Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
93/09.5GBOAZ-A.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: CASTELA RIO
Descritores: AUDIÊNCIA DO ARGUIDO
NULIDADE INSANÁVEL
Nº do Documento: RP2012030793/09.5gboaz-A.P1
Data do Acordão: 03/07/2012
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REC PENAL
Decisão: PROVIDO
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: Consubstancia nulidade insanável a omissão de agendamento para a “Audição de Condenado”, prevista nos artºs 495/2 e 498/3 do CPP.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Na 1ª Secção Judicial / Criminal do TRP acordam
os Juízes no Recurso Penal nº 93/09.5GBOAZ-A.P1:

Submetido B… [nascido a 03.10. 1976] a Julgamento por Tribunal Singular no Processo Sumário 93/09.5GBOAZ do 2JC OAZ[1], a Audiência de Julgamento [2] culminou na SENTENÇA[3] que o condenou em 180 dias de prisão a cumprir em dias livres, correspondente a 36 períodos, cada um deles com a duração de 36 horas e início no 2º fim de semana posterior ao trânsito, pela autoria material pelas 16:50 de 24.02.2009 de um crime (doloso) de condução de veículo automóvel ligeiro de passageiros sem habilitação legal p.p. pelo art 3-2 do DL 2/98 de 3/1 e na acessória responsabilidade tributária processual penal, tendo-se provado que [4]:
………………………………………
………………………………………
………………………………………

Inconformado com o decidido, o ARGUIDO interpôs RECURSO provido pelo ACÓRDÃO de 25.11.2009 [5] que substituiu a pena de 180 dias de prisão em regime de dias livres pela pena de substituição prestação de trabalho gratuito a favor da comunidade durante 180 horas, a ser cumprida durante os dias úteis após o horário normal de trabalho sem exceder em cada dia o permitido pelo regime de horas extraordinárias, aos sábados, domingos e feriados (art 58-4 do CP) no Hospital / Centro de Saúde da área da sua residência.

A TRS [6] da Equipa Porto Penal 4 da DGRS [7] informou em 26.3.2010 [8] quanto a:
………………………………………
………………………………………
………………………………………

A Mma Juiz a quo proferiu DESPACHO em 04.7.2011 [9] com o teor seguinte [10]:
Por douto acórdão do Tribunal da Relação do Porto foi B… na pena de 180 dias de prisão substituídos por 180 horas de trabalho gratuito a favor da comunidade.

No relatório de execução da medida foi dado conhecimento a 23 de Fevereiro de 2011 que o arguido havia ficado de comparecer de 19 de Junho de 2010 em diante, e prestar o respectivo trabalho quinzenalmente durante todo o dia de sábado. Mais se refere que numa fase inicial compareceu e que entretanto deixou de o fazer. Ali consta que inicialmente o arguido foi dando conta dos seus impedimentos e numa fase posterior deixou de justificar por qualquer forma as suas ausências, revelando-se infrutíferas as tentativas de contacto telefónico, efectuadas em deferentes horas para o telemóvel que havia fornecido, assim como as convocatórias enviadas quer para a morada constante dos autos quer para aquela entretanto fornecida pelo condenado.

Conclui-se no referido relatório que “ (...) tendo em conta a manutenção da falta de colaboração por parte de B…, não obstante a disponibilidade da C… para se manter constituída como tal no âmbito do presente processo, afigura-se-nos estarem comprometidos os fins pedagógicos e ressocializadores a que a presente medida se propõe”.

Notificado o arguido do ter do relatório social junto aos autos para que em 10 dias se pronunciasse, advertindo-se que face ao não cumprimento da prestação de trabalho a favor da comunidade se ponderava o cumprimento da pena de prisão. Tendo este sido notificado pessoalmente (fls. 143) este nada disse, ou requereu.

A Digna Magistrada do Ministério Público promoveu o cumprimento pelo arguido da pena de prisão em que foi condenado, nos termos do disposto no art. 59°, n° 2, al. b) do Código Penal.

Solicitada à DGRS informação acerca do período de tempo de trabalho efectivamente prestado, veio a DGRS informar que o arguido cumpriu 24 horas das 180 fixadas nos autos.

Tendo em conta o teor do relatório de execução junto aos autos e em particular o teor que acima se mencionou, verifica-se que o condenado se recusou, sem justa causa, a prestar o trabalho que lhe foi fixado no douto acórdão acima mencionado, não fundamentando por qualquer forma, apesar de notificado para o efeito, a sua recusa em prestar as horas ainda em falta, mostrando-se incontactável perante os técnicos da DGRS.

Assim, verificados que estão os pressupostos estabelecidos no art. 59°, n° 2, a1. b) do Código Penal, decide-se revogara pena de trabalho a favor da comunidade, aplicada em substituição da pena de prisão fixada.

Nos termos do disposto no n° 4 do art. 59° do Código Penal, o Tribunal haverá que descontar no tempo de prisão a cumprir os dias de trabalho já prestados, de acordo com o n° 3 do art. 57° do Código Penal, ou seja, cada hora de trabalho prestado corresponderá a um dia de prisão a descontar.

Assim, tendo o arguido cumprido 24 horas de trabalho, terão que lhe ser descontados 24 dias de prisão, ficando por cumprir 156 dias de prisão.

Em face de todo o exposto, e nos termos do art. 59º, n° 2, al. b) e n° 4 do Código Penal, revogo a pena de trabalho a favor da comunidade aplicada em substituição da pena de prisão e em consequência determino que o arguido cumpra 156 dias de prisão.

Notifique e, após trânsito em julgado do presente despacho, emita os competentes mandados de detenção e condução do arguido ao estabelecimento prisional.

Inconformado com o decidido, tempestivamente o ARGUIDO interpôs RECURSO conforme Declaração de interposição com Motivação [11] rematada com 4 CONCLUSÕES delimitadoras [12] de objecto do Recurso e poderes de cognição deste TRP, as quais seguidamente se transcrevem ipsis verbis [13]:

1. O arguido não foi notificado do teor do relatório de folhas 131 e 132 dos autos, desconhecendo-o em absoluto, e não lhe tendo sido dada a possibilidade de se pronunciar sobre o mesmo, o que deverá acarretar a revogação do douto despacho recorrido, por violação do artigo 59° n°2 do Código Penal.

2. Conforme consta do relatório de folhas 131 e 132 dos autos, o arguido sempre mostrou vontade e motivação para cumprir a prestação de trabalho a favor da comunidade, não existindo elementos suficientes nos autos para que o Tribunal a quo chegue à conclusão de que o arguido se recusou a prestar o trabalho, pois se o arguido tivesse sido notificado do relatório justificaria a não prestação do trabalho e prestaria o período ainda em falta, devendo-se conceder integral provimento ao presente recurso, e revogando-se o douto despacho de folhas ... dos autos, de 4 de Julho de 2011, por violação do artigo 59° n° 2, alínea b) do Código Penal.

3. O julgador tem o poder-dever de, consideradas as exigências de cada caso concreto, preterir as penas privativas da liberdade face às não privativas da liberdade, e dentro daquelas optar pelas menos estigmatizantes, pelo que o Tribunal a quo tinha também o dever de indagar o arguido quanto à aceitação da substituição da pena de prisão por outras medidas, tais como o regime de semi-detenção, a prisão por dias livres e a obrigação de premanência na habitação, o que não fez, pelo que se impõe a modificação da decisão do tribunal a quo, por violação do preceituado nos artigos 43°, 44º, 46°, 58° e seguintes, 70° e 71° do Código Penal;

4. Termos em que, deverá conceder-se integral provimento ao presente recurso, substituindo-se o douto despacho recorrido por outro em que, aderindo aos argumentos supra expostos, se aplique ao arguido, pela prática do crime de condução de veículo sem habilitação legal, p.p. art. 3°, n.° 1 do DL 2/98 de 03 de Janeiro, prisão por dias livres, o regime de semidetenção ou a obrigatoriedade de permanência na habitação, conforme dispõem os artigos 44°, 45°, 46° e 70° do Código Penal, assim se fazendo sã e inteira Justiça.
NOTIFICADO o Ministério Público para responder conforme arts 411-6 e 413-1 do CPP, tempestivamente a Sra Procuradora Adjunta RESPONDEU [14] concluindo [15] que:

1. Bem andou o Tribunal a quo ao ter revogado a pena de prestação de trabalho a favor da comunidade e ao ordenar o cumprimento da pena de prisão determinada no Acórdão, descontado os dias de trabalho já cumpridos pelo arguido, nos termos do disposto nos artigos 59.°, n.° 2, alínea b) e n.° 4 do Código Penal.

2. Não foi preterido o direito de audição do arguido, plasmado no artigo 61.°, n.° 1, alínea b) do Código Penal uma vez que este, ao contrário do que afirma, foi notificado pessoalmente a fls. 143, do teor do relatório da DGRS de fls. 131 e 132 para que se pronunciasse em 10 dias, dando-se conta, nesse acto de notificação, que estava em causa a ponderação sobre a revogação da pena substitutiva e o cumprimento efetivo da pena de prisão em que foi condenado nestes autos.

3. Não será de ponderar na presente fase processual - após a revogação de uma pena de substituição da pena de prisão com determinação de efetivo cumprimento desta última - a aplicação do regime de permanência na habitação, a prisão por dias livres ou o regime de semidetenção, uma vez que o momento próprio para tal é o da sentença condenatória, face à sua natureza de efetivas penas de substituição e já não modos de execução da pena de prisão.

4. O despacho judicial recorrido não violou o disposto no artigo 59.°, n.°2, alínea b) do Código Penal, nem o disposto nos artigos 44.° a 46.° e 70.°, todos do mesmo diploma legal.

● Assim, negando-se provimento ao recurso interposto pelo arguido e mantendo-se a decisão revogatória recorrida nos precisos termos, farão V.as Ex.as JUSTIÇA.

ADMITIDO o Recurso a subir imediatamente, em separado e com efeito suspensivo apenas do Despacho recorrido para este TRP conforme arts 399, 401-1-b, 407-2-b, 406-2, 408-2-c e 427 do CPP [16],

Em Vista conforme art 416-1 do CPP o Exmo Procurador Geral Adjunto emitiu PARECER [17] … no sentido de que deve ser negado provimento ao recursoporquanto Subscrevo as considerações que tece a Exma Procuradora adjunta na sua resposta à motivação | De facto o incumprimento por parte do recorrente quanto à obrigação que lhe foi imposta, mas que aceitou, de trabalho a favor da comunidade foi desleixado, numa primeira fase, foi repetido e, na última fase, foi … por se negar ao contacto e ao acompanhamento por parte das técnicas de Reinserção social, como se vê do relatório aqui documentado a fls. 64 e 65”.

NOTIFICADO o Defensor do Arguido para se pronunciar, querendo, em 10 dias conforme art 417-2 do CPP, NÃO o fez.

Na oportunidade efectuado EXAME PRELIMINAR e colhidos os VISTOS LEGAIS os autos foram submetidos à CONFERÊNCIA.
APRECIANDO:

Consabido jus penalmente que O tribunal revoga a pena de prestação de trabalho a favor da comunidade e ordena o cumprimento da pena de prisão determinada na sentença se o agente, após a condenação: … Se recusar, sem justa causa, a prestar trabalho …(art 59-1-b-I do Código Penal), processual penalmente importa ter presente que À … revogação …. é correspondentemente aplicável o disposto nos nºs 2 … do artigo 495º(art 498-3 do CPP) conforme o qual O tribunal decide por despacho, depois de recolhida a prova, obtido parecer do Ministério Público e ouvido o condenado na presença do técnico que apoia e fiscaliza o cumprimento das condições …(art 495-2 do CPP),

Pelo seu objecto tratando-se de uma “míni” Audiência de Julgamento restrita ao incidente do in/cumprimento pelo Condenado da «Prestação de Trabalho a favor da Comunidade» qual pena de substituição da pena principal de prisão contínua ou ininterrupta em Estabelecimento Prisional por que a revogação que competir daquela determina o cumprimento da pena de prisão fixada na Decisão Final condenatória que é a Sentença ou Acórdão ex vi art 97-1-a-2 do CPP quando não competir Substitui[r] a pena de prisão fixada na sentença por multa até 240 dias, aplicando-se correspondentemente o disposto no n.° 2 do artigo 43.°; ou Suspende[r] a execução da pena de prisão determinada na sentença, por um período que fixa entre um e três anos, subordinando-a, nos termos dos artigos 5l.° e 52.°, ao cumprimento de deveres ou regras de conduta adequadospossíveis quando … o agente não puder prestar o trabalho a que foi condenado por causa que lhe não seja imputávele … conforme o que se revelar mais adequado à realização das finalidades da punição(art 59-6-a-b do Código Penal).

Assim, lembra-se que “A aplicação de penas [principal ou de substituição e acessória] …visa a protecção de bens jurídicos [fim-último do Direito Criminal-Penal mediant]e [aquelas como fim-meio d]a reintegração do agente na sociedade” (art 40-1)[18] sem “Em caso algum a pena pode[r] ultrapassar a medida da culpa” (art 40-2) quais vectores da “…determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, …em função da culpa do agente e das exigências de prevenção” (art 71-1) às quais reconhecem-se as funções de retribuição do crime (por expiação da pena)[19], prevenção especial positiva (de ressocialização por prevenção da reincidência do agente)[20], prevenção especial negativa (de dissuasão por intimidação do agente)[21], prevenção geral positiva ou de integração [por (aprofundamento da) interiorização dos bens jus penais[22] e restabelecimento ou revigoramento da confiança da comunidade na efectiva tutela penal estatal dos bens jurídicos fundamentais à vida colectiva e individual][23] e prevenção geral negativa de intimidação (por dissuasão de potenciais criminosos)[24].

Consabido que a «Audição de Condenado» nos termos e para os efeitos do art 495-2 ex vi art 498-3 do CPP, para a qual o Condenado tem de ser atempadamente notificado para poder naquela comparecer a fim de então apresentar pessoalmente de viva voz causa, circunstância, facto, motivo e ou razão de um, até então apenas indiciado, não cumprimento integral e efectivo «sem justa causa» da pena de substituição, envolve dialecticamente a prestação de informações pelo TRS, a oportunidade da prestação pelo Condenado de declarações que entender a sua defesa a perguntas de Tribunal, Ministério Público e Defensor, a prestação de esclarecimentos pelo TRS, a apreciação do conteúdo de declarações e informações e esclarecimentos com demais meios de prova que forem produzidos, o Parecer do Ministério Público e a oportunidade de apresentação de uma Oposição pelo Defensor do Arguido sob os princípios da publicidade, da oralidade, da concentração e da investigação atinentes à produção de prova e sob os princípios da livre apreciação da prova, da imediação, da presunção de inocência e do in dúbio pro reo atinentes à Decisão do estrito incidente.

Pelos objecto e conteúdo penalmente substantivos da «Audição de Condenado» nos termos e para os efeitos do art 495-2 ex vi art 498-3 do CPP não se subscreve a compreensão processual penalmente redutora, da omissão de tal diligência, sufragada no ARL de 17.10.2007, Carlos Almeida no Processo 8135/2007-3, conforme a qual “I - A violação do princípio do contraditório imposto, para além do mais, pelo n.° 2 do artigo 495.° do Código de Processo Penal, constitui irregularidade processual exterior e prévia ao despacho recorrido. Não é um vício que directamente lhe respeite e que, portanto, possa ser corrigido através do recurso interposto do despacho proferido. II - Se o recorrente pretendia a correcção do procedimento adoptado e o respeito pelo princípio do contraditório, como era seu direito, deveria então, em vez de recorrer do despacho proferido, ter arguido tempestivamente a irregularidade cometida perante o tribunal de 1ª instância, interpondo do despacho que viesse a ser proferido, caso o mesmo não lhe fosse favorável, o competente recurso. III - O reconhecimento da irregularidade pelo tribunal de 1.ª instância ou pelo Tribunal da Relação determinaria a invalidade dos actos que o seu cometimento tinha afectado, entre os quais se contava o despacho recorrido. IV — Não podia era o recorrente, através da impugnação do despacho proferido sobre a questão da revogação ou não da suspensão da pena, pretender obter a declaração de uma irregularidade processual prévia que oportunamente não arguiu”.

Diversamente, emergindo de objecto e conteúdo da «Audição de Condenado» nos termos e para os efeitos do art 495-2 ex vi art 498-3 do CPP a obrigatoriedade da audição prévia do Condenado a possível revogação da «Prestação de Trabalho a favor da Comunidade» tal como da outra pena de substituição «Suspensão da execução da pena de prisão» como vem sendo jurisprudencialmente afirmado, congruentemente entende-se que O arguido deve ser ouvido, independentemente do motivo da revogação da suspensão, sob pena da nulidade do artigo 119.°, alínea c), uma vez que a lei não relaciona a audição do arguido com nenhum motivo em especial. Aliás, interpretação diversa prejudicaria os direitos da defesa e o princípio do contraditório, sendo por isso de preferir interpretação conforme à CRP (acórdão do TRE, de 22.2.2005, in CJ, XXX, 1, 267, e acórdão do TRL, de 1.3.2005, in CJ, XXX, 2, 123, mas contra, sem razão, acórdão do TRP, de 8.2.2006, in CJ, XXXI, 1, 206, e acórdão do TRC, de 9.5.2007, in CJ, XXXII, 3, 51)” [25].

Da sinopse processual penal supra efectuada ressuma claramente que o Tribunal a quo omitiu agendamento da diligência «Audição de Condenado» que obrigatoriamente competia ter provido nos termos e para os efeitos do art 495-2 ex vi art 498-3 do CPP, tendo proferido Despacho revogatório da pena de substituição «Suspensão da execução da pena de prisão» ao ter olvidado por manifesto lapso aquela remissão legislativa no decurso da tramitação processual penal efectuada.
É certo que o Tribunal a quo detinha nos autos processuais o Relatório de Incumprimento de 23.02.2011 concluindo que Face ao exposto e tendo em conta a manutenção da falta de colaboração por parte de B…, não obstante a disponibilidade da C… para se manter constituída como tal no âmbito do presente processo, afigura-se-nos estarem comprometidos os fins pedagógicos e ressocializadores a que a presente medida alternativa se propõee que o Condenado foi notificado em 19.5.2011, por contacto pessoal por Chefe da Esquadra de … da PSP do COMETPOR, para, querendo, se pronunciar em 10 dias … nos termos doutamente promovidos a fls. 136…conforme a qual Renovamos p. de fls. 133, devendo o arguido ser notificado pessoalmente pela entidade policial da área da sua residência para além da já efectuada ao defensor oficioso advertindo-o que se pondera, face ao não cumprimento da prestação de trabalho a favor da comunidade, que o mesmo cumpra os 180 dias de prisão. | Face às duas moradas constantes nos autos – a do TIR a fls. 5 e a mais recente indicada no relatório de fls 131, p. sejam indicadas estas duas às entidades policiais, bem como o nº de telemóvel indicado pelo próprio a fls. 50”.

Se a providência do Relatório de Incumprimento de 23.02.2011 conforma-se ao sentido substancialmente expresso, a propósito da «Suspensão da execução da pena de prisão» mas com pertinência in casu mercê da remissão do art 498-3 para o art 495-2 do CPP, no ARC de 07.5.2003, João Trindade no Processo 612/03 conforme o qual “I - Na perspectiva da alínea b) do art. 56.° do C.P. independentemente da obrigatoriedade da audição prévia do condenado, deve o tribunal antes de ordenar a revogação da suspensão, proceder a diligências tendentes a averiguar das razões ou motivos que levam o condenado a delinquir novamente. II - A não revogação automática, implica algo mais que uma simples notificação ao arguido para justificar o não cumprimento da obrigações que lhe foram impostas. É necessário que o Juiz reúna os elementos necessários para, em consciência, tomar uma decisão que vai afectar a liberdade do condenado, já que a prisão é um mal que deve reduzir-se ao mínimo necessário. III - O tribunal cumpre todas as obrigações processuais criando a condições necessárias para proferir despacho de apreciação nos termos do art. 56.° do C.P. se enceta várias diligências tendentes a tomar declarações ao arguido e este não é encontrado, não só na morada que consta dos autos como em outras obtidas junto das autoridades”,

A omissão de agendamento da diligência «Audição de Condenado» que obrigatoriamente competia ter provido nos termos e para os efeitos do art 495-2 ex vi art 498-3 do CPP constitui a «nulidade insanável» do art 119-1-c do CPP conforme o qual Constituem nulidades insanáveis, que devem ser oficiosamente declaradas em qualquer fase do procedimento, além das que como tal forem cominadas em outras disposições legais: … A ausência do arguido ou do seu defensor, nos casos em que a lei exigir a respectiva comparência que abrange não só os casos da obrigatoriedade de comparência do Arguido no Debate Instrutório (art 300) e em Audiência de Julgamento (art 332) que, a final, até podem ter lugar na ausência por não comparência do Arguido mas também o caso da «Audição de Condenado» nos termos e para os efeitos do art 495-2 ex vi art 498-3 do CPP compreendidos à luz da fórmula do art 32-1 da CRP conforme o qual O processo criminal assegura todas as garantias de defesa …entendido como, … sobretudo, uma expressão condensada de todas as normas restantes deste artigo, que todas elas são, em última análise, garantias de defesa. Todavia, este preceito introdutório serve também de cláusula geral englobadora de todas as garantias que, embora não explicitadas nos números seguintes, hajam de decorrer do princípio da protecção global e completa dos direitos de defesa do arguido em processo criminal. Em «todas as garantias de defesa» engloba-se indubitavelmente todos os direitos e instrumentos necessários e adequados para o arguido defender a sua posição e contrariar a acusação. Dada a radical desigualdade material de partida entre a acusação (normalmente apoiada no poder institucional do Estado) e a defesa, só a compensação desta, mediante específicas garantias, pode atenuar essa desigualdade de armas. Este preceito pode, portanto, ser fonte autónoma de garantias de defesa. Em suma, a «orientação para a defesa» do processo penal revela que ele não pode ser neutro em relação aos direitos fundamentais (um processo em si, alheio aos direitos do arguido), antes tem neles um limite infrangível” [26].

In casu releva-se que a revogação da pena de substituição «Prestação de Trabalho a favor da Comunidade» fundamentou-se no facto de … o condenado se recusou, sem justa causa, a prestar o trabalho que lhe foi fixado no douto acórdão [de 25.11.2009 desta 1ª secção do TRP] acima mencionado, não fundamentando por qualquer forma, apesar de notificado para o efeito, a sua recusa em prestar [as 156 das 180] horas ainda em falta, mostrando-se incontactável perante os técnicos da DGRS quando a conscienciosa Decisão do incidente do in/cumprimento da pena de substituição «Prestação de Trabalho a favor da Comunidade» é precedido de «Audição de Condenado» que obrigatoriamente competia ter sido a quo provido nos termos e para os efeitos do art 495-2 ex vi art 498-3 do CPP como único modo processual penalmente possível de asseverar o imperativo constitucional.

Tanto assim que o Recorrente relevou na Motivação de Recurso, além do facto objectivo que … o arguido não foi notificado do teor do relatório de folhas 131 e 132 dos autos, desconhecendo em absoluto o mesmo”, também o decisivo facto, apresentado conclusiva posto que argumentativamente, … de não ter sido dada a possibilidade ao arguido de se pronunciar sobre tal relatório antes de ser revogada a prestação de trabalho a favor da comunidade …como não foi pelo facto processual penalmente decisivo de nunca ter sido agendada «Audição de Condenado» que obrigatoriamente competia ter sido a quo provida nos termos e para os efeitos do art 495-2 ex vi art 498-3 do CPP.

TERMOS EM QUE:

1. No provimento do Recurso do Condenado B… pela procedência da nulidade insanável do art 119-1-c do CPP por omissão total da diligência «Audição de Condenado» que obrigatoriamente competia nos termos e para os efeitos do art 495-2 ex vi art 498-3 do CPP, revogam o Despacho recorrido que deverá ser substituído por outro que agende tal diligência seguindo-se todos os legais termos que processual penalmente competem.
2. Sem tributação conforme art 513-1 do CPP por o Recorrente não ter decaído.
3. Notifiquem-se os Sujeitos Processuais conforme art 425-6 do CPP.
4. Transitado, remeta-se ao 2JCOAZ para execução do decidido.

TRP, 07 de Março de 2012
José Manuel da Silva Castela Rio
Joaquim Maria Melo de Sousa Lima
__________________
[1] 2º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Oliveira de Azeméis.
[2] Realizada na presença pela comparência do Arguido na Sessão de prova de 19.3.2009.
[3] Na Acta de 19.3.2009 a fls. 26-38 do SUM / 20-32 deste Recurso em Separado.
[4] Conforme scanerização do Relator.
[5] A fls. 96-102 do SUM / 33-39 deste Recurso em Separado.
[6] Técnica de Reinserção Social.
[7] Direcção Geral de Reinserção Social do Ministério da Justiça.
[8] Conforme scanerização pelo Relator do Relatório a fls 118-120 do SUM / 40-42 deste Recurso.
[9] A fls. 148-149 do SUM / 01-02 deste Recurso em Separado.
[10] Conforme scanerização do Relator.
[11] A fls. 154 a 159 do SUM / 03 a 08 deste Recurso em Separado.
[12] Conforme consabidas Jurisprudência reiterada dos Tribunais Superiores (vg STJ 28.4.1999, CJS 2/99 pág 196) e Doutrina processual penal (vg GERMANO MARQUES DA SILVA, Curso de Processo Penal, III, 3ª edição, Verbo, 2000, pág 347).
[13] Por scanerização pelo Relator.
[14] A fls. 161 a 169 do SUM / 09 a 17 deste Recurso em Separado.
[15] Conforme scanerização do Relator.
[16] Por Despacho de 19.10.2011 a fls. 170 do SUM / 18 deste Recurso em Separado.
[17] A fls. 61 deste Recurso em Separado.
[18] Sequentemente, “A execução da pena de prisão, servindo a defesa da sociedade e prevenindo a prática de crimes, deve orientar-se no sentido da reintegração social do recluso, preparando-o para conduzir a vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes” (art 42-1), congruentemente, “A execução das penas…visa a reinserção do agente na sociedade, preparando-o para conduzir a vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes, a protecção de bens jurídicos e a defesa da sociedade” (art 2-1), “A execução, na medida do possível, evita as consequências nocivas da privação da liberdade e aproxima-se das condições benéficas da vida em comunidade” (art 2-5) e “promove o sentido de responsabilidade do recluso, estimulando-o a participar no planeamento e na execução do seu tratamento prisional [segundo “os princípios da especialização e da individualização”] e no seu processo de reinserção social, nomeadamente através de ensino, formação, trabalhão e programas” (art 2-6-5, estes do CEP).
[19] Lembram-se os arts 54 [“Para prevenção e repressão dos crimes haverá penas”] e 84 [cuja “aplicação …, entre os limites fixados na lei para cada uma, depende da culpabilidade do delinquente, tendo-se em atenção a gravidade do facto criminoso, os seus resultados, a intensidade do dolo, os motivos do crime e a personalidade do delinquente”] do CP de 1886 revisto pelo DL 39 688 de 05.6.54 claramente fazendo depender a medida da pena da medida da culpado infractor a reprimir.
[20] Que “não significa uma espécie de “lavagem ao cérebro”, i. é, uma substituição da “mundividência” do condenado pela “mundividência” dominante na sociedade, mas, sim e apenas, uma tentativa de interpelação e consequente auto-adesão do delinquente à indispensabilidade social dos valores essenciais (bens jurídico-penais) para a possibilitação da realização pessoal de todos e de cada um dos membros da sociedade. Em síntese, significa uma prevenção da reincidência. Esta função da pena implica, como é evidente, profundas alterações das condições físicas e pessoais (como a estrutura arquitectónica dos estabelecimentos prisionais, e a ocupação do tempo em actividades profissionais e culturais) em que, geralmente, é cumprida a pena de prisão; caso contrário, esta finalidade - que, repetida e nomeadamente no caso português, tem sido considerada essencial para que a pena seja verdadeiramente um meio de protecção dos bens jurídicos - não se cumprirá, tomando-se, pelo contrário, a prisão em meio de dessocialização ou de agravamento da desintegração social do delinquente” (AMÉRICO TAIPA DE CARVALHO, Direito Penal, § 97).
[21] “conatural à pena, e constitui também uma função da pena, que em nada é incompatível com a referida função positiva de ressocialização. É que não se trata de intimidar por intimidar, mas sim de uma dissuasão (através do sofrimento que a pena naturalmente contém) humanamente necessária para reforçar no delinquente o sentimento da necessidade de se auto - ressocializar, ou seja, de não reincidir. E, no caso de infractores ocasionais, a ter de ser aplicada uma pena, é esta mensagem punitiva dissuasora o único sentido da prevenção especial” (AMÉRICO TAIPA DE CARVALHO, Direito Penal, § 98).
[22] Pela pena como “um meio de interpelar, a sociedade e cada um dos seus membros, para a relevância social e individual do respectivo bem jurídico tutelado penalmente; …função da pena [que] começa por se realizar com a criação da lei criminal-penal (interpelação legal) e consuma-se com a aplicação judicial da pena e sua execução (interpelação judicial e fáctica). | Naturalmente que quanto mais importante for o bem jurídico, mais intensa deve ser a interpelação. E, por isto, necessariamente que quanto mais grave for o crime (mais valioso o bem jurídico a proteger) mais grave terá de ser a pena legal, e, no geral, também maior a pena judicial. | Esta dimensão de interiorização torna-se mais necessária relativamente às condutas lesivas de bens jurídicos que, embora merecedores da tutela penal, a consciencialização da sua importância, para a vida da sociedade e das pessoas, ainda não é suficientemente profunda e generalizada. Tal é o caso de muitos dos bens jurídicos protegidos pelo direito penal secundário ou económico-social” (AMÉRICO TAIPA DE CARVALHO, Direito Penal, § 102).
[23] “mensagem de confiança e de pacificação social…dada, especialmente, através da condenação penal, enquanto reafirmação efectiva da importância do bem jurídico lesado” com “a dimensão ou objectivo da pacificação social” (AMÉRICO TAIPA DE CARVALHO, Direito Penal, § 102).
[24] Por ser tão “irrealista considerar que a dissuasão individual não é uma função (um “fim”) da pena” como “afirmar que a dissuasão geral não é um dos sentidos ou funções da pena, mas somente um seu efeito lateral” (AMÉRICO TAIPA DE CARVALHO, Direito Penal, § 103).
[25] PAULO PINTO DE ALBUQUERQUE, Comentário do Código de Processo Penal, 2ª edição, Universidade Católica Editora, Lisboa, Maio 2008, pág 1250, anotação 2 ao art 495 do CPP.
[26] J J GOMES CANOTILHO, VITAL MOREIRA, Constituição da República Portuguesa Anotada, I, 4ª edição, Coimbra Editora, Janeiro de 2007, pág 516.