Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
2154/07.6TBPVZ-K.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: MENDES COELHO
Descritores: ARTICULADO SUPERVENIENTE
AMPLIAÇÃO DO PEDIDO
ADMISSIBILIDADE
Nº do Documento: RP202203212154/07.6TBPVZ-K.P1
Data do Acordão: 03/21/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Indicações Eventuais: 5ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I – Como qualquer outro dos articulados que carreia para o processo os factos atinentes aos fundamentos da acção ou da defesa quanto a ela [vide arts. 552º nº1 d) e 572º b) e c) do CPC], do articulado superveniente deve constar a alegação circunstanciada e concreta dos novos factos, de modo, designadamente, a aquilatar-se do seu conteúdo e tempestividade para efeito do disposto no art. 588º nºs 1 e 3 do CPC.
II – A operação de liquidação futura de indemnização por danos destina-se apenas a calcular a extensão dos danos apurados – e, por isso, já em concreto anteriormente alegados – e/ou a determinar o valor dos mesmos em termos pecuniários, mas já não, de novo, ao apuramento da sua própria existência.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº2154/07.6TBPVZ-K.P1
(Comarca do Porto – Juízo Central Cível da Póvoa de Varzim – Juiz 2)

Relator: António Mendes Coelho
1º Adjunto: Joaquim Moura
2º Adjunto: Ana Paula Amorim

Acordam no Tribunal da Relação do Porto:

I Relatório

AA e BB intentaram acção com processo ordinário (face ao CPC então vigente) contra CC e mulher DD e contra “M..., Lda.”.
A concluir a petição inicial, os Autores pedem que seja:
«a) declarado que às comunidades das populações da Freguesia ... pertencem, em propriedade comum, as praias referidas, a que se referem as descrições prediais n.ºs ... a ..., desde as piscinas da S... até às proximidades da Capela ..., naquela freguesia;
e
b) declarados nulos todos os actos e negócios, designadamente os referidos neste articulado, que tiveram por objecto as referidas praias e nulos os respectivos registos na Conservatória do Registo Predial, mandando-se cancelar, nomeadamente os mencionados na alínea anterior;
c) sejam os Réus condenados a restituir os terrenos dessas praias àquelas comunidades, abstendo-se de ofender ou por qualquer modo perturbar o seu direito».
Os Réus CC e M..., Lda. contestaram e deduziram reconvenção, pedindo a condenação dos Autores:
«a) a reconhecerem que o Réu CC é dono e possuidor dos [seguintes] prédios[«a) Prédio rústico, constituído por terreno inculto ou de areia, com a área de 40.000 m2, situado no ... ou da ..., da cidade (outrora vila) da Póvoa de Varzim, a confrontar do nascente com a estrada municipal, do norte com herdeiros de EE, do poente com a linha das marés vivas e do sul com o Estádio ..., inscrito na matriz sob o art. ... e descrito na Conservatória do Registo Predial no n.º ...;
b) Prédio rústico, constituído por terreno inculto ou de areia, com a área de 8.400 m2, sito no lugar do Chato, da Freguesia ..., Póvoa de Varzim, a confrontar do nascente com caminho público, do norte com a carreira de tiro e caminho público, do poente e sul com terreno do Ministério da Marinha, inscrito na matriz sob o art. ... e descrito na Conservatória do Registo Predial no n.º ...;
c) Prédio rústico, constituído por terreno inculto ou de areia, com a área de 9.700 m2, no lugar do ..., da Freguesia ..., Póvoa de Varzim, a confrontar do nascente com FF e com GG e outros, do norte com a linha das marés vivas e do sul com o regato de ..., inscrito na matriz sob o art. ... e descrito na Conservatória do Registo Predial no n.º ...;
d) Prédio rústico, constituído por terreno inculto ou de areia, com a área de 21.600 m2, no lugar de ..., da Freguesia ..., Póvoa de Varzim, a confrontar do nascente com HH e com herdeiros de II e outros, do norte com o regato ..., do poente com a linha das marés vivas e do sul com o regato do ..., inscrito na matriz sob o art. ... e descrito na Conservatória do Registo Predial no n.º ...»] […];
b) a reconhecerem que a Ré M..., Lda. é dona e possuidora dos [seguintes] prédios[a) Prédio rústico, formado por o areal da ..., com a área de 14.000 m2, sito no lugar da ..., da Freguesia ..., Póvoa de Varzim, a confrontar do nascente com estrada municipal, do norte com o posto da Guarda Fiscal, do poente com a praia e do sul com JJ, inscrito na matriz sob o art. ... e descrito na Conservatória do Registo Predial no n.º ...;
b) Prédio rústico, formado por terreno inculto ou de areal, de 18.000 m2, situado no lugar da ..., da Freguesia ..., Póvoa de Varzim, a confrontar do norte com herdeiros de KK e de LL, do poente com a linha das marés vivas e do sul com herdeiros de EE, inscrito na matriz sob o art. ... e descrito na Conservatória do Registo Predial no n.º ...;
c) Prédio rústico, formado por um terreno inculto ou de areia, com a área de 13.000 m2, no lugar de ..., da Freguesia ..., Póvoa de Varzim, a confrontar do nascente com estrada municipal, com MM, com NN e com OO e outros, do norte com o regato ou esteiro, do poente com a linha das marés vivas e do sul com o Posto da Guarda Fiscal, inscrito na matriz sob o art. ... e descrito na Conservatória do Registo Predial no n.º ...»] […];
c) a não mais perturbarem os direitos de propriedade e de posse dos Réus sobre os seus identificados prédios».

A Ré DD apresentou contestação, invocando a sua ilegitimidade (fls. 494-496, volume III).

Por decisão proferida a fls. 9v-11, do apenso ao qual corresponde, atualmente, o n.º 2154/07.6TBPVZ-I, foi julgada habilitada, como cessionária, a Câmara Municipal ... – rectius, o Município da Póvoa de Varzim –, em parcial substituição do Réu CC.

Notificado para sobre eles se pronunciar, o Município da Póvoa de Varzim, «na qualidade de habilitado cessionário», veio dizer que «adere […] ao alegado nos articulados (contestação-reconvenção e tréplica) e respectivos documentos apresentados pelos réus CC e M..., Lda.» e conclui no sentido de que «seja julgada improcedente a ação e absolvido o Réu Município do pedido» e que se reconheça «que o Município é proprietário do prédio adquirido ao R. CC» (fls. 524, volume III).
Foi proferido despacho saneador a fls. 1126-1155, volume VI, em sede do qual foi julgada improcedente a excepção dilatória de ilegitimidade activa, foi julgada procedente a excepção dilatória de ilegitimidade passiva e, consequentemente, foi absolvida da instância a Ré DD. Foi elaborada especificação (matéria de facto assente) e questionário (base instrutória).

Foi admitida a intervenção principal espontânea, do lado activo, de PP e QQ.

Na sequência do falecimento do Réu CC, foram habilitados na sua posição processual RR, SS, TT, UU, VV, WW, XX, YY (apenso nº 2154/07.6TBPVZ-C).

Na sequência do falecimento da Interveniente Principal QQ, foram habilitados na sua posição processual ZZ, AAA e BBB (apenso nº 2154/07.6TBPVZ-J).

A “Assembleia da Comunidade dos Compartes do Baldio ...”, representada pelo seu Presidente do Conselho Directivo, veio, a 28/9/2016, requerer a sua intervenção principal espontânea nos autos.
Em tal requerimento afirma: “A requerente faz seus os articulados dos Autores, que aqui se dão por reproduzidos. – aos quais se associa”.
Os Réus/Reconvintes deduziram oposição.
Por decisão proferida a 1/10/2017 (em conclusão de 28/9/2017), foi admitida aquela requerida intervenção principal espontânea.
O julgamento iniciou-se a 10/5/2018 e, por entre variadas vicissitudes processuais, tiveram lugar subsequentes sessões em 15/6/2018, 9/9/2019, 9/10/2019, 4/11/2019 e 4/12/2019.
Estando designada nova sessão para 27/1/2020, veio nessa mesma data a interveniente “Assembleia da Comunidade dos Compartes do Baldio ...” apresentar o seguinte requerimento, que intitulou de “articulado superveniente”, cujo teor integral se transcreve:

A Assembleia de Compartes do Baldio ..., interveniente autora, nestes autos, vem requerer contra:
- os RR, reconvintes, M... e os herdeiros ...;
- e a co-Ré, habilitada, Câmara Municipal ..., articulado superveniente, nos termos do artigo 588º nºs 1, 2 e 3c) do CPC e 564º nº 2 do CC – com os seguintes fundamentos:
I
Os AA foram agora surpreendidos pelos factos alegados nos antecedentes requerimentos, de 20/12/2019 (em VII) e de 31/12/2019 - com as referências nºs 24614105 e 24663692 1.
1
Os Docs juntos por requerimentos de 13 a 15 do mês corrente, dos quais se tratará adiante - e o Doc nº 1, ora junto, são bem elucidativos do modo descarado, até grotesco, como foi ocupado por edificações de terceiros, o lugar das alegadas descrições nºs ... a ..., das reivindicadas praias, nominalmente deixadas, com destino à família ..., no negócio de CCC.
Ver-se-á que alguns desses terceiros, ocupantes nas mesmas zonas das praias, são testemunhas do rol dos RR.
Os RR recusam indicar os números das descrições prediais, criadas por esses terceiros. Os AA tiveram de procurá-las.
2
A escritura da partilha adicional de 1970 – não se limitou a proporcionar a venda da praia a CCC. Estimulou a sua ocupação por terceiros.
Aquele foi só o negócio visível.
Serviu de cortina de fumo à especulação sobre várias zonas da praia, permitida ao terceiro, a que se refere a prova testemunhal dos AA – e a muitas outras pessoas.
Terceiro que era o Presidente da Junta de Freguesia ..., à data da escritura da partilha adicional de 1970, donde tudo partiu. (v. em III do requerimento de 20/12/2019)
A Avenida ... foi construída encostada ao cume da rampa de areia, à qual chegam as águas do mar, em maré cheia. (Doc 2 – foto extraída do mapa google, onde essa avenida vem assinalada a vermelho)
Assim se foi esvaziando o objeto desta reconvenção.
3
Notificados, os RR não alegaram nem provaram expropriação de parcelas de prédio privado, para a construção dessa Avenida ....
E nem para as ruas transversais, que foram sendo construídas para acesso às inúmeras, licenciadas edificações, sobre a retalhada praia.
4
O silêncio dos RR, perante tais factos, já abordados nos requerimentos de 20/12/2019 (em VII) e de 31/12/2019, confirmam o papel passivo e meramente instrumental da família ... – que a vox populi sempre lhes atribuiu.
Faltava a confirmação. E não se imaginava que atingisse tais proporções.
Sabe-se que CC assinou a imprescindível escritura de partilha adicional.
Para o que se seguiu, bastou a procuração, com poderes gerais, passada ao seu advogado.
(Elucidativo será atentar na documentada resistência dos herdeiros, à sua habilitação, nos preliminares desse incidente. E a falta de colaboração do advogado do reconvinte, na sua identificação)
Habilitados contra sua vontade – vieram a passar, todos, procuração ao mesmo escritório. E, sem coerência com o antecedente comportamento, passaram a encabeçar os requerimentos que se seguiram.
5
Aqueles factos de superveniente conhecimento, vieram a revelar o facto relevante, para a presente acção: - a indiferença (consciente ou não) dos reconvintes ..., perante a ocupação, por quaisquer terceiros, (até testemunhas suas) das áreas das praias que os RR alegaram terem estado, sempre, na posse dessa família.
6
Indiferença, em que permaneceram, durante anos e anos, o reconvinte, CC e seus herdeiros.
A descrição ... não é significativa exceção. Quanto a esta o reconvinte CC nada teve de fazer, já que a co-Ré Câmara Municipal apressou-se a ocupar a praia, na frente para a estrada marginal, com a construção de parque e jardim.
7
Não havendo notícia de qualquer oposição a tais actos de ocupação por terceiros, nas criadas descrições nºs ..., ... e ... - quer por parte do reconvinte, CC, quer de qualquer dos seus habilitados herdeiros.
Ocupação que conheciam ou deviam conhecer, a não ser que lhes fosse indiferente.
Ora,
8
Os RR vêm alegando a sua convicção e a do reconvinte, CC, de serem donos das praias que reivindicam.
II
Objetivo comum dos RR
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Os factos, agora chegados ao conhecimento dos AA - mostram que nenhuma convicção havia, por parte do reconvinte, CC, de ser titular de qualquer direito sobre as praias.
Assim como, tal convicção não há, por parte dos seus herdeiros.
Acresce que
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Todos os RR, repetidamente, recusaram a exibição da relação de bens de qualquer das heranças, na família ..., ao longo de um século, apresentadas em qualquer serviço público - que tivessem incluído as reivindicadas praias.
Por fim,
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Em 20/12/2019, (em VI) requerida a indicação dos números das verbas que incluíssem as praias – na sua resposta, remeteram-se ao completo silêncio.
É a confirmação da inexistência de quaisquer verbas, que incluíssem praias, nas relações de bens de todas as heranças dos antepassados deste reconvinte. Assim,
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Mostra-se que, único objetivo de todos os RR, foi que o reconvinte CC acedesse aos apelos do referido terceiro, testemunha do rol dos RR, identificada por testemunhas dos AA, que, com CCC, pretendia ocupar as praias - para que aquele obtivesse título, que foi a escritura de partilha adicional da herança de sua mãe.
E, com esta, criasse aparência de direito que lhes desse cobertura e, formalmente, o legitimasse a fazer venda ao mesmo, CCC, das praias a sul do Rio ....
Deste modo,
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Enganando os Autores.
E lesando, nos seus direitos, a representada da requerente, comunidade dos compartes do Baldio das Praias ..., privando-a da sua fruição.
III
O “...” e os moinhos com logradouros elásticos na praia
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A norte do Rio ..., os construídos barracos ancoraram as novas edificações que lá proliferam (vide em III do requerimento de 20/12/2019).
No extremo norte da praia, esse papel tiveram-no os moinhos.
Havia-os, em todas as praias, para produção de energia eólica.
Os terceiros ocupantes, atribuíram-lhes logradouros elásticos – onde todos os ocupantes cabiam … até a co-ré, Câmara Municipal, para, arbitrariamente, rasgar a praia, com a construção de vias públicas.
Vedado por taipais amarelos, com uma construção, ainda em obra, de DDD (herdeiros) pode ver-se o que resta do tal ... – depois de subtrações várias, de que foi alvo a nascente e, segundo alega o ocupante EEE, pelo vizinho do norte (FFF). (a fls 30 do Doc 2, referido em 1)
Vedado com rede malha-sol, o areal ocupado pela testemunha dos RR, FFF – soma, com o ..., uma frente de quase 200 metros de comprimento: um terço dessa nova avenida.
Ambas as parcelas da praia podem distinguir-se no mapa google.
Situam-se no extremo sul da Avenida ....
Os documentos juntos ilustram bem o que se passou.
O terceiro, ocupante referido em 1, explica o método usado.
Compra um moinho com a área de 12,5 m2, no meio do .... (Certidão matricial – a fls 72 do DOC ora junto). Anexa-lhe o areal á volta, com o logradouro, multiplicando os 12,5 m2 da área do moinho. O multiplicador depende da área, em volta, ainda sem outro ocupante.
(em 12 e 13 da sua contestação, na ação de demarcação nº 69/83 – no Doc 1, ora junto)
Objetadas tal área e as confrontações, responde que - sendo muito antiga, a matriz está desatualizada. (No mesmo Doc ora junto, a fls 70)
É verdade. A praia tinha desaparecido !
Já no contrato promessa de 1977, antecipa, como confrontações, esses então inexistentes caminhos (A fls 31 do Doc ora junto).
Os excertos das plantas topográficas fornecidos pela CM (a fls 25 e 26 do Doc ora junto) mostram que ainda inexistiam.
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Em 1967, GGG registou esse ..., com base no moinho que herdara de sua avó. Anexou-lhe logradouro sobre o ....
Vendeu-o a EEE, que o vendeu a DDD, garantindo ter-lhe transmitido, seguramente, os 4.300 metros quadrados que registou.
(Vide no Doc junto, referido em 1, Averbamento à descrição nº ... – Ap. ......
Mas,
O nome de HHH, aparece a nascente, ocupando uma quarta parte da zona indicada por EEE, para esse ....
Não tendo encontrado descrição predial que lhe corresponda (pode estar omisso) a requerente desconhece como e através de quem se terá apossado dessa parcela.
(V, Planta topográfica fornecida pela co-Ré Câmara Municipal - com data de 24 /11/1982 - a fls 25 do Doc ora junto)
Noutra quarta parte, há outro terceiro (casa de andar) também a nascente, à direita.
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Com data de 1983, noutra planta topográfica fornecida pela Câmara Municipal, vem, já assinalada, no mesmo local, a implantação de uma obra no local dos nºs de polícia, 12 e 16 da Travessa à Rua ..., de herdeiros de HHH. (fls 30 do mesmo Doc)
Estava privado de acesso para essa fracção encravada.
Seguiu o ensinamento do mestre terceiro (artigo 22 da contestação de FFF em ação de demarcação (Doc ora junto).
Abriu ele próprio, o acesso de que precisava, ofertando a faixa do areal, para o que veio a ser a travessa à Rua .... E logo obteve da co-Ré, a Câmara, o licenciamento e a urbanização para as edificações com os nºs 12 e 16 dessa travessa – aliás, um beco, já que não tem saída.
Enquanto DDD e o comprador de um outro miraculoso moinho, a Norte – discutiam a demarcação das parcelas da praia, que tomaram.
Essas duas parcelas do ... perfazem, só elas, uma frente de quase 200 metros de comprimento – um terço da Avenida ....
Outros terceiros, em toda essa zona da praia, seguiram idênticos métodos.
IV
Do dano
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Com a sua atuação, o reconvinte CC, assinando a escritura de partilha adicional, seguida de escritura de venda das criadas descrições ... a ..., permitiu, à co-Ré reconvinte, M..., que ocupasse as praias e as explorasse em seu proveito; e que vendesse parte delas à co-Ré Câmara Municipal, embolsando o preço da venda.
E ao referido terceiro, que praticasse actos especulativos sobre o restante das praias, a norte do Rio ..., deixando tais praias à disposição desse terceiro e de outros não identificados, até ao extremo norte da praia do ... - permitindo que delas tirassem elevados proveitos.
Por seu lado,
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A co-Ré, Câmara Municipal, foi co-autora na consumação de tais lesões, licenciando loteamentos e novas edificações, a toda a gente que os requeresse - em toda a extensão das referidas praias, desde as piscinas da S... até ao extremo norte da estrada marginal, no .... (Doc ora junto)
Licenciando muitas dessas obras, já na pendência desta acção, em que é parte, quase desde o princípio.
Situadas muitas delas a escassas dezenas de metros das águas do mar, mesmo em maré baixa.
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Tendo, ainda, construído, sobre as reivindicadas praias, infraestruturas urbanas, para servir as inúmeras edificações, que licenciou.
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E ocupando parte substancial das reivindicadas praias, transformando-as em parque e em jardim.
Facto notório, do conhecimento geral, já que pode ver-se no mapa Google – por isso, devendo ser considerado pelo tribunal, sem necessidade de alegação nem de prova. (artigo 5º nº 2 c) do CPC)
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Sabendo ainda todos os RR e a co-Ré Câmara Municipal que, na escritura de aforamento, a ... não se declarou dona dos terrenos a nascente da marginal, mas aforou declarados maninhos, para melhor aproveitamento com pinheiros.
E que a mesma ... declarou, noutro documento, que era direito seu aforar baldios que considerasse mal aproveitados. (artigo 3º da petição da acção de justificação judicial de 1868 – Doc junto por AA e RR.)
E assim,
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Todos sabendo que mesmo os terrenos a nascente da marginal faziam parte do reivindicado baldio.
Deste modo,
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Todos eles, RR, lesando, com a sua atuação, a mesma comunidade de compartes do referido baldio, subtraindo as respetivas áreas à sua utilização comunitária, privando-a das utilidades e rendimentos que pudessem proporcionar.
24
A Câmara Municipal ... era habilitada co-Ré, nesta acção, desde pouco depois do seu início, em 1993, tendo conhecimento de todos estes factos. E de que tais praias eram objecto desta acção e de que era proibida por lei qualquer edificação ou obra de urbanização, nas praias.
25
O referido terceiro (FFF) e outros ocuparam as praias, comprando uma dúzia de metros quadrados da área de moinhos de vento, quase todos já então demolidos, nos locais de aparecidas pedras, alegados restos desses moinhos.
Áreas multiplicadas 100 ou 200 vezes, de anexados logradouros (no ... !), conforme as que houvesse ao redor, ainda sem outro ocupante.
(a fls 13 e sgs do Doc ora junto - artigos 12 a 21 da contestação na referida ação de demarcação).
E dando-se-lhes descrições predais omissas na conservatória.
No caso do chamado ... a descrição predial foi criada nos anos 60, com o nº 16973 (atual 2525, no sistema informático (Doc referido em 1)
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A co-Ré Câmara Municipal agiu em conflito e contradição com o alegado pelos RR, na sua reconvenção, a que aderiu, como melhor se verá na análise dos documentos supervenientes, juntos - com tais licenciamentos concedidos a terceiros, ocupantes das praias, no local das descrições atribuídas ao reconvinte CC.
Em 24/11/1982, foi requerida, pelo ocupante DDD, conhecido empreiteiro, a viabilidade do loteamento no ....
Em 17/12 do mesmo ano, foi-lhe deferida a urbanização da praia, a escassas dezenas de metros das águas do mar. (vide no mapa google.)
(Doc citado em 1 – a fls 25 a 27 desse documento - junto em 14/01/2020, por requerimento com a referência nº ...).
Em três semanas! Acção mais eficaz … não seria possível !
Para tal, prolongou-se a entretanto construída rua (para servir outros ocupantes, a nascente) – hoje chamada Rua ....
Como também pedia o mestre terceiro - rasgou-se mais essa faixa da praia, a cerca de 100 metros a poente da estrada marginal que vem do ....
Anos depois, os ocupantes da praia foram ainda brindados com a construção da Avenida ... – já, diariamente, quase beijada pelas águas do mar.
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O referido terceiro e outros terceiros não são partes neste processo, nada, contra eles, podendo ser aqui peticionado.
Parte não é, também, a Junta da Freguesia – com forte contributo nos mesmos factos.
V
O reconvinte CC
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Tudo isto confirma que a família ... só serviu como testa de ferro nos negócios:
- os encobertos; e o descoberto, do CCC.
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Os factos, agora alegados, são novos.
É que, depois do esbulhador CCC e da Ré, M..., outros tomaram conta das praias. E sem que a família ... se importasse.
30
Entre esses outros está a herança de HHH de que é titular mais uma testemunha dos RR.
31
A dúvida é se o reconvinte CC teve conhecimento da reconvenção.
Reforça essa dúvida o alegado desconhecimento da identidade dos herdeiros, pelo mandatário do reconvinte.
E a resistência dos herdeiros à sua habilitação.
Há ainda a oposição dos RR a toda a prova de actos de posse por parte da família ..., como a requerida junção de extratos da relação de bens das heranças de antepassados dessa família.
E o patrocínio por parte do mesmo mandatário, de interesses de terceiro, o referido DDD e herdeiros, na ocupação do chamado ... - em conflito com a reconvenção da família ....
(A fls 12 do Doc referido em 1)
Da petição do ocupante, DDD, ressalta a sua alegação de que os areais da praia têm uma única utilidade: a edificação urbana. (no mesmo Doc referido em 1 – artigos 31 e 32 da petição inicial)
VI
A actuação da co-Ré Câmara Municipal
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Merece especial menção que a notória ligeireza, na descrita actuação da co-ré, Câmara Municipal, ocorre dois anos antes do acto da delimitação do domínio público marítimo (de 13 de Janeiro de 1984).
O que permite admitir que a esta co-Ré não seria estranha toda a trama que se preparava, na ocupação das praias.
Com o previsível sururu que levantaria.
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Esta co-Ré não se limitou a comprar parte da reivindicada praia, à reconvinte M... – quando era já habilitada cessionária nestes autos.
É mais responsável que qualquer dos RR, pela invasão das praias – com o licenciamento de dezenas e dezenas de edificações, concedidas a terceiros, ocupando as criadas descrições predais, reivindicadas na reconvenção da família ....
Licenciara já centenas dessas edificações a terceiros, a poente da marginal que, no extremo Norte, é a rua ....
Continuou a licenciar mais algumas dezenas, na zona da Avenida ..., a poucas dezenas de metros das águas do mar, mesmo em maré baixa
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Chocante a ligeireza com que deferiu, a DDD, a urbanização da praia, em três semanas. Requerida em 24/11/1982, foi deferida em 17 de Dezembro do mesmo ano. (a fls 23 a 25 do Doc ora junto)
A mesma ligeireza, na aceitação da pretensão do ocupante da parte nascente do tal ..., HHH - na criação da travessa dos ..., fornecendo-lhe o necessário acesso.
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Bem pode dizer-se que a Câmara Municipal impulsionou a edificação em massa, sobre as praias.
Ao ponto de o referido terceiro gabar-se de ter sido ele que iniciou a construção do prolongamento para poente da Rua ..., calcando o areal e assim o dividindo do ocupado pelo vizinho a sul – de seguida pavimentado pela Câmara Municipal.
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O mesmo dizendo o ocupante, FFF, ter acontecido na construção da Avenida ..., também por ele calcada. (artigo 22 da contestação daquele - no Doc ora junto).
Como se o calcamento das areias da praia, por parte de um particular fosse bastante para a desafectação da respectiva faixa e a sua transformação em via pública.
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Essa testemunha dos RR, FFF, assume-se como criador de caminhos da rede viária municipal.
E a co-ré, Câmara Municipal, consente!
Assim se explicam as ruas, ruelas, travessas e becos, multiplicados sobre a praia (a poente da marginal - rua ... e sua continuação para sul) e a invasão desta por centenas de edificações.
Veja-se quanto vale um T-3, junto das águas do mar!
Quanto valerá uma das dezenas de moradias, licenciadas pela Câmara Municipal – nessa chamada Avenida ...?!
Para sabê-lo - bastará uma rápida busca, por apartamentos e moradias, junto do mar, na Avenida ..., em ... – no correspondente site da internet.
São factos cujo conhecimento está ao alcance de toda a gente. São factos notórios.
O respectivo conhecimento pelo tribunal não depende de alegação nem de prova. (artigo 5º nº nº 2 c) do CPC)
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Eis a razão da ligeireza no deferimento da urbanização da praia, pela Câmara Municipal - a maior responsável por essa invasão.
Fazendo-o a pedido de qualquer terceiro – ainda que em colisão com a reconvenção da família ....
A co-ré tenta escapar à sua responsabilidade por essa monstruosa invasão das praias.
É muito maior que a imputável a qualquer dos RR.
Sem a ligeireza no licenciamento por parte da co-Ré, os ilícitos praticados +na ocupação das praias não seriam possíveis
39
Está também explicada a recusa da certidão relativa à identificação da marginal a que se refere a escritura de 1925, da partilha da herança do Dr. +David Alves. A confrontação poente das descrições nºs ... a .... (verba 30).
Mas,
No mapa google distingue-se, cerca de 40 metros a nascente do topo norte dessa nova Avenida ..., a rua que margina a praia no ..., onde tem o nome de rua ..., que, em linha aproximadamente reta, prossegue para sul, hoje com o nome de Rua ..., até fletir para nascente, passando a tomar, hoje, o nome de Rua ... – vindo a entroncar, no cruzeiro de ..., na EM ..., que completa a marginal até à Póvoa de Varzim.
O mapa google está ao alcance de qualquer pessoa.
Os factos que contém são notórios, caindo no âmbito do artigo 5º nº 2 c) do CPC.
VII
Documentos supervenientes
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Os documentos foram juntos, para contraprova da matéria da reconvenção (quesitos 47 a 55 da BI)
E após a recusa da junção de documentos em poder da parte contrária (a co-Ré, Câmara Municipal e os reconvintes, habilitados herdeiros ...) - para contraprova dos mesmos factos.
A requerente só agora pôde dispor desses documentos.
É por isso, inaplicável o artigo 423º nºs 1 e 2 do CPC, que dispõe:
“Os documentos destinados a fazer prova dos fundamentos da ação ou da defesa devem ser apresentados com o articulado em que se aleguem os factos correspondentes.”
“Se não forem juntos com o articulado respetivo, os documentos podem ser apresentados até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final, mas a parte é condenada em multa, exceto se provar que os não pôde oferecer com o articulado.”
Aplicável é, por isso, o nº 3 do mesmo artigo, dispondo:
“Após o limite temporal previsto no número anterior, só são admitidos os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento, bem como aqueles cuja apresentação se tenha tornado necessária em virtude de ocorrência posterior.”
Porquanto
Os documentos juntos não se destinam à prova dos fundamentos da acção.
Muito menos poderiam os AA pretender a prova dos fundamentos da defesa.
Destinam-se, sim, à contraprova da reconvenção, deduzida pela defesa.
41
Recusada a junção de documentos em poder da parte contrária (artigo 429º do CPC) – houve que fazer busca de documentos para prova:
- de quem são os donos das edificações sobre a praia reivindicada; e
- como chegaram á “posse” das parcelas de praia.
Para isso, foi necessário descobrir os nºs das descrições prediais.
Tratando-se de praia – provável era que estivessem omissos.
Nesse caso, a prova seria muito difícil.
Por sorte, os AA descobriam uma das criadas descrições: a do chamado .... É o Doc referido em 1.
Através deste, a A chegou ao DOC ora junto.
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Pelas datas das certidões, mostra-se que são documentos supervenientes.
A sua junção é, por isso, admissível. (artigo 423º nº 3 do CPC)
E nem será líquido que aplicável seja o novo CPC – iniciado que foi o +julgamento em2007.
VIII
De jure
Factos constitutivos, de superveniente conhecimento
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Trata-se de fatos bem distintos dos já alegados nos autos.
Com efeito.
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Uma coisa é a pretensão da Reconvinte herança da família ..., de haver as praias para si.
Tendo ou não razão, fá-lo-iam no interesse próprio.
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Mais grave é que aceite, em silêncio - ser testa de ferro para que outros o façam.
Opondo-se ao seu depoimento de parte, sobre a sua própria posse, e à junção de documentos em seu poder.
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Ainda mais grave é que aceitem, em silêncio, ser testas de ferro de quaisquer incertos terceiros.
Estes RR podem desconhecer, até, a sua reconvenção?
Os herdeiros resistiram à sua habilitação. Terá isso algum significado?
Respondem, pelo menos, pela outorga na partilha adicional e do mandato ao seu advogado.
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Dispõe o artigo 588º do CPC:
1 - Os factos constitutivos, modificativos ou extintivos do direito que forem supervenientes podem ser deduzidos em articulado posterior ou em novo articulado, pela parte a quem aproveitem, até ao encerramento da discussão.
2 - Dizem-se supervenientes tanto os factos ocorridos posteriormente ao termo dos prazos marcados nos artigos precedentes como os factos anteriores de que a parte só tenha conhecimento depois de findarem esses prazos, devendo neste caso produzir-se prova da superveniência.
3 - O novo articulado em que se aleguem factos supervenientes é oferecido:
a) Na audiência prévia, quando os factos hajam ocorrido ou sido conhecidos até ao respetivo encerramento;
b) Nos 10 dias posteriores à notificação da data designada para a realização da audiência final, quando não se tenha realizado a audiência prévia;
c) Na audiência final, se os factos ocorreram ou a parte deles teve conhecimento em data posterior às referidas nas alíneas anteriores.
Com efeito,
48
Trata-se de factos constitutivos do direito dos AA.
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Contradiz a sua reconvenção - a manifesta indiferença dos reconvintes ....
Sobre tais factos silenciando, totalmente, na sua resposta ao requerimento de 20/12/2019
Por outro lado
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Sem posse da alegada transmitente, a família ... não há posse da reconvinte M....
Assim,
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Destes factos resulta a improcedência de ambas as reconvenções.
E assim,
A inexistência de qualquer posse que se oponha à posse da Autora.
52
São factos de conhecimento superveniente.
Era inimaginável uma ocupação desta envergadura, por quaisquer terceiros, conhecidos ou desconhecidos da família ... – mesmo testemunhas do rol dos RR.
Reduzindo à insignificância, criadas descrições prediais, reivindicadas pelo reconvinte CC.
E, mais que isso, a total indiferença deste e dos seus herdeiros.
No que são acompanhados pelo silêncio completo dos RR, sobre tal matéria, do requerimento de 20/12/2019.
IX
Desde já se declara que a Autora destinará a indemnização, a que venha a ser julgada com direito, aos fins sociais previstos na deliberação em assembleia geral de 15 de janeiro de 2005.
(Doc junto aos autos, com o primeiro requerimento de intervenção principal da aqui Autora).
DEVE – admitido o presente articulado – condenar-se, solidariamente, os RR reconvintes e a co-Ré, Câmara Municipal, a pagar à comunidade dos compartes do referido baldio, representada pela Assembleia de Compartes do Baldio ..., indemnização a liquidar em execução de sentença, pelos danos que lhe foram causados, com a sua atuação – a que acrescem juros moratórios, à taxa legal, desde a notificação aos RR, deste requerimento.

Sobre tal requerimento foi proferido em 26/11/2010 (em conclusão de 16/11/2020) o seguinte despacho:
A Assembleia de Compartes do Baldio ... apresentou um requerimento que intitulou «articulado superveniente» (fls. 4062- 4082v, refª 34655672).
Analisado esse requerimento, verificamos que o mesmo consubstancia uma forma de impugnação de factos alegados em reconvenção e já impugnados – pelo que ficaram a constar da base instrutória, cfr. quesitos 47 a 55 –, bem como a apresentação antecipada de alegações.
Além disso, salvo o devido respeito por diferente opinião, ao invés do que a Assembleia de Compartes do Baldio ... afirma, não foram trazidos ao processo «factos constitutivos do direito dos AA.»; o que agora é trazido ao processo é, no essencial, argumentação que contraria a reconvenção que foi deduzida pelos Réus e documentação que visa contrariar essa reconvenção.
Importa referir, ainda, que, a terminar o seu requerimento, a Assembleia de Compartes do Baldio ... formula um pedido indemnizatório contra «os RR reconvinte e a co-Ré Câmara Municipal».
Todavia, após a estabilização da instância – do art. 564.º, alínea b) do Código de Processo Civil – apenas é admitida a ampliação ou a redução do pedido. Ora o pedido indemnizatório é um pedido diferente do pedido inicialmente formulado, é um pedido que acresce ao pedido inicialmente formulado (não é um mero desenvolvimento ou consequência do pedido primitivo), ou seja, estamos perante uma cumulação do pedido (não perante uma ampliação do pedido) que não é admissível face ao disposto no art. 265.º, n.º 2, do Código de Processo Civil.
Pelo exposto, nos termos do art. 588.º, n. 1 do Código de Processo Civil, não se admite o requerimento intitulado «articulado superveniente» (fls. 4062-4082v, refª 34655672) apresentado pela Assembleia de Compartes do Baldio ....

A interveniente “Assembleia da Comunidade dos Compartes do Baldio ...” veio interpor recurso de tal despacho, tendo na sequência da respectiva motivação apresentado as seguintes conclusões:
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RR, SS, TT, UU, VV, WW, XX, YY, como habilitados de CC, e “M..., Lda.”, todos réus/reconvintes, apresentaram contra-alegações, defendendo que deve ser negado provimento ao recurso.

Corridos os vistos legais, cumpre decidir.
São duas as questões a tratar:
a) – apurar se é de admitir o articulado intitulado como “articulado superveniente” apresentado pela interveniente “Assembleia da Comunidade dos Compartes do Baldio ...”;
b) – apurar se é de considerar como de ampliação do pedido o pedido formulado no final daquele articulado, no sentido da condenação solidária dos RR reconvintes e da co-Ré, Câmara Municipal, “a pagar à comunidade dos compartes do referido baldio, representada pela Assembleia de Compartes do Baldio ..., indemnização a liquidar em execução de sentença, pelos danos que lhe foram causados, com a sua atuação”.
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II – Fundamentação

Os dados a ter em conta são os acima alinhados no relatório.
Vamos ao tratamento da questão enunciada sob a alínea a).
Sobre o articulado superveniente dispõe-se no art. 588º do CPC o seguinte:
1.Os factos constitutivos, modificativos ou extintivos do direito que forem supervenientes podem ser deduzidos em articulado posterior ou em novo articulado, pela parte a quem aproveitem, até ao encerramento da discussão.
2.Dizem-se supervenientes tanto os factos ocorridos posteriormente ao termo dos prazos marcados nos artigos precedentes como os factos anteriores de que a parte só tenha conhecimento depois de findarem esses prazos, devendo neste caso produzir-se prova da superveniência.
3.O novo articulado em que se aleguem factos supervenientes é oferecido:
a) Na audiência prévia, quando os factos hajam ocorrido ou sido conhecidos até ao respetivo encerramento;
b) Nos 10 dias posteriores à notificação da data designada para a realização da audiência final, quando não se tenha realizado a audiência prévia;
c) Na audiência final, se os factos ocorreram ou a parte deles teve conhecimento em data posterior às referidas nas alíneas anteriores.
Tendo o articulado em causa sido apresentado já depois de iniciado o julgamento [situação prevista na alínea c) do nº3], no mesmo deveriam ser alegados factos subsumíveis à previsão do nº1, que fossem supervenientes nos termos definidos no nº2 e que tivessem ocorrido ou a interveniente deles tivesse tido conhecimento em data posterior à referida na alínea b) do nº3, ou seja, depois de decorridos 10 dias sobre a notificação da data do julgamento, pois no caso a tramitação dos autos não comportou a realização de audiência prévia.
Como qualquer outro dos articulados que carreia para o processo os factos atinentes aos fundamentos da acção ou da defesa quanto a ela [vide arts. 552º nº1 d) e 572º b) e c) do CPC], do articulado superveniente deve constar a alegação circunstanciada e concreta dos novos factos.
Como se vê do teor de tal articulado, cujo conteúdo integral supra se transcreveu, o mesmo é constituído por um aglomerado de considerações sobre documentos para onde se remete, de comentários diversos sobre alegados comportamentos das contrapartes no processo e de considerações de direito, nele não se conseguindo descortinar uma efectiva descrição de factos concretos “constitutivos, modificativos ou extintivos do direito ocorridos no espaço e concretamente situados no tempo, até de modo a que, conforme se exige no preceito legal que se referiu, se possa verificar que tais factos são posteriores (nos termos referidos sob o nº2 daquele art. 588º) e acrescem aos constantes dos articulados já apresentados ou que, sendo anteriores, só foram conhecidos da Recorrente dentro do balizamento temporal que a lei prevê.
Assim, porque dele não consta uma descrição de factualidade concreta e temporalmente situada, de modo, designadamente, a aquilatar-se do seu conteúdo e tempestividade para efeito do disposto no art. 588º nºs 1 e 3 c) do CPC, é perfeitamente de sufragar a não admissão do articulado em referência decidida pelo tribunal recorrido.

Passemos agora para a questão enunciada sob a alínea b).
Naquele articulado que, enquanto articulado superveniente, se entendeu ser de não admitir, vem formulado o seguinte pedido:
Deve – admitido o presente articulado – condenar-se, solidariamente, os RR reconvintes e a co-Ré, Câmara Municipal, a pagar à comunidade dos compartes do referido baldio, representada pela Assembleia de Compartes do Baldio ..., indemnização a liquidar em execução de sentença, pelos danos que lhe foram causados, com a sua atuação – a que acrescem juros moratórios, à taxa legal, desde a notificação aos RR, deste requerimento”.
No despacho recorrido entendeu-se que tal pedido indemnizatório é um pedido diferente do pedido inicialmente formulado, que acresce a este, não sendo o mesmo um mero desenvolvimento ou consequência do pedido primitivo, do que decorre uma situação de cumulação do pedido – e não uma ampliação do pedido – que não é admissível face ao disposto no art. 265º nº2 do CPC.
Analisemos.
A poder ocorrer ampliação do pedido pela Recorrente, a mesma teria que ser feita por referência ao pedido formulado na petição inicial (como articulado que a ora Recorrente, enquanto interveniente principal, fez seu, pois face ao momento processual da sua intervenção já não podia apresentar articulado próprio, como decorre do art. 314º do CPC).
Ora, na petição inicial da acção não se invocam quaisquer danos concretos cuja indemnização se pretenda, nem, como do petitório final de tal peça se constata, se deduz qualquer pedido de condenação no pagamento de uma qualquer indemnização.
Nesta sequência, não se vê como o pedido ora em análise, de condenação no pagamento de indemnização a liquidar em execução de sentença pelos danos que foram causados, possa ser consequência ou desenvolvimento do pedido inicial e, assim, ser susceptível de ser considerado como ampliação do pedido por via da previsão do art. 265º nº2 do CPC.
E logo por aqui, por o mesmo não integrar ampliação do pedido nos termos previstos naquele preceito, seria de o não admitir, como se decidiu na decisão recorrida.
Por outro lado, a ora Recorrente, naquela sua peça que intitulou de “articulado superveniente”, além de nada alegar no sentido de uma qualquer pretensão de ampliação do pedido inicialmente deduzido, quer por remissão para qualquer factualidade já alegada na petição inicial, quer pela invocação de um qualquer desenvolvimento ou de uma qualquer ocorrência por si considerada como consequência do pedido ali formulado – não refere aquela figura processual, nem sequer por referência a qualquer disposição de direito processual a ela atinente –, formula aquele pedido de forma perfeitamente autónoma e na pura decorrência de todo o conjunto de considerações por remissão para documentos, de comentários e de imputações de juízos de valor às contrapartes que ali foi tecendo.
Portanto, trata-se de um pedido novo e só baseado no pretenso articulado superveniente apresentado.
Assim sendo, tendo-se indeferido o articulado superveniente apresentado como base para a dedução de tal pedido, será desde logo, como consequência de tal indeferimento, de não admitir tal novo pedido.
Porém, ainda que se prescinda do indeferimento do articulado em análise como articulado superveniente e se tente aproveitar algum do seu conteúdo de forma a nele tentar discernir algo que, por relação com a petição inicial, pudesse, de modo a ser enquadrável como consequência ou desenvolvimento do pedido inicial, servir de base ao pedido nele formulado, tal, a nosso ver, não se logra.
O único conteúdo atinente a tal análise seria o que a ora Recorrente ali alega sob o ponto IV, com o título “Do dano” e sob os artigos 17 a 27, onde, a par de ali tecer variadas considerações sobre actuações do Réu CC e das Rés “M...” e Câmara Municipal, refere sob o artigo 23, interpretando aquelas actuações, que as mesmas integram subtracção de áreas à utilização comunitária da comunidade de compartes e privação desta das utilidades e rendimentos que tais áreas pudessem proporcionar.
Ora, além de a subtracção de áreas ali referenciada estar já alegada na petição inicial e ser a base dos pedidos nela formulados sob as alíneas a), b) e c), não podendo por isso ser considerada como uma qualquer consequência ou desenvolvimento do pedido inicial, aquela ali referida privação de utilidades e rendimentos é só alegada naqueles exactos termos, isto é, de forma claramente conclusiva e, portanto, sem arreigamento em quaisquer prejuízos concretos alegados ou minimamente definidos, do que decorre que a mesma nem sequer pode ser considerada como alegação de factualidade susceptível de poder ser interpretada como consequência ou desenvolvimento do pedido inicial e desse modo poder fundar ampliação do pedido para os termos pretendidos no articulado em análise. Note-se que, como se sabe, a operação de liquidação futura de indemnização por danos destina-se apenas a calcular a extensão dos danos apurados – e, por isso, já em concreto anteriormente alegados – e/ou a determinar o valor dos mesmos em termos pecuniários, mas já não, de novo, ao apuramento da sua própria existência [no sentido de que a liquidação pressupõe a anterior existência provada de danos, vide, entre outros, os Acórdãos do STJ de 30/4/2014 (proc. nº593/09.7TTLSB.L1.S1; relator Mário Belo Morgado) e de 18/9/2018 (proc. nº4174/16.0T8LRS.L1.S1; relator Sousa Lameira), disponíveis em www.dgsi.pt].
Assim, pelo que se veio de expor, é de concluir que o pedido formulado no final do articulado superveniente não integra ampliação do pedido que seja admissível.

Por tudo quanto se veio de analisar e decidir, é de concluir pela improcedência do recurso e pela confirmação da decisão recorrida.

Não há lugar a custas do recurso, pois a Recorrente, que nele decaiu, está delas isenta (art. 4º nº1, alínea x) do Regulamento das Custas Processuais).
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Sumário (da exclusiva responsabilidade do relator – art. 663 º nº7 do CPC):
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III – Decisão
Por tudo o exposto, acorda-se em julgar improcedente o recurso, mantendo-se a decisão recorrida.
Sem custas, por a Recorrente, que decaiu, delas estar isenta.
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Porto, 21 de Março de 2022
Mendes Coelho
Joaquim Moura
Ana Paula Amorim