Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | JERÓNIMO FREITAS | ||
Descritores: | ARTICULADO SUPERVENIENTE CUMULAÇÃO SUCESSIVA DE PEDIDOS E DE CAUSAS DE PEDIR DIREITO AO CONTRADITÓRIO | ||
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Nº do Documento: | RP20230605173/21.9T8OAZ-B.P1 | ||
Data do Acordão: | 06/05/2023 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | RECURSO PROCEDENTE; ANULADA A DECISÃO | ||
Indicações Eventuais: | 4ª SECÇÃO (SOCIAL) | ||
Área Temática: | . | ||
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Sumário: | I - Decorre expressa e inequivocamente do n.º4, do art.º 28.º do CPT, que apresentado articulado para os fins admitidos no artigo, “o réu é notificado para contestar tanto a matéria do aditamento como a sua admissibilidade”, sendo evidente, o juiz só poderá pronunciar-se quanto à admissibilidade do articulado após a parte ter contestado ou decorrido o prazo legal, incluindo a possibilidade de prática do acto para além dele com multa (art.º 139.º/5 do CPC), sem que o tenha feito. II - A apresentação de articulados supervenientes “nos termos do artigo 588.º do Código de Processo Civil ou para os efeitos do artigo 28.º do presente Código”, respeitam a realidades distintas e visam fins diferentes. O art.º 28.º do CPT consagra um regime especial de admissibilidade de cumulação sucessiva de pedidos e de causas de pedir, ou seja, não previsto no processo civil comum. Por seu turno, o art.º 588.º do CPC, rege sobre a admissibilidade de dedução em articulado superveniente de “factos constitutivos, modificativos ou extintivos do direito que forem supervenientes” [n.º1]. III - No caso é manifesto que as AA apresentaram articulado superveniente com pedido de cumulação sucessiva de pedidos e de causas de pedir, estribando-se no artigo 28.º, n.º1 e 3 do Código de Processo do Trabalho. IV - Ao admitir expressamente o articulado superveniente, o Senhor juiz considerou necessariamente que o mesmo foi tempestivamente apresentado e, também, que o seu conteúdo era admissível. V - Significa isto, que ao proferir aquela decisão, sem que tenha decorrido o prazo do n.º4, do art.º 28.º do CPT, o Tribunal a quo violou o direito ao exercício do contraditório (art.º 3.º/3, do CPC), dado que vedou à Ré a possibilidade contestar não só a matéria do mesmo, como também a sua admissibilidade, negando-lhe o direito expressamente estabelecido naquela norma. | ||
Reclamações: | |||
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Decisão Texto Integral: | Tribunal da Relação do Porto APELAÇÃO n.º 173/21.9T8OAZ–B.P1 SECÇÃO SOCIAL ACORDAM NA SECÇÃO SOCIAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO I.RELATÓRIO I.1 Na presente acção especial emergente de acidente de trabalho, que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro, Juízo do Trabalho de Oliveira de Azeméis, em que AA, viúva, e BB, estudante, nascida em .../.../2007, com o patrocínio oficioso do Ministério Público, demandam A... - COMPANHIA DE SEGUROS, SA, e B..., LDA, em 09-09-2022, por estas foi apresentado articulado superveniente, invocando o disposto no artigo 28.º, n.º1 e 3 e 60.º, n.º3 do Código de Processo do Trabalho, com pedido de cumulação sucessiva de pedidos e de causas de pedir. O conteúdo do articulado em causa é o seguinte: -«1.º Tal como alegado na petição inicial apresentada nestes autos, no dia 08-01-2021, cerca das 10:35 horas, em Vale de Cambra, CC foi vítima de acidente, 2.º O qual consistiu em, quando desenvolvia trabalhos no interior de uma obra, sita no gaveto da Rua ... com a Rua ..., em ..., Vale de Cambra, ao nível do piso térreo, a parte superior da parede exterior/nascente da obra derrocou para o interior atingindo-o, o que lhe causou lesões traumáticas crânio-meningo-encefálicas e torácicas, 3.º As quais, direta e necessariamente, lhe provocaram a morte que veio a ocorrer no dia 09-01-2021, no Centro Hospitalar .... 4.º O sinistrado CC trabalhava então, como pedreiro, sob as ordens, direção e fiscalização de B... Lda, R. empregadora, 5.º Como referido na petição inicial, aquando da tentativa de conciliação a R. seguradora declarou que entendia que o acidente resultava da violação de regras de segurança e saúde no trabalho, existindo assim atuação culposa da entidade empregadora, de acordo com o art.º 18, n.º 1 da Lei 98/2009 de 4 de setembro. 6º Em consequência, mas apenas na sua contestação, veio a ré seguradora dar a conhecer os factos que sustentavam esta conclusão obtidos através das diligências de averiguação e investigação do sinistro que realizou e que integram violação de regras de segurança por parte do empregador. 7.º Apenas nesse momento e, já após a apresentação da petição inicial, como decorre dos autos, tomaram as AA/ beneficiárias conhecimento dos seguintes factos: 8.º A parede acima aludida em 2.º compreendia cerca de 90% da sua porção acima da cota do piso do andar elevado, tendo, ao colapsar, e porque o interior e cobertura do edifício em que ocorria a obra tinham sido inteiramente demolidos e retirados, rodado ao longo da linha de separação dos dois pisos, coincidente com o alinhamento dos pontos de encastramento do vigamento do soalho que havia sido removido, projectando-se sobre o interior da edificação onde se encontrava o sinistrado. 9.º A parede em causa (alçado) comportava um muro por gravidade (pedra mole justaposta e argamassada por barro. 10.º Os vãos das janelas eram ladeados (ombreiras/padieiras e soleiras) por cantaria de granito, exceto o alçado colapsado. 11.º No momento em que ocorreu o acidente acima descrito, o único ponto de ancoragem situava-se no travamento dos alçados Este/Oeste, existindo pontos de vazamento das paredes dos alçados por ausência de pedra. 12.º Existia apenas outro ponto de amarração de uma verguinha de 8 mm numa trave de madeira que, após o acidente, ficou caída no local. 13.º De facto, não existia projeto de escoramento dos alçados ou de contenção provisória das fachadas, tendo a empregadora afirmado que tinha garantida a estabilidade dos mesmos do seguinte modo: - com “verguinhas de 8 mm suportadas por peças de madeira colocadas pelo exterior dos vãos da janela do piso 2 (próximas das padieiras), impediam a rotação das paredes mais compridas para o exterior”; - “escoras de 4 m, reforçadas na sua extensão para 8 m, por ferros de 20 com 1,0 , de comprimento, soldados ao corpo das escoras, garantiam o travamento interior das mesmas paredes. 14.º Porém, não era isso que sucedia, nomeadamente: - a extensão total das escoras perfazia 6,88m e não 8 metros; - os pilares não encastravam toda a sua secção nas paredes preexistentes; - o número de barrotes de ancoragem das verguinhas que serviam de tirantes não correspondia à totalidade dos vãos das janelas possíveis de usar na sustentação das paredes. 15.º Acresce que, as escoras utilizadas no escoramento não tinham os vergalhões de 20 e 16 mm colocados no seu interior soldados e as escoras apoiavam entre si através das patelas de apoio ao piso. 16.º Para além disso, o modelo adotado “contenção interior” não foi o adequado face à tipologia das paredes e seu distanciamento não, dado que não teve em conta: - A geometria do edifício; - O sistema da fundação; - O estado de conservação dos vários elementos que compõem o edifício; - Os materiais que compõem o edifício; - As cargas actantes de caminhos de carga. 17.º Nem foi o mesmo complementado com testes e ensaios que permitissem fornecer dados sobre: - O nível de degradação do edifício; - As características dos materiais; - A capacidade de carga e estado de tensão. 18.º Não ocorreu qualquer intervenção sobre a condição das paredes, nomeadamente com a aplicação de argamassas de consolidação de superfícies com vazios/sem material desintegrados de reduzida coesão e resistência, vazios esses que efetivamente ali existiam. 19.º Não foi feita distribuição dos esforços por áreas mais alargadas das paredes, como exigia o estado das mesmas, mas apenas de forma pontual. 20.º Não foi efetuado o reforço dos vãos das janelas e portas, o que era exigível face à presença de diferentes materiais com massas diferenciadas. 21.º Não foi previsto qualquer sistema de monotorização do comportamento das paredes e que pudesse dar indicações no decurso da obra de movimentações indesejáveis e de risco. 22.º A estrutura de suporte não deve apoiar diretamente nos elementos que contem, como sucedia, não utilizando o apoio da estrutura numa malha linear ou outro mecanismo de distribuição de cargas (perfis IPE ou meios fios madeira), o que era aconselhável. 23.º Na ligação destes mecanismos aos elementos retidos, optou-se pela solução de ligação direta pontual, quando se aconselhava ligação contínua ou semi-contínua. 24.º Optaram, no que concerne à solução de travamento interior das paredes para resistir ao impulso gerado pela tração das mesmas por via da tensão nas verguinhas e influência do peso próprio dos materiais de contenção, por usar vão de 6,88 m de escoras de escoramento preparadas para escoramento individualizado e não interligadas em quatro pontos. 25.º Seria aconselhável a construção de uma coluna treliçada de tubo com secção de 60x60 e nas superfícies de contacto com as paredes colocados estrados de tábuas para distribuição das cargas por uma superfície mais alargada, e não simplesmente a descarregar nas ombreiras dos vãos da janela, como sucedia. 26.º Estes factos, isto é, em suma: - a ausência de projeto de contenção das fachadas elaborada por engenheiro; - a ausência de preparação atempada das paredes aumentando-se a coesão dos materiais empobrecidos, colmatando vazios e uniformizando a resistência das mesmas; - solução de contenção inadequada na conceção e dimensão; - Interferência na estabilidade da parede conferida pela estrutura resistente em construção; - montagem do sistema de monotorização podia ter denunciado a necessidade de correção da contenção, evitando o sucedido; foram causa da ocorrência do acidente acima mencionado. 27.º Acresce que, apesar de a Ré entidade patronal ter na sua ficha de procedimentos de segurança “Escoramento de paredes”, verificou-se que não foram cumpridas todas as medidas de segurança previstas: O ponto 1 “Caracterização” da FSS 04.09 identifica a necessidade de escoramento com a “colocação de estruturas de carácter provisório (suporte horizontais/diagonais, prumos), mas não foi efetuado qualquer escoramento com suporte diagonal. 28.º Os factos acima descritos são agora aqui alegados por cautela de patrocínio, dado que os mesmos constam já do objeto deste processo tal como fixado no despacho saneador proferido nestes autos, por terem sido alegados pela ré/seguradora, constando da sua contestação e integrando o tema de prova 2. Para além do agora exposto, 29.º apenas após a junção aos autos, na sequência do despacho proferido após audiência de partes no dia 02.02.2022, da perícia realizada no processo crime, as AA. tomaram conhecimento dos seguintes factos que reforçam os anteriores sendo parcialmente coincidentes: 30.º A obra teve início a 12.03.2020, os trabalhos de demolição iniciaram-se a 25.11.2020 e a 17.12.2020 foi definida a alteração ao projeto de estabilidade à supressão de uma viga de fundação (VF1) que seria compensada pelo aumento de sapatas e pilares. 31.º No exterior da estrutura do edifício existia um andaime ao longo de todo o comprimento da parede que sofreu a derrocada, com amarrações ligeiras do andaime à parede no alinhamento da derrocada, amarrações estas que seriam apenas para o travamento e estabilização do andaime e não para o suporte lateral da parede. 32.º No local existia grua que servia o edifício. 33.º Encontrava-se em curso cofragem de vigas. 34.º Não existiam quaisquer escoras horizontais de travamento lateral das paredes das fachadas nascente e poente. 35.º Não existia no nível do rés-do-chão quaisquer tirantes a ligar as duas paredes das fachadas. 36.º Apenas existia um tirante constituído por varão de aço com 8 mm de diâmetro ao nível do primeiro piso, instalado à cota da padeira da janela central das fachadas nascente e poente. Como acima referido, 37.º as quatro paredes de fachada ao nível do primeiro piso encontravam-se descalçadas em cerca de um terço a metade da sua espessura. 38.º Esta redução de espessura das paredes na base do piso elevado, altera o comportamento estruturas das mesmas, o que associado a um escoramento transversal deficiente ou à falta do mesmo, colocou em causa a integridade estrutural das paredes de fachada e potenciou o seu derrube para o interior. 39.º Aquando do momento do acidente o balde/tina preso à grua terá embatido no tirante acima identificado contribuindo para a queda da parede para o interior, dado que aquele tirante visava realizar o travamento das paredes nascente e poente contra o derrube para o exterior. 40.º Como já referido em 13.º, não existia projeto específico de escoramento das paredes da fachada. 41.º Em demolições integrais do interior do edifício, dada a fragilidade dos elementos que se pretende preservar, deve-se prever proteção contra o colapso descontrolado. 42.º Para garantir a integridade dos elementos a preservar, neste caso, as paredes de fachada e diminuir ou eliminar o risco de colapso, a medida adequada é o travamento horizontal das paredes que visa impedir ou minimizar os deslocamentos horizontais da parede para fora do seu plano. 43.º Em suma, para travar as paredes contra deslocamento para o exterior devem ser instalados tirantes, para travar as paredes contra deslocamentos para o interior devem ser introduzidos escoramentos verticais e horizontais suficientemente resistentes e adequadamente ligados às paredes para resistirem tanto a compressões como a trações, o que aqui não sucedia. 44.º A parede caiu devido às circunstâncias acima mencionadas, não só as mencionadas em 26.º, como as que resultam deste relatório pericial, concretamente: - a ausência de escoramento horizontal; - a vulnerabilidade das paredes decorrente do descalce existente na base do interior das paredes da fachada ao nível do primeiro piso; - a existência de uma força externa atuante no topo das paredes e dirigida para o interior e que consistia no supra referido tirante; tudo isto gerando, após o embate do balde contra o tirante, um impulso sobre o paramento superior da parede nascente e que determinou o seu colapso para o interior da obra. 45.º Ao agir deste modo violou o artigo 281.º, n.º2 e 3 do Código do Trabalho e o disposto nos artigos 14.º, n.º 2, al. c) e d), artigo 20.º, al. a) c) e d), artigo 22.º, n.º 1, al. m) do Decreto-Lei 273/2003, de 29 de Outubro, o artigo 22.º, n.º 1, al. c) e d) do referido Decreto-Lei em conjugação com o artigo 2.º da Portaria n.º 101/96 de 3 de abril e o artigo 15.º, n.º 1 e 3 do Decreto-lei n.º 273/2003, de 29 de Outubro. 45.ºTudo isto são comportamentos e omissões imputáveis à entidade patronal que tinha a seu cargo a execução da obra e o especial dever de assegurar aos trabalhadores condições de segurança no trabalho, condutas que Ré/entidade patronal devia ter adotado de modo a impedir o perigo de desmoronamento das fachadas em contenção, do que era capaz e não fez. 45.º Ao não agir deste modo, a Ré/entidade patronal colocou o seu trabalhador CC em exposição a esse perigo de desmoronamento, perigo esse que se veio a concretizar, assim violando o mais básico dever que sobre si impendia de assegurar condições de segurança no trabalho. 46.º Esta violação de regras de segurança por parte da entidade patronal que decorre do exposto nos artigos que antecedem foi causa única, exclusiva e adequada do acidente acima descrito e, consequentemente, da morte do sinistrado CC, pelo que deve, nos termos do disposto no artigo 18.º, n.º1 da Lei n.º 98/2009 de 04.09, existir agravamento da responsabilidade acidentária. 47.º Todos estes factos, embora contemporâneos do acidente, apenas foram trazidos ao conhecimento das AA. nos momentos acima mencionados quando apresentados nestes autos, após a apresentação da petição inicial, motivo pelo qual não foram os mesmos incluídos nessa peça processual. Do direito: 48.º O artigo 28.º, n.º1 do Código de Processo do Trabalho estabelece que “é permitido ao autor aditar novos pedidos e causas de pedir, nos termos dos números seguintes”, prevendo o n.º2 aditamento à petição inicial até à audiência final no caso de factos de ocorrência superveniente e esclarecendo o seu n.º3 que “o autor pode ainda deduzir contra o réu novos pedidos, nos termos do número anterior, embora esses pedidos se reportem a factos ocorridos antes da propositura da ação, desde que justifique a sua não inclusão na petição inicial”. 49.º Em anotação a esta norma, leia-se em “Código de Processo do Trabalho Anotado e Comentado – os processos laborais na prática judiciária”, José Joaquim F. Oliveira Martins, Almedina, Setembro de 2020, página 56 e 57: “O n.º3 refere-se a uma realidade distinta do número anterior (e que podemos chamar de superveniência subjetiva), em que os factos ocorreram já antes do início da ação, mas não foram alegados (por o autor, por exemplo, não os conhecer, no que será o caso mais normal), podendo ser alterada e ampliada a causa de pedir e os pedidos desde que o autor “justifique a sua não inclusão na petição inicial” (sempre com a ressalva, atenta a remissão para o número anterior, relativa à exigência da mesma forma processual)”. 50.º Por sua vez, o artigo 60.º, n.º3 do Código de Processo do Trabalho esclarece que são admitidos articulados supervenientes nos termos do disposto no artigo 588.º do Código de Processo Civil (que admite a alegação de factos supervenientes, quer os ocorridos posteriormente ao termo dos prazos como os factos anteriores de que a parte só tenha conhecimento depois de findarem esses prazos, constitutivos do seu direito) e para os efeitos do artigo 28.º do Código de Processo do Trabalho. 51.º Os factos acima descritos têm inegável relevância para o objeto deste processo por estarem relacionados com o acidente que aqui se discute que causou a morte do sinistrado CC e demonstrarem que existiu, por parte da entidade empregadora, violação de regras de segurança o que conduziu àquela morte, ocorre quanto aos mesmos superveniência subjetiva e encontram-se as AA. em tempo para a sua apresentação neste articulado, tal como permitido pelas normas legais acima citadas. 52.º O artigo 18.º, n.º1 da Lei n.º 98/2009 de 04.09 prevê que “quando o acidente tiver sido provocado pelo empregador, seu representante ou entidade por aquele contratada e por empresa utilizadora de mão-de-obra, ou resultar de falta de observação, por aqueles, das regras sobre segurança e saúde no trabalho, a responsabilidade individual ou solidária pela indemnização abrange a totalidade dos prejuízos, patrimoniais e não patrimoniais, sofridos pelo trabalhador e seus familiares, nos termos gerais”. 53.º Nessas situações, nos termos do n.º4 e 5 dessa norma, “no caso previsto no presente artigo, e sem prejuízo do ressarcimento dos prejuízos patrimoniais e dos prejuízos não patrimoniais, bem como das demais prestações devidas por atuação não culposa, é devida uma pensão anual ou indemnização diária, destinada a reparar a redução na capacidade de trabalho ou de ganho ou a morte, fixada segundo as regras seguintes: a) Nos casos de incapacidade permanente absoluta para todo e qualquer trabalho, ou incapacidade temporária absoluta, e de morte, igual à retribuição; b) Nos casos de incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual, compreendida entre 70 % e 100 % da retribuição, conforme a maior ou menor capacidade funcional residual para o exercício de outra profissão compatível; c) Nos casos de incapacidade parcial, permanente ou temporária, tendo por base a redução da capacidade resultante do acidente. 5 - No caso de morte, a pensão prevista no número anterior é repartida pelos beneficiários do sinistrado, de acordo com as proporções previstas nos artigos 59.º a 61.º” 54.º Quanto ao pedido: o pedido corresponde em suma, ao efeito jurídico que o autor pretende retirar da ação proposta. 55.º Na petição inicial proposta nestes autos, as AA., desconhecendo os concretos factos acima mencionados, pediram a condenação das rés no seguinte: I - A pagar à primeira A: a) - uma pensão anual e vitalícia no montante de € 3.281,44 até perfazer idade de reforma por velhice e de € 4.375,25, a partir daquela idade ou da verificação de deficiência ou doença crónica que afete sensivelmente a sua capacidade para o trabalho, pensão essa atualizável, devida a partir de 10-01-2021, correspondente, respetivamente, a 30,00% e a 40,00% da retribuição anual ilíquida de € 10.938,12; b) – a quantia de € 25,00, relativa às supracitadas despesas de transporte; II – A pagar à segunda A: a) - uma pensão anual no montante de € 2.187,62, até perfazer 18 anos e, após esta idade, até aos 22 ou 25 anos, enquanto frequentar, respetivamente, o ensino secundário e o ensino superior ou cursos aos mesmos equiparados ou, sem limite de idade, quando afetada de doença física ou mental que o incapacite sensivelmente para o trabalho, pensão essa atualizável, devida a partir de 10-01-2021, correspondente a 20,00% da retribuição anual ilíquida de € 10.938,12; III – A pagar às AA: - A dividir em partes iguais, a quantia de € 5.792,29, respeitante a subsídio por morte, correspondente a 12 vezes o valor de 1,1 IAS à data da morte; IV - Juros de mora já vencidos e os vincendos, à taxa legal de 4%, contados a partir do vencimento das obrigações e até efetivo e integral pagamento, computando-se a quantia global de € 278,55, à data da propositura da presente ação”. 56.º Tendo em conta a afirmação da Ré Seguradora em tentativa de conciliação, deduziu-se ainda o seguinte pedido subsidiário: a condenação da Ré empregadora no pagamento às AA de: - Uma pensão anual e vitalícia no montante de € 10.938,12, correspondente à retribuição anual ilíquida de € 10.938,12, repartido pelas AA.; a) - A quantia de € 25,00, referente às mencionadas despesas de transporte; b) - A quantia de € 5.792,29, repartido pelas AA, respeitante a subsídio por morte, correspondente a 12 vezes o valor de 1,1 IAS à data da morte, c) - A quantia de € 65.000,00 pela perda de vida do sinistrado; d) - A quantia de € 70.000,00 pelos danos não patrimoniais sofridos pela primeira e segunda autoras (€ 35.000,00 cada). e) - Juros de mora já vencidos e os vincendos, à taxa legal de 4%, contados a partir do vencimento das obrigações e até efetivo e integral pagamento. 57.º Ora, perante o acima exposto no presente articulado, perante os factos novos dados a conhecer, devem tais pedidos ser alterados, não na sua substância, mas na sua relação de subsidiariedade, o que se requer Nestes termos e nos demais de direito aplicável, requer-se a V.Ex.ª: A. se digne admitir o presente articulado superveniente, nos termos preceituados nos artigos 28.º, n.º1 e 3 e 60.º, n.º3 do Código de Processo do Trabalho; B. permita o aditamento à petição inicial apresentada dos factos acima descritos, passando os mesmos a integrar o objeto e os temas de prova destes autos, acrescendo aos demais já constantes do despacho saneador oportunamente proferido; C. permita a alteração da relação entre os pedidos formulados nos autos do seguinte modo: a condenação da Ré empregadora no pagamento às AA de: - Uma pensão anual e vitalícia no montante de € 10.938,12, correspondente à retribuição anual ilíquida de € 10.938,12, repartido pelas AA.; a) - A quantia de € 25,00, referente às mencionadas despesas de transporte; b) - A quantia de € 5.792,29, repartido pelas AA, respeitante a subsídio por morte, correspondente a 12 vezes o valor de 1,1 IAS à data da morte, c) - A quantia de € 65.000,00 pela perda de vida do sinistrado; d) - A quantia de € 70.000,00 pelos danos não patrimoniais sofridos pela primeira e segunda autoras (€ 35.000,00 cada). e) - Juros de mora já vencidos e os vincendos, à taxa legal de 4%, contados a partir do vencimento das obrigações e até efetivo e integral pagamento. e, subsidiariamente, para a hipótese de não de demonstrar que o acidente se ficou a dever a violação das regras de segurança da parte da R. empregadora então, pede-se, em consequência que as R.R., na medida das responsabilidades de cada uma, sejam condenadas: I - A pagar à primeira A: a) - uma pensão anual e vitalícia no montante de € 3.281,44 até perfazer idade de reforma por velhice e de € 4.375,25, a partir daquela idade ou da verificação de deficiência ou doença crónica que afete sensivelmente a sua capacidade para o trabalho, pensão essa atualizável, devida a partir de 10-01-2021, correspondente, respetivamente, a 30,00% e a 40,00% da retribuição anual ilíquida de € 10.938,12; b) – a quantia de € 25,00, relativa às supracitadas despesas de transporte; II – A pagar à segunda A: a) - uma pensão anual no montante de € 2.187,62, até perfazer 18 anos e, após esta idade, até aos 22 ou 25 anos, enquanto frequentar, respetivamente, o ensino secundário e o ensino superior ou cursos aos mesmos equiparados ou, sem limite de idade, quando afetada de doença física ou mental que o incapacite sensivelmente para o trabalho, pensão essa atualizável, devida a partir de 10-01-13 2021, correspondente a 20,00% da retribuição anual ilíquida de € 10.938,12; III – A pagar às AA: - A dividir em partes iguais, a quantia de € 5.792,29, respeitante a subsídio por morte, correspondente a 12 vezes o valor de 1,1 IAS à data da morte; IV - Juros de mora já vencidos e os vincendos, à taxa legal de 4%, contados a partir do vencimento das obrigações e até efetivo e integral pagamento, computando-se a quantia global de € 278,55, à data da propositura da presente ação. Para tanto, requer-se a V. Exa se digne mandar notificar as RR para contestarem, querendo, nos termos disposto no artigo 28.º, n.º4 do Código de Processo do Trabalho. [..]». I.2 Subsequentemente, em 27-092022, o tribunal a quo proferiu o despacho seguinte: -«Pelo menos em relação a parte dos factos alegados no requerimento do MP apresentado em 0.09.2022, não se pode afastar a superveniência subjetiva, pelo que se admite o articulado superveniente e se determina, nos termos do artigo 588.º, n.º 4, do CPC, a notificação da Ré empregadora para, 10 dias, se pronunciar». I.3 Inconformado com esta decisão a Ré B..., LDA, apresentou recurso de apelação, o qual foi admitido com o modo de subida e efeito adequados. As alegações foram sintetizadas nas conclusões seguintes: I. A 09-09-2022, o "MINISTÉRIO PÚBLICO", em representação e patrocínio das beneficiárias AA e BB, juntou aos autos um articulado superveniente (acto com referência "CITIUS" n.º 13441594) onde, além do mais, peticionou o aditamento à petição inicial dos factos alegados no articulado superveniente (pedido B.) do articulado superveniente), alterou os pedidos anteriormente formulados e a respectiva ordem de apreciação (pedido C. do articulado superveniente) e requereu que o articulado em questão fosse admitido (pedido A. do articulado superveniente). II. A recorrente foi notificada do articulado superveniente no dia 15-09-2022 (acto com referência "CITIUS" n.º 123421495) e, posteriormente, do despacho datado de 20-09-2022 (com referência "CITIUS" n.º 123465408) e notificado à recorrente a 21-09-2022, ordenou o Tribunal a quo que os autos aguardassem o contraditório quanto a tal articulado superveniente. III. Sempre teria a recorrente, nesta senda, e pelo menos, até ao dia 04-10-2022 para exercer o direito ao contraditório (prazo esse contado nos termos das disposições conjugadas dos arts. 149.°, 139.", n.º 5, al. c), 221.º e 255.º todos do CPC ex vi art. 1.º, n.º 2, al. a) do CPT), no entanto, logo a, logo a 27-09- 2022 proferiu o Douto Tribunal o despacho ora recorrido (acto com referência "CITIUS" n.º 123592181) e que admitiu o articulado superveniente do "MINISTÉRIO PÚBLICO". IV. Tal despacho foi proferido sem que a recorrente tenha exercido o elementar direito ao contraditório (previsto no art. 3.º, n.º 3 do CPC ex vi art.º, n.º 2, al a) do CPT) e sendo que, na data em que tal despacho foi proferido, aquela ainda se encontrava perfeitamente em tempo de exercer o aludido direito. V. Impõe-se uma nota para dizer que esta posição do Tribunal a quo é tão mais grave na medida em que, não só configura o cercear á recorrente de um direito absolutamente elementar e que o Tribunal a quo até tinha inicialmente reconhecido (por meio do despacho datado de 20-09-2022, com referência "CITIUS" n.º 123465408)... VI. Sem prejuízo da nulidade que tal acarreta em termos processual, importa referir que, além de tal formalidade, sempre a decisão recorrida se encontra inquinada no plano material, olhando à manifesta intempestividade de que padece o articulado superveniente de 09-09-2022, razão pela qual, ao contrário do decidido, sempre se impunha que o Tribunal a quo não o tivesse admitido por meio da decisão recorrida. VII. Dispõe o art. 28.º, n.º 3 do CPT que as alterações ao pedido por parte do autor baseadas em factos anteriores à propositura da petição inicial devem ser feitas "nos termos do número anterior", ou “até à audiência final”. VIII. Tendo a audiência final nos presentes autos iniciado-se já no passado dia 26-05-2022 - conforme deflui do teor da própria acta (acto de 26-05-2022 com referência "CITIUS" n.º 122007753) - e tendo o articulado superveniente sido apresentado, apenas, a 09-09-2022, é o articulado em causa intempestivo e, portanto, inadmissível legalmente. IX. Sem prejuízo, caso se queira chamar à colação o regime previsto no art. 588.º do CPC ex vi art. 60.º do CPT - disposição legal em que, aparentemente, o Tribunal a quo se tenta abrigar - a intempestividade é, neste caso, ainda mais cristalina, uma vez que, dos arts. 6.º e 7.º do articulado superveniente, deflui à saciedade que as beneficiárias, alegadamente, tiveram conhecimento dos factos em que sustentam o articulado superveniente após a contestação da R. "A..." (junta aos autos a 04-10-2022 com referência "CITIUS" n.º 12030234). XI. Sem que em caso algum se conceda que, efectivamente, apenas na dita sede as beneficiárias tiveram conhecimento de tal suposta circunstância - alegação que será devidamente desfeita em sede própria - certo é que, ainda assim, tal articulado teria de ser junto, então, "Na audiência prévia, quando os factos hajam ocorrido ou sido conhecidos até ao respetivo encerramento" (art. 588.º, n.º 3, al. a) do CPC), sendo este o limite temporal que o legislador impõe para a prática do acto pelo que, tendo a audiência prévia ocorrido no passado dia 02-02-2022 (cfr. acta da audiência prévia de 02-02-2022 com referência "CITIUS" n.º 120066910) e apenas 09-09-2022 foi junto aos autos o articulado superveniente, dúvidas não subsistem quanto à intempestividade do dito articulado. XII. Caso não se entenda pela intempestividade do articulado superveniente, ainda assim não poderia o mesmo ser admitido atenta a falta de pressupostos para o efeito, desde logo porque as beneficiárias limitam-se a alegar que "após a apresentação da petição inicial tomaram conhecimento dos factos" que, alegadamente, servem de base à apresentação do articulado superveniente (cfr. Art. 7.º do articulado em causa) - alegação essa meramente conclusiva - e que incumpre os ónus que sobre as mesmas impendiam de alegarem em que concretamente consistiu tal superveniência e, posterior e cumulativamente, provarem tal alegação (tudo conforme ensina a doutrina e jurisprudência citada em sede própria). XIII. Não há nos presentes autos - e, concretamente, no articulado superveniente - qualquer alegação relativamente às concretas razões que impediram as beneficiárias de conhecer anteriormente os supostos factos em que basearam o seu requerimento probatório, a que se soma a evidência de, no tocante à prova dessa superveniência, não ter sido, sequer, formulado qualquer requerimento probatório para efeitos dessa temática. XIV. Na verdade, é falso que exista a superveniência que as beneficiárias alegam pois que, se só agora requereram, alegaram e peticionaram o que consta do articulado superveniente, só às mesmas é imputável. XV. As beneficiárias encontram-se representadas em juízo pelo "MINISTÉRIO PÚBLICO", entidade devidamente preparada para enquadrar os factos, aplicar-lhes o Direito e com o poder e valências necessárias para determinar a realização de quaisquer diligências probatórias preliminares para poder instruir devidamente a petição inicial, peto que se entendia que deveria ter instruído ou preparado melhor a petição inicial, tal não merece colhimento. XVI. Além disso, aquando da instauração da acção, já o "MINISTÉRIO PÚBLICO" era perfeitamente conhecedor que a R. "A..." tinha alegado que o acidente se deveu a um quimérico incumprimento das regras de construção e/ou segurança - cfr. art. 34.º da petição inicial (junta aos autos a 22-08-2021 com referência “CITIUS" n.º 11868077) - e, bem assim, olhando à posição das partes expressa no auto de não conciliação (acto de 14-07-2021, com referência "CITIUS" n.º 11868077). XVII. Portanto, é inexistente qualquer superveniência do conhecimento dos factos alegados no articulado superveniente na medida em que, o que ali se alegou, era já era do conhecimento das beneficiárias, pelo menos, desta a tentativa de conciliação ocorrida a 14-07-2021, o que torna, portanto, inadmissível o articulado cm causa. XVII. Portanto, é inexistente qualquer superveniência do conhecimento dos factos alegados no articulado superveniente na medida em que, o que ali se alegou, era já era do conhecimento das beneficiárias, pelo menos, desta a tentativa de conciliação ocorrida a 14-07-2021, o que torna, portanto, inadmissível o articulado cm causa. XVIII. Ademais, caso o "MINISTÉRIO PÚBLICO" quisesse logo verter o que ora verteu para os autos e peticionar o que agora pretende peticionar por meio do articulado superveniente, tinha todas as condições para o efeito, na medida em que a petição inicial deu entrada a 22-08-2021, data em que, constava dos presentes autos o relatório que a "ACT" elaborou e que, embora sem fundamento, entendeu existir culpa da aqui R. na produção do acidente (cfr. acto de 15-02-2021 com referência "CITIUS" n.º 11147211) e tinha, igualmente, acesso ao relatório pericial elaborado pela "FACULDADE DE ENGENHARIA DA UNIVERSIDADE DO PORTO" o qual foi junto a 27-02-2021 ao Proc. N.º 4/21.0T9VLC, cujo acompanhamento electrónico tinha sido deferido pelo acto de 12-02-2021 com referência "CITIUS" n.º 116144752. XX. Ainda que se tivesse por aplicável, a R. opôs-se a qualquer alteração ou ampliação ao pedido e à causa de pedir nos termos do art. 264.º do CPC, fazendo-o por meio do requerimento de 29-09-2022 (com referência 'CITIUS" n.º 13532245), Pelo que, igualmente por aqui, sempre seria legalmente inadmissível o articulado superveniente. XXI. Não obstante o Tribunal a quo, por meio de despacho datado de 20-09-2022, ter expressamente reconhecido o direito ao contraditório da recorrente relativamente ao articulado superveniente e desta ter, no mínimo até ao dia 04-10-2022 para exercer o tal direito, logo a 27-09-2022 proferiu o Douto Tribunal o despacho ora recorrido (acto com referência "CITIUS" n.º 123592181), ou seja, quando a recorrente se encontra, ainda, em prazo para o exercício do direito ao contraditório. XXII. Tendo a decisão recorrida sido tomada sem respeito pelo elementar direito ao contraditório da recorrente, verifica-se a sua nulidade e a nulidade de todos os actos posteriormente praticados, na medida em que, atento o alegado, verifica-se uma omissão de acto e formalidade que a lei prescreve [art. 3.°, n.º 3 e 195.º, n.º 1 do CPC ex vi art.1.º, n.º 2, al. a) do CPT), nulidade essa que desde já se deixa invocada. XXIII. A decisão ora recorrida não se encontra fundamentada, dado que não faz uma análise entrecruzada, global e crítica dos elementos de prova que o Tribunal a quo teve em conta para a sua decisão, violando o disposto no art. 154.º,607.º, 615.º, 674.º, n.º 1, c), 663.º, n.º 2 e 666.º do CPC e arts. 205.º, n.º 1, art. 20.º e 2.º da CRP, pelo que, deverá a nulidade ora arguida ser julgada procedente, por provada, olhando às disposições legais referidas, com todas devidas e legais consequências. XXIV. O Tribunal a quo limita-se a dizer que "não se pode afastar a superveniência subjectiva" (sic) sendo que tal constitui mero apontamento de teor estritamente conclusivo, não tendo deixado expresso quais os factos que considera provados e não provados relativamente à suposta superveniência de conhecimento dos "factos" que as beneficiárias utilizam como fundamento para o articulado superveniente e, adicionalmente, elucidar as partes dos concretos motivos que levaram a dar tal matéria, respectivamente, como provada ou não provada sendo certo que não existe qualquer prova disso mesmo ou sequer o Tribunal a quo ordenou a sua produção. XXV. Também não observou o Tribunal a quo o dever de fundamentação num plano jurídico, dado que limita-se a ordenar que a recorrente se pronuncie sobre a decisão recorrida à luz do disposto no art. 588.º, n.º 4 do CPC Contudo, nada diz quanto às normas, diplomas, princípios de direito em que estribou o dispositivo. XXVI. Foram violadas, entre outras disposições e princípios legais, o disposto nos arts. 2.º, 20.º e 205.º, n.º 1 todos da CRP, arts. 3.º, n.º 3, 149.º,139º, n.º 5, 154.º, 195.º, n.º 1, 221.º, 255.º, 264.º, 607.º, n.º 4, 663.º, n.º 2 todos do CPC aplicáveis por remissão do art. 1.º n.º 2, al, a) do CPT, arts. 28.º, n.°s 2 e 3, do CPT, art. 588.º do CPC ex vi art. 60.º do CPT, princípio da equiparação dos despachos às sentenças e princípio do contraditório, os quais deverão ser interpretados no sentido e alcance que se deixou alegado, dado que tais interpretações partem, justamente, da melhor doutrina e jurisprudência tiradas sobre tais matérias (conforme as respectivas referências feitas em sede própria). Conclui pugnando pela procedência do recurso, em consequência sendo revogada a decisão recorrida e substituída por outra que julgue inadmissível o articulado superveniente apresentado e ordenado o seu desentranhamento. Subsidiariamente, pede que seja julgada a arguida nulidade da decisão recorrida, por falta de fundamentação e obscuridade. I.4 As AA, com o patrocínio do Ministério Público, apresentaram contra-alegações que sintetizaram nas conclusões seguintes: 1. O artigo 60.º, n.º3 do Código de Processo do Trabalho regula as situações em que, no processo do trabalho, é admissível articulado superveniente: nos termos do artigo 588.º do Código de Processo Civil ou do artigo 28.º do Código do Trabalho. 2. Nos termos do artigo 588.º, n.º 4 do Código de Processo Civil ex vi artigo 1.º, n.º2, alínea a) do Código de Processo do Trabalho, após a apresentação do articulado, o juiz profere despacho liminar sobre a admissão do articulado superveniente, rejeitando-o quando, por culpa da parte, for apresentado fora de tempo, ou quando for manifesto que os factos não interessam à boa decisão da causa; ou ordenando a notificação da parte contrária para responder em 10 dias. 3. O princípio do contraditório não é cerceado pois quanto àqueles factos e à admissibilidade da sua alegação pode e deve sempre a parte se pronunciar na resposta para a qual foi notificada. 4. Neste sentido, entre outros o Acórdão da Relação de Lisboa de 08.02.2022, relatado pelo Desembargador José Capacete, disponível em www.dgsi.pt" a resposta a um articulado superveniente apenas deve ter lugar apôs a prolação, pelo juiz, do despacho que, admitindo liminarmente aquele articulado, ordena a notificação da parte contrária para, querendo, lhe responder (n.º 4 do art. 588.º). Ê que, sendo obrigatório o despacho liminar previsto no n.º 4 do art. 588.º, pode até dar-se o caso de não haver lugar a qualquer resposta, como necessariamente sucederá nos casos em que aquele despacho é de imediata rejeição do articulado superveniente. 5. O despacho liminar de admissão de articulado superveniente limita-se a averiguar se o articulado superveniente: foi apresentado fora de tempo ou se é manifesta a sua inviabilidade, no sentido de serem os factos impertinentes, isto é, por os factos não interessarem à decisão da causa. 6. Concluindo em sentido negativo, admite-o liminarmente determinando a notificação das demais partes que relativamente a ele tenham direito ao exercício do contraditório, para, sob a cominação aplicável aos restantes articulados, responderem no prazo de dez dias. 7. É depois na resposta que "podem ser alegados todos os meios de defesa cabíveis contra o novo articulado, incluindo a alegação de que ele deveria ter sido objeto de rejeição liminar por qualquer um dos fundamentos referidos no 1.º caso” acórdão da Relação de Lisboa de 08.02.2022 acima citado. 8. Trata-se por isso de um mero despacho de expediente, nos termos definidos no artigo 152.º, n.º4 do Código de Processo Civil, que se destina a prover ao andamento regular do processo, não resultando dele uma decisão que caiba ser fundamentada pois não é esse despacho que incide sobre qualquer pedido controvertido, nos termos exigidos pelo artigo 154.º do Código de Processo Civil que consagra o dever de fundamentar as decisões. 9. De todo o modo, o dever de fundamentação não exige que todas as decisões do tribunal cumpram as exigências de uma sentença ou decisão interlocutória, nomeadamente discriminando factos provados e não provados, enunciando fundamentos e provas da decisão em matéria de facto, nem os motivos do sentido da decisão. 10. O artigo 28.º, n.º1 do Código de Processo do Trabalho estabelece que "é permitido ao autor aditar novos pedidos e causas de pedir, nos termos dos números seguintes", prevendo o n.º2 aditamento à petição inicial até à audiência final no caso de factos de ocorrência superveniente e esclarecendo o seu n.º3 que “o autor pode ainda deduzir contra o réu novos pedidos, nos termos do número anterior, embora esses pedidos se reportem a factos ocorridos antes da propositura da ação, desde que justifique a sua não inclusão na petição inicial”. 11. Nosso entender sucede neste caso pois a audiência final apenas se inicia com a produção de prova. 12. Nos presentes autos a audiência ainda não se iniciou, antes foi adiada, como consta expressamente da ata e decorre do artigo 604.º do Código de Processo Civil - a audiência final só se inicia não havendo razões de adiamento, como foi o caso. Tanto assim será que se a audiência destes autos se tivesse iniciado teria sido interrompida e não adiada como foi. 13. Mas ainda que assim não se entendesse, não é a totalidade dos factos que chegaram ao conhecimento das beneficiárias na contestação. Efetivamente, como consta do articulado superveniente, os factos descritos em 1.º a 27.º apenas foram alegados naquela peça, por cautela de patrocínio e enquadramento dos restantes, dado que os mesmos constam já do objeto deste processo tal como fixado no despacho saneador proferido nestes autos, por terem sido alegados pela ré/seguradora, constando da sua contestação e integrando o tema de prova 2. 14. E, quanto aos factos descritos em 29.º a 47.º como também se refere no articulado superveniente, tais factos, embora contemporâneos do acidente, apenas foram trazidos ao conhecimento das AA. a 04.02.2022 após a realização da audiência prévia (02.02.2022), quando oficiosamente foi ordenada a junção aos autos de relatório pericial, pelo que quanto a estes está preenchida a previsão do artigo 588°, n.º3, alíneas a) e c) do Código de Processo Civil. 15. Assim, se considerarmos como relevante para definição do momento limite para apresentação do articulado superveniente o previsto neste artigo 588.º, n.º1, alínea c), verifica-se que é apenas exigido que quanto aos factos conhecidos após a audiência prévia (como é o caso), o articulado seja apresentado na audiência final, ou seja, para efeitos desta norma, pode o articulado superveniente ser mesmo apresentado no decurso da audiência até antes do seu encerramento, como sucede nesta situação. 16. Os factos alegados pelas beneficiárias no articulado superveniente têm inegável relevância para o objeto deste processo por estarem relacionados com o acidente que aqui se discute que causou a morte do sinistrado CC e pretenderem demonstrar que existiu, por parte da entidade empregadora, violação de regras de segurança o que conduziu àquela morte, tanto existe essa relevância que a violação das regras de segurança constitui precisamente um dos temas de prova fixados no despacho saneador. 17. Ou seja, estamos perante um articulado apresentado em tempo (antes da realização da audiência final), que apresenta factos que interessam à boa decisão da causa, pelo que estão preenchidos os pressupostos formais de admissibilidade do articulado superveniente, nos termos do artigo 588.º, n.º4 do Código de Processo Civil ex vi artigo 60.º, n.º3 do Código de Processo do Trabalho. 18. Para além disso, entendemos estarem também preenchidos os pressupostos previstos no artigo 28.º do Código de Processo do Trabalho que permite a apresentação de novos pedidos e causas de pedir em caso de superveniência subjetiva. 19. As beneficiárias apenas tomaram conhecimento dos factos descritos em 1.º a 27.º aquando da contestação da Ré Seguradora, não tendo como deles tomar conhecimento em momento anterior. Efetivamente, esses factos constam de relatório pericial interno da seguradora a que as beneficiárias não tinham acesso, relatório esse que nunca lhes tinha sido dado conhecimento, dado que se trata de documento interno daquela parte e que não tinha sido junto aos autos em momento anterior. 20. O mesmo sucede quanto aos factos descritos em 29.º a 47.º, pois tais factos apenas foram apenas trazidos ao conhecimento das AA. a 04.02.2022 após a realização da audiência prévia (02.02.2022), quando oficiosamente foi ordenada a junção aos autos de relatório pericial cuja realização foi determinada em inquérito criminal. 21. Na petição inicial, em função daquilo que genérica e conclusivamente foi alegado pela seguradora na tentativa de conciliação, foi deduzido pedido subsidiário para a eventualidade de se concluir existir - como a seguradora sempre afirmou e como constitui o tema de prova 2 destes autos - violação de regras de segurança pela entidade patronal. Tal tema de prova já está nos autos, o que se alega no articulado superveniente são factos que se reconduzem a este tema de prova, que são manifestamente relevantes para o mesmo e que apenas foram conhecidos com a junção daqueles documentos, nomeada e concretamente: as alterações ao projeto de estabilidade com supressão de uma viga, o modo de cofragem, de escoramento, a existência ou não de tirantes a ligar as paredes das fachadas, as características desses tirantes e sua localização, o estado das paredes após a demolição, etc. 22. No nosso entender, perante o acima exposto, encontra-se demonstrado que o conhecimento dos factos alegados no articulado superveniente ocorreu após a apresentação da petição inicial, tanto que essa superveniência decorre do próprio processo e da circunstância de aqueles factos resultarem de perícias, uma ordenada pela Seguradora e de cujo relatório era a única detentora e a outra por se tratar de perícia determinada em inquérito criminal e de cuja existência apenas as beneficiárias tomaram conhecimento quando junta aos autos após indagação judicial. I.5 O Digno Procurador Geral Adjunto junto desta Relação não emitiu parecer nos termos do art.º 87.º 3, do CPT, por a tal obstar o facto das autoras serem patrocinadas pelo Ministério Público. I.6 Foi dado cumprimento ao disposto no art.º 657.º n.º2, CPC e determinou-se que o processo fosse inscrito para ser submetido a julgamento em conferência. I.7 Delimitação do objecto do recurso Sendo o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das alegações apresentadas, salvo questões do conhecimento oficioso [artigo 87.º do Código do Processo do Trabalho e artigos 639.º, 635.º n.º 4 e 608.º n.º2, do CPC, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho] as questões colocadas, organizadas em termos de precedência lógica, são as seguintes: i) Violação do direito do contraditório (art.º 3.º 3, do CPC) [conclusões I a V e XXI e XXII]; ii) Nulidade da decisão por falta de fundamentação [conclusões XXIII a XXV]; iii) Erro na aplicação do direito, em razão do Tribunal a quo ter admitido o articulado superveniente sendo a sua apresentação intempestiva [conclusões VI a XV]; e, por inexistência de superveniência [conclusões XVI a XX]. II. FUNDAMENTAÇÃO II.1. MOTIVAÇÃO DE FACTO Como interesse para apreciação do recurso releva a matéria mencionada no relatório, bem assim os factos que se passam a fixar: 1 – Na petição inicial consta, para além do mais, o seguinte: -«[..] 34.º Para a hipótese da absolvição da R. seguradora, por se entender que o acidente se ficou a dever a violação das regras de segurança por parte da R. empregadora, então têm as A.A. direito a haver desta, a título subsidiário, em consonância com o preceituado no artº 18º, nos 1 e 4, als. c) da LAT, as seguintes prestações: - Uma pensão anual e vitalícia no montante de € 10.938,12, correspondente à retribuição anual ilíquida de € 10.938,12, repartido pelas AA, nos termos dos artigos 59º a 61ºda LAT; - A quantia de € 25,00, referente às mencionadas despesas de transporte; - A quantia de € 5.792,29, repartido pelas AA., respeitante a subsídio por morte, correspondente a 12 vezes o valor de 1,1 IAS à data da morte. […] Nestes termos e nos demais de direito aplicável, deve a presente ação ser julgada provada e procedente e, em consequência, serem as R.R., na medida das responsabilidades de cada uma, condenadas: [..] Subsidiariamente, para a hipótese de, como sustenta a R. seguradora se entender que o acidente se ficou a dever a violação das regras de segurança da parte da R. empregadora então, deverá esta ser condenada a pagar às AA. - Uma pensão anual e vitalícia no montante de € 10.938,12, correspondente à retribuição anual ilíquida de € 10.938,12, repartido pelas AA.; a) - A quantia de € 25,00, referente às mencionadas despesas de transporte; b) - A quantia de € 5.792,29, repartido pelas AA, respeitante a subsídio por morte, correspondente a 12 vezes o valor de 1,1 IAS à data da morte, c) - A quantia de € 65.000,00 pela perda de vida do sinistrado; d) - A quantia de € 70.000,00 pelos danos não patrimoniais sofridos pela primeira e segunda autoras (€ 35.000,00 cada). e) - Juros de mora já vencidos e os vincendos, à taxa legal de 4%, contados a partir do vencimento das obrigações e até efetivo e integral pagamento. [..]». 2 - Em 2 de Fevereiro de 2033, foi realizada audiência prévia, constando da respectiva acta, no que aqui releva, o seguinte: «[..] III – Objeto: A violação das regras de segurança e suas consequências indemnizatórias. IV – Matéria de Facto: Factos assentes: [..] H. Na tentativa de conciliação, realizada a 14-07-2021, a 1ª autora reclamou para si das rés, na medida da responsabilidade de cada uma pensão anual e vitalícia no montante de € 3.281,44, até perfazer idade de reforma por velhice e de € 4.375,25 a partir daquela idade ou da verificação de deficiência ou doença crónica que afete sensivelmente a sua capacidade para o trabalho, pensão essa atualizável, devida a partir de 10-01-2021, correspondente, respetivamente, a 30,00% e a 40,00% da retribuição anual ilíquida de € 10.938,12 e a quantia de € 25,00, relativa às supracitadas despesas de transporte. Reclamou ainda das rés, para a sua filha menor, na medida da responsabilidade de cada uma: - Uma pensão anual no montante de € 2.187,62, até perfazer 18 anos e, após esta idade, até aos 22 ou 25 anos, enquanto frequentar, respetivamente, o ensino secundário e o ensino superior ou cursos aos mesmos equiparados ou, sem limite de idade, quando afetada de doença física ou mental que o incapacite sensivelmente para o trabalho, pensão essa atualizável, devida a partir de 10-01-2021, correspondente a 20,00% da retribuição anual ilíquida de € 10.938,12. Mais reclamou o pagamento, para si e para a sua filha menor, a dividir em partes iguais, a quantia de € 5.792,29, respeitante a subsídio por morte, correspondente a 12 vezes o valor de 1,1 IAS à data da morte. Reclamou também os juros de mora respeitantes a todas as sobreditas prestações, à taxa legal (4,00%), contados a partir do seu vencimento e até efetivo e integral pagamento. Por sua vez, a ré seguradora aceitou a existência do acidente e a sua caracterização como de trabalho, o nexo de causalidade entre o mesmo e a morte do sinistrado, a categoria profissional, a retribuição deste e a transferência da responsabilidade infortunística, nos termos da apólice de seguro, em função da retribuição anual ilíquida de € 10.938,12 e aceitou, por conseguinte, pagar à autora uma pensão anual e vitalícia no montante de € 3.281,44, até perfazer idade de reforma por velhice e de € 4.375,25, a partir daquela idade ou da verificação de deficiência ou doença crónica que afete sensivelmente a sua capacidade para o trabalho, pensão essa atualizável, devida a partir de 10-01-2021, correspondente, respetivamente, a 30,00% e a 40,00% da retribuição anual ilíquida de € 10.938,12 e a quantia de € 25,00, respeitante a despesas de transporte. Aceitou, de igual modo, pagar à segunda autora, filha menor do sinistrado, uma pensão anual no montante de € 2.187,62, até perfazer 18 anos e, após esta idade, até aos 22 ou 25 anos, enquanto frequentar, respetivamente, o ensino secundário e o ensino superior ou cursos aos mesmos equiparados ou, sem limite de idade, quando afetada de doença física ou mental que o incapacite sensivelmente para o trabalho, pensão essa atualizável, devida a partir de 10-01-2021, correspondente a 20,00% da retribuição anual ilíquida de € 10.938,12. Mais aceitou pagar a ambas, em partes iguais, a quantia de € 5.792,29, respeitante a subsídio por morte, correspondente a 12 vezes o valor de 1,1 IAS à data da morte, bem como os juros de mora respeitantes a todas as sobreditas prestações, nos termos reclamados. Contudo e, apesar de ser a entidade responsável, a ré seguradora declarou que iria solicitar o reembolso à entidade empregadora e ao dono da obra, por entender que o acidente resulta da violação de regras de segurança e saúde no trabalho, existindo assim atuação culposa da entidade empregadora, de acordo com o art.º 18, n.º 1 da Lei 98/2009 de 4 de setembro e que a seguradora não prescinde do direito de regresso junto da mesma, nos termos do art.º 79º, n.º 3 do mencionado diploma. Por sua vez, a ré empregadora aceitou a existência do acidente e a sua caracterização como de trabalho, o nexo de causalidade entre o mesmo e a morte do sinistrado, a categoria profissional, a retribuição deste e a transferência da responsabilidade infortunística, nos termos da apólice de seguro, em função da retribuição anual ilíquida de anual de € 10.938,11. Declinou, porém, assumir qualquer responsabilidade pelo acidente, nada aceitando pagar às autoras a título de pensão ou qualquer outro título, por ser de entendimento que não houve violação ou incumprimento das regras de segurança e saúde no trabalho, e por entender que tem toda a responsabilidade transferida para a companhia de seguros. [..] Temas de prova: [..] 2. A violação de regras de segurança: O acidente ocorreu numa obra de reabilitação integral de um edifício destinado a habitação, cujo interior e cobertura foram demolidos, permanecendo as paredes envolventes, a conservar? A parede colapsada, compreendia cerca de 90% da sua porção acima da cota do piso do andar elevado? Rodou ao longo da linha de separação dos dois pisos, coincidente com o alinhamento dos pontos de encastramento do vigamento do soalho que havia sido removido? Projectou-se sobre o interior da edificação? A parede em causa (alçado) comportava um muro por gravidade (pedra mole justaposta e argamassa por barro)? Os vãos de janelas são ladeados (ombreiras/padieiras e soleiras) por cantaria de granito, excepto o alçado colapsado? Durante a primeira visita ao local do acidente foi identificado: um único ponto de ancoragem no travamento dos alçados Este/Oeste; uma trave de madeira caída no terreno, que constituía outro ponto de amarração da verguinha de 8 mm; pontos de vazamento das paredes dos alçados por ausência de pedra? A ré empregadora não promoveu a realização de projecto de escoramento dos alçados, tendo sido descrito de forma sumária de que forma foi garantida a estabilidade dos mesmos: “verguinhas de 8 mm suportadas por peças de madeira colocadas pelo exterior dos vãos da janela do piso 2 (próximas das padieiras), impediam a rotação das paredes mais compridas para o exterior”; “escoras de 4 m, reforçadas na sua extensão para 8 m, por ferros de 20 com 1,0, de comprimento, soldados ao corpo das escoras, garantiam o travamento interior das mesmas paredes”? Os vergalhões de 20 e 16 mm colocados no interior das escoras não estavam soldados e as escoras apoiavam entre si através das patelas de apoio ao piso? Uma inspecção inicial teria de ter em conta: A geometria do edifício; O sistema da fundação; O estado de conservação dos vários elementos que compõem o edifício; Os materiais que compõem o edifício; As cargas actantes de caminhos de carga? A referida inspecção complementada com uma série de testes e de ensaios permitiriam fornecer dados sobre: O nível de degradação do edifício; As características dos materiais; A capacidade de carga e estado de tensão? Esta caracterização resultante de inspecção inicial permite tomar algumas decisões, tais como: A técnica da construção; A estrutura de suporte da fachada mais adequada; O tipo de demolição mais adequado; O faseamento construtivo? Não foram identificadas intervenções sobre a condição das paredes com a aplicação de argamassas de consolidação de superfícies com vazios/sem material desintegrados de reduzida coesão e resistência? Não se procedeu ao alargamento das superfícies de parede na entrega aos apoios de contenção, nem à distribuição dos esforços por áreas mais alargadas das paredes e não de forma pontual como verificada? Não se verificou o reforço dos vãos das janelas e portas, solução exigível face à presença de diferentes materiais com massas diferenciadas? Não foi previsto qualquer sistema de monotorização do comportamento das paredes e que pudesse dar indicações no decurso da obra de movimentações e de risco? A estrutura de suporte apoiava directamente nos elementos que contem (como verificado), não se procendo ao apoio da estrutura numa malha linear ou outro mecanismo de distribuição de cargas (perfis IPE ou meios fios madeira)? Na ligação destes mecanismos aos elementos retidos, optou-se pela solução de ligação directa pontual e não de ligação contínua ou semi-contínua? A solução de travamento interior das paredes para resistir ao impulso gerado pela tracção das mesmas por via da tensão nas verguinhas e influência do peso próprio dos materiais de contenção? Optaram por usar vão de 6,88 m de escoras de escoramento preparadas para escoramento individualizado e não interligadas em quatro pontos? Não se procedeu à construção de uma coluna treliçada de tubo com secção de 60x60 e nas superfícies de contacto com as paredes colocados estrados de tábuas para distribuição das cargas? Estes pontos de tracção não distribuiam a carga por uma superfície mais alargada, descarregando nas ombreiras dos vãos da janela? O acidente ocorreu pelos seguintes fatores: Ausência de preparação atempada das paredes aumentando-se a coesão dos materiais empobrecidos, colmatando vazios e uniformizando a resistência das mesmas; Solução de contenção inadequada na concepção e dimensão; Interferência na estabilidade da parede conferida pela estrutura resistente em construção; A montagem do sistema de monotorização podia ter denunciado a necessidade de correcção da contenção? O PSS1 de obra ignora a permanência diária dos trabalhadores no interior da obra em exposição ao perigo iminente de desmoronamento da(s) fachadas em contenção? O Plano de Segurança e Saúde (PSS) elenca um conjunto de riscos e medidas preventivas que podem ser observadas em qualquer tipo de obra, não atendendo às particulares especificidades da obra em curso onde ocorreu o acidente? A ficha de procedimentos de segurança “Escoramento de paredes” – FSS 04.09 não prevê de forma detalhada as medidas de segurança a adoptar? No PSS é feita referência à necessidade de: “efectuar estudo de conservação, características de solidez e estabilidade das estruturas que permita a intervenção sem o seu desmoronamento e em condições de segurança”, o referido estudo não conta do PSS apresentado; “elaborar um plano de trabalhos, com especificação dos materiais, peças e acessórios a utilizar”, tal plano e especificações não contam do PSS apresentado; “efectuar uma escolha cuidada dos materiais a utilizar na construção do escoramento”, nada no PSS indica o tipo de materiais a utilizar no escoramento; “utilizar sempre peças e acessórios (diagonais, forquilhas, abraçadeiras, uniões, macacos e bases...) na montagem da estrutura”, o PSS não especifica a forma de proceder ao escoramento das paredes da obra em edificação? Não foram cumpridas todas as medidas se segurança previstas na ficha de procedimentos de segurança “Escoramento de paredes”, designadamente não foi colocada estrutura de carácter provisório com suportes diagonais, prumos). Não foi previsto no PSS um cálculo que permitisse identificar o risco de desmoronamento total ou parcial do escoramento para aferir a estabilidade da parede e tipo de escoramento adequado? Em consequência, aumentou o risco de desmoronamento? No momento do acidente, encontravam-se no local apenas o sinistrado e mais três outros trabalhadores, não estando presente o Superior Hierárquico que supervisionasse e fiscalizasse os trabalhos? A ré empregadora implementou e seguiu todas as normas e tomada de medidas decorrentes do Plano de Segurança de Saúde [doravante, abreviado “PSS”], o qual foi elaborado pela sociedade “C..., LDA.” especialmente para a obra em causa? Esta empresa está acreditada para a elaboração do dito “PSS” e acompanhou a ré empregadora no desenrolar da empreitada? A parede que desmoronou foi trabalhada para que fosse possível realizar a entrega da laje, ficando o apoio excêntrico relativamente ao centro de gravidade? Previamente aos trabalhos de demolição, a ré empregadora analisou as estruturas do edifício a recuperar, apurou o seu estado de conservação e concluiu pela necessidade de aplicação de escoras e tirantes nas paredes, tendo procedido à sua aplicação, alterando para o efeito o projecto inicialmente previsto no sentido de conferir maior estabilidade às paredes exteriores? Essa alteração do projecto de estrutura consistiu na supressão da viga de fundação e na criação de pilares e sapatas para melhor apoio da lage, com o intuito de evitar descalçar as paredes exteriores ao nível do piso térreo e garantir maior estabilidade à obra? No primeiro piso, foram colocados quatro tirantes a ligar a parede exterior nascente à poente, a estabilizar as mesmas e a dar garantia de as paredes exteriores não derrocarem encontrando-se, ainda naquela altura, cada tirante com, pelo menos, duas escoras cada um, perfazendo assim um total de 8 escoras naquele piso, encontrando-se os tirantes a fixar as paredes nascentes e poente e as escoras a estabilizar os tirantes que fixavam as paredes nascentes e poentes? A derrocada das paredes ocorreu por força da ruptura provocada, por causas naturais, na argamassa onde se haviam acumulado águas e humidades? As paredes da estrutura estavam saturadas de água face à elevada pluviosidade? A parede que ruiu que foi a que estava voltada para nascente, ou seja, a estrutura que primeiramente sentiria o aquecimento matinal originado pelos raios de sol? Nas zonas de maior concentração de argamassa, a saturação da parede é maior e, consequentemente, os efeitos dos ciclos de gelo–degelo são mais influentes a provocar destabilização por desconsolidação? Estes efeitos combinados com os fenómenos físicos em consequência das condições meteorológicas que se verificaram no local da obra (temperaturas efectivamente baixas) desconsolidaram a parede levando à sua derrocada? Este fenómeno não foi previsto pela entidade que elaborou o PSS? Em condições de normalidade, não seria expectável que tal pudesse acontecer e/ou constituir um factor de risco? Em janeiro de 2021, foram registadas temperaturas que ultrapassaram a barreira dos – 5º (cinco graus negativos) e os índices de pluviosidade, o valor médio da quantidade de precipitação no presente ano hidrológico 2020/2021, desde 1 de Outubro 2020 a 31 de Janeiro de 2021, 441.9 mm, correspondeu a 94 % do valor médio 1971-2000? Estas condições climatérias empoladas pelo próprio microclima da região, asseveraram os efeitos dos ciclos de gelo/degelo, contribuindo para uma degradação imprevisível da segurança estrutural da parede em causa? Todas as janelas eram ladeadas por ombreiras e padieiras por cantaria de granito? Existiam 4 (quatro) pontos de ancoragem? Estavam colocadas 8 (oito) traves metras, complementadas com 4 (quatro) vergas de 8 mm? Não há qualquer forma técnica, material ou outra de proceder à soldagem dos vergalhões às escoras? No momento do acidente a obra já decorria há um mês e já tinham sido executados, designadamente, os seguintes trabalhos: demolição de parte da cobertura pois outra parte já se encontrava ruída; demolição de divisórias, soalho e vigas de madeira; limpeza de piso térreo interior; execução de fundações (alteradas de acordo com o fiscal e projectista); execução de piso térreo; betonagem de pilares com 20cm encastrados nas paredes antigas; e cofragem (em estado avançado) da laje de piso do 1.º andar? No decorrer do estudo de estabilidade efectuado, das demolições em parte do telhado, soalho, abertura de fundações, betonagem das fundações, rasgos de paredes ao nível do rés-do-chão para embutir os pilares e betonagem dos mesmos, cofragem de viga cinta ao nível do 2.º piso, não aparentava exirtir alteração à estrutura, nem de desagregação de materiais? As escoras eram dotadas, precisamente, de interligação em 4 (quatro) pontos e por meio de varão de 20mm? [..]». 3- Na ACTA DE JULGAMENTO de 26 de Maio 2022, consta o seguinte: -[..] ABERTA A AUDIÊNCIA, pelo Mmo. Juiz foi tentada a conciliação das partes, que não se tornou possível. *** De seguida, foi requerida e concedida a palavra à Ilustre Mandatária da Ré Seguradora, que no seu uso formulou um requerimento que se encontra gravado em suporte digital/CD, no contador de 00:00:01 a 00:04:37, em pista com a sua identificação.Após foi dada a palavra à Digna Magistrada do Ministério Público, para se pronunciar, e que se encontra gravado em suporte digital/CD, no contador de 00:00:01 a 00:00:44, em pista com a sua identificação. Após foi dada a palavra ao Ilustre Mandatário da Ré Empregadora, para se pronunciar, e que se encontra gravado em suporte digital/CD, no contador de 00:00:01 a 00:01:35, em pista com a sua identificação. *** De seguida, pelo Mmo. Juiz de direito, foi proferido o seguinte:DESPACHO Tendo em conta, e uma vez que só agora deu entrada no processo o requerimento em que a Ré Seguradora desiste do reconhecimento do direito de regresso, e tendo em conta que se admite que a questão colocada é juridicamente relevante e se justifica que a Entidade Empregadora pretenda um prazo para se pronunciar sobre a mesma, concedem-se os 10 dias requeridos para o efeito. A produção de prova que estava designada para hoje, adia-se para a data já agendada 22 de junho de 2022, pelas 9h 30m com continuação pelas 13h 30m, e para a continuação designa-se o dia 8 de Setembro de 2022, pelas 9h 30m com continuação pelas 13h 30m. *** Consigna-se que a data indicada foi fixada mediante prévia concertação com os Ilustres Mandatários presentes.[..]». 4 – Em despacho de 20-09-2022, o Senhor Juiz consignou o seguinte: “Requerimento de 9-09-2022, aguarde o contraditório”. 5 – Em 29-09-2022, a recorrente apresentou requerimento de oposição ao articulado superveniente, referindo dele ter sido notificada na sequência do despacho de 20-09-2022, dele constando, no essencial, que a Ré se opõe à admissibilidade por considerar intempestiva a apresentação face ao disposto no n.º2, do art.º 28.º do CPT, dado a audiência final já se ter iniciado “no passado dia 26-05-2022” [artigos 5 a 9]; e, também, “caso se queira chamar à colação o regime previsto no art. 588.º do CPC”, por a audiência prévia ter ocorrido em 02-02-2022, “e apenas agora o articulado superveniente foi junto aos autos” não subsistindo dúvidas “quanto à intempestividade do dito articulado” [10 a 14]; em razão das beneficiárias terem limitado a alegar que “após a apresentação da petição inicial tomaram conhecimento dos factos”, quando tinham o “ónus [..] de alegar em que concretamente consistiu tal superveniência e prova-la” [artigos 15 a 21]; por considerar que não há qualquer superveniência, dispondo as AA, patrocinadas pelo Ministério Público, do conhecimento necessário à articulação dos factos quando foi apresentada a petição inicial [artigos 22 a 38], dado que “em 12-05-2021 foi deferido o peido de acompanhamento electrónico do Proc. 4/21.0T9VCL no qual se avalia a putativa responsabilidade penal do acidente igualmente objecto dos presentes autos” , sendo que nesse processo “o relatório elaborado pela Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto foi junto a 27-02-2021”. Refere, ainda [art.º 39.º] que “Ainda que se tivesse por aplicável, a R. opõe-se a qualquer alteração ou ampliação ao pedido e à causa de pedir nos termos do art. 264.º do CPC, [..]”. 6. Notificada da decisão do tribunal a quo proferida em 27-09-22 [a decisão recorrida], a recorrente apresentou novo requerimento em 13-10-22, dizendo apresenta-lo por mera cautela e não podendo ser entendido como uma renúncia da R. ao direito ao recuso do despacho em causa, que ainda se encontra em prazo para exercer, invocando impugnar em bloco tudo o alegado no articulado superveniente. II.2 Violação do direito do contraditório A recorrente invoca a nulidade da decisão, por violação do disposto no art.º 3.º 3, do CPC, [conclusões I a V e XXI e XXII]. Alega, no essencial, que em 21-09-22 foi cumprida a notificação do despacho datado de 20-09-22, no qual o Tribunal a quo ordenou que os autos aguardassem o contraditório quanto ao articulado superveniente, direito que poderia exercer, pelo menos, até ao dia 4 -10-2022, de acordo com as regras sobre os prazos processuais. No entanto, logo a 27-09-2022, o Tribunal a quo proferiu o despacho recorrido, admitindo o articulado superveniente, sem que lhe tivesse permitido exercer o direito contraditório. Defende que, em consequência, mostra-se violado o direito ao exercício do contraditório, omissão de acto e formalidade que a lei prescreve, consubstanciando uma nulidade (art.º 3.º3 e 195.º 1 do CPC), que afecta os actos praticados posteriormente. Contrapõem as recorridas, com o patrocínio do Ministério Público, no essencial, que o art.º 60.º/3, do CPT, admite a apresentação de articulado superveniente nos termos do art.º 588.º do CPC ou art.º28.º do CPT. Nos termos do art.º 588.º/4 do CPC, após a apresentação do articulado superveniente o juiz profere despacho liminar, sendo então ordenada a notificação da parte contrária para se pronunciar em dez dias. Defende não se verificar a nulidade arguida, referindo que o princípio do contraditório não é cerceado pois quanto àqueles factos e à admissibilidade da sua alegação pode e deve sempre a parte pronunciar-se na resposta para a qual foi notificada. Cabe assinalar ainda, que no despacho sobre a admissibilidade do recurso, o Tribunal a quo pronunciou-se quanto às nulidades arguidas no recurso, dizendo singelamente “Mais considero inexistir qualquer das nulidades invocadas”. Passemos à apreciação. O artigo 3.º do CPC, com a epígrafe “Necessidade do pedido e da contradição”, no seu n.º3, dispõe o seguinte: [3] O juiz deve observar e fazer cumprir, ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório, não lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem. A norma foi introduzida com a reforma do Código de Processo Civil, operada em 1995/1996 pelos Decretos-Lei nºs 329°-A/95 de 12 de Dezembro e 180/96 de 25 de Setembro, acentuando a importância dos princípios da contraditório e da igualdade das partes, passando aquele a ter uma ampliada consagração legal. Deste princípio decorre que cada parte é chamada a apresentar as suas razões de facto e de direito, a oferecer as suas provas e a pronunciarem-se sobre o valor e resultado de umas e outras e, portanto, salvo caso de manifesta desnecessidade, não é lícito ao juiz decidir sobre questões de direito ou de facto, mesmo de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem. Visto noutra perspectiva, significa isto também, que se porventura o juiz conclui que para a apreciação e decisão do litígio vai debruçar-se sobre questão que as partes não suscitaram nos seus articulados, nem sobre ela tiveram oportunidade de se pronunciarem, a fim de evitar a prolação de uma decisão surpresa, antes de avançar, sob pena de incorrer em nulidade que pode influir no exame ou decisão da causa (art.º 195.º 1, CPC), deve ordenar a notificação das partes dando-lhes conta daquele propósito e facultando-lhes a possibilidade de exercerem o contraditório. Como se elucida no Ac. do STJ de 24-02-2015 [proc.º 116/14.6YLSB, Conselheira Ana Paula Boularot, disponível em www.dgsi.pt] “[A] decisão surpresa faz supor que a parte possa ser apanhada em falta por uma decisão que embora pudesse ser juridicamente possível, não esteja prevista nem tivesse sido por si configurada”. A violação do princípio do contraditório consubstancia nulidade processual por omissão de ato que deveria ter sido praticado, com influência na decisão da causa (art. 195º, nº 1, do CPC). Trata-se, todavia, de nulidade processual que, por estar coberta pela própria decisão, já que foi nesta que a mesma foi cometida, é impugnável por via de recurso a interpor da mesma, quando admissível, acabando por equivaler ou consubstanciar nulidade da sentença /decisão por omissão de pronúncia. Neste sentido, afirma o Acórdão do TRP de 08.10-2018 [Proc. 721/12.5TVPRT.P1, Desembargadora Ana Paula Amorim, disponível em www.dgsi.pt]: “I - Suscitada a título oficioso a apreciação de uma questão de direito, o exercício do contraditório, nos termos do art. 3º/3 CPC dependerá sempre da verificação de uma nova abordagem jurídica da questão perante o objeto do litígio, que não fosse perspetivada pelas partes, mesmo usando da diligência devida. II-A omissão de uma formalidade de cumprimento obrigatório, como ocorre com o respeito pelo princípio do contraditório destinado a evitar “decisões-surpresa”, configura a nulidade da sentença/despacho, por omissão de pronúncia, nos termos do art. 615º/1 d) CPC”. Servindo-nos agora da elucidativa síntese do Ac. de 02-12-2019, deste TRP [Proc.º 14227/19.8T8PRT.P1, Desembargadora Eugénia Cunha, disponível em www.dgsi.pt]: -«Decisão-surpresa é a solução dada a uma questão que, embora pudesse ser previsível, não tenha sido configurada pela parte, sem que esta tivesse obrigação de prever fosse proferida. A proibição da decisão-surpresa reporta-se, principalmente, às questões suscitadas oficiosamente pelo tribunal. O juiz que pretenda basear a sua decisão em questões não suscitadas pelas partes mas oficiosamente levantadas por si, “ex novo”, seja através de conhecimento do mérito da causa, seja no plano meramente processual, deve, previamente, convidar ambas as partes a sobre elas tomarem posição, só estando dispensado de o fazer, conforme dispõe o nº 3, do art. 3º, em casos de manifesta desnecessidade. Com este princípio quis-se impedir que as partes pudessem ser surpreendidas, no despacho saneador ou na decisão final, com soluções de direito inesperadas, por não discutidas no processo, as quais, no regime anterior, eram permitidas. Pretendeu-se, pois, proibir as decisões-surpresa embora tal não retire a liberdade e independência que o juiz tem, em termos absolutos, de subsumir, selecionar, qualificar, interpretar e aplicar a norma jurídica que bem entender, aplicando o direito aos factos de modo totalmente autónomo. Impõe, sim, ao julgador que, para além de dar a possibilidade às partes de alegarem de direito, sempre que surge uma questão de direito ainda não discutida ao longo do processo tem de, antes de decidir, facultar às partes a sua discussão. A regra do contraditório passou, assim, a abarcar a própria decisão de uma questão de direito, decisiva para a sorte do pleito, inovatória, inesperada e não perspetivada pelas partes, tendo de ser dada a estas a possibilidade de, previamente, a discutirem sendo que tal “entendimento amplo da regra do contraditório, afirmado pelo nº3, do art. 3º, não limita obviamente a liberdade subsuntiva ou de qualificação jurídica dos factos pelo juiz – tarefa em que continua a não estar sujeito às alegações das partes relativas à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito (art. 664º); trata-se apenas e tão somente, de, previamente ao exercício de tal “liberdade subsuntiva” do julgador, dever este facultar às partes a dedução das razões que considerem pertinentes, perante um possível enquadramento ou qualificação jurídica do pleito, ou uma eventual ocorrência de exceções dilatórias, com que elas não tinham razoavelmente podido contar”[4]. [4] REGO, Carlos Lopes do (2004). Comentários ao Código de Processo Civil, 2ª ed., vol. I. Coimbra: Almedina, pág 32]. Revertendo ao caso, começaremos por relembrar que as AA, com o patrocínio do Ministério Público, apresentaram apresentado articulado superveniente invocando o disposto no artigo 28.º, n.º1 e 3 e 60.º, n.º3 do Código de Processo do Trabalho, com pedido de cumulação sucessiva de pedidos e de causas de pedir. Tal decorre logo do início do articulado, mas também da justificação que invocam para a sua apresentação e da parte final do mesmo, acima transcrito, mas que nesses segmentos, por comodidade, aqui se reproduz de novo: -« [..] 48.º O artigo 28.º, n.º1 do Código de Processo do Trabalho estabelece que “é permitido ao autor aditar novos pedidos e causas de pedir, nos termos dos números seguintes”, prevendo o n.º2 aditamento à petição inicial até à audiência final no caso de factos de ocorrência superveniente e esclarecendo o seu n.º3 que “o autor pode ainda deduzir contra o réu novos pedidos, nos termos do número anterior, embora esses pedidos se reportem a factos ocorridos antes da propositura da ação, desde que justifique a sua não inclusão na petição inicial”. 49.º Em anotação a esta norma, leia-se em “Código de Processo do Trabalho Anotado e Comentado – os processos laborais na prática judiciária”, José Joaquim F. Oliveira Martins, Almedina, Setembro de 2020, página 56 e 57: “O n.º3 refere-se a uma realidade distinta do número anterior (e que podemos chamar de superveniência subjetiva), em que os factos ocorreram já antes do início da ação, mas não foram alegados (por o autor, por exemplo, não os conhecer, no que será o caso mais normal), podendo ser alterada e ampliada a causa de pedir e os pedidos desde que o autor “justifique a sua não inclusão na petição inicial” (sempre com a ressalva, atenta a remissão para o número anterior, relativa à exigência da mesma forma processual)”. 50.º Por sua vez, o artigo 60.º, n.º3 do Código de Processo do Trabalho esclarece que são admitidos articulados supervenientes nos termos do disposto no artigo 588.º do Código de Processo Civil (que admite a alegação de factos supervenientes, quer os ocorridos posteriormente ao termo dos prazos como os factos anteriores de que a parte só tenha conhecimento depois de findarem esses prazos, constitutivos do seu direito) e para os efeitos do artigo 28.º do Código de Processo do Trabalho. [..] Nestes termos e nos demais de direito aplicável, requer-se a V.Ex.ª: A. se digne admitir o presente articulado superveniente, nos termos preceituados nos artigos 28.º, n.º1 e 3 e 60.º, n.º3 do Código de Processo do Trabalho; B. permita o aditamento à petição inicial apresentada dos factos acima descritos, passando os mesmos a integrar o objeto e os temas de prova destes autos, acrescendo aos demais já constantes do despacho saneador oportunamente proferido; C. permita a alteração da relação entre os pedidos formulados nos autos do seguinte modo: a condenação da Ré empregadora no pagamento às AA de: - Uma pensão anual e vitalícia no montante de € 10.938,12, correspondente à retribuição anual ilíquida de € 10.938,12, repartido pelas AA.; a) - A quantia de € 25,00, referente às mencionadas despesas de transporte; b) - A quantia de € 5.792,29, repartido pelas AA, respeitante a subsídio por morte, correspondente a 12 vezes o valor de 1,1 IAS à data da morte, c) - A quantia de € 65.000,00 pela perda de vida do sinistrado; d) - A quantia de € 70.000,00 pelos danos não patrimoniais sofridos pela primeira e segunda autoras (€ 35.000,00 cada). e) - Juros de mora já vencidos e os vincendos, à taxa legal de 4%, contados a partir do vencimento das obrigações e até efetivo e integral pagamento. e, subsidiariamente, para a hipótese de não de demonstrar que o acidente se ficou a dever a violação das regras de segurança da parte da R. empregadora então, pede-se, em consequência que as R.R., na medida das responsabilidades de cada uma, sejam condenadas: I - A pagar à primeira A: a) - uma pensão anual e vitalícia no montante de € 3.281,44 até perfazer idade de reforma por velhice e de € 4.375,25, a partir daquela idade ou da verificação de deficiência ou doença crónica que afete sensivelmente a sua capacidade para o trabalho, pensão essa atualizável, devida a partir de 10-01-2021, correspondente, respetivamente, a 30,00% e a 40,00% da retribuição anual ilíquida de € 10.938,12; b) – a quantia de € 25,00, relativa às supracitadas despesas de transporte; II – A pagar à segunda A: a) - uma pensão anual no montante de € 2.187,62, até perfazer 18 anos e, após esta idade, até aos 22 ou 25 anos, enquanto frequentar, respetivamente, o ensino secundário e o ensino superior ou cursos aos mesmos equiparados ou, sem limite de idade, quando afetada de doença física ou mental que o incapacite sensivelmente para o trabalho, pensão essa atualizável, devida a partir de 10-01-13 2021, correspondente a 20,00% da retribuição anual ilíquida de € 10.938,12; III – A pagar às AA: - A dividir em partes iguais, a quantia de € 5.792,29, respeitante a subsídio por morte, correspondente a 12 vezes o valor de 1,1 IAS à data da morte; IV - Juros de mora já vencidos e os vincendos, à taxa legal de 4%, contados a partir do vencimento das obrigações e até efetivo e integral pagamento, computando-se a quantia global de € 278,55, à data da propositura da presente ação. Para tanto, requer-se a V. Exa se digne mandar notificar as RR para contestarem, querendo, nos termos disposto no artigo 28.º, n.º4 do Código de Processo do Trabalho.». Num parêntesis, não é despiciendo notar que as AA finalizaram o requerimento requerendo fosse determinada a notificação das “RR para contestarem, querendo, nos termos disposto no artigo 28.º, n.º4 do Código de Processo do Trabalho”, quando agora, diga-se, incoerentemente, vêm procurar defender posição diversa, nomeadamente, que no caso não era devido o prévio exercício do contraditório, alegando que o art.º 588.º/4, do CPC, prevê a prolação de despacho liminar sendo então ordenada a notificação da parte contrária para se pronunciar em dez dias. O art.º 28.º do CPT, com a epígrafe “Cumulação sucessiva de pedidos e de causas de pedir”, estabelece o seguinte: 1 - É permitido ao autor aditar novos pedidos e causas de pedir, nos termos dos números seguintes. 2 - Se, até à audiência final, ocorrerem factos que permitam ao autor deduzir contra o réu novos pedidos, pode ser aditada a petição inicial, desde que a todos os pedidos corresponda a mesma forma de processo. 3 - O autor pode ainda deduzir contra o réu novos pedidos, nos termos do número anterior, embora esses pedidos se reportem a factos ocorridos antes da propositura da ação, desde que justifique a sua não inclusão na petição inicial. 4 - Nos casos previstos nos números anteriores, o réu é notificado para contestar tanto a matéria do aditamento como a sua admissibilidade. Decorre expressa e inequivocamente do n.º4, que apresentado articulado para os fins admitidos no artigo, “o réu é notificado para contestar tanto a matéria do aditamento como a sua admissibilidade”. Como é evidente, o juiz só poderá pronunciar-se quanto à admissibilidade do articulado após a parte ter contestado ou decorrido o prazo legal, incluindo a possibilidade de prática do acto para além dele com multa (art.º 139.º/5 do CPC), sem que o tenha feito. O Senhor Juiz, em despacho de 20-09-2022, determinou “Requerimento de 9-09-2022, aguarde o contraditório”. Porém, antes de a R. ter apresentado o requerimento de oposição e sem que tenha o prazo legal para se pronunciar, em 27 de em 27-09-2022, proferiu o despacho seguinte: -«Pelo menos em relação a parte dos factos alegados no requerimento do MP apresentado em 0.09.2022, não se pode afastar a superveniência subjetiva, pelo que se admite o articulado superveniente e se determina, nos termos do artigo 588.º, n.º 4, do CPC, a notificação da Ré empregadora para, 10 dias, se pronunciar». Diga-se, desde já, que não se percebe a alusão ao art.º 588.º n.º4, do CPC. É certo, como referem as recorridas nas contra-alegações que o n.º, 3, do artigo 60.º do CPT, remete (também) para o art.º 588.º do CPC, ao estabelecer que “só são admitidos articulados supervenientes nos termos do artigo 588.º do Código de Processo Civil ou para os efeitos do artigo 28.º do presente Código”. Mas importa ter presente que a apresentação de articulados supervenientes “nos termos do artigo 588.º do Código de Processo Civil ou para os efeitos do artigo 28.º do presente Código”, respeitam a realidades distintas e visam fins diferentes. De resto, por isso mesmo aquela norma refere uma “ou” outra possibilidade. O art.º 28.º do CPT consagra um regime especial de admissibilidade de cumulação sucessiva de pedidos e de causas de pedir, ou seja, não previsto no processo civil comum. Por seu turno, o art.º 588.º do CPC, rege sobre a admissibilidade de dedução em articulado superveniente de “factos constitutivos, modificativos ou extintivos do direito que forem supervenientes” [n.º1]. A propósito dessas normas observa Carlos Alegre [Código de Processo do Trabalho, Almedina, 6.ª edição, 2004, p. 187] o seguinte: «À primeira vista, a leitura destes dois artigos parece levar a concluir que ambos dizem a mesma coisa e que, afinal, as situações não são diferentes. Mas, na realidade, existe uma diferença fundamental entre elas que conduz a situações verdadeiramente diferentes: - nos casos do artigo 506.º, n.ºs 1 e 2, [aos quais correspondem o actual art.º 588.º, n.ºs 1 e 2] os factos supervenientes (constitutivos, modificativos ou extintvos) dizem respeito ao direito accionado; - nos casos do artigo 28.º, n.s 2 e 2, os factos supervenientes não dizem respeito ao direito já accionado, mas a novos direitos (n.º1). Nas situações do artigo 506.º, a causa de pedir mantém-se a mesma; nas situações do artigo 28.º, são aditados novos pedidos e causa de pedir. Neste particular aspecto, o Código de Processo do Trabalho, mostra-se francamente mais magnânimo, permitindo a dedução de articulados supervenientes relativos a factos que respeitem não só ao direito peticionado, como a novos pedidos e causa de pedir. [..]». Nas palavras de Albino Mendes Baptista [Código de Processo do Trabalho, Quid Juris, 2000, p. 126], no processo laboral “consagra-se um regime mais abrangente do que o do processo civil comum, porquanto por via da cumulação sucessiva de pedidos ou causas de pedir há novação da acção”. Como começámos por assinalar e evidenciar, no caso é manifesto que as AA apresentaram articulado superveniente com pedido de cumulação sucessiva de pedidos e de causas de pedir, estribando-se no artigo 28.º, n.º1 e 3 do Código de Processo do Trabalho. Daí que, como também dissemos, não se percebe a alusão ao art.º 588.º n.º4, do CPC. Não obstante, o que assume relevância é o juízo formulado pelo Tribunal a quo face a esse enquadramento, dado que ao admitir expressamente o articulado superveniente, considerou necessariamente que o mesmo foi tempestivamente apresentado e, também, que o seu conteúdo era admissível. Determinou a notificação da Ré para se pronunciar, mas por exclusão de partes, em termos lógicos, apenas para se pronunciar quanto ao factos alegados, ficando, desde logo, prejudicada a possibilidade de se pronunciar quanto à admissibilidade de apresentação do articulado em causa. Significa isto, que ao proferir aquela decisão, admitindo o articulado superveniente, o Tribunal a quo violou o direito ao exercício do contraditório (art.º 3.º/3, do CPC), dado que vedou à Ré a possibilidade contestar não só a matéria do mesmo, como também a sua admissibilidade, negando-lhe o direito expressamente estabelecido no n.º4, do art.º 28.º do CPT. Por conseguinte, conclui-se, e declara-se, que a decisão em causa enferma da nulidade da sentença/despacho, por omissão de pronúncia, nos termos do art.º 615º/1 d) CPC. Cabe retirar as consequências do decidido, nomeadamente, quanto ao demais em causa no presente recurso. Tendo-se julgando-se nula a decisão nos termos do art.º 615º/1 d) CPC, por decorrência lógica fica prejudicada a apreciação da arguida nulidade da decisão por falta de fundamentação [conclusões XXIII a XXV]. Quanto ao alegado erro na aplicação do direito, em razão do Tribunal a quo ter admitido o articulado superveniente sendo a sua apresentação intempestiva [conclusões VI a XV]; e, por inexistência de superveniência [conclusões XVI a XX], verifica-se que após a prolação da decisão em crise, em 29-09-2022, a recorrente apresentou o requerimento de oposição ao articulado superveniente -, referindo dele ter sido notificada na sequência do despacho de 20-09-2022-, com o conteúdo que se procurou sintetizar no ponto provado 5. Não obstante, se este Tribunal de recurso se substituísse à 1.ª instância na apreciação da questão, estar-se-ia a preterir um grau de jurisdição quanto à apreciação dos argumentos da recorrente e, ademais, no rigor das coisas, a optar por uma solução em incoerência com o fundamento afirmado para se chegar à decisão acima, ou seja, que a 1.ª instância preteriu o direito ao contraditório, por não se ter pronunciando sobre os argumentos esgrimidos pela recorrente para se opor à admissibilidade do articulado superveniente. Impõe-se, pois, anular a decisão recorrida e determinar que a primeira instância profira nova decisão, atendendo ao requerimento de oposição apresentado em 29-09-2022, pela Ré empregadora, observando o direito ao contraditório expressamente estabelecido no art.º 28.º 4, do CPT. Consequentemente, anulam-se também os termos subsequentes que dependam absolutamente da decisão anulada. III. DECISÃO - Em face do exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar o recurso procedente, anulando a decisão recorrida e determinando que o Tribunal a quo profira nova decisão, atendendo ao requerimento de oposição apresentado em 29-09-2022, pela Ré empregadora, observando o direito ao contraditório expressamente estabelecido no art.º 28.º 4, do CPT. Consequentemente, anulam-se também os termos subsequentes que dependam absolutamente da decisão anulada. - Custas do recurso a cargo das recorridas, atento o decaimento (art.º 527.º CPC), mas sem prejuízo do apoio judiciário. Porto, 5 de Junho de 2023 Jerónimo Freitas Nelson Fernandes Teresa Sá Lopes |