Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
4180/18.0T8VNG.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: RITA ROMEIRA
Descritores: ACIDENTE DE TRABALHO
AGRAVAMENTO DA RESPONSABILIDADE
NEXO DE CAUSALIDADE
Nº do Documento: RP202002034180/18.0T8VNG.P1
Data do Acordão: 02/03/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: RECURSO NÃO ADMITIDO
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL)
Área Temática: .
Sumário: I - A apensação de acções não afasta a autonomia de cada um dos pedidos, apesar de juntas, mantêm a sua autonomia possibilitando-se, apenas, a instrução e o julgamento conjuntos, com vista à economia processual e em ordem a evitar contradições entre julgados, permanecendo a utilidade económica do pedido de cada acção e, consequente, sucumbência, não se alterando o valor do processo principal.
II - Assim, o valor de €30,000,01 fixado a cada uma das causas, atento o disposto no art. 629º do CPC, não basta para que seja admissível recurso ordinário, sendo necessário, também, que a decisão impugnada seja desfavorável ao recorrente em valor superior a metade da alçada do tribunal de que se recorre.
III - Logo, sendo o valor em que a Ré foi condenada a pagar, individualmente às AA. de cada uma das acções apensadas, inferior a metade de €5.000,00 e sendo esse o valor que tem de ser atendido para efeitos de alçada do Tribunal, de que se recorre, o recurso daquela não é admissível, por falta do segundo requisito enunciado naquele art. 629º, supra referido.
IV - Nos termos do art. 44º, da Lei nº 62/2013, de 26.08, em matéria cível, a alçada dos tribunais da Relação é de €30.000 e a dos tribunais de 1ª instância é de €5.000.
V - Sendo, o pedido de declaração de aplicabilidade de determinados instrumentos de regulamentação colectiva do trabalho, mero pressuposto dos pedidos com incidência pecuniária, nomeadamente, diferenças salariais, aquele pedido não pode ser valorado autonomamente, considerando-o como relativo a interesse imaterial, sempre com recurso assegurado até ao Supremo Tribunal de Justiça.
VI - Nem pode, a questão de se discutir qual o regime jurídico aplicável em cada litígio, seja esse regime de natureza legal ou de natureza convencional, ser valorada, autonomamente, para incrementar o valor das acções para efeito de alçadas.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Proc. Nº 4180/18.0T8VNG.P1
Origem: Tribunal Judicial da Comarca do Porto, V. N. Gaia – Juízo Trabalho – Juiz 1
Recorrente: B…, SA
Recorridas: C…, D… e E….
Acordam, nesta secção do Tribunal da Relação do Porto
I - RELATÓRIO
As AA., C…, (neste processo), D… (no apenso A) e E… (no apenso B), intentaram acção emergente de contrato de trabalho contra B…, SA, todas pedindo a condenação da Ré a:
a) - Reconhecer e reclassificá-las, respectivamente, na categoria profissional de assistente de consultório II, nível 4, assistente administrativa III e assistente de consultório II, nível 4;
b) - Pagar, a cada uma, a quantia global de 1.188,00€, a título de diferenças verificadas nas cinco diuturnidades já vencidas;
c) - Pagar mensalmente, a cada uma, a quantia de 18,60€, a título de cada uma das cinco diuturnidades vincendas.
Valor: 1.188,00 euros
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A Ré contestou, cada uma das acções (neste processo e no apenso A, a fls. 39 e ss., no apenso B a fls. 32 e ss.), alegando que procedeu à reclassificação profissional de cada uma das Autora, em Junho de 2018, para a categoria peticionada, termina que deve a acção ser totalmente improcedente, por não provada e, em todas, requer que:
“a) Seja declarada a não isenção de pagamento de custas da Autora, por ausência do pressuposto previsto no art. 44º, nº 2, alínea b), do Código do Trabalho e 5º, nº 2 do Código do Processo de Trabalho.
b) Seja corrigido o valor da causa para os 30.000,01€, nos termos e para os efeitos do disposto nos art.s 306º, 308º e 310º do Código Processo Civil (ex vi art. 1º, nº 2, a) do Código de Processo de Trabalho).
c) Seja interpretada a Cláusula 49ª do CCT outorgado pela FNS com a FETESE, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego nº 29, de 08/08/2016 e, em consequência, se declare que à Autora e aos trabalhadores da Ré em igualdade de circunstâncias não é aplicável o disposto na referida Cláusula e, em consequência, ser a Ré absolvida do peticionado nas alíneas b) e c) do petitório.
E, em consequência,
d) Seja admitido recurso de Revista dos presentes autos, até ao Supremo Tribunal de Justiça, nos termos e para os efeitos do disposto no art. 185º do CPT, em virtude desta se tratar de acção atinente à Interpretação de Cláusula de Convenção Colectiva de Trabalho (no caso a Cls.ª 49.ª do CCT da FNS).
e) Sejam apensos aos presentes autos os processos interpostos pelas trabalhadoras..., aqui, agora, também, AA.;
f) Seja declarada totalmente improcedente, por não provada, a presente acção e, em consequência, ser a Ré absolvida, condenando-se a A. em custas judiciais e o mais legal.
g) Seja a Autora condenada no pagamento da quantia de 500,00€, a título de multa e indemnização por abuso de direito;
h) Seja a Autora condenada como litigante de má fé e, em consequência, condenada a pagar à Ré uma multa, no valor de 600,00€ e uma indemnização, de montante nunca inferior a 4.000,00€, sendo 1.500,00€ correspondentes aos honorários dos subscritores e 345,00€ de IVA sobre aquele valor, calculado à taxa legal de 23%.
Valor: €30.000,01.”.
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As AA. responderam (neste processo a fls. 139 e ss., no apenso A, a fls. 135 e ss., no apenso B a fls. 132 e ss.), todas refutando o alegado e peticionado pela Ré e terminando como na petição inicial.
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Após as diligências tidas por necessárias, nos termos que constam do despacho de fls. 203, foi deferida a requerida apensação das três acções.
De seguida, nos termos que constam a fls. 294, o Tribunal “a quo”, fixou a cada uma das acções o valor de €30.000,01, com o argumento de que “nas três acções, as Autoras pretendem que a Ré seja condenada a pagar-lhes não só as diferenças relativas às diuturnidades já vencidas, no montante de 1.188,00, como também todas as que se vencerem no futuro, à razão mensal unitária de 18,60€” e proferiu despacho saneador.
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Realizada a audiência de julgamento, foi proferida sentença que terminou com o seguinte dispositivo: “Nestes termos e com tais fundamentos, julgo a presente acção procedente, por provada e, em consequência:
- Julgo extinto, por inutilidade superveniente da lide, o pedido formulado pelas Autoras relativo à reclassificação profissional das mesmas;
- Condeno a Ré a pagar a cada uma das Autoras a quantia global já vencida de 1.656,00€, a título de diferenças no pagamento das diuturnidades relativas ao período compreendido entre Janeiro de 2016 e Abril de 2019;
- Condeno a Ré a pagar a cada uma das Autoras a quantia mensal global de (18,60€ x 5) 93,00€, a título de diuturnidades vincendas.
Custas pela Ré.”.
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Inconformada a R. veio interpor recurso, nos termos das alegações juntas, a fls. 224 e ss., que terminou com as seguintes CONCLUSÕES:
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NESTES TERMOS E NOS MELHORES DE DIREITO APLICÁVEIS, QUE V. EXAS. DOUTAMENTE SUPRIRÃO, DEVE SER DADO PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO E, POR VIA DISSO, SER ALTERADA A, ALIÁS, DOUTA DECISÃO RECORRIDA, SUBSTITUINDO-A POR OUTRA QUE CONTEMPLE AS CONCLUSÕES ATRÁS ADUZIDAS, ABSOLVENDO-SE A RÉ DOS PEDIDOS CONTRA SI FORMULADOS.
ASSIM SE FAZENDO A SÃ E COSTUMEIRA JUSTIÇA!”
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As recorridas contra - alegaram, terminando com as seguintes Conclusões:
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Assim, entende-se que a douta sentença recorrida é justa e faz correcta interpretação e aplicação dos preceitos legais, pelo que deve ser mantida “In Totum”, com o que se fará a habitual JUSTIÇA!”
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O Tribunal “a quo” admitiu o recurso como apelação, com efeito suspensivo (dada a prestação de caução pela recorrente, no montante indicado pela mesma e sem oposição das recorridas, de 3.500,00€) e ordenou a subida dos autos a este Tribunal da Relação.
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Nesta Relação, o Ex.mo Sr. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer, nos termos do nº 3, do art. 87º do CPT, no sentido de que deverá ser julgado improcedente o recurso.
Notificadas deste parecer, as AA./recorridas vieram compartilhar da opinião expressa naquele e a R./recorrente não ofereceu resposta.
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Após, nos termos do despacho junto a fls. 300 e atento o disposto nos art.s 652º, nº 1, al. b) e 655º, nº 1, ambos do CPC, foram as partes notificadas para se pronunciarem, querendo, sobre a possibilidade de não se conhecer do recurso.
A este, respondeu a R./recorrente, nos termos do requerimento junto a fls. 306 a 322, expondo e requerendo o seguinte que se transcreve, em síntese:
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Tudo compulsado,
68.º Inexiste qualquer fundamento para que não seja admitido o recurso apresentado pela Recorrente.
69.º Devendo o douto Tribunal admitir o recurso apresentado.
Nestes termos e nos melhores de Direito que V. Exa. mui doutamente suprirá, deve ser admitido o presente Recurso e, em consequência, ser revogada a Sentença sob recurso.”.
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Notificada, a parte contrária, nada disse.
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Dado cumprimento ao disposto no art. 657º, nº 2 do CPC, há que apreciar e decidir.
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Previamente
- A questão de saber se o recurso interposto é admissível?
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II – FUNDAMENTAÇÃO
Os factos a ter em consideração são os que constam do relatório que antecede.
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A questão a apreciar, já foi suscitada no despacho, de 10 de Dezembro de 2019, onde se considerou o seguinte:
“O Tribunal “a quo” admitiu o recurso interposto, pela ré na presente acção, da sentença proferida nos autos.
No entanto, como é sabido o despacho que admita o recurso não vincula este Tribunal “ad quem”, havendo que se proceder neste à reponderação dos fundamentos invocados, afim de, confirmar ou infirmar aquele despacho de admissão.
Analisados os autos, verifica-se que estamos perante uma situação de apensações de acções, a respeito das quais dispõe o art. 267º do actual CPC (correspondente ao art. 275º do CPC 1961), precisamente sob a epígrafe “Apensação de acções”, que:
“1 - Se forem propostas separadamente ações que, por se verificarem os pressupostos de admissibilidade do litisconsórcio, da coligação, da oposição ou da reconvenção, pudessem ser reunidas num único processo, é ordenada a junção delas, a requerimento de qualquer das partes com interesse atendível na junção, ainda que pendam em tribunais diferentes, a não ser que o estado do processo ou outra razão especial torne inconveniente a apensação.
(...).”.
Ora, a apensação desta acção, por se verificarem os pressupostos da coligação, às demais, não lhes retira a autonomia e não tem incidência no que respeita ao valor da mesma, tal como na coligação activa, em que cada um dos autores tem um interesse próprio e independente dos demais autores, apesar da identidade da causa de pedir (art. 36° do Código de Processo Civil).
Quando assim é, o Supremo Tribunal de Justiça tem decidido uniformemente que havendo coligação “o valor atendível, para efeitos de recurso, não corresponde ao valor da causa mas, antes e tão-somente, ao valor dos pedidos deduzidos individualmente por cada um dos coligantes” – (acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 22.03.2007 proferido no processo 07S274 in www.dgsi.pt), e no mesmo sítio, veja-se também, (os acórdãos do mesmo Tribunal de 18.02.2016, processo 558/12.1TTCBR.C1.S1, de 01.09.2016, processo 2653/13.0TTLSB.L1.S1), onde se lê “...para aferição dos requisitos de recorribilidade, há que atender ao valor de cada um dos pedidos e não à sua soma”.
E - como é o caso – ainda do mesmo Tribunal no (acórdão de 13.11.2002, processo: 02S2772) decidiu-se: “Quer no caso de apensação de acções, quer no caso de coligação activa voluntária, o valor da causa a atender para efeitos de alçada é o de cada uma das acções apensadas ou coligadas pelos diversos autores, e não a soma dos valores dessas individualizadas pretensões”.
No mesmo sentido, já (A. dos Reis, in Comentário ao Código de Processo Civil, 3º, pág. 220) ensinava que “A simples apensação de acções não opera a sua integração numa única, mantendo cada uma delas a sua individualidade própria, uma vez qua a apensação é ditada por razões de economia processual e, acima de tudo, em ordem a evitar contradições”.
Analisando, a presente acção não se integra em nenhuma das situações previstas nas várias alíneas do artigo 79° do Código de Processo de Trabalho. Pois, pese embora, tal pudesse pensar-se do pedido, formulado pelas AA. na al. a), do seu petitório, este pedido tornou-se inócuo, sendo a instância, quanto a ele, julgada extinta, por inutilidade superveniente da lide, dado a Ré ter, antes de apresentada a contestação, em Junho de 2018, ainda que, depois de instaurada a acção, procedido à reclassificação profissional de cada uma das AA., nos termos por elas pretendidos.
Assim, ter-se-á de aplicar ao caso, para efeitos de apreciação sobre a admissibilidade do presente recurso, o disposto no art. 629° do Código de Processo Civil.
Dispõe este artigo, no seu n°1, que “O recurso ordinário só é admissível quando a causa tenha valor superior à alçada do tribunal de que se recorre e a decisão impugnada seja desfavorável ao recorrente em valor superior a metade da alçada desse tribunal, atendendo-se, em caso de fundada dúvida acerca do valor da sucumbência, somente ao valor da causa.
No seguimento do exposto, verifica-se que, pese embora, à causa tenha sido fixado valor superior à alçada do Tribunal de que se recorre, (cujo valor da alçada é €5.000,00) apreciando os pedidos individualmente deduzidos pelas autoras e o valor que a recorrente foi condenada a pagar a cada uma delas, “a quantia global já vencida de 1.656,00€”, verifica-se que, nem cada um dos pedidos, individualmente, formulado, nem o valor que a ré foi condenada a pagar, a cada uma, lhe é desfavorável em valor superior a metade da alçada do Tribunal recorrido, ou seja, não ultrapassam nem atingem o valor de (€2.500,00).
Isto dito:
A potencialidade de alguma circunstância impeditiva de conhecimento, no todo ou em parte, do objecto do recurso, manda que, precedentemente a uma qualquer decisão, as partes tenham a possibilidade de se pronunciar, em 10 dias, cfr. art.s 652º, nº 1, al. b) e 655º, nº1, ambos do referido C. P. Civil.
Notifiquem-se, então, nessa conformidade.”.
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Atento o entendimento expresso no despacho que antecede, com o qual concordamos na íntegra, há que dizer, desde já, sempre com o devido respeito por diferente opinião, que não é admissível o recurso interposto pela Ré da sentença recorrida que a condenou a pagar, a cada uma das AA., a quantia global, já vencida, de €1.656,00, não bastando para que tal aconteça, o facto de ter sido fixado, a cada uma das acções apensadas, o valor de €30.000,01, o qual ultrapassa o valor da alçada do Tribunal “a quo”, nem pelo facto de ser aplicável aos presentes autos o regime preceituado nos art.s 183º a 186º do CPT, como considera a recorrente.
O recurso não é admissível, não só, porque nenhum dos argumentos invocados pela recorrente, na resposta àquele procede mas, também, porque não têm eles a virtualidade de infirmar, como já havíamos referido naquele despacho, que não estamos perante acção que se integre nas situações que, em processo laboral, “independentemente do valor da causa e da sucumbência”, admitem sempre recurso para a Relação, conforme dispõe o art. 79º, do CPT que, na parte inicial, remete para as regras gerais, aplicáveis nos casos não enumerados, taxativamente, no mesmo.
Assim, como regra geral, temos que: “O recurso ordinário só é admissível quando a causa tenha valor superior à alçada do tribunal de que se recorre e a decisão impugnada seja desfavorável ao recorrente em valor superior a metade da alçada desse tribunal; atendendo-se, em caso de fundada dúvida acerca do valor da sucumbência, somente ao valor da causa.”, conforme dispõe o art. 629º, nº 1 do CPC.
Sobre o valor das “Alçadas” dispõe a Lei nº 62/2013, de 26.8, no seu art. 44º, que: “Em matéria cível, a alçada dos tribunais da Relação é de € 30 000 e a dos tribunais de 1ª instância é de €5000.”.
Justificando.
Desde logo, o facto do valor de cada uma das acções, apensadas, ser de €30.000,01, não basta para que se admita o recurso interposto para esta Relação. Pois, ao contrário do que considera a recorrente, não estamos perante um caso em que seja de atender, apenas, ao valor da acção. Na situação, não se suscita qualquer dúvida acerca do valor da sucumbência, o qual, em nenhuma das acções é desfavorável à recorrente em valor superior a metade da alçada do Tribunal recorrido. Basta atentarmos no enunciado no art. 297º, do CPC, que sob a epígrafe, “critérios gerais para a fixação do valor”, em concreto, no seu nº 2, dispõe que, quando na mesma acção se cumulam vários pedidos atende-se, somente, aos interesses já vencidos, para sabermos qual o valor da sucumbência.
A este propósito, veja-se o que ficou sumariado no (Ac.STJ de 14-01-2009, Recurso n.º 2469/08-4.ª Secção, relator (Pinto Hespanhol) disponível in www.dgsi.pt (local da internet a que pertencem os demais referidos, sem outra indicação)), onde se lê: “III - Pedindo-se, na acção, quantias certas em dinheiro, expressas em moeda legal, que representam a utilidade económica imediata do pedido, é esse o valor da causa, segundo o critério geral consagrado nos artigos 305.º, n.º 1, e 306.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, não tendo influência na fixação do valor da causa «as quantias que terá, efectivamente, de pagar no futuro», tal como não têm qualquer influência na fixação do valor da causa as retribuições e juros vincendos (artigo 306.º, n.º 2, do Código de Processo Civil)”.
E, sendo desse modo, verifica-se que, em cada uma das acções, o valor da sucumbência é inferior ao referido no nº1, daquele art. 629º, nada se alterando por se tratar de apensação de acções.
Pois, como se lê, no (Ac. do TRC de 27.02.2007, Proc. nº 819/05.6TBOHP.C1) “I – A noção de apensação de acções sugere que as mesmas, apesar de juntas, mantêm a sua autonomia, propiciando-se apenas a instrução e o julgamento conjuntos, com vista à economia processual e em ordem a evitar contradições entre julgados.
II – Assim, não haverá que adicionar os pedidos e transformar as duas acções numa só, eventualmente sob forma de processo mais solene, isto é, permanece a utilidade económica do pedido de cada acção e não se altera o valor do processo principal.”
Foi com fundamento no valor do pedido e, consequente, valor em que a R. foi condenada a pagar a cada uma das AA. e por não se integrar a presente acção em nenhuma das situações previstas no referido art. 79º, do CPT que, foi proferido o despacho de 10.12.2019, notificando sobre a possibilidade de não se conhecer do recurso o que, agora, se confirma, atenta a jurisprudência unânime do Supremo Tribunal de Justiça proferida a este respeito.
Assim, pese embora, se verificar o afirmado pela recorrente quanto ao valor de cada acção fixado em (€30.000,01), atento o que decorre daquele art. 629º, do CPC, aplicável ao caso e o nosso entendimento, no sentido do dominante na jurisprudência do STJ, que em situações de apensação de acções, tal como nos casos de coligação activa (voluntária) manda atender, para efeitos de recurso, ao valor correspondente a cada pedido, bem como à respectiva sucumbência, relativamente a cada uma das acções, não determinando a apensação, para efeitos de recurso, a perda da individualidade de cada um dos pedidos formulados pelas AA. e, consequentemente, da individualidade da sucumbência da recorrente, porque nenhum deles é superior ou atinge metade do valor da alçada do Tribunal de 1ª instância, isso implica a inadmissibilidade do recurso da recorrente para este Tribunal da Relação.
No reforço do nosso entendimento, veja-se o decidido, no (Ac. STJ de 01.09.2016,), onde se refere: “Tem sido jurisprudência uniforme deste Tribunal que, para aferição dos requisitos de recorribilidade, há que atender ao valor de cada um dos pedidos e não à sua soma (cfr. neste sentido os acórdãos desta Seção Social de 18.02.2016, proc. nº 558/12.1TTCBR.C1.S1, de 20 de Fevereiro de 2002, proc. nº 3899/01, de 30 de Junho de 2004, proc. nº 609/04, de 13 de Julho de 2004, proc. nº 1501/04, de 11 de Maio de 2005, proc. nº 362/05 e de 6 de Dezembro de 2006, proc. nº 3215/06), sendo que, no caso de coligação ativa voluntária a “cumulação não determina a perda da individualidade de cada uma das respectivas acções, não obstante se encontrarem inseridas no mesmo processo”, pelo que “os recursos das decisões (ou da decisão final) só serão admissíveis se e na medida em que os mesmos fossem admissíveis se processados em separado” (acórdão desta 4ª secção de 2.02.2005, processo 4563/04).”.
Nesse mesmo sentido vejam-se, ainda, os seguintes sumários de acórdãos do mesmo Tribunal:
- No (Ac.STJ de 24-09-2008): “II - A coligação não afasta a autonomia de cada um dos pedidos, sucedendo apenas que os demandantes se juntam para fazer valer a sua própria pretensão no mesmo processo, prosseguindo objectivo idêntico àquele que seria alcançado pela apensação de acções, que constitui uma realidade processual substancialmente idêntica.
III - Nestes casos, o valor atendível para efeitos de recurso não corresponde ao valor da causa, mas antes ao valor dos pedidos deduzidos individualmente por cada um dos autores/coligantes.”
- No (Ac.STJ de 13.11.2002): “I - Quer no caso de apensação de acções, quer no caso de coligação activa voluntária, o valor da causa a atender para efeitos de alçada é o de cada uma das acções apensadas ou coligadas pelos diversos autores, e não a soma dos valores dessas individualizadas pretensões.”.
E, por último no (Ac.STJ de 10.12.2008), onde se lê: “1. Na coligação activa, o valor a atender, para efeitos de admissibilidade do recurso, não é o valor da causa, que resulta da soma dos valores dos pedidos formulados por cada um dos autores, mas sim o valor do pedido formulado por cada um deles, individualmente considerado.
2. Assim, ainda que o valor da causa exceda a alçada da Relação, a decisão desta não será susceptível de recurso se revista, se o valor do pedido de cada um dos autores não for superior à alçada daquele tribunal.
3. Correspondendo o valor da causa à soma das quantias pecuniárias certas peticionadas por cada um dos autores, o valor do pedido de cada autor, a levar em conta para efeitos de recurso, será o valor da quantia certa por cada um deles peticionada, ainda que tenham pedido a ilicitude do despedimento e o pagamento das retribuições vincendas.”.
Decorre do que antecede, que em caso de apensação de acções, apesar de juntas, as mesmas mantêm a sua autonomia, mantêm-se distintos os pedidos deduzidos pelos vários autores em cada uma das acções e permanece a utilidade económica do pedido, de cada um deles, apenas, se possibilitando com a apensação o julgamento conjunto de acções, com vista à economia processual e, essencialmente, em ordem a evitar contradições entre julgados.
A este propósito o (Prof. Alberto Reis in Comentário ao Código de Processo Civil, 3º vol., pág 220) refere que, “a simples apensação de acções não opera a sua integração numa única, mantendo cada uma delas a sua individualidade própria, uma vez que a apensação é ditada por razões de economia processual e, acima de tudo, em ordem contradições”.
Resulta do exposto que, sendo o valor que a Ré foi condenada a pagar, individualmente às AA./recorridas, é inferior a metade de €5.000,00 e sendo esse o valor que tem de ser atendido para efeitos de alçada do Tribunal, de que se recorre, o recurso daquela não é admissível, por falta do segundo requisito enunciado naquele art. 629º, supra referido.
E, também, não é admissível porque, ao contrário do que alega a recorrente, não podemos concordar que estejamos perante qualquer direito imaterial ou de cálculo indeterminável. Pois, como bem se decidiu no (Ac. do STJ, de 13.11.2002, Proc. nº 02S2772, já supra referido), “a circunstância de se discutir qual o regime jurídico aplicável em cada litígio, seja esse regime de natureza legal ou de natureza convencional, não transforma o respectivo processo em causa sobre interesses imateriais, sempre com recurso assegurado até ao Supremo Tribunal de Justiça”.
Acrescendo, contrariamente ao alegado pela recorrente, que a questão “real e nuclear que cumpria aferir nestes autos”, não era a interpretação de uma cláusula do CCT aplicável. Basta atentar no pedido formulado pelas AA. e no que foi decidido para se verificar que a pronúncia efectuada sobre o pedido de declaração e aplicabilidade da convenção colectiva, em causa, constituiu mero pressuposto dos pedidos pecuniários formulados decorrentes de, alegadas diferenças salariais, não se estando, no caso, perante um pedido de declaração de aplicabilidade daquele instrumento de regulamentação colectiva “erga omnes”. Ou seja, a sua aplicabilidade, apenas, foi suscitada como fundamento dos referidos pedidos pecuniários, não estando em causa a fixação do sentido daquela cláusula, mas sim a regulação da concreta situação de cada uma das AA. Não podendo, assim, a questão suscitada ser valorada, autonomamente, para incrementar o valor das acções para efeito de alçadas.
Por último, também, não é de aplicar ao caso o preceituado nos art.s 183º a 186º, do CPT, como considera a recorrente, alegadamente por estarmos perante situações materialmente iguais. Porque, é manifesto que tal não acontece.
Como se refere no recente (Ac. do TRL de 10.04.2019, Proc. nº 756/18.4T8LSB-4), “A acção para anulação e interpretação de cláusulas de convenções colectivas de trabalho tem por objectivo, respectivamente, a apreciação de contradição material do conteúdo das convenções colectivas e a fixação do sentido das suas cláusulas.”.
Ora, sendo deste modo, sempre com o devido respeito, atenta a pretensão deduzida pelas AA. nas acções, em causa, não se vê que esteja em causa, como já dissemos, a interpretação daquela, concreta, cláusula 49ª da convenção colectiva de modo a fixar o sentido desta.
Aliás, basta atentar na sistemática do Código de Processo de Trabalho no que se reporta às espécies de acções, sujeitas a distribuição, dispondo o art.21º:
“1.º Na distribuição há as seguintes espécies:
1.ª Ações de processo comum;
(…).
12.ª Outros processos especiais previstos neste Código;
(…).”.
A presente acção, pela natureza da causa de pedir e do pedido, é uma “acção de processo comum” e não a especial “acção de anulação e interpretação de cláusulas de convenções colectivas de trabalho”, prevista nos art.s 183º a 186º do CPT, com regime e tramitação próprios, incluindo para efeitos de recurso.
Improcedem, assim, totalmente os argumentos invocados pela recorrente, em defesa da admissibilidade do recurso.
E, face ao que se deixou dito, sem necessidade de outras considerações, só resta concluir, atentos os fundamentos invocados e como já havíamos deixado antever, no despacho anterior, que estamos perante circunstância que impede o conhecimento do recurso por, o mesmo, não ser admissível, dado o valor individual que a Ré foi condenada a pagar a cada uma das AA., não lhe ser desfavorável em valor superior a metade da alçada do tribunal recorrido, sendo que, o despacho proferido no Tribunal “a quo” que procedeu à sua admissão, não vincula este Tribunal “ad quem”, cfr. dispõe o nº 5, do art. 641º, do CPC.
Por fim, diga-se, que não se vislumbra a violação de qualquer dispositivo convencional ou legal, nomeadamente, o disposto no nº 2 do art. 300º, do CPC.
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III – DECISÃO
Pelo exposto, acordam os Juízes desta secção do Tribunal da Relação do Porto, em não tomar conhecimento do objecto do recurso interposto pela Ré, por o mesmo não ser admissível.

Custas pela recorrente.
Notifique.

Porto, 3 de Fevereiro de 2020
Rita Romeira
Teresa Sá Lopes
Domingos Morais