Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
4058/12.1TBGDM-B.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: MANUEL DOMINGOS FERNANDES
Descritores: RESOLUÇÃO EM BENEFÍCIO DA MASSA
RESOLUÇÃO CONDICIONAL
AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO JUDICIAL
NATUREZA DA ACÇÃO
ÓNUS DA PROVA
Nº do Documento: RP201701234058/12.1TBGDM-B.P1
Data do Acordão: 01/23/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Indicações Eventuais: 5ª SECÇÃO (LIVRO DE REGISTOS N.º 641, FLS.389-398)
Área Temática: .
Sumário: I - A acção de impugnação da resolução de acto em benefício da massa insolvente onde apenas sejam impugnados factos invocados para fundamentar a resolução é uma acção de simples apreciação negativa.
II - Como assim, compete ao Administrador de insolvência a alegação e prova dos factos constitutivos do direito potestativo de resolução de acto em benefício da massa insolvente que exerceu.
III - Fora dos casos previstos no artigo 120.º, nº 1 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas a resolubilidade dos actos prejudiciais à massa insolvente pressupõe a prejudicialidade do acto, requisito que se não verifica se apenas se prova que determinado imóvel foi vendido pelo preço referido no respectivo acto notarial e onde se declara que já foi recebido dando-se a respectiva quitação.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº 4058/12.1TBGDM-B.P1-Apelação
Origem: Comarca do Porto-Santo Tirso-Inst. Central-1ª Sec.Comércio-J3
Relator: Manuel Fernandes
1º Adjunto Des. Miguel Baldaia
2º Adjunto Des. Jorge Seabra
Sumário:
I- A acção de impugnação da resolução de acto em benefício da massa insolvente onde apenas sejam impugnados factos invocados para fundamentar a resolução é uma acção de simples apreciação negativa.
II- Como assim, compete ao Administrador de insolvência a alegação e prova dos factos constitutivos do direito potestativo de resolução de acto em benefício da massa insolvente que exerceu.
III- Fora dos casos previstos no artigo 120.º, nº 1 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas a resolubilidade dos actos prejudiciais à massa insolvente pressupõe a prejudicialidade do acto, requisito que se não verifica se apenas se prova que determinado imóvel foi vendido pelo preço referido no respectivo acto notarial e onde se declara que já foi recebido dando-se a respectiva quitação.
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I-RELATÓRIO
Acordam no Tribunal da Relação do Porto:
B… veio, por apenso ao processo especial de insolvência em que é requerente C…, SA e requerido D…, intentar a presente acção sumária contra a massa insolvente de D…, representada pelo Administrador de Insolvência, Sr. Dr. E…, peticionando se declare a ineficácia da resolução do contrato de compra e venda em benefício da massa insolvente notificada pelo Administrador de insolvência. Devendo, em consequência manter-se válida a aquisição do imóvel em causa pela Autora.
Para tanto alega, em suma, que pagou, desde que o insolvente passou a ter dificuldades financeiras, as prestações por este devidas ao credor a favor do qual se encontram registadas hipotecas sobre o imóvel, pelo que era também a A. Credora do insolvente em €23.300,00.
Mais alega que foi como forma de pagamento deste crédito que o insolvente lhe vendeu o referido imóvel, inexistindo pois qualquer simulação, sendo que a A. tem no dito imóvel a sua habitação.
Refere por último que com a venda ora resolvida os credores não foram prejudicados, antes beneficiados, porque a autora está a pagar o crédito garantido por hipoteca e o valor do bem não é suficiente para pagar os credores não garantidos.
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Contestou a Massa, impugnando os factos alegados pela A., mais reafirmando os fundamentos da resolução, nomeadamente que há muito aquela, mãe do insolvente, da situação falimentar deste, e que a alienação do imóvel foi feita apenas e tendo em vista tal situação, para subtrair o dito imóvel à liquidação, e mais que a autora não assumiu os créditos hipotecários que sobre o imóvel por si adquirido continuam a existir, mas que oneram a massa, pois que continuaram a ser titulados apenas pelo insolvente.
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Saneados os autos, realizou-se audiência de julgamento em conformidade com o que da respectiva acta consta.
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A final, foi proferido decisão que julgou a acção totalmente improcedente e julgou válida e eficaz a resolução relativa ao negócio descrito em 1º) dos factos provados.
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Não se conformando com o assim decidido veio a Autora interpor o presente recurso concluindo as suas alegações pela forma seguinte:
1) A questão que se coloca à douta apreciação do Meritíssimo Tribunal “ad quem”, resume-se a saber se pode considerar-se devidamente fundamentada a resolução do negócio celebrado entre a Apelante e o Insolvente, declarada pelo Sr. Administrador de Insolvência.
2) A resolução em benefício da massa insolvente pode assumir a modalidade de resolução condicional, prevista no artigo 120.º do CIRE e de resolução incondicional, ínsita nas diversas alíneas do n.º 1 do artigo 121.º do CIRE.
3) Em primeiro lugar, importa averiguar se, ao caso, é aplicável alguma das alíneas do último daqueles normativos legais.
4) Nos termos do disposto na alínea h), do número 1, do artigo 121º do CIRE,-único enquadrável no negócio sub judice-são resolúveis em benefício da massa insolvente, sem dependência de quaisquer outros requisitos, os actos a título oneroso realizados pelo insolvente dentro do ano anterior à data do início do processo de insolvência, em que as obrigações por ele assumidas excedam manifestamente as da contraparte.
5) Porque ali se consagra uma presunção iuris et de iure (“sem dependência de quaisquer outros requisitos”), entende a Apelante, com o devido respeito, não terem cabimento as considerações tecidas, na douta sentença proferida pelo Tribunal “a quo”, no que concerne à presunção de má fé da contraparte, relativamente ao negócio dos autos.
6) Designadamente, o [des]conhecimento por parte da impugnante da situação de iminente insolvência da R., e a [in]existência de relações especiais entre ambas.
7) De facto, um acto a título oneroso, mesmo que praticado naquele período, só é resolúvel se a obrigação nele assumida pelo insolvente for manifestamente excessiva em confronto com a atribuída à contraparte–usura (Vide artigo 282.º do Código Civil).
8) Ora, nos presentes autos, foi dado como provado que:
- Sobre o imóvel alienado pelo insolvente recaíam duas hipotecas voluntárias a favor do Banco F… (ponto 2 dos factos provados).
- O insolvente adquiriu o imóvel aos anteriores proprietários por escritura celebrada em 21 de Abril de 1998 pelo preço de 5.000.000$00 (ponto 3 dos factos provados).
- Para pagamento desse preço, o insolvente contraiu empréstimo hipotecário no Banco G… SA (“G…”), no valor de 22.964,74€, constituindo-se a Apelante fiadora e principal pagadora desse empréstimo (ponto 4 dos factos provados).
- Posteriormente, em 06/11/2002, o insolvente transferiu esse empréstimo para o Banco F…, para o que contraiu empréstimo junto dessa instituição, voltando a A. a constituir-se fiadora e principal pagadora do mesmo (ponto 5 dos factos provados).
- Na mesma data, o insolvente contraiu, junto do mesmo Banco, um outro empréstimo hipotecário, no montante de 75.000,00€ para realização de obras de beneficiação do imóvel, constituindo-se também aí a Apelante fiadora e principal pagadora desse empréstimo (ponto 6 dos factos provados).
- A apelante, em meados de 2009, começou a transferir, de forma regular para o Banco mutuante, diversas quantias até que estas atingiram o montante global de EURO 19.800,00 (ponto 7 dos factos provados).
9) Desta matéria provada, resulta, inequivocamente, que a Apelante pagou, pelo imóvel, um valor manifestamente superior ao valor patrimonial deste.
10) Isto porque, enquanto que a prestação do insolvente consistiu na entrega de um imóvel cujo valor patrimonial, em 13/07/2012, era de EURO 1.041,31 (Cfr. ponto 1 dos factos dados como provados), a prestação da Apelante consistiu no seguinte:
- No pagamento, ao banco mutuante, da quantia global de EURO 19.800,00 (Cfr. onto 7 dos factos provados),
- No recebimento do aludido imóvel sobre o qual recaiam duas hipotecas, para garantia do reembolso de dois empréstimos hipotecários com o valor originário de EURO 22.964,74 e EURO 75.000,00–Cfr. pontos 5 e 6 dos factos provados,
- Na subsistência de garantia pessoal–fiança com renúncia ao benefício da excussão prévia – para o mesmo fim–Cfr. pontos 4, 5 e 6 dos factos provados,
11) Nessa medida, por aplicação do número 3, do artigo 120º e da alínea h), do número 1, do artigo 121º do CIRE, estima a Apelante não ser válida, à luz destes preceitos legais, a resolução do contrato de compra e venda em benefício da Massa Insolvente.
12) Por outro lado, dispõe o número 1 do artigo 120º do CIRE que podem ser resolvidos em benefício da massa insolvente os actos prejudiciais à massa praticados dentro dos dois anos anteriores à data do início do processo de insolvência.
13) Considerando-se prejudiciais à massa, nos termos do número 2 daquele normativo legal, os actos que diminuam, frustrem, dificultem, ponham em perigo ou retardem a satisfação dos credores da insolvência, desde que ocorra má fé por parte de quem os outorga, sendo que esta se presume quando, para além daquela limitação temporal, neles participem pessoas que se encontrem especialmente relacionadas entre si.
14) Esta presunção de má fé, que é ilidível, verifica-se na situação dos autos, uma vez que o negócio sub Júdice ocorreu dentro daquele perímetro temporal e foi celebrado entre pessoas especialmente relacionadas entre si.
15) Sucede, porém, que, a montante desta presunção de má fé, não ocorre o pressuposto basilar da resolução, isto é, o que se acha consignado nos números 1 e 2 do artigo 120º do CIRE, concretamente a pratica de acto que diminuiu, frustrou, dificultou, pôs em perigo ou retardou a satisfação dos credores do insolvente. Senão vejamos:
16) O imóvel in casu encontra-se onerado com duas hipotecas, garantindo um valor global de EURO 97.964,74, em confronto com o seu valor patrimonial de 1.041,31€.
17) Como é unanimemente aceite pela doutrina e jurisprudência nacionais, a hipoteca é uma garantia especial das obrigações que confere ao credor o direito de se pagar pelo valor de certos bens com preferência sobre os demais credores do devedor.
18) Nessa medida, se o imóvel fosse adicionado à massa insolvente e vendido no âmbito do processo de insolvência, o produto da sua venda seria presumivelmente insuficiente para a liquidação desses créditos hipotecários.
19) E, por maioria de razão, os credores comuns não retirariam daí qualquer benefício.
20) Por outro lado, a satisfação do crédito detido pelos credores garantidos continuou assegurada, quer através de hipoteca, quer através da fiança constituída pela Apelante, esta última representando adicional garantia.
21) Assim, contrariamente ao vertido na douta sentença, ora posta em crise, a retirada da esfera patrimonial do insolvente do aludido imóvel não prejudicou nenhum dos credores da massa.
22) Ao invés, a permanência daquele imóvel na esfera patrimonial do insolvente prejudicaria o credor hipotecário, que assim ficaria exposto à contingência da mera satisfação parcial do seu crédito, em face de um valor de venda, em sede de liquidação, plausivelmente inferior.
23) Neste quadro, porque não verificado o pressuposto, que é basilar para a resolução condicional, do desfavor dos interesses patrimoniais da massa insolvente, prejudicada fica a análise da questão da má fé.
24) Pelo exposto, também por aplicação do artigo 120º do CIRE, estima a Apelante carecer de fundamento a resolução do contrato de compra e venda em benefício da Massa Insolvente.
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Devidamente notificada contra-alegou a apelada concluindo pelo não provimento do recurso.
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Foram dispensados os vistos.
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II- FUNDAMENTOS
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso-cfr. artigos 635.º, nº 4, e 639.º, nºs 1 e 2, do C.P.Civil.
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No seguimento desta orientação é apenas uma a questão que importa apreciar e decidir:
a)- saber se existe, ou não, em função da factualidade que dos autos resultou assente, fundamento para a resolução do acto em benefício da massa insolvente.
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A)- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

É a seguinte a matéria de facto que vem dada como provado pelo tribunal recorrido:
1. Em 13/07/2012 D… e B… outorgaram escritura pública denominada de Compra e Venda em que o primeiro declarou: que vende à segunda outorgante, pelo preço de vinte e três mil euros, que já recebeu e dá quitação, o seguinte imóvel: prédio urbano composto por uma casa com dois pavimentos e quintal, sito na Rua …, da freguesia de …, concelho do Porto, descrito na Primeira Conservatória do Registo Predial do Porto sob o nº 2298, inscrito na matriz sob o artigo 486, com o valor patrimonial de 1.041,38 Euros.
Que o referido prédio está registado a favor do vendedor ainda no estado de solteiro pela inscrição Ap. trinta e um de 16/01/1998. Que sobre o referido prédio incidem duas hipotecas, registadas pela Ap. trinta e um de 19/02/2003 e outra Ap. trinta e dois de 19/02/2003 a favor do Banco F…, SA.. e a segunda declarou: Que aceita a presente venda nos termos exarados e destina o prédio adquirido a habitação própria e permanente.
2. Sob o imóvel recaíam e recaem duas hipotecas voluntárias a favor do banco F….
3. O insolvente adquiriu o identificado imóvel aos anteriores proprietários por escritura celebrada em 21 de Abril de 1998 pelo preço de 5.000.000$00 (cinco milhões de escudos).
4. Para pagamento do respectivo preço, contraiu empréstimo hipotecário no Banco G… SA (“G…”) no montante de 5.000.000$00 (cinco milhões de escudos), constituindo-se aí a A. fiadora e principal pagadora desse empréstimo.
5. Por escritura de 6 de Novembro de 2002, o insolvente transferiu esse empréstimo para o banco F…, para o que contraiu junto desta instituição empréstimo no montante de 22.964,74€ (vinte e dois mil novecentos e sessenta e quatro euros e setenta e quatro cêntimos), voltando a A. a constituir-se fiadora e principal pagadora desse empréstimo.
6. E na mesma data de 6 de Novembro de 2002, o insolvente contraiu junto deste banco (F…), outro empréstimo hipotecário no montante de 75.000,00€ (setenta e cinco mil euros) para realização de obras de beneficiação do imóvel, constituindo-se também aí a A. fiadora e principal pagadora desse empréstimo.
7. A A., em meados de 2009, começou a transferir para a conta através da qual eles eram pagos, os valores seguintes: Janeiro de 2010–700,00€ - Fevereiro de 2010 – 700,00€ - Março de 2010 – 700,00€ - Abril de 2010 – 700,00€ - Maio de 2010 – 700,00€ - Junho de 2010 – 700,00€ - Julho de 2010 – 700,00€ - Agosto de 2010 – 700,00€ - Setembro de 2010 – 700,00€ - Outubro de 2010 – 700,00€ - Novembro de 2010 – 700,00€ - Dezembro de 2010 – 700,00€ - Janeiro de 2011 – 700,00€ - Fevereiro de 2011 – 700,00€ - Março de 2011 – 700,00€ - Abril de 2011 – 700,00€ - Maio de 2011 – 700,00€ - Junho de 2011 – 700,00€- Julho de 2011 – 700,00€ - Agosto de 2011 – 700,00€ - Setembro de 2011 – 700,00€- Outubro de 2011 – 700,00€ - Novembro de 2011 – 700,00€ - Dezembro de 2011 – 700,00€ - Janeiro de 2012 – 700,00€ - Abril de 2012 – 750,00€ - Maio de 2012 – 700,00€ - Julho de 2012 – 850,00€.
8. No dia 28 de Fevereiro de 2013, às 11.49 horas, foi decretada a insolvência de D….
9. A insolvência foi requerida por C…, SA..
10. O insolvente era sócio-gerente da sociedade H…, Lda., que foi por sua vez declarada insolvente pelo Tribunal do Comércio de Vila Nova de Gaia em 09/10/2012, pelas 23.28 horas, no âmbito do processo nº 904/12.8TYVNG.
11. A C…, SA. é portadora de uma letra no valor de 73.064.12 euros, emitida pela firma H…, Lda. não integralmente preenchida no que se refere, designadamente, à data de vencimento, local pagamento e valor.
12. Bem como emitiu e entregou à C…, SA. uma declaração em que em suma a autorizava a preencher a letra, datada de 30.08.2011, avalizada pelo ora insolvente na qualidade de sócio gerente.
13. A C…, SA. enviou carta registada à aceitante, dando um prazo de 5 dias para regularizar a situação, findo os quais, como não obteve resposta, procedeu ao preenchimento da letra.
14. Apresentada a pagamento, a letra veio devolvida por falta de pagamento, quer da aceitante quer dos seus avalistas, inclusive o ora insolvente.
15. No verão de 2012 a A. já tinha conhecimento que o insolvente D… e a sociedade H…, Lda estavam em situação de insolvência, nomeadamente aquando da celebração do negócio realizado em 13 de Julho de 2012, já tinha conhecimento de nenhum deles tinha condições de solver as suas obrigações.
16. A A. tinha conhecimento que o imóvel estava onerado com hipoteca.
17. A A. e o insolvente decidiram transferir o imóvel para o nome da A., precisamente por causa da situação de eminente insolvência do requerido, a conselho de um funcionário bancário.
18. A autora é mãe do insolvente D….
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III. O DIREITO

Como supra se referiu é apenas uma a questão que importa apreciar e decidir:

a)- saber se existe, ou não, em função da factualidade que dos autos resultou assente, fundamento para a resolução do acto em benefício da massa insolvente.

Como emerge da decisão recorrida aí se entendeu ter sido validamente resolvido, pelo Sr. Administrador, o contrato de compra e venda celebrado entre o devedor insolvente e a apelante.
Deste entendimento dissente a recorrente, alegando não resultar dos autos qualquer quadro factual que permita fundamentar a referida resolução.
Que dizer?
A resolução em benefício da massa insolvente é um instituto especial do processo de insolvência que se destina à tutela da generalidade dos credores do insolvente, na medida em que permite, ao Administrador da Insolvência, que a eficácia[1] de toda uma panóplia de actos seja destruída, verificados que sejam certos requisitos de ordem temporal, subjectiva e objectiva.
É um instituto cujos antecedentes se encontram nos artigos 1168.º, 1170.º e 1171.º, do Código de Processo Civil de 1939, nos artigos 1200.º, 1202.º e 1203.º, do Código de Processo Civil de 1961 e nos artigos 156.º, 158.º e 159.º do Código dos Processos Especiais de Recuperação da Empresa e de Falência.
A resolução em benefício da massa insolvente efectiva-se por carta registada com aviso de recepção, dentro dos seis meses subsequentes ao conhecimento do acto e nunca depois de decorridos dois anos sobre a data da declaração de insolvência (artigo 123.º, nº 1, do CIRE).
Postos estes breves considerandos e tendo em conta que a recorrente não põe em causa a declaração resolutiva feita pelo Sr. Administrador nem impugna o quadro factual que o tribunal recorrido deu como provado vejamos, então, se existia, ou não, fundamento para julgar válida a resolução efectuada pelo Srº Administrador da Insolvência.
Em primeiro plano, importa convocar o quadro normativo aplicável, desde logo, o regime estabelecido nos artigos 120.º e seguintes do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE), aprovado pelo Dec.-Lei n.º 53/2004, de 18-3, com as alterações introduzidas pelo Dec.-Lei n.º 200/2004, 18-8.
Ora, o artigo 120.º do mencionado Código dispõe que:
1 – Podem ser resolvidos em benefício da massa insolvente os actos prejudiciais à massa praticados ou omitidos dentro dos quatro anos anteriores à data do início do processo de insolvência.
2 – Consideram-se prejudiciais à massa os actos que diminuam, frustrem, dificultem, ponham em perigo ou retardem a satisfação dos credores da insolvência.
3 – Presumem-se prejudiciais à massa, sem admissão de prova em contrário, os actos de qualquer dos tipos referidos no artigo seguinte, ainda que praticados ou omitidos fora dos prazos aí contemplados.
4 – Salvo nos casos a que respeita o artigo seguinte, a resolução pressupõe a má fé do terceiro, a qual se presume quanto a actos cuja prática ou omissão tenha ocorrido dentro dos dois anos anteriores ao início do processo de insolvência e em que tenha participado ou de que tenha aproveitado pessoa especialmente relacionada com o insolvente, ainda que a relação especial não existisse a essa data.
5 – Entende-se por má fé o conhecimento, à data do acto, de qualquer das seguintes circunstâncias:
a) – De que o devedor se encontrava em situação de insolvência;
b) – Do carácter prejudicial do acto e de que o devedor se encontrava à data em situação de insolvência iminente;
c) – Do início do processo de insolvência.
E a propósito do que seja pessoa especialmente relacionada com o insolvente, o artigo 49.º, n.º 1, alíneas b) e c), consideram como tal:
b) – Os ascendentes, descendentes ou irmãos do devedor …;
c) – Os cônjuges dos ascendentes, descendentes ou irmãos do devedor.
O artigo 121.º do mesmo Código, sob a epígrafe “Resolução incondicional” prescreve, no que aqui releva, que:
1 – São resolúveis em benefício da massa insolvente os actos seguidamente indicados, sem dependência de quaisquer requisitos:
a) – Partilha celebrada menos de um ano antes da data do início do processo de insolvência em que o quinhão do insolvente haja sido essencialmente preenchido com bens de fácil sonegação, cabendo aos co-interessados a generalidade dos imóveis e dos valores nominativos;
b) – Actos celebrados pelo devedor a título gratuito dentro dos dois anos anteriores à data do início do processo de insolvência, incluindo o repúdio de herança ou legado, com excepção dos donativos conformes aos usos sociais;
d) – Pagamento ou outros actos de extinção de obrigações cujo vencimento fosse posterior à data do início do processo de insolvência, ocorridos nos seis messes anteriores à data do início do processo de insolvência, ou depois desta mas anteriormente ao vencimento;
g) – Pagamento ou outra forma de extinção de obrigações efectuados dentro dos seis meses anteriores à data do início do processo de insolvência em termos não usuais no comércio jurídico e que o credor não pudesse exigir;
h) – Actos a título oneroso realizados pelo insolvente dentro do ano anterior à data do início do processo de insolvência em que as obrigações por ele assumidas excedam manifestamente as da contraparte.
2 – O disposto no número anterior cede perante normas legais que excepcionalmente exijam sempre a má fé ou a verificação de outros requisitos.
Ora, da conjugação do estabelecido nos artigos 120.º e 121.º acima transcritos decorre que, no plano dos pressupostos, a resolução em benefício da massa insolvente pode reconduzir-se a uma de duas modalidades, a saber:
a) - a resolução condicional, quando o acto visado tenha ocorrido mais de um ano e até quatro anos antes do início do processo de insolvência, cujos pressupostos gerais, previstos no artigo 120.º, consistem na prejudicialidade do acto para a massa insolvente e na má fé do terceiro beneficiado;
b) – a resolução incondicional, quando o acto visado se traduza em quaisquer dos actos constantes da tipologia enunciada nas diversas alíneas do n.º 1 do artigo 121.º, os quais se presumem prejudiciais à massa insolvente, sem admissão de prova em contrário (presunção iuris et de jure), nos termos do n.º 3 do art.º 120.º, não se exigindo quaisquer outros requisitos, mormente o da má fé do terceiro, salvo o ressalvado no n.º 2 do art.º 121.º.
Porém, no âmbito da própria resolução condicional, há que ter presente que:
- a prejudicialidade do acto para a massa se presume também iuris et de iure, quando tal acto consubstancie qualquer dos tipos previstos no n.º 1 do artigo 121.º ainda que praticados ou omitidos fora dos prazos ali contemplados (artigo 120.º, n.º 3);
- a má fé de terceiro também se presume juris tantum, nos termos do artigo 120.º, n.º 4, podendo, por isso, ser ilidida por aquele por prova em contrário, nomeadamente pela não verificação de qualquer das circunstâncias previstas no n.º 5 do citado artigo 120.º, de cujo conhecimento, por parte do terceiro, decorre a existência de má fé.
Aqui chegados, a decisão recorrida confirmou a resolução do acto estribada na resolução condicional a que atrás se fez referência e não em qualquer resolução incondicional, razão pela qual se não vislumbra o afirmado pela recorrente quando refere que é inaplicável, ao caso sub judice, o disposto na alínea h), do número 1 do artigo 121.º do CIRE.
Efectivamente, o tribunal recorrido confirmou a resolução do acto considerando, por um lado, ser apodíctico que retirar da esfera patrimonial do insolvente um imóvel, seu principal bem, prejudica os credores da massa e, por outro, que tendo o acto lesivo sido praticado em 13/07/2012, ou seja escassos três meses antes do processo de insolvência, nele participou a mãe do insolvente que, com ele tem relação especial, e foi praticado com o propósito confessado de subtrair o bem aos credores do insolvente, quando a autora já conhecia a situação de insolvência do filho.
Como assim, importa então perscrutar se a factualidade dado como assente nos autos se enquadra na factie species da sobredita resolução condicional.
Como se sabe a resolução de actos prejudiciais à massa insolvente pode ser impugnada pela contraparte no negócio resolvido mediante acção a propor contra a massa insolvente, no prazo de seis meses, sob pena de caducidade, acção que correrá seus termos por apenso ao processo de insolvência (artigo 125.º, do CIRE).
No nosso direito positivo, em termos gerais, compete àquele que invoca um direito, a alegação e prova dos factos constitutivos desse direito (artigo 342.º, nº 1, do Código Civil), competindo a prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos àquele contra quem é invocado o direito (artigo 342.º, nº 2, do Código Civil), sendo que em caso de dúvida, os factos devem ser considerados como constitutivos do direito (artigo 342.º, nº 3, do Código Civil).
Porém, o nosso direito civil, além de algumas previsões avulsas sobre a repartição do ónus da prova (vejam-se por exemplo os artigos 487.º, nº 1 e 799.º, nº 1, ambos do Código Civil), tem também algumas regras especiais, nomeadamente no que respeita as acções de simples apreciação ou declaração negativa, caso em que compete ao réu a prova dos factos constitutivos do direito que se arroga (artigo 343.º, nº 1, do Código Civil).
O direito de resolução é um direito potestativo de natureza extintiva e, tratando-se de resolução em benefício da massa insolvente, o seu nascimento depende do preenchimento dos requisitos legais.
No que concerne à resolução condicional ao abrigo do artigo 120.º do CIRE, são requisitos gerais da resolução em benefício da massa insolvente os seguintes:
a) Realização pelo devedor de actos ou omissões;
b) Prejudicialidade do acto ou omissão em relação à massa insolvente;
c) Verificação desse acto ou omissão nos quatro anos anteriores à data do início do processo de insolvência;
d) Existência de má fé do terceiro.[2]
Se o nascimento do direito potestativo de resolução do acto em benefício da massa insolvente depende dos referidos pressupostos legais, dir-se-á, que o ónus da prova dos mencionados requisitos legais necessários àquele nascimento compete à massa insolvente[3], pois é esta entidade que invoca o direito potestativo extintivo a seu favor e que o pretende fazer valer em face da contraparte no negócio resolvido.
Todavia, a questão que se pode colocar é a de saber se, a circunstância da resolução ser declarada por via extrajudicial e de ser atacada por via de impugnação judicial, altera os dados da questão.
No seu configuração geral, a impugnação, como até o próprio nome indica, visará a negação dos factos invocados pelo Administrador da Insolvência para fundamentar a resolução que extrajudicialmente declarou.
Neste circunstancialismo, parece que a qualificação mais acertada para esta acção é a de mera apreciação negativa, na medida em que no referido figurino geral visará tão-só a demonstração da inexistência ou inverificação dos pressupostos legais da resolução declarada pelo administrador da insolvência [artigo 4º, nº 2, alínea a), do Código de Processo Civil].
Na acção de impugnação, o impugnante está apenas, de modo antecipado, a exercer o seu direito à contraprova (artigo 346.º do Código Civil), alegando factos que constituem negação dos factos invocados como fundamento do direito de resolução exercido pelo administrador da insolvência ou, noutra vertente, articulando factos extintivos do mesmo direito de resolução.
Alguma jurisprudência[4] e alguma doutrina[5], sustenta que cabe aos impugnantes a demonstração da inexistência de prejuízo para a massa insolvente e de má fé da sua parte, olvidando-se quer a natureza da acção de impugnação da resolução em benefício da massa insolvente, quer ainda a natureza de simples contraprova das alegações de inexistência de prejudicialidade no acto resolvido[6] ou da má fé por parte do terceiro interveniente no acto objecto de resolução, neste último caso sempre que o autor da resolução não beneficie de uma presunção legal juris tantum de má fé.[7]
Acontece que, a alegação de inexistência de prejuízo para a massa insolvente ou a inexistência de má fé da contraparte no negócio objecto de resolução não constituem factos extintivos do direito de resolução, mas antes a impugnação dos factos invocados para fundamentar o exercício do direito de resolução pelo administrador da massa insolvente.
Só se pode falar de um facto extintivo de um direito quando previamente existem um ou vários factos constitutivos que originaram esse direito.
É manifesto que a alegação da inexistência de prejudicialidade ou de má fé não constituem factos extintivos do direito de resolução, sendo antes a negação dos factos necessários ao nascimento do direito de resolução que, por via extrajudicial, foi exercido pelo administrador da insolvência.
A inexistência de prejudicialidade ou de má fé alegadas pelo impugnante, a provarem-se, não determinam a extinção de um direito potestativo, antes contendem com o nascimento desse direito, pois integram a negação dos factos constitutivos daquele direito.
Se o nascimento desse direito potestativo depende da prejudicialidade do acto e da má fé do terceiro, a alegação da inexistência de prejudicialidade ou de má fé não constitui qualquer facto impeditivo do nascimento do direito em apreço. É que, em tal caso, não se trata de defesa por excepção peremptória, mas antes e simplesmente de uma defesa por impugnação antecipada que pode ou não ser motivada.
Na verdade, tais alegações, ainda que envolvam a alegação de factos novos, o que sucede em regra na impugnação motivada, caso se provem, não obstam à produção ab initio dos efeitos jurídicos próprios do direito de resolução, antes contendem com o próprio nascimento do direito em apreço ”.[8]
Aqui chegados apreciemos, agora, a factualidade provada em ordem a determinar se estão demonstrados os factos necessários à constituição ou nascimento do direito de resolução que nestes autos se impugna.
Dúvidas não existem de que está provada a realização de um acto por parte do devedor insolvente e que se traduziu num contrato de compra do imóvel descrito em 1º) da fundamentação factual.
Por outro lado a escritura de compra e venda em que intervieram a aqui recorrente e o insolvente foi outorgada em 13/07/2012, sendo que, a insolvência do devedor D… foi requerida em 23/10/2012 e declarada por sentença proferida em 28/02/2013.
Portanto, o negócio foi celebrado cerca de três meses antes do início do processo de insolvência e cerca de sete meses antes da declaração de insolvência.
Daqui resulta, sem margem para qualquer tergiversação, o preenchimento do requisito da temporalidade, ou seja, o acto é, assim, abstractamente resolúvel.
Vejamos, agora, se se verificam os restantes pressupostos para que se considere válida a resolução do acto, isto é, a prejudicialidade do acto e a existência de má fé.
No que tange à má fé, é por demais evidente que também ela se verifica na situação concreta, pois que, para além da factualidade que se encontra vertida nos factos descritos em 15º) a 17º) da fundamentação factual, o negócio em causa foi celebrado entre pessoas especialmente relacionadas entre si uma vez que a apelante e o devedor insolvente são mãe e filho, respectivamente [facto descrito em 8º) da fundamentação factual].
Mas será que da factualidade assente nos autos resulta ter sido o acto realizado prejudicial para a massa insolvente?
De acordo com o artigo 120.º, nº 2, do CIRE já atrás transcrito, o acto é prejudicial à massa quando diminua, frustre, dificulte, ponha em perigo ou retarde a satisfação dos credores da insolvência.
Para efeitos da referida norma, os actos prejudiciais à massa não são apenas aqueles que diminuam o valor da massa insolvente, mas todos os actos que, de um modo geral, “tornem a satisfação do interesse do credores mais difícil ou mais demorada”.[9]
Como se sabe a finalidade principal do processo de insolvência é o pagamento, na maior medida possível, dos credores da insolvência, que a liquidação da massa insolvente e a sua repartição pelos credores deve respeitar o princípio da igualdade entre os credores da insolvência, sem prejuízo das diferenciações previstas pela lei e que a resolução em benefício da massa se destina precisamente a alcançar estes objectivos relativamente a actos do devedor que não obstante anteriores à declaração de insolvência prejudiquem os interesses dos credores.
Ora, em bom rigor, o acto prejudicial à massa para efeitos de resolução não pressupõe necessariamente que o acto implique uma diminuição do valor da massa insolvente; a lei não considera prejudicial o acto que diminua o valor da massa, prejudicial é o acto que diminua a satisfação dos credores e se é certo que esta última ocorre como consequência necessária daquela, já a inversa não é verdadeira, pois pode haver actos que não envolvam, em termos contabilísticos, uma diminuição do valor da massa e impliquem uma diminuição da satisfação dos interesses dos credores, basta que um determinado bem do património do insolvente seja substituído por um outro cuja natureza seja dificilmente penhorável, como é o caso, do dinheiro.
Na verdade, o dinheiro é um bem que pela sua própria fungibilidade é facilmente mobilizável e sonegável à acção dos credores.
No caso em apreço está apenas provado[10], sob este conspecto, que o bem imóvel descrito em 1º) da fundamentação factual foi vendido pelo devedor insolvente à Autora apelante pelo preço de vinte e três mil euros aí se tendo declarado ter já sido recebido o referido preço do qual se dava a respectiva quitação.
Como assim, perante esta factualidade não se pode dizer, como se afirma na decisão recorrida, que é “apodíctico que retirar da esfera patrimonial do insolvente um imóvel, seu principal bem, prejudica os credores da massa”.
Com efeito, embora se possa afirmar que a massa insolvente ficou substancialmente reduzida com a venda do referido imóvel, daí não se segue que a prática desse acto tenha diminuído, frustrado, dificultado posto em perigo ou retardado a satisfação dos credores do insolvente.
Efectivamente, para que assim fosse era necessário que estivesse provado, desde logo, que o valor pelo qual foi vendido o imóvel não foi recebido pelo devedor insolvente, ou tendo-o sido não entrou no património do devedor ou não foi usado para solver as suas dívidas.
Para além disso, necessário também se tornava que estivesse demonstrado que o referido valor não correspondia ao seu valor real, ou seja, que o bem foi vendido por preço inferior ao seu valor de mercado.
Ora, nada disto se encontra provado nos autos, sendo que, como atrás se referiu, era à apelada que incumbia a sua alegação e prova.
Como assim, dissentimos em absoluto da posição assumida na decisão recorrida quanto à repartição do ónus da prova, quando nela se afirma e passamos a citar:
Ao contrário, a autora não logrou provar os factos que alegou, nomeadamente que a aquisição da propriedade correspondia à sua real vontade e foi feita como meio de pagamento - até porque de facto nem sequer assumiu ou solveu o passivo hipotecário que onerava o imóvel”.
Efectivamente, como já acima sustentamos, competia ao administrador da insolvência a alegação e prova dos factos constitutivos do direito de resolução que exerceu, sem prejuízo do que decorre do princípio da aquisição processual (artigo 515.º do Código de Processo Civil).
Significa, portanto, que incumbia à apelada demonstrar a prejudicilidade do acto, coisa que manifestamente não fez.
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Resulta, assim, do exposto que não estando provada a prejudicialidade do acto a impugnação não podia ter sido julgado improcedente como o foi.
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Destarte, procedem as conclusões 12ª a 24ª formuladas pela recorrente e, com elas, o respectivo recurso.
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IV-DECISÃO

Pelos fundamentos acima expostos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar a apelação interposta procedente por provada e, consequentemente, revogando-se a decisão recorrida declara-se a total ineficácia da resolução efectuada pelo Sr. Administrador, em benefício da Massa Insolvente relativa ao contrato de compra e venda do imóvel descrito em 1º da fundamentação factual.
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Custas do recurso e da acção a cargo da massa insolvente já que a presente acção não está abrangida pela tributação do processo de insolvência (artigo 303º do CIRE), sendo aplicável a secção B, da tabela I, anexa ao Regulamento das Custas Processuais, à taxa de justiça do recurso.
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Porto, 23 de Janeiro de 2017.
Manuel Domingos Fernandes
Miguel Baldaia de Morais (dispensei o visto)
Jorge Seabra (dispensei o visto)
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[1] A resolução contende com a eficácia do acto e não com a sua validade, embora a resolução negocial seja equiparada nos seus efeitos à nulidade ou anulabilidade do negócio jurídico (artigo 433º do Código Civil), do que se trata é da cessação, em regra retroactiva, dos efeitos do negócio resolvido e não da invalidação do mesmo negócio por força da verificação de factos impeditivos da produção dos efeitos do negócio objecto de resolução. Como ensinava Manuel de Andrade in Teoria Geral da Relação Jurídica, Volume II, 4ª reimpressão, Almedina 1974, página 411, na terminologia do Código Civil de Seabra “a nulidade é apenas a ineficácia que procede da falta ou irregularidade de qualquer dos elementos internos ou essenciais do negócio.”
[2] Cfr. neste sentido Luís Meses de Leitão, Direito da Insolvência, Almedina, pág. 218.
[3] Neste sentido, quanto à prejudicialidade e à má fé do terceiro veja-se, Resolução em Benefício da Massa Insolvente, Almedina 2008, Fernando de Gravato Morais, páginas 54 e 69.
[4] Vejam-se os acórdãos da Relação de Lisboa de 24 de Setembro de 2009, relatado pelo Sr. Desembargador António Valente, no processo nº 725/06.7TBTVD-I.L1-8 e de 09 de Março de 2010, relatado pelo Sr. Desembargador Pires Robalo, no processo nº 520/06.3TBLNH-F.L1-7, ambos acessíveis no site da DGSI.
[5] Veja-se, Fernando de Gravato Morais, obra citada página 167, que começa por referir, de forma correcta, a nosso ver, que cabe ao impugnante o encargo de provar todos os factos extintivos do direito de resolução invocado, para depois afirmar, inexplicavelmente e em contradição com o que anteriormente afirmara na página 54, que compete ao impugnante a demonstração de que o acto não foi prejudicial à massa insolvente.
[6] Esta qualificação pressupõe obviamente que a resolução impugnada não beneficia da presunção juris et de jure de prejudicialidade prevista no artigo 120º, nº 3, do CIRE.
[7] Nesta última hipótese, o impugnante não se poderá cingir a uma simples contraprova (artigo 346º do Código Civil), estando obrigado a produzir prova do contrário, em ordem a ilidir a presunção legal juris tantum de má fé (artigos 120º, nº 4, do CIRE e 350º, nº 2, do Código Civil).
[8] Neste sentido Acórdão da Relação de Coimbra de 24/05/2011 in www.dgsi.pt e que aqui seguimos de perto.
[9] Carvalho Fernandes e João Labareda, obra citada pág. 429.
[10] Importa que se tenha em atenção que a matéria factual não foi objecto de impugnação.