Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
343/15.9T9ESP.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: HORÁCIO CORREIA PINTO
Descritores: CRIME DE FURTO
ENERGIA ELÉCTRICA
LEGITIMIDADE
QUEIXA
EDP
Nº do Documento: RP20180124343/15.9T9ESP.P1
Data do Acordão: 01/24/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REC PENAL
Decisão: PROVIMENTO PARCIAL
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO, (LIVRO DE REGISTOS N.º 746, FLS.25-52)
Área Temática: .
Sumário: É a D..., SA, quem tem legitimidade para apresentar queixa por crime de furto de energia eléctrica, como titular da concessão para a distribuição de electricidade.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº 343/15.9T9ESP.P1
Acordam os juízes que integram esta 4ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto.
Relatório.

Procedeu-se a julgamento em processo comum, com intervenção de tribunal singular de:
B…,
casada, doméstica, nascida em 03/11/1962, na freguesia de …, concelho de Santa Maria da Feira, filha de E… e de F…, titular do cartão de cidadão n.º ……..-…. e residente na Rua …, n.º …, ….-… …, Santa Maria da Feira (TIR a fls. 179),
C…, divorciada, cabeleireira, nascida em 19/06/1973, na freguesia de …, concelho de Santa Maria da Feira, filha de G… e de H…, titular do cartão de cidadão n.º ………-…. e residente na Rua …, n.º …, …, ….-… … (TIR a fls. 185).
Dispositivo:
a) Condenar a arguida B…, pela prática, em co-autoria material e na forma consumada de um crime de furto simples, p. e p. pelo artigo 203 do C.P, na pena de 200 (duzentos) dias de multa à taxa diária de €8,00 (oito euros), num total de €1.600,00 (mil e seiscentos euros);
b) Condenar a arguida C…, pela prática, em co-autoria material e na forma consumada de um crime de furto simples, p. e p. pelo artigo 203 do C.P, na pena de 300 (trezentos) dias de multa à taxa diária de €8,00 (oito euros), num total de €2.400,00 (dois mil e quatrocentos euros);
(…)
d) Julgar integralmente procedente, por provado, o pedido de indemnização civil formulado pela demandante D…, SA contra as demandadas B… e C…, e, em consequência, condenar estas a pagar, solidariamente, àquela a quantia total de €206,12 (duzentos e seis euros e doze cêntimos) acrescida de juros legais a contar desde a citação e até efectivo e integral pagamento.
(…)
Questão prévia:
Pugnou ainda pela falta de legitimidade da queixosa D… SA para a apresentação de queixa e consequente dedução do pedido de indemnização civil porquanto tal legitimidade compete à D1… SA.
Conclui pela extinção do procedimento criminal.
Discutida a causa resultaram provados os seguintes factos:
1) A arguida B… celebrou em 01/12/2014 um contrato com a empresa D1… SA para fornecimento de energia eléctrica, pela potência de 3,45 KWH, no apartamento sito na Rua …, n.º …, …, em Espinho.
2. Entre meados de Outubro de 2013 e, pelo menos, 23/03/2015, a arguida C… residiu naquele apartamento, que lhe foi cedido gratuitamente pela co-arguida B….
3. Em data concretamente não apurada, mas certamente entre 01/12/2014 e 23/03/2015, as arguidas, por si ou com a colaboração de terceira pessoa não identificada, em conjugação de esforços e intentos e na sequência de um plano previamente traçado, rompendo o selo da tampa superior do contador de electricidade, colocaram um objecto não identificado no interior do contador, a bloquear a rotação do disco que contabiliza o consumo e, rompendo também o selo do dispositivo controlador de potência, regularam a potência de 3,45KWH para 10,35KWH, e, desta forma, adulteraram o equipamento de medição de consumo de energia relativo à instalação particular sita na Rua …, nº …, …, em Espinho, obtendo energia eléctrica para exclusivo consumo nesta residência em quantidade superior àquela que era contabilizada, em prejuízo da D… SA.
4. Com a descrita conduta as arguidas causaram à ofendida D… SA um prejuízo patrimonial de €206,12 (duzentos e seis euros e doze cêntimos).
5. As arguidas B… e C… agiram em comunhão de esforços e intentos, de acordo com um plano previamente traçado, com o propósito concretizado de consumirem mais energia eléctrica do que a contabilizada, ou seja, de lhes ser exigido um preço inferior ao da energia efectivamente utilizada, obtendo benefício económico, a que bem sabiam não terem direito e apropriando-se da energia não contabilizada.
6. As arguidas agiram livre, voluntaria e conscientemente, bem sabendo que tal conduta era proibida e punida por lei penal.
Do pedido de indemnização civil:
7. A demandante D… SA exerce em regime de concessão de serviço público, a actividade de distribuição de energia eléctrica em alta e média tensão, sendo ainda concessionária da rede de distribuição de energia eléctrica em baixa tensão no concelho de Espinho.
8. Na qualidade de concessionária da rede de distribuição de energia eléctrica a demandante procede à ligação à rede eléctrica publica das instalações de consumo que para tanto tenham celebrado os respectivos contratos de fornecimento de energia eléctrica com os comercializadores legalmente constituídos e que operam no mercado livre ou no mercado regulado.
9. Através dos seus piquetes técnicos a demandante procede ainda à fiscalização das instalações particulares tendo em vista – além do mais – despistar eventuais ligações abusivas à rede eléctrica.
10. Com a conduta descrita supra, as arguidas furtaram toda a energia eléctrica não contabilizada pelo contador em virtude da adulteração do equipamento.
11. Detectadas as irregularidades, os técnicos da demandante procederam à substituição do contador existente por um contador novo selando todos os equipamentos.
12. Assim e porque pretendiam usufruir de energia elétrica sem para tanto pagar o preço respectivo, as arguidas ou alguém a seu mando e agindo no seu interesse desselaram e adulteraram o mecanismo de contagem com o intuito predeterminado de furtar e consumir energia, causando assim prejuízo à demandante no valor de cerca de €206,12 (duzentos e seis euros e doze euros), reportado ao período de 12.12.2014 a 23.03.2015.
13. Tal prejuízo referido em 12) e como o contador se apresentava desselado e manipulado, foi calculado por estimativa a qual teve por base uma utilização média diária de 4,3 horas, sendo ainda considerado o escalão de potência de 10,35 KVA.
Mais se provou que:
4. A arguida B… é doméstica, tem o 6.º ano de escolaridade e vive em casa própria com o seu marido que operário da construção civil e aufere €60,00 ao dia.
15. Despende a quantia de €260,00 para fazer face ao empréstimo bancário para aquisição de habitação.
16. Tem 5 imóveis, nomeadamente 3 lojas e 2 apartamentos, sendo que duas lojas e um apartamento estão arrendados retirando, respectivamente, as quantias de €400,00, €475,00 e €450,00 a título de renda.
17. Tem três filhos, todos maiores de idade e que vivem por conta própria.
18. A arguida B… não tem antecedentes criminais.
19. A arguida C… tem o 6.º ano de escolaridade, é cabeleireira de profissão, e trabalha há cerca de dois anos num cabeleireiro auferindo cerca de €900,00 a €1000,00 por mês.
20. Antes de trabalhar a tempo inteiro como cabeleireira no … Shopping, apenas fazia part-times, também como cabeleireira no shopping e ainda num cabeleireiro, ao fim de semana, em Espinho.
21. Vive com o seu companheiro que aufere a quantia de €550,00 e ainda a sua filha.
22. A arguida C… já respondeu criminalmente e foi condenada no âmbito do:
a) Processo nº 263/08.3PAMAI, pela prática em 10.03.2008, de um crime de falsificação de documento e um crime de furto simples na pena única de 150 dias de multa à taxa diária de €6,00, num total de €900,00.
b) Processo nº 490/08.3TDLSB, pela prática de um crime de emissão de cheque sem provisão, na pena de 100 dias de multa à taxa diária de €5,00, num total de €500,00.
c) Processo nº 95/09.1GDVFR, pela prática de dois crimes de falsificação ou contrafacção de documento, na pena única de 9 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de um ano.
d) Processo nº 263/10.3GDVFR, pela prática de um crime de burla simples, na pena de 250 dias de multa à taxa diária de €6,00, num total de €1.500,00.
e) Processo nº 2544/07.4TAFUN, pela prática, em 20.10.2007, de um crime de emissão de cheque sem provisão na pena de 150 dias de multa à taxa diária de €5,00, num total de €750,00.
f) Processo nº 156/08.4TAFUN pela prática em 19.10.2007, de um crime de emissão de cheque sem provisão na pena de 300 dias de multa à taxa diária de €5,00, num total de €1.500,00.
Matéria de Facto Não Provada
1. Que o prejuízo causado à ofendida D… SA seja de 276,82€ (duzentos e setenta e seis euros e oitenta e dois cêntimos).

Motivação da matéria de facto
Ora, no caso presente este juízo valorativo é delicado na medida em que os meios de prova são indiciários … inexiste prova directa de que foram as arguidas que procederam à adulteração do contador.
Cumpre por isso, em termos gerais, densificar critérios explicativos do quê e porquê da decisão.
Etimologicamente indício significa qualquer objecto de conhecimento que pode fundamentar a convicção do julgador na existência de determinados factos. Num sentido mais rigoroso indícios são representações da realidade que demonstram a existência de outros factos directa ou indirectamente, de forma necessária ou eventual.
Como é evidente esses indícios são obtidos através dos meios de prova legalmente admissíveis cuja valoração e imagem global demonstram ou não a realidade ou possibilidade da existência de um facto criminoso e do seu agente.
(…)
Todavia, conforme salienta o citado Ac RG de 19.1.09, acessível in www.dgsi.pt, (que nesta parte seguimos de perto), a eficácia probatória da prova indiciária está dependente da verificação de quatro requisitos:
1)Prova dos indícios … 2. Concorrência de uma pluralidade de indícios … 3. Raciocínio dedutivo … 4. Motivação da sentença …
Isto posto, analisaremos então a prova produzida, desde já adiantando que o tribunal não teve quaisquer dúvidas em considerar que foram as arguidas as autoras dos factos que lhe são imputados.

Assim, o tribunal valorou, desde logo a prova documental junta aos autos e que se passa a evidenciar:
- auto de vistoria de 23.03.2015 de fls. 13;
- fotografias de fls. 14 a 18;
- contrato de fornecimento de energia celebrado entre a arguida B… e o comercializador em 01.12.2014 de fls. 108 e ss;
- informação de fls. 118/137;
- informação de fls. 128 e em que se diz que a irregularidade detectada na vistoria realizada em 23.03.2015 beneficiava em exclusivo a instalação denunciada;
- informação de fls. 135/141 e em que é dito que o cliente facultou as leituras em 09.02.2015 e 27.04.2015;
- informação de fls. 153 e 154;
- documentos de fls. 82, que informa que o 1º contrato de fornecimento de energia vigorou entre 12.03.2013 a 28.02.2014;
- informação de fls. 83 que comprova o corte do fornecimento de energia em 28.02.2014, levado a cabo pela ofendida e a pedido do comercializador;
- informação de fls. 84 de onda resulta que os técnicos das vistorias de 18.07.2014 e 25.11.2014 consignaram o consumo ilícito de energia;
- informação de fls. 85, de onde resulta o histórico de leituras que vidência consumo ilícito de energia no período em que não havia contrato compreendido entre a data de corte (28.02) e o novo contrato (12.12.2014) em que os consumos evoluíram do indicie 87.206 KWH para o índice 93.177 KWH;
- informação de fls. 86 e 87, ordem de serviço que deu origem à vistoria;
- informação de fls. 98, cálculos dos prejuízos elaborados pela ofendida;
- facturas de fls. 335 a 355 correspondentes ao contrato de fornecimento de energia eléctrica para a habitação em causa nos autos no período 12 de Março de 2013 a 28 de Fevereiro de 2014 (e que abrange as facturas de fls. 104 a 108);
- facturas de fls. 372 a 428 correspondentes ao contrato de fornecimento de energia eléctrica para a habitação em causa nos autos no período de 11 de Dezembro a Setembro de 2016, (e que abrange as facturas de fls.42 a 47);
- avisos de interrupção de fornecimento de energia eléctrica para a habitação em causa nos autos no período compreendido entre 22.05.2013 a 19.02.2014, de fls. 358 a 376;
- avisos de interrupção de fornecimento de energia eléctrica para a habitação em causa nos autos no período compreendido entre 22.07.2015 a 17.11.2016 de fls. 440 a 454.
Mais ateve-se na demais prova testemunhal produzida em audiência e ainda nas declarações das arguidas.
Assim e concretizando, para prova do facto dado como provado no ponto 1) o tribunal ateve-se nas declarações da arguida B… e ainda no documento junto aos autos a fls. 108 e ss.
Para prova do facto dado com provado no ponto 2. o tribunal baseou-se nas declarações das próprias arguidas que o admitiram, sem qualquer reserva.
No que diz respeito ao facto dado como provado no ponto 3., nomeadamente aos danos que o contador e equipamento de medição de energia apresentavam, o tribunal ateve-se no auto de vistoria de fls. 13, nas fotografias de fls. 14 a 18 e ainda no depoimento das testemunhas I… e ainda J…, cujos depoimentos se mostraram totalmente credíveis atenta a forma imparcial, genuína, espontânea e escorreita em que ocorreram.
Na verdade tais testemunhas enquanto electricistas de profissão esclareceram que no dia 23.03.2015, e na sequência de uma ordem de serviço, deslocaram-se ao prédio em questão, sito na Rua .., nº …, a fim de procederam a uma fiscalização a um dos contadores desse prédio.
Sucede, porém, que quando se fazem a fiscalização de um dos contadores do prédio, aproveitam e fazem a fiscalização dos demais existentes nesse mesmo prédio.
Foi o que sucedeu no caso dos autos, na medida em que, apesar de não terem ido, propositadamente fiscalizar tal contador, aproveitaram e também fiscalizaram os demais contadores do prédio sito na Rua …, nº …, entre os quais, o do ….
E nessa fiscalização depararam-se com as anomalias que estão descritas no auto de vistoria de fls. 13 e que deram por integralmente reproduzido, nomeadamente, o selo da tampa superior do contador de electricidade estava rompido, tendo sido colocado um objecto não identificado no interior do contador, a bloquear a rotação do disco que contabiliza o consumo; assim como o selo do dispositivo controlador de potência também estava alterado na medida em que regularam a potência de 3,45KWH para 10,35KWH, e, desta forma, adulteraram o equipamento de medição de consumo de energia relativo à instalação particular sita na Rua …, nº …, …, em Espinho, obtendo energia eléctrica para exclusivo consumo nesta residência em quantidade superior àquela que era contabilizada.
Face a tais depoimento, corroborados pelo auto de vistoria de fls. 13, e de resto, pela própria arguida C… que no momento da fiscalização também se encontrava no local e presenciou a inspecção levada a cabo pelos técnicos, e que confirmou, in loco, o que era constatado por estes, o tribunal não teve quaisquer dúvidas em considerar que tais eram os danos que o selo/contador/equipamento de medição de consumo de energia relativo à instalação particular sita na Rua …, nº …, …, em Espinho apresenta.
Isto posto, resta explicitar qual a convicção do tribunal no sentido de conseguir imputar a autoria de tais danos às arguidas, na medida em que inexiste prova directa relativamente a tais factos e as arguidas negam a sua prática.
Com efeito, as arguidas desejaram prestar declarações e confirmaram, grosso modo os factos descritos na acusação, negando apenas terem sido as autoras dos danos causados e descritos no ponto 3) da acusação, alegando ainda desconhecer quem o fez.
Assim esclareceram que a arguida B… é a proprietária da fracção em causa e que a cedeu, de forma gratuita, sem qualquer contrapartida pecuniária, à sua amiga, a arguida C…, que nela habita, ininterruptamente, desde Outubro de 2013, até à presente data.
Que o fez por serem amigas e por a querer ajudar, sendo que não lhe cobrava qualquer quantia por tal cedência, sendo a arguida C… a responsável pelas despesas de água, luz, ainda que os respectivos contratos continuassem em nome da arguida B….
No entanto, negaram terem feito qualquer adulteração no contador e afins, sendo que igualmente desconhecem quem o possa ter feito na medida em que não viram nem têm qualquer pessoa suspeita que possam indicar.
Ora, as declarações das arguidas, na parte em que negam a prática dos factos não mereceram credibilidade aos olhos do tribunal, as quais de resto não se mostram corroboradas por qualquer outro meio de prova, sendo, pelo contrário, infirmadas pela demais prova produzida.
De resto as declarações das arguidas para além de inverosímeis conforme infra se vai explanar, são igualmente contraditórias, o que denota a cumplicidade em querer escamotear os factos, bastando para tanto atender à contradição verificada sobre o motivo pelo qual iam proceder ao corte de electricidade aquando da fiscalização de Dezembro de 2014, ou mesmo quem é que possui as facturas relativas ao contrato. É que tanto diziam que quem possuía as facturas era a arguida C… como depois já afirmavam que esta as entregava à arguida B…, que as mantinha consigo. Ou então, segundo a arguida B…, o motivo subjacente ao corte de energia era motivado pela necessidade de celebrar um novo contrato de fornecimento de energia atenta a alteração legislativa operada o que obrigava a que a entidade contratante fosse diversa da que estava; enquanto que a arguida C… (fugindo a boca para a verdade) afirmou que lhe disseram que o corte era devido à falta de contrato, para depois, quando confrontada com a contradição face o depoimento da arguida B…, retratar-se, alegando que era por causa da necessidade de um novo contrato com uma outra entidade.
É certo que inexiste, como se disse, prova directa, que atesta a prática, pelas arguidas dos factos dados como provados, pois estas negam a prática desse facto e inexiste qualquer testemunha que o corrobore.
No entanto, face aos factos conhecidos, e que infra explicitaremos, conseguimos, estabelecer um nexo preciso, directo, coerente, lógico e racional entre os indícios provados e os factos que deles se inferem (a autoria dos factos imputável às arguidas).
Senão vejamos.
Desde logo e conforme resulta do depoimento da testemunha I… e J… e informação de fls. 128, a irregularidade detectada beneficia em exclusivo a instalação denunciada.
Ou seja, inexiste qualquer outra pessoa que pudesse beneficiar de tais irregularidades que não as proprietárias/detentoras/utilizadoras da fracção em causa.
Por outro lado, e no que à arguida C… é inequívoco a sua autoria nos factos.
Na verdade, resultou provado que era esta arguida que habita na fracção em causa desde Outubro 2013.
Ou seja, é esta arguida que – com exclusão de outros a não ser o seu companheiro e filha – habita e usufrui do imóvel, e bem assim de todas as comodidades que o mesmo pode oferecer.
E como resulta à saciedade, qualquer consumidor pretende ter o máximo de energia possível e pagar o menos possível, o que é ainda mais premente se o consumo de energia em causa for de tal ordem que a potência contratada não é suficiente para a mesma.
Resultou do depoimento da testemunha I…, que de resto, como se disse, foi bastante credível e relevante para a descoberta da verdade material, na medida em que, enquanto técnico de electricidade conseguiu explicar, de forma leiga e perfeitamente clara os meandros da sua actividade e que podem escapar com facilidade a quem não é da área, e que de forma peremptória esclareceu que a potencia contratada para a fracção em causa 3,45 KWH, (correspondente 15), apenas permite estarem ligados um simples cilindro e fogão, sendo que para ligar uma máquina de lavar louça/roupa ou secador necessário se torna uma potencia superior, nomeadamente a de 6,9 KWH ou mais.
Ora, pela própria arguida C… foi dito que na casa em que habita tem cilindro, fogão, aquecedor de inverno e ainda vários outros utensílios própria de cabeleireira, nomeadamente um secador profissional (2800 de potência) e ainda uma máquina de cortar cabelo, etc.
Ou seja, resulta à saciedade que a potência contratada para tal habitação não era, de todo, suficiente para fazer face ao consumo de energia que a arguida tinha, ao que não será alheio o facto de a mesma exercer a actividade de cabeleireira (refira-se que a arguida, durante o hiato temporal em questão apenas exercia, conforme dito pela própria, actividade de cabeleira em parte-time no arrábida shopping durante a semana e noutro cabeleiro em Espinho, mas ao fim-de-semana, pelo que não nos causaria qualquer estranheza que durante o período de tempo livre que tinha à semana, a arguida fizesse biscates na área de cabeleireiro em casa), e por isso mesmo possuísse diversos instrumentos próprios de tal actividade e que consomem diversa energia.
Daqui resulta que apenas esta arguida podia beneficiar de tais adulterações na medida em que as mesmas permitem a passagem de 3,45KWH para 10,35KWH, e, desta forma, obter energia eléctrica para exclusivo consumo nesta residência em quantidade superior àquela que era contabilizada.
Já no que diz respeito à arguida B…, ao tribunal também não suscitou qualquer dúvida quanto à sua autoria.
Com efeito, e em primeiro lugar, a arguida B… é que é a proprietária da fracção em causa.
Em segundo lugar é a mesma arguida que figura como contraente no contrato de fornecimento de energia celebrado com a D1… SA para a fracção em causa, contrato esse celebrado já depois de estar a viver na fracção a arguida C….
Em terceiro lugar é a mesma arguida que pagava as contas de luz daquela fracção. Ou seja, apesar de ser a arguida C… a moradora, o certo é que segundo resultou das declarações de ambas, a pedido desta, aquela arguida B… começou a proceder ao pagamento das despesas de luz relativas à fracção em causa, pelo que, como resulta à saciedade, que quanto menos gastos tivesse com tal consumo (o que necessariamente ocorreria por força da adulteração levada a cabo), mais lucraria.
Dito de outro modo, por força do consumo que a arguida C… efectuava na fracção em causa, as contas de electricidade seriam necessariamente superiores caso a potencia contratada fosse a que correspondia à efectivamente gasta.
Ora, por força da adulteração levada a cabo, tal consumo de energia era, não só não totalmente contabilizado, como ainda por cima, beneficiava de uma potência superior à contratada, com claro prejuízo para a ofendida e claro benefício para a utilizadora de tal energia (C…) e pagadora da mesma (B…).
Em quarto lugar, segundo o depoimento da testemunha K… do departamento de fraudes que presta serviço à D…, já não era a primeira vez que a arguida C… mantinha um procedimento fraudulento relativamente ao consumo de energia eléctrica, pois, precisamente no mesmo prédio, mas relativo a uma fracção sita no terceiro andar, igualmente registada em nome da arguida, também detectaram fraudes (consumos ilegais de energia), de onde se conclui pela reiteração da arguida para a prática de tais condutas.
Em quinto lugar, todos os antecedentes da arguida B… (e também da arguida C…) e que se traduzem em fraudes no que ao fornecimento de energia diz respeito, permitem concluir pela sua intervenção na dos autos.
Na verdade e para conseguir estabelecer o nexo de causalidade dos factos ora em apreço e a sua autoria, necessário se torna repristinar toda a informação que resulta da prova documental junta aos autos e supra referida conjugada com a prova testemunhal produzida em audiência, mormente o depoimento da testemunha K…, cujo depoimento se afigurou credível, isento e imparcial.
Assim, de tais elementos de prova (documental e testemunhal) resulta que:
1. Entre 12.03.2013 e 28.02.2014 vigorou um primeiro contrato de fornecimento de energia celebrado entre a arguida B… e D1… SA para a fracção em causa nos autos (que se percebe atendendo a que a arguida C… ainda não estava a morar em tal fracção), contrato esse que cessou naquela data de 28.02.2014 por ordem do comercializador e por incumprimento contratual do consumidor;
2. Durante o período referido em 1) (mais concretamente em Outubro de 2013), a arguida C… vai morar para a fracção em causa;
3. Que entre 29.02.2014 e 10.12.2014 não houve qualquer contrato de fornecimento de energia para a fracção em causa. Não obstante não haver contrato válido, o certo é que continuaram a consumir energia (ilícita) nesse mesmo período conforme resulta de fls. 85 (histórico de leituras que vidência consumo ilícito de energia no período em que não havia contrato compreendido entre a data de corte (28.02) e o novo contrato (12.12.2014) em que os consumos evoluíram do indicie 87.206 KWH para o índice 93.177 KWH);
4. Que na sequência da uma vistoria levada a cabo à fracção em causa, em Dezembro de 2014, e em que os técnicos iam proceder ao corte de energia por falta de contrato, é celebrado, mais uma vez, (e apesar de já la estar a morar a arguida C…) pela arguida B… um novo contrato de fornecimento de energia com validade desde 12.12.2014 até à presente data, sendo que é logo após tal contrato, ou seja durante o período que media 01.12.2014 e 23.03.2015 que se descobre a adulteração em causa nos autos.
Desta sequência cronológica de factos é facilmente perceptível a intenção das arguidas e a sua conduta.
(…)
Mas note-se, que apesar de tal novo contrato já poder ser celebrado em nome da arguida C… que já lá estava a morar há mais de um ano, o certo é que foi novamente a arguida B… que celebrou o novo contrato o que também evidencia a sua participação nos factos.
Ora, não podendo continuar a beneficiar de energia sem pagar, como tinham feito desde 29.02.2014, as arguidas que tiveram de celebrar novo contrato de fornecimento de energia sob pena de lhe ser cortado, de vez, tal fornecimento, tiveram que arranjar um nova solução de forma a não despenderem tanto dinheiro e consumirem mais energia, pelo que resolveram praticar os factos dados como provados.
E nem se diga que são necessários especiais conhecimentos para causar os danos verificados, o que afasta a autoria das arguidas que nenhum conhecimento têm na área.
É que resultou de forma perfeitamente clara dos depoimento das testemunhas I… e J…, electricistas de profissão, que qualquer pessoa, sem especiais conhecimentos, é capaz de levar a cabo tais danos.
De resto, e compulsadas as fotografias de fls. 14 a 18 e 244 a 250, verificamos que a rasura no número “4” de forma a parecer ser um número “1” (passagem dos 15 para os 45 de potencia) e que consta de fls. 249, é de tal forma grosseira e evidente que permite a conclusão que foi feita por um amador, ou então por alguém que não tenha os utensílios adequados para o efeito.
Mas mesmo que não tenham sido as arguidas a concretizar tais danos, o certo é que poderiam perfeitamente ter pedido a alguém, com conhecimento especializados ou genéricos na área (como por exemplos um electricista ou um simples operário da construção civil que contacta todos os dias com tais matérias e de que resto, coincidentemente ou não, é a profissão do marido da arguida B…), para os concretizarem, mas sempre no interesse e a mando das arguidas.
Por outro lado, de igual modo, não colhe a versão da arguida B… que tais danos poderão ter sido praticados por qualquer pessoa mal intencionada e com intenção de a prejudicar.
Desde logo pois pese embora tal afirmação, o certo é que a mesma é desprovida de qualquer prova, mormente identificação de quem poderia ter interesse em as prejudicar.
Depois porque tal versão cai por terra já que mesmo a ter sido alguém com intuito de as prejudicar, então não se bastaria com tais factos sem a respectiva denúncia. Ou seja, tal pessoa teria de se certificar que as arguidas viriam a ser, efectivamente responsabilizadas, que a sua conduta teria frutos, pelo que teria de as denunciar o que não foi feito, nem mesmo de forma anónima, pois conforme referiram os técnicos, a vistoria à fracção em causa ocorreu de forma casual e não premeditada.
De todo o exposto, nomeadamente dos antecedentes atrás descritos relativos a fraudes e procedimentos enganadores no consumo de energia; a sequência temporal dos factos (é precisamente na sequência de terem sido descobertas quanto ao consumo ilícito de energia sem pagar durante o período da inexistência do contrato e face à impossibilidade de poderem continuar a beneficiar de tal regime que as arguidas celebram um novo contrato de fornecimento de energia, mas em que é adulterado o contador e os selos, conseguindo desta forma, continuar a usufruir de mais energia mediante menor pagamento); aliados ao benefício que tais factos apenas podem trazer às próprias arguidas (à arguida C… enquanto consumidora e à arguida B… enquanto pagadora), e a mais ninguém, o tribunal não teve qualquer dúvida em considerar as arguidas, por si, ou por intermédio de alguém, no seu exclusivo interesse, como co-autoras de tais factos.
Para prova dos factos dados como provados nos pontos 4) (em contraposição com o facto dado como não provado no ponto 1) 7) a 13) o tribunal ateve-se, para além das regras de experiência comum e normalidade e de conhecimento notório e público, no depoimento da testemunha L… que de forma perfeitamente clara, espontânea, verosímil e com conhecimento de causa, relatou ao tribunal o prejuízo causado pelas condutas das arguidas à ofendida e a forma de o calcular.
Quanto às condições socio económicas das arguidas, o tribunal ateve-se nas suas próprias declarações que, nesta sede, não nos mereceram qualquer reparo.
Quanto aos antecedentes criminais das arguidas, o tribunal valorou os CRC´s juntos aos autos.
(…)
Da medida concreta da pena
Relativamente à arguida B…, a mesma não apresenta qualquer antecedente criminal, pelo que, será de dar prevalência à pena de multa.
No entanto, e relativamente à arguida C…, não podemos olvidar que apresenta já diversos antecedentes criminais, relacionados com a prática de crimes contra o património, nomeadamente furto, emissão de cheque sem provisão, burlas, falsificação de documento.
No entanto tais antecedentes remontam há já mais de 8/10 anos, sendo que desde então desconhece-se que a arguida tenha praticado qualquer outra conduta avessa ao direito, estando, actualmente inserida social, familiar e profissionalmente.
Opta-se, assim, por lhe aplicar pena de multa, pela prática do crime em causa.
(…)
Assim, ponderados todos estes elementos e com a convicção de que, desta forma, será conseguida a sua plena ressocialização, entendemos adequado fixar a pena a aplicar à arguida B… em 200 (duzentos) dias de multa.
Relativamente ao montante diário, importa ter presente que embora a pena de multa tenha de representar um sacrifício para a arguida, deve o tribunal atender à situação económica e financeira deste e aos seus encargos pessoais (artigo 47, nº 2 do Código Penal).
(…)
Ora, recorrendo a critérios de razoabilidade e às regras da experiência comum, bem como sopesando a situação económico-financeira da arguida, a qual tem rendimentos que rondam os €1.200,00 mensais e tem um encargo fixo de €260,00 por mês, tem-se por justa e adequada a fixação do montante diário em €8,00 (oito euros).
Assim, ponderados todos estes elementos e com a convicção de que, desta forma, será conseguida a sua plena ressocialização, entendemos adequado fixar a pena a aplicar à arguida C… em 300 (trezentos) dias de multa.
Relativamente ao montante diário, e tendo em consideração as condições que supra se teceram e que aqui se dão por reproduzidas, e recorrendo a critérios de razoabilidade e às regras da experiência comum, bem como sopesando a situação económico-finaceira da arguida, a qual se insere num agregado familiar de onde retiram a quantia mensal de cerca de €1.500,00, e apesar de não ter nenhuma encargo mensal fixo, tem uma filha dependente, tem- se por justa e adequada a fixação do montante diário em €8,00 (oito euros).
(…)
Recurso da arguida C…
Por indisponibilidade de suporte magnético vamos sintetizar o objecto do recurso e conclusões.
A recorrente considera a medida da pena excessiva, desproporcionada.
O valor mensal para cada um dos elementos do agregado familiar situam-se abaixo do valor do salário mínimo nacional.
O prejuízo causado pelas arguidas é de 206,12€.
A arguida tem antecedentes mas não praticou crimes nos últimos anos.
A multa de 2.400,00€ é incomportável para a recorrente.
A multa é muito superior ao valor do prejuízo causado.
A multa é desajustada.
As multas das co-arguidas são diferentes e nada justifica tratamento diverso.
A multa de 500,00€ parece ser a multa mais adequada.
A sentença recorrida violou o artº 47 do CP.

Recurso de B….
Conclusões:
1ª A Douta Sentença recorrida não julgou correctamente a matéria de facto;
2.ª A Douta Sentença fez exclusivo uso de presunções sem que se encontrassem reunidas as provas indiciárias, directas ou indirectas que o permitissem;
3.ª A Douta Sentença abusou abundantemente de deduções e retirou ilações sem se alicerçar na existência de um nexo, directo ou mesmo indirecto que, segundo as regras do pensar humano racional e cartesiano, gerasse um todo coerente;
4.ª A legitimidade para a apresentação da queixa e dedução do pedido de indemnização civil compete à D1… SA e não à D… SA;
5.ª Na Douta Sentença é seguido um entendimento contrário, tendo-se confundido, no entanto, o “veículo” com o “combustível” que o faz andar;
6.ª Na acusação não é especificado se o furto corresponde a “energia da rede” e/ou a “energia do contrato de fornecimento” e dúvidas não residem que os factos se reportam a um período em que está em vigor um contrato de fornecimento de energia com a D1… SA (cfr. Factos Provados em 1 e 3 da Matéria de Facto Provada);
7.ª O crédito de que a demandante cível e queixosa se arroga titular tem por objecto “encargos de uso de rede associados à quantidade de energia eléctrica ilicitamente consumida em virtude da manipulação do contador”, cuja expressão pecuniária, tal como decorre dos factos provados em 10 e 13 da matéria de facto provada, corresponde à diferença entre, por um lado, os montantes anteriormente pagos, correspondentes aos “encargos de uso das redes” ao comercializador que emitiu as suas facturas com base nas leituras do contador viciado; e, por outro lado, os que teria pago se se considerasse a quantidade de energia realmente consumida no mesmo período.
8.ª Não se trata de uma diferença relativa ao “preço” da energia eléctrica consumida propriamente dita (a chamada “tarifa de energia”) mas, diversamente, de uma diferença que tem por objecto a tarifa de uso da rede de distribuição (artºs 27 e 74 do Regulamento Tarifário);
9.ª O facto constitutivo do direito (“original”) ao recebimento do valor “real” da tarifa de uso da rede de distribuição de electricidade, calculado com base na quantidade de energia realmente consumida, que se projecta no direito (“derivado”) à diferença entre, por um lado, o montante recebido e, por outro lado, o montante efectivamente a receber, em conformidade com o consumo real de electricidade, é o contrato de uso da rede que liga o distribuidor ao comercializador dependendo a quantificação da prestação do consumo real de energia;
10.ª O direito do distribuidor de energia eléctrica ao recebimento da tarifa de uso da rede não é um efeito (nem depende) da prática de um qualquer facto ilícito sendo, diversamente, um dos principais efeitos jurídico-obrigacionais do contrato de uso de rede como é, aliás, confirmado pelo artº 1/1 e pelo artº 3/2 do Decreto-Lei nº 328/90, de 22/10;
11.ª O facto de o legislador não fazer depender tal direito (do fornecedor) da verificação dos pressupostos gerais nucleares da obrigação de indemnizar (a prática de facto ilícito e culposo) mostra que o consumidor, quando paga o valor do consumo real (e o valor das tarifas de acesso às redes que dele dependem), cumpre o seu dever principal de prestação e não uma qualquer obrigação de indemnizar (muito menos uma obrigação de indemnizar);
12.ª Diga-se, no plano do dano, que a demandante/queixosa D… SA nunca será titular do direito ao ressarcimento de um dano consistente no valor da energia eléctrica “apropriada” ou “furtada” (ou consumida sem ser medida pelo contador), uma vez que não é (nem pode ser) a “proprietária” da energia apropriada: o proprietário da energia que circula na rede é o comercializador D1… SA;
13.ª A D… SA é a proprietária das “linhas e dos postes” por onde circula a energia eléctrica (veículo) e não da “energia eléctrica em si mesma” (combustível) dado que a propriedade desta caberá ou ao produtor e/ou ao comercializador;
14.ª No plano da ilicitude, justamente porque há um contrato de uso da rede de distribuição que vincula a D… SA ao comercializador D1… SA, não é ilícito o uso da rede para a circulação da energia eléctrica que chega à instalação de consumo: tal contrato (de estrutura locativa) tem justamente o efeito de legitimar o uso da rede gerida e explorada pela demandante: a falta de fidedignidade dos registos do contador, resultante da sua viciação, apenas implica, quanto à D… SA que, insiste-se, não é proprietária da electricidade que “corre” na rede, a correcção do valor da tarifa de uso da rede; a correcção, afinal, do valor da prestação a que, contratualmente, tem direito;
15.ª O consumo real não registado no contador não transforma um direito de crédito, de fonte contratual, numa pretensão indemnizatória delitual;
16.ª No caso, a pretensão da D… SA tem, como resulta da Douta Sentença, por objecto a tarifa de uso da rede de distribuição e esta é objecto de um crédito (emergente do contrato de uso de rede celebrado com o comercializador) cujo sujeito passivo não é o consumidor: é, sim, o comercializador D1… SA pois que, justamente, é este que celebra, com o distribuidor D… SA, sujeito activo do crédito, o contrato de uso da rede, solução legal essa que resulta do disposto no art.º 44.º/3 do Decreto-Lei n.º 29/2006;
17.ª A D… SA não é parte legítima no pedido de indemnização civil porquanto essa legitimidade competiria, sim, à D1… SA, ilegitimidade essa que não deixa de se repercutir no direito de queixa exercido, o qual caberá a esta última e não àquela, devendo extinguir-se o procedimento criminal por falta de legitimidade da “queixosa”, com todas as consequências;
18.ª O raciocínio expendido pelo Tribunal “a quo”, equivale a uma verdadeira apologia da maleabilização (e quase supressão) de princípios como a presunção de inocência e o in dubio pro reo, justificado pela sugerida incapacidade de terem sido recolhidos os necessários indícios (provas) concretos que permitissem sustentar a acusação pública contra a Recorrente;
19.ª Feita uma leitura mais atenta da motivação da Douta Sentença recorrida, que estamos perante uma falácia ou a mera tautologia do “só pode ser assim”;
20.ª Encontramo-nos na douta sentença perante “palpites”, meros raciocínios e não factos, raciocínios esses que nem sequer lograram ser dados como comprovados na matéria de facto provada, como no caso de “é a mesma arguida que pagava as contas de luz daquela fracção”, e “(…) a arguida B… mantinha um procedimento fraudulento relativamente ao consumo de energia eléctrica, pois, precisamente no mesmo prédio, mas relativo a uma fracção sita no terceiro andar, igualmente registada em nome da arguida, também detectaram fraudes (consumos ilegais de energia) (…)”;
21.ª Tem de se salientar que o Tribunal “a quo” não pode com rigor valorar tais factos, que nem sequer constam da matéria de facto provada, como modo de comprovar com segurança que foi a Recorrente que cometeu o crime pelo qual foi condenada;
22.ª Basta para tanto pensar que, apesar de a Recorrente não ter logrado provar os factos indicados em 4.º da sua contestação, tal não quer dizer que os mesmos não possam ter acontecido, concluindo-se assim que existem outras formas alternativas da sua prática, além de que resulta da própria decisão que a “única” interessada na situação foi e é a arguida C…;
23.ª O que resulta manifesto da decisão censurada é de que o Tribunal «a quo» partiu para a demonstração do facto indício, que é a base da inferência, a partir de prova meramente indiciária, o que é de todo inadmissível atenta a insegurança que tal provoca (Acórdão da Relação de Coimbra de 09/02/2000, CJ, Tomo I, página 56), mesmo para os defensores da aplicação em processo penal da «prova por presunção» apesar de, de acordo com outra posição (seguida pela Recorrente), as presunções terem de haver-se banidas em processo penal em face do disposto no artº 32 nº 2 da CRP – Acórdão do STJ de 07/11/1990, Processo n.º 41294/3.ª;
24.ª No caso vertente, conclui-se que a eficácia probatória da prova indiciária, no que toca á Recorrente e de acordo com o que resulta da decisão censurada, não se verifica, pelo que não é possível alcançar a pretendida autoria na prática do crime pelo qual foi condenada;
25.ª O Tribunal “a quo” também não fez a melhor apreciação do documento de fls. 159 a 161 dos autos (Ordem de Serviço n.º …………, de 18/07/2014, gerada na sequência de verificação de consumo sem contrato), do qual resulta que foi a própria Recorrente (Tel. ………) quem alertou a D… SA para o facto de, já na referida data, “o local poder ter luz de forma abusiva” (cfr.), concluindo-se, conforme regras da experiência comum, que caso a mesma tivesse incorrido voluntaria e propositadamente no comportamento pelo qual veio a ser acusada e condenada, não partiria da sua iniciativa, como aconteceu, reportar esse facto;
26.ª Estamos, na douta sentença recorrida, perante um raciocínio incompatível com o disposto no artº 32, nº 2 da CRP;
27.ª A única posição aceitável e compatível com o aludido preceito constitucional, passa por sustentar que os critérios de apreciação e valoração da prova são unitários, não podendo ser, como acontece no caso, maleabilizados consoante as maiores ou menores dificuldades probatórias de determinados factos;
28.ª É que, se um facto é de difícil prova, ainda assim não se demite o acusador de o provar, se quer sustentar a acusação; a deficiência ou falta de prova do referido facto, tem como necessária consequência a não prova do facto, como é elementar;
29.ª Acredita-se até que, na dúvida, o Tribunal “a quo” optou por valorizar contra a Recorrente a inexistência de prova concreta da prática de tais factos, circunstância essa que, com o devido respeito, quando conjugado com o trecho onde é feita tal afirmação (inexistência de prova concreta), transparece do seguinte trecho da douta sentença recorrida: “Ora, as declarações das arguidas, na parte em que negam a prática dos factos não mereceram credibilidade aos olhos do tribunal, as quais de resto não se mostram corroboradas por qualquer outro meio de prova, sendo, pelo contrário, infirmadas pela demais prova produzida.”;
30.ª O que acontece é que dos elementos probatórios, como resulta da própria decisão censurada, não se logrou, de forma directa (ou mesmo indirecta) fazer-se qualquer prova de que a Recorrente tenha praticado os factos, verificando-se uma situação em que tentando seguir o raciocínio do julgador, os factos que suportam a condenação não se mostram provados e colidem inconciliavelmente entre si, uns com os outros e com a fundamentação da decisão;
31.ª Nenhumas das testemunhas inquiridas afirmou que viu ou tem conhecimento de que a Recorrente tenha praticado quaisquer dos factos pelos quais foi condenada: I… (cfr. Registo gravação do depoimento prestada na sessão de julgamento de 02 de Novembro de 2016, de 00.00 a 18m10ss e 00.00 a 27m46ss); J… (cfr. Registo gravação do depoimento prestada na sessão de julgamento de 23 de novembro de 2016, de 00.00.01 a 00.19.54); M… (cfr. Registo gravação do depoimento prestada na sessão de julgamento de 23 de Novembro de 2016, de 00.00.01 a 00.04.02); N… (cfr. Registo gravação do depoimento prestada na sessão de julgamento de 23 de Novembro de 2016, de 00.00.01 a 00.04.33); O… (cfr. Registo gravação do depoimento prestada na sessão de julgamento de 23 de Novembro de 2016, de 00.00.01 a 00.03.12); L… (cfr. Registo gravação do depoimento prestada na sessão de julgamento de 23 de Novembro de 2016, de 00.00.01 a 00.11.35);
32.ª A Recorrente, sempre pugnou pela sua inocência, sempre afirmou que tudo o que consta da acusação é falso e sobre o crime de que vem condenada, afirmou e sem qualquer hesitação que eram falsos os factos ali alegados (cfr. Registo gravação do depoimento prestada na sessão de julgamento de 02 de Novembro de 2016, de 00.00 a 28m57ss);
33.ª Transparece até, aqui, da douta sentença recorrida que, reportando-se à arguida C…, “(…) apenas esta arguida podia beneficiar de tais adulterações na medida em que as mesmas permitem a passagem de 3,45KWH para 10,35KWH, e, desta forma, obter energia eléctrica para exclusivo consumo nesta residência em quantidade superior àquela que era contabilizada.”;
34.ª Na verdade, no caso, da douta decisão resulta que existe uma forte dúvida sobre a prática dos factos pela Recorrente, resultando patente que, na dúvida, o Tribunal «a quo» optou por condena-la, decidindo contra esta quando se impunha a sua absolvição;
35.ª Ao fazê-lo, violou o disposto no artigo 127 do CPP e o princípio processual penal do in dubio pro reo que lhe inere, constante do artigo 32 nº 2 da CRP, impondo-se assim a absolvição do Recorrente;
36.ª Impõe-se uma modificação da matéria de facto nos termos e para efeitos do artigo 431 do CPP, no sentido de que os Factos Provados sob os nºs 3, 4, 5 e 6 da matéria de facto provada, na parte que se refere à Recorrente, ser julgada como não provada e a mesma absolvida da sua prática, com as necessárias consequências para o pedido cível formulado, absolvendo-a do mesmo;
37.ª A pena de multa aplicada à Recorrente considera-se, mesmo por aplicação do princípio do “in dubio pro reo”, infundada e injusta;
38.ª As sanções penais terão de assumir a gravidade estritamente necessária à prossecução dos fins das penas, mais precisamente “a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade.” (art.º 40.º, n.º 1 do CP) e tendo sempre como limite a medida da culpa;
39.ª No que se reporta à escolha da pena e determinação da pena regem os artºs 70 e 71 do CP, sendo que as várias circunstâncias que deverão ser consideradas na determinação da medida da pena e que se encontram exemplificativamente elencadas no nº 2 do artº 71º do C.P., reconduzem-se todas elas ao grau de culpa do agente ou às exigências de prevenção, constituindo concretizações destas duas categorias;
40.ª Sendo certo que das exigências de prevenção «já cuidou, em primeira mão, o legislador, quando estabeleceu a moldura punitiva» – Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 10/04/1996, CJSTJ, II/96, 168;
41.ª Os elementos dos autos vão no sentido de o grau de ilicitude, modo de execução, gravidade das consequências ou grau de gravidade de violação de deveres impostos ao agente, apontarem para pena mais próxima do limite mínimo da moldura penal do crime pelo qual foi condenada a Recorrente;
42.ª No que se reporta às circunstâncias previstas no artº 71, nº 2, alíneas a), c) e) e f) do C.P., a douta sentença recorrida nada refere a este respeito, não sendo expectável que a Recorrente venha a reincidir, razão pela qual também esta circunstância aponta no sentido da aplicação de pena próxima do limite mínimo da moldura penal;
43.ª O trecho da Douta Sentença que se refere à Recorrente, respeitante aos critérios ponderados, é de natureza essencialmente conclusiva, pouco permite acrescentar além da diminuta gravidade e censurabilidade da conduta da Recorrente, nada dizendo a respeito do nº 3 do artº 72 do CP;
44.ª Relativamente ao grau de ilicitude, modo de execução, gravidade das consequências ou grau de gravidade de violação de deveres impostos ao agente, a douta sentença recorrida é absolutamente omissa, de natureza essencialmente conclusiva;
45.ª Ao contrário do referido na douta sentença recorrida, o grau de culpa da Recorrente, atento o valor diminuto da coisa furtada, sempre se afigura também como diminuto, impondo a aplicação de penas próximas dos limites mínimos (porquanto a culpa constitui limite da pena);
46.ª A recorrente não tem antecedentes criminais, o que reforça a ideia de que esta não apresenta riscos de reincidência e que se encontra socialmente integrada;
47.ª Todas as circunstâncias analisadas mostram inequivocamente que, ainda que a versão factual constante da douta sentença recorrida correspondesse à verdade histórica dos factos, sempre se verificaria uma culpa diminuta da Recorrente e sempre seriam extremamente ténues as finalidades de punição;
48.ª Tendo optado pela aplicação de uma pena de multa á Recorrente, com limite mínimo de 10 dias e o máximo de 360 dias (n.º 1 do art.º 47.º do CP), o Tribunal “a quo” decidiu aplicar-lhe uma pena desproporcionalmente superior ao limite mínimo da moldura penal para o tipo criminal em causa, em manifesta contradição com as (parcas e conclusivas) referências que fez relativamente àquela;
49.ª Com tal condenação, o Tribunal «a quo» violou o disposto nos mencionados artigos, por incorrecta e imprecisa aplicação dos seus pressupostos;
50.ª Considerando os factos provados e não provados sobre as circunstâncias da prática do crime; as (escassas) considerações quanto ao grau de ilicitude do facto e seu modo de execução e gravidade, intensidade do dolo, sentimentos manifestados no seu cometimento e os fins ou motivos que o determinaram; o reduzido período de tempo em que a situação se manteve (12/2014 a 03/2015); a conduta anterior e posterior à prática dos factos, designadamente a inexistência de antecedentes criminais; a personalidade da Recorrente; a sua integração social; as suas condições pessoais, nomeadamente familiares; o tempo decorrido com perda de intensidade quanto às exigências da prevenção geral positiva, entende a Recorrente que o Tribunal «a quo» não desenvolveu grande esforço de concretização ou justificação das opções sancionatórias tomadas, sendo patente que a pena aplicada é manifestamente excessiva, porquanto o grau de culpa e as necessidades de punição impunham que a mesma não ultrapassasse os 90 dias de multa, correspondentes ao período em que a situação se manteve, à taxa de 6,5€/dia, tendo em conta a situação pessoal da mesma;
51.ª Deve a Douta Sentença recorrida ser revogada por douto Acórdão que proceda a nova determinação da pena a aplicar à Recorrente, aplicando-lhe, sem prejuízo daquela indicada supra, sanção mais próxima do limite mínimo da moldura penal aplicada;
52.ª Entendimento contrário comporta uma interpretação dos Arts.º 40, 70, 71, nºs 1 e 2 do CP.

Resposta do MP ao recurso interposto por B…
Conclusões
1. A energia eléctrica em causa foi furtada da rede pública e não estava a ser contabilizada, pelo que nunca seria incluída no contrato de fornecimento existente, causando, assim, um prejuízo à entidade distribuidora e não à comercializadora.
2. Não é verdade, como decorre dos depoimentos das próprias arguidas, que a única interessada no furto fosse a co-arguida C…, pois era a arguida B… quem muitas vezes pagava a factura da electricidade, uma vez que a primeira admitiu que muitas vezes não o conseguia fazer tendo em conta as “inexplicavelmente” elevadas contas.
3. O Tribunal pode formar a sua convicção através do método indiciário de prova e recorrendo às regras da experiência comum e foi o que aconteceu. A prova produzida em audiência de julgamento foi solidamente suficiente para convencer o Tribunal de que a arguida praticou os factos de que vinha acusada, tudo para além de uma dúvida razoável.
4. O Tribunal a quo explicou detalhadamente como formou a convicção de que a Recorrente foi co-autora dos factos em discussão (cfr. fls. 15 a 24 da sentença recorrida).
5. Na sentença recorrida, o Tribunal explicou, fundamentadamente, como concluiu pela adequação da medida da pena aplicada, expondo como, em que sentido e em que grau considerou a culpa, a ilicitude, as exigências de prevenção, a postura da arguida em julgamento, a ausência de antecedentes e o valor do furto.

Resposta do MP ao recurso interposto por C….
Conclusões:
1. Ao determinar a medida concreta da pena aplicada nos 300 dias de multa, o Tribunal considerou a culpa elevada da Arguida, o nível de desconformidade com o Direito que esta revelou, as elevadas exigências de prevenção deste tipo de crimes, nomeadamente de prevenção geral, as ainda mais elevadas exigências de prevenção especial (atendendo aos antecedentes criminais da arguida), a postura demonstrada em audiência de discussão e julgamento, mas também o valor diminuto do furto em si mesmo considerado.
2. Efectivamente, o valor do furto é o único factor de ponderação que deve ser considerado diminuto, pois todos os demais são elevados, devendo, sobretudo, atender-se a que a Recorrente já foi condenada diversas vezes por ilícitos contra o património, o que incrementa de forma manifesta as necessidades de prevenção especial, uma vez que as penas anteriores não se mostraram suficientes para que passasse a conformar o seu comportamento ao Direito, pelo que se considera a medida da pena aplicada perfeitamente adequada às concretas circunstâncias do caso.
3. Acresce que, atendendo ao rendimento do agregado familiar da arguida de 1.500,00EUR e à inexistência de encargos fixos (nomeadamente quanto à renda da casa), o Tribunal teve por justo e adequado fixar o montante diário em 8,00EUR.
4. E, ao contrário do que argumenta, o facto de a pena de multa a que foi condenada ser superior à da co-arguida B…, não resulta do valor do quantitativo diário (que é igual), mas da concreta medida da pena, atendendo às particulares necessidades de prevenção e do grau da culpa.
5. Tendo em conta que o montante mínimo de 5,00EUR apenas deverá ser aplicável às pessoas que vivam no mínimo existencial, ou abaixo dele, que o valor do salário mínimo nacional e que o agregado familiar da arguida aufere em média por mês 1.500,00EUR, de acordo com critérios de proporcionalidade e recorrendo a uma regra de três simples, verifica-se que a taxa diária aplicada de 8,00EUR é perfeitamente adequada.

Parecer.
Este documento equaciona o objecto de ambos os recursos.
Excesso de medida de pena de multa – no caso da arguida C…; e
Erro na apreciação da prova; ilegitimidade da D1… SA e pena excessiva – no caso da arguida B….
Nesta resposta corrobora-se com a decisão proferida pelo tribunal a quo, quanto à questão da legitimidade; matéria de facto e medida das penas.
Os recursos devem ser julgados improcedentes.

Cumpriu-se o artº 417, nº2 do CPP.

Colhidos os vistos legais foram os autos submetidos a conferência.
Nada obsta à apreciação do mérito.
Mantém-se a regularidade da instância.

A recorrente B… respondeu reiterando a posição assumida nas conclusões do seu recurso.

Fundamentação e Direito.
Estamos perante dois recursos: um da recorrente C… e outro da recorrente B….
A recorrente C… insurge-se apenas contra o excesso da medida da pena de multa. Por sua vez a recorrente B… questiona vários aspectos: ilegitimidade da D… SA, entidade que efectuou a participação criminal – exercício do direito de queixa; impugnação da matéria de facto, alegando que o tribunal partiu de elementos indiciários de prova que não lhe permitem retirar conclusões, neste sentido a recorrente desconsidera também as presunções estabelecidas, proibidas pelo direito processual penal e por último insurge-se contra a medida da pena que também considera excessiva e desajustada.
Vamos em primeiro lugar tratar do recurso da recorrente B… porque a questão da medida da pena de multa é comum aos dois recursos.
Recurso de B….
Legitimidade da queixosa e demandante civil:
A recorrente pugna pela extinção do procedimento criminal porque a empresa D… SA não tem legitimidade para o exercício do procedimento criminal, em bom rigor não é a entidade que deve deduzir a queixa-crime. A legitimidade para participar criminalmente e deduzir pedido cível é da D1... SA – sujeito contratual da relação jurídica de fornecimento que estabeleceu com a recorrente – contrato de fls 108 e ss.
Vejamos a matéria da ilegitimidade.
Sobre esta matéria consideramos que a primeira abordagem efectuada pelo tribunal, tratada como questão prévia, está correcta.
No que ao sistema eléctrico respeita poderemos distinguir a produção, o transporte, a distribuição e a comercialização de electricidade.
De acordo com o contrato de concessão, a “REN SA” é a única entidade de transporte de electricidade em Portugal Continental.
Já a D… SA, aqui queixosa e demandante, é a empresa que exerce a actividade de operador de rede de distribuição no território continental de Portugal, sendo titular da concessão para a exploração da Rede Nacional de Distribuição (RND) de Energia Eléctrica em Média Tensão (MT) e Alta Tensão (AT), e das concessões municipais de distribuição de energia eléctrica em Baixa Tensão (BT).
(…)
Efectivamente, com a liberalização do sector procedeu-se à separação da actividade de comercialização da actividade de distribuição, ou seja, o fornecimento de energia eléctrica foi juridicamente separado da actividade de distribuição.
O D.L. n.º 29/06, de 15.02 – que transpôs para a ordem jurídica nacional os princípios da Directiva nº 2003/54/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de Junho que estabeleceu regras comuns para o mercado interno da electricidade - criou as bases gerais da organização e funcionamento do sistema eléctrico nacional (SEN), bem como as bases gerais aplicáveis ao exercício das actividades de produção, transporte, distribuição e comercialização de electricidade e à organização dos mercados de electricidade (artº 1 do referido diploma).
O artº 3 do referido D.L. definiu a “Distribuição” como sendo “a veiculação de electricidade em redes de distribuição de alta, média e baixa tensões para entrega ao cliente, excluindo a comercialização”, sendo o “distribuidor” a “entidade titular de uma concessão de distribuição de electricidade”.
Nos termos do seu artº 4 “o exercício das actividades de produção e de comercialização de electricidade processa-se em regime de livre concorrência”, enquanto “o exercício das actividades de transporte e de distribuição de electricidade processa-se em regime de concessão de serviço público, em exclusivo, nos termos definidos em diploma específico”. Na sequência o artº 36 salienta que “o operador de rede de distribuição é independente, no plano jurídico, da organização e da tomada de decisões de outras actividades não relacionadas com a distribuição”.
No artº 43 sublinha-se que a “actividade de comercialização de electricidade é separada juridicamente das restantes actividades”, resultando do artº 42 que o «exercício da actividade de comercialização de electricidade consiste na compra e venda de electricidade para comercialização a clientes finais ou outros agentes».
Já o artº 48 dispõe que o “comercializador de último recurso é obrigado a fornecer electricidade aos clientes que lha requisitem e que preencham os requisitos legais definidos para o efeito”.
O mesmo acontece no D/L nº 172/2006, de 23/08, onde se distingue a «distribuição» - ou seja, “a transmissão de electricidade em redes de distribuição de alta, média e baixa tensão para entrega ao cliente, mas sem incluir a comercialização” sendo esta “a compra e venda de electricidade a clientes, incluindo a revenda”.
Isto posto, analisemos a questão dos autos.
Ora, face à matéria imputada às arguidas na acusação verifica-se que, de facto, havia um contrato de fornecimento de energia eléctrica, pela potência de 3,45 KWH, no apartamento sito na Rua …, nº …, em Espinho celebrado entre a arguida B… e a empresa “D1… S.A.”, contrato esse que estava em vigor desde 01.12.2014, sendo o alegado furto de energia ocorreu na vigência de tal contrato de fornecimento.
Aqui o tribunal a quo começa por dizer que a energia furtada, nada tem a ver com o referido contrato, tendo sido desviada da rede pública que é explorada e da inteira responsabilidade da D… SA.
Expressamente o tribunal a quo diz:
Dos factos imputados às arguidas na acusação resulta que o comercializador D1… SA não chegou a cobrar a tarifa e demais encargos associados à energia eléctrica furtada precisamente porque tal energia foi desviada – furtada – da rede pública, rede que é explorada e da responsabilidade da ora demandante D1… SA.
Dito de outro modo, a energia cujo furto é imputado às arguidas prende-se com a energia da rede e não a energia do contrato de fornecimento, pelo que é para quem titula/explora a rede eléctrica publica que tal furto causa prejuízo, ou seja, a ora queixosa e demandante D… SA, que a explora ao abrigo de uma concessão de direito público, pelo que inexistem dúvidas quanto a quem tem, in casu, legitimidade para a apresentação de queixa e consequente dedução do pedido de indemnização civil.
É bom tomar em atenção que o contrato de fornecimento é de 1/12/2014 e que, pela entrada em vigor do D/L nº 29/06 de 15/02, em cumprimento da referida directiva nº 2003/54/CE, foram estabelecidas regras comuns no mercado europeu, com reflexo no mercado interno, designadamente foram estabelecidas as regras gerais de funcionamento do sistema eléctrico nacional, com definição exacta da função “distribuição”entidade titular de uma concessão de distribuição de electricidade. Ou seja, a legitimidade não advém apenas do facto de a energia furtada passar pela rede de abastecimento da concessionária D… SA mas, sobretudo porque esta entidade é hoje, após a entrada em vigor daquele D/L, quem distribui a energia aos clientes nas modalidades de alta, media e baixa tensão. Se a recorrente bem precisar verá que o contrato de fornecimento celebrado naquela data, e exibido a fls 108, é bem diferente do actual, este último mais completo e preocupado com a posição de cliente. Este contrato está disponível na netcontrato de fornecimento de energia eléctrica em baixa e média tensão. Com este modelo, que substituiu o anterior, a entidade legitimada é a D… SA. A leitura dos equipamentos de medição, sua comunicação, verificação dos selos ou qualquer adulteração (controlo e alteração de potência) do sistema competem ao cliente, D… ou D2….
O cliente pode sempre chamar a D… alertando para eventuais anomalias. A D… SA, como operador de rede de distribuição, compete-lhe a entrega de energia eléctrica; instalação de contadores e leituras. Já a D2… compete-lhe a venda de electricidade com as tarifas fixadas pela ERSE, incluindo contratação, facturação e cobrança. O actual contrato é ainda mais preciso ao disciplinar os procedimentos fraudulentos – falsear o funcionamento normal ou leitura dos equipamentos de medição de energia eléctrica ou de controlo da potência constitui violação do contrato de fornecimento de energia eléctrica, nomeadamente a captação de energia a montante do equipamento de medição ou qualquer outra viciação. Presume-se que o procedimento fraudulento é imputável ao utilizador da instalação. A entidade lesada é a D… SA. O utilizador contratual é a recorrente B…, tendo cedido o apartamento, entre Outubro 2013 e 23/03/2015 à arguida C…, sem que tivesse operado qualquer cessão da posição contratual. A recorrente B… não transmitiu a terceiros a sua posição no contrato de fornecimento. A esta matéria – relação entre as recorrentes – voltaremos ao analisar a prova.
A legislação esparsa não deixa dúvidas, razão que levou a que os novos modelos contratuais coloquem a D… SA como contraente.
As referências à D… SA são abundantes:
Guia de Medição, Leitura e Disponibilização de Dados – aprovado pela ERSE (Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos), onde se pode ler: “a energia eléctrica associada a procedimento fraudulento comprovadamente identificada e registada em cada ano não deve ser imputada a carteiras de comercializadores”;
Ainda do mesmo guia “a verificação do procedimento fraudulento, e o apuramento do período temporal da potência e da energia que lhe possam estar associados, compete ao operador da rede cuja rede a instalação em fraude esteja ligada”;
D/L. nº 328/90 (artº 2 nº2) que confere à queixosa/demandante, enquanto operador de rede, legitimidade para intervir judicialmente;
Artigo 75.º nº 1, alínea h) do Regulamento das Relações Comerciais que atribui à D… SA a faculdade de proceder ao corte de fornecimento de energia eléctrica em caso de verificação da existência de procedimento fraudulento.
A D… SA no seu pedido cível apenas alegou o pagamento correspondente à tarifa do uso de rede – prejuízo objectivamente causado – e não o custo que importaria se a energia subtraída tivesse sido contabilizada, nos termos da normal comercialização.
Há ainda um terceiro aspecto que não pode ser olvidado.
O titular do direito de queixa é o ofendido, considerando-se como tal o titular dos interesses que a lei especialmente quis proteger com a incriminação (artº113, nº1 do CPP). Mesmo que dúvida houvesse, estaria dissipada pelo facto da entrada em vigor do D/L nº 29/06 de 15/02, em cumprimento da referida Directiva, que passou a fazer intervir como contraente activo a D… SA, não deixando esta interveniente de estar inserida no organograma da D… Extinguir o procedimento criminal por causa desta natureza seria levar longe demais o formalismo processual, desacreditando a justiça material.
Conclui-se que a energia é da rede e foi furtada; entretanto as bases gerais da organização e funcionamento do sistema eléctrico foram alteradas, passando a D… SA a ser a entidade titular da concessão para distribuir electricidade e, por último, que o direito de proceder criminalmente – direito de queixa – compete ao titular dos interesses que a lei quis proteger, nesta circunstância a D…, fundamento para estar mais do que legitimada.
Neste sentido improcede a excepção de ilegitimidade.

Impugnação da matéria de facto.
O erro de julgamento, deficiente análise e valoração da matéria de facto provada, está alegado em conformidade com o disposto no artº 412, nºs 3 e 4 do CPP. O ónus de especificação está correctamente estabelecido e compreende-se perfeitamente que o recorrente pretende afirmar que a prova indiciária dos autos não permite concluir que a recorrente é responsável pelo furto de electricidade. O tribunal na dúvida deveria absolver a recorrente, acabando por fazer um mau uso do princípio da livre apreciação da prova.
Vejamos a matéria de facto dada como provada.
1) A arguida H… celebrou em 01/12/2014 um contrato com a empresa D1… SA para fornecimento de energia eléctrica, pela potência de 3,45 KWH, no apartamento sito na Rua …, nº …, …, em Espinho.
2. Entre meados de Outubro de 2013 e, pelo menos, 23/03/2015, a arguida C… residiu naquele apartamento, que lhe foi cedido gratuitamente pela co-arguida B….
3.Em data concretamente não apurada, mas certamente entre 01/12/2014 e 23/03/2015, as arguidas, por si ou com a colaboração de terceira pessoa não identificada, em conjugação de esforços e intentos e na sequência de um plano previamente traçado, rompendo o selo da tampa superior do contador de electricidade (…) rompendo também o selo do dispositivo controlador de potência, regularam a potência de 3,45KWH para 10,35KWH, e, desta forma, adulteraram o equipamento de medição de consumo de energia … obtendo energia eléctrica para exclusivo consumo nesta residência em quantidade superior…
Como é que se provaram estes factos no tribunal a quo ?
Facto do ponto 1) resultou provado por força do documento (contrato de fornecimento) junto a fls 108 e ss.
O facto do ponto 2) pelas declarações de ambas as arguidas que admitiram as circunstâncias em que estava a ser utilizado o apartamento.
Facto nº 3) foi declarado provado – danos no contador e equipamento de medição de energia – por força do auto de vistoria de fls 13; fotografias de fls 14/18 e ainda o depoimento das testemunhas N… e J… – electricistas de profissão. Em fiscalização ao prédio foram detectadas as anomalias constantes do auto de vistoria no apartamento propriedade da B….
Como imputar a responsabilidade de tais factos às arguidas/recorrentes, uma vez que negaram a sua prática?
A arguida B… é a titular do contrato de fornecimento. O apartamento estava na disponibilidade da recorrente B… que só o havia emprestado temporariamente à arguida C… - por um curto período de tempo. Ambas negaram que tivessem furtado energia, ou seja disseram que não procederam à alteração do contador. O benefício desta alteração serve os interesses da arguida recorrente B… como titular do contrato de fornecimento, na sua posição de beneficiária. A arguida B… teve, durante o julgamento, a possibilidade de convencer o tribunal da sua não participação no processo fraudulento, remetendo a responsabilidade para a arguida comodatária, ou qualquer outro terceiro que tivesse participado na adulteração, sendo certo que este só actuaria a benefício dos utentes do imóvel, rectius arguidas.
O contrato actual – o modelo de contrato actualmente fornecido pela D… SA – não deixa dúvidas, presume-se que qualquer procedimento fraudulento é imputável ao utilizador da instalação, utilizador como beneficiário do contrato de fornecimento.
Para inverter esta presunção (no sentido literal do termo) é necessário demonstrar que terceiros tiveram acesso livre ao equipamento, certamente para daí retirarem algum benefício. Nada disto ficou provado. O que se prova é que o contrato de fornecimento está em nome da arguida B… e que esta não imputou responsabilidades a outrem que pudesse beneficiar da viciação. Falar de “palpites” ou de que “só pode ser assim” é depreciativo, pois o recurso aos elementos de prova existentes permite-nos chegar a uma conclusão: na ausência de demonstração do benefício a favor de terceiro(s), eventualmente da arguida C…, o benefício só pode reverter para a arguida B…, contraente do instrumento de fornecimento de energia. Como bem diz a sentença há um conjunto de elementos de prova no processo – contrato; auto de vistoria e depoimento das testemunhas electricistas – que funciona como prova plural de indícios, provocando um raciocínio dedutivo que leva à motivação da sentença, com apreciação crítica e devidamente fundamentada.
Indício é um facto certo que está em relação íntima com outro facto a que o tribunal chega por meio de uma conclusão natural ou inferência, mesmo que se trate de uma prova critica, circunstancial ou indirectaLa Prueba en Processo Penal – Rúben A. Chaia, 2ª Edição/Hammurabi – fls 890 e ss - Argentina - dizemos nós, não proibida pelo CPP. Não há motivo para que uma prova desta natureza não possa ser valorada no seu conjunto e com o restante material de prova carreado para os autos. Partimos de um conjunto de elementos de prova para uma conclusão lógica. Por outro lado as presunções, como observações ou conhecimentos reiterados, transmitidos de geração em geração, constitutivas de uma experiência colectiva ou universal, permitem – noutros ramos de direito - que, por seu intermédio, se possa considerar um facto certo ou provável porém, o artº 32 nº 2 da CRP parece afastá-las como meio de prova no domínio penal – as presunções de culpa estão banidas do processo penal, ao invés da presunção de inocência …
Certo é que indícios - prova indiciária - não é o mesmo que presunções de culpa.
Em conclusão não restam dúvidas que o procedimento fraudulento, para subtrair energia, foi desencadeado pela arguida B….
Não obstante parece-nos de prova muito difícil concluir que a arguida C… é co-autora deste processo fraudulento. Melhor, os elementos de facto de que dispomos não nos permitem afirmar que sabia da adulteração do contador, aliás a proprietária nunca lhe imputou essa responsabilidade. O período durante o qual a arguida beneficia do imóvel é muito limitado: cerca de 5 meses. O contrato de fornecimento não estava no seu nome. Quem pagava o consumo viciado era a arguida B…. Com estes elementos não podemos partir para uma conclusão de co-autoria, mesmo que se realize com níveis diferentes de intervenção. Afirmar que a arguida C…, por si ou com a colaboração de terceira pessoa não identificada, em conjugação de esforços e intentos e na sequência de um plano previamente traçado, rompendo o selo da tampa superior do contador de electricidade … obteve energia eléctrica ilicitamente para exclusivo consumo da residência onde habitava, constitui um juízo dedutivo demasiado temerário, pois temos dúvidas que soubesse do processo fraudulento. Aliás o tribunal refere claramente que não sabe quem o fez … mas depois considera que foram ambas as arguidas.
Há algumas imprecisões na motivação que não são decisivas para a condenação da arguida B…: a fls 680, no decurso da motivação diz-se todos os antecedentes da arguida B… … que se traduzem em fraudes … e, ainda, na mesma folha fala-se de tais elementos de prova – documental e testemunhal – mas, no elenco dessa prova vai-se para além dos factos provados, nomeadamente fala-se em mais do que um contrato de fornecimento de energia e interregno desse fornecimento … Esta última argumentação não pode afectar a arguidas, e muito menos a arguida C…, porque não provada.
O tribunal com esta prova indiciária, por força dos elementos concretos disponíveis, só pode chegar dedutivamente à conclusão que a autora do crime foi a arguida B…, beneficiária contratual directa do fornecimento de energia e não a arguida C…, porque a mesma matéria de prova não permite dedução idêntica.
Os factos com os artigos 3), 4), 5) e 6) têm que ser corrigidos, figurando um único interveniente: a arguida B….
Improcede a matéria de facto alegada pela recorrente B… mas, dela reflexamente beneficia a arguida B… por via do alegado tratamento da co-autoria – o recurso interposto de uma sentença abrange toda a decisão (artº 402 do CPP). Embora a recorrente B… não proceda à impugnação da matéria de facto, dela beneficia por ter sido alegada pela recorrente B…, uma vez que a condenação do tribunal a quo trata o caso no exercício da conjugação de esforços e plano previamente traçado entre ambas.
Improcede a impugnação da matéria de facto alegada em benefício da recorrente B….

Do excesso da medida da pena de multa
O tribunal condenou a arguida B… pela prática, em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de furto simples, p. e p. pelo artigo 203 do C.P, na pena de 200 (duzentos) dias de multa à taxa diária de €8,00 (oito euros), num total de €1.600,00 (mil e seiscentos euros).
A arguida B… não tem antecedentes criminais levando necessariamente o tribunal a dar prevalência à pena de multa.
Neste sentido opta-se por lhe aplicar pena de multa pela prática do crime em causa.
A medida concreta da pena será determinada em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, atendendo-se a todas as circunstâncias elencadas pelo artigo 71, nºs 1 e 2, do Código Penal, que depuserem a favor e contra o agente.
Quanto à arguida B…, há que sopesar, a culpa, personalidade e as exigências de prevenção especial. A arguida dificultou a descoberta da verdade quando tinha ao seu dispor a liberdade de não prestar declarações. Por outro lado está familiarmente inserida e não tem antecedentes criminais.
O valor do furto é pouco expressivo.
O crime de furto simples é punido com pena de prisão até 3 três anos ou pena de multa (artº 203, nº 1 do CP). A pena de multa é fixada em dias, tendo como limite mínimo 10 dias e como limite máximo 360 dias. Cada dia de multa corresponde a uma quantia que varia entre 5/500,00€. O valor da multa deverá atender à situação económico financeira e encargos pessoais (47, nº2 do CP). O número de dias de multa ultrapassa largamente metade da moldura da pena abstracta. A arguida não tem antecedentes criminais. O valor do furto de energia é de 206,12€.
Recorrendo a critérios de razoabilidade e às regras da experiência comum, bem como sopesando a situação económico-financeira da arguida, a qual tem rendimentos que rondam os €1.200,00 mensais brutos e tem um encargo fixo de €260,00 por mês, tem-se por justa e adequada a fixação do montante diário em €8,00 (oito euros).
Assim, ponderados todos estes elementos entendemos justo e adequado fixar a pena de 100 dias de multa.
Procede o recurso quanto à moldura da pena (modificação).
A condenação da arguida B…, por via desta alteração, passa a ser a seguinte: condenar a arguida B… pela prática, em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de furto simples, p. e p. pelo artigo 203 do C.P, na pena de 100 (cem) dias de multa à taxa diária de €8,00 (oito euros), num total de €800,00 (oitocentos euros).

Recurso da arguida C….
Por força da análise da intervenção das arguidas em co-autoria, face à impugnação da matéria de facto apresentada no recurso da recorrente B…, cfr. a nossa posição, acima exposta, entende este tribunal superior que, oficiosamente, deve absolver a arguida C…, por não se ter provado a sua intervenção na prática do crime.
A equacionada questão da excessiva moldura da pena de multa está prejudicada.
Procede o recurso pelas razões invocadas.

Em conclusão, os factos dados como provados com os nºs 3 a 6, devem ler-se com a correcção de que a participação no crime se deveu exclusivamente à intervenção da arguida/recorrente B…. A modificabilidade da decisão recorrida resulta do disposto no artº 431 alªs a) e b) do CPP.
O dipositivo passa a ter a seguinte redacção:
a) Condenar a arguida B…, pela prática, em co-autoria material e na forma consumada de um crime de furto simples, p. e p. pelo artigo 203 do C.P, na pena de 100 (cem) dias de multa à taxa diária de €8,00 (oito euros), num total de €800,00 (oitocentos euros);
b) Absolver a arguida C…, pela prática, em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de furto simples, p. e p. pelo artigo 203 do CP.
c) Julgar parcialmente procedente, por provado, o pedido de indemnização civil formulado pela demandante D…, SA contra a demandada B… e, em consequência, condena-la a pagar àquela, a quantia total de €206,12 (duzentos e seis euros e doze cêntimos) acrescida de juros legais a contar desde a citação e até efectivo e integral pagamento.
d) Absolver a arguida C… do pedido de indemnização cível deduzido pela D… SA.

Assim e nestes termos acordam os juízes que integram esta 4ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto.
a) Em dar provimento parcial ao recurso interposto pela arguida B…, alterando a moldura concreta da pena de multa nos termos supra referidos. A restante matéria não obtém provimento, confirmando-se nessa parte a decisão recorrida.
b) Dar provimento ao recurso interposto pela arguida C…, com a consequente absolvição.
c) Sem custas.

Registe e notifique.

Porto, 24 de Janeiro de 2018.
Horácio Correia Pinto
Moreira Ramos