Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
4944/21.8T8MAI.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: ANTÓNIO LUÍS CARVALHÃO
Descritores: PROCESSO DE CONTRA ORDENAÇÃO LABORAL
FASE ADMINISTRATIVA
ATO DE DELEGAÇÃO DE COMPETÊNCIAS
REVOGAÇÃO DA DECISÃO
Nº do Documento: RP202205044944/21.8T8MAI.P1
Data do Acordão: 05/04/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL; RECURSO DE CONTRA-ORDENAÇÃO LABORAL.
Decisão: RECURSO PROCEDENTE; REVOGADA A SENTENÇA.
Indicações Eventuais: 4. ª SECÇÃO SOCIAL
Área Temática: .
Sumário: I - O ato de delegação de competências fica perfeito na medida em que dele constem, de um modo claro e apreensível por um qualquer destinatário, os assuntos que o delegado poderá com base nele decidir como se essa solução promanasse do próprio delegante, não se exigindo que seja circunscrita uma espécie de poderes dentro dum género.
II - Assim, constando do ato de delegação a “aplicação das coimas e das sanções acessórias correspondentes às contraordenações laborais”, está determinado com clareza que foi delegada a competência para “decisão nos processos de contraordenação”, pois a aplicação de coimas e sanções acessórias implica necessariamente conduzir um procedimento que culmina com uma decisão (não havendo outra forma para essa aplicação), não havendo “invalidade por falta de especificação dos poderes conferidos”.
III - O art.º 36º, nº 2 do RPCOLSS ao prever a possibilidade de revogação, total ou parcial, da decisão, ainda que não afaste a prolação posterior de nova decisão, não permite a prática do ato decisório de novo indiscriminadamente, não consentindo o legislador uma reformulação do decidido que esvazie de sentido a impugnação judicial apresentada, estando subjacente uma ponderação do alegado na impugnação com obediência ao princípio da legalidade.
IV - O legislador não quis claramente permitir que, com a revogação, se voltasse atrás na fase administrativa e se voltassem a realizar diligências de instrução, derivando daqui que nunca poderá ser proferida nova decisão com alteração dos factos provados, pelo que não pode a ACT, depois de apresentada a impugnação judicial, revogar a decisão proferida e proferir nova decisão que altera a factualidade provada, a motivação da decisão de facto e o enquadramento jurídico.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Recurso Penal (contraordenação) n.º 4944/21.8T8MAI.P1
Origem: Comarca do Porto, Juízo do Trabalho da Maia – J1


Acordam em conferência na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto

RELATÓRIO
Em processo de contra ordenação foi aplicada pela Diretora do Centro Local do Grande Porto da Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT), coima no valor de €3.523,32 (três mil quinhentos e vinte e três euros trinta e dois cêntimos) à sociedade “A..., Lda.” (arguida), pela prática, a título de negligência e por reincidência, da contra ordenação muito grave prevista e punida pelo art.º 36º, nº 2 do Regulamento (UE) nº 165/2014, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 04.02.2014[1], art.ºs 25º, nº 1, al. b) e 14º, nº 4, al. a), da Lei nº 27/2010, de 30 de agosto, e art.º 561º do Código do Trabalho [estando em causa motorista da arguida que, ao ser inspecionada, foi verificado que não se fazia acompanhar de todos os registos referentes aos 28 dias anteriores ao da fiscalização (estavam em falta os relativos a 2 dias em que efetivamente houve condução em benefício da arguida), nem tinha consigo qualquer outro documento que permitisse ao agente fiscalizador aferir da justificação para falta dos registos ou justificasse as razões pela qual não os tinha na sua posse].

Inconformada com tal decisão, apresentou a sociedade arguida impugnação judicial, concluindo dever ser absolvida da prática da contra ordenação, ou se assim não se entender, deverá ser condenada a título de negligência com coima especialmente atenuada para metade do mínimo legal.

Foi proferido despacho a admitir a impugnação, com efeito suspensivo (nos termos do art.º 35º, nº 2 do RPCOLSS[2]).

Depois de realizado julgamento, foi proferida sentença decidindo julgar improcedente a impugnação judicial apresentada, mantendo integralmente a decisão recorrida.

Não se conformando com sentença proferida, dela interpôs recurso a sociedade arguida, formulando as seguintes CONCLUSÕES, que se transcrevem[3]:
…………………..
…………………..
…………………..
Termina dizendo ser notório que o tribunal a quo não fez a melhor interpretação do Direito aplicável, devendo o recurso ser julgado procedente e, em consequência, ser revogada a sentença recorrida.

Foi proferido despacho a admitir o recurso, para subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito suspensivo.

O MºPº apresentou resposta ao recurso, formulando as seguintes CONCLUSÕES, que igualmente se transcrevem:
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O Senhor Procurador-Geral-Adjunto, neste Tribunal, emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso, improcedendo as conclusões formuladas e mantendo-se a sentença recorrida, referindo essencialmente o seguinte:
Na douta decisão recorrida foi devidamente apreciada a validade da decisão administrativa, por haver sido proferida por quem tinha legitimidade para prolação do ato.
Não integra nulidade insuprível uma qualquer irregularidade, sendo que à arguida foi efetivamente dada a possibilidade de se pronunciar acerca de tudo aquilo que contra si está contido na decisão administrativa e da qual se pôde defender, por haver compreendido o seu sentido e alcance. Não vem invocada a violação de princípio e de norma procedimental, invocando-se apenas uma genérica invalidade e da qual não extrai quaisquer as consequências jurídicas que lhe possam aproveitar.
Tendo em consideração a factualidade dada como provada e os meios de prova que a sustaram, entendemos que a decisão recorrida se encontra bem fundamentada, de facto e de direito, não merecendo censura as questões a dirimir nos presentes autos, que foram adequadamente analisadas, o que afasta qualquer vício de erro de julgamento ou de inconstitucionalidade.
No mais, bem andou a Mmª. Juíza a quo no modo como apreciou a caracterização do tipo contraordenacional em imputado à Recorrente, com manutenção da condenação administrativa e tendo feito adequada fixação da medida da coima aplicável.
Do exposto decorre que a sentença recorrida observou os princípios do delito contraordenacional que se mostraram aplicáveis, com respaldo na jurisprudência que a este respeito se tem firmado.

Foi cumprido o disposto no art.º 417º, nº 2, do Código de Processo Penal.

Procedeu-se a exame preliminar, e foram colhidos os vistos, após o que o processo foi à conferência, cumprindo apreciar e decidir.
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FUNDAMENTAÇÃO
Conforme vêm considerando a doutrina e a jurisprudência de modo uniforme, à luz do disposto no art.º 412º, nº 1, do Código de Processo Penal (aqui aplicável por via do disposto no art.º 50º, nº 4 do RPCOLSS), o âmbito do recurso é definido pelas conclusões que o recorrente extraiu da sua motivação, em que resume as razões do pedido (e porque as conclusões resumem a motivação, todas as conclusões devem ser antes objeto de motivação), sem prejuízo, naturalmente, do conhecimento das questões de conhecimento oficioso.
Assim, aquilo que importa apreciar e decidir no âmbito deste recurso é:
● saber se a Diretora do Centro Local do Grande Porto da Autoridade para as Condições do Trabalho tinha competência (delegada) para decidir da aplicação das coima pela prática de contraordenação;
● saber se a decisão que aplicou a coima é nula, porque consubstancia a renovação de um ato administrativo revogado;
● saber se é imputável à empresa arguida a contraordenação em causa.
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Da delegação de poderes na Subdiretora do Centro Local do Grande Porto da Autoridade para as Condições do Trabalho:
Alega a Recorrente que da delegação de competência constante do Despacho nº 1125-C/2021[4] não resulta qualquer especificação ou individualização dos poderes para a tomada de decisões em processos de contraordenação.
O tribunal a quo decidiu não se verificar, a este propósito, qualquer nulidade, escrevendo o seguinte:
Relativamente a esta questão [da nulidade da decisão administrativa com fundamento na incompetência do órgão para a prática do ato], resultam assentes dos autos os seguintes factos:
a) O presente processo de contraordenação com o n.º ......... foi distribuído à Exma. Sra. Instrutora AA no dia 21 de agosto de 2018 (cf. documento junto aos autos a fls. 13).
b) A Exma. Sra. Instrutora identificada em a) elaborou a proposta de decisão com data de 06/07/2021 (cf. proposta de decisão junta aos autos de fls. 77 a fls. 92).
c) Por decisão datada de 22/07/2021, constam, entre outros dizeres: “No uso da delegação de competências que em mim foi delegada pelo Senhor Inspetor-Geral do Trabalho, conforme despacho n.º 1125-C/2021, publicado no Diário da República, II Série, n.º 18, de 27-01-2021, concordo com a proposta acima referida, a fls. __ dos autos, que aqui dou por inteiramente reproduzida, passando a fazer parte integrante da presente decisão. Nestes termos, aplico a A..., Lda. a coima de Euros 3.535,32 (tês mil e quinhentos e trinta e cinco euros e trinta e dois cêntimos (cf. decisão junta aos autos a fls. 93).
d) A decisão referida em c), termina com a seguinte menção “O(A) SUBDIRETOR(A)” assinatura “(BB)” (cf. decisão junta aos autos a fls. 93).
e) Foi publicado no Diário da República nº 18, 2ª série, PARTE C, página 407-(6) de 27 de janeiro de 2021:
“TRABALHO, SOLIDARIEDADE E SEGURANÇA SOCIAL”
“Autoridade para as Condições do Trabalho”
“Despacho (extrato) n.º 1125-C/2021”
“Sumário: Delegação de competências nos dirigentes em funções nos serviços da Autoridade para as Condições do Trabalho, no âmbito das respetivas unidades orgânicas”
“Tendo sido nomeada, nos termos do disposto nos artigos 42.º do Código de Procedimento Administrativo, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 4/2015, de 07 de janeiro, para o exercício das funções inerentes ao cargo de Inspetora-Geral da Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT), e de forma assegurar o normal funcionamento dessa Autoridade delego, no âmbito de atos de gestão corrente, ao abrigo do disposto no nº 2 do artigo 6.º e nº 1 do artigo 9º da Lei[5] n.º 2/2004, de 15 de janeiro, na sua atual redação, dos artigos 44º a 50º do Código do Procedimento Administrativo, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 4/2015, de 07 de janeiro, atento o disposto na alínea f) do n.º 1 do artigo 14.º do Decreto-Lei n.º 18/2008, de 29 de janeiro, que aprova o Código dos Contratos Públicos (CCP), na rua redação atual, e do artigo 109º do mencionado Código, nos Dirigentes em funções nos serviços da Autoridade para as Condições do Trabalho, a seguir indicados, no âmbito das respetivas unidades orgânicas, sem prejuízo do poder de avocação:
(….)
5- (…)
Na Diretora do Centro Local do Grande Porto, licenciada BB;
(…)
5.8- Aplicação das coimas e das sanções acessórias correspondentes às contraordenações laborais, com exceção das sanções acessórias de cessação da autorização do exercício da atividade e de interdição temporária do exercício da atividade, que me foi conferida pela alínea a) do n.º 1 e n.ºs 2 e 3 do artigo 3.º da Lei n.º 107/2009, de 14 de setembro, e pela alínea a) do n.º 1 do artigo 4.º do Decreto Regulamentar n.º 47/2012, de 31 de julho”.
(…)
Dispõe o artigo 1º da Lei nº 107/2009, de 14 de setembro que “A presente lei estabelece o regime jurídico do procedimento aplicável às contraordenações laborais e de segurança social”.
E dispõe o artigo 2º, nº 1, alínea a) do mesmo diploma legal que:
“1- O procedimento das contraordenações abrangidas pelo âmbito de aplicação da presente lei compete às seguintes autoridades administrativas:
a) À Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT), quando estejam em causa contraordenações por violação de norma que consagre direitos ou imponha deveres a qualquer sujeito no âmbito de relação laboral e que seja punível com coima”.
Mais dispõe o artigo 3º, nº 1, alínea a) do mesmo diploma legal que:
“1- A decisão dos processos de contraordenação compete:
a) Ao inspetor-geral do Trabalho (IGT), no caso de contraordenações laborais”.
Finalmente, dispõe o nº 3 do citado artigo 3º que “As competências a que se refere o presente artigo podem ser delegadas nos termos do Código do Procedimento Administrativo (CPA)”.
Atento o facto assente e) é o que ocorre nestes autos, uma vez que a competência a que alude o artigo 3º, nº 1, alínea a) da Lei nº 107/2009, de 14 de setembro cometida ao Inspetor-Geral do Trabalho foi delegada à Diretora do Centro Local do Grande Porto, Dra. BB, que, de facto, decidiu, tendo assinado a decisão [cf. facto assente d)].
De acordo com o facto assente d), ao invés de constar “diretora”, consta “subdiretora”, todavia, a identificação da Diretora está correta – BB – pelo que, decidiu quem tinha competência para o efeito.
A errada identificação da categoria profissional na decisão não tem a virtude de “anular” a decisão, é certo que é de evitar, todavia, trata-se de um erro de escrita sem consequência, uma vez que a Diretora do Centro Local do Grande Porto, Dra. BB, foi quem decidiu e assinou a decisão.
Por último, não compreende o Tribunal o argumento utilizado pela Recorrente no sentido que o órgão delegante quis, efetivamente, distinguir a competência da decisão (que não consta da delegação), da competência de aplicação das coimas (que foi especificamente objeto de delegação).
Como é que se pode aplicar uma coima sem ser através de uma decisão devidamente fundamentada?
Este argumento mostra-se ininteligível, para tanto transcreve-se algumas normas:
− artigo 8º, nº 1 da Lei nº 107/2009, de 14 de setembro “(…) da decisão da autoridade administrativa que lhe aplique coima, sanção acessória ou admoestação”;
− artigo 25º, nº 1 da Lei nº 107/2009, de 14 de setembro “A decisão que aplica a coima e as sanções acessórias contém”;
− artigo 32º da Lei nº 107/2009, de 14 de setembro “A decisão da autoridade administrativa de aplicação de coima é suscetível de impugnação judicial”.
Concluindo a delegação de “Aplicação das coimas e das sanções acessórias correspondentes às contraordenações laborais”, necessariamente importa a delegação da decisão de aplicação de coimas, pois inexiste forma de aplicar uma coima que não seja por meio de uma decisão administrativa.
Em face do exposto, julgo não verificada a nulidade da decisão administrativa com fundamento na incompetência do órgão para a prática do facto.
A delegação de competências/poderes consiste no ato pelo qual um órgão normalmente competente para a prática de certos atos jurídicos autoriza um outro órgão ou agente, indicados por lei, a praticá-los também.
Dispõe o nº 1 do art.º 47º do CPA[6] que no ato de delegação ou subdelegação, deve o órgão delegante ou subdelegante especificar os poderes que são delegados ou subdelegados ou os atos que o delegado ou subdelegado pode praticar, bem como mencionar a norma atributiva do poder delegado e aquela que habilita o órgão a delegar.
A propósito do CPA anterior ao atualmente em vigor[7], mas cujo nº 1 do art.º 37º tinha redação idêntica ao nº 1 do art.º 47º do atual CPA (grosso modo foi aditado o segmento final), escreveu-se no acórdão do STA de 11.01.2007[8] o seguinte (que dada a similitude de redações das versões do CPA tem aqui cabimento):
Quando o art.º 37º, nº 1, do CPA diz que o ato de delegação deve «especificar» os poderes que são delegados, o verbo está usado no sentido corrente de «indicar», «determinar» ou «mencionar» aqueles poderes, e não no sentido etimológico (speciem facere) de circunscrever uma espécie de poderes por contraposição a um género em que ela se incluísse.
Se assim não fosse, não cessariam as dúvidas acerca da regularidade dos atos de delegação, pois qualquer espécie de poderes – se não se tratar de uma ínfima espécie abaixo da qual só se encontrarão os atos singulares correspondentes ao exercício concreto dos poderes delegados – constituirá, por sua vez, um género em relação às espécies que acaso se divisem sob si.
Evidentemente que o legislador do CPA, ao aludir à especificação dos poderes delegados, não pretendeu arrastar os intérpretes para estas minúcias lógicas e as correlativas dificuldades; e antes quis, muito simplesmente, dizer que o ato de delegação só ficará perfeito na medida em que dele constem, de um modo claro e apreensível por um qualquer destinatário, os assuntos que o delegado poderá doravante decidir como se essa solução promanasse do próprio delegante.
Para apreciar a questão há que ter presentes os factos enunciados pelo tribunal a quo, supra transcritos.
No caso em apreço, do ato de delegação consta a aplicação das coimas e das sanções acessórias correspondentes às contraordenações laborais, o que, tendo presente que, como consta do aresto do STA citado, o legislador não exige seja circunscrita uma espécie dentro dum género, nos leva a dizer que está determinado com clareza que foi delegada a competência para “decisão nos processos de contraordenação”, pois a aplicação de coimas e sanções acessórias implica necessariamente conduzir um procedimento que culmina com uma decisão, não havendo outra forma para essa aplicação, como consta do RPCOLSS.
Ou seja, o ato de delegação de competências identifica com suficiente clareza, e de forma positiva, a extensão e o objeto da delegação, pelo que a decisão de aplicação de coima proferida pela Diretora do Centro Local do Grande Porto da ACT não enferma de invalidade por falta de especificação dos poderes conferidos.
De referir que, tal como refere a sentença recorrida, a menção no final dessa decisão a “SUBDIRETOR(A)” não gera nulidade, pois está identificada a Diretora com o seu nome (BB) que foi quem recebeu as competências delegadas (como consta do extrato do despacho publicado no DR acima referido, ponto 5).
De resto, depreende-se que tal referência resultará da utilização de minutas, pois nos despachos em que não terá sido utilizada minuta consta corretamente tratar-se da Diretora (cfr. por exemplo o despacho de 11.10.2021, a fls. 129-130).
Concluímos, então e sem necessidade de considerações mais desenvolvidas, que a decisão de aplicação de coima proferida pela Diretora do Centro Local do Grande Porto da ACT foi proferida por quem tinha competência para tal, por lhe ter sido delegada, sendo nessa medida válida, improcedendo o recurso nesta vertente.

Da nulidade da decisão da Diretora do Centro Local do Grande Porto da ACT proferida em 22.07.2021:
Alega, por outro lado, a Recorrente ser nula a decisão proferida em 22.07.2021 porque em 10.02.2021 havia sido proferida decisão, em relação à qual apresentou impugnação judicial, sendo depois notificada de decisão de revogação dessa decisão, e de seguida foi proferida aquela decisão de 22.07.2021, sucedendo, porém, que é substancialmente diferente da anterior, quando a ACT não tem competência legal para “reapreciar” o decidido.
O tribunal a quo decidiu não se verificar qualquer nulidade, escrevendo o seguinte:
Relativamente a esta questão [da nulidade da nova decisão por não ser a correção de mero lapso], resultam assentes dos autos os seguintes factos:
a) Consta do auto de contraordenação n.º ...-OG, elaborado pela G.N.R a descrição dos factos que justificam a violação da norma estatuída no artigo 36.º, n.º 2 do Regulamento (UE) n.º 165/2014 do Parlamento Europeu e do Conselho de 4 de fevereiro, conjugada com a norma estatuída no artigo 25.º, nº 1, alínea b) da Lei nº 27/2010, 30 de agosto (cf. auto de contraordenação de fls. 9).
b) Tal como resulta do aditamento ao auto de contraordenação a imputação à Recorrente de um comportamento violador das normas referidas em a) (cf. aditamento ao auto de contraordenação junta aos autos a fls. 11/12).
c) A Recorrente foi notificada pela ACT em 05/09/2018 nos termos e para os efeitos dos artigos 17.º e 19.º da Lei nº 107/2009, de 14 de setembro, com cópia do auto de contraordenação identificado em a) (cf. cópia da notificação junta aos autos a fls. 15).
d) A Instrutora a quem foi distribuído o procedimento de contraordenação apresentou uma proposta de decisão datada de 28/01/2021, subsumindo os factos à contraordenação estatuída no artigo 36.º, n.º 1 do Regulamento (UE) n.º 165/2014 do Parlamento Europeu e do Conselho de 04 de fevereiro, (cf. proposta de decisão junta aos autos de fls. 33 a fls. 47).
e) A Exma. Sra. Diretora do Centro Local do Grande Porto da Autoridade para as Condições do Trabalho proferiu a decisão datada de 10/02/2021, na qual deu por reproduzida a proposta identificada em d) com a aplicação da coima de € 3.535,32 à Recorrente (cf. decisão junta aos autos a fls. 48).
f) Notificada a decisão referida em e) à Recorrente, esta apresentou a impugnação judicial datada de 15/03/2021 à referida decisão (cf. articulado de impugnação judicial junto aos autos de fls. 56 a fls. 66).
g) Na sequência do referido em f), a Exma. Sra. Diretora do Centro Local do Grande Porto da Autoridade para as Condições do Trabalho decidiu em 06 de julho de 2021 que:
a) Revogo a decisão proferida no âmbito dos autos acima referidos, por a mesma dever considerar-se inválida, nos termos do artigo 120º, nºs 1, 2, alínea d), e 3, alínea c), do CPP, aplicável ex vi artigo 41º do RGCO, e do artigo 36º, nº 2 da Lei 107/2009 de 14 de setembro;
b) O aproveitamento de todos os atos praticados até à elaboração de proposta de decisão, seguindo-se os ulteriores trâmites do processo contraordenacional;
c) A notificação da arguida e respetivo mandatário do despacho que determinar o supra exposto”.
(cf. decisão junta aos autos a fls. 74)
h) A decisão referida em g) foi notificada à Recorrente e ao seu Ilustre Mandatário no dia 06 de julho de 2021 (cf. cópia das cartas de notificação juntas aos autos a fls. 75/76).
i) A Exma. Sra. Diretora do Centro Local do Grande Porto da Autoridade para as Condições do Trabalho proferiu nova decisão datada de 22/07/2021, subsumindo os factos à contraordenação estatuída no artigo 36º, nº 2 do Regulamento (UE) nº 165/2014 do Parlamento Europeu e do Conselho de 04 de fevereiro, de aplicação da coima de € 3.535,32 (cf. decisão junta aos autos a fls. 93).
j) A Recorrente apresentou o requerimento enviado pelo correio com data de 29/07/2021 a requerer “Seja anulado o aproveitamento dos atos praticados até à decisão final, porquanto todos os atos praticados após ter sido lavrado o auto inicial enfermam do mesmo erro que enfermava a decisão revogada” (cf. requerimento e envelope juntos aos autos de fls. 96 a fls. 100).
k) Por carta enviada em 27/08/2021 a Recorrente apresentou a impugnação judicial à decisão referida em i) (cf. requerimento e envelope de fls. 111 a fls. 126).
l) Na sequência da impugnação judicial referida em k) a Exma. Sra. Diretora do Centro Local do Grande Porto da Autoridade para as Condições do Trabalho, por decisão datada de 11 de outubro de 2021 remeteu os autos ao Ministério Público (cf. decisão junta aos autos a fls. 129/130).
(…)
Vejamos.
Dispõe o artigo 36.º da Lei n.º 107/2009, de 14 de setembro que:
1- Recebida a impugnação judicial e, sendo cado disso, efetuado o depósito referido no artigo anterior, a autoridade administrativa competente envia os autos ao Ministério Público no prazo de 10 dias, podendo, caso o entenda, apresentar alegações.
2- Até ao envio dos autos, pode a autoridade administrativa competente revogar, total ou parcialmente, a decisão de aplicação da coima ou sanção acessória”.
Igual regime está estatuído no artigo 62º do RGCO:
1- Recebido o recurso, e no prazo de cinco dias, deve a autoridade administrativa enviar os autos ao Ministério Público, que os tornará presentes ao juiz, valendo este ato como acusação.
2- Até ao envio dos autos, pode a autoridade administrativa revogar a decisão de aplicação da coima”.
O Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República emitiu o parecer n.º 5/2020 JCM, relativamente ao processo contraordenacional analisando em primeiro lugar o regime jurídico/legal do processo contraordenacional na Alemanha plasmado na OWIGStVGÄnd de 1968, que serviu de base ao Regime Geral das Contraordenações aprovado pelo Decreto-Lei nº 433/82 de 27 de outubro, sendo este regime jurídico (português) decalcado daquele (alemão na versão inicial da OWiG), pronuncia-se posteriormente sobre o regime jurídico/legal do processo contraordenacional nacional e, especificamente quanto à matéria ora em apreciação.
(…)
Apesar das vantagens acima enunciadas, o legislador português, pese embora ter procedido a várias reformas do RGCO posteriormente à reconstrução da fase intermédia do processo contraordenacional na Alemanha, promovida, sobretudo, pela OWIGStVGAnd de 1986, manteve esta fase com a configuração inicial, a qual foi decalcada da versão primitiva da OWIG de 1986. Ter-se-á entendido que as propaladas vantagens não justificavam a introdução de uma fase demasiada complexa num processo que se deveria caracterizar pela sua simplicidade.
Assim, o artigo 62º do RGCO limita-se, ainda hoje, a dizer que a autoridade administrativa, após ser recebida a impugnação judicial, pode revogar a decisão impugnada, ou, se assim não o entender, enviar os autos ao Ministério Público, em cinco dias, o qual, por sua vez, os remete ao juiz, valendo este ato como acusação.
Prevê-se, em primeiro lugar, a possibilidade da autoridade administrativa, face aos argumentos esgrimidos pelo arguido nas alegações e conclusões da impugnação judicial que lhe é apresentada, revogar a decisão sancionatória (artigo 62º, nº 2, do RGCO). Recebida a impugnação da decisão sancionatória proferida pela autoridade administrativa, esta tem o dever de analisar os argumentos aduzidos nas respetivas alegações e conclusões, reapreciando a sua decisão, podendo, se assim o entender, revogá-la, no prazo máximo de 05 dias (dentro do prazo que dispõe para enviar ao Ministério Público).
Em primeiro lugar, constata-se que a autoridade administrativa não tem poderes para verificar se a impugnação apresentada cumpre os requisitos legais.
E, conforme revela a curta duração do prazo para a autoridade administrativa reexaminar a decisão sancionatória, contrariamente ao que prevê a atual redação da OWiG alemã, resultante da reforma legislativa de 1986, também não lhe é possível realizar novas diligências de prova, com vista a tomar posição sobre a impugnação deduzida pelo arguido.
A autoridade administrativa já poderá, todavia, revogar a decisão sancionatória. A revogação deve basear-se no reconhecimento da existência de uma ilegalidade processual (v.g. a não audição do arguido) ou substantiva (v.g. aplicação de uma sanção acessória não prevista na lei), pelo que, apesar da terminologia utilizada, estamos perante uma situação que se equipara à anulação de um ato administrativo com efeitos retroativos (artigo 163º, n.º 2, do C.P.A.), o que permitirá, para além da possibilidade de uma revogação parcial (v.g. revogação limitada à aplicação da sanção acessória), o suprimento, se possível, da ilegalidade existente, seguida de prolação de nova decisão pela autoridade administrativa”.
De acordo com os factos assentes foi exatamente isto que a Entidade Administrativa fez: revogou a decisão que tinha proferido (que se equipara a anulação do ato administrativo) e supriu a ilegalidade existente – fundamentação jurídica da decisão diversa da que foi imputada no auto de contraordenação – com a prolação de nova decisão administrativa.
Neste parecer do Conselho Consultivo ora citado nesta sentença é citada a seguinte doutrina para justificar o parecer:
ANTÓNIO DE OLIVEIRA MENDES e JOSÉ DOS SANTOS CABRAL, Notas ao Regime Geral das Contra Ordenações e Coimas, 3.ª ed., Almedina, Coimbra, pág. 222, MANUEL SIMAS SANTOS e JORGE LOPES DE SOUSA, Contra Ordenações Anotações ao Regime Geral, 6.ª ed., Áreas Editora, Lisboa, 2011, pág. 490, ALEXANDRA VILELA, ob. cit. pág. 458.
No sentido de que a revogação da decisão sancionatória poderá ter outros fundamentos, AUGUSTO SILVA DIAS, ob. cit., pág. 243.
PAULO PINTO DE ALBUQUERQUE, ob. cit., pág. 260, anotação 16, apesar de referir que a revogação da decisão pela autoridade só pode basear-se em razões de legalidade, exemplifica como uma das situações em que é possível a revogação, a necessidade de um esclarecimento mais sólido dos factos.
BEÇA PEREIRA, Regime Geral das Contra Ordenações e Coimas, 10.ª ed., Almedina, Coimbra, 2014, pág. 178., e PAULO PINTO DE ALBUQUERQUE, ob. cit., pág. 260, anotação 15.
PAULO PINTO DE ALBUQUERQUE, ob. cit., página 260, anotação 17, admitindo também os efeitos retroativos da revogação da decisão sancionatória, invocando o disposto no anterior CPA, aponta como limite da nova decisão que venha a ser proferida não poder ser mais gravosa para o arguido que a decisão revogada, com fundamento na proibição da reformatio in pejus”.
Como se vê, nesta última anotação a entidade administrativa pode proferir uma nova decisão na sequência da revogação da anterior decisão, não pode é proferir uma decisão mais gravosa, o que não aconteceu nestes autos, pois a coima aplicada foi exatamente do mesmo montante.
Concluindo, o conceito jurídico de revogação utilizado no artigo 36º, nº 2 da Lei n.º 107/2009, de 14 de setembro, tal como utilizado no artigo 62º, nº 2 do RGCO, abarca o suprimento da ilegalidade existente na decisão revogada, seguida de nova decisão proferida pela autoridade administrativa.
A Recorrente defende o contrário porquanto equipara a decisão administrativa a uma decisão judicial e, por isso, estriba-se no disposto no artigo 380.º do Código de Processo Penal.
Todavia, uma decisão administrativa não é equiparada a uma sentença judicial antes é equiparada a uma acusação se impugnada judicialmente e apresentada a Juízo pelo Ministério Público, ver por todos, Acórdão de 30/11/2016, proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, com o nº de processo 33951/15.8T8LSB.L1-4, relatado pelo Venerando Juiz Desembargador Sérgio Almeida, disponível para consulta in www.dgsi.pt/jtrp “II. A decisão administrativa não é equiparável a uma sentença e não tem de conter os requisitos que a lei, nomeadamente processual penal, impõe para esta; corresponde, sim, impugnada judicialmente e apresentada em juízo pelo Ministério Público, nos termos do art.º 37 da Lei nº 107/2009 (e do art.º 62 da RGCO, Regime Geral das Contra Ordenações, aprovado pelo DL nº 433/82, de 27 de outubro, com as alterações sucessivas designadamente a introduzida pelo DL n.º 244/95, de 14/09) a uma acusação”.
Finalmente, utiliza-se o argumento por maioria de razão atenta a decisão “Decretada a nulidade da decisão administrativa não pode o juiz absolver a arguida e determinar o arquivamento dos autos, mas antes ordenar o envio do processo para a entidade administrativa a fim de serem supridas as omissões que estão na origem da nulidade” proferida pelo Tribunal da Relação de Évora no Acórdão de 22/04/2010, com o nº de processo 2826/08.8TBSTR.E1, relatado pelo Venerando Juiz Desembargador Gilberto Cunha, disponível para consulta in www.dgsi.pt/jtre.
A Recorrente utiliza um último argumento: a prolação da 1.ª decisão [factos assentes d) e e)] equivale a uma acusação e, como tal, não poderia a ACT proferir nova decisão [facto assente i)] por se tratar de uma 2ª acusação.
Todavia, não é assim, nos termos do artigo 62º, nº 1 do RGCO “Recebido o recurso, e no prazo de cinco dias, deve a autoridade administrativa enviar os autos ao Ministério Público, que os tornará presentes ao juiz, valendo este ato como acusação”, nem nos termos do artigo 37º da Lei n.º 107/2009, de 14 de setembro “O Ministério Público torna sempre presentes os autos ao juiz, com a indicação dos respetivos elementos de prova, valendo este ato como acusação”, nesta conformidade, apenas com a apresentação dos autos ao Juiz é que estamos face à apresentação de uma acusação, logo, afigura-se evidente que a 1.ª decisão proferida pela ACT [factos assentes d) e e)] e, por si revogada [facto assente g)] não vale como acusação.
Não se verifica, por conseguinte, a nulidade da nova decisão por não ser a correção de mero lapso ou erro dos serviços na remessa da impugnação judicial como invocado posteriormente pela Recorrente.
A questão está em saber se, prevendo o nº 2 do art.º 36º do RPCOLSS a possibilidade, após a apresentação da impugnação judicial, de revogação da decisão proferida, se pode depois dessa revogação ser proferida nova decisão, e na afirmativa com que âmbito pode ser proferida.
Como refere João Soares Ribeiro[9], o facto da Administração poder revogar a decisão, depois de a ter proferido, tem dois significados claros:
(i) o primeiro é que, ao contrário do que sucede com o juiz, o decisor administrativo não esgota a sua capacidade decisória depois da prolação da decisão;
(ii) o segundo é o de que ainda se está, e mesmo depois da apresentação e receção da impugnação judicial, dentro da fase administrativa que só termina com o envio dos autos (ao MºPº), sem prejuízo de, mesmo após esse ato, continuar a Administração a ter alguma intervenção no processo, designadamente mediante a atuação do MºPº (art.º 45º, nº 2)[10].
De acordo com o art.º 165º, nº 1 do CPA, revogar uma decisão administrativa proferida significa determinar a cessação dos seus efeitos, por razões de mérito, conveniência ou oportunidade, tendo, como regra, efeitos apenas para o futuro (art.º 171º, nº 1 do CPA).
Todavia, o nº 2 do art.º 36º do RPCOLSS não parece compaginável com razões de conveniência ou oportunidade (sendo afastadas pelo princípio da legalidade, previsto no art.º 43º do RGCOCC – aqui aplicável por via do disposto no art.º 60º do RPCOLSS – consagrado no art.º 3º, nº 1 do CPA, que dispõe que os órgãos da Administração Pública devem atuar em obediência à lei e ao direito, dentro dos limites dos poderes que lhes forem conferidos e em conformidade com os respetivos fins).
Com efeito, está expresso no art.º 36º, nº 2 do RPCOLSS, que a revogação (total ou parcial) apenas pode ter lugar após a apresentação da impugnação judicial (não antes), pelo que subjacente está uma ponderação do alegado nessa impugnação, mas tendo presente o princípio da legalidade, o qual também passa por a atuação da Administração estar em sintonia com os princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa-fé (cfr. art.º 266º, nº 2 da CRP)[11].
Ou seja, depois de proferida a decisão e tendo sido apresentada impugnação judicial, a autoridade administrativa envia em 10 dias o processo ao Ministério Público, podendo no entanto a autoridade administrativa, diante da motivação do impugnante, ao invés de fazer a remessa do processo, proceder à revogação total ou parcial da decisão, por razões de legalidade.
Não prevê o legislador a reformulação da decisão mas sim a sua revogação, total ou parcial, e não tendo a revogação, como se disse, como regra, efeitos retroativos (art.º 171º, nº 1 do CPA[12]), não se pode dizer que resulte claro que a autoridade administrativa possa praticar o ato decisório de novo.
No acórdão da Secção Social do TRL de 14.01.2004[13], então a propósito do art.º 62º, nº 2 do RGCOCC[14] [não existia o RPCOLSS, mas aquela disposição legal tem similitude com o nº 2 do art.º 36º do RPCOLSS], escreveu-se não ser possível proferir nova decisão, justificando-o da seguinte forma:
Dispõe esse art.º 62º:
“1- Recebido o recurso, e no prazo de cinco dias, deve a autoridade administrativa enviar os autos ao Ministério Público, que os tornará presentes ao juiz, valendo este ato como acusação.
2- Até ao envio dos autos, pode a autoridade administrativa revogar a decisão de aplicação da coima.”
O processo contraordenacional assume a natureza de procedimento administrativo até à sua fase judicial, sendo de admitir, em todos os casos não expressamente previstos e em que a lei a tal não se oponha, o recurso às normas e princípios do Código de Procedimento Administrativo. Como se refere no Ac. da Rel. do Porto de 27/05/2002, Col. Jur. XXVII, III, 233, essa natureza admite especialidades, consistindo uma delas a não admissibilidade de recurso hierárquico da sanção cominada, como resulta do disposto no art.º 59º, nº 1, do RGCO, que só pode ser atacada através de impugnação judicial para o tribunal comum, não sujeita, portanto, às regras do contencioso de anulação, mas às das transgressões e subsidiariamente às do processo penal, como resulta das disposições dos art.ºs 59º, 66º e 74º, nº 4, do RGCO.
Recentemente, o Tribunal Constitucional, por Acórdãos de 29/02/2003 e 4/02/2003, publicados no DR, II Série, de 16 de Abril e 23 de Maio de 2003, veio afirmar que o processo contraordenacional assume estruturalmente uma especial natureza mista, com uma clara feição de procedimento administrativo até à fase judicial, sendo que, em todas as circunstâncias não expressamente previstas (e não havendo disposição normativa que a tal se oponha), se terá de admitir o recurso à disciplina e princípios que genericamente regem esse tipo de procedimento.
João Soares Ribeiro, em estudo publicado no Prontuário de Direito do Trabalho, nº 63, pags. 99 e ss, depois de fazer referência à orientação de que a aplicação subsidiária do processo penal (prevista no art.º 41º, nº 1, do RGCO) seria especialmente aplicável à fase administrativa do processo de contraordenação, defende, como nos parece que é de defender, que está fora de questão que se terão de aplicar nessa fase, pelo menos nalgumas circunstâncias, normas próprias da atividade administrativa.
E, continua o mesmo autor, independentemente do RGCO se não referir nunca ao Cod. Proc. Administrativo como direito subsidiário, tem, contudo, a decisão judicial de dele se socorrer quando um conflito dessa natureza lhe é levado para dirimir em sede de recurso de impugnação judicial da decisão administrativa.
E um dos princípios que deverá reger o procedimento administrativo é o princípio da legalidade.
Determina a Constituição que a Administração prossegue um interesse público “no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos” – art.º 266º. Como corolário do disposto no art.º 3º, que determina que o Estado se subordina à lei fundamental e se funda na legalidade democrática. Daí a subordinação da Administração não só à Constituição como à Lei.
Esse princípio foi vertido no art.º 43º do RGCO (“O processo das contraordenações obedecerá ao princípio da legalidade”), constituindo a trave mestra onde deve assentar a atuação das autoridades administrativas ao longo de todo o processo.
Por tudo isso, não podemos concordar menos com o recorrente/MºPº quando afirma, nas suas conclusões de recurso, de que, na Administração, vigora o princípio de que o que não é proibido é permitido. Como salienta Diogo Freitas do Amaral, in Direito Administrativo, vol. II, ed. 1998, pág. 46, citado pelo arguido, nas suas contra-alegações, “a lei não é apenas um limite à atuação da Administração, é também o fundamento da ação administrativa. Quer isto dizer que hoje em dia não há um poder livre de a Administração fazer o que bem entender, salvo quando a lei lhe proibir; pelo contrário, vigora a regra de que a Administração só pode fazer aquilo que a lei lhe permitir que faça.
Por outras palavras, a regra geral – em matéria de atividade administrativa – não é o princípio da liberdade, é o princípio da competência. Segundo o princípio da liberdade, pode-se fazer tudo aquilo que a lei não proíbe; segundo o princípio da competência, pode-se fazer apenas aquilo que a lei permite”.
No particular domínio do processo contraordenacional pretende-se a obtenção do carácter de definitividade do ato. Ao invés do que sucede com um ato administrativo normal, a lei atribui ao ato produzido pela entidade administrativa carácter vinculante a ponto de o arguido poder reagir através de interposições de recurso para os tribunais – João Soares Ribeiro, estudo citado, pág. 103.
Tudo quanto se disse permite atingir aquilo que nos parece a mais correta interpretação do art.º 62º do RCGO, e ela é a de que, recebido a impugnação judicial, a autoridade administrativa só pode tomar uma de duas atitudes: ou envia os autos ao Ministério Público, para os efeitos previstos no nº 1; ou revoga a decisão de aplicação da coima.
Não há terceira alternativa, designadamente a de produzir nova decisão, nem que seja para corrigir ou completar a decisão já tomada, e que foi objeto de recurso para o tribunal. Assim o impede o princípio da legalidade, sendo que o verbo “revogar” só pode ter um sentido, o de dar sem efeito a decisão que aplicou a coima.
Se o legislador, nesse art.º 62º, quisesse conceder à autoridade administrativa o poder de proferir nova decisão certamente os termos utilizados seriam outros.
Aliás, aceitar a solução contrária seria abrir caminho a que, sempre que a autoridade administrativa, analisando a impugnação apresentada, entendesse que algo haveria que alterar ou completar, poderia proferir nova decisão, sem qualquer limite quanto ao seu número, o que, convenhamos, é repudiado pelo mais elementar bom senso. (sublinhou-se)
Na verdade, o propósito do legislador parece ter sido este: se em face do alegado na impugnação judicial apresentada a autoridade administrativa constatar que, por razões de legalidade, a decisão não deve manter-se na ordem jurídica, no todo ou em parte, pode revogar a mesma, total ou parcialmente, evitando o envio para se iniciar a fase judicial, cujo desfecho já se advinha.
É claro, em face do já dito, que o legislador não quis permitir que, com a revogação, se voltasse atrás na fase administrativa e se voltassem a realizar diligências de instrução, derivando daqui que nunca poderá ser proferida nova decisão com alteração dos factos provados.
Quer isto dizer que podemos assentar que, a admitir-se a prolação de nova decisão, não pode ser permitida a prolação de nova decisão sem limites.
E quando falamos em limites não nos referimos ao limite decorrente do princípio de reformatio in pejus, aqui aplicável[15], indiscutivelmente inultrapassável, mas a limites mais restritos que impeçam que a autoridade administrativa faça aquilo que o legislador manifestamente não contemplou: a reformulação da decisão proferida.
Assim, podemos dizer que o art.º 36º, nº 2 do RPCOLSS ao prever a possibilidade de revogação, total ou parcial, da decisão não afastará a prolação posterior de nova decisão, mas desde que não implique uma reformulação do decidido, que esvazie de sentido a impugnação judicial apresentada (perante a perspetiva de sucesso da impugnação não pode ser reformulada a decisão de forma a evitar esse sucesso), podendo tão-só ser supridas invalidades que a autoridade administrativa possa suprir.
Em suma, o art.º 36º, nº 2 do RPCOLSS permite que, em face da impugnação judicial apresentada, se evite a remessa para a fase judicial da decisão, ou de parte da decisão, que com certeza iria ser revogada (arquivando logo o processo), ou que com certeza voltaria à autoridade administrativa para ser suprida invalidade (fazendo-o desde logo, evitando delongas).
Admitir a prolação, após revogação de decisão, de nova decisão sem os limites acabados de referir seria arredar o princípio da legalidade com a latitude acima referida (previsto no art.º 43º do RGCOCC, aqui aplicável por via do disposto no art.º 60º do RPCOLSS).
Posto isto, vejamos o caso concreto.
Dos factos provados, constantes da transcrição da sentença supra, resulta o seguinte:
Em 10.02.2021 foi proferida decisão a aplicar coima de €3.535,32 à arguida, pela prática da contra ordenação muito grave prevista e punida pelo art.º 36º, nº 1 do Regulamento (UE) nº 165/2014, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 04.02.2014[16], art.ºs 25º, nº 1, al. b) e 14º, nº 4, al. a), da Lei nº 27/2010, de 30 de agosto, e art.º 561º do Código do Trabalho, constando dos factos provados que o veículo conduzido na altura estava equipado com tacógrafo analógico (ponto 6).
A arguida apresentou impugnação judicial alegando, entre o mais, ser nula a decisão por do art.º 25º, nº 1, al. c) do RPCOLSS (por mencionar quer o nº 1 quer o nº 2 do art.º 36º Regulamento (UE) nº 165/2014, do Parlamento Europeu e do Conselho) e por violação do dever de fundamentação (por não se perceber porque foi dado como provado o constante do ponto 6).
Em 06.07.2021 foi proferida decisão a revogar a decisão proferida, sendo essencialmente referido o seguinte:
Analisados os argumentos apresentados pela arguida julga-se de os considerar procedentes pelos seguintes motivos:
1. Considera a arguida a decisão administrativa proferida pelo Centro Local do Grande Porto da ACT, deverá ser nula, uma vez que a arguida vem acusada de duas infrações, ou seja, de violar os números 1 e 2 do artigo 36º do Regulamento (UE) nº 165/2014, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 04 de fevereiro de 2014.
2. Com efeito, sempre se terá de entender que assiste razão à arguida.
3. Afinal foi levantado à arguida o auto de notícia nº ... – OG por violação do disposto no art.º 36º, nº 2 do referido Regulamento e a decisão administrativa por lapso, considerou que foi violado o disposto no nº 1 do artigo 36º do referido Regulamento.
Em 22.07.2021 foi proferida nova decisão, a aplicar coima de € 3.535,32 à arguida da contra ordenação muito grave prevista e punida pelo art.º 36º, nº 2 do Regulamento (UE) nº 165/2014, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 04.02.2014, art.ºs 25º, nº 1, al. b) e 14º, nº 4, al. a), da Lei nº 27/2010, de 30 de agosto, e art.º 561º do Código do Trabalho, deixando de constar dos factos provados que o veículo conduzido na altura estava equipado com tacógrafo analógico[17].
Como refere a Recorrente, além dessa alteração nos factos provados (eliminação da referência a que o veículo estava equipado com tacógrafo analógico – passando a não estar expresso, diga-se, com que tipo de tacógrafo estava equipado) houve outras alterações, transcrevendo-se o referido pela Recorrente:
a) No facto dado como provado nº 2 consta, na nova decisão, que as atividades de viagens são a atividade principal da Recorrente, quando na primitiva decisão não existia essa referência;
b) Foi eliminado o facto nº 6 da decisão primitiva onde se lia: “O veículo pesado de matrícula ..-FA-.., está equipado com tacógrafo analógico”.
c) Foi acrescentado o facto nº 10 na nova decisão, dizendo, após a afirmação de que a condutora havia exercido condução nos dias discriminados, “facto dado a conhecer pela arguida na sua defesa”. Com esta alteração mexe-se na matéria de facto, mas não se mexe no número de factos provados. Ou seja, pretende-se criar a aparência de que não houve alterações, tanto assim que a factualidade continua a ter 19 factos dados como provados.
d) O atual facto nº 11 tem uma redação diferente do facto que na primeira decisão figurava no nº 10;
e) O anterior facto nº 11 pura e simplesmente foi eliminado da segunda decisão;
E mais! São também acrescentados vários pontos justificativos no subtítulo “VIII. DA MOTIVAÇÃO”. Onde se passa a enumerar os documentos que serviram de fundamento aos factos dados como provados, quando, na decisão primitiva, não foi feito qualquer exame crítico aos meios de prova que sustentaram a coima final aplicada.
Na verdade, foram mantidos 19 pontos, sendo eliminado aquilo que constava do ponto 6, como se disse, sendo o que consta do ponto 10 inovatório, mas que em rigor nem devia ali constar porque não representa um facto objetivo, traduzindo antes o meio de obtenção de prova que deveria constar da motivação, como aliás consta (é o seu teor: Facto dado a conhecer pela arguida na defesa escrita); no ponto 2 foi acrescentada a palavra “principal” a seguir a atividade; e o teor do ponto 10 (antes ponto 11) foi reformulado.
Por outro lado, na “motivação” da decisão de facto foram acrescentados 3 parágrafos com o seguinte teor (sendo que antes deles, além da referência genérica à análise ponderada e crítica da prova produzida de acordo com as regras da experiência comum, em concreto apenas constava que foi essencialmente tido em conta o auto de notícia da GNR e a defesa da arguida):
O facto provado sob o nº 2 resultou da consulta ao Sistema de Informação da Classificação portuguesa de atividades económicas (que se anexa).
O facto provado sob o nº 10 resultou dos docs. 1 e 2 da defesa escrita apresentada pela arguida (que se encontra junto aos autos).
Os factos provados sob os nºs 12, 13, 14 e 15 resultaram da consulta do Registo Individual de Infrações da arguida (que se encontra junto aos autos).
Como se vê, na nova decisão proferida em 22.07.2021 foi alterado o enquadramento jurídico da infração (de modo a ser considerado o nº 2 em vez do nº 1 do art.º 36º do Regulamento), foi alterada a matéria de facto e a motivação da decisão de facto.
Perante isto, quid iuris?
Da análise do processo recolhemos o seguinte: a condutora foi fiscalizada no dia 23.02.2018 quando conduzia viatura equipada com tacógrafo digital (com a matrícula ..-FA-..), estando em falta registos relativos aos dias 31.01.2018 e 15.02.2018, declarando ela ao agente autuante que nesses dias não conduziu mas se esqueceu da declaração da empregadora comprovativa; depois, na defesa escrita da arguida, foram juntos discos de tacógrafo analógico (viatura com a matrícula ..-..-VI) relativos àquela condutora e àqueles dias[18]; assim, na elaboração da primeira “proposta de decisão” não terá sido atentado que os discos se reportavam a outro veículo e foi considerado provado que o veículo com a matrícula ..-FA-.. estava equipado com tacógrafo analógico (apenas se depreende que assim seja, raciocinando sobre os elementos disponíveis, pois da motivação nada consta que explique a prova desse facto em concreto).
Esta confusão pode compreender-se admitindo um contexto de muito trabalho, mas importa ver se o legislador permite que após a revogação da decisão proferida em 10.02.2021 fosse proferida a decisão de 22.07.2021 com as alterações em relação à de 10.02.2021 que já se referiram.
Como acima se disse, e relembramos, estamos na fase administrativa, em que a decisão não constitui acusação (só quando o Mº Pº apresenta os autos ao juiz – art.º 37º do RPCOLSS), sendo nesse domínio que nos temos que situar, sendo por isso irrelevante saber se caso o processo tivesse prosseguido com a primeira decisão proferida poderia vir a ter lugar a alteração de factos (em sede de julgamento).
Decorre daquilo que já se expôs, que a primeira decisão terá partido de uma análise pouco cuidada do processo, pois assentou que o veículo estava equipado com tacógrafo analógico sem ser que resultava do processo, e nessa medida a infração imputada teve por base o disposto no nº 1 do art.º 36º do Regulamento, quando na verdade, o veículo estava equipado com tacógrafo digital[19], e como tal a existir infração será com referência ao nº 2 do art.º 36º do Regulamento.
A primeira decisão não explica porque razão foi dado como assente que o veículo estava equipado com tacógrafo analógico (nada diz na motivação especificamente sobre a questão), presumindo-se que tal derive de terem sido juntos dois discos de tacógrafo (analógico) com a defesa apresentada pela arguida, não tendo sido atentado que se reportavam a condução noutros dias noutro veículo (que estaria equipado com tacógrafo analógico), como acima se disse.
Acresce que o ponto 2 dos factos provados expressava tem como atividade, atividades agências de viagens (CAE ...), e passou a expressar (realçando-se o aditado) tem como atividade principal, atividades agências de viagens (CAE ...).
Não foi explicado porque foi feito esse aditamento, mas terá relacionado com o facto de na impugnação judicial que apresentara a arguida alegar que a determinação do objeto social da arguida não está completo, pois o mesmo é atividade de agência de viagens, turismo, transportes públicos de passageiros, e para obviar à incompletude foi acrescentado ser aquela a atividade principal (e será? não está justificado).
Não estamos, assim, claramente perante mero lapso, como foi dito na decisão de revogação, pois um lapso é algo que salta à vista da leitura do texto da decisão, revelado no próprio contexto, ou seja, ao ler o texto verifica-se que há erro, que não era querido dizer o que ficou a constar, e no caso em apreço manifestamente que não é isso que sucede.
Com efeito, evidencia-se uma alteração (ainda que não substancial) dos factos provados, da motivação e do enquadramento jurídico, por erro cometido na análise do processo que foi evidenciado na impugnação judicial apresentada pela arguida.
Temos, então que concluir, dizendo-o sem rodeios, que ao ser apresentada a impugnação judicial foi verificada a falta de rigor na consignação dos factos provados na primeira decisão, bem como, podemos dizê-lo, a ligeireza da motivação deles, e foi então alterado o que constava dos factos provados e acrescentada a motivação, e alterado o enquadramento jurídico (no sentido de que a infração a imputar seria por referência ao nº 2 e não ao nº 1 do art.º 36º do Regulamento).
Quer isto dizer que não se concorda com a apreciação do tribunal a quo quando afirma que aquilo que a ACT fez foi o seguinte: revogou a decisão que tinha proferido (que se equipara a anulação do ato administrativo) e supriu a ilegalidade existente – fundamentação jurídica da decisão diversa da que foi imputada no auto de contraordenação – com a prolação de nova decisão administrativa.
É que, a decisão não é necessariamente ilegal porque enquadra os factos em normas diversas das referidas no auto de contraordenação [que lei foi violada? não está dito], pelo que não foi suprida uma ilegalidade, foi sim reformulada a decisão antes proferida, alterando os factos provados, aditando a motivação da decisão de facto, e alterando o enquadramento jurídico.
Por outro lado, é muito duvidoso que a revogação se equipare à anulação, pois o legislador conhecedor dos dois conceitos utilizou o termo “revogação”.
Em suma, embora se nos afigure que a posição do acórdão do TRL de 14.01.2004 em relação ao, hoje, art.º 36º, nº 2 do RPCOLSS possa ser mitigada, de modo que possa ser admitida a prolação de nova decisão se estiver apenas em causa a supressão de invalidade que o pudesse ser (ainda que mesmo aí, o correto será suprir a invalidade diretamente, não revogar para decidir de novo), numa situação como a dos autos (em que é alterada, além do mais, a matéria de facto), acompanhamos o exposto nesse aresto, e concluímos não consentir o art.º 36º, nº 2 do RPCOLSS que seja proferida nova decisão pela autoridade administrativa, depois de revogar a anterior, alterando a factualidade provada, a motivação da decisão de facto e o enquadramento jurídico (ainda que se trate de uma alteração não substancial).
Sendo assim, a decisão proferida em 22.07.2021, porque não consentida em face do nº 2 do art.º 36º, nº 2 do RPCOLSS, é nula, e não podendo ser repetida determina o arquivamento do processo.

Procede, pois o recurso, ficando prejudicado o conhecimento da terceira questão acima enunciada.
*
DECISÃO
Pelo exposto, acordam os juízes da Secção Social do Tribunal da Relação do Porto em conceder provimento ao recurso e, em consequência, revogar a decisão recorrida e determinar o arquivamento do processo.

Sem custas.
Notifique.

(texto processado e revisto pelo relator, assinado eletronicamente)
Porto, 04 de maio de 2022
António Luís Carvalhão
Rui Penha
Paula Leal de Carvalho
____________________
[1] Será a este Regulamento que nos referiremos quando doravante mencionarmos Regulamento sem qualquer outra menção.
[2] Assim designamos o Regime Processual aplicável às Contra ordenações Laborais e da Segurança Social, aprovado pela Lei nº 107/2009, de 14 de setembro.
[3] As transcrições efetuadas neste acórdão respeitam o respetivo original, salvo correção de gralhas evidentes e realces/sublinhados que no geral não se mantêm (porque interessa o texto em si), consignando-se que quanto à ortografia utilizada se adota o Novo Acordo Ortográfico.
[4] Junto a fls. 131-133 doa autos [publicado (extrato) no DR, 2ª série – parte C, nº 18, de 27 de janeiro de 2021 (págs. 407 /6) a 407 (10)].
[5] O termo “aplicação” era manifesto lapso na transcrição do extrato do despacho, que se corrigiu (substituindo-se por “Lei”).
[6] Código do Procedimento Administrativo, aprovado (no uso de autorização legislativa) pelo DL nº 4/2015, de 07 de janeiro.
[7] Aprovado pelo DL nº 442/91, de 15 de novembro.
[8] Consultável em www.dgsi.pt, processo nº 0899/06 (citando o acórdão do STA de 15.10.2003, processo nº 046577, cujo sumário também é consultável em www.dgsi.pt).
[9] In “Contra Ordenações Laborais – regime jurídico”, 2011, 3ª edição, Almedina, pág. 76.
[10] Na 2ª edição da referida obra (“Contra Ordenações Laborais – regime jurídico anotado contido no Código do Trabalho”, 2ª edição, Almedina, 2003), antes do RPCOLSS, João Soares Ribeiro referia (pág. 203, nota de rodapé 294) ser muito duvidosa a competência para alterar, mesmo que em sentido favorável ao arguido, a decisão por parte da autoridade administrativa, por não convencer o argumento de que “quem pode o mais (revogar) pode o menos (alterar)” precisamente porque aqui o poder menos é nitidamente mais prejudicial ao arguido. Parecia, assim, apenas admitir como possível a revogação da decisão, não a sua reforma.
[11] Vd. Manuel Simas Santos e Jorge Lopes de Sousa, “Contra Ordenações – anotações ao regime geral”, 2ª edição, Dez. de 2002, Vislis Editores, pág. 272.
[12] Paulo Pinto de Albuquerque (in “Comentário do Regime Geral das Contraordenações – à luz da Constituição da República Portuguesa e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem”, Universidade Católica Editora, pág. 260, ponto 17), admite efeitos retroativos da revogação, mas reporta-se ao CPA entretanto revogado pelo DL nº 4/2015, de 07 de janeiro (cujo nº 2 do art.º 145º dispunha ter a revogação efeito retroativo quando se fundamente na invalidade do ato).
[13] Consultável em www.dgsi.pt, processo nº 8504/2003-4.
[14] Regime Geral das Contraordenações e Coimas, aprovado pelo DL nº 433/82, de 27 de outubro.
[15] Como refere Paulo Pinto de Albuquerque (in “Comentário do Regime Geral das Contraordenações – à luz da Constituição da República Portuguesa e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem”, Universidade Católica Editora, pág. 260, ponto 17), depois da interposição da impugnação judicial a autoridade administrativa não pode proferir decisão mais gravosa para o arguido, sob pena de a própria reação processual do impugnante se volver numa ocasião explorada pela autoridade impugnada para reformar a sua decisão em detrimento do impugnante.
[16] As propostas de decisão que suportam as decisões transcrevem tanto o nº 1 como o nº 2 do art.º 36º, apenas se sabendo que numa está em causa o nº 1 e noutra o nº 2 porque dizem “vem a arguida acusada de ter violado disposto no nº…” (o que se confirma na proposta da decisão de revogação).
[17] Tacógrafo que faz o registo (condução, descanso, outros tempos de trabalho e disponibilidade) analogicamente em folhas (discos de tacógrafo); existindo também o tacógrafo digital, que faz o registo digital, sendo o condutor titular de um cartão.
[18] O condutor de veículo equipado com tacógrafo digital, caso tenha conduzido nos 28 dias anteriores veículos equipados com tacógrafo clássico (analógico) tem que se fazer acompanhar dos respetivos discos, como consta do nº 2 do art.º 36º do Regulamento.
[19] Dizemos “estava” e não “estaria”, apesar de não constar dos factos provados (da segunda decisão) que o tacógrafo com o qual o veículo em causa estava equipado era digital, mas é o que resulta do processo analisado com algum cuidado e criticamente, havendo elementos bastantes para o inserir entre os factos provados (a própria leitura da auto elaborado pelo agente autuante evidencia-o ao falar de “registo da sua atividade” e não em discos de tacógrafo e ao mencionar o nº 2 do art.º 36º do Regulamento, sendo de resto admitido pela Recorrente).