Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | ALBERTO TAVEIRA | ||
Descritores: | CITAÇÃO PRECLUSÃO DO DIREITO DE CONTESTAR | ||
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Nº do Documento: | RP202503114176/24.3T8OAZ-A.P1 | ||
Data do Acordão: | 03/11/2025 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | CONFIRMADA | ||
Indicações Eventuais: | 2ª SECÇÃO | ||
Área Temática: | . | ||
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Sumário: | Ocorrendo segunda citação da requerida para contestar e já havendo decorrido o prazo na integra após a primeira citação, precludiu o direito de contestar. | ||
Reclamações: | |||
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Decisão Texto Integral: | PROC. N.º[1] 4176/24.3T8OAZ-A.P1 * Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro Juízo de Comércio de Oliveira de Azeméis - Juiz 2
RELAÇÃO N.º 212 Relator: Alberto Taveira Adjuntos: Maria da Luz Seabra Artur Dionísio Oliveira * ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO * I - RELATÓRIO. AS PARTES Insolvente: A..., Lda. * A) AA, BB e CC, vieram requerer a declaração de insolvência da sociedade “A..., Lda.”, alegando, em síntese, serem credores da requerida das quantias de € 4.209,50, € 4.609,59 e € 3.069,65, respectivamente, a título de créditos laborais, que a requerida tem outros credores com créditos vencidos, nomeadamente a Segurança Social, não possui bens suficientes para pagar o seu passivo, que ascende a mais de € 3.200.000,00, e se encontra impossibilitada de cumprir pontualmente as suas obrigações e, nessa medida, em situação de insolvência. B) Por despacho de 13.11.2024 foi ordenada a citação da requerida. Foi enviada carta R/AR por ofício datado de 14.11.2024 – refª 135748375 – para a morada ..., ..., ... .... C) Tal carta veio devolvida, com indicação de não reclamado, com data de 05.12.2024. Obtidos elementos quanto à sede da requerida, foi enviada carta R/AR por ofício datado de 06.12.2024 – refª 136143731 – para “DD, Legal Rep. De A..., Lda., Rua ..., ... - ..., ... ...”. D) Os requerentes, a 09.12.2024, vieram pedir que a citação se realize através de “citação pessoal da requerida A..., Lda por meio de agente de execução, que desde já se nomeia EE, com a cédula profissional n. ....” Por despacho de 09.12.2024 ordenou-se que se aguardasse a citação por via postal. Os requeridos a 18.12.2024, vieram, de novo, pedir a citação pessoal da requerida, que foi deferida por despacho de 18.12.2024. Procedeu-se à emissão de pedido de citação pessoal através de agente de execução, com data de 19.12.2024 – cfr refª 136366286. E) Foi junto aos autos a 06.01.2024, AR de citação, assinado por DD e datado de 20.12.2024. F) Foi a 08.01.2025 proferida sentença pela qual foi declarada insolvente a sociedade A..., Lda.. G) Com data de 08.01.2025 é junto aos autos comunicação da Agente de Execução com citação pessoal da requerida, com data 06.01.2025. H) A 10.01.2025, a requerida vem expor ao Tribunal ter sido citada a 08.01.2025, está ainda em prazo para contestar o pedido de insolvência deduzido contra si. Pede que seja declarada extemporânea a sentença proferida, devendo a mesma ser dada sem efeito. I) Na sequência é proferido a 10.01.2025 o seguinte despacho: “Conforme resulta dos autos, a sociedade requerida foi citada em 20.12.2024 - cfr. refªs 136143731 e 17133685 – pelo que o prazo para deduzir oposição terminou a 30.12.2024. Pelo exposto, indefere-se ao requerido através da refª 50973320.” ** * DA DECISÃO RECORRIDA A DECISÃO é a indicada sob a alínea E) – na qual foi declarada a insolvência da requerida. * DAS ALEGAÇÕES A insolvente, vem desta decisão interpor RECURSO, acabando por pedir o seguinte: “Nestes termos e nos mais e melhores de Direito, que seguramente V.ªs Ex.ªs suprirão, deve a presente apelação ser julgada procedente por demonstrada, revogando-se a sentença datada de 08/01/2025, com a Ref.ª 136513446, determinando-se prazo para ser deduzida oposição à insolvência pela Requerida.“. * A apelante, insolvente, apresenta as seguintes CONCLUSÕES: “I. Por sentença proferida no dia 08.01.2025 foi declarada a insolvência da aqui Recorrente, em virtude de, o tribunal a quo, entender que a requerida, não ter deduzido qualquer oposição, considerando assim provados, por confissão, bem como por força dos documentos juntos, os factos alegados na petição inicial, cujo teor se dá aqui por reproduzido. II. Tendo considerado para o efeito, a Requerida ter sido regularmente citada, nos termos e para os efeitos do disposto no art. 29º e 30º do CIRE, a requerida não deduziu oposição. III. Considerando ainda para esse efeito, a citação remetida à legal representante da Requerida (para a morada da legal representante) datada de 06.12.2024 e por esta recepcionada em 20.12.2024. IV. Sucede que em 14.11.2024 foi remetida para a morada da sede da Requerida citação, a qual foi devolvida em 05.12.2024, em virtude de não ter sido reclamada. V. Nessa sequência, em 09.12.2024 requereu a Ilustre Mandatária dos Requerentes, a citação pessoal da requerida A..., Lda por meio de agente de execução, que desde já se nomeia EE, com a cédula profissional n. .... VI. Tendo sido pedida tal citação à AE em 19.12.2024. VII. Citação essa levada a cabo, na morada da Requerida, em 08.01.2025. VIII. Ora, com a citação do devedor, pode este no prazo de 10 dias, deduzir oposição, nos termos do art.º 30.º n.º 1 do CIRE. IX. Pelo que, tendo o devedor sido citado em 08.01.2025, encontrava-se ainda em prazo para deduzir a oposição, nos termos do referido art.º 30º n.º 1 do CIRE e do art.º 569º n.º 2 do CPC. X. Tanto mais que, conforme doutamente decidido pelo TRL no acórdão datado de 14.11.2023, proferido no âmbito do Proc. 2464/22.2T8LSB-D.L1: O artº 246º nº 2 do Código de Processo Civil impõe que a carta registada com aviso de recepção, destinada a citar pessoa coletiva, seja expedida para a sede inscrita no ficheiro central do Registo Nacional de Pessoas Colectivas, estabelecendo o nº 4 daquele normativo que, nos casos de devolução do expediente aí previstos, se proceda ao depósito da carta nos termos previstos no artº 229º nº 5 do Código de Processo Civil. (sublinhado nosso). XI. Algo que o tribunal manifestamente não fez, tendo optado por deferir a requerida citação pessoal através de AE, a requerimento aliás, como se disse, da Ilustre Mandatária dos Requerentes. XII. Pelo que, sendo a sentença proferida em 08.01.2025, ante tudo o exposto e salvo o devido respeito por opinião diversa, tal sentença é extemporânea. XIII. Extemporaneidade suscitada através de requerimento junto aos autos pela Requerida em 10.01.2025. XIV. O qual foi indeferido por despacho proferido nesse mesmo dia 10.01.2025. XV. Pelo exposto, e sempre com respeito por entendimento diverso, deve sentença recorrida ser revogada e concedido prazo à Recorrente para deduzir a pretendida oposição à insolvência.”. * A A. apresentou CONTRA-ALEGAÇÕES, pugnando pela improcedência do recurso. *** * II-FUNDAMENTAÇÃO. O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação da recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso – artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 3 do Código de Processo Civil
Como se constata do supra exposto, as questões a decidir, são as seguintes: Foi a requerida/insolvente, citada a 06.12.2024 ou a 08.01.2025. Foram observadas todas as regras da citação da requerida. ** * OS FACTOS Os factos com interesse para a decisão da causa e a ter em consideração são os constantes no relatório, e que aqui se dão por reproduzidos. A sentença quanto à questão suscitada, afirmou o seguinte. “Regularmente citada, nos termos e para os efeitos do disposto no art. 29º e 30º do CIRE, a requerida não deduziu oposição.” ** * DE DIREITO. A questão é por demais simples. Considera-se a insolvente devidamente citada a 20.12.2024? A redacção do artigo 246.º do Código de Processo Civil – que regula a citação das pessoas colectivas foi recentemente alterada – Decreto-Lei n.º 87/2024 de 07.11. A actual redacção por força do artigo 16.º (produção de efeitos), do citado diploma, ainda não entrou em vigor, ou nos termos da Lei, começou a produzir efeitos (as alterações ao artigo 246.º, do Código de Processo Civil, produzem efeitos na precisa data em que produzem “efeitos as disposições do diploma a que se refere o n.º 1 do artigo 230.º-A do Código de Processo Civil”.) Prosseguindo. A presente instância teve o seu início a 08.11.2024, tendo sido ordenada a citação da insolvente por despacho de 13.11.2024 – alínea B). Aí se ordenou: “Cite nos termos e para os efeitos previstos nos arts. 29º e 30º do CIRE. Caso se frustre a citação por via postal da requerida, deverá ser a mesma citada, por via postal, na pessoa do/a respectivo/a legal representante, se necessário através do recurso às bases de dados para obtenção da sua morada. Frustrando-se a citação da requerida na pessoa do/a legal representante, a requerida deve ser citada para a morada da sua sede, nos termos previstos no artigo 229º, nº 5 do Código de Processo Civil.” A secretaria oficiosamente solicitou elementos quanto à citanda/insolvente, tendo procedido à emissão de nova carta registada com AR, agora na pessoa do legal representante da citanda/insolvente, com data de 06.12.2024 – alínea C). Na sequência de requerimento dos requerentes, a 18.12.2024, foi ordenada a citação pessoal da citanda/insolvente – alínea D). Nos presentes autos foi a requerida/insolvente citada por duas vezes: a) A 20.12.2024 por carta registada com AR, na pessoa do seu legal representante; b) A 06.01.2024 por contacto pessoal na pessoa do seu legal representante. Aquando do segundo acto de citação, já havia decorrido na integra o prazo para deduzir oposição – dia 30.12.2024, acrescido dos três dias de multa do artigo 139.º do Código de Processo Civil, que cessou a 03.12.2024. As regras processuais impõem que em caso de “erros ou omissões dos atos praticados pela secretaria judicial” estas não podem prejudicar as partes – artigo 157.º, n.º 6 do Código de Processo Civil. Isto é, “devendo as secretarias judiciais atuar nos termos da lei e segundo orientações do juiz de que dependem, as partes hão de poder confiar naquilo que os funcionários judiciais lhe transmitem ou levem a cabo”, Código de Processo Civil Anotado, ANTÓNIO ABRANTES GERALDES, PAULO PIMENTA e LUÍS PIRES DE SOUSA, Vol I, 2019, pág. 193. Neste sentido Acórdão Supremo Tribunal de Justiça 6617/07.5TBCSC.L1.S2, de 30.03.2017, relatado pelo Cons ABRANTES GERALDES: “Como se disse, as exigências são especialmente rigorosas no que respeita ao acto de citação, tal o seu relevo processual e as suas repercussões na esfera jurídica do demandado, o que é bem visível através da leitura de diversos preceitos dispersos. Desde logo, pela consequência referida no art. 198º, nº 1 (art. 195º do NCPC) quanto aos efeitos de formalidades prescritas na lei. Sendo inobservadas, implicavam a nulidade da citação, desde que a falta cometida pudesse prejudicar a defesa do citado (nº 3), nulidade que era de conhecimento oficioso, nos termos do art. 202º, nº 1 (art. 196º do NCPC). Além disso, nos casos mais graves em que, realizada a citação, o demandado se mantivesse em situação e revelia, determinava o art. 483º (art. 566º do NCPC) que o juiz deveria vigiar especialmente o cumprimento das formalidades legais, determinando a repetição do acto quando encontrasse irregularidades. Desse regime legal transparecia, nas palavras de Alberto dos Reis, o “horror à revelia” (RLJ, ano 79º, pág. 238), de tal modo que, perante irregularidades susceptíveis de interferir, em abstracto, no exercício do direito de defesa, se privilegiava a repetição da diligência, afastando, ainda que por excesso, o risco de ser proferida decisão à revelia do demandado. Já para os casos em que a irregularidade se traduzisse na concessão de um prazo superior ao legalmente previsto, a ordem que emanava do art. 198º, nº 3 (art. 191º, nº 3, do NCPC), era a de considerar tempestiva a prática do acto dentro desse prazo, num sinal claro de que os erros de terceiros não deveriam prejudicar o exercício do direito de defesa, como se estabelecia na norma geral do art. 161º, nº 6 (art. 157º, nº 6, do NCPC). É neste contexto normativo e dentro dos princípios que o enformam que deve enquadrar-se a concreta situação, no pressuposto de que o direito processual deve assegurar, sem qualquer dúvida, o exercício dos direitos conferidos às partes, com especial destaque para os que rodeiam o exercício do direito de defesa.”
Do processado não há dúvidas que em face da não citação da requerida/insolvente, foi ordenada a citação pessoal através de Agente de Execução – alínea D). A mesma concretizou-se no dia 06.01.2025. Após prolação da sentença a 08.01.2025, vem a requerida/insolvente no dia 10.01.2025 argumentar que o prazo para contestação ainda não havia decorrido na integra, pelo que a sentença seria extemporânea. A M.ma Juíza n o mesmo dia, por despacho refª 136602845 (supra aludido em I)), declara que o prazo para contestar já havia decorrido na integra pelo que não tinha fundamento o pedido da requerida/insolvente. E aqui chegados, não podemos deixar de dar razão ao entendimento do Tribunal a quo. Uma vez que o prazo para contestar havia já decorrido na integra, e por consequência juridicamente a insolvente deixou d éter o direito de contestar o pedido de insolvência. Não poderá a requerida/insolvente ver atribuído um direito que está extinto, ainda que por força de uma nova citação ordenada judicialmente e efectuada por Agente de Execução. Não podemos deixa de declarar que o direito que a requerida/insolvente tinha para contestar o pedido já havia precludido aquando da efectivação da citação ocorrida a 06.01.2025. O direito processual de contestar a presente acção precludiu, e deste modo consolidou-se a situação de revelia que determina a confissão ficta dos factos alegados pelos requerentes e a imediata passagem do processo (seus termos) à fase de sentença, tal como foi feito nos autos – artigos 29.º e 30.º do CIRE, com especial relevo o n.º 5 desta norma legal (Se a audiência do devedor não tiver sido dispensada nos termos do artigo 12.º e o devedor não deduzir oposição, consideram-se confessados os factos alegados na petição inicial, e a insolvência é declarada no dia útil seguinte ao termo do prazo referido no n.º 1, se tais factos preencherem a hipótese de alguma das alíneas do n.º 1 do artigo 20.º). Por todo o exposto, soçobra a pretensão da apelante. *** * III DECISÃO Pelo exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação do Porto, em julgar improcedente a apelação, confirmando-se a decisão recorrida. Custas pela apelante (confrontar artigo 527.º do Código de Processo Civil). * Sumário nos termos do artigo 663.º, n.º 7 do Código de Processo Civil. ……………………………… ……………………………… ……………………………… * Alberto Taveira Maria da Luz Seabra Artur Dionísio Oliveira _______________ [1] O relator escreve de acordo com a “antiga ortografia”, sendo que as partes em itálico são transcrições cuja opção pela “antiga ortografia” ou pelo “Acordo Ortográfico” depende da respectiva autoria. |