o direito ao pagamento das importâncias seguras (artº 22º, nº 5). Se o Tomador de Seguro submeter o contrato a aceitação expressa de benefício, deverá mencioná-lo na proposta de seguro ou no pedido de alteração de beneficiários. Nestas circunstâncias, o beneficiário designado deverá declarar, por escrito, a aceitação do benefício, passando este a considerar-se irrevogável sem expressa autorização do beneficiário aceitante (idem, nº 6). Foi o que sucedeu no presente caso, uma vez que o beneficiário designado pelo tomador veio expressamente declarar que aceitava o benefício, com o que tornou irrevogável essa designação. Mais se estabeleceu no contrato que tal designação de beneficiário só poderia ser revogada com a aceitação deste. À data em que a recorrente foi notificada de que fora requerida a penhora da prestação deste seguro e para proceder ao depósito do saldo da conta, já existia, pois, um direito do beneficiário designado ao valor do saldo calculado nos termos da apólice, estando o pagamento desse saldo dependente apenas da verificação de uma das condições de funcionamento da respectiva garantia: ou o decurso do prazo do contrato; ou a morte da pessoa segura ocorrida no período de vigência da apólice. Daqui resulta que o crédito cuja penhora se manteve pelo despacho recorrido não estava na titularidade do executado. O contrato de seguro de Vida, titulado pela Apólice 06/…/………, é um típico contrato a favor de terceiro (artº 443º do Código Civil). O terceiro a favor de quem for convencionada a promessa adquire direito à prestação independentemente de aceitação (artº 444º, nº 1). Ora, a prestação devida pela Seguradora, correspondente ao capital acumulado devido no termo do prazo do contrato de seguro em caso de vida do segurado, não é um crédito do aqui executado e tomador de seguro, mas é, antes, um crédito do actual beneficiário designado, ou seja, o F………., S.A. Apenas estão sujeitos à execução os bens do devedor susceptíveis de penhora que, nos termos da lei substantiva, respondem pela dívida exequenda. Em casos especialmente previstos na lei, podem ser penhorados bens de terceiro, desde que a execução tenha sido movida contra ele (artºs 601º, 817º e 818º do Código Civil e 821º do Código de Processo Civil). Com efeito, os bens de terceiro só podem ser objecto de execução em dois casos: quando sobre eles incida direito real constituído para garantia do crédito exequendo; quando tenha sido julgada procedente impugnação pauliana de que resulte para o terceiro a obrigação de restituição dos bens ao devedor (cfr. Lebre de Freitas, Acção Executiva, Coimbra Editora, pág. 179). No caso presente não consta que a execução tenha sido movida contra o beneficiário das garantias do seguro da Apólice referida. Sendo certo, porém, que o capital que constitui a prestação do seguro encontra-se na titularidade daquele beneficiário, em face do negócio jurídico efectuado pelo Tomador de Seguro, e aqui executado: a) por um lado, a declaração expressa de aceitação do benefício, concretamente para caucionar uma conta corrente em que é titular, junto do Banco beneficiário, uma sociedade da qual o Tomador declarou ser sócio; b) por outro lado, porque a declaração de aceitação se tornou irrevogável e, com ela, ficou o Tomador de Seguro impedido de exercer o direito de resgate do contrato, ainda que parcial. Ao manter a penhora de tal crédito, efectuada pelo solicitador de execução, o Tribunal cometeu a ilegalidade de permitir a penhora de direitos de outrem, que não se inscrevem na esfera jurídica do executado, em flagrante violação dos artºs 817º e 818º do Código Civil e artº 821º CPC. 3. Decisão Em face do exposto, acordam os juízes desta Relação em conceder provimento ao agravo e, em consequência, revogar o despacho recorrido e ordenar o levantamento da referida penhora de crédito. Sem custas. Porto, 05-11-2009 Manuel Lopes Madeira Pinto Maria Amélia Condeço Ameixoeira Carlos Jorge Ferreira Portela |