Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
1860/08.2TBPRD-4.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: MADEIRA PINTO
Descritores: FUNDO DE GARANTIA DOS ALIMENTOS DEVIDOS A MENORES
PENSÃO DE ALIMENTOS A FAVOR DO MENOR
Nº do Documento: RP201405151860/08.2TBPRD-4.P1
Data do Acordão: 05/15/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO.
Decisão: ALTERADA.
Área Temática: .
Sumário: I- O pagamento de prestação de alimentos a menores através do Estado quando o progenitor/a tenha situação económica que não lhe permite pagar a prestação, sem violar o seu mínimo de sobrevivência ou se ignore totalmente a situação económica daquele e até o paradeiro, deve ser assunto a merecer a devida atenção do legislador, cabendo a este definir a política social que entender adequada a esta situação, no âmbito da sua competência exclusiva e de acordo com as prioridades definidas politicamente.
II- A nós, enquanto julgador não nos cabe definir essa política social, nem subverter o sistema “ficcionando” uma situação económica do progenitor/a a quem cabe prestar alimentos e, dessa forma, fixar uma pensão alimentar que não é adequada à realidade provada, apenas com base num pretenso superior interesse do menor, sem quadro legal.
III- O FGADM é um “fundo fechado”, constituído mediante pressupostos taxativos, para garantia dos alimentos devidos a menores antes fixados por decisão judicial ou equivalente, que o poder legislativo criou, com efeitos em 15. 10.1998 mas com entrada em vigor apenas em Janeiro de 2000 (artº 11º DL nº 164/99, de 13,95), com o OE de 2000, para garantir uma prestação autónoma mas substitutiva do progenitor/devedor originário. Todo o regime jurídico desta garantia tem como pano de fundo aquele fim: daí a sub-rogação, daí os reembolsos, daí a cessação da prestação a cargo do FGADM a partir do momento em que o obrigado a alimentos comece o pagamento das prestações.
IV- Poderá o poder legislativo criar prestações sociais/subsídios de protecção da infância e juventude, em termos gerais e abstratos de acordo com as opções político-legislativas, de futuro. Não podem é os tribunais, na falta de mecanismos legais em vigor, subverter o sistema político-constitucional e fazer integrar no FGADM situações de facto propositadamente simuladas ou que na previsão das normas que regulam este Fundo, nelas não têm cobertura.
Reclamações:
Decisão Texto Integral:
Processo nº 1860/08.2TBPRD-4.P1(apelação) 3ª Secção
Relator: Madeira Pinto (533)
Adjuntos: Carlos Portela
Pedro Lima da Costa
*
1. Relatório
No processo de alteração da regulação do exercício das responsabilidades parentais dos menores B........ e C……, filhos de D….. e de E……, que corre os seus termos pelo 3º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Paredes, por sentença proferida em19.02.2013, transitada em julgado, foi homologado acordo dos progenitores de regulação das responsabilidades parentais daquelas menores, tendo sido fixada a pensão de alimentos no valor mensal de 50,00€, a favor de cada um dos menores, e a pagar mensalmente ao pai dos menores, por qualquer meio idóneo, até ao dia 10 de cada mês seguinte ao que disse respeito, ao qual os menores ficaram confiados.
Por requerimento de 16.05.2013, veio o pai dos menores deduzir incidente de incumprimento, ao abrigo dos artºs 146º, al. d) e 181º, ambos da OTM, contra a progenitora dos menores, por falta de pagamento daquela prestação de alimentos desde a data em que foi fixada e era devida, no valor global de 300,00€. Conclui, requerendo que sejam realizadas as necessárias diligências com vista ao cumprimento coercivo e, caso não seja possível este, fazer intervir o Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores.
Ouvida a requerida para alegar em dez dias o que tivesse por conveniente, nada veio dizer. Tendo vista no processo, o Ministério Público requereu a realização de diligências de prova da situação económica da mãe dos menores e do agregado familiar onde as menores residem, o que foi determinado judicialmente.
Em nova vista (fls 23) o Ministério Público, requereu que, julgado procedente o incumprimento da devedora originária, deverá ser ordenado o pagamento da prestação de alimentos a pagar pelo Estado, através do Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores, a favor do progenitor.
Em 06.12.2013 foi proferido decisão (despacho e não sentença, por força do disposto no artº 152º, nºs 1 e2 NCPC) que, concluindo não ser possível obter a cobrança dos alimentos em dívida pala via do artº 189º OTM, julgou verificada a impossibilidade da progenitora pagar a pensão de alimentos devidas aos filhos menores nos termos do artº 189º OTM e determinou, de seguida, a prestação a pagar pelo FGAM em substituição da dita progenitora, à luz do disposto na Lei nº 75/98, de 19.11 e do DL nº 164/99, de 13.5, com as alterações introduzidas pelo artº 183º, da Lei nº 66-B/2012, que aprovou o Orçamento de Estado de 2013 e artº 17º da Lei nº 64/2012, de 20.12, que procedeu à segunda alteração à Lei nº 64-B/2011, de 30.11, que havia procedido à primeira alteração à mesma Lei que aprovou o OE para 2013, fixando-a em 1UC (102,00€) mensais, para cada um dos menores, a prestar pelo Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores, em substituição da mãe, quantias essas a remeter ao pai das menores, pelo IGFSS, na qualidade de gestor do FGAM, com a obrigação deste de renovar a prova de manutenção dos pressupostos para a atribuição daquela prestação social, nos termos previstos na Lei 75/98, de 19.11 e DL nº 164/99, de 13.5.
Para tal, foram dados como provados os seguintes factos e que esta Relação aceita:
a) Nos autos de alteração das responsabilidades parentais que constituem o Apenso A, os menores B….. e C…. ficaram entregues à guarda do pai, tendo a progenitora ficado de contribuir com € 50,00 mensais a favor de cada um dos filhos, acordo esse que foi homologado por sentença transitada em julgado;
b) A progenitora nunca mais pagou qualquer prestação alimentícia desde Abril de 2013;
c) O progenitor reside na companhia dos filhos, da companheira, dos dois filhos desta e da menor F….., irmã consanguínea dos menores;
d) O agregado aufere, no momento, € 200,00 a título de prestação alimentícia devida aos filhos da companheira do progenitor; e tem despesas de € 690,00 mensais;
e) O progenitor aufere, actualmente, um subsídio de desemprego com termo provável em Fevereiro de 2014, no valor de € 419,10 mensais;
f) A progenitora não tem rendimentos;
Pela primeira vez notificado para intervir nos autos, através da notificação deste despacho, veio o Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, IP, entidade que gere o FGAM, interpor o presente recurso, admitido e processado como apelação, com subida imediata e efeito meramente devolutivo, apresentando. nas suas alegações as seguintes CONCLUSÕES:
I. Na douta decisão recorrida, considerou-se provado que “a) Nos autos de alteração das responsabilidades parentais que constituem o Apenso A, os menores B….. e C….. ficaram entregues à guarda do pai, tendo a progenitora ficado de contribuir com ) 50,00 mensais a favor de cada um dos filhos, acordo esse que foi homologado por sentença transitada em julgado;,”.
II. Como decorre da douta decisão em recurso, na decisão proferida nos autos de alteração das responsabilidades parentais não foi fixada à progenitora obrigada a prestar alimentos a obrigação de actualização da pensão de alimentos, nem sequer é estabelecido que tal pensão seria alvo de actualização.
III. Na decisão recorrida determinou-se “… que o Fundo de Garantia dos Alimentos Devidos a Menores proceda ao pagamento, em substituição do progenitor, a título de alimentos aos menores B….. e C….., no montante de 1 UC para cada um, …”.
IV. Verifica-se, assim, que pelo o Tribunal “a quo” foi atribuída uma prestação alimentar a ser suportada pelo FGADM (H 204,00 – 2 x H102,00), de valor bem diferente do fixado judicialmente à progenitora em incumprimento (H 100,00 – 2 x H 50,00).
V. Pela Lei nº 75/98, de 19 de Novembro, alterada pelo art. 183º da Lei 66-B/2012, de 31 de Dezembro, foi constituído o Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores (FGADM), o qual se encontra regulado pelo DL nº 164/99, de 13 de Maio, com a redacção dada pela Lei 64/2012, de 20 de Dezembro de 2012.
VI. Resulta daqueles normativos que a obrigação do FGADM é a de assegurar/garantir os alimentos devidos a menores, quando - entre outros requisitos - a pessoa judicialmente obrigada a prestar alimentos não satisfizer as quantias em dívida pelas formas previstas no art. 189º do DL 314/78, de 27 de Outubro.
VII. Verifica-se, assim, que a obrigação legal de prestar alimentos pelo FGADM é diferente da obrigação judicial de os prestar, sendo que só existe obrigação judicial desde que o tribunal constitua alguém como devedor de alimentos, isto é, que condene alguém em determinada e quantificada prestação alimentar.
VIII. Dos normativos que regulam a intervenção do Fundo, resulta que o Estado somente se substitui ao obrigado enquanto este não iniciar ou reiniciar o cumprimento da sua obrigação e pelo valor fixado judicialmente para esta.
IX. Tal significa que o FGADM não garante o pagamento da prestação de alimentos não satisfeita pela pessoa judicialmente obrigada a prestá-los, antes assegurando, face à verificação cumulativa de vários requisitos, o pagamento de uma prestação “a forfait” de um montante por regra equivalente – ou menor – ao que fora judicialmente fixado. – cfr. Remédio Marques, in “Algumas Notas Sobre Alimentos (Devidos A Menores”).
X. Quer isto dizer que o FGADM – tal como decorre quer da letra quer do espírito da lei - apenas assegura/garante o pagamento dos alimentos judicialmente fixados, pelo que,
XI. O FGADM não poderá ser condenado no pagamento de uma prestação substitutiva de valor superior à fixada ao devedor originário.
XII. Nos casos em que o FGADM paga ao menor/credor a prestação substitutiva de alimentos verifica-se uma situação de sub-rogação legal, concretamente prevista no nº 1 do art. 5º do DL 164/99, de 13 de Maio, com a redacção dada pela Lei 64/2012, de 20 de Dezembro de 2012, e não uma situação de exercício de direito de regresso contra o devedor da prestação alimentícia.
XIII. É certo que, não obstante constituírem realidades jurídicas distintas, o exercício quer do direito de sub-rogação, quer do direito de regresso pressupõe sempre, por parte do respectivo titular, o cumprimento da obrigação.
XIV. No entanto, a sub-rogação, como forma de transmissão das obrigações, atribui ao subrogado solvens o mesmo direito do credor, enquanto que o direito de regresso é um direito nascido ex novo na esfera jurídica daquele que extinguiu, ou à custa de quem foi extinta a obrigação, e esta distinção é importante para o caso dos autos.
XV. A prestação paga pelo FGADM é autónoma relativamente à do obrigado a alimentos, e, para a sua fixação, é necessária a verificação do incumprimento e da impossibilidade da sua satisfação por este último, pelo que,
XVI. É que forçoso concluir que o FGADM, enquanto entidade sub-rogada, quando procede ao pagamento da prestação de alimentos, o faz no cumprimento de uma obrigação própria e não alheia, e, assim sendo, o Fundo deve substituir-se ao devedor originário apenas desde a notificação da decisão que determina a sub-rogação.
XVII. A este respeito, é jurisprudência dominante que o montante da prestação de alimentos a cargo do FGADM está limitado pela fixada ao progenitor do menor, como bem decidiram recentemente o Tribunal da Relação de Coimbra – Proc. 3819/04 – 2ª Secção Cível - Acórdão de 19/02/2013; o Tribunal da Relação de Lisboa - Proc. 1529/03.4TCLRSA.
L2-6 – 6ª Secção - Acórdão de 08/11/2012; Proc. 2214/11.9TMLSB-A.L1 – 2ª Secção – Acórdão de 12/12/2013; e Proc. 122/10.0TBVPV-B.L1 – 6ª Secção – Acórdão de 19/12/2013; o Tribunal da Relação de Guimarães Proc. 2740/12.2TBVCT-A.G1 – 2ª Secção – Decisão Singular de 12/11/2013; e o Tribunal da Relação do Porto - Proc. 30/09 – 5ª Secção - Acórdão de 25/02/2013; e Proc. 3609/06.5TJVNF-AP1 – 5ª Secção – Decisão Singular de 10/10/2013.
XVIII. Depois de pagar, o FGADM fica sub-rogado em todos os direitos do menor credor dos alimentos, sendo-lhe, pois, lícito exigir do devedor de alimentos uma prestação igual ou equivalente àquela com que tiver sido satisfeito o interesse do menor (credor), incluindo o direito de requerer execução judicial para reembolso das importâncias pagas.
XIX. Tal significa que o FGADM é apenas um substituto do devedor dos alimentos, pelo que a sua prestação não pode exceder a fixada para o mesmo.
XX. Acresce que a sub-rogação não pode exceder a medida da sub-rogação total, porquanto, se o terceiro paga mais do que ao devedor competia pagar, ele não tem o direito de exigir do devedor o reembolso pelo excesso e só poderá exigir do credor a restituição do que este recebeu indevidamente.
XXI. Dito de outra forma, não pode o terceiro, satisfazendo o credor, aumentar o montante do crédito contra o devedor – vide Vaz Serra in BMJ 37/56 – o que implica que, se o terceiro pagou mais do que era devido pelo devedor, no excesso não opera a sub-rogação e, portanto, o direito ao reembolso, como se retira do disposto no nº 1 do art. 593º do CC.
XXII. Se a prestação social pudesse ser fixada em valor superior não se justificaria racionalmente que a lei a fizesse depender do incumprimento pelo obrigado, antes deveria depender apenas e tão só as necessidades actuais do menor.
XXIII. Aceitar que a prestação fosse superior seria instituir-se, sem apoio normativo, uma prestação social em parte não reembolsável e ainda por cima sem que o credor a tenha de restituir como “indevida” no sentido do art. 10º do Decreto-lei 164/99, com a redacção introduzida pela Lei n.º 64/2012, de 20 de Dezembro.
XXIV. Assim, não tem suporte legal a fixação de uma prestação alimentícia a cargo do FGADM de valor superior à fixada à progenitora ora devedora, pelo que o FGADM apenas se deverá considerar obrigado a assumir essa mesma prestação em substituição do progenitor incumpridor, nos precisos termos em que a este foi aquela judicialmente fixada.
XXV. Não se pode, assim, concordar com o decidido pelo Tribunal a quo na parte em que se altera a prestação substitutiva de alimentos de responsabilidade do FGADM, por diferente da fixada judicialmente à progenitora, demonstrando-se como impossível a satisfação da prestação por falta de preenchimento de requisito legal,
XXVI. Sendo que, caso se mantenha tal decisão, a obrigação e responsabilidade de prestar alimentos deixará de ser imputável à progenitora incumpridora passando a ser única e exclusivamente da responsabilidade do FGADM, o que de todo se demonstra impossível pelas razões supra descritas.
XXVII. Em abono do que o apelante aqui sustenta, vem, a Orientação da Procuradoria Distrital de Lisboa, resultante do 2º Encontro de Magistrados do MP da Jurisdição de Família e Menores, realizado a 27 de Novembro de 2008, do seguinte teor: “O valor da prestação a cargo do FGADM não pode exceder o valor da prestação do devedor originário de alimentos, uma vez que, por força do disposto no nº 3 do artigo 6º da Lei nº 75/98, existindo sub-rogação legal, com vista à garantia do respectivo reembolso, o seu regime jurídico não contempla que uma parte do efectivamente pago não seja reembolsável.” – (disponível em http://www.pgdlisboa.pt/leis/lei_mostra_articulado.php?nid=708& tabela=leis).
XXVIII. E, como se disse supra, a recente Decisão Singular de 10/10/2013, proferida pelo Tribunal da Relação do Porto – 5ª Secção, no Proc. 3609/06.5TJVNF-AP1, cuja fundamentação de direito, pela sua clareza e relevância, com a devida vénia, se reproduz.
“3. Fundamentos de direito
3.1. O regime aplicável
Dispõe o artigo 5º do Decreto-lei nº 164/99 de 13 de Maio (com as alterações introduzidas pelo DL nº 70/2010, de 16/06, e pela Lei nº 64/2012, de 20/12):
1 - O Fundo fica sub-rogado em todos os direitos do menor a quem sejam atribuídas prestações, com vista à garantia do respectivo reembolso,
2 O IGFSS, IP, após o pagamento da primeira prestação a cargo do Fundo, notifica o devedor para no prazo máximo de 30 dias úteis a contar da data da notificação, efectuar o reembolso.
3 - Decorrido o prazo previsto no número anterior sem que o reembolso tenha sido efectuado, o IGFSS, IP, acciona a sistema de cobrança coercivo das dívidas à segurança social, mediante emissão da certidão de dívida respectiva.
São os seguintes os requisitos cumulativamente exigidos para a atribuição de prestações de alimentos nos termos da Lei nº 5/98 de 19/11, face às alterações introduzidas no DL 164/99 de 13/05 pelo DL 70/2010 de 16/06 e pela e pela Lei nº 64/2012, de 20/12: i) a existência de uma decisão judicial que tenha fixado os alimentos devidos a menores (nos termos do disposto na 1ª parte da alínea a) do nº 1 do art. 3° do DL 164/99 de 13 de Maio); ii) que o menor beneficiário resida em território nacional; iii) que não seja possível a satisfação pelo devedor das quantias em dívida, pelas formas previstas no art. 189° da OTM (2ª parte da alínea a) do nº 1 do art. 3º do DL 164/99 de 13 de Maio); iv) que o menor não tenha rendimento ilíquido superior ao valor do indexante dos apoios sociais (IAS) nem beneficie nessa medida de rendimentos de outrem a cuja guarda se encontre, entendendo-se que o alimentado não beneficia de rendimentos de outrem a cuja guarda se encontre, superiores ao valor do IAS, quando a capitação do rendimento do respectivo agregado familiar não seja superior àquele valor (art. 3º, nº 1, alínea b) e nº 2 do DL 164/99 de 13/05).
Como se refere no acórdão da Relação de Lisboa, de 3.03.2011 (Proferido no processo 18-B/2003-6, acessível no site da DGSI), a prestação de alimentos a cargo do Fundo de Garantia dos Alimentos Devidos a Menores supõe uma prestação de alimentos a cargo dos progenitores e não paga, voluntária ou coercivamente (art. 1º Lei nº 75/98) e só subsiste enquanto aquela e o seu não cumprimento subsistirem (art. 3º, nº 4, Lei nº 75/98. e art. 3º, nº1, Dec. Lei nº 164/99), constituindo a prévia decisão judicial sobre quem é a pessoa obrigada a alimentos, e a fixação dessa prestação, condição sine qua non para que possa ser solicitado o pagamento da prestação alimentar ao FGADM.
Cremos que não poderia ser de outra forma, face à sub-rogação legal prevista no nº 1 do artigo 5º do DL 164/99 de 13/05.
O nosso ordenamento jurídico prevê duas espécies de sub-rogação: a sub-rogação convencional e a sub-rogação legal, a sub-rogação legal é a que se produz directamente por força da lei, só existindo, portanto, na medida em que esta a permita. (Vide Almeida Costa, Direito da Obrigações, 12ª edição, 2011, pág. 822 a 826).
Como preceitua o art. 592º, nº 1 do Código Civil, fora dos casos de sub-rogação convencional e de outras hipóteses especialmente previstas por lei, “o terceiro que cumpre a obrigação só fica sub-rogado nos direitos do credor quando tiver garantido o cumprimento, ou quando, por outra causa, estiver directamente interessado na satisfação do crédito”.
O nº 1 do artigo 593º do Código Civil estabelece os efeitos da sub-rogação, quer voluntária, quer legal, nestes termos: “O sub-rogado adquire, na medida da satisfaçãodada ao direito do credor, os poderes que a este competiam”.
Em suma, o sub-rogado fica investido na posição jurídica até aí atribuída ao credor darelação obrigacional.
Face à consequência jurídica enunciada, poderá afirmar-se que ocorre uma verdadeira substituição de titularidade (no étimo latino sub rogare, sub rogatio, está contida a ideia de substituição, ou seja, o facto de uma pessoa tomar o lugar da outra, ssumindo a sua posição) da posição jurídica objecto da sub-rogação, como se conclui no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 12.09.2013 (Proferido no processo 749/08.0TBTNV.C1.S1, acessível no site da DGSI): “O direito de sub-rogação traduz a substituição do credor na titularidade do direito a uma prestação fungível, pelo terceiro que cumpre em lugar do devedor (ou que faculta a este os meios necessários ao cumprimento). [...] o crédito não se extingue, antes de transfere para o terceiro que cumpre em vez do devedor. Mantém-se, por conseguinte, na titularidade do terceiro, o mesmo direito de crédito de que era titular o anterior credor”.
Com esta conclusão (substituição na titularidade do direito e manutenção na titularidade do sub-rogado do “mesmo direito de crédito de que era titular o anterior credor”, somos chegados à questão fulcral debatida nos autos, equacionada nestes termos: poderá o FGADM ficar vinculado ao pagamento e, consequentemente, subrogado numa prestação superior àquela que foi fixada para o credor?
Cremos que não, sob pena de total desvirtuação da figura jurídica da sub-rogação.
É este o entendimento que tem prevalecido na jurisprudência (Em abono da sua tese, o apelante cita um acórdão deste Tribunal e desta Secção (Proc. 30/09 — 5ª secção, acórdão de 25.02.2013, não acessível no site da DGSI), como ocorreu com o acórdão da Relação de Coimbra, de 19.02.2013 (Proferido no processo nº 3819/04.0TBLRA-C.Cl, acessível no site da DGSI), sumariado nestes termos: «A prestação a suportar pelo Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores (FGADM), prevista no artigo 1º, da Lei nº 75/98, de 19 de Novembro (Garantia de Alimentos Devidos a Menores), não pode ser superior à prestação colocada a cargo do devedor de alimentos (No mesmo sentido, veja-se
o acórdão da Relação de Coimbra, de 6.06.2006, proferido no Processo nº 419/06, parcialmente sumariado assim: “Nos termos da Lei nº 75/98 e do DL nº 164/99, o Tribunal pode, dentro do máximo mensal de 4UC. fixar a cargo do FGADM uma prestação mensal de montante igual ou inferior mas não superior à fixada anteriormente a cargo do obrigado a alimentos”).
Consta do sumário do acórdão citado, uma conclusão que nos revela o absurdo do entendimento contrário: “Se a prestação a pagar pelo FGADM pudesse ser superior à prestação do devedor, então a lei devia prever a hipótese, mas não prevê, que, tendo o devedor retomando o pagamento da prestação de alimentos se porventura esta prestação fosse inferior à que vinha sendo paga pelo FGADM, esta entidade continuaria vinculada a pagar alimentos ao menor, agora no montante equivalente à diferença entre a prestação que o FGADM estava a pagar e aquela que a devedor recomeçou a pagar, ao invés de prever simplesmente, nesta hipótese, a cessação da obrigação a cargo do FGADM».
Em suma, salvo o devido respeito, tendo mantido intocado o valor da prestação devida pelo requerido, progenitor da menor, de ) 85,98 mensais (actualizada com referência à data da decisão recorrida), não podia a sentença fixar em valor superior () 100 mensais), a prestação a pagar pelo Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores, à progenitora G….., em substituição do progenitor.
Deverá, em consequência, ser revogada a sentença na parte em que condena o FGADM em valor superior ao fixado ao progenitor.
Decorre do exposto, salvo o devido respeito a manifesta procedência do recurso.”
(Reproduzimos).
XXIX. Ao decidir como decidiu, violou o Mmo. Juiz a quo, o disposto no nº 2 do art. 2º, no nº 5 do art. 3º, e no nº 1 do art. 5º do DL 164/99, de 13 de Maio, todos com a redacção dada pela Lei 64/2012, de 20 de Dezembro de 2012.
Nestes termos e demais de direito, deve ser dado provimento ao presente recurso declarando-se que o montante da prestação de alimentos a cargo do FGADM está limitado pelo valor da prestação fixada judicialmente à progenitora do menor, e, consequentemente, deve ser revogada a douta decisão recorrida na parte que estabelece uma prestação substitutiva de alimentos a pagar pelo FGADM superior à fixada judicialmente para a obrigada a alimentos, tudo com inerentes consequências legais.
No entanto, V. Exas. apreciando e decidindo farão a costumada JUSTIÇA.
Devidamente notificado, em representação dos menores, foram apresentadas contra alegações de recurso pelo Ministério Público, concluindo pela manutenção do julgado.
Cumpre decidir.
*
2. DO RECURSO
2.1. os Factos
Com relevo para a decisão do recurso, considero provados os factos acima referidos decorrentes da tramitação processual, que aqui dou por reproduzidos.
2.2.O DIREITO
Nos termos do art. 181º, n.º 1, da OTM, se, relativamente à situação do menor, um dos progenitores não cumprir o que tiver sido acordado ou decidido, pode o outro requerer ao tribunal as diligências necessárias para o cumprimento coercivo e a condenação do remisso em multa até € 250,00 e em indemnização a favor do menor ou do requerente ou de ambos.
Sempre entendemos que, quando o incumprimento diz respeito apenas a alimentos, deve aplicar-se o procedimento regulado no artigo 189º OTM., sendo o incidente processado nos próprios autos do processo onde foi regulado o poder paternal dado que o incumprimento previsto na norma do nº 1 do artº 181º OTM, diz respeito à “situação do menor”, devendo entender-se que apenas estarão aí em causa as situações de guarda/residência e visitas- neste sentido vide Ac RC de 28.01.1986, BMJ 353º, p.522 e AC RP de 21.12.2004, www.dgsi.pt , Rui Epifânio e António Farinha, OTM, Contributo para uma visão interdisciplinar do Direito de Menores e de Família, 2ª ed, Coimbra, Almedina, 1982.
Mesmo que assim se não entenda, e se entenda como Helena Bolieiro/Paulo Guerra, “A Criança e a Família –Uma Questão de Direito(s)”, Coimbra Editora, 2009, p.245, este incidente corre nos próprios autos judiciais onde foram reguladas as responsabilidades parentais e não por apenso, como in casu ororreu- artºs 147º, al f) e 153º OTM…mas, nenhum mal ao mundo vem por esse modo de processar e que parece vulgarizar-se, tendo sentido em incidentes volumosos (que não é o presente caso).
Trata-se de um procedimento que visa o cumprimento coercivo, eficaz e célere, das obrigações dos progenitores em relação aos seus filhos resultantes de decisão judicial, mesmo que homologatória de acordo dos progenitores.
Assim, o procedimento tem, em primeira linha, uma natureza tipicamente executiva, embora e em segunda linha, em virtude do exercício legítimo do contraditório, possa ter uma fase declarativa inicial.
Contudo e em nosso entender, essa fase declarativa inicial só poderá ter como fundamento legítimo a inexistência do incumprimento ou a inexistência de mora nesse incumprimento, nos termos da lei civil.
Já não poderá ter como fundamento aquele circunstancialismo superveniente que, em abstracto, justificaria, por exemplo, uma revisão do anteriormente acordado ou decidido por via do procedimento de alteração da regulação do exercício do poder paternal.
Assim como não poderá ter como fundamento qualquer circunstância que esteja em manifesta oposição com aquelas que ficaram apuradas no processo em que a decisão ou o acordado foi consignado.
Por outro lado, relativamente às prestações de alimentos devidas, cujo incumprimento esteja atestado, os meios de as tornar coercivas que o tribunal dispõe neste tipo de procedimento são apenas e tão-só aqueles que estão previstos no art. 189º da OTM.
Tal significa que, se o devedor não se enquadrar nas situações previstas neste último normativo citado, não restará outra alternativa ao credor senão lançar mão da respectiva execução de alimentos ou acção comum, dado que o tribunal não pode accionar os meios coercivos que tem ao seu dispor neste tipo de procedimento, por uma manifesta impossibilidade prática.
No caso dos autos, houve lugar ao procedimento do artº 181º OTM contra a progenitora das menores incumpridora da pensão de alimentos judicialmente fixada, a requerimento do progenitor guardião, ao abrigo do disposto nos artºs 183º, nº 3 e 189º OTM, tendo sido realizadas diligências de prova diversas, com vista a apurar a situação económica do agregado familiar onde os menores vivem com o pai e sobre a situação económica da requerida mãe.
Destas informações, quanto à requerida, resulta que esta não tem contribuições do trabalho para a Segurança Social, nem aufere desta quaisquer subsídios ou pensões e que se ignoram quaisquer outros rendimentos ou bens.
Ora, perante tal cenário fáctico, existente na data da decisão recorrida, revela-se impossível a cobrança dos alimentos devidos pela progenitora aos filhos menores pela via do incidente de incumprimento através do procedimento pré-executivo previsto no artº 189º OTM, não sendo possível ordenar o desconto e adjudicação adequados, tanto mais que a requerida não fica com um remanescente após pagamento das despesas que lhe permitam aquilo que é tido como o mínimo de sobrevivência equivalente ao indexante de Apoios Sociais (IAS), que é um valor base que serve de referência ao cálculo e actualização das contribuições, pensões e demais prestações sociais, no valor de 419.22€, inalterado desde 2009. No Orçamento de Estado para 2013, ficou definida a manutenção deste valor pelo quarto ano consecutivo. Como é sabido, o IAS veio substituir a Retribuição Mínima Mensal Garantida (RMMG) enquanto referencial determinante da fixação, cálculo e actualização das contribuições, das pensões e outras prestações sociais. Foi criado em 2006 pela Lei n.º 53-B/2006, de 29 de Dezembro, estando em vigor desde o início de 2007.
Constatada esta situação fáctica pelo tribunal recorrido, prosseguiram os autos para a decisão de fixação da prestação de alimentos devidos aos menores a pagar pelo FGAM, nos próprios autos de incidente de incumprimento de pensão de alimentos, conforme requerido pelo pai dos menores.
Em sede deste incidente, deve o tribunal proceder às diligências que considere necessárias, correndo este nos próprios autos e estando sujeito às regras do processo de jurisdição voluntária - artº 150º e 153º da OTM, 1409º s CPC. Entre tais diligências é obrigatório inquérito sobre as necessidades do menor, de acordo com o disposto no artº 3º, nº3 da Lei nº 75/98 e artº 4º, nº 1, do respectivo diploma regulamentar (DL nº 164/99, de 13.05), inquérito esse a que houve lugar e constando o seu relatório de fls. 13 a 16.
Deveria ainda haver audição prévia do IGFSS, I.P., em obediência aos princípios do contraditório, da audição prévia e da igualdade das partes, o que in casu (como habitualmente) não foi cumprido - artºs 3º, nºs 1, 2 e 3 e 4º NCPC - vide Direito das Crianças e dos Jovens, Manuel Lopes Madeira Pinto (ora relator), Livraria Petrony, 2010, p. 92
No final, o tribunal proferirá decisão, fixando a prestação devida pelo FDGAM aos menores, a título de alimentos e em substituição da devedora originária (progenitora), no valor mensal que julgar adequado às necessidades das menores e desde que se verifiquem os pressupostos legais necessários previstos nos artºs 1ºda Lei nº 75/98 e 3º DL nº 164/99, de 13.05 (diploma regulamentar), sem prejuízo da fixação de prestação provisória em situação de urgência, ao abrigo do disposto no artº 3º, nº 2, da Lei nº 75/98.
De referir que o FGAM fixa com um direito de subrogação legal nesse montante mensal contra o devedor originário que não excede a obrigação líquida deste- artº 6º, nº 3, da Lei nº 75/98 e artº 6º DL nº 164/99).
Conforme bem refere o Acórdão desta Relação disponível no site da Relação do Porto, Sumários nº 35, in agravo nº 887/06.3TBPNF.P1, 2ª Secão, de 08/09/2009 (Cândido Lemos):
“I- A obrigação de prestação de alimentos a menor, assegurada pelo Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores, em substituição do devedor, nos termos previstos nos artigos 1º da Lei no 75/98, de 19 de Novembro, e 2° e 4°, n°5, do Decreto-Lei n° 164/99, de 13 de Maio, só nasce com a decisão que julgue o incidente de incumprimento do devedor originário e a respectiva exigibilidade só ocorre no mês seguinte ao da notificação da decisão do tribunal, não abrangendo quaisquer prestações anteriores.”
II- A jurisprudência uniformizada do Supremo Tribunal de Justiça vincula as instâncias inferiores [arts. 678° n° 2, c), 732° - B, n° 4 do Código de Processo Civil”
Nos casos em que o FGADM paga ao menor/credor a prestação substitutiva de alimentos verifica-se uma situação de sub-rogação legal, concretamente prevista no nº 1 do art. 5º do DL 164/99, de 13 de Maio, com a redacção dada pela Lei 64/2012, de 20 de Dezembro de 2012, e não uma situação de exercício de direito de regresso contra o devedor da prestação alimentícia. É certo que, não obstante constituírem realidades jurídicas distintas, o exercício quer do direito de sub-rogação, quer do direito de regresso pressupõe sempre, por parte do respectivo titular, o cumprimento da obrigação. No entanto, a sub-rogação, como forma de transmissão das obrigações, atribui ao sub-rogado solvens o mesmo direito do credor, enquanto que o direito de regresso é um direito nascido ex novo na esfera jurídica daquele que extinguiu, ou à custa de quem foi extinta a obrigação, e esta distinção é importante para o caso dos autos.
A prestação paga pelo FGADM é autónoma relativamente à do obrigado a alimentos, e, para a sua fixação, é necessária a verificação do incumprimento e da impossibilidade da sua satisfação por este último, pelo que é forçoso concluir que o FGADM, enquanto entidade sub-rogada, quando procede ao pagamento da prestação de alimentos, o faz no cumprimento de uma obrigação própria e não alheia, e, assim sendo, o Fundo deve substituir-se ao devedor originário apenas desde a notificação da decisão que determina a sub-rogação.
Depois de pagar, o FGADM fica sub-rogado em todos os direitos do menor credor dos alimentos, sendo-lhe, pois, lícito exigir do devedor de alimentos uma prestação igual ou equivalente àquela com que tiver sido satisfeito o interesse do menor (credor), incluindo o direito de requerer execução judicial para reembolso das importâncias pagas. Tal significa que o FGADM é apenas um substituto do devedor dos alimentos, pelo que a sua prestação não pode exceder a fixada para o mesmo. Acresce que a sub-rogação não pode exceder a medida da sub-rogação total, porquanto, se o terceiro paga mais do que ao devedor competia pagar, ele não tem o direito de exigir do devedor o reembolso pelo excesso e só poderá exigir do credor a restituição do que este recebeu indevidamente. Dito de outra forma, não pode o terceiro, satisfazendo o credor, aumentar o montante do crédito contra o devedor – vide Vaz Serra in BMJ 37/56 – o que implica que, se o terceiro pagou mais do que era devido pelo devedor, no excesso não opera a subrogação e, portanto, o direito ao reembolso, como se retira do disposto no nº 1 do art. 593º do CC. Se a prestação social pudesse ser fixada em valor superior não se justificaria racionalmente que a lei a fizesse depender do incumprimento pelo obrigado, antes deveria depender apenas e tão só as necessidades actuais do menor.
Aceitar que a prestação fosse superior seria instituir-se, sem apoio normativo, uma prestação social em parte não reembolsável e ainda por cima sem que o credor a tenha de restituir como “indevida” no sentido do art. 10º do Decreto-lei 164/99, com a redacção introduzida pela Lei n.º 64/2012, de 20 de Dezembro.
Assim, não tem suporte legal a fixação de uma prestação alimentícia a cargo do FGADM de valor superior à fixada ao progenitor ora devedor, pelo que o FGADM apenas se deverá considerar obrigado a assumir essa mesma prestação em substituição do progenitor incumpridor, nos precisos termos em que a este foi aquela judicialmente fixada.
Decorre do disposto no artº 182, nº 1, da OTM e ainda do facto de as acções de regulação do exercício de poder paternal se inserirem nos processos de jurisdição voluntária, por força do artº 150º da OTM e artº 1411, nº 1, do Código de Processo Civil, que as decisões proferidas no âmbito destas acções são modificáveis. Mas são-no apenas quando seja alegada e comprovada a superveniência de circunstâncias que, constituindo alteração da factualidade anteriormente existente, tornem necessário alterar o então estabelecido, ou quando se verifiquem situações de incumprimento que justifiquem e aconselhem essa alteração. Vale isto por dizer, que o processo de alteração da responsabilidade paternal não pode ser utilizado para tentar ver reapreciado o acerto e adequação da decisão que fixou os aspectos do poder paternal.
Muito menos deve ser utilizado o “expediente” em voga nos tribunais de simular uma pensão alimentar de um dos progenitores (que ab initio não tinha condições para a prestar e muitas vezes ignorando-se a sua real situação económica e paradeiro para, logo de seguida, accionar o incumprimento via artºs 181 e 198º OTM, seguindo-se o pedido de atribuição de prestação pelo FGAM, com condenação deste (em prestação superior à do progenitor devedor) e sem sequer o GGFSS, que gere este FGAM ser ouvido nos autos, sendo apenas notificada de sucessivas decisões surpresa…para pagar apenas. Ao menos que lhe é concedido o direito de recurso.
O caso dos autos tem todas as nuances pela cronologia e situação fáctica apurada para se enquadrar nestas “novas regulações das responsabilidades parentais”, fugindo aos requisitos apertados da nova acção de alteração da regulação do poder paternal, prevista no artº 182º OTM.
É verdade que o presente processo é de jurisdição voluntária, sendo-lhe aplicáveis as disposições próprias do artº 182º OTM, as disposições especiais dos artºs 1409.° a 1411º e 302.° a 304 CPC, ex vi artº 150º OTM e, ainda, subsidiariamente as disposições gerais e comuns do processo civil. Mas, essa natureza de jurisdição voluntária não permite uma espécie de “vale tudo”.
Inexiste, no caso, qualquer dúvida sobre o preenchimento dos pressupostos para a intervenção do FGADM, apenas se discutindo a possibilidade da prestação social do FGADM, poder divergir (para mais) do valor da prestação alimentar a que o requerida está obrigada judicialmente a pagar ao pai dos filhos menores B…. e C….., com 13 e 11 anos de idade na data da elaboração do relatório social, a quem está confiada a sua guarda, conforme fora acordado e homologado por sentença, uma vez que, estando aquela obrigada ao pagamento da quantia mensal legal de 50,00€, por cada filho menor, o FGADM foi condenado na decisão recorrida a pagar a favor de cada menor uma prestação mensal no valor de 1UC, ou seja 102,00€.
Para o recorrente o valor da pensão não poderia ultrapassar o valor da pensão de alimentos fixada na 1.ª instância, por ser uma pensão substitutiva e garantia de pagamento dos alimentos judicialmente fixados, de tal modo que o Fundo fica, nos termos da lei, numa situação de sub-rogação legal nos direitos do menor a quem sejam atribuídas as prestações, tendo em vista a garantia do respectivo reembolso, ao abrigo do art.º 5.º, n.º 1, do DL n.º 164/99, de 13 de Maio. Embora reconhecendo que a prestação de alimentos a cargo do FGADM é autónoma relativamente à do obrigado a alimentos e sendo para a sua fixação necessária a verificação do incumprimento e da impossibilidade da sua satisfação por este último, o recorrente conclui que o montante da prestação de alimentos a cargo do FGADM está limitado pela fixada ao progenitor do menor, não podendo reembolsar mais do que aquilo de que este é devedor.
Já deixamos clara a nossa posição, mas desenvolvamos melhor aqui a questão expondo todos os nossos argumentos.
Do Preâmbulo do citado DL 164/99, de 13.05, que regulamenta a Lei nº 75/98, de 19.11, consta que a Constituição da República Portuguesa consagra expressamente o direito das crianças à protecção, como função da sociedade e do Estado, tendo em vista o seu desenvolvimento integral, bem como, ainda que assumindo uma dimensão programática, este direito impõe ao Estado os deveres de assegurar a garantia da dignidade da criança como pessoa em formação a quem deve ser concedida a necessária protecção. Desta concepção, resultam direitos individuais, desde logo o direito a alimentos, pressuposto necessário dos demais e decorrência, ele mesmo, do direito à vida, concretizando-se no acesso a condições de subsistência mínimas, o que, em especial no caso das crianças, não pode deixar de comportar a faculdade de requerer à sociedade e, em última instância, ao próprio Estado as prestações existenciais que proporcionem as condições essenciais ao seu desenvolvimento e a uma vida digna. Estabelece o art.º 5.º, n.º 1 daquele DL 164/99, que o FGADM fica sub-rogado em todos os direitos do menor a quem foram atribuídas prestações, com vista à garantia do respectivo reembolso, sendo que, de acordo com o art.º 7.º, o reembolso não prejudica a obrigação de prestar alimentos previamente fixada.
Delimitado o quadro normativo que enquadra a questão em discussão nos presentes autos, duas posições jurisprudenciais se perfilam quanto à resposta a dar à mesma:
Assim, defende uma determinada corrente jurisprudencial, convocando essencialmente em abono da posição que sustenta, a função substitutiva e subsidiária do Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores, que a obrigação deste nunca pode exceder a obrigação incumprida, e pela qual pugna o apelante no recurso aqui interposto. Seguem esta orientação os acórdãos da RL de 13.12.2007, proc. n.º 10407/2007-8, de 31.01.2008, proc. n.º 10848/2007-6, de 06.03.2008, proc. n.º 1608/2008-6, de 08.11.2012, proc. n.º 2135/11.5YXLSB-D.L1-6; da RC de 25.05.2004, proc. n.º 70/04, de 06.06.2006, proc. n.º 419/06 (com voto de vencido), de 06.06.2006 e de 19.02.2012, proc. n.º 3119/04.0TBLRA-C.C1; da RG de 12.01.2005, proc. n.º 2211/04-1, acessíveis in www.dgsi.pt., nosso relato de Ac de 25.3.2010 e acórdão relato de TOMÉ RAMIÃO, PROCº 3464/08.0TBAMD.L1-6 de 06-12-2011, acessíveis in www.dgsi.pt
Ainda, recentemente, defendem esta tese os Acórdãos do Tribunal da Relação de Coimbra – Proc. 3819/04 – 2ª Secção Cível - Acórdão de 19/02/2013 – do Tribunal da Relação do Porto - Proc. 30/09 – 5ª Secção - Acórdão de 25/02/2013 e de 192.2013 e Ac RL de Lisboa, de 08.11.2012., todos in www,dgsi,pt
Diga-se que na Relação do Porto há muitos outros acórdãos não publicados no site da dgsi que defendem esta mesma tese.
Já uma outra orientação jurisprudencial considera que o único limite da obrigação que recai sobre o Fundo de Garantia dos Alimentos Devidos a Menores é a que resulta dos art.ºs 2.º, n.º 1 da Lei nº 75/98 e do art.º 3.º, n.º 5 do DL n.º 164/99, designadamente, quando este último determina que as prestações a suportar pelo referido Fundo “…não podem exceder, mensalmente, por cada devedor, o montante de 1 IAS, independentemente do número de filhos menores”, nada obstando que excedam o valor das prestações incumpridas, desde que não ultrapasse aquele limite legal…e até há jurisprudência que admite prestação de alimentos superior à que era devida pelo(s) progenitor(es). Este entendimento podemos vê-lo acolhido, entre outros, nos Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 04.06.2009, proc. n.º 91/03.2TQPDL.S1 (com um voto de vencido); da RL de 11.07.2013, proc. nº 5147/03.9TBSXL-B.L1-2; da RE de 17.04.2008, proc. nº 3137/07-2; da RC de 09.10.2001, proc. n.º 1788/2001, de 05.03.2002, proc. n.º 3431/2001 (com voto de vencido), de 02.12.2003, proc. n.º 3265/03, de 24.06.2008, proc. n.º 29-A/2000.C1; desta Relação, de 24.02.2205, proc. n.º 0530542, de 27.06.2006, proc. n.º 0623392, de 18.06.2007, proc. n.º 0733397, de 08.03.2007, proc. n.º 0731266, de 02.12.2008, proc. n.º 0826018, de 17.02.2009, proc. n.º 20003/00.4TBVRL, de 08.09.2011, proc. n.º 1645/09.9TBVNG.1.P1, de 15.01.2013, proc. n.º 3718/07.3TBSTS-A.P1, de 28.11.2013, proc. n.º 3255/11.1TBPRD-A.P1, de 15.01.2013, proc. n.º 3718/07.3TBSTS-A.P1, 03.12.2013, proc. n.º 262/07.2TBCHV.P1, de 15.10.2013, proc. n.º 37/12.7TBCNF.1.P1, de 03.12.2013, proc. n.º 1621/11.1TBPNF-B.P1, acessíveis in www.dgsi.pt. e os mais recentes publicados desta Secção, os Acórdãos de 28.11.2013 (Judite Pires) e de 2.12.2013 (Teresa Santos, adjunta no anterior acórdão), este com declaração de voto de vencido do senhor desembargador Pedro Martins, no sentido da tese por nós defendida neste acórdão. Pela sua singeleza meridiana transcrevemos esta declaração de voto:
“Como o próprio nome do FGADM indica, trata-se de um fundo para garantia dos alimentos devidos. Criou-se assim um fundo para garantir uma prestação, não se criou uma nova prestação social administrativa independente daquela, fixável pelos tribunais judiciais e não reembolsável, que é o resultado a que chega a tese contrária. Todo o regime jurídico desta garantia tem como pano de fundo aquele fim: daí a sub-rogação, daí os reembolsos, daí a cessação da prestação a cargo do FGADM a partir do momento em que o obrigado a alimentos comece o pagamento das prestações. A imposição de realização de diligências probatórias para averiguar das efectivas necessidades dos menores quando o FGADM é accionado, que é o principal argumento da tese contrária (como se pode ver na 2ª edição do estudo de Remédio Marques, pp 237-239), justifica-se de forma muito diversa da avançada por essa tese, ou seja, visa-se com ela prevenir as múltiplas hipóteses de conluio entre os progenitores, em prejuízo dos dinheiros públicos, com fixação de prestações alimentares que ultrapassem os montantes necessários. Por isso, quando os fundos públicos são chamados a pagar a prestação, tem que se averiguar, com novas diligências de prova, se as necessidades dos menores correspondem de facto à prestação fixada (fixada… por acordo ou com base em prova testemunhal oferecida pelas partes). E é também isto que justifica o facto de a prestação fixada aos obrigados não ser o único factor a ter em conta na fixação da prestação a suportar pelo FGADM. Aliás, se o fim visado com esta prestação fosse de facto a satisfação das necessidades dos menores, com base nestas necessidades, não se justificaria que ela fosse restrita aos menores a quem não está a ser paga a prestação pelos devedores originários. Deveria ser prestada a todos os menores necessitados. Mas é evidente que o regime jurídico desta específica prestação não tem este fim (independentemente de se aceitar que alguma outra prestação o devia ter... isto é, alimentar todos os menores necessitados e não apenas aqueles a quem esteja fixada alguma prestação alimentar).”
Diga-se que também no Acórdão do STJ para fixação de jurisprudência n.º 12/2009, 7 de Julho, publicado no DR, 1.ª série, n.º 150, de 5 de Agosto de 2009, embora em resposta à questão sobre a data de nascimento da obrigação a cargo do Fundo, se considerou que esta prestação nova não tem de ser, necessariamente, equivalente à que estava a cargo do progenitor: “A obrigação de prestação de alimentos a cargo do Fundo é uma obrigação independente e autónoma, embora subsidiária, da do devedor originário dos alimentos, no sentido de que o Estado não se vincula a suportar os precisos alimentos incumpridos, mas antes a suportar alimentos ex novo”.
Posição eclética tem o Prof Dr Remédio Marques, in“Algumas Notas sobre Alimentos Devidos a Menores”, Coimbra Editora, 2.ª edição revista, 2007, págs. 237-239, ao considerar que: “o Fundo de Garantia visa propiciar uma prestação autónoma de segurança social, uma prestação a forfait de um montante, por regra equivalente ao que fora fixado judicialmente - mas pode ser maior ou menor, sendo certo que as prestações atribuídas não podem exceder, mensalmente, por cada devedor, o montante de quatro unidades de conta de custas. Se assim não fosse, seria inútil e supérfluo ordenar-se a realização de diligências probatórias e o inquérito social acerca das necessidades do menor: não faria, na verdade, qualquer sentido desenvolver esta actividade probatória - que inclui, nos termos do art. 4/2 do DL 164/99, de 13/05, pedidos de informação a delegações regionais do Instituto da Segurança Social, ou de outros serviços, públicos ou privados, que disponham de elementos relativos às necessidades e à situação sócio-económica do menor e da família onde se encontra inserido ou acolhido -, com vista a fixar uma prestação igual ou inferior à que fora anteriormente fixada. Estas actividades probatórias seriam, então, inúteis, desnecessárias e supérfluas, caso a prestação do Fundo de Garantia devesse corresponder ao montante já fixado anteriormente ou a uma quantia inferior a esta outra. É claro que, na hipótese de o Fundo ter sido condenado em um montante superior (mas em todo o caso inferior a 4 UC), a sub-rogação que possa vir a exercer contra o progenitor obrigado será somente parcial até ao limite quantitativo da condenação deste último. E nem vale objectar dizendo que esta actividade probatória se destina a averiguar a eventual diminuição das necessidades do menor, para o efeito da fixação de uma prestação inferior ao montante pré-fixado pelo tribunal ou homologado pela Conservatória, pois que é facto notório que as necessidades de um menor (v.g., educação, segurança, vestuário, alimentação, actividades extra-curriculares, etc.) aumentam com a idade (…), sendo também certo que se detecta, não raro, uma tendência de subavaliação dos custos reais de manter e educar uma criança (…). Uma vez que, bem ou mal, a intervenção do Fundo de Garantia não fica precludida pelo decurso de um período mais ou menos longo subsequente ao incumprimento (total ou parcial, originário ou sucessivo) por parte do obrigado, não é estultice observar-se que o mero decurso do tempo, aliado à inevitável desvalorização monetária do nosso tempo, implicará a fixação de um montante superior ao que fora anteriormente fixado (…). O tribunal deve, outrossim atender, na fixação de um montante - que pode ser inferior a quatro unidades de conta de custas -, à capacidade económica do agregado familiar da pessoa a cuja guarda se encontre, ao montante da prestação de alimentos fixada pelo tribunal e às necessidades específicas do menor. Vale tudo isto por dizer que ao tribunal é lícito e é exigível efectuar a reponderação da situação de facto do menor à luz da qual fora anteriormente fixada a pensão de alimentos cujo incumprimento tenha dado origem ao pedido de condenação dirigido contra o Fundo de Garantia, já que esta anterior pensão constitui apenas um dos índices de que o julgador se pode servir ao fixar a prestação do Fundo de Garantia (art. 2.°/2 da Lei n.º 75/98 e art. 3.°/3 do Decreto-Lei n.º 164/99)”.
Não têm posição definida, parecendo que se inclinam para esta última tese, em princípio, Helena Bolieiro/Paulo Guerra, “A Criança e a Família –Uma Questão de Direito(s)”, Coimbra Editora, 2009, p.232.
Citando agora o acórdão relato de TOMÉ RAMIÃO, PROCº 3464/08.0TBAMD.L1-6 de 06-12-2011, in www.dgsi.pt:
“Competirá ao Estado, e bem assim quando não for fixada judicialmente prestação alimentar - nas situações de ausência total de rendimentos ou carência de rendimentos bastantes, bem como na situação em que se desconhecem esses elementos -, atribuir as respetivas prestações sociais através de outros mecanismos de proteção social, a que está obrigado ( esgotadas as possibilidades de obtenção de alimentos de outros familiares, nos termos do art.º 2009.º do C. Civil), sendo que o direito das crianças à proteção, como função da sociedade e do Estado, tendo em vista o seu desenvolvimento integral, vem consagrado na C. R. P. (art.º 69.º), o que implica a imposição ao Estado dos deveres de assegurar a garantia da dignidade da criança como pessoa em formação a quem deve ser concedida a necessária proteção, sendo, como é, o direito a alimentos, decorrência, ele mesmo, do direito à vida (art.º 24.º da C. R. P). Em obediência a esses princípios, o “Fundo de Garantia” instituído pela Lei n.º 75/98, de 19 de novembro e regulamentada pelo Dec.-Lei n.º 164/99, de 13 de maio, constitui apenas uma das formas de proteção, não a única. A atribuição do Rendimento Social de Inserção ou a concessão de prestações sociais no âmbito do sistema da segurança social, ao abrigo dos art.os 8.º/2, alínea a), 29.º/2, 30.º, alínea c) e 41.º/1, alíneas a) e f) da Lei n.º 4/2007, de 16 de janeiro (diploma que define as base gerais em que assenta o sistema de segurança social), constituem outras formas de proteção, nomeadamente através do subsistema de ação social, que assegura a especial proteção de crianças e jovens, através de prestações pecuniárias de caráter eventual — seu art.º 29.º/2 e 30.º, alínea c). Parece-nos, pois, que a solução legal adequada, nestas circunstâncias, passa pela não fixação de qualquer prestação de alimentos a cargo desse progenitor, sem prejuízo de ulterior fixação, desde que se modifique ou seja conhecida a situação económica, dado que estamos em presença de processo de jurisdição voluntária, cuja decisão poderá ser revista e alterada, nos termos dos art.os 150.º e 182.º da O. T. M. e 1411.º do C. P. Civil, tendo em conta os princípios da atualidade e alterabilidade dos alimentos”.
Não obstante a clara opção legislativa, em constituir um “fundo fechado” surpreendem-nos, cada vez mais, decisões judiciais a alargar o âmbito desse fundo fechado, criado com a legitimidade constitucional de quem faz as Leis e a que os Tribunais devem apenas obediência, com o argumento assente em normas programáticas e não vinculativas- vg artºs 67 e 69 - segundo a Constituição da República Portuguesa de 1976- artºs 108º, 110,111º, mnº 1, 112º, 161º ss, , 182 ss e 202º CPP de 1976.
Razões de generosidade não podem aqui ser chamadas para justificar atropelos à legalidade constitucional. Cabe aos órgãos constitucionais competentes (legislativo e executivo) a consagração de tutela protectora para a atribuição de prestações sociais a menores que não têm uma prestação de alimentos fixada judicialmente por carência ou desconhecimento das condições de vida do progenitor(a) obrigado(a) a tal.
Mais grave violação das elementares regras do direito, será fixar essa prestação em processo de alteração ou até de simples regulação das responsabilidades parentais, sem intervenção do FGAM, que pela subversão total das regras processuais dado que essa prestação deve ser fixada em incidente próprio, a correr nos próprios autos onde foi fixada a pensão alimentar e após o incidente de incumprimento ou execução especial por alimentos e sempre com o respeito pelo princípio do contraditório do FGAM. Como o relator deste acórdão escreveu em anotação ao artº 181º OTM, em Direito das Crianças e Jovens, 1ª edição, Livraria Petrony, 2010, “Entendemos que a prestação a pagar pelo FGAM apenas é devida enquanto perdurar a menoridade do menor, cessando nessa altura ope legis e que o FGAM, representado pelo Gabinete de Gestão Financeira da Segurança Social, deve ser citado/notificado para poder deduzir oposição no prazo de oito dias, ao abrigo do disposto nos art.ºs 3º n,”’ 1 a 3 e 303,°, nº2 CPC ex vi artº 161.° OTM”.
Neste sentido, veja-se o acórdão uniformizador de jurisprudência, nº 12/2009, DR Iª Série, nº 150, de 05.08.09, que fixou a seguinte jurisprudência obrigatória para os tribunais judiciais: “A obrigação de prestação de alimento a menor, assegurada pelo Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores, em substituição do devedor, nos termos previstos nos artigos 1º da lei nº 75/98, de 19 de Novembro e 2º e 4°, nº 5, do Decreto-Lei nº 164/99, de 13 de Maio, só nasce com a decisão que julgue o incidente de incumprimento do devedor originário e a respectiva exigibilidade só ocorre no mês seguinte ao da notificação da decisão do tribunal, não abrangendo quaisquer prestações anteriores”.
Isto para dizer que o pagamento de prestação de alimentos a menores através do Estado quando o progenitor/a tenha situação económica que não lhe permite pagar qualquer prestação ou se ignore totalmente a situação económica daquele, deve ser assunto a merecer a devida atenção do legislador, cabendo a este definir a política social que entender adequada a esta situação, no âmbito da sua competência exclusiva e de acordo com as prioridades definidas politicamente. A nós, enquanto julgador não nos cabe definir essa política social, nem subverter o sistema “ficcionando” uma situação económica do progenitor/a a quem cabe prestar alimentos e, dessa forma, fixar uma pensão alimentar que não é adequada à realidade provada, apenas com base num pretenso superior interesse do menor, sem quadro legal. Daí não podermos alinhar com o entendimento jurisprudencial de que é exemplo o Ac RC de 12.02.2008, (relator Isaías Pádua) in www.dgsi.pt, citado no requerimento inicial da apresente acção.
Este nosso entendimento, não viola nenhuma norma de direito constitucional ou convencional consagrada, nomeadamente o princípio da igualdade previsto no artº 13º, nº 1, CRP de 1976, dado que a situação de incumprimento da prestação original de alimentos motivadora da intervenção do FGAM, é diferente da situação de não ter sido fixada a prestação alimentar (obrigação originária).
Procedem, pois, as conclusões de recurso da apelante.
Assim se revoga o decidido na decisão recorrida.
*
SUMARIANDO:
1-O pagamento de prestação de alimentos a menores através do Estado quando o progenitor/a tenha situação económica que não lhe permite pagar a prestação, sem violar o seu mínimo de sobrevivência ou se ignore totalmente a situação económica daquele e até o paradeiro, deve ser assunto a merecer a devida atenção do legislador, cabendo a este definir a política social que entender adequada a esta situação, no âmbito da sua competência exclusiva e de acordo com as prioridades definidas politicamente.
2-A nós, enquanto julgador não nos cabe definir essa política social, nem subverter o sistema “ficcionando” uma situação económica do progenitor/a a quem cabe prestar alimentos e, dessa forma, fixar uma pensão alimentar que não é adequada à realidade provada, apenas com base num pretenso superior interesse do menor, sem quadro legal.
3-O FGADM é um “fundo fechado”, constituído mediante pressupostos taxativos, para garantia dos alimentos devidos a menores antes fixados por decisão judicial ou equivalente, que o poder legislativo criou, com efeitos em 15. 10.1998 mas com entrada em vigor apenas em Janeiro de 2000 (artº 11º DL nº 164/99, de 13,95), com o OE de 2000, para garantir uma prestação autónoma mas substitutiva do progenitor/devedor originário. Todo o regime jurídico desta garantia tem como pano de fundo aquele fim: daí a sub-rogação, daí os reembolsos, daí a cessação da prestação a cargo do FGADM a partir do momento em que o obrigado a alimentos comece o pagamento das prestações.
4-Poderá o poder legislativo criar prestações sociais/subsídios de protecção da infância e juventude, em termos gerais e abstratos de acordo com as opções político-legislativas, de futuro. Não podem é os tribunais, na falta de mecanismos legais em vigor, subverter o sistema político-constitucional e fazer integrar no FGADM situações de facto propositadamente simuladas ou que na previsão das normas que regulam este Fundo, nelas não têm cobertura
*
3. Decisão
Em face do exposto, acordam os juízes deste Tribunal em conceder provimento ao recurso, pelo que se revoga a decisão recorrida e se fixa a prestação a pagar pelo FGAM a favor dos menores supra identificados e a pagar ao pai destes, com quem residem, em 50, 00€ (cinquenta euros) para cada menor, devendo o tribunal a quo ordenar as diligências legais subsequentes.
Custas do incidente pelo requerente e sem custas a apelação.

Porto, 15.05.2014
Madeira Pinto
Carlos Portela
Pedro Lima da Costa