Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
| Processo: |
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| Nº Convencional: | JTRP000 | ||
| Relator: | MARIA LUZIA CARVALHO | ||
| Descritores: | CONVOCAÇÃO DA AUDIÊNCIA PRÉVIA PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO DECISÃO SURPRESA CONTRATAÇÃO A TERMO | ||
| Nº do Documento: | RP202503171901/24.6T8VLG.P1 | ||
| Data do Acordão: | 03/17/2025 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
| Decisão: | IMPROCEDENTE; CONFIRMADA A SENTENÇA | ||
| Indicações Eventuais: | 4ª SECÇÃO (SOCIAL) | ||
| Área Temática: | . | ||
| Sumário: | I - No âmbito do processo laboral, face aos interesses em presença, aos princípios da simplicidade, celeridade e economia processuais que o regem, só há lugar a audiência prévia se a complexidade da causa o justificar. II – A não audição das partes nos termos do art.º 3.º, nº 3 do CPC, prévia à decisão do mérito da causa no despacho saneador, não constitui violação do princípio do contraditório, não sendo uma decisão surpresa aquela que se pronuncia sobre as questões que integram o objeto do processo e foram debatidas nos articulados, tendo as partes, designadamente a recorrente, tido oportunidade de sobre ela se pronunciar nos articulados. III - As flutuações de volume de serviço inerentes ao negócio não constituem, por si só, motivo justificativo de recurso à contratação a termo. | ||
| Reclamações: | |||
| Decisão Texto Integral: | Processo n.º 1901/24.6T8VLG.P1 Origem: Comarca do Porto, Juízo do Trabalho De Valongo - J1 Acordam os juízes da secção social do Tribunal da Relação do Porto Relatório AA, intentou a presente ação com processo comum emergente de contrato individual de trabalho, contra A..., S.A., formulando o seguinte pedido: “a) Ser reconhecido à A. o vínculo do contrato de trabalho por tempo indeterminado; b) Ser reconhecida a nulidade do contrato a termo por falta de fundamento do termo certo e respetiva adenda; c) Ser a R. condenada a convolar o contrato de trabalho a termo certo e respetiva adenda da A. em contrato sem termo, nos termos do art. 147.º do C.T.; d) Ser a R. condenada a contar-lhe a antiguidade na empresa e na categoria profissional desde 25.06.2021 e reintegrá-la na categoria e funções; e) Ser a R. condenada a pagar à A. as prestações intercalares, desde 07.06.2023 a 31.05.2024 até efetiva integração que neste momento se computa em € 11.597,00 (Onze mil quinhentos e noventa e sete euros e noventa e sete cêntimos), acrescidas de juros de mora vencidos e vincendos até efetivo e integral pagamento; f) Ser a R. condenada ao pagamento de custas e condigna Procuradoria.” Alegou que as partes celebraram um contrato de trabalho a termo resolutivo, todavia, tal termo é nulo e tendo a ré considerado o contrato cessado com fundamento na respetiva caducidade, nada mais fez do que a despedir ilicitamente. Mais alega que todas as adendas celebradas também são nulas. A ré contestou pugnando pela validade da contratação da autora a termo e, consequentemente, pela improcedência da ação. Findos os articulados, o tribunal “a quo” proferiu despacho afirmando que o processo reúne condições para ser conhecido de mérito em sede de despacho saneador considerando que estão assentes os contratos de trabalho entre a autora e a ré que servem de causa de pedir à ação e que uma vez que a questão já foi devidamente discutida nos articulados não se impõe que as partes se pronunciem novamente sobre esta questão, proferindo, de seguida despacho saneador sentença no qual decidiu: “i) Condenar a Ré a reconhecer a Autora como sua trabalhadora subordinada, no âmbito do contrato de trabalho sem termo celebrado em 25.06.2021; ii) Condenar a Ré a reconhecer a ilicitude do despedimento da Autora nos termos do artigo 381.º, alínea c) do Código do Trabalho; iii) condenar a Ré a reintegrar a Autora no estabelecimento da empresa da Ré, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade; iv) condenar a Ré a pagar à Autora os salários intercalares a contar 30 dias antes da data da instauração da presente ação até trânsito em julgado desta sentença que declara a ilicitude do despedimento, deduzindo-se: v) 1. as importâncias que a Autora aufira com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento e; vi) 2. o subsídio de desemprego atribuído à Autora no período de tempo referido, devendo o empregador entregar essa quantia à segurança social.” Inconformada a ré interpôs o presente recurso, apresentado alegações que concluiu nos seguintes termos: «I. Salvo o devido respeito, tendo o Tribunal a quo decidido do mérito da causa, sem que às partes fosse concedida a possibilidade de discussão de facto e de direito e sem previamente ter consultado as partes sobre essa mesma possibilidade, cometeu-se uma nulidade por omissão de uma formalidade que a lei prescreve, nos termos do n.º 1 do art. 195.º do C.P.Civ.. II. Na verdade, o douto despacho saneador-sentença proferido constitui uma decisão surpresa porquanto não foi precedido de despacho designando data para a audiência prévia e sem que tenha sido feita menção à discussão de facto e de direito do mérito da causa, seja este por escrito ou oralmente. III. Tem vindo a ser entendimento unânime que quando o juiz pretenda decidir de imediato, no todo ou em parte, do mérito da causa, deve convocar a audiência prévia por forma a possibilitar às partes a discussão de facto e de direito da questão, sendo que o conhecimento do mérito da causa deve ser precedido da consulta das partes, nos termos e para os efeitos do art. 3.º, n.º 3 do C.P.Civ.. IV. Resulta assim dos autos que não foi efectuada a discussão de facto e de direito do mérito da causa em momento prévio ao da prolação da decisão dos autos, pelo que esta nulidade há-se transformar-se numa nulidade da própria sentença proferida e, como tal, enquadrável no art. 615.º, n.º 1, d) do C.P.Civ, sendo a decisão nula por excesso de pronúncia. V. Além de que não foi dada oportunidade para se demonstrar que o contrato que vinculou as partes é formal e materialmente válido. VI. Desde logo porque os factos invocados no texto do contrato são verdadeiros, como são correctas as apreciações sobre a natureza precária das necessidades de recursos humanos daí decorrentes. VII. Mais, os detalhes do fundamento que possam faltar podem ser comprovados pelo empregador como forma de reforçar a sua veracidade e ocorrência como motivo da contratação, como acontece compreensivelmente, nos casos em que os projectos assentam em descrições técnicas complexas. VIII. Porém, e uma vez que o Tribunal a quo decidiu do mérito antes de ser produzida a prova, a Recorrente viu-se coartada na sua defesa porquanto a decisão ocorre em que a tenha havido oportunidade para apresentar e interpretar as provas carreadas para o processo que permitiriam enquadrar a matéria em discussão. IX. Com tal decisão impõe-se a modificação da sentença proferida em sede de saneador, prosseguindo aos autos para audiência de discussão e julgamento. X. A justificação do contrato em crise ocorre nos termos do n.º 1 do art. 140.º do C.Trab., e teve em vista a satisfação de necessidades temporárias que resultam da tendência instável de queda de tráfego postal e da impossibilidade de determinar o sentido da sua evolução e bem assim a incerteza quanto à manutenção, pela Ré, da concessão do serviço postal universal. XI. O direito à segurança no emprego - constitucionalmente consagrado no art. 53.º da C.R.P., não colide com a existência de contratos de trabalho a termo, permitindo a lei o recurso à contratação a termo por necessidades de gestão corrente dos recursos humanos da entidade empregadora, desde que se insira e cumpra o respectivo regime jurídico. XII. As situações elencadas no art. 140.º, n.º 2 do C.Trab., são meramente exemplificativas, pelo que o Empregador pode sustentar o contrato noutra motivação desde que sejam preenchidos os requisitos constantes da cláusula geral do n.º 1 do mesmo preceito e ainda se respeitem os requisitos formais do art. 141.º do C.Trab.. XIII. Estes requisitos encontram-se preenchidos no caso em apreço, desde logo porque os factos invocados traduzem uma necessidade de contratação da Empresa, de natureza manifestamente temporária porque limitada à duração do período de tempo necessário ao apuramento da evolução do decréscimo de tráfego e bem assim à finalização do processo de concessão do SPU e consolidação do seu impacto. XIV. Se a Recorrente não fosse nomeada concessionária do SPU, ou se, sendo-o, não fosse viável para a empresa outorgar o respectivo contrato, extinguir-se-ia a razão da contratação entretanto viabilizada. XV. Relembre-se que o mercado abriu a oportunidade a outras empresas com capacidade para apresentarem propostas alternativas à da Recorrente, pelo que esta desconhecia se ia manter ou não este cliente essencial e, mantendo-o em que termos. XVI. Acresce que todos os factos de base invocados no texto do contrato não são manipuláveis pela A... porque lhe são absolutamente exteriores. XVII. Portanto, a necessidade da A... invocada no contrato outorgado com o Autor é verdadeira, é precária, não visa perdurar, mas apenas acompanhar as necessidades de contratação que, por força dos referidos condicionalismos, são necessariamente temporárias. XVIII. Por outro lado, as necessidades temporárias da Recorrente e que justificam a aposição do termo foram objectivamente definidas pela A... no texto do contrato, são factos públicos e notórios e nem por isso a Ré deixou de os esclarecer nas cláusulas estipuladas. XIX. As fundamentações que cabem no referido n.º 1, não incluem, nem os motivos já constantes do n.º 4, nem os motivos referidos nas alíneas do n.º 2 (porque, nesse caso, seriam aplicáveis esses motivos, e não o n.º 1), por isso, é lógico presumir que as fundamentações do n.º 1 se baseiam em situações diferentes e muito específicas da realidade do empregador, assinalando a importância da perspectiva empresarial e do negócio. XX. Sendo que esta definição pelo empregador só pode acontecer ao abrigo de critérios empresariais, que naturalmente irão considerar o negócio específico da empresa no seio da respectiva conjuntura social e económica e de mercado. XXI. Portanto, ao empregador, a lei apenas impõe que explicite essa fundamentação de modo a que surja clara a veracidade da motivação, a sua precariedade, e a sua estimada manutenção durante toda a duração do contrato. XXII. Não se trata de uma imprevisibilidade, incerteza ou de oscilações de mercado, que possa ser considerada como riscos inerentes a qualquer tipo de empresa em qualquer tipo de sector de actividade, no caso em apreço estão em causa circunstâncias deveras especiais, conforme descrito no contrato. XXIII. Já no que diz respeito à duração do contrato, a mesma foi definida de acordo com o conhecimento público sobre o referido processo de concessão do SPU, não ultrapassando o período estritamente necessário à satisfação dessas necessidades, sendo que estas se mantinham à data, agravadas pela situação pandémica, e ainda se aguardava pela decisão do Governo que punha fim a este procedimento. XXIV. Por fim, estão preenchidos os requisitos formais previstos no art. 141.º do C.Trab., tanto porque as necessidades temporárias foram objetivamente definidas no texto do contrato, como a descrição constante do texto do contrato funda-se em dados concretos que podem ser facilmente confirmados, nomeadamente, no site da ANACON. XXV. Por conseguinte, nem foram omitidas, nem são insuficientes, as referências ao termo e ao motivo justificativo do contrato. XXVI. A estipulação do termo no contrato em apreço não visou iludir as disposições que regulam o contrato sem termo, porque o contrato foi celebrado ao abrigo da motivação prevista no n.º 1 do art. 140.º do C.Trab.. XXVII. Pelo exposto, o contrato a termo e respectivas adendas têm justificação válida e cessou por caducidade, nos termos legais. XXVIII.A sentença recorrida é nula porque não precedida de marcação de audiência prévia, o sendo que não foi dada a oportunidade às partes para se pronunciarem sobre a possibilidade de decisão de mérito, havendo excesso de pronúncia nos termos conjugados dos arts. 3.º, n.º 3, 195.º, n.º 1 e 615.º, n.º 1, d) e, caso assim não se entenda, porque não aplicou correctamente o direito aos factos dados como provados, violou o disposto nos arts. 279.º e 323.º do C.Civ. e arts. 140.º, 141.º, 147.º, 390.º do C.Trab.» * A autora apresentou contra-alegações formulando as seguintes conclusões: «1- A A./Apelada, desde já, reafirma a sua total adesão à Douta Sentença proferida pelo Tribunal “a quo”, porquanto conforme com o direito. 2 - No que diz respeito à obrigatoriedade de realização da audiência prévia a R./Apelante esquece que estamos no domínio do Direito do Trabalho e por consequência do respetivo Direito adjetivo. 3 - Carece de fundamento os argumentos aduzidos pela R./Apelante de Decisão Surpresa ou de obrigatoriedade de audiência prévia. 4 - A audiência prévia apenas é convocada e assume obrigatoriedade quando a complexidade da causa o justifique. 5 - Em caso de manifesta simplicidade e estarmos exclusivamente perante matéria de direito, como é o caso dos autos, onde exclusivamente é apreciada a Justificação do Termo aposto no contrato de trabalho é evidente a desnecessidade de qualquer discussão adicional quanto à matéria de direito e muito menos fazer incidir e dilatar o processo com produção de prova testemunhal. 6 - Atento o preceituado no art. 62.º, n.º 1 do Código de Processo do Trabalho, “Concluídas as diligências resultantes do preceituado no n.º 1 do artigo anterior, se a elas houver lugar, é convocada uma audiência prévia quando a complexidade da causa o justifique”. 7 - Competirá, pois, ao juiz, findos os articulados e as diligências que tenham tido lugar, nos termos do art. 61.º, atenta a natureza da causa e a sua complexidade, determinar (ou não) a realização da audiência prévia nos moldes supra descritos, assim se harmonizando os dois regimes legais. Não se devendo esquecer que a audiência prévia na sua essência se traduz (também) na preparação da audiência final, com vista à sua simplificação. 8 - No presente caso, a solução adotada na sentença recorrida assentou em matéria e questões perfeitamente conhecidas da Ré – a (in)validade da contratação a termo do Autor, conforme foi explanado, abundantemente, nos respetivos articulados. Destes resultando ter tido a Ré oportunidade de influenciar o sentido da decisão em seu favor. 9 - Consequentemente, nenhuma nulidade por omissão ou preterição de formalidade que a lei repute como essencial foi cometida, não havendo lugar à aplicação do art. 195.º do C.P.C.. 10 - Diga-se ainda, em abono da sentença com a qual se está de acordo em toda a sua extensão, fundamentação e direito, que não é “pelos factos relatados na justificação do termo serem verdadeiros”, que os mesmos podem justificar estas contratações a termo pela R./Apelante, nomeadamente no que à A./Apelada diz respeito. 11 - As justificações do termo de um contrato, não podem ser genéricas ou de âmbito global, ou seja, a Guerra da Ucrânia, da Palestina, ou o conflito na Venezuela, não estão, direta ou sequer indiretamente, ligadas com a necessidade da contratação a termo. Aliás basta atender ao período de duração do conflito, ou destes conflitos para se perceber que teríamos contratos de trabalho a termo incerto e não certo indefinidamente. 12 - Não há necessidades de recursos humanos precárias, mas permanentes na R./Apelante. 13 - Diz a R./Apelante que, “O direito à segurança no emprego – constitucionalmente consagrado no art. 53.º da C.R.P., não colide com a existência de contratos de trabalho a termo.”, mas colide com a falsa contratação a termo por isso se exige que a justificação enquadrada e enquadrável, resulte não de generalidades, mas de fundamentos absolutamente sindicáveis no âmbito de necessidades gestionárias da empresa. Violando a R./Apelada esta norma constitucional. 14 - Na argumentação da R./Apelante falta, a “adequação”, a “situação concreta” e a “objetividade”, tudo caraterísticas que estes contratos não têm, e que não será com a produção de prova testemunhal ou outra que se poderá ultrapassar a sua falta. 15 - Há, pois, uma clara violação do disposto nos artigos 140.º e 141.º do Código do Trabalho. 16- O motivo justificativo da celebração de contrato de trabalho a termo tem que constar expressamente no contrato através da menção dos factos que o integram, e estando em causa uma “formalidade ad substantiam” apenas estes podem ser atendidos para aferir da validade do termo, logo não seria qualquer prova adicional ou testemunhal que viria “esclarecer” o que a R./Apelante pretendeu. 17 – [em branco nas contra-alegações] 18 - A execução de tarefa ocasional ou serviço determinado precisamente definido e não duradouro, enquanto motivo justificativo da celebração de contrato de trabalho a termo refere-se à execução de tarefa que não corresponde à normal atividade da empresa ou, em alternativa, a situações que podendo ou não ser estranhas a tal atividade, têm, no entanto, uma duração transitória pré-determinada, um serviço de duração limitada. 19 - Há, desde logo, violação do disposto no art. 141.º, n.º 1, al. e) e n.º 3 e ainda do art. 147.º, n.º 1, al. a) do C.T. porquanto o contrato indica uma fundamentação não enquadrável na justificação dos contratos a termo. 20 - No âmbito da Lei 17/2012, dispõe o art. 4.º quanto à atividade de prestação de serviços postais que, integram a atividade de serviço postal as operações de aceitação, tratamento, transporte e distribuição de envios postais e para o assegurar o prestador de serviços postais utiliza em conjunto de meios humanos e materiais que constituem a rede postal. 21 - A Lei Postal determina ainda no seu art. 7.º estar a R./Apelante obrigada “ao respeito pelos termos e condições laborais e pelos regimes de Segurança Social estabelecidas por Lei, por regulamentação, por disposições administrativas e por IRCT.” Sendo importante realçar que nos termos da Lei Postal, art. 18.º (Lei 17/2012) os prestadores de serviço, ou seja, a R./Apelante tem direito à compensação do custo líquido do serviço universal quando este constitua um encargo financeiro não razoável para os mesmos. 22 - O Serviço Postal Universal é obrigatório, essencial para o país, não havendo qualquer necessidade de contratação precária ou a termo, pois, ainda que a R./Apelante pudesse vir a ter um prejuízo, correspondendo os seus trabalhadores a uma necessidade permanente para assegurar o seu objetivo ou desiderato, sempre tal custo seria suportado pelo Governo/Tutela. 23 - A R./Apelante sabe, com absoluta certeza, desde pelo menos 03 de novembro de 2021 (Resolução é de 23 de setembro de 2021), que se manterá como única concessionária do SPU, e como tal, não existe qualquer necessidade de contratação a termo para o posto de trabalho de CRT, cujos giros têm tendencialmente aumentado, não em número mas em extensão geográfica e volume de trabalho, com a consequente redução de qualidade de serviço e concentração da distribuição em períodos mais alargados de tempo, dado a escassez de trabalhadores. 24 - A R./Apelante alega ainda que “é o empregador quem define o que, exclusivamente na sua perspetiva, desde que objetivamente fundado, constitui uma motivação temporária assente num imperativo do funcionamento da actividade prosseguida”. É evidente que é esta tese e esta interpretação que foi rejeitada pela A./Apelada e pelo Tribunal, uma quando propôs a ação e outro quando decidiu na sentença. 25 - Uma coisa a R./Apelante tem razão é que “foi clara a sua motivação” e foi-o também para o Tribunal, daí a decisão de que recorre. 26 - A Decisão do Tribunal “a quo” prima por absoluta retidão e respeito pela lei devendo a sentença ser confirmada na íntegra e a trabalhadora reintegrada.» * O recurso foi regularmente admitido e recebidos os autos neste tribunal, foi proferido despacho determinando a devolução dos autos à 1.ª instância com vista à prolação de despacho a que alude o art.º 617.º, n.º 3 do Código de Processo Civil (doravante CPC) sobre a nulidade da sentença arguida pela recorrente. Tal despacho foi proferido concluindo pela inexistência da nulidade da sentença invocada. Recebidos, de novo, os autos neste tribunal, o Ministério Público, nos termos do art.º 87.º, n.º 3 do Código de Processo do Trabalho (doravante CPT), emitiu parecer no sentido da improcedência total do recurso. Nenhuma das partes se pronunciou sobre o aludido parecer. * Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir. * Delimitação do objeto do recurso Resulta do art.º 81.º, n.º 1 do Código de Processo do Trabalho (doravante CPT) e das disposições conjugadas dos arts. 639.º, nº 1, 635.º e 608.º, n.º 2, todos do Código de Processo Civil (doravante CPC), aplicáveis por força do disposto pelo art.º 1.º, n.º 1 e 2, al. a) do CPT, que as conclusões delimitam objetivamente o âmbito do recurso, no sentido de que o tribunal deve pronunciar-se sobre todas as questões suscitadas pelas partes (delimitação positiva) e, com exceção das questões do conhecimento oficioso, apenas sobre essas questões (delimitação negativa). Assim, são as seguintes as questões a decidir: 1 - nulidade da sentença; 2 – validade da contratação da autora a termo. * Fundamentação de facto Na decisão recorrida foram considerados provados os seguintes factos; «a) A Autora e a Ré celebraram o contrato denominado “Contrato de Trabalho a Termo Certo”, com a data aposta de 24.06.2021. b) O teor integral desse contrato é o seguinte: [não se tratando de matéria impugnada, dá-se por reproduzido o teor integral do cotrato transcrito no despacho sanedor/sentença.] c) A Autora e a Ré celebraram outro contrato denominado “Contrato de Trabalho a Termo Certo”, com o prazo de seis meses e com início em 08.02.2022 e termo a 07.08.2022. d) O teor integral desse contrato é o seguinte: [não se tratando de matéria impugnada, dá-se por reproduzido o teor integral do cotrato transcrito no despacho sanedor/sentença.] e) Após 08.08.2022 a A. e R. outorgam uma adenda ao contrato de trabalho celebrado em 07.03.2023, por 3 meses, para o ..., ao abrigo da al. g) do n.º 2 do art. 140.º do C.Trab., fundamentado no Projecto de Reestruturação dos Centros de Distribuição, dos Centros de Produção e Logística, e das Lojas, que cessou a 06.06.2023. f) A Autora auferia uma retribuição mensal de € 760,00.» * Apreciação A recorrente invocou a nulidade da sentença por excesso de pronúncia, alegando que a mesma não foi precedida da realização de audiência prévia ou de consulta das partes ao abrigo do art.º 3.º, n.º 3 do CPC, sendo a decisão nula por ter sido omitida uma formalidade prescrita na lei que impediu que fosse efetuada a discussão de facto e de direito do mérito da causa em momento prévio ao da prolação da decisão dos autos, transformando aquela nulidade numa nulidade da própria sentença proferida e, como tal, enquadrável no art.º 615.º, n.º 1, d) do CPC. A autora, por sua vez, no que foi acompanha pelo Ministério Público, considera que não foi violada qualquer formalidade legal, concluindo pela inexistência da nulidade invocada. A nulidade da sentença a que se alude na alínea d) do art.º 615.º, n.º 1 do CPC está diretamente relacionada com os limites da atividade de conhecimento do tribunal, estabelecidos no artigo 608.º, n.º 2 do CPC, cominando-se, em respeito pelo princípio do pedido e do impulso processual associado ao princípio do contraditório, a violação de tais limites, isto é, as situações em que o tribunal se pronuncia sobre questões de que não podia tomar conhecimento. Com efeito, decorre do art.º 608.º, n.º 2 do CPC que na sentença o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, não podendo ocupar-se senão dessas questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras questões. Assim, as questões sobre as quais o tribunal deve pronunciar-se e às quais está limitada a sua intervenção aferem-se, em função do objeto processual delineado pelo autor, conformado este pelo pedido e causa de pedir, bem como pelas questões/exceções ao mesmo opostas pelo réu, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso. Por isso, haverá excesso de pronúncia, gerador de nulidade da sentença, se o tribunal incumprir os limites máximos do dever de decidir aquelas questões. Distintas das nulidades da sentença são as nulidades processuais a que alude o n.º 1 do artigo 195.º do CPC, respeitando estas últimas a atos de tramitação ou sequência processual, resultando da prática de ato indevido ou de ato sem observância das respetivas formalidades, bem como da omissão de ato que devia ter sido praticado. Na prática, contudo, a distinção entre nulidades da sentença e nulidades processuais poderá não ser evidente, como sucede quando esteja em causa a omissão de uma formalidade obrigatória (aqui se incluindo as omissões invocadas pela recorrente de realização da audiência prévia e de audição das partes previamente à prolação da decisão), questão que, de resto, tem suscitado acesa querela jurisprudencial e doutrinal quanto ao enquadramento jurídico do vício em que se traduz a prolação de decisão surpresa e de que bem se dá nota no Ac. RL de 26/09/2023[1]. Seja qualquer for a solução pela qual se opte, ela só relevará se se estiver perante uma verdadeira decisão surpresa. Dispõe o art.º 62.º, n.º 1 do CPT que “Concluídas as diligências resultantes no n.º 1 do artigo anterior, se a elas houver lugar, é convocada uma audiência prévia quando a complexidade da causa o justifique.” De tal disposição, resulta que no âmbito do processo laboral, face aos interesses em presença, aos princípios da simplicidade, celeridade e economia processuais que o regem, ao contrário do que acontece no domínio processual civil, em que a realização da audiência prévia, nos termos do art.º 591.º, n.º 1 do CPC, é a regra (ainda assim com as exceções previstas nos arts. 592.º, 593.º e 597.º, este relativo a ações de valor não superior a metade da alçada da Relação, como é o caso dos autos), só há lugar a audiência prévia se a complexidade da causa o justificar. Na situação dos autos, estava em causa, antes de mais, a apreciação da validade da estipulação do termo por as motivos invocados no contrato não se subsumirem ao disposto pelo art.º 140.º, n.º 1 do Código do Trabalho (doravante CT) e por incumprimento da obrigação de indicação de factos concretos que integrem motivo justificativo o termo, questões que não dependem de prova a produzir, já que têm de ser decididas à luz do teor contratual, e que integrando o objeto do processo foram debatidas nos articulados. Trata-se de questões, que independentemente da maior ou menor complexidade do teor contratual, não oferecem complexidade do ponto de vista da sua subsunção jurídica, quer em abstrato, já que correspondem a questões amplamente decididas pelos tribunais, quer em concreto, já que correspondem a situações nas quais a recorrente tem tido, como é do conhecimento geral, intervenção em múltiplos processos ao longo dos anos. Nessa medida, nada obrigava o Mm.º Juiz “a quo” a convocar as partes para audiência de partes, antes de proferir a decisão sobre o mérito da causa. E também não foi preterido princípio do contraditório, por as partes antes da prolação e tal decisão, não terem sido ouvidas ao abrigo do art.º 3.º, n.º 3 do CPC. Dispõe a referida norma que: “O juiz deve observar e fazer cumprir, ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório, não lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem.” Ora, como se pode ler no Ac. do STJ de 19/10/2022[2], parcialmente transcrito no Ac. do STJ de 24/05/2023[3], referido pelo tribunal “a quo”, quer no despacho que precedeu o despacho saneador, quer no despacho em que se pronunciou sobre a nulidade arguida pela recorrente: «O princípio do contraditório, enquanto princípio estruturante do processo civil, exige que se dê a cada uma das partes a possibilidade de deduzir as suas razões “de facto e de direito”, de “oferecer as suas provas”, de “controlar as provas do adversário” e de “discretear sobre o valor e resultados de umas e outras”. [cf. acórdão do T. Constitucional n.º 177/2000, DR, II série, de 27.10.2000]. A norma do n.º 3 do artigo 3.º do CPC, introduzida pela Reforma de 1995/96, veio ampliar o âmbito tradicional do princípio do contraditório, como garantia de uma discussão dialéctica ou polémica entre as partes no desenvolvimento do processo. A uma concepção válida, mas restritiva, substitui-se hoje uma noção mais lata de contraditoriedade, com origem na garantia constitucional do “rechtliches Gehõr” germânico, entendida como garantia da participação efectiva das partes no desenvolvimento de todo o litígio, mediante a possibilidade de, em plena igualdade, influírem em todos os elementos (factos, provas, questões de direito) que se encontram em ligação com o objecto da causa e que em qualquer fase do processo apareçam como potencialmente relevantes para decisão. O escopo principal do princípio do contraditório deixou assim de ser a defesa, no sentido negativo de oposição ou resistência à actuação alheia, para passar a ser a influência, no sentido positivo de direito de influir activamente no desenvolvimento e no êxito do processo. [cf. Lebre de Freitas, in Introdução ao Processo Civil, Conceitos e Princípios Gerais à luz do Código Revisto", 1996, pág. 96]. Mesmo relativamente às questões de direito, a norma proíbe, como sublinha este Autor, as decisões-surpresa, ou seja, decisões baseadas “em fundamento que não tenha sido considerado previamente pelas partes”, enquanto violadoras do princípio do contraditório, conforme entendimento jurisprudencial do Supremo Tribunal de Justiça. [cf. Acórdão do STJ de 15.10.2002, in www.dgsi.pt). No dizer de António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, in Código de Processo Civil Anotado, Volume I, Almedina, pp. 19 e seguintes: “Ao princípio do contraditório subjaz a ideia de que repugnam ao nosso sistema processual civil, decisões tomadas à revelia de algum dos interessados (...). Tal como o princípio do contraditório não deve obscurecer o objetivo da celeridade processual, também esta não pode conduzir a uma dispensa do contraditório sob o pretexto da sua desnecessidade. Tal dispensa é prevista a título excecional, de modo que apenas se justificará quando a questão já tenha sido suficientemente discutida ou quando a falta de audição das partes não prejudique de modo algum o resultado final.”.» No caso dos autos, a decisão a proferir, como já explicitámos, não revestia complexidade (nem a recorrente alegou o contrário) e não dependia de prova a produzir, pelo que a não audição das partes não prejudicaria o resultado final. E é fulcral salientar que, como também já acima afirmámos, as questões sobre as quais o tribunal se pronunciou integram o objeto do processo e foram debatidas nos articulados, tendo as partes, designadamente a recorrente, tido oportunidade de sobre ela se pronunciar, como fez, amplamente, na contestação. Por isso, a decisão proferida não constitui uma decisão surpresa, antes corresponde à apreciação da questão submetida à apreciação do tribunal (cfr. art.º 608.º, n.º 2 do CPC). Daí que, não se vislumbre que o tribunal tenha decidido questão da qual não podia conhecer, ou que tenha sido, por qualquer forma, violado o contraditório. Improcede, pois, a nulidade da sentença por excesso de pronuncia invocada pela recorrente. * Importa, assim, que este tribunal se pronuncie sobre a segunda questão suscitada pela recorrente, a da validade da contratação da autora a termo. Antes porém, importa fazer uma explicitação quanto ao objeto do recurso. Da matéria de facto provada resulta que a recorrente e a recorrida celebraram um contrato de trabalho a termo, não renovável, com início em 25/06/2021 e a duração de 6 meses, um contrato a termo, não renovável, com início em 08/02/2022 e duração de 6 meses, e uma adenda a este contrato, com início em 07/03/2023, com a duração de 3 meses. O tribunal “a quo”, apreciando o pedido formulado pela autora, pronunciou-se apenas sobre o primeiro contrato celebrado, e louvando-se no Ac. RC de 14/10/2022[4], julgou ação procedente, concluindo que a contratação da autora a termo não foi efetuada para fazer face a necessidade temporárias, devendo o contrato considerar-se como sem termo nos termos da al. b) do n.º 1 do art.º 147.º do CT, condenando a ré a reconhecer a autora como sua trabalhadora subordinada, no âmbito do contrato de trabalho sem termo celebrado em 25/06/2021, declarando a ilicitude do despedimento e condenando a ré a reintegrar a autora no estabelecimento da empresa, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade. A recorrente, quer nas alegações de recurso, quer nas conclusões que formulou apenas se pronuncia sobre a questão tal como decidida pelo tribunal, nada alegando relativamente aos demais contratos celebrados, limitando, pois, atento o disposto pelo art.º 608.º, n.º 2 do CPC, a nossa apreciação à questão relativa ao contrato que teve início em 25/06/2021. Vejamos então. Em conformidade com o princípio da segurança no emprego consagrado no artigo 53º da Constituição Portuguesa, só excecionalmente o legislador laboral admite a celebração de contratos a termo. As exceções àquele princípio são as situações em que está em causa a satisfação de necessidades temporárias da empresa e pelo período estritamente necessário à sua satisfação, tal como estatui o art.º 140º, nº 1 do Código do Trabalho (doravante CT), disposição legal que prevê «um sistema de cláusula geral, que sujeita a admissibilidade de aprazamento o contrato à verificação de uma necessidade temporária, e que é complementada pelo n.º 2 do aludido preceito, através de uma enumeração exemplificativa (…)»[5]. Estão em causa necessidades não permanentes objetivamente definidas pelo empregador, o que não significa que a conformidade legal da contração a termo depende da qualificação pelo empregador das necessidades como temporárias. Significa, antes, que sobre o empregador impende a obrigação de só contratar a termo quando existem razões concretas, exteriorizáveis como tal, que possam ser entendidas (quer pelo contraentes, quer pelo tribunal se chamado a intervir) como transitórias ou passageiras. Por isso, também, nos termos do art.º 141.º, n.º 1 do CT, o contrato de trabalho a termo está sujeito a forma escrita, devendo ser assinado por ambas as partes e conter entre outras a indicação do termo estipulado e do respetivo motivo justificativo, a qual deve ser feita pela menção expressa dos factos que integram aquele motivo, devendo estabelecer-se a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado (art.º 140º, nº 1, al. e) e nº 3 do C.T.), considerando-se sem termo o contrato celebrado fora dos casos previstos no n.º 1 do art.º 140.º, bem como aquele em que falte ou seja insuficiente, além do mais, a indicação do motivo justificativo (art.º 147, nº 1, als. b) e c) do C.T.). Trata-se de exigências que visam o controlo externo da legalidade da contratação a termo e cuja justificação última se encontra no citado princípio constitucional. Tal finalidade só se cumpre, se do contrato constar a indicação, em concreto e de forma circunstanciada, dos factos que integram qualquer uma das situações em que é admissível a contratação a termo, ou seja, uma qualquer situação de necessidades temporárias da empresa e que permita estabelecer a relação entre a justificação invocada e a duração do contrato, não se bastando com a mera reprodução do texto legal ou com a indicação genérica ou vaga (cfr. art.º 141.º, n.º 1, al. e n.º 3 do Código do Trabalho).[6] A recorrente discorda da decisão que considerou a contratação da autora sem termo nos termos do art.º 147.º, n.º 1, al. b) do CT, por não se subsumir ao disposto pelo n.º 1 do art.º 140.º do CT. Da cláusula quarta do contrato resulta que o mesmo foi celebrado por 6 meses (com início em 25/05/2021 e termo em 24/12/2021), período estimado como necessário e adequado à satisfação das necessidades temporárias da empresa. Tais necessidades foram descritas no contrato, nos seguintes termos: “2. As necessidades temporárias de contratação referidas no número anterior resultam da atual incerteza quanto á possibilidade e às condições da manutenção pela A... do contrato de concessão do serviço postal universal para além de 31-12-2021, e da consequente impossibilidade de determinação, neste momento, e atento o contexto pandémico que se atravessa, de quantos e de quais os postos de trabalho que se irão manter após o período de incerteza, estimado decorrer ate, pelo menos, 31/12/2021. 3. Até 31-12-2021, a A... é, em território nacional, a prestadora do serviço postal universal, ao abrigo do n.º 1 do artigo 57.º da Lei Postal, mas não existe qualquer garantia que a A... continuará a ser prestadora designada depois daquela data. 4. A consulta pública sobre diversos aspetos essenciais do regime regulatório do serviço postal universal promovida pela Autoridade Nacional da Comunicações (ANACOM), em particular nas matérias reativas a qualidade e regulamento relativo à distribuição domiciliária, encontra-se pendente de decisão por parte daquela entidade. Considerando o habitual desenvolvimento deste tipo de processo, não se prevê que as decisões finais sobre este assunto sejam decididas antes de 331/12/2021. 5. Por outro lado, não se conhece ainda o calendário relativo ao processo administrativo de designação do prestador do serviço universal, procedimento que deverá ser iniciado pelo Governo e do qual a A..., presentemente, não tem informação, concluindo-se que será difícil que o referido processo de designação ocorra antes do segundo semestre de 2021. 6. As circunstâncias descritas nos números anteriores impõem a necessidade de antecipar a possível transformação da A..., que na eventualidade de não ser designada como a prestadora do serviço postal universal a partir de 31/12/221, terão necessariamente impacto na organização e no seu negócio, nomeadamente, em termos de RH. 7. estima-se, assim, que haverá um enorme impacto muito significativo na área de Recursos Humanos da A..., com fortes implicações na área de recrutamento e, sobretudo, no número, na forma e nas modalidades de contratação, as ainda impossível de concretizar nesta fase e perante tantas variáveis. 8. O impacto de qualquer das realidades referidas nos números anteriores prolongará a incerteza do número e do tipo de postos de trabalho permanentes, pelo menos até à prorrogada vigência do atual contrato de concessão do serviço postal universal (portanto, pelo menos, até 31-12-2021).” Ora, a leitura atenta desta motivação, revela-nos que, apesar da sua extensão, a situação invocada não se subsume ao disposto pelo art.º 140.º, n.º 1 do CT, por várias razões. Concede-se que o que consta do contrato é suscetível de retratar uma situação de incerteza relativamente à quantidade de trabalhadores necessários após decisão relativa à atribuição ou não da concessão do serviço postal universal à recorrente. Mas tal incerteza, em si mesma, não constitui uma necessidade temporária de contratação de mais trabalhadores, no período a que reporta a contratação (de 25/06/2021 a 31/12/2021). Com efeito, tal como se concluiu no Ac. da RC de 14/10/2022 já identificado supra, propósito de um outro contrato a termo em que a aqui recorrente interveio como empregadora e em que o motivo invocado foi, em parte, o invocado na situação dos autos, “as flutuações de volume de serviço inerentes ao negócio não constituem, por si só, justificativas de recurso a contratação a termo, por falta do requisito geral “necessidade transitória” - Ac. STJ de 14-03-2007, RG de 28-05-2015, pgs. 337/122.6TTVCT.G1, www.dgsi.pt. E também a concessão ou não concessão do SPU é uma questão que se enquadra no próprio risco de mercado não servindo para justificar a verificação de uma necessidade temporária.” Por outro lado, não se pode esquecer que o que está em causa é a justificação para admitir mais um trabalhador. E quanto a essa matéria, nada resulta do contrato. Na verdade, nada vem dito quanto à necessidade de tal contrato naquele momento para o ..., não se percebendo qual a concreta necessidade da recorrente que lhe esteve subjacente (a recorrente precisava de contratar o autor porquê? Qual a situação concreta e estranha ao seu normal funcionamento em virtude da qual a recorrente precisou naquela momento de mais trabalhadores com a categoria de Carteiro?). Toda a motivação constante do contrato apenas releva para demonstrar que a necessidade de contratar o autor só se manteria até 31/12/2021, mas não qual a necessidade que até lá existia e que a recorrente se propunha colmatar. Por isso, nem a situação invocada é subsumível ao disposto pelo art.º 140.º, n.º 1 do CT, nem a indicação do motivo justificativo satisfaz os requisitos do art.º 141º, n.º 1, al. e) parte final e n.º 3 do mesmo Código. Nessa medida, atento o disposto pelo art.º 147.º, n.º 1, als. b) e c) do CT, não merece censura a decisão recorrida que considerou o contrato como contrato sem termo condenando a recorrente a reconhecê-lo enquanto tal, declarando a ilicitude do despedimento e condenando a ré a reintegrar a autora no estabelecimento da empresa, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade. O recurso, é, pois, totalmente improcedente. * Nos termos do disposto pelo art.º 527.º do CPC tendo a recorrente ficado integralmente vencida, é sua a responsabilidade pelo pagamento das custas. * Decisão Por todo o exposto acorda-se julgar o recurso improcedente, confirmando-se o despacho saneador/sentença recorrido. Custas pela recorrente. * Maria Luzia Carvalho Sílvia Saraiva Teresa Sá Lopes _____________ [1] Processo n.º 19406/19.5T8Lsb.L1-6, acessível em www.dgsi.pt. [2] Processo n.º 13358/20.6T8LSB.L1.S1, acessível www.dgsi.pt. [3] Processo n.º 154/22.5T8TMR.E1.S1, acessível em www.dgsi.pt. [4] Processo n.º 2564/1.6T8LRA.C1, acessível em www.dgsi.pt. [5] Joana Nunes Vicente, in Direito do Trabalho, Relação Individual, 2.ª Edição Revista e Atualizada, pág. 549/550. [6] A propósito dos requisitos da justificação do termo contratual, veja-se, entre outros o Ac. RP 04/04/2022, processo nº 4061/20.8T8MTS.P1, acessível em www.dgsi.pt. |