Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
4393/11.6TBVLG-A.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: VIEIRA E CUNHA
Descritores: PROPRIEDADE HORIZONTAL
DESPESAS COM AS PARTES COMUNS
PRESCRIÇÃO
ACTA DA ASSEMBLEIA DE CONDÓMINOS
FORÇA EXECUTIVA
Nº do Documento: RP201405274393/11.6TBVLG-A.P1
Data do Acordão: 05/27/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I – As despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do condomínio constam de um orçamento, sendo depois repartidas pelos condóminos, geralmente em prestações mensais, nos termos do artº 1424º CCiv, e, por isso, renovam-se anualmente, enquanto durar o condomínio – artºs 1424º e 1431º, prescrevendo no prazo de cinco anos – al. g) do artº 310° CCiv, e o prazo da prescrição começa a correr da data em que a prestação pode ser exigida — nº 1 do artº 306º.
II – Na exegese do disposto no artº 323º nº2 CCiv, entende-se que as razões de índole processual ou de organização judiciária irrelevam para a imputação de responsabilidade no atraso da citação ao requerente; tal é o caso de a citação se ver delongada pela necessária precedência da penhora.
III – Nos termos do artº6º nº1 D-L nº 268/94, a força executiva da acta da assembleia de condóminos não depende de nela se fazer necessariamente constar um montante liquidado, concreto, certo, da dívida de cada condómino, mas tal força executiva extrai-se antes do critério que permita que esse valor se determine, a achar pelo confronto da acta que o preveja.
IV – A acta que aprova o valor global em dívida por parte de determinado condómino apenas constitui título executivo se acompanhado da acta ou actas que prevejam tal valor ou desde que essa sobredita acta descrimine, por períodos e valores intermédios, as quantias em causa.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: ● Rec. 4393/11.6TBVLG-A.P1. Relator – Vieira e Cunha. Adjuntos – Desembargadores Maria Eiró e João Proença Costa.

Acórdão do Tribunal da Relação do Porto

Súmula do Processo
Recurso de apelação interposto na acção com processo incidental de oposição à execução, com o nº4393/11.6TBVLG-A, do 2º Juízo da Comarca de Valongo.
Exequente – Condomínio do Edifício ….
Executados/Oponentes/Apelantes – B… e mulher C….

Tese dos Oponentes
Conforme se lê na petição executiva, as quantias que invocadamente se encontram em dívida reportam-se á data de 31/3/2007.
Como assim, nos termos do artº 310º CCiv, sendo certo que os Executados foram citados em Maio de 2012, encontra-se prescrita a obrigação invocada.
A acta de assembleia de condomínio de 17/11/2011, que serve de base à execução, não especifica qual o montante em dívida pelos ora Oponentes – apenas refere genericamente montantes em atraso de condóminos.
No mais, impugnam a alegação da petição executiva.

O Exequente não contestou.

Sentença Recorrida
Na sentença proferida a final, a oposição à execução foi julgada improcedente, com a absolvição do Exequente do pedido.

Conclusões do Recurso:
I. O presente recurso é interposto na sequência da decisão proferida no 2º Juízo do Tribunal Judicial de Valongo, em que julgou improcedente o pedido formulado pelo Autor, absolvendo o Réu, e improcedente, por não provada, a oposição à execução deduzida pelos Executados.
II. Não concordam os Executados com a douta sentença proferida pelo Tribunal “a quo”.
III. Que decidiu pela improcedência da oposição deduzida e ordenou o prosseguimento da instância executiva.
IV. Contudo, os documentos apresentados pela Exequente no Requerimento Executivo (Atas da Assembleia de Condóminos, fls. 22), por si só, relativamente aos valores de quotas em falta, não são líquidos, certos e exigíveis.
V. Pois, para além de serem de todo imperceptíveis, não é possível vislumbrar, a que meses e anos, dizem respeito as quotas em atraso, pois a mesma apenas apresenta tão só, valores genéricos, sendo totalmente omissa relativamente aqueles meses/ anos que foram pagos e aqueloutros que não foram; e em que data se venceram.
VI. E, nem mesmo indica se foram ajustadas condições de pagamento, e, em caso afirmativo, quais os seus termos.
VII. Pelo que, não estão preenchidos os requisitos de exequibilidade do título apresentado pela Exequente, nos termos do nos termos do disposto no artº 6º do DL 268/94.
VIII. Pois, apenas a ata da assembleia de condóminos em que se fixa a quota-parte de comparticipação de cada condómino nas despesas comuns, bem como o prazo e modo de pagamento, constitui título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, requisito este que não foi verificado.
IX. Que relativamente à prescrição invocada, não podem os Apelantes concordar com a Mm. Juiz “a quo”, ao entender que o prazo prescricional dos créditos referentes a despesas de condomínio, é o prazo ordinário de 20 anos, constante do artigo 309º do Código Civil.
X. Quando a situação atinente às quotas de condomínio em causa no caso em apreço, ou seja, a comparticipação das despesas comuns por parte de cada um dos condóminos, constituem obrigações reais não ambulatórias, sendo prestações periodicamente renováveis.
XI. E as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício e ao pagamento de serviços de interesse comum, como é referido no art.º 1424.º, n.º 1, do CC, integram, assim, a situação prevista na alínea g) do art.º 310.º, do CC, estando, pois, sujeitas indubitavelmente ao prazo de prescrição de 5 (cinco) anos, tal como alegado pelos Apelantes na Oposição à Execução.
XII. Sendo este o entendimento dominante, senão unânime, da nossa jurisprudência, podendo-se citar, entre outros, o Acórdão do STJ de 14.12.2000.

Factos Provados
a) Foi dada à execução a ata de assembleia geral ordinária de condóminos do prédio constituído em propriedade horizontal sito na Rua …, …, …, realizada a 17/11/2011, junta a fls. 22 e ss. dos autos principais, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
b) Os opoentes foram os titulares inscritos da fração autónoma designada pelas letras DH, daquele prédio, até 23/03/2007, data em que foi inscrita a favor de D…, S.A., por dação em cumprimento, através da Ap. 30 da referida data.
c) Os opoentes C… e B… foram citados para a ação executiva, respetivamente, a 27/04/2012 e a 09/05/2012.
d) O exequente interpôs contra o ora opoente B… ação executiva, que correu seus termos sob o n.º 1904/06.2TBVLG do 2.º Juízo deste tribunal, nos termos constantes do requerimento executivo cuja cópia se encontra a fls. 64 dos autos, cujo teor se dá aqui por totalmente reproduzido, para todos os legais efeitos.
e) Nessa ação, foi lavrado acordo de pagamento da quantia exequenda, conforme resulta de fls. 66 e 67 dos autos, cujo conteúdo se dá aqui por integralmente reproduzido, tendo sido julgada extinta a execução, pelo pagamento da quantia exequenda e das custas, por despacho de 17/06/2009 (fls. 69 dos autos, que aqui igualmente se reproduz).

Fundamentos
Em função das doutas conclusões do recurso, as questões a apreciar serão as seguintes:
- em primeiro lugar, saber se, ao invés do decidido em 1ª instância, a obrigação exequenda se encontra prescrita;
- depois, saber se os documentos apresentados pela Exequente no Requerimento Executivo (Actas da Assembleia de Condóminos, fls. 22), por si só, relativamente aos valores de quotas em falta, não são líquidos, certos e exigíveis.
Vejamos então.
I
Começando pela questão da prescrição da obrigação exequenda, ao abrigo do disposto no artº 310º al.g) CCiv.
Diz-se que a razão de ser da prescrição de curto prazo do artº 310º al.g) CCiv está em evitar que o credor deixe acumular excessivamente os seus créditos, assim se protegendo o devedor de uma acumulação de mensalidades ou anuidades em dívida, que, enquanto dívida de capital, passível de exigência numa prestação única, seria passível de trazer a ruína ou, ao menos, uma onerosidade não calculada ao devedor (assim, Prof. Manuel de Andrade, Teoria Geral, II – 3ª reimp., pg. 452, e Prof. Vaz Serra, Prescrição e Caducidade, Bol. 107º/285, cits. in S.T.J. 4/10/2000 Col.III/60).
É conveniente porém, para a exegese do conceito de “prestações periodicamente renováveis”, nos aproximarmos das diferenças que a doutrina divisou, em matéria de realização no tempo das prestações contratuais.
V.g., o Prof. Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, I/80, cit. in Ac.R.L. 11/12/97 Col.V/125, relatado pelo Desemb. Paixão Pires, classificou as prestações como instantâneas, fraccionadas ou repartidas, e duradouras. E assim:
“Dizem-se instantâneas as prestações em que o comportamento exigível ao devedor se esgota num só momento (…).”
“Duradouras aquelas em que a prestação se protela no tempo, tendo a duração temporal da relação creditória uma influência decisiva na conformação global da prestação, chamando-se-lhes por isso obrigações duradouras. Dentro destas, distinguem-se duas modalidades: as prestações de execução continuada, cujo cumprimento se prolonga ininterruptamente no tempo (v.g., as do locador, do fornecedor de água, gás ou electricidade, do depositário, do comodante), e as prestações reiteradas, periódicas ou com trato sucessivo, que se renovam em prestações singulares sucessivas por via de regra ao fim de períodos consecutivos (v.g., as do locatário, quanto ao pagamento da renda ou aluguer, do foreiro, do devedor da renda perpétua ou vitalícia, do consumidor de água, gás ou electricidade).”
“Dizem-se fraccionadas ou repartidas as obrigações cujo cumprimento se protela no tempo, através de sucessivas prestações instantâneas, mas em que o objecto da prestação está previamente fixado, sem dependência da relação contratual (v.g., preço pago a prestações, fornecimento de certa quantidade de mercadorias ou de géneros, a efectuar em diversas partidas).”
“Nas obrigações duradouras, a prestação devida depende do factor tempo; nas prestações fraccionadas, o tempo não influi na determinação do seu objecto, apenas se relacionando com o modo da sua execução.”
Derivando da distinção doutrinal para o caso concreto, haverá que apurar se o objecto da prestação é determinado, sobre o mais, em função do respectivo tempo de duração (prestação duradoura, de execução continuada ou periódica), ou antes se é essencialmente determinado em função do valor do bem adquirido (prestação fraccionada).
Só para as prestações duradouras de natureza reiterada ou periódica valeria a prescrição de 5 anos a que se reporta o disposto no artº 310º al.g) CCiv. Já as prestações fraccionadas ou repartidas cairiam no âmbito da prescrição ordinária de 20 anos – artº 309º CCiv.
Dado o conspecto das obrigações supra traçado, aquilo que releva é que não nos encontramos perante um objecto prestacional único, ainda que fraccionado – encontramo-nos antes perante prestações duradouras reiteradas, isto é, periodicamente renováveis, para os efeitos do artº 310º al.g) CCiv.
A sufragar este entendimento, assinalamos o Consº Aragão Seia, Propriedade Horizontal, 2.ª ed., pg. 131, citado no Ac.R.L. 22/4/2010, pº 5892/04.1YXLSB.L1-6, relatado pela Desembª Márcia Portela, disponível na base de dados oficial, quando escreve que «as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do condomínio constam de um orçamento a elaborar anualmente, sendo depois repartidas pelos condóminos, geralmente em prestações mensais nos termos do artº 1424º por representarem a contrapartida do uso e fruição daquelas partes comuns. Essas prestações renovam-se, pois, anualmente, enquanto durar o condomínio – artºs 1424º e 1431º. Assim sendo, prescrevem no prazo de cinco anos - alínea g) do artigo 310° - e o prazo da prescrição começa a correr da data em que a prestação pode ser exigida — nº 1 do artigo 306º».
No mesmo sentido, sem preocupação de exaustividade, encontramos os Ac.R.L. 21/6/2011, pº 7855/07.6BOER-A.L1-7, relatado pela Desembª Mª Amélia Ribeiro, ou o Ac.R.C. 14/11/06, pº 3948/04.0TBAVR.C1, relatado pelo Desemb. Artur Dias, ambos da base de dados oficial. Não se sinaliza, aliás, jurisprudência em sentido contrário.
O facto de se tratarem de prestações “ob rem” ou “propter rem”, conexas à propriedade horizontal, não descaracteriza o facto de se tratarem de prestações anualmente renováveis, reiteradas, em função das previsões orçamentais.
No caso dos autos, segundo os próprios termos da douta sentença recorrida, o que reclama o Exequente é o pagamento de quotas e despesas do condomínio vencidas e não pagas até à alienação da fracção referida, apuradas até 31/3/2007.
Todavia, os Oponentes deixaram de ser os titulares inscritos da fracção autónoma a partir de 23/3/2007, pelo que temos de fixar a partir desta última data o início do decurso do prazo de prescrição do direito – artº 306º nº1 CCiv.
Verifica-se ainda que a petição executiva deu entrada em juízo em 17/12/2011.
No caso dos autos, os Executados/Oponentes foram citados em 27/4/2012 e em 9/5/2012.
Nos termos do artº 323º nº2 CCiv, se a citação se não fizer dentro de cinco dias depois de ter sido requerida, por causa não imputável ao requerente, tem-se a prescrição por interrompida logo que decorram os cinco dias.
Ou seja: só se atende ao momento da citação se a culpa da demora superior a cinco dias for de atribuir ao requerente (Profs. Pires de Lima e Antunes Varela, Anotado, I – 3ª ed., pg. 289) – quaisquer outros factores, designadamente que sejam de imputar aos necessários trâmites processuais, não relevam para um juízo de responsabilidade do requerente no facto de a citação não ser feita em cinco dias.
O que se verifica nos autos é que a petição deu entrada em juízo cerca de três meses antes do termo final do prazo de prescrição (5 anos a contar de 23/3/07) – a citação foi antecedida de penhora, mas a demora do referido trâmite processual irreleva para um juízo de responsabilidade do requerente da citação (tal como outrora se mencionou para a demora decorrente de necessária distribuição do processo – Ac.R.E. 28/4/92 Bol.416/734 – ou pela ocorrência de férias judiciais – S.T.J. 29/4/92 Bol.416/619, Ac.R.L. 14/5/87 Bol.367/565 ou Ac.R.P. 14/3/95 Col.II/193).
Ou seja, como se pronunciou o citado acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, relatado pelo Consº César Marques, as razões de índole processual ou de organização judiciária irrelevam para a imputação de responsabilidade no atraso da citação ao requerente.
Tal é o caso, por exemplo, de a citação se ver delongada pela necessária precedência da penhora – cf., nesse sentido, Ac.R.L. 13/1/09, pº 9584/2008-1, relatado pelo Desemb. Rijo Ferreira, na base de dados oficial.
E assim se conclui, apodicticamente, que, mesmo considerando o prazo de prescrição de cinco anos, a interrupção da prescrição, por aplicação do disposto no artº 323º nºs 1 e 2 CCiv, se verificara já em momento anterior ao da efectiva citação dos Oponentes e sem que se mostrasse decorrido o citado prazo de prescrição do direito.
Improcede o primeiro núcleo do recurso.
II
Quanto à questão do título executivo – invoca-se, basicamente que “os valores de quotas em falta, não são líquidos, certos e exigíveis, pois, para além de serem imperceptíveis, não é possível vislumbrar, a que meses e anos, dizem respeito as quotas em atraso, pois apresentam tão só, valores genéricos, sendo a acta de assembleia totalmente omissa relativamente aqueles meses/anos que foram pagos e aqueloutros que não foram; e em que data se venceram”.
São características da exequibilidade do título a certeza, a exigibilidade e a liquidez, segundo dispõe o artº 802º CPCiv61.
Genericamente, a obrigação é certa quando esteja comprovada por título executivo que dê a conhecer os respectivos objecto e sujeitos; é exigível quando está vencida (Ac.R.P. 8/1/96 Col.I-185); é líquida quando se acha determinada (Consº Lopes Cardoso, Manual, artº 802º).
Em complemento, o artº 6º nº1 D.-L. nº268/94 de 25 de Outubro refere que a acta da reunião da Assembleia de Condóminos que tiver deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, que não devam ser suportados pelo condomínio, constitui título executivo contra o proprietário que deixe de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota parte.
Por outro lado, segundo o artº 6º nº2 de idêntico diploma, o administrador deve instaurar acção judicial destinada a cobrar as quantias referidas no número anterior.
São estas últimas normas, que estabelecem a exequibilidade das actas de assembleia de condóminos que podem ser mais directamente visadas pela douta impugnação recursória.
Na exegese dessas citadas normas, concordamos com a orientação dos Ac.R.P. 2/6/98 Col.III/190 e Ac.R.L. 2/3/04 Col.II/69: entendemos que a acta que delibera sobre o montante em concreto da dívida que cada condómino possui para com o condomínio se inscreve na finalidade, na ratio, daquele artº 6º nº1.
O objectivo legal foi o de evitar a propositura de acções declarativas, no âmbito das relações de condomínio, por forma a tornar mais eficaz o regime da propriedade horizontal – cf. o preâmbulo do D-L nº 268/94.
Como assim, não é apenas a acta que prevê contribuições para o condomínio que pode constituir título executivo.
Todavia, se essa acta que prevê as citadas contribuições para o condomínio pode não ser condição suficiente, ela é condição necessária para a apresentação do título executivo.
Uma acta que se limita a descrever um débito, não acompanhado das actas que o prevêem, contém um elemento acessório - a menção da dívida concreta, mas falta-lhe, de acordo com o artº6º nº1 D-L nº 268/94, o elemento principal, que é a deliberação da assembleia de condóminos quanto à fixação do montante das contribuições e respectivo prazo de pagamento.
Desta forma, como adequadamente se doutrinou no Ac.R.P. 13/9/2012, pº 4222/10.8TBGDM-A.P1, da base de dados oficial, relatado pelo Desemb. Amaral Ferreira, só por si, essa acta não pode servir de base à presente execução.
Na verdade, extrai-se do teor do citado artº6º nº1 que “a força executiva da acta não depende de nela se fazer necessariamente constar o montante determinado, concreto, certo, da dívida de cada condómino”, mas tal força executiva extrai-se antes do critério que permita que esse valor se determine, a achar pelo confronto da acta que o preveja.
Desta forma, se a acta pode conter o valor global devido ao condomínio (seja por contribuições correntes, seja para realização de despesas de conservação ou fruição das partes comuns, ou para pagamento de serviços de interesse comum), ela deve permitir que a cada condómino, pela aplicação da permilagem da sua fracção ao valor global, saber qual o montante que lhe toca (se outro critério não for expressamente deliberado).
A acta constitui título executivo apenas se se mostrar acompanhada da deliberação da assembleia que fixa a obrigação exequenda, como o impõe a lei que criou este concreto título executivo.
E não é isso que se verifica no caso da obrigação exequenda – sendo certo que existe descriminação de valores por períodos temporais, quanto a alguns dos condóminos em falta, já quanto aos ora Oponentes nada é dito, tendo sido aprovado um valor global em falta, cujo detalhe ou origem se ignora.
Como se exprimiu o Ac.R.P. 16/6/09, pº 12447/06.4YYPRT-B.P1, também in www.dgsi.pt, relatado pelo Desemb. Rodrigues Pires, a acta dada à execução contem o que se pode designar como elemento acessório – a menção da dívida concreta, mas falta-lhe, de acordo com o artº 6º nº1 D-L nº 268/94, de 25.10, o elemento principal que é a deliberação da assembleia de condóminos quanto à fixação do montante das contribuições e respectivo prazo de pagamento; como tal, só por si, essa acta não pode servir de base à presente execução”.
No mesmo sentido, veja-se ainda, sem preocupação de exaustividade, o Ac.R.P. 4/6/09, pº 1139/06.4TBGDM-A.P1, relatado pelo Desemb. José Ferraz, Ac.R.L. 2/5/2013, pº 2568/10.4TBCSC-A.L1-8, relatado pela Desembª Carla Mendes, e Ac.R.L. 30/6/2011, pº 13722/10.9YYLSB.L1-6, relatado pelo Desemb. Ascensão Lopes.
Como se exprimiu igualmente o Ac.R.L. 11/7/2013, pº 10090/12.8TCLRS.L1-7, relatado pela Desembª Ana Resende, o que importa como título é a acta de onde se extraia o montante da comparticipação de cada condómino, podendo o montante total em dívida constar, ou não, da acta dada à execução, pois que tal montante não passa, para os efeitos da execução, de um mero exercício de liquidação.
A jurisprudência tem aliás admitido a possibilidade da execução da deliberação que liquide o montante em dívida, desde que correctamente discriminado pelos prazos e valores parciais em causa – assim, Ac.R.C. 20/6/2012, pº 157/10.2TBCVL-A.C1, relatado pelo Desemb. Carlos Gil.
Neste sentido e nesta parte, a impugnação recursória merece acolhimento.

Resumindo a fundamentação:
I – As despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do condomínio constam de um orçamento, sendo depois repartidas pelos condóminos, geralmente em prestações mensais, nos termos do artº 1424º CCiv, e, por isso, renovam-se anualmente, enquanto durar o condomínio – artºs 1424º e 1431º, prescrevendo no prazo de cinco anos – al. g) do artº 310° CCiv, e o prazo da prescrição começa a correr da data em que a prestação pode ser exigida — nº 1 do artº 306º.
II – Na exegese do disposto no artº 323º nº2 CCiv, entende-se que as razões de índole processual ou de organização judiciária irrelevam para a imputação de responsabilidade no atraso da citação ao requerente; tal é o caso de a citação se ver delongada pela necessária precedência da penhora.
III – Nos termos do artº6º nº1 D-L nº 268/94, a força executiva da acta da assembleia de condóminos não depende de nela se fazer necessariamente constar um montante liquidado, concreto, certo, da dívida de cada condómino, mas tal força executiva extrai-se antes do critério que permita que esse valor se determine, a achar pelo confronto da acta que o preveja.
IV – A acta que aprova o valor global em dívida por parte de determinado condómino apenas constitui título executivo se acompanhado da acta ou actas que prevejam tal valor ou desde que essa sobredita acta descrimine, por períodos e valores intermédios, as quantias em causa.

Dispositivo (artº 202º nº1 da Constituição da República):
Julga-se procedente, por provado, o interposto recurso de apelação, e, como tal, revoga-se a douta sentença recorrida, julgando-se procedente a interposta oposição á execução, com a consequente extinção da presente execução, na parte referente aos ora Recorrentes.
Custas pelo Apelado.

Porto, 27/V/2014
Vieira e Cunha
Maria Eiró
João Proença