Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
11425/08.3TBVNG.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: FILIPE CAROÇO
Descritores: ALIMENTOS ENTRE EX-CONJUGES
Nº do Documento: RP2011091511425/08.3TBVNG.P1
Data do Acordão: 09/15/2011
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO.
Decisão: ALTERADA.
Indicações Eventuais: 3ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: Actualmente, após as alterações introduzidas pela Lei n.º 61/2008, de 31/10, o direito a alimentos entre os ex-cônjuges é excepcional e visa garantir uma vida minimamente condigna a quem deles carecer, sem que tenha o direito de exigir a manutenção do padrão de vida de que beneficiou na constância do matrimónio, sendo o seu montante fixado segundo os elementos previstos no n.º 1 do art.º 2016-A do Código Civil.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Proc. nº 11425/08.3TBVNG.P1 – 3ª Secção (apelação)
Tribunal de Família e Menores de Vila Nova de Gaia

Relator Filipe Caroço
Adj. Desemb. Teresa Santos
Adj. Desemb. Maria Amália Santos

Acordam no Tribunal da Relação do Porto

I.
B…, emigrante, desempregado, residente em … Suissa, também com residência em Portugal, na … , ..° Direito, …, Vila Nova de Gaia, instaurou acção especial de divórcio contra a sua mulher, C…, com o NIF ………, residente em …, Lote n.º .., ..° Direito, …, ….-… Vila Nova de Gaia, alegando, no essencial, que a relação conjugal se foi deteriorando, designadamente em razão da emigração do A., tendo as partes assumido reciprocamente a separação de facto, não mais partilhando leito, mesa e habitação a partir do ano 2000.
Pede, assim, que seja dissolvido por divórcio o matrimónio celebrado entre A. e R.
Citada a R. e revelando-se infrutífera a tentativa de conciliação que teve lugar, aquela contestou a acção por impugnação dos factos da petição inicial e reconveio invocando o abandono, pelo A., da casa de morada da família e violação dos deveres de cooperação e assistência à família, pretendendo também o divórcio, mas com base nos factos da reconvenção.
O A. replicou defendendo a improcedência do pedido reconvencional e a procedência do pedido da acção, se não for de dar cumprimento ao disposto no art.º 1779º, nº 2, do Código Civil, com prosseguimento dos autos nos termos do divórcio por mútuo consentimento, por ambos o desejarem.
O tribunal determinou que o processo prosseguisse como divórcio litigioso, admitiu o pedido reconvencional, dispensou a realização da audiência preliminar e elaborou factos assentes e base instrutória, de que não houve reclamação.
Instruídos os autos e designada data para a realização da audiência de julgamento, o tribunal deu-se conta da aplicabilidade ao caso, da nova lei do divórcio (Lei nº 61/2008, de 31 de Outubro), consignando em acta a desnecessidade da discussão da culpa no divórcio e a existência de vontade de ambos os cônjuges em se divorciarem, pelo que os mesmos requereram a conversão do divórcio sem consentimento em divórcio por mútuo consentimento, tendo chegado a acordo quanto ao destino da casa de morada da família que ficou entregue à C…, o que se consignou em acta.
Como o casal não chegou a acordo relativamente a alimentos, remeteu a apresentação da relação de bens comuns para data posterior, e o tribunal notificou as partes para, ao abrigo dos art.ºs 303º e seg.s do Código de Processo Civil, alegarem todos os factos que se lhes afigurassem pertinentes e indicarem todos os meios de prova que entendessem relevantes para, posteriormente, ser proferida decisão em matéria de alimentos.
Apresentou, então, a R. C… um pedido de alimentos contra o A. pelo valor de € 500,00, alegando que é doméstica, não tem qualquer rendimento nem é possível exercer profissão dada a sua idade e a falta generalizada de emprego.
Continua a alimentar e a vestir uma filha que ainda está a tirar uma licenciatura --- em favor da qual o A. envia ainda, mensalmente, a quantia de € 300,00 --- e paga ainda, a R., a renda da casa e outras despesas com a habitação, no que tem de ser ajudada pela família.
Já o A. vive com desafogo na Suíça há cerca de 7 anos, com um rendimento mensal proveniente do trabalho que então era já de € 3.740,98.
O A. contestou o incidente negando a possibilidade de satisfação do pedido da R. por ter estado desempregado entre Novembro de 2008 e Setembro de 2009, sendo a sua situação de emprego actualmente remunerada com o vencimento mensal de Fr 3.367,50, o que equivale a € 2.200,00. Com este dinheiro paga renda de casa (€ 430,00), água, electricidade, e gás (€ 158,00), um crédito pessoal (€ 205,00), transporte para o trabalho (€ 138,00), cada refeição diária no local de trabalho (€ 264,00) e seguro de saúde obrigatório (€ 240,00), e paga ainda a pensão de alimentos à sua filha, D…, residente com a R., na quantia mensal de € 300,00, restando-lhe a quantia mensal de 745,50 francos (€ 465,00) que afecta a gastos com alimentação, telefone, lavandaria, entre outras.
Faz notar que a R. trabalha, diariamente, para terceiros, como empregada doméstica, daí auferindo rendimentos.
Conclui no sentido de que o tribunal julgue o pedido improcedente.
Teve lugar a audiência de julgamento com inquirição de duas testemunhas da R., sem gravação dos depoimentos, apesar deste registo ter sido requerido por ambas as partes e admitido pelo tribunal.
Na sequência da discussão, o tribunal proferiu sentença na qual respondeu, fundamentadamente, à matéria de facto e conheceu de Direito fixando os alimentos na quantia de € 300,00 por mês a favor da R. e decretando o divórcio entre os cônjuges, por mútuo consentimento, com homologação prévia dos acordos firmados.

Inconformado, recorreu o A. alegando com as seguintes CONCLUSÕES:
«1ª A matéria de facto dada como provada na decisão em recurso, salvo o devido respeito, merece censura, devendo ser alterada, por isso, no ponto que a seguir se sintetiza:
2ª Artigo 4 da sentença - na parte que indica que a requerente sofreu um problema de saúde e que consequentemente, na presente data, não tenha possibilidade de obter qualquer rendimento devido aquele problema de saúde ou seja que o alimentando esteja impossibilitado de obter rendimentos.
3ª A requerida nunca alegou problemas de saúde, nem nunca juntou qualquer prova documental aos autos, indicando quais os problemas de saúde de que sofre.
4.ª Se efectivamente assim fosse a requerida estaria, com certeza, reformada por invalidez.
5.ª A requente, apesar de ter 54 anos, pode, se assim quiser, obter emprego, já que na área das limpezas e restauração, que era o trabalho que realizava, não existe falta emprego como é consabido.
6.ª A matéria de facto dada como não provada na decisão em recurso, salvo o devido respeito, merece censura, devendo ser alterada, por isso, nos pontos que a seguir se sintetizam:
7.ª - Que o requerido paga renda mensal no valor de € 430,00, referente ao imóvel em que reside.
- Que requerido tem uma despesa mensal, com agua, electricidade e gás no valor de € 158,00.
- Que o requerido tem uma despesa mensal em transporte para o trabalho no valor de € 138,00
- Que o requerido tem despesa mensal com uma refeição diária no local de trabalho no valor de € 264,00.
- Que o requerido tem despesas com vestuário, lavandaria, telefone, alimentação (pequeno almoço e jantar), e lazer o que equivalem estas a pelo menos € 465,00.
8.ª Estas despesas representam o montante de € 1455,00.
9.ª Estas despesas são necessárias para o requerido suportar uma vida condigna na Suíça, que é substancialmente mais cara que em Portugal, sem por em risco a sua própria manutenção de vida de acordo com a sua condição.
10.ª Recorrendo a um juízo de experiência comum, sempre se teria que considerar o valor de € 1455,00, para as necessidades normais do requerido, sem por em risco a sua própria manutenção de vida de acordo com a sua condição.
11.ª Também deve ser alterada a decisão na parte em que considerou não provado que o requerido tem;
- Despesa mensal de € 205,00 referente a credito pessoal contraído no E….
- Despesa mensal de € 240,00 referente a seguro de saúde obrigatório.
12.ª O requerido comprovou documentalmente estas duas despesas conforme doc. 2 e 3 junto aos autos.
13.ª O requerido tem uma despesa mensal total de € 2.200,00, (€ 1.455,00 + € 205,00 + € 240,00 + € 300,00 de pensão de alimentos paga à filha),
14.ª O requerido não tem possibilidades económicas de pagar pensão de alimentos à sua ex mulher, já que aufere somente € 2200,00, fruto do seu trabalho.
15.ª. Por alimentos entende-se tudo o que é indispensável ao sustento, habitação e vestuário conforme artigo 2002 n.º 1 do C.Civil.
16.ª Nos termos do art. 2004 também do Cód. Civil estatui-se que os alimentos serão proporcionados aos meios daqueles que houver de prestá-los e à necessidade daquele que houver de recebê-los (nº 1) e na sua fixação atender-se-á, também, à possibilidade de o alimentando prover à sua subsistência (nº 2).
17.ª Relativamente aos cônjuges diz-nos o artigo 2016 n.º1 que cada cônjuge deve prover à sua própria subsistência.
18.ª São pressupostos do direito a alimentos, cuja ónus da prova impende sobre a requerente (art.342 nº1 CC), a verificação cumulativa dos seguintes elementos: 1- Que o alimentando não disponha de meios suficientes de subsistência; 2- Que o alimentando esteja impossibilitado de os obter. 3- Que haja possibilidade de os mesmos serem prestados por parte de quem estiver legalmente adstrito a essa obrigação.
19.ª Só o primeiro pressuposto foi preenchido.
20.ª O segundo pressuposto não foi preenchido já que, como se referiu, a requerente não se encontra impossibilitada de trabalhar por motivo de doença,
21.ª A requerente, apesar de ter 54 anos, pode, se assim quiser, obter emprego, já que na área das limpezas e restauração, que era o trabalho que realizava, não existe falta emprego como é consabido.
22.ª O terceiro pressuposto também não ficou preenchido já que o requerido, conforme se demonstrou, não tem possibilidades económicas de suportar uma pensão de alimentos á ex mulher
23.ª Não deve o requerido ficar prejudicado devido à inércia da requerente que pode trabalhar mas prefere não o fazer, não providenciando pela angariação de meios de subsistência
24.ª Os alimentos não podem ser fixados em montante desproporcionado aos meios de quem se obriga, mesmo que desse modo não seja possível eliminar completamente a situação de carência do alimentado, devendo atender-se à parte disponível dos rendimentos normais, tendo em atenção as obrigações do devedor para com outras pessoas.
25.ª Subsumindo os factos mencionados ao direito aplicável, verifica-se que foram violados, pelo tribunal a quo, os artigos n.º 2004 e 2016 n.º1 do C.C» (sic)
Termina no sentido de que seja revogada a sentença na parte em que o requerido ficou obrigado a prestar alimentos à requerente no montante de € 300,00.

Não fora apresentadas contra-alegações.
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Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
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II.
O objecto do recurso está delimitado pelas conclusões da apelação, acima transcritas, sendo que se apreciam apenas as questões invocadas e relacionadas com o conteúdo do acto recorrido e não sobre matéria nova, excepção feita para o que for do conhecimento oficioso (cf. art.ºs 660º, nº 2, 684º e 685º-A, do Código de Processo Civil, na redacção que foi introduzida pelo Decreto-lei nº 303/2007, de 24 de Agosto, aqui aplicável).
O Tribunal deve apreciar todas as questões decorrentes da lide, mas, embora o possa fazer, não tem que discutir todos os argumentos ou raciocínios das partes, ou seja, apenas deve considerar o que for necessário e suficiente para resolver cada questão[1].
Para decidir está a questão da pensão de alimentos a favor da R. e a cargo do A.; saber se há condições para ser atribuída e, na afirmativa, qual deve ser o valor legalmente adequado, o que passa --- atentos os termos da apelação --- pela eventual reapreciação da matéria de facto e pela aplicação do Direito.
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III.
É a seguinte a matéria de facto dada como provada na 1ª instância:
1) A requerente e o requerido casaram em 28 de Fevereiro de 1980 –doc. de fls. 15 e 16.
2) A requerente é doméstica, não auferindo qualquer rendimento.
3) O requerido trabalha na Suíça, com um rendimento de 3367,50 francos, correspondente a cerca de € 2.200,00 mensais.
4) A requerente cuidava da casa e dos filhos, tendo também em determinado período exercido actividade em limpezas e noutra altura tendo acumulado tal actividade com outra num restaurante, até ter sofrido um problema de saúde que a impediu de continuar.
5) Uma das filhas do casal, maior, vive ainda com a requerente, sendo estudante na faculdade de enfermagem.
6) O requerido envia para a requerente e tendo em vista a colaboração para os estudos da filha o valor mensal correspondente a € 300,00 (cerca de 458,25 francos).
7) A requerente é ajudada pela família, bem como a sua filha “supra” referida.
8) O requerido teve um período de desemprego.
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Não se provou que o requerido esteve desempregado no período de Novembro de 2008 a Setembro de 2009, que paga de renda 650 francos relativo ao imóvel onde reside, que paga água, luz e gás, no valor mensal de 240 francos, que paga 350 francos referente a um crédito pessoal, que tem uma despesa de 210 francos de transporte, e 400 francos por uma refeição diária no local de trabalho, e ainda 359 francos de seguro de saúde obrigatório. Não se provou ainda que a requerente trabalha como empregada doméstica e que recebe rendimentos. Os demais factos alegados ou são conclusivos e matéria de direito.
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IV.
A.
1ª Questão: a modificação da matéria de facto
Segundo o art.º 712º, nº 1, a decisão do tribunal de l.ª instância sobre a matéria de facto pode ser alterada pela Relação:
a) Se do processo constarem todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre os pontos da matéria de facto em causa ou se, tendo ocorrido gravação dos depoimentos prestados, tiver sido impugnada, nos termos do artigo 685.°-B, a decisão com base neles proferida;
b) Se os elementos fornecidos pelo processo impuserem decisão diversa, insusceptível de ser destruída por quaisquer outras provas;
c) Se o recorrente apresentar documento novo superveniente e que, por si só, seja suficiente para destruir a prova em que a decisão assentou.
De acordo com o art.º 685º-B, nº 1, da referida lei adjectiva, quando se impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, o recorrente deve obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição, além dos concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, quais os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.
Da análise do recurso resulta claro que o A. deu cumprimento ao referido ónus processual, previsto no citado nº 1 do art.º 685º-B. Indicou, com precisão e rigor, os pontos que pretende ver alterados, como sendo uma parte determinada do item 4º dos factos provados e deseja que seja tida como não provada, e alguns pontos dados como não provados e que considera terem ficado demonstrados, a saber:
a) Que o requerido paga renda mensal no valor de € 430,00, referente ao imóvel em que reside;
b) Que requerido tem uma despesa mensal, com água, electricidade e gás no valor de € 158,00;
c) Que o requerido tem uma despesa mensal em transporte para o trabalho no valor de € 138,00;
d) Que o requerido tem despesa mensal com uma refeição diária no local de trabalho no valor de € 264,00;
e) Que o requerido tem despesas com vestuário, lavandaria, telefone, alimentação (pequeno almoço e jantar), e lazer o que equivalem estas a pelo menos € 465,00, num total de € 1.455,00.
f) Que o requerido tem despesa mensal de € 205,00 referente a crédito pessoal contraído no E….
g) Que o requerido tem despesa mensal de € 240,00 referente a seguro de saúde obrigatório.
Vejamos.
No que concerne à matéria de facto provada e colocada em crise tem-se como prévia à reapreciação da prova a verificação do fundamento da rejeição do facto proposta pelo recorrente. A discordância prende-se com o segmento do item 4º dos factos provados onde se afirma que a R. sofreu “um problema de saúde que a impediu de continuar” a trabalhar, sem que, todavia, tal facto tivesse sido alegado.
Analisando o requerimento da R. que abriu o incidente para fixação de alimentos (fl.s 98 e seg.s), dele não resulta qualquer referência a doença ou falta de saúde da requerente e assim, menos ainda que tivesse deixado de trabalhar por impossibilidade ou incapacidade emergente do estado de doença. O que de mais próximo com essa matéria a R. ali alegou foi que é doméstica, não tem rendimento algum e que não é possível vir a auferi-lo, com base em qualquer actividade profissional, atento a sua idade e a generalizada falta de emprego no nosso país (art.ºs 5º, 6º e 7º).
É conhecido o princípio do dispositivo, tradicionalmente, como um dos pilares fundamentais do processo civil, segundo o qual, cabe às partes o ónus da iniciativa processual, não só pela formulação do pedido, como também pela alegação da matéria de facto que, em cada caso, lhe sirva de fundamento.
Situando-nos na vertente do dever de alegar os factos que integram a causa de pedir ou a matéria de excepção que a defesa invoque, constitui regra processual que o juiz só pode fundar a decisão nos factos alegados pelas partes nos respectivos articulados (art.ºs 264º, nºs 1 e 664º, do Código de Processo Civil).
Este princípio, outrora quase intocável, foi objecto de várias limitações nas últimas reformas do processo civil em ordem a, cada vez mais, fazer prevalecer a verdade material sobre a formalidade, pela manifesta vontade do legislador de dar primazia ao direito das partes, ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio, quando necessário, através de uma intervenção mais activa do juiz[2] pela realização do inquisitório. É o que resulta, designadamente, das reformas processuais levadas a cabo pelo Decreto-lei nº 329-A/95, de 12 de Dezembro e pelo Decreto-lei nº 180/96, de 25 de Setembro no âmbito dos art.ºs 264º, 265º e 650º, nº 2, al. f) e nº 3, do Código de Processo Civil.
Reequacionando os princípios do dispositivo e da oficiosidade, o legislador explicou desde logo na nota preambular daquele primeiro decreto-lei reformador que “no que se refere à exacta definição da regra do dispositivo, estabelece-se que a sua vigência não preclude ao juiz a possibilidade de fundar a decisão não apenas nos factos alegados pelas partes mas também nos factos instrumentais que, mesmo por indagação oficiosa, lhes sirvam de base. E, muito em particular, consagra-se --- em termos de claramente privilegiar a realização da verdade material --- a atendibilidade na decisão de factos essenciais à procedência do pedido ou de excepção ou reconvenção que, embora insuficientemente alegados pela parte interessada, resultem da instrução e discussão da causa, desde que o interessado manifeste vontade de os aproveitar e à parte contrária tenha sido facultado o contraditório”.
A possibilidade conferida a ambas as partes de correcção da matéria de facto alegada, com base no novo conteúdo do nº 2 e do nº 3 do art.º 264º por actuação oficiosa do juiz ou por sua iniciativa, representa um nítido avanço em comparação com o regime demasiado rígido que resultava do sistema anterior.
É assim que o referido nº 2 prevê actualmente a possibilidade de o juiz fundar a decisão, além do mais, na consideração, mesmo oficiosa, dos factos instrumentais que resultem da instrução e discussão da causa. E o subsequente nº 3 viabiliza a possibilidade de consideração na decisão de factos essenciais à procedência das pretensões formuladas ou das excepções deduzidas que sejam complemento ou concretização de outros que as partes hajam oportunamente alegado e resultem da discussão da causa, desde que a parte interessada manifeste vontade de deles se aproveitar e à parte contrária tenha sido facultado o exercício do contraditório.
Esta última norma insere-se ainda no princípio do dispositivo, por dever ser da parte a iniciativa de se aproveitar de facto novo essencial e representa a concessão de uma derradeira oportunidade de ampliação da matéria de facto.
É na petição inicial que o autor deve expor os factos que servem de fundamento à acção, ou seja, os factos constitutivos do direito invocado e integradores da causa de pedir (art.° 467º, nº l, al. c), do Código de Processo Civil).
Os factos novos, não alegados pelas partes no momento oportuno, sejam eles instrumentais ou essenciais, só são admissíveis se resultarem da instrução e discussão da causa. Neste caso, por força do art.º 650º, nº 2, al. f), do Código de Processo Civil, o juiz deve providenciar até ao encerramento da discussão pela ampliação da base instrutória da causa, nos termos do disposto no artigo 264º.
Como se extrai da análise da acta de audiência de julgamento, e do mais que se observa nos autos, a Ex.ma Juiz não providenciou pela ampliação da base instrutória, designadamente quanto ao facto que veio a dar como provado relativo à falta de saúde da R. e à impossibilidade de trabalhar e de obter rendimento do trabalho.
Ao atender a este facto novo sem a ampliação da base instrutória e cumprimento das referidas formalidades legais, manifestamente, a decisão constituiu surpresa para o A. que não se pôde preparar para o contraditório, quer pela negação do facto, quer pela indicação de provas tendentes ao seu afastamento (nºs 3 e 4 do citado art.º 650º); pelo que se declara, necessariamente, a sua irrelevância[3], já que também não é um facto notório, por não ser do conhecimento geral, qualquer estado de saúde ou de doença da R. (art.º 514º do mesmo código). A consideração daquela matéria não alegada, e nas condições em que foi --- dando-a como provada ---, constitui violação do princípio do dispositivo, do contraditório e da proibição da indefesa, e da igualdade das partes (cf., entre outros já citados, os art.ºs 3º, nº 3, e 3º-A, também do Código de Processo Civil).
Afasta-se assim, inviabilizando a reapreciação da prova, parte da matéria dada como provada sob o item 4º da sentença, que se reduz com a seguinte redacção:
«A requerente cuidava da casa e dos filhos, tendo também em determinado período exercido actividade em limpezas e noutra altura tendo acumulado tal actividade com outra num restaurante.»

A matéria dada como não provada e a reapreciação da prova.
O A. pretende que sejam dadas como provadas algumas despesas regulares no exercício da sua vida pessoal, na Suíça, país onde reside. Para o efeito apela, simplesmente, a fotocópias de documentos particulares que juntou com a contestação.
Em audiência, o tribunal inquiriu apenas duas testemunhas, ambas arroladas pela A. Foram ouvidas com indicação a toda a matéria da base instrutória. Nos termos da fundamentação em matéria de facto, ficou a constar da sentença que uma delas é um filho do casal que chegou a viver com o pai na Suíça durante cerca de um ano. Esta convivência coloca-a numa posição de conhecimento privilegiado, mais ou menos relevante, relativamente à vida do seu progenitor naquele país, nomeadamente quanto respeita às despesas por ele alegadas na contestação. Tal circunstância não parece ter sido estranha ao tribunal a quo que, embora de modo sucinto, dá relevo nesta matéria ao depoimento da testemunha F…, o dito filho de A. e R.
Os depoimentos das testemunhas não foram objecto de gravação. Ambas as partes a requereram e foi deferida, mas não foi realizada. É uma irregularidade, mais precisamente uma nulidade processual secundária que, para ser apreciada, teria que ser invocada na audiência de julgamento ou, quanto muito, como fundamento de recurso (art.º 201º, nº 1, 202º, a contrario, 203º, nº 1, e 205º, nºs 1, e 3, do Código de Processo Civil). Como não foi arguida, considera-se sanada.
Ainda que, na aparência da fundamentação referida, o tribunal recorrido tenha como reduzida a relevância dos depoimentos testemunhais relativamente à matéria não provada e em discussão no recurso, a verdade é que a este tribunal ad quem não pode ser retirada a possibilidade de exame de toda a prova indicada à matéria impugnada e produzida para o efeito, de modo a seleccionar autónoma e livremente, e na medida que tiver por adequada, a prova que tem como relevante para a decisão da questão de facto em conformidade. O julgamento da matéria de facto --- agora solicitado à Relação --- sendo um juízo eminentemente subjectivo, “objectiva-se” nos meios de prova devidamente interpretados, valorados e apreciados que o motivam.
Por outro lado, a fundamentação da decisão em matéria de facto, embora exigente, não tem que ser, nem é possível que seja, exaustiva ao ponto de esgotar, em absoluto, toda e qualquer influência na decisão.
Acontece que, quando há gravação dos depoimentos prestados, nos termos do nº 2 do art.º 712º do Código de Processo Civil, a Relação pode atender, mesmo oficiosamente, a quaisquer elementos probatórios que “hajam servido de fundamento à decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados”; e que, não havendo gravação dos depoimentos, a decisão da 1ª instância só pode ser alterada pela Relação “se do processo constarem todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre os pontos da matéria de facto em causa”.
Ilustrando esta posição legislativa, extrai-se do acórdão da Relação de Lisboa de 8.2.2007[5] que, havendo produção de prova testemunhal sem que os respectivos depoimentos tenham sido gravados, não é possível reapreciá-los e, com efeito, fica inviabilizada a eventual modificação da matéria de facto apenas, ou também, com base neles fixada. E --- dizemos nós --- fixada pela positiva ou pela negativa. É que neste caso não ficam a constar do processo todos os elementos de prova que serviram de base àquela decisão.
Sedimentando tal entendimento, decorre do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16.9.2008[6] que na primeira parte da al. a) do nº 1 do art.º 712º se enquadram as situações em que não houve lugar à produção de prova testemunhal ou, tendo ela sido produzida sem que houvesse gravação, a mesma teve lugar antecipadamente ou por deprecada ou carta rogatória e reduzida a escrito designadamente por impossibilidade da realização daquele registo de voz. Nestas condições, da referida al. a), a reapreciação da prova e a eventual alteração da matéria fixada pressupõe a documentação total da prova que serviu de base à decisão, ou que tenha sido impugnada a decisão baseada em prova gravada.
Por conseguinte, não é com base na referida al. a) do nº 1 do art.º 712º que pode ser reapreciada a matéria de facto impugnada pelo A.
A al. b) do nº 1 do art.º 712º permite a modificação da matéria de facto se, no processo, houver prova irrefutável em sentido diverso. Este fundamento está, como se sabe, relacionado com o valor legal da prova, exigindo-se que a força probatória dos elementos coligidos no processo não possa ser afastada pela prova produzida em julgamento. Ao abrigo desta alínea b) a alteração das respostas só é admissível quando haja no processo um meio de prova plena, resultante de documento, confissão ou acordo das partes, e esse meio de prova plena diga respeito a determinado facto sobre o qual o Tribunal também se pronunciou em sentido divergente. Como ensina o Prof. Alberto dos Reis[7], “se estiver junto aos autos documento que faça prova plena ou cabal de determinado facto e o juiz, na sentença, tiver admitido facto oposto, com base na decisão do tribunal colectivo, incumbe à Relação fazer prevalecer a força probatória do documento”.
A prova deve ser apreciada no seu conjunto, conjugando todos os elementos produzidos no processo e atendíveis, independentemente da sua proveniência, em face do princípio da aquisição processual (art.º 515º do Código de Processo Civil). Por outro lado, como se disse já, o artigo 655º n.º 1, do Código de Processo Civil, consagra o denominado sistema da prova livre, segundo o qual o tribunal aprecia livremente as provas, decidindo os juízes segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto.
Sendo particulares e sem força probatória plena os documentos oferecidos pelo A., e tendo sido livremente conjugados pela Ex.ma Juiz, nos termos do art.º 655º do Código de Processo Civil, com os depoimentos testemunhais produzidos em audiência de julgamento, para o mesmo Julgador concluir que é de afastar o respectivo teor e a prova que deles o A. pretendia que fosse extraída na matéria da contestação, torna-se evidente a inacessibilidade deste tribunal ad quem ao conjunto das provas produzidas de modo a permitir uma nova apreciação.
A al. c) do nº 1 do art.º 712º do Código de Processo Civil, viabiliza a eventual modificação da matéria de facto se o recorrente apresentar documento novo superveniente irrefutável, no sentido de destruir todas as outras provas; o que também não é, manifestamente, o caso.
Admitir, no caso sub judice, a reapreciação da matéria de facto, sem o registo da prova oralmente produzida seria violar o referido normativo processual. Daí que não seja sindicável a matéria de facto que foi fixada na 1ª instância.

Dada a supra referida ablação de um facto, constante do item 4º dos factos provados, passa a ser a seguinte, a matéria provada e a considerar:
1) A requerente e o requerido casaram em 28 de Fevereiro de 1980 - doc. de fls. 15 e 16.
2) A requerente é doméstica, não auferindo qualquer rendimento.
3) O requerido trabalha na Suíça, com um rendimento de 3367,50 francos, correspondente a cerca de € 2.200,00 mensais.
4) A requerente cuidava da casa e dos filhos, tendo também em determinado período exercido actividade em limpezas e noutra altura tendo acumulado tal actividade com outra num restaurante.
5) Uma das filhas do casal, maior, vive ainda com a requerente, sendo estudante na faculdade de enfermagem.
6) O requerido envia para a requerente e tendo em vista a colaboração para os estudos da filha o valor mensal correspondente a € 300,00 (cerca de 458,25 francos).
7) A requerente é ajudada pela família, bem como a sua filha “supra” referida.
8) O requerido teve um período de desemprego.
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B.
2ª questão: O enquadramento jurídico dos factos – O direito a alimentos
Por alimentos entende-se tudo o que é indispensável ao sustento, habitação e vestuário (art.º 2003º, nº 1, do Código Civil[8]).
Desde a versão inicial do Código Civil (Decreto-lei nº 47334 de 25 de Novembro de 1966) até à versão actual introduzida pela Lei nº 61/2008, de 31 de Outubro (aqui aplicável), pelas alterações introduzidas no art.º 2016º, os alimentos devidos entre os ex-cônjuges foram vistos, primeiro, basicamente, como uma sanção sobre o cônjuge único culpado ou o cônjuge principal culpado pelo divórcio quando ambos sejam considerados culpados, passando depois a predominar a sua natureza indemnizatória na reforma de 1977 (Decreto-lei nº 496/77, de 25 de Novembro), que ainda se mantém na mais recente actualização do referido preceito legal, como parte de uma reforma mais abrangente que eliminou a apreciação da culpa como factor relevante da atribuição de alimentos entre os ex-cônjuges (Lei 61/2008).
Quanto ao montante de alimentos, enquanto na versão inicial do Código Civil não existia norma especial relativa alimentos em caso de separação judicial de pessoas e bens ou divórcio, devendo aplicar-se a regra geral do art.º 2004º, segundo a qual os alimentos eram proporcionados aos meios daquele que haveria de prestá-los e à necessidade daquele com direito a recebê-los, considerando também a possibilidade de o alimentando prover à sua subsistência, já a reforma de 1977 estabeleceu um regime especial para o efeito no art.º 2016º, nº 3, segundo o qual “na fixação do montante dos alimentos deve o tribunal tomar em conta a idade e estado de saúde dos cônjuges, as suas qualificações profissionais e possibilidades de emprego, o tempo que terão de dedicar, eventualmente, à criação de filhos comuns, os seus rendimentos e proventos e, de modo geral, todas as circunstâncias que influam sobre as necessidades do cônjuge que recebe os alimentos e as possibilidades do que os presta”.
E foi assim também que a jurisprudência transitou da ideia de que o cônjuge culpado deveria proporcionar ao alimentando uma situação económica tendencialmente idêntica à da constância do matrimónio, para a posição de que “o direito a alimentos do divorciado, ao abrigo do art.º 2016º, tem natureza alimentar, pelo que não nasce por mero efeito da verificação do pressuposto da culpa previsto no n.º 1 do mesmo artigo, nem tem como finalidade assegurar ao requerente o mesmo padrão de vida que usufruía na vigência do casamento[9].
A versão actual do Código Civil, dada pela Lei 61/2008, foi mais longe. Viabilizando o divórcio a pedido de um cônjuge sem o consentimento do outro, com afastamento da apreciação da culpa por violação dos deveres conjugais, e com base na mera constatação de ruptura do casamento (art.ºs 1773º, nº 3 e 1781º), além de reforçar a ideia de que qualquer dos cônjuges tem direito a alimentos, independentemente do tipo de divórcio (por mútuo consentimento ou sem o consentimento do outro) afirmou o princípio de que cada ex-cônjuge deve prover à sua própria subsistência depois do divórcio (art.º 2016º, nº 1) e deixou expresso em letra de lei que “o cônjuge credor não tem o direito de exigir a manutenção do padrão de vida de que beneficiou na constância do matrimónio” (art.º 2016º-A).
Para a determinação do montante de alimentos a atribuir ao ex-cônjuge necessitado, além dos elementos acima referidos e indicados no art.º 2016º, nº 3, na versão da reforma de 1977, a última reforma acrescentou:
- A duração do casamento;
- A colaboração prestada à economia do casal; e
- Um novo casamento ou união de facto.
E se o princípio da autonomia económica do ex-cônjuge não foi tão longe quanto se chegou a propor[10], a verdade é que cada um dos ex-cônjuges deverá em princípio prover à sua subsistência. E só se a um deles tal não for de todo possível, terá então o direito a receber alimentos do outro cônjuge, em montante que lhe permita garantir um mínimo de vida digna, e sempre de acordo com as reais possibilidades económicas do ex-cônjuge obrigado a prestá-los. Este direito, assentando num dever assistencial que perdura para além do casamento, passou a ter carácter subsidiário[11] e, seguramente, limitado pela obrigação de socorro numa situação de grande exigência resultante de manifesta carência de meios de subsistência num quadro de impossibilidade ou séria dificuldade de obtenção de rendimento suficiente à realização de uma vida minimamente condigna.
É neste conjunto de circunstâncias e condições, essencialmente previstas nos art.ºs 2016º e 2016º-A, e à luz dos factos provados que há-de determinar-se o direito e, na afirmativa, o montante da pensão de alimentos a prestar pelo A. a favor da R. requerente.
Doméstica e sem rendimento algum, a requerente tem vivido com ajuda de familiares, tendo com ela residente ainda uma filha do dissolvido casal, maior e estudante de enfermagem. Está numa situação de dependência económica absoluta, embora relativamente à referida filha o A. preste já uma pensão mensal no valor de € 300,00.
Pelo seu rendimento do trabalho, de € 2.200,00 por mês, o A. está em condições de poder prestar alimentos.
Embora não estejam provadas as despesas do requerido que foram oportunamente alegadas, designadamente com renda de casa, água, electricidade, gás, transportes, seguro de saúde, tal ausência de prova refere-se sobretudo aos valores indicados, não tanto à existência de despesas dessa natureza, como parece resultar da fundamentação em matéria de facto constante da sentença recorrida.
Aliás, é do conhecimento geral que qualquer pessoa, principalmente as que vivem do seu trabalho pessoal, para mais na emigração, tem que suportar aquele tipo de despesas, indispensáveis ao dia-a-dia da vida em sociedade, sabendo-se também que na Suíça, onde o A. reside, o custo de vida é elevado.
O A. requerido suporta já uma pensão de alimentos (€ 300,00) a favor da filha e, ao contrário do que se ponderou na decisão em crise, não foi sequer alegado que a R. requerente não pode trabalhar, tendo ela experiência em trabalhos de limpeza e de hotelaria na área da restauração.
Ante a possibilidade de trabalhar, mas admitindo a dificuldade generalizada em obter emprego no país (que a requerente invoca no art.º 7º do seu requerimento inicial), como tem sido notório por causa da crise económica e financeira actual, maxime para uma mulher sem especial qualificação e com mais de 50 anos de idade (cf. fl.s 15 e 16), o A. requerido pode e deve prestar alimentos a favor da ex-mulher. Releva sobremaneira um casamento que durou quase 30 anos e em cujo âmbito A. e R. conceberam e criaram filhos, um deles ainda estudante e economicamente dependente.
Em todo o caso, a pensão em causa destina-se apenas a assegurar o indispensável à subsistência do ex-cônjuge e nunca poderá constituir um incentivo à acomodação de um beneficiário que pode trabalhar, quanto mais não seja algumas horas por dia ou alguns dias por semana na execução de trabalhos de limpeza e na restauração.
Nesta perspectiva, ponderando o critério legal, temos como justo e adequado às circunstâncias do caso que o A. suporte uma pensão de alimentos mensal a favor da R. requerente pelo montante de € 200,00 que, sendo um valor significativo quando associado à pensão que já suporta a favor da filha maior do casal, nem por isso faz perigar a sua a manutenção da sua qualidade de vida de acordo com a sua condição.
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SUMÁRIO (art.º 713º, nº 7, do Código de Processo Civil):
I- O art.º 2016º, nºs 1 e 2, do Código Civil, na redacção que foi introduzida pela Lei nº 61/2008, de 31 de Outubro, consagra o princípio segundo o qual os cônjuges devem prover à sua própria subsistência depois do divórcio e quer se trate de divórcio por mútuo consentimento, quer de divórcio sem o consentimento do outro cônjuge.
II- A título excepcional, nas condições previstas no subsequente art.º 2016º-A, pode um dos ex-cônjuges ser obrigado a prestar alimentos a favor do outro, mas, nesse caso, considerando que os rendimentos do obrigado se contêm dentro de valores medianos/baixos na sociedade em que vive, a prestação limitar-se-á a garantir ao beneficiário o necessário à subsistência, nunca devendo constituir um incentivo à ociosidade quando o mesmo está em condições de poder obter trabalho e rendimento próprio, em alguma medida ponderável.
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V.
Pelo exposto, acorda-se nesta Relação em julgar a apelação parcialmente procedente e, em consequência, altera-se a decisão recorrida fixando-se o dever de prestar alimentos pelo A. B… a favor da R. requerente C… no valor mensal de € 200,00.
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Custas da acção e da apelação por A. e R. na proporção do decaimento.
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Porto, 15 de Setembro de 2011
Filipe Manuel Nunes Caroço
Teresa Maria dos Santos
Maria Amália Pereira dos Santos Rocha
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[1] Cardona Ferreira, Guia de Recursos em Processo Civil, Coimbra, 4ª edição, p.s 54, 103 e 113 e seg.s.
[2] Acórdão da Relação de Coimbra de 9.3.2004, proc. nº 4070/03, in www.dgsi.pt.
[3] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 22.6.2005, proc. nº 05B1993, in www.dgsi.pt.
[4] Os sublinhados são nossos.
[5] In www.dgsi.pt.
[6] In www.dgsi.pt. Em sentido semelhante, acórdão da Relação de Lisboa, de 19.10.2006, proc. nº 6814/2006-6 e acórdãos da Relação de Coimbra de 22.2.2005, proc. nº 3794/04 e de 20.4.2010, proc. nº 286490/08.0YIPRT.C1, e da Relação de Évora de 8.11.2007, proc. nº 1610/07-3, publicados na mesma base de dados.
[7] Código de Processo Civil Anotado, vol. I, pág. 472.
[8] Diploma a que pertencem todas as disposições legais que se citarem sem menção de origem.
[9] Amadeu Colaço, Novo regime do Divórcio, Almedina, 2ª edição, pág.s 148 e 149, citando, entre outros, os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 18.6.1985, de 8.2.2000, de 16.5.2002 de 27.1.2005 e de 14.11.2006.
[10] No texto da Proposta de Lei n.º 509/X, que chegou a ser aprovada no Plenário da Assembleia da República e no âmbito da qual resultou o Decreto da AR n.º 232/X, era então estipulado, no artigo 2016.°-B do C.C, que a obrigação de alimentos devia ser estabelecida por um período limitado, salvo razões ponderosas, sendo que este período podia ser renovado. Aquele preceito foi eliminado.
[11] Amadeu Colaço, ob. cit., pág. 153.