Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
3003/18.5T8MAI.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: ANTÓNIO LUÍS CARVALHÃO
Descritores: ACIDENTE DE TRABALHO
DESCARACTERIZAÇÃO
RESPONSABILIDADE AGRAVADA
VIOLAÇÃO DAS REGRAS DE SEGURANÇA
Nº do Documento: RP202210033003/18.5T8MAI.P1
Data do Acordão: 10/03/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: RECURSOS PARCIALMENTE PROCEDENTES; ALTERADA A SENTENÇA
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL)
Área Temática: .
Sumário: I - Não existe fundamento para importar os factos dados como provados em sentença proferida em processo que apreciou impugnação judicial de decisão administrativa que sancionou a Empregadora pela prática de contraordenação [não se configurando a autoridade do caso julgado, nem se aplicando as presunções previstas nos art.ºs 623º (oponibilidade a terceiros da decisão penal condenatória) e 624º (eficácia da decisão penal absolutória) do Código de Processo Civil, que não têm aplicação em relação a processo de impugnação judicial de contraordenação].
II - Para que o acidente de trabalho seja descaraterizado nos termos do art.º 14º, nº 1, al. a) da LAT, não basta a mera violação das regras de segurança, sendo necessário que essa infração ocorra por culpa grave do trabalhador (não relevando os casos de culpas leves, desde a inadvertência, à imperícia, à distração ou ao esquecimento) e que este tenha consciência da violação.
III - Tendo uma máquina um gradeamento na zona da serra de corte e toda a estrutura que a compõe, mas existindo uma abertura que permite o acesso à estrutura da máquina de corte, onde se conclui existirem componentes da máquina em movimento, ainda que para aceder a esse local se imponha ir de cócoras ou, no limite, com as pernas completamente fletidas, integra-se a situação na 2ª parte do nº 1 do art.º 18º da LAT (que prevê que no caso de o acidente resultar da falta de observação, pelo empregador, das regras sobre segurança e saúde no trabalho, a responsabilidade é agravada).
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Recurso de apelação n.º 3003/18.5T8MAI.P1
Origem: Comarca do Porto, Juízo do Trabalho da Maia – J1

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:

RELATÓRIO
Depois de frustrada a tentativa de conciliação, AA, que estava casada com o sinistrado BB, apresentou petição inicial (PI) para impulso da fase contenciosa deste processo para a efetivação de direitos resultantes de acidente de trabalho (conforme art.º 117º, nº 1, al. a) do Código de Processo do Trabalho), contra “T..., S.A.” (1ª Ré ou Empregadora) e “X..., S.A.”[1] (2ª Ré ou Seguradora), pedindo a condenação da 1ª Ré a pagar-lhe o seguinte:
a) pensão anual no montante de € 3.766,10, até atingir a idade da reforma por velhice;
b) Pensão anual no montante de € 5.021,46, a partir da data em que atinja a idade da reforma por velhice ou a partir do momento em que ficar, se ficar, afetada por doença física ou mental que afete sensivelmente a sua capacidade para o trabalho;
c) subsídio de morte no montante de € 5.146,80;
d) subsídio por despesas de funeral no montante de € 1.385,00;
e) indemnização por despesas de transporte no montante de € 50,00;
pedindo que, subsidiariamente, caso o tribunal considere que a responsabilidade não recai sobre a 1ª Ré, fosse a 2ª Ré condenada nos exatos termos pedidos à 1ª Ré.
Fundou o seu pedido alegando, em síntese, que o seu marido trabalhava por conta da 1ª Ré, e em 08/05/2018 sofreu acidente de trabalho quando estava a fazer a manutenção da máquina de corte de painéis, o qual ocorreu porque a Empregadora não tomou as medidas de segurança que teriam evitado o acidente.

Citadas as Rés, cada uma apresentou contestação, alegando, em resumo:
-- a 1ª Ré, que o acidente se ficou a dever apenas à incúria do sinistrado que, violando todas as regras e indicações dadas, se enfiou debaixo da máquina sem qualquer necessidade, ninguém lhe tendo dado ordem para que efetuasse trabalho e/ou operação no local em questão, concluindo dever ser absolvida;
-- a 2ª Ré, que o acidente ocorreu devido à falta de observância das condições de segurança por parte da 1ª Ré, sendo esta a única responsável pela reparação nos termos do art.º 18º, nº 1 da LAT[2], devendo ser reconhecido à 2ª Ré o direito de regresso quanto às quantias que vier a pagar à Autora em cumprimento da decisão a proferir nos autos.

Remetida citação ao Centro Distrital Segurança Social – ... e ao Centro Nacional de Pensões, nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 1º, nº 2 e art.º 3º do Decreto-lei nº 59/89, de 22 de fevereiro, nada foi alegado.

Foi proferido despacho saneador, no qual foi afirmada a regularidade e validade da instância, consignando-se os factos assentes, fixado o objeto do litígio e enunciados os temas de prova.

Realizada «audiência de discussão e julgamento», foi proferida sentença decidindo o seguinte:
I) condenar a 1ª Ré a pagar à Autora:
− a pensão anual no montante de € 12.553,66, com vencimento desde o dia seguinte ao falecimento do sinistrado e a pagar nos termos previstos no art.º 72.º da Lei n.º 98/2009, de 04 de setembro, acrescida de juros de mora calculados à taxa legal de 4% ao ano, desde o vencimento até efetivo pagamento;
− o valor de € 5.661,48 a título de subsídio de morte, acrescido de juros de mora calculados à taxa legal de 4% ao ano, desde o dia seguinte ao falecimento do sinistrado até efetivo pagamento;
− o valor de € 1.385,00 a título de subsídio por despesas de funeral acrescido de juros de mora calculados à taxa legal de 4% ao ano, desde a citação da Ré até efetivo pagamento;
− o valor de € 50,00 a título de despesas de transporte, acrescido de juros de mora calculados à taxa legal de 4% ao ano, desde a citação da Ré até efetivo pagamento;
II) condenar a 2ª Ré, solidariamente, no pagamento das mesmas quantias, sem prejuízo do direito de regresso sobre a 1ª Ré.

Não se conformando com a sentença proferida, dela veio a 1ª Ré (Empregadora) interpor recurso, formulando as seguintes CONCLUSÕES, que se transcrevem[3]:
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Termina dizendo dever ser concedido provimento ao recurso e, em consequência, deve revogar-se a sentença nos termos expostos com a consequência de a Recorrente ser absolvida do pedido.

Não se conformando, igualmente, com a sentença proferida, dela veio a 2ª Ré (Seguradora) interpor recurso, formulando as seguintes CONCLUSÕES, que se transcrevem:
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Termina dizendo dever ser dado provimento ao recurso, revogando-se a sentença recorrida, substituindo-se por outra que condene a Recorrente (2ª Ré) solidariamente apenas nas prestações normais, sem prejuízo do direito de regresso.

A Autora apresentou resposta ao recurso apresentado pela 1ª Ré, formulando as seguintes CONCLUSÕES, que se transcrevem:
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Também a 2ª Ré apresentou resposta ao recurso apresentado pela 1ª Ré, formulando as seguintes CONCLUSÕES, que igualmente se transcrevem:
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Foi proferido despacho a mandar subir os recursos de apelação apresentados pela 1ª Ré e pela 2ª Ré, imediatamente, nos próprios autos, e com efeito meramente devolutivo.

O Sr. Procurador-Geral-Adjunto, neste Tribunal da Relação, emitiu parecer (art.º 87º, nº 3 do Código de Processo do Trabalho), referindo em essência, (i) quanto ao recurso da 1ª Ré que afigura-se-nos duvidoso que se mostrem reunidos todos os supra referidos pressupostos para se concluir pela responsabilidade agravada da 1ª Ré, na qualidade de Empregadora do Sinistrado, consagrada no artigo 18º da Lei nº Lei nº 98/2009 e que deve improceder a impugnação da decisão sobre a matéria de facto, e (ii) quanto ao recurso da 2ª Ré que o recurso merece provimento e deve revogar-se, nesta parte e segmento, a sentença recorrida.

Procedeu-se a exame preliminar, foram colhidos os vistos, após o que o processo foi submetido à conferência.
Cumpre apreciar e decidir.
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FUNDAMENTAÇÃO
Conforme vem sendo entendimento uniforme, e como se extrai do nº 3 do art.º 635º do Código de Processo Civil (cfr. também os art.ºs 637º, nº 2, 1ª parte, 639º, nºs 1 a 3, e 635º, nº 4 do Código de Processo Civil – todos aplicáveis por força do art.º 87º, nº 1 do Código de Processo do Trabalho), o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação apresentada[4], sem prejuízo, naturalmente, das questões de conhecimento oficioso.
Assim, aquilo que importa apreciar e decidir neste caso[5] é saber se:
Do recurso da 1ª Ré:
● A sentença é nula por omissão de pronúncia?
● Houve erro de julgamento sobre a matéria de facto?
● O acidente ocorrido deve ser descaraterizado por via do disposto no art.º 14º, nº 1, al. a) e/ou al. b) da LAT? (ou decorreu de atuação culposa da Empregadora conforme art.º 18º, nº 1 da LAT?)
Do recurso da 2ª Ré:
● A Seguradora não pode ser responsabilizada pelas prestações com o agravamento previsto no art.º 18º da LAT?
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Porque tem interesse para a decisão do recurso, desde já se consignam os factos dados como provados e como não provados na sentença de 1ª instância, objeto de recurso.
Quanto a factos PROVADOS, foram considerados os seguintes, que se reproduzem:
1. BB trabalhava por conta da Ré T..., sob a sua direção e fiscalização.
2. Desempenhava as funções de operador de máquinas de embalar.
3. Auferia o salário base de € 580,00 x 14 meses, acrescido de subsídio de alimentação, no montante de € 115,29 x 11 meses, e de outras remunerações, no valor de € 3.165,47, totalizando um salário anual de € 12.553,66.
4. A Ré T..., entidade patronal do sinistrado BB, havia transferido para a Ré Seguradora a responsabilidade por acidentes de trabalho mediante contrato titulado pela apólice nº ....
5. Em 08/05/2018, nas instalações da Ré T..., BB sofreu acidente do qual resultou a sua morte.
6. BB foi encontrado pelo colega de trabalho CC, caído no chão, debaixo da máquina de corte de painéis.
7. CC chamou os colegas que se encontravam na serralharia, entre eles DD, que verificou que a cabeça do sinistrado BB se encontrava envolta numa poça de sangue.
8. DD, com a ajuda dos restantes colegas, retirou o sinistrado BB da parte inferior da máquina, tendo-se, então, apercebido que tinha a cabeça esmagada.
9. Na altura a máquina encontrava-se em funcionamento.
10. Foi chamado o Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM), que declarou o óbito do sinistrado BB, bem como a Polícia de Segurança Pública (PSP), que elaborou participação que se encontra junto aos autos a fls. 33ss, cujo teor aqui se dá por reproduzido para todos os efeitos legais.
11. Realizada autópsia, foi possível verificar danos na cabeça, pescoço, abdómen, tórax, coluna vertebral e medula, concluindo-se que:
1ª - Em face dos dados necrópsicos, da informação circunstancial disponível e do resultado dos exames complementares, a morte de BB foi devida às lesões traumáticas crânio-meningoencefálicas, atrás descritas.
“2ª - Estas terão resultados de traumatismo de natureza contundente, tal como o que pode ter sido devido a acidente de trabalho - esmagamento, conforme consta da informação circunstancial facultada.
“3ª - Os resultados dos exames complementares realizados seguem em anexo ao presente relatório.” (Doc. 8 - Relatório de Autópsia Médico-Legal)”.
12. Tratando-se de acidente de trabalho, a Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) realizou inquérito, que se encontra junto aos autos a fls. 17ss, cujo teor aqui se dá por reproduzido para todos os efeitos legais.
13. E levantou auto de contraordenação à entidade empregadora pela violação dos artigos 11.º, n.º 1; 16.º, n.º 1; e 22.º, todos do DL n.º 50/2005 de 25 de fevereiro, que deu origem ao processo de contraordenação n.º ..., com aplicação de uma coima à arguida (em concurso de infrações com outras contraordenações).
14. Impugnada a decisão administrativa por parte da “T..., S.A.”, que deu origem ao recurso de contraordenação que correu termos sob n.º 1224/19.2T8MAI do Juiz 2 deste Tribunal, veio a ser proferida sentença em primeira instância que considerou provada a seguinte factualidade:
“Processos ...:
21. A impugnante tem como atividade a fabricação de outros produtos minerais não metálicos diversos, n.e., entre os quais a fabricação de painéis de lã de rocha destinadas a isolamentos térmicos e acústicos.
22. A zona da área de empacotamento das placas de lã de rocha localiza-se numa fase final da linha de produção.
23. O acidente mortal referido em 5 ocorreu na zona da linha de produção que procede ao corte transversal e consequente deslizamento das placas de lã de rocha, conforme verificado pela inspetora do trabalho da ACT através do documento da ocorrência com ficha CODU n.º ... do INEM que se deslocou ao local atestando e das participações do acidente de trabalho mortal efetuada pela empregadora, aos serviços da ACT em 08/05/2018 e da participação da PSP que se deslocou ao local.
24. O referido acidente ocorreu quando o trabalhador se encontrava nas instalações da impugnante, na zona inferior do equipamento de corte e das mesas de rolos transportadoras das referidas placas.
25. Conforme verificado presencialmente no local pela inspetora do trabalho, nesse mesmo dia 08/05/2018 pelas 15horas, o local em questão onde se localiza o corte das placas, tem uma estrutura de suporte do disco circular de corte transversal, que se movimenta horizontalmente, quando acionado automaticamente.
26. Junto ao raio de ação do equipamento de corte, encontra-se a mesa de rolos transportadores, por onde deslizam as placas de isolamento já cortadas.
27. A zona de corte e da mesa de rolos transportadores, encontram-se a cerca de um metro de altura do pavimento. O trabalhador terá entrado por baixo da mesa de rolos, deslocando-se por aí até à zona onde foi apanhado pela estrutura da máquina de corte, que lhe terá esmagado parte da cabeça.
28. Foi formalizada pela ACT nesse mesmo dia 08/05/2018 pelas 15 horas, uma notificação de suspensão imediata, daquela zona da linha de produção, onde se encontravam os equipamentos de trabalho de corte e transporte dos painéis de lã de rocha.
29. Foi efetuada ainda pela ACT, uma notificação para apresentação de documentos, entre os quais, um relatório de verificação das prescrições mínimas de segurança e de saúde na utilização de equipamentos de trabalho, tendo a empresa cumprido e exibido o relatório a seguir identificado.
30. No relatório de verificação n.º ... ... N.º: ..., efetuado em 14/05/2018 pela S..., S.A, ao equipamento de trabalho denominado Equipamento de Classificação para Linha de 1,2 m, com o n.º de série ..., foram assinaladas não conformidades quanto aos requisitos mínimos de segurança dos equipamentos de trabalho nos itens sistemas de comando (1), risco de contato mecânico (2) e sinalização de segurança (3), constando nos comentários a cada um desses itens o seguinte:
30.1 – “1 - O sistema de comando do equipamento – realizado por autómato próprio / quadro sinóptico ilustrado na Fotografia 2 – encontra-se em língua inglesa. Tomando em consideração a complexidade do equipamento, o proprietário deverá elaborar instrução de trabalho a afixar ao lado do quadro sinóptico, contendo as informações relevantes para o arranque, a paragem e, a operação do equipamento em condições de segurança.”
30.2 – “2- A zona inferior do tabuleiro de extração de produto – Fotografia 3 – carece de proteção adequada e eficaz contra o acesso ao interior da máquina, existindo desta forma o perigo de contacto mecânico com os órgãos móveis do equipamento. De forma análoga deverão ser previstas barreiras semelhantes nas laterais do equipamento (Fotografia 4). As escadas laterais de acesso à plataforma superior deverão possuir barreira que impeça o acesso não autorizado à mesma (Fotografia 5). Na plataforma superior deverá ser aplicada proteção adequada nas zonas que comunicam com o interior do equipamento (órgãos móveis)”.
30.3 – “3- O equipamento não tinha aposto a sinalização de segurança indispensável. Neste sentido, deverá ser aposto nas portas de acesso ao interior do equipamento, a sinalização de proibição de acesso ao interior do mesmo com o equipamento em funcionamento. De forma a completar a sinalização de segurança, deverão ser apostos pictogramas normalizados de alerta para o perigo de ocorrência de contacto mecânico com os órgãos móveis do equipamento.”
31. À data de 08/05/2018 o sistema de comando do equipamento em referência, realizado por autómato próprio/quadro sinóptico encontrava-se em língua inglesa.
32. À data de 08/05/2018, a zona inferior do tabuleiro de extração do produto que é possível visualizar na foto 3 de fls. 34 verso não tinha uma proteção que impedisse o acesso ao interior da máquina de corte pela referida zona.
33. À data de 08/05/2018, as escadas laterais de acesso à plataforma superior do equipamento em referência não tinham qualquer barreira ou sinalização.
34. À data de 08/05/2018, o equipamento em referência não tinha aposto nas portas de acesso ao seu interior qualquer sinalização de proibição de acesso ao interior do mesmo com o equipamento em funcionamento.
35. A zona concreta onde ocorreu a morte do trabalhador, apenas é visitada em algumas operações de limpeza e manutenção mais profundas, quando toda a estrutura produtiva está inativa.
36. O local por onde o trabalhador entrou por baixo da mesa de rolos não é um local de acesso, nem de operação de trabalho produtiva.
37. O equipamento produtivo em causa, todo ele, é composto por uma única linha de produção de lã de rocha.
38. O acidente ocorre quase no final da linha produtiva, na área em que ocorre o corte da lã de rocha.
39. A impugnante tem a sua unidade industrial licenciada.
40. O equipamento em causa tem certificação CE.
41. As medidas referidas no relatório aludido em 30 foram já implementadas pela impugnante.
42. A linha de produção em causa tinha assinaladas as áreas de trabalho e de intervenção, estando vedada a pessoas estranhas.
43. Só terão acesso à zona produtiva as pessoas autorizadas para o efeito, mormente os trabalhadores.
44. Os trabalhadores recebem formação relativa ao desempenho das tarefas, constando dessa formação a identificação das áreas de operação, as áreas interditas e as áreas de risco.
45. O próprio equipamento tem sistemas de segurança ativos, sendo que na área onde ocorreu o acidente, se se abrir a estrutura de proteção da zona de corte, a máquina pára automaticamente”.
15. Em tal sentença foi decidido que a arguida não incorreu na violação do disposto nos artigos 11º, nº 1 e 16º, nº 1 do DL n.º 50/2005, de 25 de fevereiro; tendo sido condenada por violação do disposto no artigo 22º do mesmo diploma.
16. Tal sentença foi confirmada por Acórdão do Tribunal da Relação do Porto.
17. A atividade da Ré T... – produção de lã de rocha – é única no país.
18. A Ré T... tem a sua atividade e unidade industrial devidamente licenciada, que periodicamente vai renovando.
19. E nesse licenciamento é tida em conta a linha de produção.
20. O equipamento produtivo, todo ele, é composto por uma única linha de produção, pensada, construída e montada de raiz.
21. O produtor do equipamento concebeu, elaborou e montou no local toda a linha de produção.
22. O equipamento em causa tem certificação CE e manteve-se nas condições previstas pelo fabricante.
23. Toda a linha de produção da T..., tem perfeitamente assinaladas as áreas de trabalho e de intervenção sendo certo que estas estão vedadas a pessoas estranhas.
24. Só terão acesso à zona produtiva as pessoas autorizadas para o efeito, mormente os trabalhadores.
25. Estes recebem e sempre receberam formação adequada ao desempenho das tarefas.
26. O acidente em causa ocorreu quase no final da linha produtiva, na área em que ocorre o corte da lã de rocha.
27. Daqui o produto fabricado e já cortado, segue para a área de embalamento/empacotamento destinando-se, depois, à armazenagem em lugar próprio para posterior venda.
28. Nesta parte do equipamento procede-se ao corte transversal das placas isolantes, tornando-as na forma e tamanho desejado, e consequente deslizamento delas por um tabuleiro de extração para uma outra secção onde se procederá ao embalamento/empacotamento do produto.
29. Esta estrutura encontra-se protegida com gradeamento em todo o seu volume e extensão – tipo gaiola – de forma a que se evitem contactos mecânicos com a serra de corte que, uma vez acionada, trabalha de forma automática.
30. O acesso ao interior desta secção, onde trabalha a serra de corte e toda a estrutura que a compõe, é feito por duas portas laterais, uma de cada lado, que fazem parte do gradeamento que a protege.
31. Assim que estas portas fossem abertas, à data do acidente como hoje, toda a máquina para de forma automática na medida em que o próprio sistema operativo que a rege (v.g. software), assume essa intrusão como uma falha e, à cautela, faz parar a serra de corte.
32. Para além disso existem zonas previamente delimitadas com linhas amarelas horizontais no solo que demonstram quais os limites de aproximação às máquinas de forma a evitar o contacto mecânico e demonstram quais as zonas onde se pode aceder.
33. Em redor desta máquina, essas linhas amarelas distam cerca de 60 cm, aproximadamente, do gradeamento que a envolve.
34. Apenas permitindo e indicando como pontos de contacto e de eventual passagem junto e até à máquina ao pé das portas referidas em 30.
35. Por debaixo do tabuleiro de extração do produto existe uma abertura nessa “gaiola” que envolve este equipamento.
36. Essa abertura não serve de acesso ao interior do equipamento.
37. Ao contrário dos locais permitidos para acesso ao interior onde esta intrusão se faz em pé, por esse caminho e abertura, qualquer homem terá que se introduzir de cócoras ou, no limite, com as pernas completamente fletidas e daí progredir, nesta posição, até à zona onde existia a estrutura da máquina de corte.
38. Aquele local e aquele equipamento não era o local habitual de trabalho do trabalhador sinistrado.
39. A T... tem na sua estrutura uma secção de serralharia e manutenção própria para tais serviços.
40. A manutenção ao equipamento é feita regularmente por técnicos competentes tendo este sido alvo de uma operação dessa índole muito pouco tempo antes do sinistro – cfr. doc. 1 e 2.
41. É frequente a T... efetuar análises de risco nas suas instalações e com referência aos diversos equipamentos que fazem parte da estrutura produtiva – vide doc 3 a 5 em específico quanto ao equipamento onde o sinistrado pereceu.
42. Esta máquina foi posta a funcionar no ano de 2003.
43. Na altura da sua produção foi construída com a mais alta tecnologia de ponta e dotada de todos os sistemas de segurança – o produtor é de um pais nórdico muito reconhecido pela sua extrema preocupação por questões de segurança ativa.
44. Todas as manutenções de vulto, quer ao nível estrutural quer ao nível mais operacional, são efetuadas ou pelos técnicos do fabricante ou por agentes por estes autorizados.
45. Ao longo de todos estes anos desde a data da sua instalação e arranque – quase 19 anos – nunca estes ou alguém detetou falhas de segurança no todo ou em partes do equipamento.
46. No dia seguinte ao acidente (09 de maio de 2018), a entidade S... efetuou uma vistoria ao equipamento e não detetou qualquer anomalia ou não conformidade no equipamento em questão – cfr. doc. 6.
47. No dia 14 de maio de 2018 foi efetuada nova vistoria pela mesma entidade (S...) ao mesmo equipamento e foram detetadas as seguintes irregularidades:
“…O sistema de comando do equipamento -realizado por autómato próprio/ quadro sinóptico encontra-se em língua inglesa”;
“…A zona inferior do tabuleiro de extração de produto carece de proteção adequada e eficaz contra o acesso ao interior da máquina, existindo desta forma o perigo de contacto mecânico com os órgãos móveis do equipamento”;
“… As escadas laterais de acesso à plataforma superior deverão possuir barreira que impeça o acesso não autorizado à mesma. Na plataforma superior deverá ser aplicada proteção adequada nas zonas que comunicam com o interior do equipamento (órgãos móveis) …”;
“…O equipamento não tinha aposto a sinalização de segurança indispensável” – Cfr. relatório de verificação n.º ... ... n.º ..., efetuado em 14/05/2018 pela “S..., S.A.” aludido no doc. 1.
48. Face às irregularidades apontadas foram propostas as seguintes medidas de proteção e prevenção a adotar:
“… Abertura das portas laterais do equipamento, com todo o sistema de comando desligado, para verificação visual de danos que possam ter ocorrido no conjunto, inerentes ao acidente de trabalho”;
“Colocação de instrução de trabalho, ao lado do quadro sinóptico, contendo as informações relevantes para o arranque, a paragem, a operação do equipamento em condições de segurança, de acordo com o relatório da S..., n.º ..., de 15 de maio de 2018”;
“Colocação de proteção adequada e eficaz, na zona inferior do tabuleiro de extração do produto, contra o acesso ao interior da máquina, por forma a evitar o contacto mecânico com os órgãos móveis do equipamento. Esta proteção fixa, será construída em estrutura tubular 20/20 mm em aço de construção, com refe de proteção quadriculada, 30/30 mm, dando cumprimento ao especificado no relatório acima mencionado”;
“Colocação de proteção adequada na zona lateral de corte por forma a impedir o acesso ao interior da máquina, impedindo, igualmente, o contacto mecânico com os órgãos móveis do equipamento. Esta proteção fica, será construída em estrutura tabular 20/20 mm em aço de construção, com rede de proteção quadriculada, 30/30mm, dando cumprimento ao especificado no relatório acima mencionado”.
49. Realizada tentativa de conciliação perante o MP, a Ré Seguradora declarou reconhecer a “existência do acidente como de trabalho, o nexo causal entre o acidente e a ocorrência mortal, bem como aceita que se encontra para si transferido o salário anual de € 12.553,66”, mais declarando que “não aceita qualquer responsabilidade pelas consequências do acidente pois considera que o mesmo se deveu única e exclusivamente à atuação culposa da entidade patronal por falta de cumprimento das normas de segurança, de acordo com a leitura que fazem do relatório da ACT” (cfr. Auto de Tentativa de Conciliação de 23/04/2019).
50. A Ré T..., apesar de aceitar a “existência do acidente de trabalho e respetivo nexo causal entre as lesões e a ocorrência morte”, bem como “que o sinistrado auferia o salário acima referido e que o mesmo estava integralmente transferido para a Companhia de Seguros”, “Quanto ao invocado pela Companhia de Seguros de violação de regras de Segurança, não aceita que tal tenha ocorrido como virá a comprovar em sede própria e, muito menos, que essa alegada violação seja culposa”, concluindo que “não aceita qualquer responsabilidade pelas consequências do acidente” (cfr. Auto de Tentativa de Conciliação de 23/04/2019).
51. A Autora era casada com o sinistrado BB aquando da sua morte.
52. BB nasceu em .../.../1961.
53. Era utente da Segurança Social n.º ....
54. A Autora teve despesas de funeral no montante de € 1.385,00.
55. A Autora teve despesas de transporte no montante de € 50,00.

E foram considerados como NÃO PROVADOS os seguintes factos, que igualmente se reproduzem:
1. O acidente de trabalho que vitimizou o sinistrado BB terá ocorrido após este ter sido convidado a efetuar manutenção na máquina de corte de painéis.
2. Aquela zona concreta, onde ocorreu a morte do trabalhador, apenas é visitada em algumas operações de limpeza e manutenção mais profundas, quando toda a estrutura produtiva está inativa.
3. As delimitações das linhas amarelas referidas em 32 e 33 dos factos provados impedem qualquer pessoa, trabalhador ou não, de se deslocar e intrometer na abertura referida em 35 dos factos provados.
4. Alguém que queira aceder ao interior do equipamento pela abertura referida em 35 dos factos provados terá que o fazer transpondo barreiras que fazem parte da estrutura da máquina.
*
Da nulidade da sentença:
Alega a Recorrente/1ª Ré (conclusão 15ª) que, ao não se ter pronunciado, positiva ou negativamente, acerca da prova destes factos [o constante dos artigos 22, 44, 48, 59 e 60 da sua contestação], estamos perante um caso nítido e flagrante de omissão de pronúncia uma vez que foi violado o artigo 607°, n° 3 e 4 do Código de Processo Civil com a consequência prevista no artigo 615°, n° 1, alínea d) do deste diploma ex vi artigo 1º, nº 2 do CPT.
Importa, então, começar por ver se a sentença recorrida padece de nulidade nesses termos.
De acordo com a alínea d) do nº 1 do art.º 615º do Código de Processo Civil[6] é nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento.
A nulidade em causa verificar-se-á, pois, se a sentença tiver deixado de se pronunciar sobre questões que devesse apreciar, vício esse que tem a ver diretamente com os limites da atividade de conhecimento do tribunal, estabelecidos no art.º 608º, nº 2 do Código de Processo Civil[7].
Há que ter presente que, como se escreveu no acórdão do STJ de 17/10/2017[8], as causas de nulidade da sentença visam o erro na construção do silogismo judiciário e não o chamado erro de julgamento, a injustiça da decisão, ou a não conformidade dela com o direito aplicável, nada tendo a ver com qualquer de tais vícios a adequação aos princípios jurídicos aplicáveis da fundamentação utilizada para julgar a pretensão formulada: não são razões de fundo as que subjazem aos vícios imputados, sendo coisas distintas a nulidade da sentença e o erro de julgamento, que se traduz numa apreciação da questão em desconformidade com a lei, ou seja, são vícios intrínsecos da formação da sentença, sendo vícios formais do silogismo judiciário relativos à harmonia formal entre premissas e conclusão, não podendo ser confundidas com hipotéticos erros de julgamento, sejam de facto ou de direito[9].
Ora, vista a alegação da Recorrente/1ª Ré constatamos que a mesma se traduz em discordância com o decidido em 1ª instância quanto a matéria de facto, mas não configura nulidade da sentença.
É que o tribunal a quo quando consignou os “factos provados (com interesse à decisão da causa)” excluiu a prova de qualquer outro dos alegados pelas partes, seja por não ter “interesse à decisão da causa”, seja por não terem ficado provados (como os que consignou como “factos não provados”), e a Recorrente/1ª Ré entende que existem factos por si alegados que têm interesse para a decisão da causa e resultaram da prova produzida pelo que deviam figurar entre os provados.
Note-se que, conjugando o art.º 607º, nº 3 com o art.º 5º, ambos do Código de Processo Civil, resulta que o juiz não tem que sinalizar os factos sem interesse para a decisão da causa, devendo sim sinalizar cada um dos factos com interesse para a decisão da causa de forma a cobrir todas as soluções plausíveis da questão ou questões a decidir (sobretudo os essenciais, mas também os instrumentais relevantes)[10].
De todo o modo, caso haja omissão de pronúncia sobre factos alegados que se apresentem como relevantes, tal não configura a nulidade em apreciação, antes determinará a anulação da decisão de 1ª instância para ter lugar a ampliação da matéria de facto, conforme o art.º 662º, nº 2, al. c) do Código de Processo Civil.
Estamos, então, perante alegado erro de julgamento na decisão sobre a matéria de facto (a apreciar infra), e não perante “omissão de pronúncia” pois o tribunal a quo pronunciou-se sobre quais os factos provados, mas não incluiu determinados factos que a Recorrente entende deverem ser considerados provados.
Em suma, não se verifica a alegada nulidade da sentença.

Do erro de julgamento sobre a matéria de facto:
Antes de se apreciar o erro de julgamento, importa apreciar desde já, porque a resposta que dê à mesma condicionará a apreciação infra, a questão da autoridade do caso julgado[11], uma vez que alega a Recorrente/1ª Ré que existem duas sentenças que apreciam a mesma factualidade, referindo-se à sentença proferida nestes autos e à sentença proferida em apreciação da impugnação judicial apresentada em processo de contraordenação (o referido no ponto 14 dos factos provados, no qual está reproduzida parte da factualidade ali dada como provada), para depois fazer apelo à sentença proferida nesse processo de contraordenação para justificar a prova neste processo de factos ali considerados assentes.
Não está em causa a utilização aqui de meios de prova produzidos naquele outro processo (como sejam depoimentos – cfr. art.º 421º do Código de Processo Civil)[12], mas a importação de factos provados noutro processo para este processo (o valor da decisão sobre matéria de facto noutro processo).
Ora, desde já se refere que não existe fundamento para transportar os factos dados como provados no processo relativo à contraordenação para este processo.
Note-se que, em processo civil, a decisão sobre matéria de facto não tem eficácia jurídica senão no concreto processo para o qual foi produzida a prova, não tendo autonomia em relação à sentença final (o art.º 619º, nº 1 do Código de Processo Civil limita o caso julgado material à decisão de mérito).
Como referem Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora[13], a força do caso julgado não se estende aos fundamentos da sentença, pelo que os factos considerados como provados nos fundamentos da sentença não podem considerar-se isoladamente cobertos pela eficácia do caso julgado, para o efeito de extrair deles outras consequências, além dos contidos na decisão final[14].
E o acabado de expor não é contrariado pelos arestos citados pela Recorrente/1ª Ré, os quais não se reportam a sentença que tenha sido proferida em processo de impugnação de contraordenação, pois nenhum deles tem por objeto decisão sobre matéria de facto (que é o que agora está em causa):
- no acórdão desta Secção Social do TRP de 11/10/2018[15], está subjacente decisão em fase liminar de absolvição da instância por verificação da autoridade de caso julgado em face de sentença proferida em ação anterior impulsionada pelas demandantes contra outra sociedade, decisão essa confirmada na Relação;
- no acórdão do STJ de 21/03/2013[16], está subjacente decisão proferida em despacho saneador (logo, antes de produção de prova) que julgou improcedentes alguns pedidos com base na autoridade de caso julgado da decisão proferida noutro processo, decisão revogada na Relação, depois confirmada esta no Supremo;
- no acórdão do TRC de 28/09/2010[17], está subjacente decisão proferida em despacho saneador (logo, antes de produção de prova) que julgou improcedente a verificação de caso julgado de decisão proferida noutro processo (excerto cível em processo penal) que absolvera seguradora por inexistência de seguro (julgando improcedente o caso julgado, conheceu de mérito considerando existir seguro válido e eficaz absolvendo o Fundo de Garantia Automóvel, contrariando assim o antes decidido).
Considerando o antes exposto, temos que uma situação como a equacionada pela Recorrente (de considerar factos provados em sentença proferida em processo de impugnação de contraordenação), apenas se poderia ponderar com a aplicação do disposto nos art.ºs 623º (oponibilidade a terceiros da decisão penal condenatória) e 624º (eficácia da decisão penal absolutória) do Código de Processo Civil, que se pode dizer serem desvios à regra de que a decisão dada a certa questão de mérito, transitada em julgado, é vinculativa fora do processo (apenas) quando haja identidade das partes.
Todavia, tais normas referem-se tão só ao processo penal, não havendo fundamento para dizer que a presunção ali prevista se estenda a outro tipo de processos, designadamente a um processo por contra ordenação[18].
Deste modo, fica desde já consignado que da junção da certidão da sentença proferida no processo relativo a impugnação judicial de contraordenação, identificado no ponto 14 dos factos provados (no qual estão reproduzidos os factos ali dados como provados, em parte), não resulta darem-se como provados factos que o foram naquele processo, nem derivando daí a presunção da existência/inexistência de factos.

Assente que não se transportam de forma automática os factos provados no processo em que foi proferida sentença apreciando impugnação judicial de contraordenação, passemos à apreciação do alegado erro de julgamento, começando por fazer uma breve referência aos termos em que tem lugar a impugnação bem como a apreciação a fazer pelo tribunal ad quem.
Para impugnação da decisão sobre matéria de facto com fundamento em erro de julgamento, é necessário que se indiquem elementos de prova que não tenham sido tomados em conta pelo tribunal a quo quando deveriam tê-lo sido; ou assinalar que não deveriam ter sido considerados certos meios de prova por haver alguma proibição a esse respeito; ou ainda que se ponha em causa a avaliação da prova feita pelo tribunal a quo, assinalando as deficiências de raciocínio que levaram a determinadas conclusões ou assinalando a insuficiência dos elementos considerados para as conclusões tiradas.
É que, a reapreciação pelo Tribunal da Relação da decisão da matéria de facto proferida em 1ª instância não corresponde a um segundo (novo) julgamento da matéria de facto, apenas reapreciando o Tribunal da Relação os pontos de facto enunciados pelo interessado (que circunscrevem o objeto do recurso)[19].
Assim, a parte recorrente não pode simplesmente invocar um generalizado erro de julgamento tendente a uma reapreciação global dos meios de prova, não podendo a censura do recorrente quanto ao modo de formação da convicção do tribunal a quo assentar, de forma simplista, no ataque da fase final da formação de tal convicção, isto é, simplesmente em defender que a sua valoração da prova deve substituir a valoração feita pelo julgador[20]; antes tal censura tem que assentar na violação de qualquer dos passos para a formação de tal convicção, designadamente por não existirem os dados objetivos que se apontam na motivação ou por se terem violado os princípios para a aquisição desses dados objetivos ou ainda por não ter existido liberdade de formação da convicção[21].
Em conformidade, o legislador impõe à parte recorrente, que pretenda impugnar a decisão de facto, um ónus de impugnação, devendo o recorrente expor os argumentos que, extraídos de uma apreciação crítica dos meios de prova, determinem, em seu entender, um resultado diverso do decidido pelo tribunal a quo, como consta do art.º 640º, nº 1 do Código de Processo Civil.
Há ainda que ter presente que a generalidade das provas produzidas em audiência de julgamento estão sujeitas à livre apreciação do tribunal, sendo esse o caso da prova testemunhal (art.º 396º do Código Civil), do depoimento de parte (na medida em que não seja confessório – art.º 361º do Código Civil) e das declarações de parte (art.º 466º, nº 3 do Código de Processo Civil).
De referir, ainda, que a modificação da decisão da matéria de facto se deva limitar aos pontos de facto especificamente indicados, cumprindo os requisitos que se expuseram, o Tribunal da Relação não está limitado à reapreciação dos meios de prova indicados por quem recorre, devendo atender a todos os que constem do processo[22].

Feitas estas considerações, e sem as perder de vista, vejamos a impugnação apresentada pela Recorrente, acompanhando a ordem da sua alegação:
factos alegados pelas partes não considerados:
Alega a Recorrente/1ª Ré que o por si alegado na contestação sob os artigos 22º, 44º, 48º, 59º e 60º constitui matéria de facto que deve ser considerada provada.
É o seguinte o teor desses artigos da contestação (reproduzindo-se outros artigos porque encadeados com os agora em causa):
20º Só terão acesso à zona produtiva as pessoas autorizadas para o efeito, mormente os trabalhadores.
21º Estes recebem e sempre receberam formação adequada ao desempenho das tarefas.
22º Dessa formação consta a identidade das áreas de operação, as áreas interditas e as áreas de risco quer particularmente no seu posto de trabalho quer a nível geral, ou seja, áreas de risco em todo o processo produtivo.
(…)
39º Por debaixo do tabuleiro de extração do produto existe uma abertura nessa “gaiola” que envolve este equipamento.
40º Mas essa abertura não serve nem nunca serviu de acesso ao interior do equipamento.
41º Tanto assim é que as delimitações das linhas amarelas impedem a deslocação de qualquer pessoa, trabalhador ou não, de se lá deslocar e intrometer.
42º Note-se o seguinte: mesmo que alguém queira por ali aceder ao interior do equipamento terá que o fazer transpondo barreiras que fazem parte da estrutura da máquina.
43º Mais: ao contrário dos locais permitidos para acesso ao interior onde esta intrusão se faz em pé, por esse caminho e abertura, qualquer homem terá que se introduzir de cócoras ou, no limite, com as penas completamente fletidas e daí progredir, nesta posição, até à zona onde existia a estrutura da máquina de corte.
44º Por isso, é fácil de concluir que essa zona não faz parte da área de operação do equipamento.
(…)
48º Nunca em momento algum alguém com responsabilidades hierárquicas determinou ou emanou uma ordem junto do sinistrado para que este efetuasse qualquer trabalho e/ou operação naquele local.
(…)
59º De tudo quanto ficou dito resulta que o local onde ocorreu o sinistro não é, de todo, um local de acesso, nem de trabalho!
60º Como se disse, é preciso um esforço, vencendo os obstáculos, para lá chegar, porque não é área de operação produtiva.

Tendo ficado provado o alegado no artigo 21º da contestação (ponto 25 dos factos provados), defende a Recorrente/1ª Ré que também o alegado no artigo 22º da contestação deveria ter ficado provado, estando em causa a concretização da formação que é proporcionada pela Empregadora.
Desconsiderando a alegação de que tal ficou provado na sentença proferida em processo de impugnação de contraordenação, como desconsiderámos, temos que, para justificar a prova do facto, cita a Recorrente/1ª Ré excertos dos depoimentos das testemunhas EE e FF.
A Recorrida/Autora contrapõe que não releva o facto para a boa decisão da causa, nem existe suporte probatório para este facto, resultando dos excertos citados apenas que era dada formação “por posto de trabalho” (e o sinistrado não se encontrava num posto de trabalho específico).
Ora, o artigo 22º da contestação especifica o conteúdo da formação dada, e ouvidos os depoimentos, contextualizando os excertos citados, os mesmos não suportam de modo algum o ali alegado, pois é claro ser dada formação (e tal ficou provado), mas não ficou totalmente claro qual o conteúdo da formação dada aos trabalhadores [por exemplo, dando o fabricante ao fornecer a máquina formação sobre o funcionamento, como é natural, apenas aos engenheiros (não aos trabalhadores em geral), não ficou claro que formação em concreto era depois dada].
Sendo assim, sem necessidade de outras considerações, concluímos que não se impõe a alteração do decidido quanto a este ponto.

Quanto ao constante dos artigos 44º e 59º da contestação, desconsiderando a alegação de que tal ficou provado na sentença proferida em processo de impugnação de contraordenação, temos que, para justificar a prova dos factos, cita a Recorrente/1ª Ré excertos dos depoimentos das testemunhas GG e EE.
Ora, resulta claro da própria redação destes artigos (é fácil de concluir que… e resulta que…) que os mesmos são a conclusão retirada pela 1ª Ré sobre aquilo que alegou nos artigos da contestação que precederam os agora em causa.
Como se escreveu no acórdão desta Secção Social do TRP de 09/03/2020[23], “as afirmações de natureza conclusiva devem ser excluídas do elenco factual a considerar, se integrarem o thema decidendum, entendendo-se como tal o conjunto de questões de natureza jurídica que integram o objeto do processo a decidir, no fundo, a componente jurídica que suporta a decisão”.
As conclusões em causa inserem-se no núcleo dos factos essenciais para apreciação da responsabilidade na ocorrência do acidente.
Sendo assim, no enquadramento jurídico (a fazer infra) será ponderado, se for oportuno, se a conclusão pode ser retirada, mas não é de incluir as conclusões entre os factos provados, improcedendo nesta parte o recurso.

Quanto ao constante do artigo 48º da contestação, cita a Recorrente/1ª Ré excertos dos depoimentos das testemunhas GG e EE, dizendo que, como superiores hierárquicos do sinistrado, foram perentórios em afirmar que não lhe deram qualquer ordem para que efetuasse qualquer trabalho e/ou operação no local onde ocorreu o acidente.
A Recorrida/Autora contrapõe que este facto está conexionado com o ponto 1 dos factos não provados, e não releva o facto para a boa decisão da causa, além de que os excertos dos depoimentos são genéricos, não tendo as testemunhas sido questionadas sobre o caso específico dos autos, não excluindo que em concreto tenha havido ordens emanadas por outros trabalhadores.
Neste artigo da contestação está em causa a ausência de ordem para o sinistrado estar no local onde ocorreu o acidente, sendo correto que este artigo está conexionado com o ponto 1 dos factos não provados (que diz que o acidente ocorreu depois de o sinistrado ter sido convidado a efetuar manutenção na máquina junto à qual foi encontrado), pelo que se transcreve o referido pelo tribunal a quo para justificar a não prova do mesmo:
Quanto aos factos não provados, não foi produzida qualquer prova sobre o facto não provado em 1, uma vez que nenhuma testemunha pôde confirmar que ao sinistrado tenha sido ordenada qualquer intervenção naquela máquina, até porque este não seria o seu local de trabalho, nem seriam estas as suas funções (manutenção), embora a testemunha HH, colega de trabalho da vítima, tenha referido que o sinistrado tinha um trabalho polivalente dentro da empresa (serralheiro, trolha…). Mas, em concreto, ninguém pôde confirmar este facto, sendo certo que a testemunha DD, seu superior hierárquico, referiu não lhe ter dado qualquer ordem para uma qualquer manutenção da máquina. É certo que perto do local onde ocorreu o acidente estava uma caixa de ferramentas, como referido pelas testemunhas DD e II e que consta da foto de fls. 110 dos autos, mas tal facto é insuficiente para se poder concluir pela prova deste facto.
Como acima se disse, a generalidade das provas produzidas em audiência de julgamento estão sujeitas à livre apreciação do tribunal.
Com efeito, dispõe o nº 5 do art.º 607º do Código de Processo Civil que o juiz aprecia livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto, ou seja, a apreciação da prova pelo juiz é pautada por regras da ciência e do raciocínio e em máximas de experiência, sendo a estas conforme, o que não se confunde com uma apreciação arbitrária[24].
Assim, não basta uma testemunha proferir palavras em determinado sentido para ficar provado o por ela dito, importando que as testemunhas sejam credíveis, que o depoimento tenha consistência de modo que o julgador, na sua livre apreciação, forme convicção de que o dito corresponde ao sucedido (o que fundamenta).
A fundamentação do tribunal a quo para a não prova do ponto 1 dos factos não provados é muito clara, estando suportada nas regras de raciocínio lógico e regras de experiência comum, pois não é de todo crível que o sinistrado se encontrasse num local com o acesso descrito no ponto 37 dos factos provados (acesso não fácil) sem qualquer motivação (seja por iniciativa própria, seja por determinação de outrem, algum propósito havia para se encontrar num local com aquele acesso).
Não estando provado este facto (ponto 1), o que não é posto em causa, pergunta-se se será de incluir entre os factos provados o artigo 48º da contestação.
Estando em causa um facto negativo e muito abrangente (ausência total de ordens) não será, diga-se, uma mera afirmação num depoimento de que a própria testemunha não deu ordens que determinará a prova do facto em causa.
Ora, ouvidos os depoimentos referidos não se adquire convicção de modo a dar como provado o facto, apenas se retirando que as duas testemunhas em causa não deram ordens (o que é natural, diga-se, pois GG logo no início do seu depoimento esclarece que quem dava ordens de serviço ao sinistrado era o seu superior hierárquico), mas não sendo seguro que ninguém deu alguma ordem ao sinistrado.
De resto, como sugere a Recorrida/Autora, a questão feita à testemunha GG de saber se deu ordens para realizar tarefa com as máquinas em funcionamento colocando em risco a segurança e a integridade física dos trabalhadores (cfr. excerto citado) não é correta, pois questionando-a dessa forma (com o segmento em itálico) não é de ter muita esperança em resposta positiva (as perguntas não devem constranger as testemunhas, devendo ser dada plena oportunidade de falar sobre o que sabe sem constrangimentos, devendo no caso a pergunta ser “aberta”, no sentido de procurar saber se a testemunha deu alguma ordem e na afirmativa qual foi ela[25]).
Assim, não se inclui entre os factos provados o constante deste artigo da contestação.

Quanto ao constante do artigo 60º da contestação, cita a Recorrente/1ª Ré excerto do depoimento da testemunha EE e documentos juntos (essencialmente figuras ilustrativas constantes do manual de instruções da máquina e fotografias da máquina constantes do Relatório da ACT) para justificar a prova do facto.
Alega a Recorrida/Autora que, sendo este facto idêntico ao constante do ponto 4 dos factos não provados (como refere a Recorrente/1ª Ré), bastava à Recorrente/1ª Ré impugnar este, mas o mesmo não corresponde à realidade donde não ser de o aditar.
Ora, o segmento final – não é área de operação produtiva –, corresponde àquilo que constava dos artigos 44º e 59º da contestação, que já supra se disse assumir cariz conclusivo; quanto ao demais, contém juízos conclusivos sobre aquilo que já consta do ponto 37 dos factos provados – é preciso um esforço – e assume carácter vago – vencendo os obstáculos –, não havendo, assim, fundamento para acrescer ao que já consta desse ponto.
Acresce que o excerto de depoimento citado é também ele pouco preciso, a não sustentar prova concreta.
Deste modo, não se inclui este artigo da contestação nos factos provados.

factos não alegados mas relevantes para a boa decisão da causa:
Fazendo apelo ao disposto no art.º 72º, nº 1 do Código de Processo do Trabalho, diz a Recorrente/1ª Ré que durante a audiência de discussão e julgamento foram produzidos factos que deveriam ter sido dados como provados que se mostram relevantes para a boa decisão da causa, a saber:
a) O sinistrado entrou pela abertura referida em 35 dos factos dados como provados, enfiando-se por debaixo e para dentro da máquina.
b) O sinistrado foi retirado daquele local tendo a cabeça esmagada.
c) Esta foi empurrada por uma parte da estrutura da máquina de corte em movimento contra a outra estrutura da mesma máquina – v.g. chassi.
É feito apelo ao disposto no art.º 72º, nº 1 do Código de Processo do Trabalho, que dispõe que, sem prejuízo do disposto no nº 2 do artigo 5º do Código de Processo Civil, se no decurso da produção da prova surgirem factos essenciais que, embora não articulados, o tribunal considere relevantes para a boa decisão da causa, deve o juiz, na medida do necessário para o apuramento da verdade material, ampliar os temas da prova enunciados no despacho mencionado no artigo 596.º do Código de Processo Civil ou, não o havendo, tomá-los em consideração na decisão, desde que sobre eles tenha incidido discussão.
Por sua vez, o nº 2 do art.º 5º do Código de Processo Civil, dispõe o seguinte:
2- Além dos factos articulados pelas partes, são ainda considerados pelo juiz:
a) Os factos instrumentais que resultem da instrução da causa;
b) Os factos que sejam complemento ou concretização dos que as partes hajam alegado e resultem da instrução da causa, desde que sobre eles tenham tido a possibilidade de se pronunciar;
c) Os factos notórios e aqueles de que o tribunal tem conhecimento por virtude do exercício das suas funções.
No entanto, não há necessidade de concretizar melhor este regime, porquanto os factos que a Recorrente/1ª Ré quer ver aditados não podem sê-lo pela seguinte ordem de razões.
Quanto à alínea a), está em causa uma conclusão [de que o sinistrado entrou pela abertura referida em 35 dos factos provados], a qual a Recorrente/1ª Ré retira citando excerto da testemunha DD e referindo os pontos 30 e 31 dos factos provados (sendo o raciocínio o seguinte: se o sinistrado tivesse entrado pelas portas referidas no ponto 31 dos factos provados a máquina teria parado).
Ora, é verdade que existe a possibilidade de recurso à prova por presunção (art.ºs 349º a 351º do Código Civil), caso em que se consagram factos (mas factos concretos, objetivos) que se provam por via indireta (teremos, então um facto indiciário e um facto presumido, unidos por um nexo lógico).
Explicando melhor: obtido por prova direta um determinado facto, pode através de um raciocínio presuntivo estabelecer-se um nexo lógico, assente nas máximas da experiência, com outro facto, e assim ficar este assente[26], fazendo o juiz a articulação de factos na fundamentação da sentença para obter conclusões (chegar a factos presumidos).
Mas a prova indireta não se confunde com o fazer suposições sobre o que terá sucedido, o que não se pode aceitar.
No caso em análise, o raciocínio da Recorrente/1ª Ré apresenta-se como lógico, mas em rigor apenas permite dizer que o sinistrado não entrou pelas portas em causa (pois caso tal tivesse acontecido a máquina teria parado).
De todo o modo, não se nos afigura que seja nesta fase que se deva fazer o juízo em causa e assentar a conclusão.
Ou seja, com base do assente o constante dos pontos 26 a 37 dos factos provados, aquando do enquadramento jurídico dos factos se ponderará como sucedeu o acidente, podendo passar, se for relevante para as questões a decidir supra enunciadas, por perceber como chegou o sinistrado ao local onde ocorreu o acidente.
Assim, não é aditado o que consta da alínea a).
Quanto à alínea b), no ponto 8 dos factos provados já consta que o trabalhador DD quando, com a ajuda de colegas, retirou o sinistrado do local, se apercebeu que o mesmo tinha a cabeça esmagada.
E estando assente que a testemunha se apercebeu de tal facto, não há que acrescentar que efetivamente tinha a cabeça esmagada, pois não são as testemunhas (a Recorrente indica o depoimento da testemunha DD, embora indique mais de uma hora de depoimento como o relevante para esta alínea), que não são médicos, a avaliar as condições físicas do sinistrado, sendo de considerar sim o Relatório de Autópsia junto aos autos (estando no ponto 11 dos factos provados a descrição do essencial do observado aquando da realização da autópsia por peritos médicos, sem que fique a consideração do Relatório de Autópsia junto ao processo, aquando do enquadramento jurídico, limitado ao transcrito nesse ponto dos factos provados).
Assim, também não é aditado o que consta da alínea b).
Quanto à alínea c), a mesma vem na sequência da anterior (b), estando em causa consignar como resultaram as lesões para o sinistrado.
Ora, como refere a Recorrente/1ª Ré, nenhuma das testemunhas que depôs em audiência de discussão e julgamento assistiu ao acidente, sendo certo que, como também refere a Recorrente/1ª Ré, testemunhas houve que falaram sobre como terá acontecido o acidente (a testemunha GG).
Só que, estando a máquina em funcionamento (ponto 9 dos factos provados), se se pode concluir que o sinistrado foi “apanhado pelo movimento da própria máquina” (como refere a testemunha II, Inspetora do Trabalho que procedeu a inquérito ao acidente de trabalho”, no excerto do depoimento citado pela Recorrida/2ª Ré) – pois se assim não fosse não apresentaria as lesões que estão descritas no Relatório de Autópsia junto ao processo –, o certo é que o espelhado na alínea c) – que, mais do que dizer que foi apanhado pelo movimento da máquina, concretiza que a cabeça do sinistrado foi empurrada por uma parte da estrutura contra outra parte da estrutura da máquina, sem dizer que estruturas são – já traduz a entrada no domínio das suposições (tanto que nem sabe a testemunha GG o que estava o sinistrado em concreto a fazer, e não resulta que tivesse estado no local imediatamente após a ocorrência do acidente, depondo sobre o que terá acontecido raciocinando tendo por base o modo de funcionamento da máquina, dizendo que só tem um elemento móvel, sendo os demais fixos).
Assim, também não é aditado aos factos provados o que consta da alínea c).

factos dados como não provados que teriam que ser considerados como provados:
Alega a Recorrente/1ª Ré que os pontos 2, 3 e 4 dos factos não provados deveriam figurar entre os factos provados.
O tribunal a quo justificou a não prova do ponto 2 dos factos não provados referindo o seguinte, que se transcreve:
Quanto ao facto não provado em 2, pese embora as operações de manutenção do equipamento onde ocorreu o acidente ocorram quando o mesmo está inativo, conforme factualidade provada em 39 a 41, é certo que as testemunhas JJ e HH referiram que por vezes é necessário ir desencravar o produto ou olear algumas peças durante a utilização do equipamento, sendo comum realizarem essas tarefas com o mesmo a funcionar. Por este motivo não poderá dar-se por provado que aquela zona concreta onde ocorreu a morte do trabalhador, apenas é visitada em algumas operações de limpeza e manutenção mais profundas, quando toda a estrutura produtiva está inativa.
A Recorrente/1ª Ré para justificar a prova deste facto indica os depoimentos das testemunhas DD, GG, EE e FF, mas, como refere a Recorrida/Autora sem cumprir o ónus acima referido previsto na alínea a) do nº 2 do art.º 640º do Código de Processo Civil de “indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso”, donde não se poderem considerar.
Refere, depois, a Recorrente/1ª Ré que o tribunal a quo valorou os depoimentos das testemunhas JJ e HH para dar como não provado este ponto, quando para a prova dos pontos 17 a 45 os não valorou.
Ora, como se vê do trecho acima transcrito, o tribunal a quo não formou convicção de que a zona concreta onde ocorreu o acidente fosse “apenas” visitada nas situações referidas no ponto 2 dos factos provados; quando refere os depoimentos das testemunhas JJ e HH é tão só para dizer que em face do por elas dito não formou aquela convicção (dito de outra forma: ficaram dúvidas sobre que fosse assim, de modo a ficar provado), o que é diferente de dizer que as testemunhas foram credíveis (estamos no âmbito dos factos não provados, note-se).
Do exposto resulta que não se impõe alterar o decidido, mantendo-se o ponto 2 dos factos não provados como não provado.
Quanto ao ponto 3 dos factos não provados refere a Recorrente/1ª Ré não se perceber ficar provado o que consta do ponto 32 dos factos provados e ficar este ponto 3 como não provado, sendo facto essencial o respeito pelas linhas.
A Recorrida/Autora pronunciou-se pelo indeferimento do requerido dizendo que as palavras têm significados: o eventual elemento dissuasor das linhas amarelas não pode ser confundido com um impedimento.
O tribunal a quo justificou a não prova do ponto 3 dos factos não provados referindo o seguinte, que se transcreve:
Quanto ao facto não provado em 3, as linhas amarelas referidas em 32 e 33 dos factos provados são apenas zonas delimitadas no chão pelo que, efetivamente, não impedem, uma vez que não constituem obstáculo físico, qualquer pessoa de se intrometer na abertura referida em 35 dos factos provados.
Percebe-se a razão do tribunal a quo em não dar como provado este ponto, encarando o “impede” como “obstáculo físico” mas o certo é que do ponto 34 dos factos provados já consta a expressão “apenas permitindo” que acaba por ser o contra polo do “impede” constante deste ponto 3.
Está em causa matéria alegada nos artigos 38º e 41º da contestação, sendo claro que o “impedir” não tem o sentido de as linhas marcadas no solo (visíveis nas fotografias) constituírem barreira física, mas antes de serem guias delimitadoras da zona onde não é permitido o acesso (porque perigoso).
Deste modo, não é adequado dar como provado o que consta no ponto 34 dos factos provados e consignar nos factos não provados o que consta no ponto 2 utilizando o argumento do tribunal a quo.
Assim, passa-se para os factos provados, mas de modo a não criar equívocos, substitui-se “impedem” por “visam impedir” porque traduz com maior rigor aquilo que já se encontra no ponto 34 dos factos provados.
Em suma, é eliminado o ponto 3 dos factos não provados, e é intercalado entre os pontos 33 e 34 dos factos provados, um ponto 33-a) com a seguinte redação:
33-a) As delimitações das linhas amarelas referidas em 32 e 33 dos factos provados visam impedir qualquer pessoa, trabalhador ou não, de se deslocar e intrometer na abertura referida em 35 dos factos provados.
Quanto ao ponto 4 dos factos não provados, está conexionado com o artigo 60º da contestação, tendo-se supra decidido não incluir nos factos por assumir cariz conclusivo e vago.
A Recorrida/Autora pronunciou-se pelo indeferimento pelo requerido, tal como fizera em relação ao artigo 60º da contestação.
O tribunal a quo justificou a não prova do ponto 4 dos factos não provados referindo o seguinte, que se transcreve:
Quanto ao facto não provado em 4, não foi feita qualquer prova sobre o mesmo, desconhecendo-se se aquela abertura tem quaisquer barreiras que fazem parte da estrutura da máquina e que tenham que ser transpostas para por ali aceder à mesma, nem tais barreiras são visionáveis nas fotografias juntas aos autos. As testemunhas inquiridas apenas fizeram referência à necessidade de ali ter se de entrar de cócoras, o que também resulta das fotografias dos autos, atenta a dimensão daquela abertura.
Ora, tal como o artigo 60º da contestação, também o ponto 4 dos factos provados assume cariz genérico e vago, pois não concretiza que barreiras são, pelo que não é um complemento válido àquilo que consta do ponto 37 dos factos provados.
Assim, não se impõe alterar o decidido, mantendo-se o ponto 4 dos factos não provados como não provado.

Em suma, em resultado da impugnação sobre a decisão sobre a matéria de facto apresentada pela Recorrente/1ª Ré apenas se elimina ponto 3 dos factos não provados, e é intercalado entre os pontos 33 e 34 dos factos provados um ponto 33-a) com a redação supra referida.
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Assentes quais são os factos provados, importa agora fazer o seu enquadramento, resolvendo as questões supra enunciadas.

Da responsabilidade da 1ª Ré:
A sentença recorrida afastou a descaracterização do acidente como de trabalho por via do disposto no art.º 14º, nº 1, alíneas a) e b) da LAT, e considerou que o acidente resultou da falta de observação de regras de segurança por parte da Ré entidade empregadora, ou seja, considerou enquadrar-se a situação dos autos no art.º 18º, nº 1 da LAT.
Entende a Recorrente/1ª Ré que o acidente “pode ser descaracterizado” por via da aplicação das alíneas a) e b) do nº 1 do art.º 14º da LAT, enquanto a Recorrida/2ª Ré entende que “a morte do trabalhador resultou da violação das regras de saúde e segurança no trabalho, em razão da máquina que o vitimou não cumprir sequer com os requisitos mínimos impostos pelo Decreto-Lei nº 50/2005, de 25 de fevereiro”, e a Recorrida/Autora, por sua vez, acompanha o decidido em 1ª instância.
Vejamos então.
Não é posto em causa que se verificou acidente de trabalho, mas é defendido pela Recorrente/1ª Ré não haver lugar a reparação dos danos decorrentes do mesmo por ter sido a vítima (trabalhador) a dar causa ao acidente, ou seja, haver descaracterização do acidente.
Dispõe o nº 1 do art.º 14º da LAT, que tem a epígrafe «descaracterização do acidente», no que ora importa, que o empregador não tem de reparar os danos decorrentes do acidente que:
a) For dolosamente provocado pelo sinistrado ou provier de seu ato ou omissão, que importe violação, sem causa justificativa, das condições de segurança estabelecidas pela entidade empregadora ou previstas na lei;
b) Provier exclusivamente de negligência grosseira do sinistrado.
É pacífico que o ónus da prova dos factos que importam a descaracterização do acidente incumbe à entidade responsável pela reparação [à entidade empregadora ou à seguradora, esta não por ter assumido a responsabilidade com acidentes do próprio sinistrado mas por ter a responsabilidade da entidade empregadora do sinistrado transferida para si] como facto impeditivo do direito à reparação – art.º 342º, nº 2 do Código Civil.
Decorre daqui que, caso não sejam demonstrados factos que concretizem suficientemente os pressupostos da descaracterização do acidente, estaremos perante acidente de trabalho indemnizável[27].
Vejamos então, se verifica a situação da al. a) do nº 1 do art.º 14º da LAT, acima transcrita, ou seja, pergunta-se se ato do sinistrado já referenciado importa violação, sem causa justificativa, das condições de segurança estabelecidas pelo empregador ou previstas na lei, e se o acidente resultou do mesmo.
Nos termos do nº 2 do art.º 14º da LAT, considera-se existir causa justificativa da violação das condições de segurança se o acidente de trabalho resultar de incumprimento de norma legal ou estabelecida pelo empregador da qual o trabalhador, face ao seu grau de instrução ou de acesso à informação, dificilmente teria conhecimento ou, tendo-o, lhe fosse manifestamente difícil entendê-la.
Como está explicado no acórdão desta Secção Social do TRP de 14/07/2021[28], citando doutrina e jurisprudência, não é pacífico, verificando-se a situação de o trabalhador conhecer as condições de segurança vigentes na empresa ou estabelecidas na lei e as violar conscientemente, sofrendo por força disso acidente de trabalho, não é pacífico, repete-se, que seja de exigir a verificação de negligência grosseira ou se basta que essa violação careça de causa justificativa[29].
De todo o modo, em ambas as posições, o que acompanhamos, se entende que não será toda e qualquer violação de norma ou regra de segurança que imporá a “descaracterização” do acidente de trabalho, ou seja, mesmo que não se exija que se verifique negligência grosseira não será toda e qualquer atuação menos cuidada do trabalhador que conduz à descaracterização.
Para que a situação se enquadre na referida alínea a), e não haja lugar a reparação no caso de o acidente resultar de ato ou omissão da vítima impõe-se que, cumulativamente[30], as condições de segurança (que podem ser estabelecidas apenas pelo empregador) sejam violadas voluntariamente[31] e sem causa justificativa.
Assim, não sendo, como se disse, toda e qualquer violação de norma ou regra de segurança que imporá a “descaracterização” do acidente de trabalho, podemos dizer como no acórdão do STJ de 13/10/2021[32], que não basta a mera violação das regras de segurança para que o acidente seja descaraterizado, sendo necessário que essa infração ocorra por culpa grave do trabalhador (não relevando os casos de culpas leves, desde a inadvertência, à imperícia, à distração ou ao esquecimento) e que este tenha consciência da violação[33].
Importa ter presente que o art.º 17º, nº 1, al. c) da Lei nº 102/2009, de 10 de Setembro (regime jurídico da promoção da segurança e saúde no trabalho) impõe como obrigação ao trabalhador cumprir procedimentos de trabalho estabelecidos e utilizar máquinas de acordo de acordo com instruções estabelecida2s pelo empregador.
Por outro lado, a Portaria nº 53/71, de 03 de fevereiro (aprova o regulamento geral de segurança e higiene do trabalho nos estabelecimentos industriais) estabelece a proibição de efetuar operações de limpeza, lubrificação e outras com órgãos ou elementos de máquina em movimento, a menos que tal seja imposto por particulares exigências técnicas, caso em que devem ser utilizados (art.º 46º).
No caso sub judice apenas se apurou que a Empregadora proporcionou formação adequada ao desempenho das tarefas (ponto 25 dos factos provados) – que não se traduz na formação adequada no domínio da segurança e saúde no trabalho (art.º 20º, nº 1, da Lei nº 102/2009) –, não se apurando sequer o que estava o sinistrado a fazer no local onde sofreu o acidente (debaixo da máquina de corte de painéis), ou seja, mais do que não se saber se foi transmitida ao sinistrado esta proibição de efetuar operações com órgãos ou elementos de máquinas em movimento, nem sequer se sabe o que se encontrava o sinistrado a fazer ao certo no local (a realizar tarefa hétero determinada ou a realizar tarefa por sua iniciativa, neste caso quiçá como “trabalhador zeloso”?).
Ora, para se enquadrar a situação na referida alínea a) do nº 1 do art.º 14º da LAT, impunha-se que estivesse demonstrado (pela Empregadora) que o sinistrado se afastou do cumprimento das referidas regras por iniciativa própria, ou seja, era necessário que se pudesse dizer que o sinistrado voluntariamente se afastou do procedimento de se aproximar da máquina em segurança, e foi para lá das linhas amarelas marcadas no pavimento sem estar a máquina imobilizada (independentemente daquilo que em concreto estivesse a fazer), ou, dito de outra forma, teria que estar demonstrado que o sinistrado estava consciente de que se estava a expor ao perigo de poder ser esmagado, podendo e devendo atuar de acordo com as condições de segurança aplicáveis.
A situação pode comparar-se à tratada no acórdão do STJ de 10/02/2021[34], que alterou o decidido nas instâncias inferiores e considerou haver lugar a reparação pelas consequências do acidente, concluindo não existem … factos suficientes para se poder concluir que o acidente de trabalho em causa resultou dum comportamento temerário do sinistrado ou de um comportamento absolutamente indesculpável por ser gravemente violador das regras de segurança impostas pelo trabalho que estava a realizar; como a prova desses factos pertencia à Ré, não podemos descaracterizar o acidente dos autos, estas as ideias mestras (constantes do sumário):
I. O acidente ocorrido no local e tempo de trabalho produzindo lesões corporais no sinistrado que lhe causaram a morte, configura um acidente de trabalho.
II. A descaracterização do acidente com o fundamento previsto na segunda parte da alínea a) do nº 1 do artigo 14º, da LAT, segundo a qual, se o acidente provier de ato ou omissão da vítima, se ela tiver violado, sem causa justificativa, as condições de segurança estabelecidas pela entidade empregadora, não dá direito a reparação, porque se entende que foi a vítima, o trabalhador, que deu causa ao acidente, nomeadamente quando viola as condições de segurança – suas conhecidas e/ou estabelecidas pela sua empregadora.
III. Resultou provado que o sinistrado entrou no electrofiltro e foi colhido pelo sem-fim em funcionamento, sofrendo, em consequência disso, lesões traumáticas que lhe determinaram a morte. No entanto, nada se provou sobre a causa, a razão ou motivo que, no contexto dos factos, pudesse ter determinado ou justificado a conduta do sinistrado de entrar no electrofiltro e ser colhido pelo sem-fim em funcionamento.
IV. Sabe-se, contudo, que o sinistrado, por força das suas funções, conhecia muito bem os perigos que corria, pelo que era fundamental saber-se as causas do seu comportamento, cujo conhecimento resultaria do apuramento dos factos que envolveram toda a conduta do sinistrado, ou seja, todas as condições e causas que determinaram o acidente, o que não sucedeu.
V. Incumbia à Ré, entidade responsável pela reparação do acidente, o ónus da prova dos factos descaracterizadores do acidente, tendo em conta que estes constituem factos impeditivos do direito invocado pelo sinistrado e seus beneficiários. Como a prova desses factos, que não foi produzida, pertencia à Ré, não é possível descaracterizar o acidente dos autos, pelo que o trabalhador e os seus familiares têm direito à reparação dos danos emergentes de acidente de trabalho em causa.
Em suma, não está provado circunstancialismo que nos leve a dizer que o acidente decorreu de violação pelo sinistrado, sem causa justificativa, das condições de segurança estabelecidas.

Importa agora passar à previsão da al. b) do nº 1 do art.º 14º da LAT, ou seja, passar a aferir se existe descaracterização do acidente por ter resultado o mesmo de negligência grosseira do sinistrado.
O nº 3 do art.º 14º da LAT, esclarece que se entende por negligência grosseira o comportamento temerário em alto e relevante grau, que não se consubstancie em ato ou omissão resultante da habitualidade ao perigo do trabalho executado, da confiança na experiência profissional ou dos usos da profissão.
Não tem havido divergência, quer a nível da doutrina quer a nível da jurisprudência, sobre quais as situações que em termos abstratos configuram uma situação de negligência grosseira, tudo passando por saber se a situação em concreto em análise nestes autos aí se enquadra.
Mas primeiro explicitemos um pouco melhor, apelando à jurisprudência (alguma da que abunda abordando a questão), quando estamos perante situações de negligência grosseira.
Num comportamento negligente temos os seguintes elementos objetivos: (i) um dever objetivo de cuidado; (ii) que é violado por uma ação do sinistrado; (iii) de que advém o resultado (iv) que é imputado a essa violação.
Já para estarmos perante a descaracterização do acidente de trabalho, com base na negligência grosseira, ter-se-á que se se verificar, cumulativamente, um comportamento temerário de elevado grau e que esse comportamento seja causa adequada e exclusiva do sinistro[35], mas esse comportamento não pode consubstanciar um ato ou omissão resultante da habitualidade ao perigo do trabalho executado, da confiança na experiência profissional ou dos usos da profissão.
Como se escreveu no aresto do STJ de 19/10/2005[36], a figura da negligência grosseira … corresponde a uma negligência particularmente grave, qualificada, atento, designadamente, o elevado grau de inobservância do dever objetivo de cuidado e de previsibilidade da verificação do dano ou do perigo. / Trata-se de uma negligência temerária, configurando uma omissão fortemente indesculpável das precauções ou cautelas mais elementares. / Essa negligência grosseira, …, deve ser apreciada em concreto, em face das condições da própria vítima e não em função de um padrão geral, abstrato, de conduta. / Assim, para que se verifique a apontada exclusão da responsabilidade emergente de acidente de trabalho é necessária a prova de que ocorreu um ato ou omissão temerários em alto e relevante grau por parte do sinistrado, injustificados pela habitualidade ao perigo do trabalho executado, pela confiança na experiência profissional ou pelos usos e costumes da profissão, e, além disso, que o acidente tenha resultado exclusivamente desse comportamento[37].
Assim, na aferição da medida do dever de cuidado exigido há que fazer apelo a um juízo ex ante, tendo em conta o exigível ao homem medianamente diligente do tipo social do sinistrado, mas colocado no seu circunstancialismo concreto e com os conhecimentos particulares do mesmo, de modo a apurar se a produção do evento era previsível, e só a omissão desse dever impediu a sua previsão ou a sua justa previsão[38].
Quando se possa dizer que o agente atuou como teria atuado esse homem medianamente conhecedor e diligente naquele circunstancialismo não há violação do dever objetivo de cuidado.
Feitas estas considerações, vejamos o caso sub judice.
Dos factos provados (designadamente pontos 9, 20 e 26 a 37 dos factos provados) retiramos que o sinistrado – independentemente daquilo que em concreto estivesse a fazer, o que não se sabe – se encontrava num local onde não devia estar com a máquina em funcionamento, como a mesma estava, pois existiam linhas amarelas marcadas no pavimento que não deviam ser transpostas, e respeitando essas linhas o acesso à máquina era apenas feito por uma de duas portas existentes no gradeamento que protege aquela secção da máquina (está em causa uma linha produtiva), portas essas que o sinistrado não utilizou pois se alguma tivesse sido aberta a máquina teria parado (a não ser que o sistema de paragem estivesse avariado, mas nada resulta nesse sentido).
E podemos dizer que foi por ter acedido àquele local que o acidente ocorreu pois terá havido embate de parte móvel da máquina em funcionamento com o sinistrado [embora não esteja apurado em concreto como o acidente ocorreu, não é de dizer, em face das conclusões do Relatório de Autópsia (cfr. ponto 11 dos factos provados), ter havido contacto com a lâmina de corte, mas havendo “esmagamento” terá havido embate violento, à partida de parte móvel da máquina em funcionamento com o sinistrado].
Perante isto, e tendo presente que o sinistrado estava numa zona onde não se acedia de forma que se possa dizer fácil (o que se extrai da conjugação, designadamente, dos pontos 6 e 35 a 37[39]), dir-se-ia, tendo em conta o exigível ao homem medianamente diligente do tipo social do sinistrado, colocado no seu circunstancialismo concreto e com os conhecimentos particulares do mesmo (ainda que não fosse o seu posto de trabalho – ponto 38 – ele tinha que conhecer que a marcação de linhas amarelas no solo implicava a sua não transposição, porque tal é utilizado em geral), dir-se-ia, repete-se, estarmos perante conduta que só uma pessoa excecionalmente descuidada e incauta leva a cabo, ou seja, perante negligência grave.
Todavia, para se poder falar em negligência grosseira do sinistrado impunha-se que estivesse demonstrado, mais propriamente que a Empregadora tivesse demonstrado, que o sinistrado, conhecedor dos perigos do lugar onde ocorreu o acidente, encontrava-se lá por iniciativa própria, pois só então poderíamos excluir ter sido determinada a sua deslocação àquele lugar, e diríamos que o sinistrado tinha tomado uma decisão (de se deslocar àquele local[40]) repudiada por qualquer pessoa minimamente prudente e avisada, constituindo uma temeridade intolerável.
Em suma, não está provado circunstancialismo que nos leve a dizer que o acidente decorreu exclusivamente de negligência grosseira do sinistrado.

Aqui chegados, concluindo, como concluímos, que não é de descaraterizar o acidente de trabalho por aplicação do art.º 14º do LAT, impõe-se ver se houve atuação culposa da Empregadora conforme art.º 18º, nº 1 da LAT.
Está em causa a 2ª parte do nº 1 do art.º 18º da LAT, que prevê que no caso de o acidente resultar da falta de observação, pelo empregador, das regras sobre segurança e saúde no trabalho, a responsabilidade é agravada (a responsabilidade … pela indemnização abrange a totalidade dos prejuízos, patrimoniais e não patrimoniais, sofridos…).
É que, o trabalhador tem direito a prestar trabalho em condições de higiene, segurança e saúde (cfr. art.º 59º, nº 1, al. c) da CRP, e art.º 127º, nº 1, al. g) do Código do Trabalho).
Está estabilizado na jurisprudência o entendimento de que o ónus da prova relativamente aos factos conducentes à conclusão de que houve quebra das regras de segurança caberá ao Autor (sinistrado) se peticionar reparação agravada nos termos do art.º 18º da LAT – como facto constitutivo do seu direito – ou à seguradora – aqui, como facto modificativo do direito (cfr. art.º 342º, nº 2 do Código Civil).
Esta reparação agravada tem lugar desde que o acidente resulte da falta de observação das regras sobre segurança, higiene e saúde no trabalho, ou seja, além da inobservância por parte da entidade empregadora de regras sobre segurança no trabalho, impõe-se que se conclua pela existência de nexo de causalidade entre essa inobservância e o acidente, nexo de causalidade esse (ou os factos que permitem afirmar o mesmo) abrangido pela regra de repartição de ónus da prova referido.
Ou seja, da falta de observância das regras sobre segurança e saúde no trabalho não resulta automaticamente a responsabilidade agravada, impondo-se que esteja em causa uma inobservância de regras tais e/ou de tal modo que determinam que ocorra o acidente.
Refere Maria José Costa Pinto[41], ilustrando-o citando arestos, que a jurisprudência do STJ denota que a afirmação do nexo de causalidade entre a violação de regras de segurança por parte do empregador e o acidente tem que ter um forte alicerce nos concretos factos apurados, deles resultando com evidência.
Vamos, então, aferir se no caso em apreço está provado que houve falta de observação pela Empregadora das regras sobre segurança e saúde no trabalho, e se essa falta foi causa adequada do acidente, ainda que na formulação negativa da teoria da causalidade (cfr. art.º 563º do Código Civil).
Segundo a formulação negativa (mais ampla) da teoria da causalidade adequada, o facto que atuou como condição do dano só não deverá ser considerado causa adequada do mesmo se, dada a sua natureza geral e em face das regras da experiência comum, se se mostrar indiferente para a verificação do efeito. Se numa formulação positiva se procura saber se é normal e adequado (provável) que aquele tipo de comportamento gere aquele tipo de dano, numa formulação negativa procura-se saber se é de todo indiferente para a produção de um dano daquele tipo um comportamento como o do lesante.
Não oferece dúvidas a aplicação do DL nº 50/2005, de 28 de fevereiro, o qual dita as prescrições mínimas de segurança e de saúde para a utilização pelos trabalhadores de equipamentos de trabalho, enunciando um conjunto de regras gerais dirigidas ao empregador, visando assegurar a segurança e a saúde dos trabalhadores na utilização daqueles, destacando-se que no art.º 16º dispõe, quanto aos “riscos de contacto mecânico”, que os elementos móveis de um equipamento de trabalho que possam causar acidentes por contacto mecânico devem dispor de protetores que impeçam o acesso às zonas perigosas ou de dispositivos que interrompam o movimento dos elementos móveis antes do acesso a essas zonas.
Decorre daqui que a abertura referida o ponto 35 dos factos provados não devia estar sem proteção de rede, não sendo o facto de a aproximação à máquina por essa abertura não se fazer de pé (cfr. ponto 37 dos factos provados) que justifica não existir rede/gradeamento[42] como existe a proteger a estrutura onde funciona a rede de corte (cfr. pontos 29 e 30 dos factos provados).
Note-se que, não tendo o sinistrado utilizado qualquer das portas referidas no ponto 30 dos facos provados, pois se assim fosse a máquina teria parado (ponto 31 dos factos provados), o sinistrado teve que passar por essa abertura referida no ponto 35 dos factos provados.
De resto, tendo ocorrido esmagamento, só se pode concluir, como já se disse, existirem componentes da máquina em movimento no local onde o sinistrado se encontrava (está provado que a máquina estava em funcionamento, recorde-se), o que quer dizer que a referida abertura dava acesso a um risco específico, pelo que, embora não fosse aquele o posto de trabalho do sinistrado [o mesmo era operador de máquinas de embalar, e estava debaixo da máquina de corte de painéis, sendo o embalamento/empacotamento do produto o passo seguinte da linha de produção – cfr. pontos 2, 6 e 28 dos factos provados], o certo é que circulava próximo dela (tanto assim é que o acidente aconteceu), pelo que se impunha, em face do dever previsto no art.º 8º do DL nº 50/2005, informar o trabalhador sobre esses riscos.
Note-se que, existindo gradeamento apenas em parte da máquina, poderia inculcar a quem não recebeu informação específica, que estava protegido o perigo e o acesso pela abertura já não comportaria perigo, não comportaria um risco tão específico como o esmagamento.
Sendo assim, porque a omissão dessa proteção não foi claramente indiferente para o resultado, está demonstrado o nexo de causalidade entre essa falta e a ocorrência do acidente de trabalho, de modo que, aderindo ao exposto na sentença recorrida para fundamentar idêntica conclusão, concluímos que a situação dos autos se enquadra na previsão do art.º 18º, nº 1 da LAT, improcedendo o recurso.

Da responsabilidade da Seguradora (2ª Ré):
A sentença recorrida, condenando a Empregadora com o agravamento de responsabilidade previsto no art.º 18º, nº 1 da LAT, condenou a Seguradora solidariamente.
A reparação dos danos emergentes do acidente de trabalho impende sobre as pessoas singulares ou coletivas de direito privado e de direito público não abrangidas por legislação especial, relativamente aos trabalhadores ao seu serviço (art.º 7º da LAT), e, existindo contrato de seguro, à partida é a seguradora a responsável (art.º 79º da LAT).
A Recorrente/2ª Ré sustenta caber a responsabilidade na reparação do acidente dos autos (em primeira linha) à Empregadora, respondendo ela solidariamente mas apenas nas “prestações normais”, porquanto o acidente ocorreu por falta de condições de segurança.
Na verdade, nos termos do disposto no nº 3 do art.º 79º da LAT a responsabilidade pela reparação que cabe à Seguradora é pelas prestações devidas em caso de atuação não culposa, como não podia deixar de ser, diga-se, pois é sobre elas que tem direito de regresso.
Na sentença recorrida no dispositivo ficou a condenação da Seguradora “nas mesmas quantias, sem prejuízo do direito de regresso”, mas aparentemente tratou-se de lapso, pois imediatamente antes, no enquadramento jurídico, foi dito que nos termos do disposto no art.º 79º, nº 3 da LAT, verificando-se alguma das situações referidas no artigo 18º, a seguradora do responsável satisfaz o pagamento das prestações que seriam devidas caso não houvesse atuação culposa, sem prejuízo do direito de regresso (sublinhou-se).
Impõe-se, então, ver qual o valor da pensão cuja responsabilidade cabe à seguradora.
Por via do disposto nos art.ºs 56º, 57º, nº 1, al. a) e 59º, nº 1, al. a) da LAT, a Seguradora é responsável por pensão anual, desde o dia seguinte ao falecimento (.../.../2018), no valor de € 3.766,10 (€ 12.553,66 x 30%) até perfazer a idade de reforma por velhice, e de € 5.021,46 (€ 12.553,66 x 40%) a partir dessa idade ou a partir do momento em que ficar afetada por doença física ou mental que afete sensivelmente a sua capacidade para o trabalho, se tal acontecer.
De referir que a pensão não é obrigatoriamente remível, apesar do valor (art.º 75º, nº 1 da LAT), porque para o aferir há que atender ao valor da pensão fixada a cargo da Empregadora.
Impõe-se, pois, alterar o decidido, nestes termos, procedendo o recurso da 2ª Ré.
*
Quanto a custas, no caso do recurso da 1ª Ré, embora procedendo em parte a impugnação da decisão sobre matéria de facto a decisão de direito mantém-se, pelo que as custas do mesmo ficam a cargo da Recorrente (art.º 527º do Código de Processo Civil); quanto ao recurso da 2ª Ré procede, mas transparecendo ter havido lapso, não se pode falar em decaimento das Recorridas, donde não haver lugar a custas.
***
DECISÃO
Pelo exposto, acordam os juízes desembargadores da Secção Social do Tribunal da Relação do Porto em conceder parcial provimento ao recurso apresentado pela 1ª Ré (Empregadora) e, em consequência, decide-se:
A) Eliminar o ponto 3 dos factos não provados, e é aditar um ponto aos factos provados, intercalando entre os pontos 33 e 34 dos factos provados um ponto 33-a) com a seguinte redação:
33-a) As delimitações das linhas amarelas referidas em 32 e 33 dos factos provados visam impedir qualquer pessoa, trabalhador ou não, de se deslocar e intrometer na abertura referida em 35 dos factos provados.
B) Manter no mais o decidido em 1ª instância.
Mais se decide conceder provimento ao recurso apresentado pela 2ª Ré (Seguradora) e, em consequência, decide-se revogar parcialmente o ponto II) do dispositivo da sentença, que se substitui pelo seguinte:
II) Condeno a 2ª Ré “X..., S.A. a pagar, solidariamente, as mesmas quantias que a Ré “T..., S.A.”, exceto quanto à pensão que é responsável pelos seguintes valores:
a) pensão anual no montante de € 3.766,10, desde .../.../2018 até a Autora atingir a idade da reforma por velhice;
b) pensão anual no montante de € 5.021,46, a partir da data em que a Autora atingir a idade da reforma por velhice; ou a partir do momento em que ficar afetada por doença física ou mental que afete sensivelmente a sua capacidade para o trabalho, se tal acontecer.
tudo sem prejuízo do direito de regresso sobre a 1ª Ré nos termos do nº 3 do art.º 79º da LAT.
Custas do recurso apresentado pela 1ª Ré a cargo da Recorrente (art.º 527º do Código de Processo Civil), com taxa de justiça conforme tabela I-B anexa ao RCP (cfr. art.º 7º, nº 2 do RCP); sem custas o recurso apresentado pela 2ª Ré.
Valor dos recursos: o da ação (art.º 12º, nº 2 do RCP).
Notifique e registe.
(texto processado e revisto pelo relator, assinado eletronicamente)

Porto, 03 de outubro de 2022
António Luís Carvalhão
Paula Leal de Carvalho
Rui Manuel Barata Penha
_______________
[1] É esta a designação atual (como explicado no início da contestação da 2ª Ré).
[2] Assim é designado neste acórdão regime aprovado pela Lei nº 98/2009, de 04 de setembro, porque conhecido por “Lei dos Acidentes de Trabalho”.
[3] As transcrições efetuadas respeitam o respetivo original, salvo correção de gralhas evidentes e realces/sublinhados que no geral não se mantêm (porque interessa o texto em si), consignando-se que quanto à ortografia utilizada se adota o Novo Acordo Ortográfico.
[4] Vd. António Santos Abrantes Geraldes, “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina, 5ª edição, pág. 156 e págs. 545/546 (estas no apêndice I: “recursos no processo do trabalho”).
[5] Seguindo a ordem da precedência lógica, sendo que a solução de alguma pode prejudicar o conhecimento de outra(s) – art.ºs 608º e 663º, nº 2 do Código de Processo Civil (cfr. art.º 87º, nº 1 do Código de Processo do Trabalho).
[6] Aplicável por via do disposto nos art.ºs 1º, nº 2, al. a) e 77º, ambos do Código de Processo do Trabalho.
[7] O qual dispõe o seguinte: O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras; não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.
[8] Consultável em www.dgsi.pt, processo nº 1204/12.9TVLSB.L1.S1.
[9] Vd. igualmente o acórdão desta Secção Social do TRP de 18/05/2020, consultável em www.dgsi.pt, processo nº 851/18.0T8GDM.P1.
[10] Vd. a propósito António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, “Código de Processo Civil Anotado”, vol. I (Parte Geral e Processo de Declaração), 3ª edição, Almedina, pág. 771 (anotação 8 ao art.º 607º).
[11] A autoridade de caso julgado importa a aceitação de uma decisão proferida em ação anterior, que se insere, quanto ao seu objeto, no objeto da segunda, visando obstar a que a relação ou situação jurídica material definida por uma sentença possa ser validamente definida de modo diverso por outra sentença – sobre o efeito positivo do caso julgado vd. João de Castro Mendes e Miguel Teixeira de Sousa, “Manual de Processo Civil”, vol. I, AAFDL Editora, 2022, págs. 641/642.
[12] Há que referir que das partes neste processo apenas a Empregadora terá tido intervenção naquele processo.
[13] In Manual de Processo Civil, 2ª edição revista e atualizada, Coimbra Editora, 1985, págs. 714 e 716.
[14] No mesmo sentido, vd. o acórdão do STJ de 03/11/2009 e o acórdão deste TRP (Secção Cível – 1ª) de 19/10/2010, ambos consultáveis em www.dgsi.pt, processos nº 3931/03.2TVPRT.S1 e nº 154/03.4TBVLC-C.P1 respetivamente; e também os acórdãos do STJ de 05/05/2005 e 20/11/2019, citados pela Recorrida/Autora, consultáveis em www.dgsi.pt, processos nº 05B691 e nº 62/07.0T8CSC.L3.S1 respetivamente.
[15] Consultável em www.dgsi.pt, processo nº 23201/17.8T8PRT.P1.
[16] Consultável em www.dgsi.pt, processo nº 3210/07.6TCLRS.L1.S1.
[17] Consultável em www.dgsi.pt, processo nº 392/09.6TBCVL.C1.
[18] Vd. a propósito do “processo tutelar educativo” ou “processo tutelar crime”, considerando não poder haver aplicação analógica por ser a norma que estabelece presunção legal de natureza excecional, o acórdão do TRL (Secção Cível – 2ª) de 21/05/2020, consultável em www.dgsi.pt, processo nº 3015/15.0T8SNT.L1-2.
[19] O que não se confunde com o entendimento, que vêm os tribunais superiores seguindo, de que, à luz do disposto no art.º 662º do Código de Processo Civil, o Tribunal da Relação na apreciação da impugnação da decisão sobre matéria de facto usa do princípio da livre apreciação da prova com a mesma amplitude de poderes que tem a 1ª instância (art.º 607º, nº 5, do Código de Processo Civil), em ordem ao controlo efetivo da decisão recorrida, devendo sindicar a formação da convicção do juiz, ou seja, o processo lógico da decisão, recorrendo com a mesma amplitude de poderes às regras de experiência e da lógica jurídica na análise das provas, como garantia efetiva de um segundo grau de jurisdição em matéria de facto; porém, sem prejuízo do reconhecimento da vantagem em que se encontra o julgador na 1ª instância em razão da imediação da prova e da observação de sinais diversos e comportamentos que só a imagem fornece [vd. António Santos Abrantes Geraldes, “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina, 5ª edição, pág. 286].
[20] De outra forma ocorreria uma inversão da posição das personagens do processo, mediante a substituição da convicção de quem tem de julgar pela convicção de quem espera a decisão (o recorrente).
[21] Daí referir o nº 1 do art.º 662º do Código de Processo Civil que “a Relação deve alterar a decisão proferida sobre matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa” (sublinhou-se).
[22] Vd. António Santos Abrantes Geraldes, “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina, 5ª edição, págs. 292/293.
[23] Consultável em www.dgsi.pt, processo nº 3789/15.9T8VFR.P1.
Vd. também o acórdão desta Secção Social do TRP de 19.04.2021, consultável igualmente em www.dgsi.pt, processo nº 2907/16.4T8AGD-A.P1.
[24] Vd. Miguel Teixeira de Sousa, “Estudos Sobre o Novo Processo Civil”, Lex, 2ª edição (Lisboa 1997), pág. 347.
[25] Sobre as “regras para a formulação de questões”, vd. Francisco da Costa Oliveira, “O Interrogatório de Testemunhas – sua prática na advocacia”, Almedina, 2ª edição, págs. 41 a 52.
[26] Sobre a questão, vd. Luís Filipe Pires de Sousa, “Prova por Presunção no Direito Civil”, Almedina, 3ª edição (2017), págs. 31 a 71.
[27] Vd. Luís Manuel Teles de Menezes Leitão, “A Reparação de Danos Emergentes de Acidentes de Trabalho”, in “Estudos do Instituto de Direito do Trabalho”, vol. 1, Almedina, pág. 559, em nota.
Vd. também, entre muitos outros, o acórdão desta Secção Social do TRP de 05/02/2018, consultável em www.dgsi.pt, processo nº 52/14.6TTOAZ.P1, e o acórdão do STJ de 13/07/2004, consultável em www.dgsi.pt, processo nº 04S1511, no qual se escreveu [é] à entidade patronal (e/ou à seguradora) que compete provar os factos demonstrativos da descaracterização do acidente de trabalho (…) / Perante um non liquet probatório, quanto a essa matéria, haverá que desfazer a dúvida em desfavor da parte a quem a sua invocação aproveitava, tendo-se como inexistente o facto impeditivo, com a consequência de não poder ser aplicada a norma cuja hipótese constituía pressuposto de aplicação.
[28] Consultável em www.dgsi.pt, processo nº 507/16.8T8VLG.P1.
[29] Sobre a questão pode ver-se também, Pedro Romano Martinez, “Direito do Trabalho”, 2ª ed., IDT – Almedina, pág. 833 e acórdão do TRG de 21/01/2021, consultável em www.dgsi.pt, processo nº 1081/17.3T8VRL.G1.
[30] Vd. Carlos Alegre, “Regime Jurídico dos Acidentes de Trabalho e das Doenças Profissionais” – Regime Jurídico Anotado, 2ª ed., Almedina, pág. 61.
[31] Vd. o acórdão do TRC de 17/05/2007, www.dgsi.pt, processo 105/04.9TTAVR.C1, onde se escreveu: «Não resultando a demonstração de que o sinistrado tenha, de forma intencional e dolosa, infringido quaisquer normas de segurança, afastada fica a possibilidade de descaracterização do acidente».
[32] Consultável em www.dgsi.pt, processo nº 3574/17.3T8LRA.C1.S1.
[33] Vd. também os acórdãos desta Secção Social do TRP de 23/11.2020 e de 22/02/2021, consultáveis em www.dgsi.pt, processos nº 1425/18.0T8MTS.P1 e 2577/18.5T8OAZ.P1 respetivamente.
[34] Consultável em www.dgsi.pt, processo nº 2267/18.9T8LRA.C1.S1.
[35] Se houver concurso de culpas – com o empregador ou colegas de trabalho – já não é afastada a responsabilidade/reparação (vd. Pedro Romano Martinez, “Direito do Trabalho”, 2ª edição, IDT – Almedina, pág. 834, e acórdão do TRC de 03/07/2003, in CJ, Ano XXVIII, tomo 4, pág. 52).
[36] Consultável em www.dgsi.pt, processo nº 05S1918, o qual embora reportado ao regime constante da Lei nº 100/97, de 13 de setembro, e do DL nº 143/99, de 30 de abril, mantém atualidade dada a similitude de regimes.
[37] Vd. também o acórdão desta Secção Social do TRP de 12/03/2007, publicado em “Acidentes de Trabalho – Jurisprudência 2000-2007”; Coletânea de Jurisprudência Edições, págs. 146-148, e, por mais recente, o acórdão do TRC de 18/12/2020, consultável em www.dgsi.pt, processo nº 1059/13.6TTCBR.C1.
[38] Vd. o acórdão do. STJ de 17/05/2007, publicado na Coletânea de Jurisprudência – Acórdãos do STJ (ASSCJ), Ano XV, tomo 2, págs. 270-273.
[39] E melhor se percebe vendo as fotografias da máquina que se encontram no processo.
[40] Certamente para fazer algo necessário para o funcionamento da máquina, pois não é de crer que fosse ali só porque se lembrou de ir, e então, caso ficasse demonstrado que tomou essa decisão, haveria que fazer-se, como refere no acórdão do TRC de 18/01/2007 [consultável em www.dgsi.pt, processo nº 664/04.6TTVFR.C1] a análise e avaliação do caso concreto e das suas reais circunstâncias, não deixando todavia de sobrar para o intérprete uma margem de intangível subjetividade no que concerne à ponderação-limite do que seja, em cada caso, a fronteira entre o espírito de bem cumprir, com eficácia e competência, abnegação ou heroísmo, e os excessos imponderados, de clara temeridade, por inexistência ou deficiente cálculo do risco, medianamente reconhecido, em abstrato, como desaconselhado à luz dos mais elementares princípios de prudência e devida previsibilidade.
[41] In “Violação de Regras de Segurança, Higiene e Saúde no Trabalho: Perspetiva Jurisprudencial”, Prontuário de Direito do Trabalho, Centro de Estudos Judiciários / Coimbra Editora, números 74/75 (maio.agosto / setembro.dezembro de 2006), pág. 205 (no ponto 3 – a verificação do nexo de causalidade entre a violação das regras de segurança, higiene e saúde no trabalho e o acidente).
[42] Embora não conste dos factos provados, no Relatório de Averiguação Final de Acidente de Trabalho elaborado pela empresa “P..., Lda.” junto ao processo, das fotografias da máquina nº 4 e nº 5, e seus comentários, retira-se ter entretanto sido colocada essa rede.