Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | DOMINGOS MORAIS | ||
Descritores: | ACÇÃO DE PROCESSO COMUM ARTICULADO SUPERVENIENTE AMPLIAÇÃO DO PEDIDO REQUISITOS DECLARAÇÕES DE PARTE PRINCÍPIO DA VERDADE MATERIAL ANULAÇÃO DO PROCESSADO | ||
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Nº do Documento: | RP202112153675/20.0T8VNG.P1 | ||
Data do Acordão: | 12/15/2021 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | ANULADA A SENTENÇA RECORRIDA | ||
Indicações Eventuais: | 4.ª SECÇÃO (SOCIAL) | ||
Área Temática: | . | ||
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Sumário: | I - A cumulação sucessiva de pedidos e de causas de pedir, prevista no artigo 28.º do Código de Processo do Trabalho, não se confunde com a alteração e ampliação do pedido e da causa de pedir a que se reportam os artigos 264.º e 265.º do Código de Processo Civil. II - A ampliação do pedido deve ser admitida, se requerida: (i) até ao encerramento da audiência de julgamento; (ii) se essa ampliação for o desenvolvimento ou a consequência do pedido primitivo. III - Caso a parte tenha apresentado no articulado inicial, requerimento de declarações de parte com a discriminação dos factos sobre que hão-de recair, não preclude o direito de ampliar o âmbito factual de tais declarações, até ao início das alegações orais em 1.ª instância, sobre factos em que tenha intervindo pessoalmente ou de que tenha conhecimento directo, independentemente, do momento temporal da intervenção ou do conhecimento. IV - O princípio da verdade material tem subjacente o princípio do inquisitório, que se caracteriza, na sua essência, pelo princípio da prevalência do mérito sobre meras questões de forma e conjuga-se com o previsto reforço dos poderes de direcção, agilização, adequação e gestão processual do juiz, no sentido de que toda a actividade processual deve ser orientada para propiciar a obtenção de decisões que privilegiem o mérito ou a substância sobre a forma. V - O indeferimento da ampliação do pedido, verificados os dois requisitos descritos no ponto II., e o indeferimento da ampliação das declarações de parte, têm como consequência a anulação do processado desde, pelo menos, a audiência de discussão e julgamento, para prova, conhecimento e decisão na 1.ª instância do objecto do pedido ampliado, bem como dos factos objecto da ampliação das declarações de parte. | ||
Reclamações: | |||
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Decisão Texto Integral: | Proc. n.º 3675/20.0T8VNG.P1 Origem: Comarca Porto -VNGaia-Juízo Trabalho-J2 Relator - Domingos Morais - Registo 943 Adjuntos - Paula Leal Carvalho Rui Penha Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto: I – Relatório 1. - B… intentou acção comum emergente de contrato individual de trabalho, na Comarca Porto-VNGaia-Juízo Trabalho-J2, contra C…, Lda., alegando, em resumo, que: A Autora foi admitida a trabalhar sob a autoridade e direcção da Ré, no dia 01 de fevereiro de 2019, através de contrato de trabalho a termo, não justificado, com a duração de 9 meses, renovável por iguais períodos de tempo, para exercer a função de operadora de posto. A Autora soube que estava grávida em abril de 2019 e imediatamente informou a Ré deste facto. Por carta datada de 25 de setembro de 2019 e recepcionada pela Autora no dia 27 de setembro de 2019, a Ré comunicou a caducidade do contrato de trabalho a termo, com efeitos a partir do dia 31 de outubro de 2019. Terminou, pedindo: “deve a ação ser julgada inteiramente procedente, por provada e, por via dela: 1.º Ser declarada a existência de contrato sem termo entre a Autora e a Ré; 2.º Ser declarada a ilicitude do despedimento da Autora; 3.º Ser a Ré condenada a pagar indemnização nunca inferior a três meses de retribuição pelo despedimento ilícito (1905,00€), acrescida de juros de mora, 4.º 540,00€ relativo ao proporcional do subsídio de férias, acrescido do montante de juros vencidos de 7,81€; 5.º 540,00€ relativo ao proporcional da retribuição do período de férias, acrescido do montante de juros vencidos de 7,81€; 6.º 104,51€ relativo ao subsídio de Natal, acrescido do montante de juros vencidos de 1,51€; 7.º 78,52€ relativo ao desconto ilícito na remuneração, acrescido do montante de juros vencidos de 1,14€; 8.º 5.000,00€ de indemnização por danos não patrimoniais. 9.º Ser a Ré condenada a pagar à Autora os salários intercalares desde a data do despedimento até trânsito em julgado da sentença. Perfazendo um total de 8.178,49€, acrescido de juros de mora vencidos e vincendos, à taxa legal, sobre cada uma das quantias de que a Ré é devedora.”. 2. - Frustrada a conciliação na audiência de partes, a ré contestou, “assumindo que efectivamente do mesmo não consta a cláusula justificativa da contratação a termo certo.”, (…), “devendo apenas e só a indemnização por inexistência da cláusula justificativa da contratação a termo certo.”. No mais, pede a sua absolvição. 3. - No despacho saneador, foi fixado o valor da acção em €8178,49. 4. - A autora deduziu articulado superveniente e ampliou o pedido: “o ponto 3 do pedido deve ser ampliado para “Deve a R. ser condenada a pagar indemnização nunca inferior a seis meses de retribuição pelo despedimento ilícito (3.810,00 €).””. 5. – A ré respondeu pelo indeferimento do articulado superveniente. 6. – A Mma Juiz despachou: “Articulado ref. 36773456 de 13.10.2020: A Autora apresentou articulado superveniente nos termos do artigo 588º do CPC com a consequente ampliação do pedido e da causa de pedir nos termos do artigo 265º, todos do CPC. Para o efeito alega que aceita a confissão da Ré no artigo 27º da contestação de que o despedimento se deveu a “deslealdade profissional da Autora para com a entidade patronal”. Entende que por força do alegado pela Ré o despedimento da A. teve como fundamento facto imputável ao trabalhador e não se deveu à verificação do termo do contrato e respetiva oposição à renovação por parte da entidade empregadora. Mais refere que do documento apresentado na contestação, da comunicação à CITE não resulta a comunicação da caducidade do contrato de trabalho a termo mas sim a não renovação do contrato a termo pelo motivo da trabalhadora não corresponder às funções que posto de trabalho exige. Invoca que tais factos são anteriores à data da propositura da ação mas cujo conhecimento apenas chegou à A. com a notificação da contestação e têm interesse para a causa. Refere que, segundo a Ré, a cessação do contrato teve como fundamento facto imputável ao trabalhador e a não oposição à renovação do contrato de trabalho a termo serviu unicamente para camuflar as verdadeiras razões para camuflar o despedimento da trabalhadora – a circunstância dela estar grávida. Alega que o despedimento é ilícito nos termos do artigo 381º com efeitos no artigo 389º do CT, pelo que de acordo com o disposto no artigo 63º, nº 2 e 8 do CT, atrabalhadora poderá ter direito a uma indemnização entre 30 a 60 dias de retribuição base, nunca inferior a 6 meses de retribuição base. Conclui reclamando a ampliação do ponto 3 do pedido pedindo a condenação da Ré no pagamento de indemnização nunca inferior a seis meses de retribuição pelo despedimento ilícito. A questão jurídica invocada da possibilidade de ampliar os pedidos e a causa de pedir é tratada no Código de Processo de Trabalho. O artigo 60º, nº 3 do CPT admite a apresentação de articulado superveniente nos termos do artigo 588º do CPC ou para os efeitos do disposto no artigo 28º do CPT, reportando este normativo a factos ocorridos antes da propositura da ação, desde que a Autora justifique a sua não inclusão na p.i. Nos termos do artigo 588º do Código de Processo Civil, os factos constitutivos, modificativos ou extintivos do direito que forem supervenientes podem ser deduzidos em articulado posterior ou em novo articulado, pela parte a quem aproveitam, até ao encerramento da discussão. Não cremos que subsistam quaisquer factos que só agora seja do conhecimento da A., suscetíveis de determinar a alteração do pedido. Em sede de petição inicial, a A. já alegava que, aquando da cessação do contrato de trabalho, se encontrava grávida e isso era do conhecimento da entidade patronal (artigo 71º e 72º), invocando o incumprimento do disposto no artigo 63º do CT, nomeadamente a falta do pedido pela entidade patronal do parecer prévio à CITE, concluindo pela ilicitude do despedimento nos termos da alínea d) do artigo 381º do CT, aludindo ainda à presunção prevista no nº 2 do artigo 63º do CT. Porém, nenhuma conclusão retirou ao nível da indemnização peticionada, não requerendo sequer um agravamento da mesma a 45 dias de retribuição. Aliás, caricatamente alude nos artigos 112º e 121º à circunstância da indemnização dever ser fixada em 60 dias de retribuição; porém, nos artigos 122º e 123º alude à retribuição mensal auferida e conclui, tal como no pedido final, pela condenação da Ré no pagamento da indemnização correspondente a um mínimo de três meses de retribuição, indemnização essa, portanto calculada a 30 dias, ao abrigo do artigo 391º, nº 3 do CT. Repete-se: a circunstância da Autora estar grávida na altura da cessação do contrato e o alegado incumprimento do disposto no artigo 63º do CT já havia sido invocado em sede de petição inicial. Aliás, em 152º artigos alegados, chega a A a fazer uma prelecção sobre o direito à maternidade e paternidade, a posição desfavorecida da trabalhadora grávida, a sua proteção constitucional, a existência de tratamento discriminatório e nenhuma consequência foi daí retirada no pedido formulado a título de indemnização. Não o pode agora fazer, invocando o conhecimento dos factos com a alegada confissão da Ré. Invoca a A que a Ré utilizou o seu direito de oposição à renovação do contrato de trabalho a termo, pretendendo, porém e verdadeiramente, despedir a A. porque estava grávida. Essa alegação é inócua neste momento, porquanto, conforme já referimos, já havia sido alegada na p.i. e nenhuma consequência a A. retirou de tal circunstancialismo. A ilicitude do despedimento não resulta da mera circunstância do termo aposto no contrato ser nulo. A possibilidade de declaração da existência de um despedimento ilícito resultará precisamente, de uma vez declarado o termo nulo, estarmos perante um contrato sem termo, pelo que a cessação da relação laboral por parte da entidade patronal apenas poderia ocorrer com fundamento em justa causa e após a instauração de um processo disciplinar o que, de facto, não ocorreu. Assim, todos os factos que poderiam determinar o pedido de agravamento da indemnização nos termos do artigo 63º, nº 8 do CT, estando sempre em causa um despedimento sem justa causa, já eram do conhecimento da A. aquando da apresentação da petição inicial e até foram pela mesma alegados. Não pode agora, tardiamente, retirar consequências jurídicas daqueles factos, quando não o fez no momento próprio. Pelo exposto, nos termos do artigo 28º do Código de Processo Civil, indefiro a ampliação do pedido nos termos agora requeridos e o alegado articulado superveniente.”. 7. – Na audiência de discussão e julgamento - cf. Acta de 15.12.2020 -, terminadas as declarações de parte da autora, pelo seu mandatário foi feito um requerimento a requerer a ampliação das declarações de parte, “à matéria indicada nos artigos 138.º a 145.º da petição inicial.”. E a Mma Juiz despachou: “A parte pode requerer as respetivas declarações até ao início das alegações orais em 1º instância. No presente caso, a autora fê-lo em sede de petição inicial indicando, conforme determina a lei, os fatos sobre os quais deverá versar o seu depoimento. Em sede de despacho saneador, consagrou-se a matéria sobre a qual deveria versar o respetivo depoimento. Assim sendo, entendo que uma vez exercido o respetivo direito não pode a parte requerer ou aditar novos fatos, pelo que vai indeferido o pedido.”. A autora arguiu a nulidade processual desse despacho, que a Mma. Juiz conheceu e indeferiu na sentença recorrida, como questão prévia. 8. – Terminada a audiência de discussão e julgamento e decidida a matéria de facto, a Mma Juiz proferiu a seguinte decisão: “Pelo exposto, julgo parcialmente procedente a presente ação porque provada e: I. declaro a existência de um contrato sem termo entre a A. e Ré; II. declaro a ilicitude do despedimento da A.; III. condeno a Ré a pagar à A: a. Uma indemnização pela antiguidade nos termos do artigo 391º do CT, correspondente a 30 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fração de antiguidade e que na data do despedimento, se cifrava em €635, correspondente a um mínimo de 3 meses, o que equivale nesta data, a € 1905, acrescido de juros de mora vencidos desde a citação e vincendos e até integral pagamento. b. a retribuição mensal devida desde 30 dias antes da propositura da acção (05.05.2019) até ao trânsito em julgado da decisão, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 390º, nº 1 e 2, al. a) do CT, correspondente ao valor mensal de €635, cuja quantia, em 05.12.2020, ascende a €5080 (€635 x 8 meses), acrescidos de juros de mora desde a presente decisão até integral pagamento da dívida. c. a quantia de €519,54 a título de subsídio de férias, acrescido dos juros de mora desde a data do respetivo vencimento (data da cessação do contrato) até integral pagamento da dívida. d. a quantia de €78,52 acrescido dos juros de mora desde a data do respetivo vencimento (data da cessação do contrato) até integral pagamento da dívida, absolvendo no mais peticionado. Custas a cargo da A e da Ré na proporção do respetivo decaimento.”. 9. - A autora apresentou recurso de apelação, concluindo: 1 - A apelante intentou contra a apelada uma ação de processo comum laboral cujo objeto consiste na analise da validade do termo aposto no contrato celebrado em 01.02.2019 pela falta de indicação circunstanciada do motivo justificativo e as consequências de tal declaração em face da comunicação da caducidade do contrato, nomeadamente, a título de indemnização nos termos do artigo 391.º, no 1 e 3 do CT e retribuições intercalares nos termos do artigo 390º, no 1 do CT; créditos salariais: proporcionais de férias, subsídio de férias e de natal e desconto feito da retribuição; indemnização por danos não patrimoniais. 2 - Vem o presente recurso interposto da sentença proferida no âmbito do referido processo, datada de 23/12/2020 na parte em o Tribunal julga improcedente o pedido de indemnização civil por danos não patrimoniais: “De todo o modo, não logrou a A. provar que com a cessação do contrato vivenciou momentos de ansiedade, receio, inquietação e preocupação ou mesmo transtorno, pelo que não se legitima, in casu, a tutela do direito, não existindo motivo bastante para fundamentar uma condenação em indemnização por danos não patrimoniais.” Questões prévias 1.1 – Ampliação do pedido 3 - Do artigo 27.º da contestação da Ré consta que que o despedimento da Autora se deveu “a deslealdade profissional da Autora para com a sua entidade patronal”. 4 - Do documento anexo à contestação, o qual consiste na “comunicação de não renovação de contrato de trabalho” realizada pela Ré ao CITE, consta que a Ré decidiu não renovar o contrato “pelo motivo, da trabalhadora não corresponder às funções a que o posto de trabalho exige” e que “a trabalhadora será substituída por outra.”. 5 - Do documento n.º 12 da petição inicial, o qual consiste na comunicação efetuada pela Ré à Autora da caducidade do contrato de trabalho, consta que a decisão de não renovação do mesmo se deveu ao facto de, conforme passamos a transcrever, “considerando a atual estrutura da sociedade e as suas efetivas necessidades, não se encontram reunidos os fundamentos e necessidades de renovação o seu contrato de trabalho”. 6 - A Autora, aqui apelante, aceitou a confissão da Ré, aqui apelada, constante do artigo 27.º da contestação e não impugnou o documento de comunicação ao CITE junto. 7 - Como tal, e em consequência dos factos descritos, no presente caso concreto estaríamos perante um despedimento por iniciativa do empregador por facto imputável ao trabalhador, sem que tivesse sido precedido do devido procedimento legal prévio ao despedimento do trabalhador. 8 - O despedimento é ilícito, nos termos dos artigos 381.º do Código do Trabalho, com efeitos previstos no artigo 389.º do mesmo diploma legal, e, por essa razão, tem aplicabilidade ao caso concreto o disposto no artigo 63.º do Código do Trabalho, o despedimento de trabalhadora grávida depende de parecer prévio do CITE e, o n.º 2 do mesmo artigo impõe que “O despedimento por facto imputável a trabalhador que se encontre em qualquer das situações referidas no número anterior presume-se feito sem justa causa.”. 9 - O n.º 8 do referido artigo prevê como cominação legal para o despedimento declarado ilícito a indemnização devida é calculada nos termos do n.º 3 do artigo 392.º do Código do Trabalho, entre 30 a 60 dias de retribuição base por cada ano completo ou fração de antiguidade, nunca inferior ao montante relativo a 6 meses de retribuição base. 10 - A Apelante requereu a ampliação do pedido, nos termos do artigo 60.º, n.º 3 do C.P.T. (Código Processo do Trabalho). 11 – O qual foi indeferido pelo Tribunal de 1ª instância, por despacho datado de 22-10-2020 decisão com o qual a Apelante não pode concordar, na parte em que: a) “Porém, nenhuma conclusão retirou ao nível da indemnização peticionada, não requerendo sequer um agravamento da mesma a 45 dias de retribuição.” 12 - Do artigo 122.º da petição inicial consta o requerimento do agravamento da indemnização peticionada da seguinte forma: “deverá a indemnização ser fixada também atendendo ao limite máximo da moldura legal”; 13 - Do artigo 3º do pedido consta que a Autora pede a condenação da Ré no pagamento de uma indemnização nunca inferior a três meses de retribuição; 14 - Do n.º 1 do artigo 391.º do C.P.T. consta que cabe ao tribunal definir o montante indemnizatório atendendo ao valor da retribuição e ao grau de ilicitude. 15 – Não pode concordar também na parte em que: b) “Invoca a A que a Ré utilizou o seu direito de oposição à renovação do contrato de trabalho a termo, pretendendo, porém, e verdadeiramente, despedir a A. porque estava grávida. Essa alegacão é inócua neste momento, porquanto, conforme já referimos, já havia sido alegada na p.i. e nenhuma consequência a A. retirou de tal circunstancialismo.” 16 - A petição inicial teve como ponto de partida a cessação do contrato de trabalho por verificação do termo, o qual vem a camuflar o despedimento em razão da gravidez da Autora. 17 - O despedimento da Autora não se deu por verificação do termo do contrato, mas antes por factos alegadamente imputáveis à trabalhadora, factos esses que servem para camuflar a verdadeira razão do despedimento: gravidez da trabalhadora 18 - Como tal, não poderia a Autora, aquando da realização do pedido originário, tirar partido do referido circunstancialismo, porque dele não tinha conhecimento e, nos termos do artigo 74.º do C.P.T. tal facto não poderá limitar o Tribunal na sua decisão, visto que, se da aplicação da lei e da prova produzida em julgamento resultar em condenação superior à peticionada, cabe ao Tribunal condenar para além do pedido, visto que não se encontra limitado ao pedido da Autora. 19 - Assim, considera a Apelante que: a) deveria o articulado superveniente e a respetiva ampliação do pedido deveria ter sido deferido e, por consequência; b) ser a Apelada condenada ao pagamento de uma compensação por despedimento ilícito de trabalhadora grávida entre 30 a 60 dias de retribuição base por cada ano completo ou fração de antiguidade, nunca inferior ao montante relativo a 6 meses de retribuição base; c) é nula a decisão do Tribunal de indeferimento da ampliação do pedido, por violação dos artigos 60.º, n.º 3, 74.º, 381.º, 389.º, 392.º, n.º 3 todos do C.P.T. 1.2 – AMPLIAÇÃO DAS DECLARAÇÕES DE PARTE DA AUTORA 20 - O presente recurso vem interposto do despacho proferido no dia 15/02/2020, oralmente e ditado para a ata e durante a audiência de julgamento, com início às 09 horas e 30 minutos, na parte em que indefere o requerimento de ampliação da matéria factual sobre a qual devem incidir as declarações de parte da Autora. 21 - O despacho recorrido foi proferido num processo comum de declaração no qual pretende a Autora que seja declarado nulo o contrato a termo celebrado com a Ré, assim como o seu despedimento durante a gravidez e que, por consequência, seja a Autora compensada e indemnizada pelos danos patrimoniais e morais sofridos. 22 - A Autora requereu, com a petição inicial, as declarações de parte e indicou a matéria de facto sobre a qual deveriam as mesmas incidir. 23 - Em sede de despacho saneador, o Tribunal consagrou a matéria sobre a qual deveria versar o respetivo depoimento requerido. 24 - No entanto, durante a audiência de julgamento, aquando da produção de prova de declarações de parte da Autora, antes das alegações finais, esta requereu a ampliação da matéria de facto sobre as quais aquelas deveriam incidir. 25 - Tal pedido foi indeferido com fundamento na intempestividade do mesmo. 26 - O despacho recorrido violou o artigo 466.º, n.º 1 do CPC assim como o princípio da verdade material. 27 - A omissão de produção de meio de prova que se figure essencial para a descoberta da verdade material e boa decisão da causa, constitui nulidade relativa, nos termos da alínea d) do n.º2 do artigo 120.º. 28 - Como tal, é nulo o despacho proferido pelo Tribunal. 29 - Deve o requerimento de prova ser diferido e à Autora ser possibilitada a prestação de declarações de parte sobre a matéria de facto constante dos artigos 138.º a 142.º da petição inicial. III – DENSIFICAÇÃO/SUBSTANCIAÇÃO DO RECURSO 30 - Autora invocou perante o tribunal de 1ª instância a nulidade do termo aposto no contrato de trabalho celebrado com a Ré. 31 - Pedido o qual procedeu e o contrato celebrado foi julgado totalmente omisso quanto ao motivo justificativo, o que, nos termos do artigo 147º, no 1, al. c) do CT, determina que o contrato seja considerado celebrado por tempo indeterminado. 32 - Tendo a ré posto fim à relação laboral que mantinha com a autora denunciando o termo do contrato para o dia 31 de outubro de 2019, sem que tivesse deduzido procedimento disciplinar contra a mesmo ou ocorresse justa causa de despedimento, operou um despedimento ilícito de acordo com o disposto no artigo 381º do CT. 33 - Acontece que, e tal como resulta provado, a Apelada invocou como justificação da decisão de não renovação do contrato e consequente despedimento ilícito: a) Conforme consta do artigo 27.º da contestação da Ré: “a deslealdade profissional da Autora para com a sua entidade patronal”. b) Conforme consta do documento anexo à contestação, o qual consiste na “comunicação de não renovação de contrato de trabalho” realizada pela Ré ao CITE, consta que a Ré decidiu não renovar o contrato “pelo motivo, da trabalhadora não corresponder às funções a que o posto de trabalho exige” e que “a trabalhadora será substituída por outra.”. 34 – Portanto, as razões que estiveram por detrás do despedimento da Apelante estão longe de se dever à verificação do termo do contrato de trabalho. 35 - Aliás, conforme ficou provado, após o despedimento ilícito da Apelante, a Ré, aqui apelada, contratou outra funcionária para exercer as mesmas funções que a Apelante exercia. 36 - Não tendo ficado provado que a trabalhadora não correspondia às funções a que o posto de trabalho exige nem que fora desleal para com a sua entidade patronal. 37 - Resulta óbvio que o despedimento da Apelante se deveu ao facto de esta se encontrar grávida. 38 – Conduta a qual e discriminatória, de forma direta, em razão do sexo. 39 - De acordo com a Diretiva 2006/54/CE do parlamento Europeu e do Conselho, de 5.07.2006, relativa à aplicação do princípio da igualdade de oportunidades e igualdade de tratamento entre homens e mulheres em domínios ligados ao emprego e à actividade profissional (reformulação), Considerando (23) “qualquer tratamento desfavorável de uma mulher relacionado com a gravidez ou a maternidade constitui uma discriminação sexual direta em razão do sexo.” 40 - A alínea c) do n.º 2 do Artigo 2.º da referida Diretiva sobre “Definições”, estabelece que: “2. Para efeitos da presente diretiva, o conceito de descriminação inclui: c) Qualquer tratamento menos favorável de uma mulher, no quadro da gravidez ou da licença de maternidade, na aceção da Diretiva 92/85/CEE.” 41 - Já na Diretiva 92/85/CEE, de 19 de outubro de 1992 relativa à implementação de medidas destinadas a promover a melhoria da segurança e da saúde das trabalhadoras grávidas, puérperas ou lactantes no trabalho, no artigo 10º foi afirmado que: “A fim de garantir às trabalhadoras, na aceção do artigo 2.º, o exercício dos direitos de proteção da sua segurança e saúde reconhecidos no presente artigo, prevê-se que: “1. Os Estados-membros tomem as medidas necessárias para proibir que as trabalhadoras, na aceção do artigo 2.º, sejam despedidas durante o período compreendido entre o início da gravidez e o termo da licença de maternidade referida no n.º 1 do artigo 8.º, salvo nos casos excecionais não relacionados com o estado de gravidez admitidos pelas legislações e/ou práticas nacionais e, se for caso disso, na medida em que a autoridade competente tenha dado o seu acordo.” 42 - O ordenamento jurídico português, no cumprimento dos princípios determinados pela União Europeia consagrou a maternidade e a paternidade como valores sociais eminentes e aos pais e as mães o direito à proteção da sociedade e do Estado na realização da sua insubstituível ação em relação aos filhos, nomeadamente quanto à sua educação, com garantia de realização profissional (n.º 1 do artigo 68.º da Constituição da República Portuguesa (CRP)), assim como instituiu o dever de comunicar o motivo para a não renovação de contrato a termo de trabalhadora grávida, puérpera ou lactante (n.º 3 do artigo 144.º do Código do Trabalho). 43 - Conforme referido no Acórdão do Tribunal de Justiça, proferido no Processo C- 438/99, disponível em www.eur-lex.europa.eu: “(...) Pela sua terceira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se o artigo 10.° da Diretiva 92/85 proíbe a não renovação pelo empregador do contrato de trabalho com duração determinada de uma trabalhadora grávida. 40. … sustenta que a proteção que decorre do artigo 10.° da Diretiva 92/85 beneficia as mulheres vinculadas ao seu empregador tanto por um contrato com duração indeterminada como por um contrato com duração determinada. Uma interpretação contrária dessa disposição redundaria em operar uma discriminação incompatível com o objetivo da referida diretiva. (...) 41. No mesmo sentido, a Comissão alega que a não renovação de um contrato de trabalho com duração determinada, na medida em que esteja provado que é devida a motivos relacionados com a gravidez, constitui igualmente uma discriminação direta em razão do sexo. Com efeito, a não renovação de tal contrato equivaleria a uma recusa de contratar uma mulher grávida, o que seria claramente contrário aos artigos 2.º e 3.º da Diretiva 76/207, tal como o Tribunal de Justiça o tem entendido em várias ocasiões (acórdãos de 8 de novembro de 1990, Dekker, C-177/88, Colect., p. I-3941, n.º 12, e de 3 de fevereiro de 2000, Mahlburg, C-207/98, Colect., p. I-549, n.os 27 a 30). (...) 43. A este propósito, força é declarar que a Diretiva 92/85 não efetua qualquer distinção, quanto ao alcance da proibição do despedimento das trabalhadoras grávidas, puérperas ou lactantes, consoante a duração da relação de trabalho em causa. Se o legislador comunitário tivesse querido excluir do âmbito de aplicação da referida diretiva os contratos com duração determinada, que representam uma parte importante das relações de trabalho, tê-lo-ia expressamente precisado (acórdão hoje proferido, Tele Danmark, C- 109/00, Colect., p. I-6993, n.º 33). 44. É, portanto, manifesto que a proibição de despedimento enunciada no artigo 10.º da Diretiva 92/85 se aplica tanto aos contratos de trabalho com duração determinada como aos celebrados com duração indeterminada. (...) 46. Todavia, tal como salientaram tanto o advogado-geral, no n.º 50 das suas conclusões, como a Comissão, em certas circunstâncias, a não renovação de um contrato com duração determinada é suscetível de se analisar como uma recusa de recrutamento. Ora, é de jurisprudência constante que uma recusa de contratação de uma trabalhadora, julgada porém apta a exercer a atividade em causa, em razão do seu estado de gravidez, constitui uma discriminação direta baseada no sexo, contrária aos artigos 2.º, n.º 1, e 3.º, n.º 1, da Diretiva 76/207 (acórdãos, já referidos, Dekker, n.o 12, e Mahlburg, n.º 20). Incumbe ao órgão jurisdicional nacional verificar se a não renovação de um contrato de trabalho, quando este se inscreve numa sucessão de contratos com duração determinada, foi efetivamente motivada pelo estado de gravidez da trabalhadora. 44 – Apesar de a proibição de despedimento prevista no artigo 10.º da Diretiva 92/85 se aplicar tanto aos contratos de trabalho com duração indeterminada como aos celebrados com duração determinada, a falta de renovação de tal contrato, quando este chegou ao seu termo normal, não poderá ser considerada um despedimento proibido pela referida disposição. 45 – Todavia, “, na medida em que a não renovação de um contrato de trabalho com duração determinada seja motivada pelo estado de gravidez da trabalhadora, constitui uma discriminação direta em razão do sexo, contrária aos artigos 2.º, n.º 1, e 3.º, n.º 1, da Diretiva 76/207.” 46 - Na verdade, o Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias, em 30 de abril de 1998 – Acórdão Thibault – esclareceu inequivocamente que: “o exercício dos direitos conferidos às mulheres em conformidade com o artigo 2.º, n.º 3, não pode ser objeto de um tratamento desfavorável no que se refere ao seu acesso ao emprego assim como às suas condições de trabalho. Nesta perspetiva, a diretiva tem em vista atingir uma igualdade substancial e não formal.” 47 - De acordo com o número 1 do artigo 24.º do Código do Trabalho o/a trabalhador/a tem direito à igualdade de oportunidades e de tratamento no que se refere ao acesso ao emprego. 48 - Determina o n.º 1 do artigo 25.º do Código do Trabalho que “O empregador não pode praticar qualquer discriminação, direta ou indireta (...)”, e refere o n.º 5 que cabe a quem alega discriminação indicar o/a trabalhador/a ou trabalhadores/as em relação a quem se considera discriminado/a, incumbindo ao empregador provar que a diferença de tratamento não assenta em qualquer fator de discriminação. 49 – Ora, a cessação de contrato de trabalho a termo impede nova admissão ou afetação de trabalhador através de contrato de trabalho a termo ou de trabalho temporário cuja execução se concretize no mesmo posto de trabalho, ou ainda de contrato de prestação de serviços para o mesmo objeto, celebrado com o mesmo empregador, antes de decorrido um período de tempo equivalente a um terço da duração do contrato, incluindo renovações (n.º 1 e 2 do artigo 143.º do Código do Trabalho). 50 - Neste sentido, e porque está em causa uma situação de não renovação de contrato a termo resolutivo certo de uma trabalhadora grávida importa aferir se no caso em concreto o direito à igualdade no acesso a emprego e no trabalho foi assegurado. 51 - No caso em apreço, a entidade empregadora comunicou a não renovação do contrato de trabalho a termo certo com a trabalhadora, ora queixosa, que se encontrava na condição de grávida, em 25.09.2019, com efeitos a partir da verificação do termo do contrato, em 31.10.2019. 52 - Nos termos do contrato de trabalho da trabalhadora especialmente protegida, esta foi contratada para desempenhar funções respeitantes à categoria de operadora de posto, sendo essa a necessidade da empresa em celebrar o contrato e o fundamento que esteve na base da sua celebração. 53 – Contra a trabalhadora, aqui Apelante, não foi instaurado qualquer procedimento disciplinar nem foi provado que esta, não fosse o facto de estar grávida, não reunia, independente do sexo, todas as capacidades e habilitações para exercer o posto que havia vindo a exercer, de forma eficiente. 54 – Não tendo a Ré, aqui pelado logrado em provar que a não renovação do contrato de trabalho da Apelante se deveu a questões objetivas direta ou indirectamente relacionadas com a prestação de trabalho da Apelante. 55 – Tendo a Ré contratado outra pessoa para exercer as mesmas funções que exercia a Apelante, logo após a cessação do contrato de trabalho. 56 – Resulta que o despedimento da Apelante foi determinado por motivos de natureza discriminatória. 57 – Visto que a contratação de outra funcionária para exercer as mesmas funções que a Ré exercia, sem que para tal tenham sido provadas as razões objetivas que fundamentem tal opção da Apelada, tal conduta constituí uma descriminação da Apelada, que não foi escolhida para permanecer no posto de trabalho porque se encontrava grávida. 58 – E, como tal, por esse facto, deve a Apelante ser indemnizada pelos danos morais sofridos com a conduta da Apelada, nos termos dos artigos 496.º e 566.º do Código Civil. 59 – A indemnização deve ser fixada no montante de 5.000,00€ dada a gravidade da conduta discriminatória da Apelada, assim como da sua tentativa de se fazer valer das normas que devem proteger os trabalhadores para camuflar as verdadeiras razões do despedimento, e da sua culpa. Nestes termos e nos demais de Direito, deve ser dado provimento ao presente Recurso. Por via dele, deve ser proferida decisão no subsecutivo sentido: - A decisão de indeferimento do pedido de ampliação do pedido ser julgada nula e, por sua consequência, ser a compensação por despedimento ilícito da Apelante ser ficada em montante nunca inferior a seis meses de retribuição base; - A decisão de indeferimento do requerimento de ampliação das declarações de parte deve ser julgado nulo e deve o requerimento de prova ser diferido e à Apelante ser possibilitada a prestação de declarações de parte sobre a matéria de facto constante dos artigos 138.º a 142.º da petição inicial; - A apelada ser condenada no pagamento de uma indemnização por danos não patrimoniais no montante de 5.000,00€. Dessa forma, será feita a costumada JUSTIÇA.”. 10 – A ré não contra-alegou. 11. - O M. Público emitiu parecer, no sentido da improcedência do recurso. 12. - Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir. II. - Fundamentação de facto 1. - Na 1.ª instância foi proferida a seguinte decisão sobre a matéria de facto: Factos provados: 1. A Autora foi admitida a trabalhar sob a autoridade e direção da Ré no dia 01 de fevereiro de 2019, conforme teor de contrato de trabalho junto como doc. 1 que se dá por integralmente reproduzido (artigo 6º da p.i.). 2. O contrato celebrado entre as partes prevê uma duração de 9 meses, renovável por iguais períodos de tempo, caso nenhuma das partes se oponha à sua renovação (artigo 7º da p.i.). 3. Ao abrigo do convencionado entre as partes, a Autora foi contratada para a função de operadora de posto (artigo 8º da p.i.). 4. A Ré exerce e atividade comercial de “Comércio distribuição de combustíveis e lubrificantes e a exploração de postos de abastecimento e estacões de serviço” (artigo 9º da p.i.). 5. A remuneração mensal convencionada foi o montante de €635,00 (seiscentos e trinta e cinco euros) (artigo 10º da p.i.). 6. Acrescidos do montante de €4,55 (quatro euros e cinquenta e cinco cêntimos) a título de subsídio de refeição, por cada dia de trabalho efectivo (artigo 11º da p.i.). 7. E do montante mensal de €27,00 (vinte e sete euros) de subsídio de falhas de caixa (artigo 12º da p.i.) 8. A Autora exercia funções no posto de abastecimento sito na Av…, ….-… … (artigo 13º da p.i.). 9. As funções desempenhadas pela Autora consistiam em: 1. receber o pagamento das mercadorias ou serviços; 2. verificar as contas devidas, passa o recibo; 3. registar essas operações e proceder à leitura dos totais e sub-totais registados nos contadores das bombas 4. controlo os stocks do produto existente na loja e reposição os mesmos, 5. limpar o interior do posto, assim como cada uma das bombas de abastecimento (artigo 14º da p.i) 10. Ao contrato de trabalho foi aditado um “Mútuo Acordo”, no qual a Ré definia que o horário de trabalho funcionaria por turnos, da seguinte forma, tal como consta do documento nº 2 junto com a p.i. que se dá por integralmente por reproduzido: “1º Turno: das 15:00h até às 23:00h 2º Turno: das 7:00h até às 15:00h 6ª Feira: fecho às 24:00h Sábado: abre às 8:00h Os turnos são rotativos todos os dias do mês e do ano.” (artigo 15º da p.i.) 11. Ao abrigo desce “acordo” “no caso da falta de uma funcionária, é da responsabilidade das outras funcionárias assegurarem o normal funcionamento do posto. A compensação deste trabalho, será feito quando a funcionária que faltou vier trabalhar, no mesmo número de tempo de trabalho, ou remunerado.” (artigo 16º da p.i.) 12. Nos termos da cláusula n.º 9 do mesmo, “as funcionárias entre si podem e devem cada uma tirar duas semanas de férias diretas, para isso o serviço será contínuo para as outras duas que estão ao serviço.” (artigo 17º da p.i.) 13. A Autora soube que estava grávida em abril de 2019 (artigo 23º da p.i) 14. Por declaração médica emitida em 26.06.2019, foi reconhecido pela médica Exma. Sra. Dra. D… que “a utente B… se encontra grávida e necessita de fazer pausas para alimentação e higiene durante o horário de trabalho” (artigo 28º da p.i.). 15. A Autora esteve de baixa médica nos seguintes períodos: 1.º 21 a 26 de junho de 2019; 2.º 26 de julho a 02 de agosto de 2019; 3.º 03 a 22 de agosto; 4.º 23 de agosto a 11 de setembro; 5.º 10 a 21 de setembro; 6.º 22 a 24 de setembro (artigo 30º da p.i.) 16. A relação laboral entre a autora e a ré cessou efeitos no dia 31 de outubro de 2019 (artigo 31º da p.i) 17. Por missiva datada de 25 de setembro de 2019, e rececionada pela Autora no dia 27 de setembro de 2019, a Ré procedeu à comunicação da caducidade do contrato de trabalho conforme teor de doc. nº 10 junto com a p.i. e que se dá por integralmente por reproduzido: “Venho por este meio comunicar a V. Exa. que, nos termos do n º 1 do art. 344 do Código do Trabalho, venho invocar a caducidade do contrato de trabalho convosco celebrado pelo período de 9 meses e cujo termo verificar-se-á no próximo dia 31 de Outubro de 2019. De facto, e considerando a atual estrutura da sociedade e as suas efetivas necessidades, não se encontram reunidos os fundamentos e necessidades para a renovação do seu contrato de trabalho. Assim e não pretendemos mais a renovação do mesmo, cessando o seu contrato por caducidade no dia 31 de Outubro de 2019.” (artigo 32º da p.i.). 18. No dia 31 de outubro de 2019, a Autora assinou, por exigência da Ré, um documento sob o título “Revogação do Contrato de Trabalho”, conforme teor do doc. nº 11 que se dá por integralmente reproduzido: “Entre, a C…, LDA., com sede na Rua…, concelho de … e B…, CC N.º……. …., residente na Rua…, n.º… ….-…, vêm pelo presente e ao abrigo do disposto nos artigos 349º e 350º da Lei nº7/2009, de 12 de fevereiro, acordar a revogação do contrato de trabalho celebrado entre as partes em 01/02/2019, nos seguintes termos: 1º A partir de 31/10/2019, o contrato de trabalho acima referido deixa de produzir os seus efeitos. 2º Nesta data foram liquidados todos os créditos vencidos e vincendos até à data de cessação do contrato. 3º O motivo da revogação do contrato de trabalho é o seguinte: Caducidade do contrato de trabalho.” (artigo 33º da p.i.) 19. A autora assinou o referido documento porquanto o mesmo era condição para receber os créditos laborais em falta, tendo-lhe sido explicado que servia de documento de quitação (artigo 34º da p.i.) 20. No mesmo dia, foi entregue à Autora o montante em dinheiro de 822,16€ num envelope, o qual a Autora não abriu para contar (artigo 35º da p.i.) 21. Do respetivo recibo de vencimento, entregue à Autora juntamente com o dinheiro, n.º 1055, emitido no dia 31/10/2019 e relativo ao mês de trabalho “outubro”, constam os seguintes descritivos: i) Ordenado base no montante de 635,00€; ii) Subsídio de refeição no montante de 4,55€; iii) Falhas de caixa no montante de 1,29€ iv) Subsídio de Natal no montante de 370,44€, num total de €900, 68 (artigo 36º e 37º da p.i.) 22. A Ré procedeu ao desconto no recibo de vencimento da Autora da quantia de €75,97 por uma falha de caixa relativa a uma ocorrência registada durante o horário de trabalho da A no dia 03.05.2019 derivado de alguém ter procedido ao abastecimento de combustível na bomba 3 e não ter pago (artigos 39º, 40º e 92º da p.i.) 23. A Autora, imediatamente antes da cessação do contrato de trabalho, gozou 18 dias de férias (artigo 43º da p.i.) 24. Na altura da cessação do contrato, a Autora, estava grávida e era mãe solteira, vivendo em casa dos pais (artigo 45º da p.i.) 25. Tendo em conta que uma das funções da Autora era receber os pagamentos de caixa relativos a, entre outros, ao preço do combustível abastecido pelos clientes da Ré, recebia um abono para falhas (artigo 94º da p.i) 26. Nos termos do documento junto a fls. 50, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, a Ré em 25 de setembro de 2019, comunicou ao CITE que não iria renovar o contrato de trabalho a termo certo celebrado com a trabalhadora por a mesma não corresponder às funções que o posto exige, informando ainda que a trabalhadora iria ser substituída por outra (artigo 23º da contestação) 27. Após a cessação das suas funções junto da Ré, esta contratou pelo menos, outra funcionária para exercer as funções anteriormente exercidas pela Autora (artigo 44º da p.i.). Factos não provados: Realizada a audiência de julgamento, não se provou que: a) A Autora por exigência da Ré, não efetuava pausa para refeições (artigo 19º da p.i) b) Ia comendo, quando não tinha clientes para atender ou outras tarefas para cumprir, a qualquer hora do horário de trabalho e em pé (artigo 20º da p.i.) c) Assim, a Autora não efetuava pausas para descansar nem para as refeições (artigo 21º da p.i.) d) Trabalhava continuamente (artigo 22º da p.i.) e) Mal soube que estava grávida, a Autora informou a Ré desse facto (artigo 23º da p.i.) f) Fosse estritamente proibido, por decorrência das regras emanadas pela entidade empregadora, as funcionárias sentarem-se durante o horário de trabalho (artigo 25º da p.i.) g) A Autora tenha permanecido a exercer funções durante toda a duração do contrato de trabalho (artigo 24º da p.i.) h) foi exigido pela Ré que permanecesse em pé durante toda a duração do horário de trabalho e não efetuasse pausas de descanso (artigo 29º da p.i.) i) a Ré tenha pago o subsidio de férias à trabalhadora (artigo 86º da p.i.) j) a Autora, mesmo antes da rutura da relação laboral, vivenciava momentos de ansiedade e inquietação, preocupada com a subsistência da sua família (artigo 138º da p.i.) k) a Autora tenha ficado dependente da ajuda de familiares (artigo 141º da p.i) l) A Autora tenha vivido e vive momentos de ansiedade e receio relativa mente ao seu futuro a curto e médio prazo, receando não ser capaz de garantir a subsistência da sua filha (artigo 142º da p.i.) m) na sequência da atuação da Ré a Autora tenha vivenciado momentos de ansiedade, tendo ficado transtornada com a comunicação de não renovação do contrato (artigo 149º da p.i). n) Competisse à Autora conferir e sondar as varas dos depósitos do posto de abastecimento e do carro-tanque (artigo 14º, nº 4 da p.i.)”. III. – Fundamentação de direito 1. - Atento o disposto nos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2, ambos do Código de Processo Civil (CPC), aplicáveis por força do artigo 1.º, n.º 2, alínea a) e artigo 87.º do Código de Processo do Trabalho (CPT), e salvo questões de conhecimento oficioso, o objecto dos recursos está delimitado pelas conclusões dos recorrentes, supra transcritas. Mas essa delimitação é precedida de uma outra, qual seja a do reexame de questões já submetidas à apreciação do tribunal recorrido, isto é, o tribunal de recurso não pode criar decisões sobre matéria nova, matéria não submetida ao exame do tribunal de que se recorre. 2. - Objecto do recurso: - Do despacho de indeferimento da ampliação do pedido. - Do despacho de indeferimento da ampliação das declarações de parte da autora, à matéria indicada nos artigos 138.º a 145.º da petição inicial. - Do pedido de indemnização civil por danos não patrimoniais. 3. - Do despacho de indeferimento da ampliação do pedido. 3.1. – A autora deduziu articulado superveniente, nos termos do artigo 588º do C.P.C., e consequente ampliação do pedido e da causa de pedir, nos termos do artigo 265.º do C.P.C., com os fundamentos seguintes: “A A. aceita a confissão da R. constante do artigo 27.º da contestação, de que o despedimento da A. se deveu “a deslealdade profissional da Autora para com a sua entidade patronal”. Por consequência da confissão da R., aceita pela A., o despedimento da A. teve como facto imputável ao trabalhador e não se deveu à verificação do termo do contrato a termo, e respetiva oposição à renovação por parte da entidade empregadora. Tal conclusão retira-se da confissão constante do artigo 27.º da contestação, E do conteúdo do documento 1, junto com a contestação, de comunicação à CITE da caducidade do contrato de trabalho da A., da qual resulta que, o que a R. vem comunicar à CITE, não é a caducidade do contrato de trabalho a termo certo, mas sim a não renovação do contrato de trabalho “pelo motivo, da trabalhadora não corresponder às funções que o posto de trabalho exige”. Os factos invocados são anteriores à data da propositura da ação e da audiência prévia já realizada, no entanto, a A. apenas teve conhecimento dos referidos factos e da existência da referida comunicação e do seu conteúdo no mesmo momento em que foi notificada da contestação da R. Daqui resulta que, a R. utilizou o seu direito de oposição à renovação do contrato de trabalho a termo para camuflar as verdadeiras razões que fundamentaram o despedimento da trabalhadora, que têm única e exclusivamente a ver com facto de ela se encontrar grávida. A conduta da R., tal como descrita constituí um elevado grau de ilicitude. O despedimento é ilícito, nos termos dos artigos 381.º do Código do Trabalho, com efeitos previstos no artigo 389.º do mesmo diploma legal. Nos termos do artigo 63.º do Código do Trabalho, o despedimento de trabalhadora grávida depende de parecer prévio do CITE e, o n.º 2 do mesmo artigo impõe que “O despedimento por facto imputável a trabalhador que se encontre em qualquer das situações referidas no número anterior presume-se feito sem justa causa.”. O n.º 8 do referido artigo prevê como cominação legal para o despedimento declarado ilícito a indemnização devida é calculada nos termos do n.º 3 do artigo 392.º do Código do Trabalho, entre 30 a 60 dias de retribuição base por cada ano completo ou fração de antiguidade, nunca inferior ao montante relativo a 6 meses de retribuição base. Assim, o ponto 3 do pedido deve ser ampliado para “Deve a R. ser condenada a pagar indemnização nunca inferior a seis meses de retribuição pelo despedimento ilícito (3.810,00€).” Requer por conseguinte a admissão, sem necessidade de acordo da R., da ampliação do pedido e da causa de pedir, porque tal é consequência do desenvolvimento do pedido primitivo, e da causa de pedir, em consequência de confissão feita e aceita pelo A.”. (negrito nosso) 3.2. - A Mma Juiz, em 23.10.2020, proferiu o despacho de indeferimento, transcrito no ponto 6. - do Relatório. 3.3.1. - Quid iuris? O artigo 28.º - Cumulação sucessiva de pedidos e de causas de pedir – do CPT, dispõe: “1 - É permitido ao autor aditar novos pedidos e causas de pedir, nos termos dos números seguintes. 2 - Se, até à audiência final, ocorrerem factos que permitam ao autor deduzir contra o réu novos pedidos, pode ser aditada a petição inicial, desde que a todos os pedidos corresponda a mesma forma de processo. 3 - O autor pode ainda deduzir contra o réu novos pedidos, nos termos do número anterior, embora esses pedidos se reportem a factos ocorridos antes da propositura da ação, desde que justifique a sua não inclusão na petição inicial. 4 - Nos casos previstos nos números anteriores, o réu é notificado para contestar tanto a matéria do aditamento como a sua admissibilidade.”. Por sua vez, o artigo 265.º, n.º 2 do C.P.C, prescreve: “2 - O autor pode, em qualquer altura, reduzir o pedido e pode ampliá-lo até ao encerramento da discussão em 1.ª instância se a ampliação for o desenvolvimento ou a consequência do pedido primitivo.”. 3.3.2. - Sobre esta temática, a jurisprudência vem entendendo que “a cumulação sucessiva de pedidos e de causas de pedir prevista na citada norma do Código de Processo do Trabalho não se confunde com a alteração e ampliação do pedido e da causa de pedir a que se reportam os artigos 264.º e 265.º do Código de Processo Civil. (…). Ora, o que está em causa nos autos é a ampliação do pedido. E quanto a tal matéria, estabelece o n.º 2 do artigo 265.º do CPC: (…). Assim, de acordo com o referido preceito legal, e no que à ampliação do pedido diz respeito, o Autor pode fazer essa ampliação: (i) até ao encerramento da audiência e (ii) se essa ampliação for o desenvolvimento ou a consequência do pedido primitivo. Nas palavras de Alberto dos Reis (Comentário ao Código de Processo Civil, vol. 3, Coimbra Editora, 1946, pág. 92), estão em causa dois limites: um limite temporal e um limite de qualidade ou nexo. E quanto a este limite, ensina o insigne mestre (pág. 92), que “a ampliação há-de estar contida virtualmente no pedido inicial”.” [cf. Acórdão do TRE de 10.11.2016, in www.dgsi.pt -.]. No mesmo sentido, o acórdão do TRL, de 14.06.2017, proferido no proc. n.º 796/14.2TTLSB.L1-4, in www.dgsi.pt, o qual, após um pormenorizado e esclarecedor percurso doutrinal e jurisprudencial sobre o tema em análise, considerou “que o regime do artigo 28.º (como antes dos artigos 30.º e 31.º do Código de Processo de Trabalho de 1981), não obstante a sua natureza normativa especial, não tem (tinha) a virtualidade de se sobrepor e afastar o regime comum e geral da alteração da causa de pedir e dos pedidos originalmente articulados na ação (artigos 264.º e 265.º do NCPC e antes artigos 272 e 273.º do Código de Processo Civil/1961), dado ali se tratar da cumulação inicial ou superveniente de novas causas de pedir e de novas pretensões radicadas em tais causas de pedir, ao passo que no Código de Processo Civil de 1961 (e agora de 2013) se regula a possibilidade de modificação das causas de pedir e pedidos originalmente formulados na Petição Inicial.”. [cf. ainda o acórdão do TRP, de 15.11.2021, proc. 144/14.1TTVLG.P1, in www.dgsi.pt]. 3.3.3. - No caso dos autos, a autora ampliou o pedido em 13.10.2020 e a audiência de julgamento teve início em 15.12.2020, o que significa que foi respeitado o limite temporal da ampliação do pedido: “até ao encerramento da discussão em 1.ª instância “. E quanto ao limite de quantidade ou de nexo? Na petição inicial, e no que reporta à alegada indemnização por despedimento ilícito, com fundamento na invalidade do termo aposto no contrato de trabalho, a autora formulou o pedido de condenação da ré: “3.º Ser a Ré condenada a pagar indemnização nunca inferior a três meses de retribuição pelo despedimento ilícito (1905,00€), acrescida de juros de mora”. E na ampliação do pedido, por despedimento ilícito nos termos dos artigos 381.º e 389.º do Código do Trabalho (face à alegada confissão da ré no artigo 27.º da contestação), a autora ampliou o montante da indemnização, em relação ao montante anterior: “O ponto 3 do pedido deve ser ampliado para: Deve a R. ser condenada a pagar indemnização nunca inferior a seis meses de retribuição pelo despedimento ilícito (3.810,00€).” Ou seja, aparentemente, e no que respeita à indemnização por despedimento ilícito, o seu fundamento não corresponde ao inicialmente alegado e peticionado. O que não significa que a ampliação do pedido não seja, o desenvolvimento ou a consequência do pedido primitivo, como prevê o n.º 2 do artigo 265.º, do C.P.C., dado o alegado pela ré no artigo 27.º da contestação - “27-E, portanto, o que determinou que a Ré invocasse a caducidade do contrato de trabalho foi a deslealdade profissional da Autora para com a sua entidade patronal, o facto de passar horas a fio a conversar com amigos no horário de trabalho, o mau atendimento ao público, uso de telemóvel no horário de trabalho, etc…” -, que constituiu fundamento diferente para a cessão do contrato de trabalho do que o comunicado pela “missiva datada de 25 de setembro de 2019”, cujo teor foi transcrito no ponto 17. dos factos provados. No pedido inicial, o fundamento da indemnização foi reportado ao artigo 393.º do CT e no pedido ampliado aos artigos 389,º e 391.º do mesmo diploma. Se procedente ou improcedente, só conhecendo do mérito da deduzida ampliação. Preenchido, pois, o segundo requisito para a ampliação do pedido. Deste modo, consideramos que a ampliação do pedido nos termos formulados era/é processualmente admissível e, como tal, procede o recurso da autora no que reporta ao despacho proferido em 23.10.2020, que considerou inadmissível tal ampliação. 4. - Do despacho de indeferimento da ampliação das declarações de parte da autora. 4.1. - Como averbado na acta da audiência de discussão e julgamento, de 15.12.2020, e respectiva gravação (cf. ponto 7. - do Relatório supra), a autora requereu “a ampliação das suas declarações de parte, à matéria indicada nos artigos 138.º a 145.º da petição inicial.”. E a Mma Juiz indeferiu tal requerimento, por considerar que a autora já exercera, nos autos, o direito de indicar os factos sobre os quais versou o seu depoimento naquela audiência. 4.2. – Nas conclusões de recurso, a autora alegou: “26 - O despacho recorrido violou o artigo 466.º, n.º 1 do CPC assim como o princípio da verdade material. 29 - Deve o requerimento de prova ser deferido e à Autora ser possibilitada a prestação de declarações de parte sobre a matéria de facto constante dos artigos 138.º a 142.º da petição inicial.”. 4.3. – Quid iuris? 4.3.1. - No “Requerimento probatório” apresentado na parte final da petição inicial, a autora requereu, além do mais, a prestação de suas declarações de parte, indicando os respectivos artigos da petição inicial: 14.º, 15.º, 16.º, 17.º, 20.º, 21.º, 22.º, 24.º, 29.º, 32.º, 33.º, 38.º e 39.º. E no despacho saneador, a Mma Juiz consignou: “Admito as declarações de parte da A. aos factos 14º, 20º a 22º, 24º, 29º, 38º e 39º porquanto os demais indicados mostram-se assentes.”. 4.3.2. - O artigo 63.º - Indicação das provas – do CPT, dispõe: “1 - Com os articulados, devem as partes juntar os documentos, apresentar o rol de testemunhas e requerer quaisquer outras provas. 2 - O rol de testemunhas pode ser alterado ou aditado até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final, sendo a parte contrária notificada para usar, querendo, de igual faculdade no prazo de 5 dias.”. (negrito nosso) O direito processual reconhece, grosso modo, três meios de prova: a prova pessoal, documental e pericial. A prova pessoal engloba a “prova por confissão” - artigo 452.º e segs. -; a “prova por declarações de parte” - artigo 466.º e segs. - e a “prova testemunhal” – artigo 495.º e segs. -, todos do CPC. E se é verdade que, por regra, todas elas devem ser apresentadas com os articulados, incluindo o “depoimento de parte” com a indicação, “de forma discriminada”, dos factos sobre que há-de recair – artigo 452.º, n.º 2 do CPC -, também é certo que a lei admite excepções a essa regra geral, como por exemplo, a do citado artigo 63.º n.º 2 do CPT, quanto à alteração do rol de testemunhas, e dos artigos 423.º e 424.º do CPC, no que toca ao momento da apresentação de documentos. Como também, a excepção expressa no artigo 466.º - Declarações de parte – do CPC, que prescreve: “1 - As partes podem requerer, até ao início das alegações orais em 1.ª instância, a prestação de declarações sobre factos em que tenham intervindo pessoalmente ou de que tenham conhecimento direto. 2 – (…). 3 - O tribunal aprecia livremente as declarações das partes, salvo se as mesmas constituírem confissão.”. (negritos nossos) Decorre dos citados normativos que a lei processual civil (aplicável nos autos por força do artigo 1.º, n.º 2, alínea a) do CPT) prescreve momentos processuais diferentes para a apresentação dos meios de prova pessoais, em particular, o “depoimento de parte” e as “declarações de parte”. No entanto, uma questão se coloca: quando a parte requer, logo no seu articulado inicial, a prestação de “declarações de parte” indicando os respectivos factos, preclude o direito de ampliar o âmbito factual de tais declarações, até ao início das alegações orais em 1.ª instância? Com todo o respeito, a resposta só pode ser uma: não. Na verdade, não só o regime da “Prova por declarações de parte” não estabelece norma igual à da “Prova por confissão das partes” - o artigo 452.º, n.º 2 do CPC -, como a lei processual também não determina, explicita ou implicitamente, a preclusão do direito de ampliar o âmbito factual das “declarações de parte”, até ao início das alegações orais em 1.ª instância, caso a parte tenha indicado, parcialmente, os respectivos factos logo no articulado inicial. Assim, o legislador não só determinou momentos processuais diferentes para a indicação dos factos sobre os quais hão-de cair o “depoimento de parte” e as “declarações de parte”, como lhe atribui diferente valor probatório, como decorre do n.º 3 do citado artigo 466.º do CPC: “3 - O tribunal aprecia livremente as declarações das partes, salvo se as mesmas constituírem confissão”. [cf., sobre o valor probatório da confissão, o artigo 358.º do C. Civil]. Assim, atenta uma das regras base de interpretação da lei, contidas no artigo 9.º do C. Civil, não pode, não deve, o intérprete tratar por igual o que o legislador expressou desigual: artigo 452.º, n.º 2, versus, artigo 466.º, n.º 1, ambos do CPC. Por outro lado, sendo as “declarações das partes” de livre apreciação pelo tribunal, o processo de formação da convicção judicial não deve ignorar o princípio da verdade material. O princípio da verdade material tem subjacente o princípio do inquisitório, introduzido no direito processual civil pelo artigo 411.º do novo CPC, já existente no direito processual laboral, pelo menos, desde o CPT de 1981. Caracteriza-se, na sua essência, pelo princípio da prevalência do mérito sobre meras questões de forma e conjuga-se com o previsto reforço dos poderes de direcção, agilização, adequação e gestão processual do juiz, no sentido de que toda a actividade processual deve ser orientada para propiciar a obtenção de decisões que privilegiem o mérito ou a substância sobre a forma – cf. artigo 6.º do CPC. E se tal princípio deve ser respeitado em todas as áreas do direito civil, por maioria de razão o deve ser na área do direito do trabalho, por força do poder-dever imposto ao juiz, pelo legislador, no artigo 72.º do CPT. Em conclusão: caso a parte tenha apresentado no articulado inicial, requerimento de declarações de parte com a discriminação dos factos sobre que hão-de recair, não preclude o direito de ampliar o âmbito factual de tais declarações, até ao início das alegações orais em 1.ª instância, sobre factos em que tenha intervindo pessoalmente ou de que tenha conhecimento directo, independentemente, do momento temporal da intervenção ou do conhecimento. Procede, assim, o recurso da autora no que reporta ao despacho proferido na audiência de discussão e julgamento, de 15.12.2020. 5. – A procedência do recurso, quanto aos dois despachos recorridos, tem como consequências jurídico-processuais: a) - A anulação da sentença final, e respectivo processado desde a audiência de discussão e julgamento, para prova, conhecimento e decisão na 1.ª instância do objecto do pedido ampliado e para a prestação das declarações de parte da autora, sobre a matéria indicada nos artigos 138.º a 145.º da petição inicial. Na verdade, tratando-se de questões novas, não apreciadas pelo Tribunal recorrido, não pode este Tribunal delas conhecer em sede de recurso. b) - O não conhecimento da questão do pedido de indemnização civil por danos não patrimoniais, por prejudicado, tanto mais que a matéria alegada nos artigos 138.º a 145.º da petição inicial reporta a esse mesmo pedido. IV – A Decisão Atento o exposto, acórdão os Juízes que compõem esta Secção Social: 1. - Anular a sentença recorrida, e o respectivo processado desde a audiência de discussão e julgamento, para prova, conhecimento e decisão na 1.ª instância dos factos que sustentam o pedido ampliado e para a prestação das declarações de parte da autora, sobre a matéria indicada nos artigos 138.º a 145.º da petição inicial, nos termos do artigo 662.º, n.º 2, alínea c), do CPC, devendo ser proferida nova decisão de facto e de direito, em conformidade. Custas a final, pela parte vencida. Porto, 2021.12.15 Domingos Morais Paula Leal de Carvalho Rui Penha |