Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
571/12.9TAPVZ.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: DONAS BOTTO
Descritores: CRIME
VIOLAÇÃO DA OBRIGAÇÃO DE ALIMENTOS
CONCURSO REAL
Nº do Documento: RP20161109571/12.9TAPVZ.P1
Data do Acordão: 11/09/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REC PENAL
Decisão: PROVIDO
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO, (LIVRO DE REGISTOS N.º 1031, FLS. 62-65)
Área Temática: .
Sumário: O crime do art.º 250º CP porque visa a protecção de bens jurídicos eminentemente pessoais, o numero de crimes determina-se pelo numero de pessoas em relação às quais a satisfação das suas necessidades fundamentais é posta em perigo pelo não cumprimento da obrigação de alimentos.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Proc. n.º 571/12.9TAPVZ.P1

Acordam em Conferência no Tribunal da Relação do Porto

Relatório

A decisão agora sob recurso, condenou o arguido B… pela prática de apenas um único crime de violação da obrigação de alimentos, previsto e punido pelo artigo 250.°, n.º 3 do Código Penal, sendo certo que na acusação lhe eram imputados, em autoria material e concurso real, dois crimes de violação da obrigação de alimentos, na forma consumada.
Inconformado com esta decisão, veio o MP dela recorrer, pedindo para o arguido ser condenado como autor material, em concurso efectivo e na forma consumada, de dois crimes de violação da obrigação de alimentos p. e p. pelo art. 250° nº 1 do C.P.
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É do seguinte teor a decisão recorrida:

Nos presentes autos de Processo Comum e para julgamento perante Tribunal Singular o Ministério Público deduziu acusação contra:
B…, casado, natural de França, nascido a 30-4-82, filho de C… e de D…, residente na Rua …, …, V. N. Famalicão, titular do c.c. nº …….. imputando-lhe a prática, como autor material e concurso real, de dois crimes de violação da obrigação de alimentos, na forma consumada, p. e p. pelo art" 250°, n,º 3 e 4, do Código Penal
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Não foi deduzido qualquer pedido de indemnização civil.
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O arguido não apresentou contestação.
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Procedeu-se a audiência de discussão e julgamento, com observância estrita de formalismo legal
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Mantêm-se os pressupostos de validade e regularidade da instância que presidiram à prolação do despacho que designa dia para julgamento, nada tendo ocorrido posteriormente que obste à apreciação do mérito da causa.
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- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO:
A - Factos Provados:
Da discussão da causa resultaram provados os seguintes factos:
1- o arguido é pai das menores E…, nascida a 23-5-2003, e de F…, nascida a 19-10-2005.
2- Por decisão proferida a 26-9-2007, no processo de Divórcio que correu termos no antigo 3° Juízo Cível do Tribunal Judicial da Póvoa de Varzim, transitada em julgado, foi homologado o acordo nos termos do qual as referidas menores ficaram entregues à guarda e cuidados da mãe, a G…, e o arguido obrigado a contribuir a título de alimentos devidos àquelas suas filhas com a quantia mensal de €100 para cada uma, a liquidar por meio de transferência bancária para uma conta da G… até ao dia 8 de cada mês.
3- Todavia o arguido, não obstante ter meios para o fazer, nunca contribuiu com a referida quantia a título de alimentos devidos àquelas suas filhas.
4. Com efeito, desde meados do ano de 2008 até 31 de Agosto de 2009 o arguido trabalhou por conta da sociedade "H…, S.A.", com sede na Rua …, em Oliveira de Azeméis, tendo auferido a quantia mensal líquida de €507,58, à excepção do mês de Agosto de 2009, em que recebeu a quantia líquida de €1.532,87.
5- Desde aquela data até 31-12-2009 o arguido recebeu subsídio de desemprego no montante mensal de €475,50.
6- De Janeiro de 2010 até 2 de Agosto de 2010 o arguido trabalhou por conta da sociedade "I…, Lda.", com sede na Rua …, …, em Mirandela, onde tinha um vencimento base mensal de €629,60, recebendo um valor líquido variável em função do número de horas mensais efectuadas, das horas suplementares e subsídio de alimentação correspondente, tendo chegado a receber, em Abril de 2010, o valor líquido de €741,28.
7- No dia 2 de Agosto de 2010, o arguido fez cessar o contrato de trabalho que havia celebrado com aquela sociedade.
8- Posteriormente o arguido arranjou novo emprego e, desde meados de 2011 até ao dia 1-4-2012 trabalhou, primeiro a tempo inteiro e depois em regime de tempo parcial, por conta da sociedade "J…, Lda.", com sede na A v" …, .. em Lisboa.
9- Aí, e até Dezembro de 2011, o arguido auferiu de remuneração base mensal o valor ilíquido de €641,93 acrescido de subsídio de alimentação no valor de €5,69 por cada dia de trabalho prestado, e ainda outras remunerações de natureza transitória e montante mensal variável, designadamente por trabalho prestado em serviço nocturno, que se cifraram num valor ilíquido, em média mensal, de €5,56.
10- E de Janeiro a Março de 2012 auferiu o valor ilíquido, por cada hora de trabalho prestado, de €3,70, acrescido de outros valores correspondentes a trabalho suplementar e nocturno, num valor mensal ilíquido, em termos médios, de €299,69.
11- Nos meses de Outubro a Dezembro de 2011 foi, por determinação judicial, descontado no vencimento do arguido a quantia de €75 por mês para pagamento parcial dos alimentos devidos às referidas suas filhas, quantia essa que foi transferida por aquela sociedade para a conta bancária da G…, mãe das menores.
12- Em consequência da actuação do arguido, foram colocadas em perigo as necessidades fundamentais do menor, nomeadamente as relativas à sua alimentação, vestuário, educação e assistência médica.
13- Posteriormente o arguido emigrou para França onde começou a trabalhar, e apenas nos meses de Julho e Agosto de 2012 depositou na conta da G…, a título de alimentos devidos às menores, a quantia total de €210,00.
14- O arguido tem também casa própria em Portugal, sita em …, V.N. Famalicão, onde reside quando se encontra neste país.
15- As menores E… e F… encontram-se, desde 2007, na dependência exclusiva da mãe, a G…, que naquela data era empregada do Centro de Dia K…, onde auferia €450,00 mensais, e em 2011 emigrou para França, onde reside e trabalha, auferindo mensalmente cerca de €400,00, seu único rendimento.
16- E como encargos tem as despesas com a renda da casa, a água, a luz, o telefone, a alimentação, vestuário e saúde das suas filhas e sua, bem como a educação daquelas, despendendo mensalmente quantia não inferior a €1.000,00, que é suportada por si e pelo companheiro com quem vive.
17- Na verdade, a G…, para fazer face a todas as despesas, tem recorrido, desde 2007, ao auxílio económico do companheiro L… e é à custa dele que tanto ela como as menores sobrevivem.
18- O arguido agiu voluntária, livre e conscientemente, bem sabendo que ao se eximir ao pagamento das prestações alimentares que sabe serem-lhe legal e judicialmente exigíveis, às quais voluntariamente se obrigou, punha em causa a satisfação das necessidades básicas das filhas E… e F…, e que a sua conduta era proibida e punida por lei.
MAIS SE PROVOU:
19- O arguido tem um outro antecedente criminal: foi condenado em 26/03/2010 pela prática do crime de ofensa à integridade física simples na pena de 60 dias de multa, à taxa diária de €6,00, já liquidada.
20- O arguido voltou a casar, encontrando-se actualmente desempregado, fazendo biscates na área de electrónica no que declarou auferir €250,00 por mês; a esposa é comerciante, auferindo cerca de €1.000,00 mensais; vivem em casa própria, liquidando de prestação mensal €415,00, têm um filho de 4 anos a cargo; declara que liquida às Finanças €120,00 mensais.
21- O arguido no mês de Agosto de 2014 recebeu cerca de €27.196,95 da venda do apartamento, bem comum do casal, que detinham em França.
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B - Factos Não Provados:
Não se provou que foi para evitar a continuidade dos descontos no seu vencimento que o arguido se demitiu, colocando-se na impossibilidade de cumprir, pelo menos com o seu vencimento, aquela sua obrigação.
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C- Motivação da decisão de facto
O art. 374° do C.P.P., no seu nº2, determina, além do mais, que a fundamentação da sentença contenha a enumeração dos factos provados e não provados, que serão, como resulta do artº 368°nº 2 do mesmo código, apenas os que, sendo relevantes para a decisão, estejam descritos na acusação, ou na pronúncia, tenham sido alegados na contestação, ou que resultem da discussão da causa. Como é sabido, dada a uniformidade do entendimento que desde há muito o STJ tem vindo a adoptar sobre esse ponto - Cfr. por todos, os Ac. STJ de 03.04.91 e de 05.02.98, in CJ, 1991, T2, 19, e CJ T2, 245, respectivamente - aquela enumeração visa a exaustiva cognição do "thema probandum", isto é, a demonstração de que o tribunal analisou especificamente toda a matéria de prova que foi submetida à sua apreciação e que se revestia de interesse para a decisão da causa, pelo que a obrigação legal de, na sentença, se fazer a descrição dos factos provados e não provados, se refere e tão somente "( .... ) aos que são essenciais à caracterização do crime e suas circunstâncias juridicamente relevantes, o que exclui os factos inócuos, irrelevantes para a qualificação do crime ou para a graduação da responsabilidade do arguido, mesmo que descritos na acusação ou na contestação" - Cfr. Ac. STJ de 15.01.97, in CJ, Ac. STJ, 1997, TI, p.181
Isto posto, vejamos qual foi o nosso percurso para decidir como se fez.
A convicção do tribunal na fixação da matéria factual supra enunciada fundamentou-se no conjunto da prova produzida, socorrendo-se de todos os elementos apreendidos, e reconstruiu em consciência o que efectivamente se passou, e que se reconduz, ao fim e ao resto, apenas aos factos supra referidos dados como provados, atendendo-se ainda às regras da normalidade e de experiência comum.
No que concerne ao essencial dos factos provados, o tribunal baseou-se sobretudo na prova documental referida na acusação no confronto com as declarações da progenitora das menores e do companheiro desta.
Da prova documental resultou, designadamente da certidão de fls. 2 e seguintes, de que foi declarado o incumprimento por parte do aqui arguido, no que concerne ao pagamento da pensão de alimentos devida às suas filhas, e que o aqui arguido viu o seu salário e subsídio desemprego penhorados, mais resulta dos recibos de vencimento juntos os montantes por si auferidos, nos vários momentos referidos na acusação.
Tivemos ainda em conta as certidões de nascimento de fls. 46-47 e 50-51 e a certidão da sentença homologatória de divórcio e regulação das responsabilidades parentais de fls. 52 e seguintes.
De tal prova documental, conjugada com as declarações da progenitora e do seu companheiro e ainda com o que foi declarado pelo arguido já na parte final do julgamento resultou patente, mas apenas isso, que o arguido bem sabia que ao agir como agiu estava a praticar um crime, tendo optado por, segundo o próprio disse, liquidar as dívidas do café (que explorou com a progenitora das menores) em vez de liquidar as pensões de alimentos a que estava obrigado, sendo certo que tinha disponibilidade financeira para o fazer.
Do conjunto do que foi declarado pela progenitora e pelo seu companheiro resultou o retrato da situação económica da mãe das menores, o auxílio que o companheiro da progenitora vem prestando à mãe das menores e a existência de situação de perigo concreto de satisfação das necessidades do menor, não fora essa ajuda.
Tivemos ainda em conta as declarações do arguido no que respeita à sua situação económica à falta de outra prova.
No que se refere aos antecedentes criminais do arguido, o tribunal teve ainda presente o C. R. C. junto.
Quanto à factualidade dada como não provada foi assim considerada por não se ter feito prova acerca da mesma (não sendo suficiente a prova documental junta para se chegar à conclusão de tal facto).
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- DECISÃO:
Pelo exposto o tribunal decide julgar a acusação pública parcialmente procedente e, em consequência:
a) Absolver o arguido B… da prática de um crime de violação de obrigação de alimentos, p. e p. pelo art. 250.°, n.º 4, do CP.
b) Condenar o arguido B… da prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de violação de obrigação de alimentos, p. e p. pelo art. 250.°, n.º 3, do CP; na pena de 1 ano de prisão, suspensa pelo mesmo período de tempo subordinada à obrigação de pagar €1.500,00 a título de indemnização à progenitora das menores, na totalidade no prazo de 30 dias ou, no prazo de 9 meses, em prestações mensais.
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O MP, como atrás referimos, veio pedir para o arguido ser condenado como autor material, em concurso efectivo e na forma consumada, de dois crimes de violação da obrigação de alimentos p. e p. pelo art. 250° nº 1 do C.P.
Assim, a questão que o recurso coloca está em saber se, para a determinação do número de crimes, não releva o número de pessoas em relação às quais, se verifica a omissão do cumprimento da obrigação de prestar alimentos.
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Nesta Relação, a Ex.ma Sr.ª PGA é de parecer que o recurso do MP deve proceder.
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Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
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Começamos por referir que no tipo legal do artigo 250.°, não está em causa apenas o mero incumprimento de uma obrigação legal de prestar alimentos, que é uma obrigação civil, mas essencialmente, a protecção do titular do direito a alimentos face ao perigo de não satisfação das necessidades fundamentais, pressupondo que o incumprimento da obrigação ponha em perigo a satisfação das necessidades fundamentais de quem tenha direito a alimentos.
Ora, as necessidades fundamentais podem traduzir-se, no direito a ter alimentos, o direito à saúde, o direito a ter uma boa educação, etc., donde os bens jurídicos protegidos sejam, em última instância, a própria vida, a integridade física e a saúde dos alimentados, ou seja, bens eminentemente pessoais.
Atento o disposto no artigo 2003.º do Código Civil, deve entender-se por alimentos, tudo o que é indispensável ao sustento, habitação, vestuário e, ainda, instrução e educação do alimentando, no caso de este ser menor, o tipo legal protege, em primeira linha, o titular do direito a alimentos face ao perigo de não satisfação dessas necessidades fundamentais (cfr. J. M. Damião da Cunha, Comentário Conimbricense do Código Penal, Coimbra Editora, 1999, Tomo II, pág. 621), sendo por isso, bens jurídicos pessoais, alguns de cunho imaterial.
Assim, não é pelo facto de os alimentos serem fixados em prestações pecuniárias mensais (artigo 2005.º do Código Civil), que decorre o carácter patrimonial do bem jurídico tutelado no tipo do artigo 250.º do CP, uma vez que o que essas prestações pecuniárias visam assegurar é a indispensável satisfação das necessidades da vida, pelo que para a determinação do número de crimes não se apresenta relevante o facto de a violação da obrigação de alimentos, em favor de vários alimentados, ser realizada através de uma única omissão ou através de várias omissões, para, por aí, se determinar o número de crimes (cfr. Damião da Cunha, ob. cit., p. 634).
Também Maia Gonçalves, em anotação ao art. 250º do C.Penal escreve: “ … o próprio Código dá clara indicação de que aqui se violam bens jurídicos eminentemente pessoais, ao incluir este artigo no título crimes contra a vida em sociedade e numa secção intitulada crimes contra a família. Por isso, em nosso entendimento e paralelamente ao que sucede com outros crimes de natureza complexa ou mista (v.g. roubo), o agente cometerá tantos crimes quantos os alimentandos a quem não prestou alimentos, embora através de uma única conduta naturalística”.
Por sua vez, refere o art.º 1878.º do CC, que compete aos pais, no interesse dos filhos, velar pela segurança e saúde destes, prover ao seu sustento, dirigir a sua educação, representá-los, ainda que nascituros, e administrar os seus bens, prevendo consequências para os casos de incumprimento deste poder-dever (cfr. art.º 1915.º, 1918.º e 1920.º e arts. 1921.º e ss.., todos do CCivil).
Assim, a omissão por incumprimento deste dever, faz perigar bens essenciais do alimentando, o que confere a este comportamento o desvalor para o qualificar como infracção criminal, pois pressupõe o interesse público de proteger a família, como elemento fulcral da sociedade, contra a supressão, modificação ou simulação da sua disciplina. A existência do dever não é um elemento integrante do crime, pois desaparece em várias situações, caso de o obrigado não ter meios de subsistência, ou mesmo se o outro familiar tem elevadas posses económicas, pelo que a natureza patrimonial do bem jurídico tutelado nestas situações, não é determinante, pois excluiria deste ilícito penal a prestação de alimentos que não assume natureza patrimonial (cfr. art.º 2005.º, n.º2 do CC), pelo que o agente deste crime só pode ser a pessoa que estiver na titularidade de uma dada relação familiar, investido numa particular posição subjectiva.
Por isso, neste ilícito, está-se a proteger criminalmente o agregado familiar.
Assim, para que se verifique a prática deste crime, basta que se perspective o perigo, não sendo necessária a carência efectiva, mesmo que se esteja a receber auxílio de terceiros, quer estes auxiliem por estar legalmente obrigados, quer o façam voluntariamente (cfr. Leal Henriques e Simas Santos, in Código Penal Anotado, 3ª Edição, 2º vol., Editora Rei dos Livros, págs., 1065 e ss.), sendo um prime de perigo e não de dano.
Assim sendo, considerando que o tipo legal visa a protecção de bens jurídicos eminentemente pessoais, o número de crimes determina-se pelo numero de alimentados que são afectados pela violação da obrigação de alimentos, isto é, pelo número de pessoas em relação às quais a satisfação das suas necessidades fundamentais é posta em perigo pelo não cumprimento da obrigação de alimentos, atento o artigo 30.º, n.º 1, do CP (cfr. Ac. STJ de 3.10.2001 (proc. n.º 2237/01-3.ª; SASTJ, n.º 54, pág. 75, Acórdãos da Relação do Porto, de 21 de Abril de 2004, in Colectânea de Jurisprudência, Ano XXIX ­2/214 I, de 8-11-2006, 4-1-2006 e 25-6-2008, e do TRE de 23-2-2016, disponíveis em www.dgsi.pt).
Por isso, o arguido ao não cumprir a obrigação a que se encontra vinculado em relação a cada uma das suas filhas, violou o mesmo bem jurídico, que é de natureza eminentemente pessoal no que respeita a duas pessoas diferentes, pelo que estamos perante um caso previsto no art. 30º nº 1 do C.Penal, como dissemos.
Incorreu, pois, o arguido na prática de dois crimes de violação de prestação de alimentos previstos e puníveis no art. 250º, nº 1 do C.Penal.
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Assim sendo, há que fixar a pena a aplicar a este segundo crime.
Ora, a pena tem finalidades exclusivas de prevenção geral e especial. «Umas e outras devem coexistir e combinar-se da melhor forma e até ao limite possíveis, porque umas e outras se encontram no propósito comum de prevenir a prática de crimes futuros (cfr. Jorge de Figueiredo Dias, Temas Básicos da Doutrina Penal, Coimbra Editora, 2001, p. 105).
Com a finalidade da prevenção geral positiva ou de integração do que se trata é de alcançar a tutela necessária dos bens jurídico-penais no caso concreto. No sentido da tutela da confiança das expectativas de todos os cidadãos na validade das normas jurídicas e no restabelecimento da paz jurídica comunitária abalada pelo crime. Também a personalidade do recorrente, manifestada nos factos e na sua atitude perante a vida e os seus deveres, não pode deixar de ser tida em consideração, sendo ainda de ter em conta problemas de socialização realçando as exigências de prevenção especial. Efectivamente, as exigências de prevenção geral de integração e de prevenção especial de socialização justificam a não opção pela pena de multa, embora a socialização em liberdade possa ser atingida, com a suspensão da execução da pena, ainda que subordinada ao cumprimento das obrigações fixadas, atingindo-se assim, as finalidades da punição. A cada um dos crimes cometidos pelo arguido corresponde a pena de prisão até dois anos ou pena de multa até 240 dias.
Atento o exposto, sendo certo que os factos traduzem apreciável censurabilidade, visto o perigo que representam para o bem estar das menores, além da gravidade que o incumprimento significativo dos deveres inerentes ao poder paternal representa, o facto de o arguido ter já um antecedente criminal, não ter confessado integralmente os factos e a inexistência de arrependimento, considera-se agora também a pena concreta de 1 ano de prisão como adequada para o segundo crime imputado ao arguido.
De acordo com o preceituado no art.º 77.º, n.º1 do CP, considera-se adequada a pena única de dezasseis meses de prisão, mantendo-se a suspensão de execução da pena nos termos decretados na decisão recorrida.
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Pelo exposto acordam os Juízes desta 1ª Secção em conceder provimento ao recurso interposto pelo M.º P.º, pelo que condenam o arguido B… pela prática de dois crimes de violação da obrigação de alimentos, previstos pelo art. 250º/1 do Cód. Penal, na pena de 1 ano de prisão cada um, e nos termos do art.º 77.º, n.º1 do CP, na pena única de dezasseis meses de prisão, suspensa na sua execução nos termos constantes da decisão recorrida, mantendo-se, no mais, o anteriormente decidido.
Sem custas.

Porto, 9-11-2016
Donas Botto
José Carreto