Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP00042498 | ||
Relator: | FERREIRA DA COSTA | ||
Descritores: | CONTRATO DE TRABALHO DESPEDIMENTO INDEMNIZAÇÃO MORTE | ||
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Nº do Documento: | RP200904271749/07.2TTPRT.P1 | ||
Data do Acordão: | 04/27/2009 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO. | ||
Decisão: | PROVIDO. | ||
Indicações Eventuais: | 4ª SECÇÃO - LIVRO 76 - FLS 243. | ||
Área Temática: | . | ||
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Sumário: | I - O direito à indemnização pelo despedimento ilícito não tem autonomia face ao direito à reintegração, sendo seu mero sucedâneo, pelo que pressupõe sempre a existência de um contrato de trabalho vigente, em execução ou em vias de o ser, pela eventual reintegração do trabalhador. II - Assim, tendo o filho e único herdeiro de uma trabalhadora falecida optado pela indemnização de antiguidade e proposto a acção num momento em que a reintegração já não era possível, dado que o contrato de trabalho já havia caducado, pelo decesso da trabalhadora, não tem o mesmo direito a qualquer indemnização, pois optou pelo direito sucedâneo quando o direito principal (a reintegração) já se tinha extinguido. | ||
Reclamações: | |||
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Decisão Texto Integral: | Reg. N.º 583 Proc. N.º 1749/07.2TTPRT.P1 Acordam no Tribunal da Relação do Porto: B………, representado pelo seu pai, C………. e patrocinado pelo Ministério Público, deduziu contra D………., S.A. a presente acção declarativa, emergente de contrato individual de trabalho, com processo comum, pedindo que se declare ilícito o despedimento de que sua mãe, entretanto falecida, foi vítima e que se condene a R. a pagar ao A. a indemnização correspondente, no montante de € 2.170,80 e os vencimentos devidos desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da sentença. Alega o A., para tanto e em síntese, que tendo sua mãe, E………., falecido em 2007-04-25, no estado de solteira, deixou como único e universal herdeiro, seu filho, ora A., o qual deverá ser habilitado como seu sucessor, para com ele prosseguir a presente acção. Mais alega que tendo sua mãe sido admitida ao serviço da R. em 2004-12-26 para desempenhar a actividade correspondente à categoria de “empregada de distribuição personalizada”, mediante a retribuição que alega, em 2006-11-30 a demandada fez cessar o contrato de trabalho mediante carta que lhe remeteu. Tal actividade foi prestada mediante contrato de trabalho a termo, pelo período de 11 meses e 5 dias, dele constando, da sua cl.ª 3.ª, que o prazo referido “… justifica-se dada a implementação do sistema de auto-controlo no Hospital ………., sistema este que implica pela sua especialidade, um aumento de procedimentos, resultando o mesmo nesta admissão, que previsivelmente termina com o término deste contrato.”. Porém, não sendo indicado qualquer motivo concreto para tal tipo de contrato, a comunicação da respectiva cessação equivale a um despedimento ilícito, pelo que pede uma indemnização de antiguidade e as retribuições vencidas e vincendas. Contestou a R., alegando que os pedidos não podem ter procedência, não só por o contrato a termo estar devidamente justificado, mas também em virtude de os direitos terem entretanto caducado, tanto pelo falecimento da mãe do A., como pela circunstância de a mesma se encontrar ilegalmente no País. O A. respondeu à contestação, por impugnação. Proferido despacho saneador, o Tribunal a quo julgou não verificada a excepção de caducidade e demais factos impeditivos do direito do A. Proferida sentença, foi a acção julgada procedente e a R. condenada a pagar ao A. “a quantia global de € 8.443,17, sendo € 2.170,80 a título de indemnização por despedimento e a restante relativa a “…créditos salariais, acrescida das retribuições devidas desde a data da sentença e até ao trânsito em julgado da mesma.” – sic. Inconformada com o assim decidido, veio a R. interpôr recurso de apelação, invocando a nulidade da sentença no respectivo requerimento de interposição e pedindo a revogação da decisão, tendo formulado a final as seguintes conclusões: 1. É nula a sentença proferida nos autos, nos termos da 1.ª parte da alínea d) do n.° 1 do art.º 668.° do C.P.C.[1], por não se ter previamente pronunciado sobre a requerida habilitação do autor, único e universal herdeiro da falecida trabalhadora da apelante; 2. É ainda nula a sentença por violação do art.º 74.° do C.P.T.[2] (os créditos salariais não são direitos indisponíveis, após a cessação do contrato de trabalho), porquanto, tendo sido pedido apenas como indemnização pelo despedimento a quantia de € 2.170,80, correspondente aos vencimentos devidos entre a data do despedimento e a data da morte da falecida trabalhadora da apelante (a conta feita na p.i. não deixa quaisquer dúvidas quanto a isso); condenou-se a apelante a pagar a indemnização de três meses de vencimento, nos termos do art.º 439.°, n.° 3, do C.T.[3], bem como os vencimentos devidos desde os 30 dias anteriores à data da propositura da presente acção até à data do trânsito em julgado da sentença, num total de € 8.443,17; 3. A sentença da 1.ª instância é também nula porque declara que três meses de vencimento correspondem ao valor de € 2.170,80, quando dá como provado que à data do despedimento a trabalhadora da apelante ganhava € 482,49 mensais; 4. Da mesma forma, a sentença da 1.ª instância é nula, nos termos da alínea c) do n.°1 do art.º 668.° do C.P.C., quando condena na quantia de € 8.443,17 a apelante, apesar de ser certo que a conta da condenação (três meses de vencimento, acrescidos dos vencimentos devidos desde 1 de Novembro de 2007 a 31 de Agosto de 2008) somar apenas € 7478,19; 5. Nos termos da alínea b) do art.º 387.º do C.T., em caso de impossibilidade superveniente, absoluta e definitiva de o trabalhador prestar o seu trabalhador, como acontece no caso de o trabalhador ter falecido, verifica-se a caducidade do contrato de trabalho;. 6. A caducidade do contrato de trabalho tem como efeito imediato a extinção do complexo de direitos e vinculações que emergiam do contrato de trabalho, até porque este é um contrato entre vivos e não mortis causa; 7. Assim, o empregador, em caso algum pode ser condenado a pagar retribuições ou vencimentos que por definição são aquilo que nos termos do contrato, das normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito como contrapartida do seu trabalho (art.º 249.°, n.°1, do C.T.), que se tenham vencido após a data da morte do trabalhador; 8. Assim, no caso de despedimento ilícito de certo trabalhador que vem a falecer depois desse despedimento, apenas é possível a condenação do empregador nas retribuições vencidas desde a data do despedimento ilícito até à data da morte do empregado; 9. No entanto, para isso acontecer, impõem-no os n.ºs 1 e 4 do art.º 437.° do C.T., é necessário que o empregado, ilicitamente despedido, proponha a respectiva acção nos 30 dias subsequentes ao despedimento; 10. Ora, in casu, a falecida trabalhadora da apelante, E………., não propôs a acção enquanto viva, tendo aliás sobrevivido ao despedimento apenas escassos meses (o despedimento ocorreu em 30/11/2006 e o falecimento ocorreu em 25/04/2007); 11. Por outro lado, a acção veio a ser proposta pelo único e universal herdeiro dessa falecida empregada da apelante apenas em 30/10/2007; 12. Pelo que, nos termos do n.° 4 do art.º 437.° do C.T. não eram devidos à falecida trabalhadora as retribuições vencidas entre 30/11/2006 e 25/04/2007, por ter caducado o direito à sua reclamação em processo judicial; 13. Ora, verificando-se a extinção desse direito daquela trabalhadora falecida, que resulta do facto do não exercício por parte dela da faculdade de accionar a apelante nos 30 dias subsequentes ao despedimento e pela superveniência da sua morte; 14. A certeza do afirmado é comprovada também pelo facto da caducidade do direito de reclamar o pagamento das retribuições que se vencerem entre a data do despedimento e até 30 dias antes da data da propositura da acção, regulada pelo n.º 4 do art.º 437.° do C.T. ter um campo de aplicação e razão de ser diversa daquela que estabelece o prazo de prescrição de 1 ano, regulado pelo art.º 381.° do C.T.; 15. O autor, ora apelado, é sucessor da falecida E……….; o que significa que passou a ser titular das relações jurídicas patrimoniais, antes encabeçadas pela sua progenitora - art.° 2024.° do C.C.; 16. A sucessão nas relações jurídicas patrimoniais de pessoa falecida não tem como directa consequência apenas a transferência da titularidade de direitos, porque implica igualmente a transferência das vinculações, sendo certo que ninguém pode transferir para outrem mais direitos do que aqueles que tem; 17. Ora, mesmo que fosse viva, aquela trabalhadora, caso intentasse a presente acção em 30/10/2007, data em que o autor a propôs, já tinha perdido o direito a receber os vencimentos que auferiria entre a data do despedimento e 25/04/2007; 18. Pelo que, o apelado não tem o direito que se arrogou; 19. Por outro lado, a opção entre a indemnização por antiguidade (a fixar entre 15 e 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fracção de antiguidade, com um mínimo de 3 meses - n.°s 1 e 3 do art.° 439.° do C.T.) e a reintegração, pertencendo esta em exclusivo ao trabalhador, é uma "obrigação de faculdade alternativa" e não uma "obrigação alternativa"; 20. Assim, nos casos em que não é possível a reintegração, como acontece quando se verifica o decesso do trabalhador, a jurisprudência dos tribunais superiores, que seja conhecida da apelante, apenas considerou atribuir aos herdeiros o direito à indemnização por antiguidade, quando o trabalhador falecido já tinha feito essa opção na acção que intentou contra a empregador; 21. Ora, no caso, nenhuma acção judicial foi intentada pela falecida trabalhadora, a única pessoa que podia fazer essa opção, e assim não teve oportunidade de manifestar a sua vontade de optar por forma juridicamente válida; 22. Tanto mais que, como tem sido decidido pelo S.T.J.[4], "a indemnização não tem autonomia perante a reintegração sendo um sucedâneo desta" - Ac. STJ, de 16/05/2001: AD, 482.° - 269; 23. Para além do alegado e concluído também é certo que a douta sentença em recurso ao condenar a apelante no pagamento das retribuições vencidas depois da morte da sua trabalhadora e nas vincendas até ao trânsito em julgado da sentença, contraria toda a jurisprudência dos tribunais superiores conhecida da apelante, que estabelece como termo da responsabilidade do empregador, a data da da caducidade do contrato (ou seja, no caso, a data da morte da trabalhadora - 25/04/2007); 24. Por fim, ao invés do decidido, deve considerar-se que a cláusula 3.ª do contrato de trabalho a termo certo ao justificar o termo com "a implementação do sistema de auto-controlo no Hospital ………., sistema este que implica pela sua especialidade um aumento de procedimentos resultando o mesmo nesta admissão, que previsivelmente termina com o término deste contrato" respeita integralmente os ditames legais contidos no art.º 131.°, n.°1, alínea e) e n.° 3 do C.T., porquanto a apelante não fez mais do que dar início ao processo imposto pelo Regulamento (CE) 852/2004, de 29 de Abril; 25. Devendo qualificar-se o contrato de trabalho em causa nestes autos como contrato de trabalho termo certo e, em consequência, ser considerada válida a denúncia de tal contrato, mediante carta enviada à trabalhadora para ter efeitos a partir de 30/11/2006; 26. Assim não o entendendo, a douta sentença violou as disposições legais supra indicadas. O A. apresentou a sua contra-alegação de resposta, pedindo a confirmação da sentença. Admitido o recurso, foram colhidos os vistos legais. Cumpre decidir. São os seguintes os factos dados como provados pelo Tribunal a quo: 1. A mãe do autor, E………. celebrou com a ré em 26.DEZ.04 contrato de trabalho escrito pelo período de 11 meses e 5 dias, tendo prestado trabalho para a mesma sob as ordens, direcção e fiscalização dela com a categoria de empregada de distribuição personalizada, mediante a retribuição mensal de € 457,90 em 2004, de € 470,72 em 2005 e de € 482,49 em 2006, cumprindo um horário normal de 8 horas diárias e 40 horas semanais, com dois dias de descanso semanal. 2. Nos termos da cl.ª 3.ª desse contrato de trabalho foi estipulado que o prazo referido “… justifica-se dada a implementação do sistema de auto-controlo no Hospital ………., sistema este que implica pela sua especialidade, um aumento de procedimentos, resultando o mesmo nesta admissão, que previsivelmente termina com o termino deste contrato.”. 3. Mediante carta enviada pela ré à trabalhadora, aquela fez cessar o contrato de trabalho em 30.NOV.06. Está também provado o seguinte facto: 4. A mãe do A., E……….., faleceu em 2007-04-25 – cfr. assento de óbito de fls. 23. Fundamentação. Sendo pelas conclusões do recurso que se delimita o respectivo objecto[5], como decorre das disposições conjugadas dos Art.ºs 684.º, n.º 3 e 690.º, n.º 1, ambos do Cód. Proc. Civil, ex vi do disposto no Art.º 87.º, n.º 1 do Cód. Proc. do Trabalho, salvo tratando-se de matérias de conhecimento oficioso de que o Tribunal ad quem pode conhecer por sua iniciativa, o que não ocorre in casu, são seis as questões a decidir nesta apelação, a saber: I – Nulidades da sentença. II – Habilitação-legitimidade do A. como sucessor de sua mãe. III – Nulidade do termo. IV – Nulidade do contrato de trabalho por falta de visto de trabalho. V – Retribuições vencidas. VI – Indemnização por despedimento. Previamente deve referir-se que, dadas as questões suscitadas neste recurso de apelação, devemos começar pelas duas últimas, ora enunciadas, dada a solução que se antevê para a decisão. Por outro lado, tendo a acção sido decidida em 1.ª instância através de saneador-sentença, não se procedeu a audiência de discussão e julgamento, sendo certo que não houve, também, impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto. Daí que, nestas circunstâncias, a Relação apenas poderá atender, para além do aditamento, aos factos dados como provados e constantes da respectiva lista da decisão do Tribunal a quo. Vejamos, então a 5.ª questão. Reporta-se ela às retribuições vencidas e vincendas. Parte ela do pressuposto que a trabalhadora, mãe do A., foi ilicitamente despedida, na medida da nulidade do termo aposto ao respectivo contrato, pois tendo a R. posto fim ao contrato celebrado em 2004-12-26, por carta de 2006-11-30, sem precedência de processo disciplinar, praticou, na sua óptica, um despedimento ilícito, pois a nulidade do termo converteu em contrato por tempo indeterminado o contrato que havia sido celebrado a termo. Ora, sendo ilícito o despedimento, dispõe o CT: Artigo 437º 1 — Sem prejuízo da indemnização prevista na alínea a) do nº 1 do artigo anterior, o trabalhador tem direito a receber as retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal.Compensação 4 — Da importância calculada nos termos da segunda parte do nº 1 é deduzido o montante das retribuições respeitantes ao período decorrido desde a data do despedimento até 30 dias antes da data da propositura da acção, se esta não for proposta nos 30 dias subsequentes ao despedimento. Acontece que, in casu, a acção foi intentada em 2007-10-30 e que a mãe do A. faleceu em 2007-04-25. Ora, face ao disposto no n.º 4 do artigo ora transcrito, dúvidas não restam de que as retribuições vencidas não são devidas desde a data do despedimento, mas apenas desde 2007-09-30. Porém, tendo ocorrido o óbito da trabalhadora entre a data do despedimento e a data da propositura da acção, deve entender-se que as retribuições vencidas não são devidas. Expliquemos porquê. Sendo o trabalhador despedido ilicitamente, visa a lei fazer, na medida do possível, a reconstituição natural da situação jurídica que existiria se não tivesse ocorrido o despedimento. Daí que, uma das prestações do contrato de trabalho em que tal reconstituição é possível, é exactamente o pagamento das retribuições vencidas e vincendas, mas sempre no pressuposto de que a prestação do trabalhador, a sua actividade - ou a sua disponibilidade para o efeito - embora não efectuada por razões imputáveis ao empregador, sempre seria possível no que ao trabalhador concerne. No entanto, apesar de ter sido ilicitamente despedido, se a prestação do trabalhador se tornar impossível por facto a ele imputável, por exemplo, pelo seu decesso ou pela sua reforma, tal facto determina a caducidade do contrato, o que arrasta consigo a cessação da obrigação do empregador de pagar a retribuição. Realmente, se se tornou impossível a prestação do trabalhor, o correspectivo do empregador, a obrigação de pagar a retribuição, também cessa. Daí que se venha entendendo de há muitos anos a esta parte que, caducado o contrato por morte do trabalhador ou pela sua reforma, cessa o direito às retribuições vencidas e vincendas[6]. In casu, a trabalhadora, se viva fosse, teria direito às retribuições vencidas e vincendas desde o trigésimo dia anterior à data da propositura da acção até à data do trânsito em julgado da decisão. Porém, tendo falecido, o seu direito a tais retribuições cessaria na data do óbito, se a acção tivesse sido proposta a seguir ao despedimento. Por isso, tendo a acção sido proposta em data posterior àquela em que ocorreu o seu decesso, o direito às retribuições vencidas e vincendas já se havia extinguido anteriormente, pelo que o A. nunca poderia arrogar-se um direito que não existia na esfera jurídica da de cujus, atento o princípio nemo plus juris in alium transferre potest quam ipse habet]7]. Improcedem, destarte, as pertinentes conclusões da apelação. A 6.ª questão. Trata-se de saber se o A. tem direito à indemnização pelo despedimento ilícito da trabalhadora, sua mãe. Vejamos. Dispõe, adrede, o CT: Artigo 436º 1 — Sendo o despedimento declarado ilícito, o empregador é condenado:Efeitos da ilicitude a) A indemnizar o trabalhador por todos os danos, patrimoniais e não patrimoniais, causados; b) A reintegrá-lo no seu posto de trabalho sem prejuízo da sua categoria e antiguidade. Artigo 439º 1 — Em substituição da reintegração pode o trabalhador optar por uma indemnização, cabendo ao tribunal fixar o montante, entre 15 e 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fracção de antiguidade, atendendo ao valor da retribuição e ao grau de ilicitude decorrente do disposto no artigo 429º.Indemnização em substituição da reintegração 2 — Para efeitos do número anterior, o tribunal deve atender a todo o tempo decorrido desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão judicial. Ora, como se referia na questão anterior, sendo o trabalhador despedido ilicitamente, visa a lei fazer, na medida do possível, a reconstituição natural da situação que existiria se não tivesse ocorrido tal facto ilícito. Daí que, uma outra prestação do contrato de trabalho em que tal reconstituição é possível é, outrossim, a retoma do contrato de trabalho, cuja execução foi suspensa pelo despedimento ilícito, pela reintegração do trabalhador na empresa, mas sempre no pressuposto de que a prestação do trabalhador, a sua actividade, embora não efectuada por razões imputáveis ao empregador, sempre seria possível no que ao trabalhador concerne. No entanto, apesar de ter sido ilicitamente despedido, se a prestação do trabalhador se tornar impossível por facto a ele imputável, por exemplo, pelo seu decesso ou pela sua reforma, tal facto determina a caducidade do contrato, o que arrasta consigo a cessação da obrigação do empregador de o reintegrar no respectivo posto de trabalho. Realmente, se se tornou impossível a prestação do trabalhador, o correspectivo do empregador, a obrigação de dare trabalho, de reintegrar na empresa, também cessa. Podendo o trabalhador optar pela indemnização da antiguidade, em substituição da reintegração, saímos do domínio da reconstituição natural da situação jurídica e passamos à reparação por equivalente, o que, não correspondendo ao primeiro e principal desiderato da lei, constitui ainda uma forma de reparar o dano decorrente do despedimento ilícito, embora em via secundária, poder-se-á afirmar. Tal opção pela indemnização, constituindo ainda uma forma de reparar o dano, por equivalente, pressupõe a existência do direito principal, o direito à reintegração, de forma que se este se extinguir porque a prestação se tornou impossível, pela verificação da caducidade do contrato de trabalho derivada, por exemplo, da morte ou da reforma do trabalhador, então, o direito à indemnização também cessa, maxime nas situações em que a opção não tenha sido exercida antes da verificação do facto que originou a caducidade do contrato de trabalho. É que o direito à indemnização não tem autonomia frente ao direito à reintegração, sendo seu mero sucedâneo[8], pelo que aquele pressupõe sempre a existência de um contrato de trabalho vigente, em execução ou em vias de o ser, pela eventual reintegração no posto de trabalho[9]. In casu, tendo a acção sido intentada depois de a trabalhadora ter falecido, o A. optou pela indemnização de antiguidade, como sucessor de sua mãe, num momento em que a reintegração no posto de trabalho já não era possível, dado que o contrato de trabalho já havia caducado, isto é, optou pelo direito sucedâneo quando o direito principal, a reintegração, já se tinha extinguido. Tal situação é mais candente quando, como sucede na hipótese, a opção nem havia sido exercida antes do facto gerador da caducidade e mesmo dando de barato que o direito de opção pela reintegração tem estrita natureza patrimonial. Do exposto decorre que o A. não tem direito á indemnização de antiguidade, pois quando a acção foi intentada ele já se encontrava extinto em virtude de a reintegração se ter tornado impossível em consequência da verificação da caducidade do contrato de trabalho de sua mãe, dado o seu decesso. Improcedem, assim, as respectivas conclusões do recurso. Ora, sendo estas as decisões que demandam as questões 5.ª e 6.ª, fica prejudicado o conhecimento das restantes pois, mesmo que a apelação merecesse provimento nessa parte, a sentença sempre deveria ser revogada, uma vez que ao A. não pode ser reconhecido o direito às retribuições vencidas e vincendas e à indemnização de antiguidade, derivados do despedimento efectuado na pessoa de sua mãe. Em síntese e sem necessidade de outros fundamentos, o recurso deverá proceder. Decisão. Termos em que se acorda em conceder provimento à apelação, assim revogando a sentença recorrida, indo a R. absolvida dos pedidos contra ela formulados pelo A. Custas pelo A., sem prejuízo do que se encontrar decidido, em sede de incidente do apoio judiciário. Porto, 2009-04-27 Manuel Joaquim Ferreira da Costa António José Fernandes Isidoro Albertina das Dores Nunes Aveiro Pereira _______________________ [1] Abreviatura de Código de Processo Civil, de ora em diante assim designado. [2] Abreviatura de Código de Processo do Trabalho, de ora em diante assim designado. [3] Abreviatura de Código do Trabalho, de ora em diante assim designado. [4] Abreviatura de Supremo Tribunal de Justiça, de ora em diante assim designado. [5] Cfr. Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil Anotado, volume V, reimpressão, 1981, págs. 308 a 310 e o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 1986-07-25, in Boletim do Ministério da Justiça, n.º 359, págs. 522 a 531 [6] Cfr. Pedro Furtado Martins, in Despedimento Ilícito, Reintegração na Empresa e Dever de Ocupação Efectiva, “Direito e Justiça” – Revista da Faculdade de Direito da Universidade Católica Portuguesa – Suplemento, 1992, págs. 139, Júlio Manuel Vieira Gomes, in Direito do Trabalho, Relações Individuais de Trabalho, volume I, 2007, págs. 1023, Pedro Romano Martinez e outros, in Código do Trabalho Anotado, 2003, págs. 632 e o Acórdão da Relação de Lisboa de 1990-11-14 [Cunha e Silva], in Colectânea de Jurisprudência, Ano XV-1990, Tomo V, págs. 168 a 170. [7] Cfr. Manuel A. Domingues de Andrade, in Teoria Geral da Relação Jurídica, Vol. II, 1960, pág. 18. [8] Rectius, tratar-se-á de uma obrigação com faculdade alternativa por parte do credor, como refere João de Matos Antunes Varela, in Das Obrigações em Geral, 2.ª edição, volume I, 1973, págs. 700 a 703, maxime, págs. 702 e 703 e Fernando Andrade Pires de Lima e João de Matos Antunes Varela, in Noções Fundamentais de Direito Civil, 4.ª edição, volume I, 1957, págs. 257 a 262. [9] Cfr., para uma sínteses da evolução da jurisprudência, na matéria, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 2006-02-21 [Sousa Peixoto], in Colectânea de Jurisprudência, Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, Ano XIV-2006, Tomo I, págs. 256 a 257, in www.dgsi.pt, Processo 05S3639 e in Trabalho & Segurança Social, 2006, N.º 5, pág. 19. Cfr., para uma breve síntese doutrinal e jurisprudencial, Pedro Furtado Martins, in Despedimento Ilícito, Reintegração na Empresa e Dever de Ocupação Efectiva, “Direito e Justiça” – Revista da Faculdade de Direito da Universidade Católica Portuguesa – Suplemento, 1992, págs. 138 a 142 e respectivas notas de rodapé. |