Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
2483/09.4TBAMT.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: MANUEL DOMINGOS FERNANDES
Descritores: ACESSÃO INDUSTRIAL IMOBILIÁRIA
ACESSÃO INVERTIDA
BOA-FÉ
Nº do Documento: RP201609122483/09.4TBAMT.P1
Data do Acordão: 09/12/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: ALTERADA
Indicações Eventuais: 5ª SECÇÃO, (LIVRO DE REGISTOS N.º 631, FLS. 84-103)
Área Temática: .
Sumário: I - Na reapreciação da prova a Relação goza da mesma amplitude de poderes da 1.ª instância e, tendo como desiderato garantir um segundo grau de jurisdição relativamente à matéria de facto impugnada, deve formar a sua própria convicção.
II - A acessão verifica-se sempre que com a coisa que é propriedade de alguém se une ou incorpora outra coisa que não lhe pertencia (art. 1325.º do CC), constituindo uma das formas de aquisição originária do direito de propriedade, reportando-se a aquisição do direito ao momento da verificação dos respectivos factos (art. 1317.º do CC), i.e., ao momento da união ou da incorporação.
III - Tal união ou incorporação há-de traduzir-se numa ligação das duas coisas, definitiva e permanente, de tal modo que seja impossível a sua separação sem alterar a própria substância da coisa que, assim, terá de formar uma unidade económica distinta da anteriormente existente.
IV - Na hipótese do art. 1340.º do CC, trata-se de construção ou obra em terreno alheio, enquanto na prevista no art. 1343. do CC, a construção tem de ser efectuada em terreno do construtor, prolongando-se, porém, em terreno alheio. Neste último caso, é essencial que a construção ocupe os dois terrenos.
V - A previsão do art. 1343.º do CC apenas se aplica quando fique provado que a maior parte da construção tenha sido implantada em terreno próprio do incorporante e só uma pequena parte da construção ocupe o terreno alheio. De contrário, cai-se na previsão geral do art. 1340.º do CC.
VI - O conceito de boa fé exigida pelo n.° 1 do art. 1340.° do Código Civil não se limita às duas situações descritas no n.° 4 do mesmo artigo.
VII - A expressão “entende-se” constante deste preceito quer dizer que, nesses duas situações, presume-se a boa fé do autor da incorporação, mas não exclui nem impede que se possa estender o conceito de boa fé a outras situações compreendidas na definição dada pelo n.° 1 do art. 1260.° do Código Civil, comprovativas de que o autor da incorporação ignorava, no momento da execução das obras em prédio alheio, que lesava o direito de terceiro.
VIII- Nos casos em estatuídos no artigo 1343.º a aquisição a que tem direito o construtor, não depende da consideração de qualquer valor acrescentado.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº 2483/09.4TBAMT.P1-Apelação
Origem: Comarca do Porto Este-Amarante-Inst. Local-Secção Cível-J1

Relator: Manuel Fernandes
1º Adjunto Des. Miguel Baldaia
2º Adjunto Des. Jorge Seabra

Sumário:
I- Na reapreciação da prova a Relação goza da mesma amplitude de poderes da 1.ª instância e, tendo como desiderato garantir um segundo grau de jurisdição relativamente à matéria de facto impugnada, deve formar a sua própria convicção.
II- A acessão verifica-se sempre que com a coisa que é propriedade de alguém se une ou incorpora outra coisa que não lhe pertencia (art. 1325.º do CC), constituindo uma das formas de aquisição originária do direito de propriedade, reportando-se a aquisição do direito ao momento da verificação dos respectivos factos (art. 1317.º do CC), i.e., ao momento da união ou da incorporação.
III- Tal união ou incorporação há-de traduzir-se numa ligação das duas coisas, definitiva e permanente, de tal modo que seja impossível a sua separação sem alterar a própria substância da coisa que, assim, terá de formar uma unidade económica distinta da anteriormente existente.
IV- Na hipótese do art. 1340.º do CC, trata-se de construção ou obra em terreno alheio, enquanto na prevista no art. 1343. do CC, a construção tem de ser efectuada em terreno do construtor, prolongando-se, porém, em terreno alheio. Neste último caso, é essencial que a construção ocupe os dois terrenos.
V- A previsão do art. 1343.º do CC apenas se aplica quando fique provado que a maior parte da construção tenha sido implantada em terreno próprio do incorporante e só uma pequena parte da construção ocupe o terreno alheio. De contrário, cai-se na previsão geral do art. 1340.º do CC.
VI- O conceito de boa fé exigida pelo n.° 1 do art. 1340.° do Código Civil não se limita às duas situações descritas no n.° 4 do mesmo artigo.
VII - A expressão “entende-se” constante deste preceito quer dizer que, nesses duas situações, presume-se a boa fé do autor da incorporação, mas não exclui nem impede que se possa estender o conceito de boa fé a outras situações compreendidas na definição dada pelo n.° 1 do art. 1260.° do Código Civil, comprovativas de que o autor da incorporação ignorava, no momento da execução das obras em prédio alheio, que lesava o direito de terceiro.
VIII- Nos casos em estatuídos no artigo 1343.º a aquisição a que tem direito o construtor, não depende da consideração de qualquer valor acrescentado.
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I-RELATÓRIO
Acordam no Tribunal da Relação do Porto:
B…, C… e D…, intentaram a presente acção sumária contra a então Freguesia de …, peticionando que;
a) Seja reconhecido que os autores e seu pai, em comum e sem determinação de parte ou direito são donos do prédio identificado no art. 5.º da petição;
b) Seja reconhecido que desse prédio faz parte uma parcela de terreno com a área aproximada de 1.000 m2;
c) Seja declarada a nulidade da doação da parcela de terreno feita pelo pai dos autores à ré;
d) Se condene a ré a restituir a parcela de terreno, ou se tal não for possível, a pagar o respectivo valor em execução de sentença.
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Para o efeito, alegram em síntese que:
- São filhos de E… e de F…, que foram casados em comunhão geral.
- A mãe dos autores faleceu em 19 de Janeiro de 2009, no estado de casada com o pai dos autores, no regime da comunhão geral, sem testamento ou doação por morte.
- Entretanto, por morte da mãe dos autores, sucederam-lhe como herdeiros os autores e o seu pai, não se tendo procedido a partilha ou inventário.
- Da herança faz parte o prédio rústico denominado “I…”, inscrito na matriz sob o artigo 415 e descrito sob o n.º 516–….
- O pai dos autores, ainda em vida da mãe dos autores, a pedido do Presidente da Junta de Freguesia de …, doou à ré Freguesia de …, uma parcela do prédio, doação feita à revelia da esposa, sem o seu conhecimento e consentimento e sobretudo, sem ter sido observada a forma de escritura pública.
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Citada a ré, a mesma contestou e reconveio, aduzindo que, em resultado do acordo que foi ajustado entre a ré e o pai dos autores, a ré ocupou a parcela, com a área de 978 m2, onde executou obras de ampliação do cemitério e de construção da casa mortuária, com valor superior a € 100.000 euros, tendo a ré adquirido a propriedade da parcela pelo instituto da acessão industrial imobiliária.
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Foi requerida e admitida a intervenção principal do pai dos autores, F…, o qual, faleceu em 23 de Maio de 2012, no estado de viúvo, sem fazer testamento ou doação por morte, tendo sido declarado habilitados como únicos herdeiros, a fls. 162, os seus 3 filhos, ora autores.
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Foi realizada audiência preliminar, tendo sido lavrado despacho-saneador a fls. 88.
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Teve lugar a realização de perícia de avaliação, cujo relatório consta a fls. 124.
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Procedeu-se a julgamento, com observância do legal formalismo.
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A final foi proferida sentença que:
a)- julgando parcialmente procedente a acção:
1- Reconheçeu que os autores, em comum e sem determinação de parte ou direito, são donos do prédio identificado no art. 5.º da petição;
2- Reconheçeu que desse prédio faz parte uma parcela de terreno com a área aproximada de 1.000 m2;
b)- julgando inteiramente procedente a reconvenção declarou que a ré adquiriu por acessão industrial imobiliária uma parcela de terreno com a área de 978 m2, desanexada do prédio referido no art. 5.º da petição, que confronta com a parte restante do prédio, com a parte restante do cemitério paroquial e Igreja de …, pagando aos Aurores a quantia de € 2.445 euros correspondente ao valor da parcela.
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Não se conformando com o assim decidido vieram os Autores interpor o presente recurso concluindo as suas alegações pela forma seguinte:
1. Pretendem os Recorrentes, tal como anunciaram no requerimento de interposição de recurso, impugnar a decisão sobre alguns pontos da matéria de facto, pelo que, como lhe impõe o art.º 640.º do Código de Processo Civil (CPC) alíneas a), b) e c) indicam i) os concretos pontos de facto que consideram incorrectamente julgados ii) os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação da prova nele realizada que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida iii) a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2. Os Recorrentes entendem que os factos elencados na sentença e vertidos nos números 12, 18, 19, 25, 28, 31 e 38 e considerados provados, estão, em parte, incorrectamente julgados.
3. E os factos 4, 6, 7 e 9 da BI, considerados como não provados deveriam ter sido dados como provados.
4. Cumprindo o que lhe é imposto pelo artigo 640.º do CPC, os Recorrentes indicam os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação da prova realizada na audiência de julgamento que impunham decisão, sobre os pontos da matéria de facto, diversa da que consta na sentença recorrida. De seguida, indicam a decisão que, no seu entender, deve ser proferida por este Alto Tribunal sobre as questões de facto impugnadas.
5. Esses meios de prova, cuja reapreciação se pretende que seja feita nesta instância, são os depoimentos do Recorrente D…, da Recorrente B…, da Recorrente C…, da testemunha G…, da testemunha H…, em relação aos quais se assinalou as passagens da gravação que se pretendem ver reapreciadas.
6. Para além dos depoimentos, devem ser reapreciados o relatório pericial e os esclarecimentos prestados pelo perito em audiência e julgamento, bem como a minuta de doação e a certidão da sentença de interdição da mãe dos Recorrentes.
7. Da apreciação crítica destes depoimentos, dos documentos indicados, do confronto entre todos esses elementos probatórios, entendem os Recorrentes que devem ser dados como provados os factos dos números 4, 6, 7 e 9 que a sentença recorrida considerou não provados.
8. No que respeita ao facto do ponto 12 deverá ser dado como provado que A parcela de terreno doada à ré tem uma área de 1.150 metros quadrados.
9. Quanto ao ponto 18 e 19 deve ser dado como provado no ponto 18 Num contacto pessoal o Sr. F… estava acompanhado do autor D…. E no ponto 19 Que ficou a saber da vontade de seu pai.
10. Deve ser dado como provado no ponto 25-As áreas parcelares da planta somam o total de 1.150m2
11. No ponto 28, deve ser dado como provado que: Depois da devolução dos documentos à ré, esta iniciou a execução, na parcela em causa, das obras de ampliação do cemitério e de construção da casa mortuária.
12. No ponto 31 deve ser dado como provado que: O autor D… teve conhecimento da vontade de seu pai.
13. No ponto 38, deve ser dado como provado que: Tendo em conta o destino do prédio, a sua localização e o estado em que se encontrava à data da ocupação, o seu valor seria de € 12.5 por metro quadrado.
14. Quanto à Matéria de Direito, a sentença recorrida começou por conhecer o pedido reconvencional, no qual a Recorrida pretende que seja reconhecido que adquiriu por acessão industrial imobiliária a parcela de terreno com a área de 978m2 desanexada do prédio descrito no artº. 5º da petição inicial, pagando o valor de 2.445.00€ correspondente ao valor da parcela e julgou inteiramente procedente esse pedido.
15. Para assim decidir, o Tribunal a quo considerou que ficou apurado que a ré construiu, em 2005, uma capela e um cemitério no seu prédio e, com tal construção, ocupou a faixa de terreno em causa nos autos.
16. Ora, o que ficou apurado é que a ré construiu em 2005 toda a obra de ampliação do cemitério e da capela mortuária, na parcela dos autores, sendo que o cemitério já existia, como resulta dos pontos 7, 14 e 18 elencados na sentença, que, na parte que agora interessa, não foram impugnados.
17. Por essa razão, quando o Tribunal a quo considerou que "o cemitério foi construído quase exclusivamente no prédio da ré e só ampliado para a parcela." laborou em erro.
18. Uma vez que todas as obras executadas pela Recorrida de ampliação e construção da capela mortuária ocorreram na parcela de terreno, que, então, pertencia aos pais dos Recorrentes, estava completamente afastada a possibilidade de aplicar ao caso concreto o disposto no artigo 1343.º do Código Civil, tal como o fez a sentença recorrida.
19. A própria Recorrida, na causa de pedir do pedido reconvencional, em nenhuma parte alegou que o cemitério foi construído quase exclusivamente no prédio da ré e só ampliado para a parcela doada, tendo fundamentado o seu direito de acessão no artigo 1340.º do CC.
20. Não há, por isso, fundamento para o reconhecimento do direito da Recorrida com base no disposto no artigo 1343.º do CC.
21.É de salientar que na parte decisória, a sentença recorrida considerou, ao julgar procedente a reconvenção, que a Ré adquiriu por acessão industrial imobiliária essa parcela.
22. Mas, mesmo que este Alto Tribunal considere que a matéria provada permite a aplicação do disposto no artigo 1343.º do CC, o que só por hipótese se admite, não estaria verificado o requisito da boa fé, que, como se deixará melhor explicitado na análise do ponto seguinte, a Recorrida não logrou provar que existisse.
23. Dado que a ampliação do cemitério e a construção da capela mortuária configura uma incorporação que pode conduzir à aquisição da propriedade por acessão industrial imobiliária, compete-nos ponderar se ao caso se aplica o disposto no artigo 1340.º do Código Civil, o que nos obriga a analisar a questão da boa fé da conduta do autor da obra.
24. Quanto a esta questão de direito, as considerações teóricas que o Tribunal a quo faz, na linha da jurisprudência do Acórdão do STJ de 7.04.2011, não merecem dos Recorrentes qualquer objecção. Outro tanto não acontece quanto à aplicação do Direito ao caso sub judice.
25. Sendo a boa fé um dos elementos estruturais da aquisição da propriedade por acessão, o ónus da sua prova recaía sobre a Recorrida.
26.E, nessa parte diz a sentença que, no caso concreto, ficou provado que a construção da capela funerária e da ampliação do cemitério, com a ocupação da dita parcela de terreno, pertencente aos autores, foi deliberada, involuntária e inconscientemente, por parte da ré pois que foram os pais dos autores que, por iniciativa do próprio pai dos autores, fizeram questão de beneficiar a freguesia de … com a dádiva dessa parcela. Por outro lado, ficou provado que a ré desconhecia, quando do início da ocupação da faixa de terreno, que se tratava de um terreno alheio–cfr. temas 14 e 17 a 24. "
27. Impõe-se, por isso, analisar se a matéria provada nos pontos com os números indicados (14, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23 e 24) permite concluir que foram os pais dos autores que, por iniciativa do próprio pai dos autores, fizeram questão de beneficiar a freguesia de … com a dádiva dessa parcela, tal como consta na sentença.
28. Julgam os Recorrentes que basta a leitura dessa matéria para concluir que não ficou provado que a mãe deles alguma vez quisesse beneficiar a freguesia de … com a doação da parcela em causa.
29. Em conclusão, ficou apenas provado que foi o pai dos Recorrentes quem fez a doação, (facto por estes alegado na sua petição inicial), mas não a mãe, É, por isso, evidente o erro em que laborou o julgador.
30. Por outro lado, não se vê que a matéria provada possa fundamentadamente permitir a conclusão que a Recorrida desconhecia, quando do início da ocupação da faixa de terreno, que se tratava de um terreno alheio.
31.A faixa de terreno ocupada pela Recorrida faz parte do prédio que pertenceu ao pais dos Recorrentes, (factos provados nos números 14, 17 a 24 e, ainda, 28,30, 39). E a Recorrida sempre soube que o terreno era do casal dos pais dos Recorrentes, tanto assim que elaborou a minuta de doação (doc.3 junto com a contestação) fazendo constar nessa minuta a palavra Casado(a) em Regime de. O senhor F… acrescentou pelo seu punho que o seu regime de bens era o de comunhão de bens.
32. Conclui-se, por isso, que a Recorrida sabia, ou não podia ignorar, que a parcela de terreno na qual ampliou o cemitério e fez a capela mortuária faz parte de um prédio que não lhe pertencia, uma vez que pertencia, nessa data, aos pais dos Recorrentes.
33. Mesmo tomando em consideração que o pai dos Recorrentes fez a doação da faixa de terreno, a recorrida não pode invocar a boa fé para efeitos de aquisição da propriedade por acessão industrial imobiliária.
34. Sabendo a Recorrida que o doador era casado e que o seu regime de casamento era o de comunhão de bens e que a faixa de terreno onde pretendia fazer as obras ( e que fez) era pertença do casal, competia-lhe obter a autorização da esposa do doador.
35. Em conclusão, a Recorrida não provou, como lhe competia, que obteve autorização da mãe dos Recorrentes, pelo que não pode invocar a boa fé para efeitos do número 4 do artigo 1340.º do C.C., o que tem como consequência que não possa ver reconhecido o direito de acessão que invoca.
36.A conduta da Recorrida que deliberada, voluntária e conscientemente fez obras em terreno que sabia ser alheio, que pertencia ao casal e que lhe foi doado apenas por um dos membros desse casal, não teve uma conduta de boa fé, para efeitos de aquisição da faixa ou parcela de terreno, pertencente ao prédio dos Recorrentes, por acessão industrial imobiliária.
37. Mesmo que a tese dos Recorrentes não merecesse acolhimento, pelos fundamentos invocados, sempre seria de considerar que, como decidiu o Acórdão do S.T.J. citado, de 7.04.2011, as várias soluções do artigo 1340º, dependem do valor que as obras tiverem trazido à totalidade do prédio, quando comparado com o valor do prédio antes das obras. Assim, tal valor acrescentado “é dado pela diferença entre o valor da nova realidade económica resultante da incorporação e o valor que o prédio tinha antes”
38. A Recorrida não provou (nem alegou) qual era o valor do prédio antes da incorporação e qual o valor do prédio com a nova realidade económica, resultante da incorporação efectuada.
39. Falta, por isso, também, esse elemento estrutural para que possa ser reconhecida a aquisição com fundamento na acessão imobiliária industrial do artigo 1340º. do CC e, consequentemente, ser julgada procedente a reconvenção.
40. Julgando procedente o pedido reconvencional, a sentença recorrida decidiu que a Junta de Freguesia de …o devia pagar aos autores a soma de € 2.445 euros, justo valor equitativo pela parcela, atendendo ao facto de os autores terem incorrido em venire contra factum proprium, ou seja, ao pretenderem revogar a palavra dos autores da herança.
41. Importa, por isso, analisar se a conduta dos Recorrentes configura um abuso de direito na modalidade de venire contra factum proprium ao pretenderem revogar a palavra dos autores da herança.
42.E no entender dos Recorrentes nada ficou provado que permita concluir que a sua conduta configura um exercício abusivo de um direito.
43. Ficou provado que a doação da parcela de terreno ocupada pela Junta de Freguesia não foi feita por escritura pública (facto provado do n.º 13 da sentença).
44. Atento o disposto no artigo 947º. do C.C. a doação de coisas imóveis só é válida se for celebrada por escritura pública (ou, actualmente, por documento particular autenticado).
45.O pedido de declaração da nulidade, que os Recorrentes formulam na presente acção, é legítimo e deve ser declarado procedente.
46. Pela reapreciação da prova pericial, os Recorrentes esperam que fique provado que o valor da parcela com a área de 1.150m2, é de, pelo menos, €: 13.500,00.
47. Os Recorrentes consideram que esse é o valor real e justo que deve ser fixado, no caso da procedência da reconvenção, devendo a Recorrida ser condenada a pagá-lo.
48. O mesmo valor deve ser fixado no caso de improcedência da reconvenção e procedência do pedido dos autores.
49.A douta sentença recorrida violou o disposto nos artºs. 1340º e 1343º do C.C., pelo que deve ser revogada e substituída por outra que que declare a nulidade da doação da parcela de terreno que faz parte do prédio identificado no artº. 5º da petição inicial, que condene a Recorrida, representada pelo presidente da Junta, a pagar aos Recorrentes a quantia de €: 13.500,00, por ser esse o valor da parcela e declare totalmente improcedente a reconvenção.
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Devidamente notificado a Ré contra-alegou concluindo pelo não provimento do recurso.
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Foram dispensados os vistos.
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II- FUNDAMENTOS

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso-cfr. artigos 635.º, nº 4, e 639.º, nºs 1 e 2, do C.P.Civil.
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No seguimento desta orientação são duas as questões que importa apreciar:

a)- saber se o tribunal recorrido cometeu erro na apreciação da prova e assim na decisão da matéria de facto.
b)- saber se a subsunção jurídica dos factos se encontra, ou não, correctamente efectuada.
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A)- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

É a seguinte a matéria de facto que vem dada como provado pelo tribunal recorrido:
1- Os autores são filhos de E… e de F…, que foram casados em comunhão geral de bens.
2- A mãe dos autores faleceu no dia 19 de Janeiro de 2009, no estado de casada com o pai dos autores, sem testamento, doação ou qualquer outra disposição de última vontade.
3- Por morte da mãe dos autores, sucederam-lhe como únicos herdeiros o marido, F…, e os autores, que são os únicos filhos do casal.
4- Não se procedeu a inventário ou partilha, estando a herança ilíquida e indivisa.
5- Em 23 de Maio de 2012, faleceu o pai dos autores, F…, no estado de viúvo, sem ter feito testamento ou doação por morte, sucedendo-lhe como únicos herdeiros os seus 3 filhos, ora autores.
6- Os pais dos autores, por si e antepossuidores, sempre tiveram o gozo e fruição do seu prédio rústico, nele cortando mato e pinheiros, recolhendo lenhas, procedendo à sua limpeza, pagando a respectiva contribuição, actos que praticaram há 20, 30 e mais anos, continuadamente, à vista de toda a gente, sem qualquer oposição, conscientes de exercer um direito próprio e convencidos de não lesar direitos de terceiros.
7- O presidente da Junta da Freguesia de … fez obras de alargamento do cemitério e construiu a capela funerária.
8- O prédio rústico confina com o cemitério da freguesia de ….
9- Da herança dos pais dos autores, faz parte o prédio rústico denominado “I…”, terra de cultura com videiras em cordão, pastagem, mato de pinhal e carvalhos, cortes, sito na freguesia de …, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº. 00516/020991 e inscrito na matriz sob o artigo 415.
10- Os autores, por si e ante possuidores, sempre tiveram o gozo e fruição do prédio, nele cortando mato e pinheiros, recolhendo lenhas, procedendo à sua limpeza, pagando a respectiva contribuição.
11- Actos que praticam há 20, 30 e mais anos, continuadamente, à vista de toda a gente, sem qualquer oposição, conscientes de exercerem um direito próprio e convencidos de não lesarem direitos de terceiros.
12- A parcela de terreno doada à ré tem uma área próxima dos 1.000 metros quadrados.
13- A doação da parcela não foi feita por escritura pública.
14- O Sr. F… deu a saber ao Presidente da Junta que cedia, gratuitamente, à Freguesia o terreno necessário, daquele seu prédio, para a execução do projecto de ampliação do cemitério e a construção da casa mortuária.
15- Como contrapartida pretendia que a Junta obtivesse para sua família, um jazigo no cemitério de Jazente.
16- E se tal se revelasse impossível devia a ré reservar um jazigo no cemitério de ….
17- Decorreram alguns contactos quer telefónicos quer pessoais, entre o pai dos autores e o Presidente da Junta de Freguesia.
18- Nos contactos pessoais o Sr. F… estava acompanhado do autor D….
19- Que assim ficou a saber da vontade de seu pai e do acordo celebrado com o Presidente da Junta da ré.
20- Para a execução do projecto, o pai dos autores, na companhia de seu filho, o autor D…, e o Presidente da Junta de Freguesia delimitaram, no prédio, a parcela necessária, com uma área que, na ocasião, foi calculada em 978 m2.
21- Em 28 de Abril de 2004 o Presidente da Junta de Freguesia de … elaborou um documento denominado “Minuta de Doação” no qual ficaram em branco os espaços destinados à identificação do primeiro interveniente e à identificação do objecto da doação.
22- Consta ainda desse documento que “O(s) Primeiros vão Doar ao segundo uma parcela de terreno com a área aproximadamente de _____m2, pertencente ao art._____ da freguesia de …, inscrita na matriz sob o nº _______, para a Ampliação do Cemitério Paroquial de …”.
23- Em 21 de Julho de 2004, o Presidente da Junta de Freguesia remeteu-lhe essa minuta destinada a ser preenchida e assinada.
24- O pai dos autores preencheu e assinou a referida minuta e devolveu-a ao Presidente da Junta acompanhada dos mesmos elementos que este lhe enviara (a carta e a planta).
25- As áreas parcelares da planta somam o total de 978m2, sendo 680m2 para o cemitério e 288m2 para a casa mortuária.
26- Assim a área de 976m2, indicada na Minuta, resultou de lapso do pai dos autores.
27- Anteriormente, a Junta de Freguesia já havia efectuado, com consentimento do pai dos autores, a limpeza do espaço que se encontrava ao abandono e coberto de matos e silvas.
28- Logo após a devolução dos documentos à ré, esta iniciou a execução, na parcela em causa, das obras de ampliação do cemitério e de construção da casa mortuária.
29- A execução deste projecto teve um custo de cerca de € 100.000 euros.
30- E com a sua execução, toda a parcela cedida pelo pai dos autores ficou ocupada com tais obras.
31- O autor D… teve conhecimento da vontade de seu pai e também de todas as condições do acordo celebrado entre este e a ré e da sua execução.
32- As obras executadas pela ré prolongaram-se durante cerca de um ano.
33- Durante este tempo os autores tiveram conhecimento da sua realização na parcela.
34- E desde a execução do acordo, nomeadamente após o óbito da mãe dos autores, o Sr. F… sempre confirmou com o Presidente da Junta da ré que o acordo se mantinha.
35- Após as últimas eleições autárquicas, tendo sabido da mudança do executivo, o Sr. F… telefonou para o actual Presidente da Junta de … no sentido de confirmar a manutenção dos acordos.
36- O que lhe foi confirmado.
37- A parcela, como o resto do prédio, era constituída por terreno destinado ao cultivo agrícola e mato, ao tempo em estado de abandono, sem qualquer cultura agrícola ou arvense e sem benfeitorias.
38- Tendo em conta o destino do prédio, a sua localização e o estado em que se encontrava à data da ocupação, o seu valor nunca seria superior a € 2,50 por m2.
39- Por causa da execução das obras a parcela ficou autonomizada da parte restante do prédio, estando dele separada por muros de vedação e dotada de abastecimento de água.
40- O que lhe aumentou o valor, pelo menos para € 5.000 euros, independentemente do valor das construções nela incorporadas de cerca de € 100.000 euros.
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III. O DIREITO

Como supra se referiu a primeira questão que importa apreciar e decidir consiste em:

a)- saber se o tribunal recorrido cometeu erro na apreciação da prova e assim na decisão da matéria de facto.

Resulta da motivação do recurso e das respectivas conclusões que os Autores recorrentes deram cumprimento aos ónus impostos pelo artigo 640.º, nº 1 als. a), b) e c) do CPCivil, pois que, faz referência aos concretos pontos da matéria de facto que consideram incorrectamente julgados, indicam os elementos probatórios que conduzem à alteração daqueles pontos nos termos por ele propugnados, a decisão que no seu entender deveria sobre eles ter sido proferida e ainda as passagens da gravação em que se funda o recurso e que transcreveu [nº 2 al. a) do citado normativo].
Cumpridos aqueles ónus e, portanto, nada obstando ao conhecimento do objecto de recurso nesse segmento, o Autores apelantes entendem que os factos elencados na sentença e vertidos nos números 12, 18, 19, 25, 28, 31 e 38 e considerados provados, estão, em parte, incorrectamente julgados e os factos 4, 6, 7 e 9 da base instrutória considerados como não provados deveriam ter sido dados como provados.
Quid iuris?
O controlo de facto, em sede de recurso, tendo por base a gravação e/ou transcrição dos depoimentos prestados em audiência, não pode aniquilar (até pela própria natureza das coisas) a livre apreciação da prova do julgador, construída dialecticamente na base da imediação e da oralidade.
Efectivamente, a garantia do duplo grau de jurisdição da matéria de facto não subverte o princípio da livre apreciação da prova (consagrado no artigo 607.º nº 5) que está deferido ao tribunal da 1ª instância, sendo que, na formação da convicção do julgador não intervêm apenas elementos racionalmente demonstráveis, já que podem entrar também elementos que em caso algum podem ser importados para a gravação vídeo ou áudio, pois que a valoração de um depoimento é algo absolutamente imperceptível na gravação/transcrição.[1]
Ora, contrariamente ao que sucede no sistema da prova legal, em que a conclusão probatória é prefixada legalmente, no sistema da livre apreciação da prova, o julgador detém a liberdade de formar a sua convicção sobre os factos, objecto do julgamento, com base apenas no juízo que fundamenta no mérito objectivamente concreto do caso, na sua individualidade histórica, adquirido representativamente no processo.
O que é necessário e imprescindível é que, no seu livre exercício de convicção, o tribunal indique os fundamentos suficientes para que, através das regras da ciência, da lógica e da experiência, se possa controlar a razoabilidade daquela sobre o julgamento do facto como provado ou não provado”.[2]
De facto, a lei determina expressamente a exigência de objectivação, através da imposição da fundamentação da matéria de facto, devendo o tribunal analisar criticamente as provas e especificar os fundamentos que foram decisivos para a convicção do julgador (artigo 607.º, nº 4 do CPCivil).
Todavia, na reapreciação dos meios de prova, a Relação procede a novo julgamento da matéria de facto impugnada, em busca da sua própria convicção, desta forma assegurando o duplo grau de jurisdição sobre essa mesma matéria, com a mesma amplitude de poderes da 1.ª instância.[3]
Impõe-se-lhe, assim, que “analise criticamente as provas indicadas em fundamento da impugnação, quer a testemunhal, quer a documental, conjugando-as entre si, contextualizando-se, se necessário, no âmbito da demais prova disponível, de modo a formar a sua própria e autónoma convicção, que deve ser fundamentada”.[4]
Importa, porém, não esquecer que, como atrás se referiu, se mantêm vigorantes os princípios da imediação, da oralidade, da concentração e da livre apreciação da prova e guiando-se o julgamento humano por padrões de probabilidade e nunca de certeza absoluta, o uso, pela Relação, dos poderes de alteração da decisão da 1ª instância sobre a matéria de facto deve restringir-se aos casos de flagrante desconformidade entre os elementos de prova disponíveis e aquela decisão, nos concretos pontos questionados.[5]
Tendo presentes estes princípios orientadores, vejamos agora se assiste razão aos Autores apelantes, neste segmento recursório da impugnação da matéria de facto, nos termos por eles pretendidos.
Entendem, desde logo, os apelantes que os pontos 4º), 6º), 7º e 9º) da base instrutória deviam ter sido dados como provados.
Esses pontos tinham a seguinte redacção:
4º)- Em data que os autores não podem precisar, chegou ao seu conhecimento que o seu pai, a pedido do então presidente da Junta de …, tinha doado à freguesia uma parcela do referido prédio?
6º)- Essa doação foi feita sem o conhecimento nem consentimento da mãe dos autores?
7º)- A mãe dos autores já sofria de doença mental que a impossibilitava de tratar da sua pessoa e dos seus bens, o que veio a ser reconhecido em acção de interdição por anomalia psíquica que correu termos no 3º. e 4º Juízos Cíveis do Porto (3º. Juízo 2ª. Secção) com o nº. 67/06.4TVPRT?
9º)- Quer o então presidente da Junta da Freguesia Ré, quer o pai dos autores sabiam que a mãe dos autores não estava em condições de dar o seu consentimento a qualquer doação?
Para o feito convocaram o depoimento de parte do Autores D…, as declarações departe B…, C… e ainda o depoimento da testemunha G… e H….
Importa, desde logo, referir que os referidos factos foram alegados pelos Autores na respectiva petição inicial (cfr. artigos 10º a 15º da referida peça).
Como assim, trata-se, como nos parece evidente, de factos que lhe são favoráveis e, como tal, os mesmos não podiam ser objecto de confissão.
Na verdade, a confissão, conforme resulta da definição contida no artigo 352.º CCivil, consiste no reconhecimento que a parte faz da realidade de um facto que lhe é desfavorável e favorece a parte contrária.
O valor probatório atribuído à confissão assenta na regra de experiência segundo a qual ninguém mente contrariamente ao seu interesse.[6]
Ora, não sendo os referidos factos contrários ao interesse de depoente não podiam ser eles objecto de confissão, pois que, ninguém pode fabricar prova a seu a favor.
E, não o sendo, a declaração de reconhecimento de factos desfavoráveis pode constituir meio de prova sujeito à livre apreciação do julgador (artigo 361º CCivil).
Acontece que, o Autor D… no seu depoimento não reconhece quaisquer factos que lhe sejam desfavoráveis, o que ele faz são simples afirmações favoráveis à sua pretensão.
Desta forma e sob este conspecto é irrelevante o seu depoimento.
E que dizer das declarações de parte das Autores B… e B…?
Nos termos estatuídos no artigo 466.º do CPCivil as partes podem requerer, até ao início das alegações orais em 1.ª instância, a prestação de declarações sobre factos em que tenham intervindo pessoalmente ou de que tenham conhecimento directo (n.º 1); às declarações das partes aplica-se o disposto no artigo 417.º–quanto ao dever de cooperação para a descoberta da verdade–e ainda, com as necessárias adaptações, o estabelecido na secção anterior, relativa à prova por confissão das partes (n.º 2); o tribunal aprecia livremente as declarações das partes, salvo se as mesmas constituírem confissão (n.º 3).
Trata-se de disposição inovadora introduzida na novo CPCivil, mencionando-se na Exposição de Motivos da proposta de lei n.º 113/XII, que está na origem da Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, que se prevê “a possibilidade de prestarem declarações em audiência as próprias partes, quando face à natureza pessoal dos factos a averiguar tal diligência se justifique, as quais são livremente valoradas pelo juiz, na parte em que não representem confissão”.
A relevância probatória destas declarações tem sido objecto de apreciação em sede de jurisprudência, salientando-se diferentes acórdãos proferidos por este Tribunal da Relação.
Dúvidas não existem de as declarações de parte que, diga-se, divergem do depoimento de parte, devem ser atendidas e valoradas com algum cuidado.
Não se pode olvidar que, como meio probatório são declarações interessadas, parciais e não isentas, em que quem as produz tem um manifesto interesse na acção.
Efectivamente, seria de todo insensato que sem mais, nomeadamente, sem o auxílio de outros meios probatórios, sejam eles documentais ou testemunhais, o Tribunal desse como provados os factos pela própria parte alegados e por ela, tão só, admitidos.
Não obstante o supra referido, o certo é que são um meio de prova legalmente admissível e pertinentemente adequado à prova dos factos que sejam da natureza que ele mesmo pressupõe (factos em que as partes tenham intervindo pessoalmente ou de que as partes tenham conhecimento directo).
Todavia, tais declarações são apreciadas livremente pelo tribunal (466.º, n.º 3, do CPCivil) e, nessa apreciação, engloba-se a sua suficiência à demonstração do facto a provar.
A afirmação, peremptória e inequívoca, de as declarações das partes não poderem fundar, de per si e só por si, um facto constitutivo do direito do depoente, não é correta, porquanto, apresentada sem qualquer outra explicação, não deixaria de violar, ela mesma, a liberdade valorativa que decorre do citado n.º 3 do artigo 466.º do CPC.
Mas compreende-se que, tendencialmente as declarações das partes, sem qualquer corroboração de outra prova, qualquer que ela seja, não apresentem, ainda assim, e sempre num juízo de liberdade de apreciação pelo tribunal, a suficiência bastante à demonstração positiva do facto pretendido provar.
Neste contexto de suficiência probatória, e não propriamente de valoração negativa e condicionada da prova (e só assim pode ser, respeitando o princípio que se consagra no artigo 466.º, n.º 3 do CPC) parece-nos claro que nunca pode estar em causa a violação da norma constitucional que salvaguarda a tutela efectiva do direito (artigo 20.º, n.º 5, da CRP).
Evidentemente que, perspectivando de modo inverso o problema, também a admissão da prova por declaração de parte num sentido interpretativo de onde decorresse, em qualquer circunstância, a prova dos factos constitutivos do direito invocado por mero efeito das declarações favoráveis, não deixaria de violar a norma constitucional, na medida em que, num processo de partes como é o processo civil, deixaria sem possibilidade de defesa–e aí, sem tutela efectiva–a parte contrária.
Como assim, a prova por declarações de parte, nos termos enunciados no artigo 466.º do Código de Processo Civil, é apreciada livremente pelo tribunal, na parte que não constitua confissão, na certeza de que a livre apreciação é sempre condicionada pela razão, pela experiência e pelas circunstâncias e que, neste enquadramento, a declaração de parte que é favorável e que surge desacompanhada de qualquer outra prova que a sustente ou sequer indicie, será normalmente insuficiente à prova de um facto essencial à causa de pedir.
Postas estas breves considerações, parece-nos evidente, que os Autores apelantes não convocam qualquer outro meio probatório que possa corroborar as afirmações feitas pelas referidas depoentes.
Com efeito, nem o depoimento da testemunha G… nem o depoimento da testemunha H… têm essa virtualidade.
A primeira das referidas testemunhas referiu no seu depoimento que:
O Sr. F… foi à Junta acompanhado pela mulher e pelo filho e disse que doava o terreno, nada sendo dito em contrário pela esposa. Mandou-lhe a minuta da doação, que o pai dos autores preencheu e devolveu pelo correio. Enviou-lhe um esboço do terreno a ocupar e ele ofereceu o terreno. A Junta nada pediu, foi o próprio Sr. F… que teve a iniciativa de dar. Asseverou que os três, Sr. F…, mulher e filho viram a demarcação do terreno a ocupar. Inclusive, enviou um levantamento topográfico do terreno, feito pela Câmara Municipal, ao Sr. F…. No local, em 2003 o casal, o filho e o depoente em 2003, acordaram na doação do terreno para ampliação do cemitério”.
Por sua vez a testemunha H… referiu que:
“(…) numa 2.ª-feira apareceram na Junta o Sr. F… para falarem da ampliação do cemitério e fixarem o limite da doação. Chegaram a ir ao cemitério os 4, o Sr. F…, o filho deste, o Sr. G… e ele Secretário.
Nunca a Junta lhes pedira nada, o Sr. F… é que teve a iniciativa de dar o terreno, de sua livre vontade. Julga que foi também pelo facto de ser ter incompatibilizado com o anterior Presidente da Junta que quis agraciar este Executivo. Sempre foi vontade comum dos pais dos autores fazer a dádiva. Aliás, não nos coibimos de salientar que a acta da Junta de 2009, de cópia a fls. 45, fala por si, ”um compromisso de honra de compra de uma sepultura para a família da Sr.ª E…” o que, só por si, indicia quem fez a benesse também e que a doação foi assumida pelo casal, sendo a mãe dos autores credora dessa gratidão”.
Acresce que, embora a testemunha J… ex-companheiro da autora C… tenha afirmado que a sua “sogra” ficou doente há mais de 12 anos e que em 2004 já estava doente, o certo é que o processo tendente à doação iniciou-se antes de Abril de 2004 e a sentença de interdição de fls. 104, fixou o início da incapacidade em Dezembro de 2004.
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Do exposto resulta, assim, não terem os recorrentes convocados meios probatórios produzidos nos autos que permitam dar como provados os supra referidos factos constantes da base instrutória.
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Como noutro passo já se referiu, impugnam também os recorrentes por estarem incorrectamente julgados os pontos factos 12, 18, 19, 25, 28, 31 e 38 da fundamentação factual.
O ponto 12 tem a seguinte redacção:
A parcela de terreno doada à ré tem uma área próxima dos 1.000 metros quadrados”.
Entendem os recorrentes que que o referido facto deveria ter a seguinte redacção:
A parcela de terreno doada à ré tem uma área de 1.150 metros quadrados”.
Para a alteração propugnada convocam os recorrentes o relatório pericial, referindo que o Sr. perito fez constar, na página 12 do seu relatório, que a área do terreno ocupada pela ampliação do cemitério e pela construção da capela mortuária, medida na planta fornecida, é de 1.150m2.
Na petição inicial os Autores alegaram no artigo 16º da referida peça que a área da parcela doada tinha a área aproximada de 1000 metros quadrados e formularam o correspondente pedido em função da área indicada.
Ora, a alteração agora pretendida extravasa aquela alegação e o correspondente pedido formulado e, como tal, não pode tal facto sofrer qualquer alteração.
Em primeiro lugar e dado tratar-se de um facto essencial, tendo resultado da instrução da causa não cai dentro da previsão do artigo 5.º do CPCivil, já que tal facto teria de ser alegado pelos Autores- nº 1 do citado preceito.
Em segundo lugar mesmo que assim não fosse, a alteração do referido facto sem ampliação do pedido era irrelevante, sendo que, aquela ampliação só seria possível até ao encerramento da discussão em primeira instância e desde que fosse o desenvolvimento ou consequência do pedido primitivo (artigo 265.º, nº 2 do CPCivil), coisa que aqui, manifestamente, não se verifica.
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Como assim, deve o referido facto manter-se inalterado.
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Os pontos 18 e 19 têm respectivamente a seguinte redacção:
Nos contactos pessoais o Sr. F… estava acompanhado do autor D…”.
Que assim ficou a saber da vontade de seu pai e do acordo celebrado com o Presidente da Junta da ré”.
Entendem os recorrentes que a redacção desses pontos deveria ser:
Num contacto pessoal o Sr. F… estava acompanhado do autor D…”.
Que ficou a saber da vontade de seu pai”.
Para o efeito indicam também os recorrentes os depoimentos convocados a propósito dos factos não provados.
Todavia, também aqui não se vislumbra como, com base em tais depoimentos, se possa proceder à alteração solicitada.
Na verdade, para além daquilo que quanto ao depoimento e declarações de parte já noutro passo se referiu, basta atentar no depoimento da testemunha G… onde refere que o Autor K… acompanhou mais de uma vez o seu pai nas deslocações à Junta de Freguesia tendo até ajudado na demarcação do terreno.
Circunstância (das deslocações do Autor D… à Junta de Freguesia) corroborada também pela testemunha H….
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Desta forma também aqui os recorrentes não indicam meios probatórios produzidos nos autos que permitam alterar a redacção dos citados pontos factuais, devendo pois manterem-se tal qual constam da fundamentação factual.
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O ponto 25 da fundamentação que os recorrentes também impugnam tem a seguinte redacção:
“As áreas parcelares da planta somam o total de 978m2, sendo 680m2 para o cemitério e 288m2 para a casa mortuária”.
Entendem os recorrentes que a redacção de tal facto deveria ser a seguinte:
“As áreas parcelares da planta somam o total de 1.150m2”.
Para a pretendida alteração convocam os recorrentes o relatório pericial.
Em relação a este ponto fundamentação factual e que corresponde ao que foi alegado no artigo 35º da contestação valem, em parte, mutatis mutandis, as mesmas considerações feitas a propósito do ponto 12.
Com efeito, o referido facto serve de base ao pedido reconvencional formulado pela Ré reconvinte.
No artigo 7º da réplica os Autores limitaram-se a dizer que parcela de terreno ocupada pela Ré tem uma área superior à que consta no artigo 35º da contestação, todavia, sem terem especificado qual era, em concreto, a área ocupada, além de que, na petição inicial alegaram que essa área era aproximadamente de 1000 metros quadrados.
Portanto, a área de 1.150 m2que consta da planta a que o relatório pericial faz referência seria, no âmbito da réplica, um facto concretizador do alegado no citado artigo 7º daquela peça e, portanto, para que fosse tomado em consideração teria que se ter lançado mão do ritualismo processual constante do artigo 5.º do CPCivil, dando à parte contrária oportunidade para sobre ele se pronunciar e arrolar a prova que tivesse por pertinente, coisa que não ocorreu.
Como assim, esta Relação não pode substituir-se à 1.ª instância e valorar já em termos definitivos a prova produzida quanto aos novos factos, ampliando em 2.ª instância a matéria de facto sem que previamente, em fase de audiência de julgamento, as partes estejam alertadas para essa possibilidade e lhes seja facultado produzir toda a prova que entenderem.
*
O ponto 28 da fundamentação factual tem a seguinte redacção:
Logo após a devolução dos documentos à ré, esta iniciou a execução, na parcela em causa, das obras de ampliação do cemitério e de construção da casa mortuária”.
Referem os recorrentes que a redacção do citado ponto deveria ser a seguinte:
Depois da devolução dos documentos à ré, esta iniciou a execução, na parcela em causa, das obras de ampliação do cemitério e de construção da casa mortuária”.
Este facto nenhum relevo tem para a decisão do pleito razão sob o ponto de vista da sua subsunção jurídica.
Ora, atento o carácter instrumental da reapreciação da decisão da matéria de facto, no sentido de que a reapreciação pretendida visa sustentar uma certa solução para uma dada questão de direito, a inocuidade da aludida matéria de facto justifica que este tribunal indefira essa pretensão, em homenagem à proibição da prática no processo de actos inúteis (artigo 137º do Código de Processo Civil, na redacção que vigorava antes da Lei nº 41/2013, de 26 de Junho e a que corresponde actualmente o artigo 130º do vigente Código de Processo Civil, aprovado pela lei que antes se citou).
Por esse motivo, abstemo-nos de reapreciar a decisão da matéria de facto relativamente ao facto em questão.
*
O ponto 31 da fundamentação factual que os recorrentes também impugnam tem a seguinte redacção:
O autor D… teve conhecimento da vontade de seu pai e também de todas as condições do acordo celebrado entre este e a ré e da sua execução”.
Entendem os Autores apelantes que esse facto deveria ter a seguinte redacção:
O autor D… teve conhecimento da vontade de seu pai”.
Para a pretendida alteração fazem os recorrentes apelo aos meio probatórios indicados a propósito dos factos não provados, mais concretamente ao depoimento de parte do Autor D….
Ora, também aqui para além do que já supra ficou dito referente a esta prova, verifica-se que de acordo com depoimento das testemunhas G… e H…, valorados por este tribunal, o conhecimento do citado Autor D… não se limitava à vontade de seu pai, pois que, tendo participado em mais que uma reunião com elementos da Junta de Freguesia, conhecia toda a envolvente da cedência da parcela para os fins a que se destinava.
Por esta razão deve o referido facto manter-se tal qual foi dado como provado pelo tribunal recorrido.
*
O ponto 38 da fundamentação factual que os recorrentes também impugnam tem a seguinte redacção:
Tendo em conta o destino do prédio, a sua localização e o estado em que se encontrava à data da ocupação, o seu valor nunca seria superior a € 2,50 por m2”.
Refere os apelantes que a redacção do mencionado ponto deveria ser a seguinte:
Tendo em conta o destino do prédio, a sua localização e o estado em que se encontrava à data da ocupação, o seu valor seria de € 12.5 por metro quadrado”.
Para o desiderato pretendido fazem apelo ao relatório pericial.
Cremos que, neste conspecto assiste razão aos recorrentes.
Efectivamente, pese embora o Sr. perito, (único nomeado pelo tribunal) tenha referido nos esclarecimentos prestados em audiência que não se sentia confortável com o valor que verteu no seu relatório, o certo é que o seu desconforto é irrelevante neste âmbito.
Na verdade, sem prejuízo da força probatória da perícia ser fixada livremente pelo tribunal–artigo 389.º do Cód. Civil-, dúvidas não existem de que a prova pericial em questões desta natureza-avalição do valor de terrenos-assume uma particular importância pelo que, as conclusões apresentadas só devem ser afastadas quando se constata que foram elaboradas com base em critérios legalmente inadmissíveis ou desadequados, ou quando se nos deparam erros ou lapsos evidentes, que importem correcção.
Daí que seja exigível aos senhores peritos uma atitude objectiva, consentânea com a especificidade dos factos e com os seus conhecimentos, compatível com o rigor, o pormenor e a substância que só a prova pericial é capaz de oferecer, traduzida num conhecimento susceptível de, nesta matéria, constituir um alicerce fundamental de uma decisão judicial.
E se é certo que o tribunal não deve aceitar acriticamente os elementos fornecidos pelos Srs. Peritos, temos também por seguro que os Srs. Juízes não devem substituir-se aos peritos, cedendo à tentação de emitir juízos valorativos de carácter eminentemente técnico, para o qual não estão–nem têm de estar–vocacionados.
Ora, no seu relatório o Sr. perito fixou o valor de 12,50 euros por metro quadrado para o ano de 2005, o qual foi encontrado entrando em linha de conta com o valor do metro quadrado em 2013 e os valores do INE, fazendo os cálculos que explicou em audiência.
Portanto, tendo o referido valor sido encontrado com base em critérios legalmente admissíveis e adequados e não constando do referido relatório erros ou lapsos evidentes, que importem correcção, não se vislumbra, porque razão o referido relatório pericial não foi devidamente valorado pelo tribunal recorrido, além de que, não consta da motivação da decisão da matéria de facto, em que elementos probatórios o referido tribunal se ancorou para dar como provado o citado ponto 38 da fundamentação factual na redacção que contém.
*
Destarte e face ao que foi alegado pelos recorrentes no artigo 20º da réplica, altera-se a redacção do ponto 38 da fundamentação factual pela forma seguinte:
Tendo em conta o destino do prédio, a sua localização e o estado em que se encontrava à data da ocupação, o seu valor seria de € 12,50 por metro quadrado”.
*
Decorre do exposto que a apreciação da Mmª juiz a quo-efectivada no contexto da imediação da prova-, surge-nos assim como claramente sufragável, com iniludível assento na prova produzida e em que declaradamente se alicerçou, nada justificando, por isso, a respectiva alteração excepto no que se refere ao ponto 38. da fundamentação factual e nos termos que acima se deixaram assinalados.
Como assim, temos de convir que, ouvidos os depoimentos indicados pelo recorrente, não são de molde a sustentar a tese que por ele vem expendida, pese embora se respeite a opinião em contrário veiculada nesta sede de recurso, havendo que afirmar ter a Mmª juiz captado bem a verdade que lhe foi trazida ao processo, com as dificuldades que isso normalmente tem, não existindo, portanto, fundamento probatório convocado pelo recorrentes para que este tribunal altere a decisão da matéria factual dada como assente pelo tribunal recorrido com a excepção do referido ponto 38.
*
Improcedem, assim, as conclusões 1ª a 12ª formuladas pelos recorrentes e procede a conclusão 13ª.
*
Alterada a fundamentação nos termos que se deixaram assinalados, a segunda questão que vem colocada no recurso prende-se com:
b)- saber se a subsunção jurídica dos factos se encontra, ou não, correctamente efectuada.

1. A aquisição da parcela de terreno pela via da acessão industrial imobiliária

Conforme decorre dos autos a Ré formulou pedido reconvencional através do qual pretendia que lhe fosse reconhecido que adquiriu por acessão industrial imobiliária a parcela de terreno com a área de 978m2 desanexada do prédio descrito no artigo 5º da petição inicial, pagando o valor de 2.445.00€ correspondente ao respectivo valor.
A sentença recorrida julgou inteiramente procedente a reconvenção e declarou que a Ré adquiriu por acessão industrial imobiliária essa parcela de terreno, pagando 2.445,00 euros correspondente ao valor da parcela.
Deste entendimento dissentem os recorrentes questionando, desde logo, que a factualidade que se deu como provada nos autos preencha a factie species do artigo 1343.º do CCivil.
Analisando.
Como se sabe a acessão constitui uma causa de aquisição originária retroactiva do direito de propriedade sobre determinada coisa, compreendendo na sua noção legal o conceito de incorporação de uma coisa da titularidade de uma pessoa, numa outra coisa da titularidade de outra, nos termos estatuídos nos artigos 1316.º, 1317.º, al. d) e 1325.º, todos do Código Civil.
Consigna o artigo 1340.º, nºs 1, 2 e 3, do Código Civil, que se alguém, de boa-fé, construir obra em terreno alheio e o valor que a mesma tiver trazido à totalidade do prédio for maior do que o valor que este tinha antes, o autor da incorporação adquire a propriedade dele, pagando o valor que o prédio tinha antes da obra, mas se o valor acrescentado for menor, a obra pertencerá ao dono do terreno, com obrigação de indemnizar o seu autor do valor que tinha ao tempo da incorporação, enquanto que se o valor acrescentado pela obra for igual ao do terreno, haverá licitação entre ambos.
Resulta, assim deste normativo que são elementos cumulativos integradores da acessão industrial imobiliária:
a)- a construção de uma obra (realizada em prédio rústico ou urbano), sementeira ou plantação resultante de um acto voluntário do interventor;
b)- que essa obra haja sido efectuada em terreno que seja propriedade de outrem, ou seja, que ocorra uma implantação em terreno alheio;
c)- que os materiais utilizados na obra, sementeira ou plantação pertençam ao interventor/autor da incorporação;
d)- que da obra tenha resultado uma incorporação, ou seja, a constituição definitiva;
e)- que da incorporação da obra, sementeira ou plantação resulte a constituição de uma unidade inseparável, permanente, definitiva de um todo único entre o terreno e a obra, sementeira ou plantação;
f)- que o valor acrescentado pela obra, sementeira ou plantação acrescente valor (económico e substantivo) àquele que o prédio possuía antes de ter sofrido a incorporação da obra, sementeira ou plantação seja superior ao valor que o prédio tinha antes da incorporação;
g)- que o autor da obra, sementeira ou plantação tenha agido de boa-fé (psicológica);
Por sua vez, estipula o artigo 1343.º, nº 1 do CCivil que “Quando na construção de um edifício em terreno próprio se ocupe, de boa-fé, uma parcela de terreno alheio, o construtor pode adquirir a propriedade do terreno ocupado, se tiverem decorrido três meses a contar do início da ocupação, sem oposição do proprietário, pagando o valor do terreno e reparando o prejuízo causado, designadamente o resultante da depreciação eventual do terreno restante”.
É o que se chama de acessão invertida pelo facto de a acessão operar não a favor do dono do solo, mas do dono do edifício.[7]
Neste caso, é essencial que a construção ocupe os dois terrenos (o próprio e o do vizinho). A este respeito defendem alguns autores que, apesar de a lei falar em ocupação de “uma parcela de terreno alheio”, não fica excluído que essa ocupação abranja a totalidade do prédio vizinho.[8] Outros, limitam a previsão do artigo 1343.º à situação em que a maior parte do prédio foi construído em terreno próprio.
Segundo esta última posição doutrinária, a previsão do artigo 1343.º do C.Civil não abrange as situações em que a maior parte da construção seja incorporada no terreno alheio e vizinho do autor dela. O elemento literal do preceito aponta nesse sentido, já que ali se alude a “uma parcela de terreno alheio”, o que exclui, à partida, o caso de o autor da incorporação ocupar totalmente o prédio alheio com a construção, ainda que ocupe, também o terreno próprio. Por outro lado, a referida expressão “parcela de terreno” inculca a ideia de que apenas uma pequena parte da construção ocupe o terreno vizinho.[9]
Se o ocupar na maior parte, ou, por maioria de razão, na totalidade, deve aplicar-se o regime geral da acessão previsto no artigo 1340º do Código Civil.
Não obstante, alguma controvérsia na doutrina e na jurisprudência, sobretudo no que concerne à espécie de acessão consagrada no artigo 1340.º do C.Civil, apontando a doutrina clássica para a consagração da tese da aquisição automática com a efectiva incorporação[10], já em relação à acessão aludida no artigo 1343.º do mesmo diploma legal é hoje preponderante a posição que a acessão industrial imobiliária, em qualquer uma das espécies de acessão, representa uma forma potestativa de aquisição do direito de propriedade, de reconhecimento, necessariamente, judicial, em que o pagamento do valor da unidade predial em causa funciona como condição suspensiva da transmissão do direito, embora com efeito retroactivo ao momento da incorporação.[11]
E tal entendimento resulta, de resto, da própria interpretação literal não só do artigo 1343.º, como também do artigo 1340º, ambos do C.C., visto que deste último também decorre que o autor da incorporação só adquire a propriedade do solo “pagando o valor que o prédio tinha antes das obras”, o que não pode deixar de significar que se não pagar a indemnização, não adquirirá a propriedade do solo.
Não há, portanto, uma aquisição automática, não se impondo coercivamente ao respectivo beneficiário o exercício de um direito-a obrigação de pagar-o que não deixaria às partes a possibilidade de resolverem consensualmente o conflito.
Postos estes considerandos, voltemos novamente ao caso que nos ocupa.
Na decisão recorrida propendeu-se para o entendimento de que, tendo o cemitério sido construído quase exclusivamente no prédio da Ré e só ampliado para a parcela, há que aplicar o disposto no artigo 1343º, e não o artigo 1340º do C.Civil.
Será que assim é?
Respigando o quadro factual assente nos autos, sobre este conspecto, resulta que:
7- O presidente da Junta da Freguesia de … fez obras de alargamento do cemitério e construiu a capela funerária;
14- O Sr. F… deu a saber ao Presidente da Junta que cedia, gratuitamente, à Freguesia o terreno necessário, daquele seu prédio, para a execução do projecto de ampliação do cemitério e a construção da casa mortuária;
28- Logo após a devolução dos documentos à ré, esta iniciou a execução, na parcela em causa, das obras de ampliação do cemitério e de construção da casa mortuária;
30- E com a sua execução, toda a parcela cedida pelo pai dos autores ficou ocupada com tais obras”.
Partindo desta factualidade alegam os Autores recorrentes que dela se conclui que todas as obras executadas pela Recorrida de ampliação e construção da capela mortuária ocorreram na parcela de terreno, que então pertencia aos pais dos Recorrentes e, por assim ser, estava completamente afastada a possibilidade de se aplicar ao caso concreto o disposto no artigo 1343.º do Código Civil.
Não se pode, salvo o devido respeito, sufragar semelhante entendimento.
Com efeito, o que dessa factualidade resulta é que, com a execução das referida obras, toda a parcela cedida pelo pai dos autores ficou ocupada, todavia, daí não se pode concluir que essas obras foram implantadas na totalidade na referida parcela, tanto mais que a obra realizada pela recorrida foi apenas uma obra de ampliação do cemitério (e edificação da capela mortuária como construção de apoio ao cemitério), e portanto, cemitério que já se encontrava construído em terreno da recorrida, além de que, ao fazer-se a referida ampliação naturalmente que parte fica já em terreno sobrante do cemitério existente, a menos que em toda a extensão pelo lado da referida ampliação já não existisse qualquer parcela de terreno não ocupado, o que nos parece de todo inverosímil.
Sustentam, todavia, os recorrentes que ainda que seja de aplicar ao caso concreto o artigo 1343.º do CCivil, o certo é que, também a factualidade que nos autos resultou demonstrada não integra o requisito da boa fé da Ré recorrida exigido pelo citado preceito.
Será de acolher o referido entendimento?
Como supra se referiu um dos requisitos da acessão é que que o autor da obra, sementeira ou plantação tenha agido de boa fé (artigos 1340.º, nº 1 e 4 e 1343.º, nº 1 do CCivil).
Há quem pretenda retirar do citado nº 4 do artigo 1340.º a interpretação restritiva de que só existe boa fé, para efeitos da acessão tipificada neste artigo, nas duas situações aí definidas: 1) se o autor da obra desconhecia que o prédio era alheio; 2) ou se foi autorizado pelo dono do terreno a realizar a obra incorporada.[12]
Pensamos, porém, que a expressão “entende-se” referida no citado preceito sugere um conceito mais aberto e mais alargado de boa fé, que vai para além das duas situações ali descritas como mera presunção de boa fé, abrangendo qualquer hipótese em que o autor da incorporação age de boa fé, competindo-lhe, então, o ónus de alegar e provar os factos integradores da boa fé (art. 342.º, n.º 1, do Código Civil).
Neste sentido, escreve Antunes Varela[13] : “Para o código de 1966, que reduziu a boa fé, em matéria de posse, a um conceito de raiz essencialmente psicológica, e cortou decididamente o cordão umbilical que a prendia ao suporte básico do título (ou ao justo título) de aquisição do direito, a posse diz-se de boa fé, quando o possuidor ignorava, ao adquiri-la, que lesava o direito de outrem (art. 1260.º, 1).
(…)
Essencial, de acordo com a nova linha de orientação legislativa, é que o possuidor ignore, ao adquirir a posse, que lesa o direito de outrem.
Quer isto dizer que o possuidor pode perfeitamente saber que o direito não é seu e, apesar disso, possuir de boa fé, desde que aja persuadido de não ofender o direito de terceiro.
(…)
Ora transplantando esta noção psicológica de boa fé, com as adaptações necessárias, da área significativa da posse para o reduto da acessão industrial imobiliária, como exige a unidade do sistema jurídico, fácil é verificar que o novo conceito de boa fé, aceite neste domínio, se ajusta … a (outras) situações”.
A este respeito veja-se ainda o que se escreveu no Ac. do STJ de 08-11-2007 “Não quis o legislador, neste capítulo dedicado à aquisição da propriedade, desviar-se da ideia de boa fé que adoptou em matéria possessória (art. 1260.º, n.º 1).
Dizer-se que age de boa fé, para efeitos de acessão, o que desconhecia que o terreno onde produziu a intervenção era alheio, ou o que interveio debaixo da autorização do dono do terreno, é, pois, o mesmo que dizer-se que assim age (de boa fé) aquele que ignorava, ao intervir em terreno alheio, que lesava o direito de terceiro.
A uniformização dos conceitos de boa fé em matéria de acessão e de posse, … já vinha, aliás, do código anterior, pelo menos desde quando o Assento do STJ de 28-11-69, interpretou o corpo do art. 2306.º do velho código, no sentido de que a boa fé, ali referida, tinha o conteúdo definido no art. 476.º.
O conceito estritamente psicológico de boa fé adoptado pelo actual código simplificou a tarefa do intérprete e aplicador da lei, mas não deixam de se pôr, com alguma frequência, dúvidas, sempre que aquele estado psicológico é referido a uma autorização e não ao desconhecimento de que o objecto da intervenção é alheio.
A autorização não precisa de provir de uma manifestação de vontade expressa; ela, as mais das vezes, insere-se ou resulta de um negócio que pretende envolver a disposição ou oneração do prédio a favor do autor da incorporação”.
Portanto, nenhuma indicação, a nível literal, há na disposição em análise [o n.º 4 do art. 1340.º do Código Civil] que nos leve a pensar estarmos perante uma enunciação taxativa.
Quando o legislador tipifica, máxime quando enumera, e não esclarece, como é o caso, se a tipologia é taxativa ou enunciativa, deverá, em princípio, entender-se, como bem adverte o Professor Oliveira Ascensão,[14] pelo carácter enunciativo e não taxativo da enumeração.
Não existe, pois, obstáculo a que se possa ampliar o conceito de boa fé, para efeito de acessão, de modo a abranger outras situações semelhantes às hipotizadas na lei, igualmente dignas e carenciadas da mesma protecção jurídica.
E é assim que o Professor Menezes Cordeiro, cônscio desta realidade, entende dever aplicar-se à acessão, por analogia, o conceito de boa fé definido no artigo 1260.º do Código Civil.[15]
Nesta perspectiva, também agirá de boa fé quem construir obra em terreno alheio ignorando que lesa o direito de outrem.
Este conceito mais aberto de boa fé também encontra convergência com a noção de acessão industrial imobiliária como “mecanismo de resolução de um conflito de direitos”, acolhida no acórdão do Tribunal Constitucional n.º 205/2000, publicado no D.R. II série, de 30-10-2000. Que fundamenta, dizendo:
A acessão … é uma forma de aquisição do direito de propriedade, que comporta diversas modalidades e ocorre em situações também variadas. Interessa-nos agora, apenas, a hipótese de acessão industrial imobiliária, prevista no n.º 1 do artigo 1340.º do Código Civil.
Considerada esta forma de aquisição no contexto do princípio da tipicidade dos direitos reais (artigo 1306.º do Código Civil) e da definição legal dos limites do direito de propriedade sobre imóveis (...) a acessão constitui, antes de mais, um mecanismo de resolução de um conflito de direitos, gerado pela sobreposição vertical de duas propriedades, a do dono da obra e a do dono do solo onde ela foi incorporada.
Na verdade, perante a ocorrência de uma sobreposição de duas propriedades distintas, não suportada por um direito de superfície validamente constituído (nem em nenhuma outra situação legalmente admitida de sobreposição de propriedades), a lei vem arbitrar o possível conflito daí emergente, mediante a fixação abstracta de um critério de prevalência. Não quis o legislador, neste capítulo dedicado à aquisição da propriedade, desviar-se da ideia de boa fé que adoptou em matéria possessória (art. 1260.º, nº 1).
Este conflito, suscitado pela incompatibilidade entre o direito do proprietário do solo e o direito do autor da incorporação, é para o legislador um conflito inescapável, no sentido de que qualquer solução por ele adoptada, ainda que por simples omissão, irá traduzir-se no sacrifício de um dos direitos em confronto. Na verdade, sempre que se trate de direitos ou pretensões idênticas sobre um mesmo objecto, como sucede na acessão e noutras situações do direito civil, o conflito daí emergente não pode deixar de encontrar uma resposta na lei, seja por via de regras especiais acerca do modo de aquisição e extinção ou oneração de direitos, seja através da aplicação de normas gerais de que resulta a prevalência de um deles”.
Do exposto resulta, assim, dizer-se que age de boa fé, para efeitos de acessão, o que desconhecia que o terreno onde produziu a intervenção era alheio, ou o que interveio debaixo da autorização do dono do terreno, é, pois, o mesmo que dizer-se que assim age (de boa fé) aquele que ignorava, ao intervir em terreno alheio, que lesava o direito de terceiro.
Porém, não obstante, o conceito estritamente psicológico de boa fé adoptado pelo actual código tenha simplificado a tarefa do intérprete e aplicador da lei, não deixam de se pôr, com alguma frequência, dúvidas, sempre que aquele estado psicológico é referido a uma autorização e não ao desconhecimento de que o objecto da intervenção é alheio.
A autorização não precisa de provir de uma manifestação de vontade expressa; ela, as mais das vezes, insere-se ou resulta de um negócio que pretende envolver a disposição ou oneração do prédio a favor do autor da incorporação.
Exemplos de situações típicas de autorização do segundo tipo são o contrato de compra e venda nulo por vício de forma; contrato-promessa de compra e venda, envolvendo a entrega imediata do prédio, para que o promitente-comprador dele se sirva como dono, ou como no caso em apreço de doação nula por vício de forma.

Perscrutando a matéria factual assente nos autos verifica-se que, neste conspecto, se encontra provado que:
“-O Sr. F… deu a saber ao Presidente da Junta que cedia, gratuitamente, à Freguesia o terreno necessário, daquele seu prédio, para a execução do projecto de ampliação do cemitério e a construção da casa mortuária;
- Como contrapartida pretendia que a Junta obtivesse para sua família, um jazigo no cemitério de Jazente.
- E se tal se revelasse impossível devia a ré reservar um jazigo no cemitério de ….
- Decorreram alguns contactos quer telefónicos quer pessoais, entre o pai dos autores e o Presidente da Junta de Freguesia.
- Em 28 de Abril de 2004 o Presidente da Junta de Freguesia de … elaborou um documento denominado “Minuta de Doação” no qual ficaram em branco os espaços destinados à identificação do primeiro interveniente e à identificação do objecto da doação.
- Consta ainda desse documento que “O(s) Primeiros vão Doar ao segundo uma parcela de terreno com a área aproximadamente de _____m2, pertencente ao art._____ da freguesia de …, inscrita na matriz sob o nº _______, para a Ampliação do Cemitério Paroquial de …”.
- Em 21 de Julho de 2004, o Presidente da Junta de Freguesia remeteu-lhe essa minuta destinada a ser preenchida e assinada.
- O pai dos autores preencheu e assinou a referida minuta e devolveu-a ao Presidente da Junta acompanhada dos mesmos elementos que este lhe enviara (a carta e a planta).
- E desde a execução do acordo, nomeadamente após o óbito da mãe dos autores, o Sr. F… sempre confirmou com o Presidente da Junta da ré que o acordo se mantinha.
- Após as últimas eleições autárquicas, tendo sabido da mudança do executivo, o Sr. F… telefonou para o actual Presidente da Junta de … no sentido de confirmar a manutenção dos acordos.
- O que lhe foi confirmado Analisando” (Factos descritos em 14 a 17, 21 a 24 e 33 a 36 fundamentação factual).
Ora, perante este quadro factual, como não dizer que a Ré, ao fazer as obras em causa no terreno em questão, não estava de boa fé nos termos que atrás se deixaram assinalados?
Com efeito, pese embora não esteja provado que a mãe dos Autores tenha dado o seu consentimento para a referida doação, o certo é que, qualquer pessoa, colocada na figura do presidente da Junta de freguesia, seria levada a pensar que, perante a conduta do respectivo cônjuge marido atrás descrita, havia um consentimento tácito por parte do outro cônjuge para a cedência da referida parcela de terreno.
É que, como noutro passo já se referiu, não obstante, a sentença de interdição de fls. 104, tenha fixado o início da incapacidade da mãe dos Autores em Dezembro de 2004, o certo é que, o processo tendente à doação iniciou-se antes de Abril de 2004.
Diante do referido, temos de concluir que a Ré ao intervir no terreno em questão estava consciente que não estava a lesar o direito de propriedade dos pais dos Autores.
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Referem também os recorrentes que não está provado (e não foi alegado) qual era o valor do prédio antes da incorporação e qual o valor do prédio com a nova realidade económica, resultante da incorporação efectuada e, por isso falta também, esse elemento estrutural para que possa ser reconhecida a aquisição com fundamento na acessão imobiliária industrial do artigo
Dúvidas não existem de que, as diversas soluções previstas no artigo 1340.º do Civil, dependem do valor que as obras tiverem trazido à totalidade do prédio, quando comparado com o valor do prédio antes das obras, sendo que, tal valor acrescentado “é dado pela diferença entre o valor da nova realidade económica resultante da incorporação e o valor que o prédio tinha antes”.[16]
Acontece que, como supra se decidiu, o caso em apreço subsume-se na hipótese do artigo 1343.º, do CCivil e, portanto, a aquisição a que tem direito o construtor, não depende da consideração de qualquer valor acrescentado.
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Julgando procedente o pedido reconvencional, a sentença recorrida decidiu que a Junta de Freguesia de … devia pagar aos Autores a soma de € 2.445 euros, justo valor equitativo pela parcela, atendendo ao facto de os autores terem incorrido em venire contra factum proprium, ou seja, ao pretenderem revogar a palavra dos autores da herança.
Neste conspecto, diga-se, desde logo que não se descortina onde exista o venire por parte dos Autores que encontre eco na factualidade dada como provada, pois que, se limitaram a pedir a nulidade da doação feita pelo respectivo progenitor sem observância da forma legal e sem o consentimento da mãe, sendo que, não está provado nos autos que tenham adoptado conduta anterior que levasse a concluir o não exercício de tal direito.
Acresce que, como estatui o artigo 1343.º nº 1 do CCivil já atrás transcrito quando na construção de um edifício em terreno próprio se ocupe, de boa fé, uma parcela de terreno alheio, o construtor pode adquirir a propriedade do terreno ocupado, se tiverem decorrido três meses a contar do início da ocupação, sem oposição do proprietário, pagando o valor do terreno.
Aliás, por assim ser é que a Ré formulou pedido reconvencional solicitado que fosse declarado que adquiriu por acessão industrial imobiliária uma parcela de terreno com a área de 978 m2, desanexada do prédio descrito no nº 5 da petição, que confronta com parte restante do prédio, com parte restante do cemitério paroquial e igreja de …, pagando à ré a quantia de 2.445,00€ correspondente ao valor da parcela.
No que concerne ao valor da parcela ocupada, face à alteração do ponto 38 da fundamentação factual, torna-se evidente que não poderá ser o que foi fixado na sentença recorrida mas sim o de € 12.225,00 (doze mil duzentos e vinte e cinco euros), isto e, 978 m2 x € 12,50.
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Destarte, improcedem as conclusões 14ª a 39ª formuladas pelos recorrentes e procedem as formuladas em 40ª a 47ª e com elas, em parte, o recurso.
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IV-DECISÃO

Pelos fundamentos acima expostos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar a apelação interposta parcialmente procedente por provada e, consequentemente, revoga-se a decisão recorrida na parte em que fixou o valor de € 2.445,00 como sendo o valor a pagar pela Ré aos Autores corresponde ao valor da parcela e consequentemente fixa-se esse valor em € 12.225,00 (doze mil duzentos e vinte e cinco euros)
No mais, mantém-se o decidido pelo tribunal recorrido.
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Custas da apelação por apelantes e apelada na proporção do respectivo decaimento (artigo 527.º, nº 1 do C.P.Civil).
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Porto, 12 de Setembro de 2016.
Manuel Domingos Fernandes
Miguel Baldaia de Morais
Jorge Seabra
_______
[1] De facto, “é sabido que, frequentemente, tanto ou mais importantes que o conteúdo das declarações é o modo como são prestadas, as hesitações que as acompanham, as reacções perante as objecções postas, a excessiva firmeza ou o compreensível enfraquecimento da memória, etc.”-Abrantes Geraldes in “Temas de Processo Civil”, II Vol. cit., p. 201) “E a verdade é que a mera gravação sonora dos depoimentos desacompanhada de outros sistemas de gravação audiovisuais, ainda que seguida de transcrição, não permite o mesmo grau de percepção das referidas reacções que, porventura, influenciaram o juiz da primeira instância” (ibidem). “Existem aspectos comportamentais ou reacções dos depoentes que apenas podem ser percepcionados, apreendidos, interiorizados e valorados por quem os presencia e que jamais podem ficar gravados ou registados para aproveitamento posterior por outro tribunal que vá reapreciar o modo como no primeiro se formou a convicção dos julgadores” (Abrantes Geraldes in “Temas…” cit., II Vol. cit., p. 273).
[2] Miguel Teixeira de Sousa in Estudos Sobre o Novo Processo Civil, Lex, 1997, p. 348.
[3] Cfr. acórdãos do STJ de 19/10/2004, CJ, STJ, Ano XII, tomo III, pág. 72; de 22/2/2011, CJ, STJ, Ano XIX, tomo I, pág. 76; e de 24/9/2013, processo n.º 1965/04.9TBSTB.E1.S1, disponível em www.dgsi.pt.
[4] Cfr. Ac. do S.T.J. de 3/11/2009, processo n.º 3931/03.2TVPRT.S1, disponível em www.dgsi.pt.
[5] Ac. Rel. Porto de 19 de Setembro de 2000, CJ XXV, 4, 186; Ac. Rel. Porto 12 de Dezembro de 2002, Proc. 0230722, www.dgsi.pt
[6] Cfr José Lebre de Freitas A Acção Declarativa Comum – Á Luz do Código Revisto, pag. 228 e Antunes Varela e outros, Manual da Processo Civil, 2ª Ed. pag. 553.
[7] Cfr. a este propósito Antunes Varela e Pires de Lima in C.Civil Anotado, Vol. III, 2ª Ed. , pág. 170 e, A. Santos Justo, in Direitos Reais, 4ª edição, Coimbra Editora, 278-279, que refere que “é o construtor, e não o proprietário do terreno, quem adquire a parcela ocupada”, sendo “titular de um direito potestativo: pode ou não adquiri-la”; e ainda Ac. STJ de 29-10-2013 acessível em www.dgsi.pt.
[8] Antunes Varela obra citada pág. 171.
[9] Cfr. neste sentido Ac. STJ de 07.04.2011 acessível em www.dgsi.pt.
[10] Antunes Varela obra citada pág. 166/167.
[11] Cfr. Quirino Soares, Acessão e Benfeitorias, CJ (STJ), Ano IV (1996), T1, 20 e 21; JOSÉ Oliveira AScenção, Estudos sobre a superfície e a Acessão, “Colecção Scientia Iuridica”, 1973, 50-64 e Direitos Reais, 438-441, Luís Carvalho Fernandes, Lições de Direitos Reais, 331, Menezes Cordeiro, Direitos Reais, 503-504 e ainda Ac. R.C. de 22.11.2005; Acs. STJ de 07.04.2011 e de 09.02.2012 todos acessíveis em www.dgsi.pt.
[12] Cfr. neste sentido acs. do STJ de 17-03-1998, in BMJ, 475, p. 690-703 e de 25-05-99, no BMJ n.º 487, p. 303-308.
[13] In RLJ, ano 125.º, p. 275
[14] In O Direito, Introdução e Teoria Geral, págs. 406 e seguintes.
[15] In Direitos Reais, II, 719, nota 1118.
[16] Cfr. neste sentido Quirino Soares Estudo referido.