Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
0844004
Nº Convencional: JTRP00041696
Relator: CRAVO ROXO
Descritores: NOTIFICAÇÃO PESSOAL
NOTIFICAÇÃO AO MANDATÁRIO
Nº do Documento: RP200810080844004
Data do Acordão: 10/08/2008
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REC PENAL.
Decisão: NEGADO PROVIMENTO.
Indicações Eventuais: LIVRO 334 - FLS 180.
Área Temática: .
Sumário: A notificação para o arguido pagar a taxa de justiça devida pela interposição de recurso, mesmo com acréscimo, não tem que lhe ser feita pessoalmente, mas apenas na pessoa do seu mandatário ou defensor.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: 4004/08.

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Acordam na Segunda Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto:
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No processo comum nº …/02.1GNPRT, do .º Juízo Criminal da Maia, foi o arguido B………. condenado na pena de 1 ano e 6 meses de prisão, suspensa pelo período de 18 meses (mediante condições), pela prática de 1 crime de homicídio por negligência, previsto no Art. 137º, nº 1, do Código Penal.
No dia 19 de Setembro de 2007, apresentou o arguido as suas alegações de recurso, por não se conformar com a condenação.
Entretanto, com data de 6.12.2007, foi o arguido notificado para pagar a taxa de Justiça, nos termos do Art. 80º, nº 2, do Código das Custas Judiciais, até ao dia 20.12.2007.
No dia 7.12.2007, a mesma notificação foi enviada para o seu mandatário, conferindo 5 dias para o pagamento da taxa de Justiça do recurso, com a cominação do nº 3 do Art. 80º, do Código citado.
A folhas 1046 existe uma guia, onde consta que a taxa de Justiça não foi paga no prazo referido.
Foi então proferido despacho, julgando o recurso sem efeito,
É deste despacho que recorre agora o arguido, para esta Relação.
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São estas as conclusões ipsis verbis do recurso (que balizam e limitam o seu âmbito e objecto):
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1 – Vem o presente recurso interposto do Douto Despacho do Meritíssimo Juiz a quo, exarado a folhas… que julgou o recurso interposto sem efeito, por força da falta de pagamento da taxa de Justiça;
2 - A secretaria apenas procedeu à notificação do mandatário do arguido nos termos e para os efeitos do n° 2 do art. 80 CCJ;
3 - Relativamente à generalidade dos actos a praticar no decurso do processo, a lei processual penal basta-se com a notificação do advogado ou defensor nomeado;
4 - Não assim no que concerne aos actos que pressupõem o conhecimento do destinatário, seja para garantir a sua presença em determinado acto, seja pela exigência da adopção de determinada conduta positiva ou negativa, seja ainda pelo relevo de que se revestem para o destinatário, nomeadamente, por possibilitarem uma reacção cuja relevância pressupõe uma decisão pessoal do destinatário;
5 - A notificação do interessado, nos termos do art. 80°, n°2 do CCJ, para proceder à apresentação do comprovativo do pagamento da taxa de justiça, com acréscimo de igual montante deveria ser feita na pessoa do próprio arguido, por implicar uma exigência da adopção de determinada conduta positiva ou negativa, decisão esta que só pessoalmente o próprio poderia tomar;
6 - Ao não ter sido pessoalmente notificado, o arguido não teve a oportunidade de conformar a sua conduta conforme o exigido e, em consequência, foram afectadas as suas garantias de defesa e acesso ao direito.
7 - Pelo exposto, o presente despacho do tribunal a quo violou o disposto nos art. 80°, n°2 do CCJ e art. 113°, n°9 CPP, e ainda o disposto no art. 32°, n°1 da CRP.
Nestes termos, e nos demais de direito, deve ser dado provimento ao presente recurso e, por via dele, ser revogado o despacho recorrido, substituindo-o por outro que ordene a notificação pessoal do arguido para os termos do disposto no art. 80°, n°2 do CCJ, tudo com as legais consequências, assim se fazendo a necessária Justiça.
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A este recurso respondeu o Ministério Público, considerando que, atento o teor do Art. 80º do CCJ e a actividade da secretaria, notificando o defensor, o recurso não merece provimento.
Já neste Tribunal, o Senhor Procurador-geral Adjunto entende também que o recurso não merece provimento.
Fio dado cumprimento ao disposto no Art. 417º, nº 2, do Código de Processo Penal, sem resposta.
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É este o teor do despacho sob censura:
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A fls. 973 veio o arguido B………. interpor recurso da sentença proferida nos autos.
O arguido não deu cumprimento do disposto no artigo 80º, nº1, do C.C.J.
Notificado, na pessoa do seu ilustre mandatário, para, no prazo de cinco dias apresentar documento comprovativo do pagamento autoliquidado da taxa de justiça devida pela interposição do recurso e da sanção prevista no artigo 80º do C.C.J., com a expressa advertência de que caso não efectuassem o pagamento das quantias devidas (cuja guia seguiu anexa) o requerimento de interposição de recurso seria considerado sem efeito, nos termos do nº3, do referido preceito legal (cfr. fls. 1044 e 1045).
O arguido não procedeu ao pagamento da quantia devida.
Estipula o artigo 80º, do Código das Custas Judiciais que “a taxa de justiça que seja condição de seguimento de recurso, deve ser autoliquidada e o documento comprovativo do seu pagamento junto ao processo com a apresentação do requerimento na secretaria ou no prazo de 10 dias a contar da sua formulação no processo (nº1); na falta de apresentação do documento comprovativo no prazo referido no número anterior, a secretaria notifica o interessado para proceder à sua apresentação no prazo de cinco dias, com acréscimo de taxa de justiça de igual montante (nº2); a omissão do pagamento das quantias referidas no número anterior determina que o requerimento de recurso seja considerado sem efeito (nº3).
Assim sendo, uma vez que o arguido, pese embora notificado para o efeito, não procedeu ao pagamento das quantias devidas pela interposição do recurso, ao abrigo do disposto no artigo 80º, nº3, do C.C.J. julga-se o mesmo sem efeito
Sem custas atenta a simplicidade da questão.
Notifique.
Em face do teor do despacho que antecede, de onde resulta que, tendo decorrido o prazo para os arguidos interporem recurso e tendo o mesmo sido julgado sem efeito, ocorreu o trânsito em julgado do douto acórdão proferido nos presentes autos, pelo que, nos termos do disposto no artigo 214°, alínea e) do Código de Processo Penal, declaram-se extintas, as medidas de coacção impostas aos arguidos.
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Questão a decidir:
Neste recurso do arguido, importa apenas avaliar se o não pagamento da taxa de Justiça referente ao recurso da sentença implica que este último fique sem efeito.
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Na versão do Código das Custas Judiciais vigente à data da interposição do recurso do arguido, era este o texto do seu Art. 80º:
Pagamento inicial da taxa de justiça e sanção pela sua omissão
1 - A taxa de justiça, que seja condição de abertura da instrução, de constituição de assistente ou de seguimento de recurso, deve ser autoliquidada e o documento comprovativo do seu pagamento junto ao processo com a apresentação do requerimento na secretaria ou no prazo de 10 dias a contar da sua formulação no processo.
2 - Na falta de apresentação do documento comprovativo no prazo referido no número anterior, a secretaria notifica o interessado para proceder à sua apresentação no prazo de cinco dias, com acréscimo de taxa de justiça de igual montante.
3 - A omissão do pagamento das quantias referidas no número anterior determina que o requerimento para abertura da instrução, para constituição de assistente ou o recurso sejam considerados sem efeito.
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Temos por certo que, dentro do prazo estipulado para o efeito, a taxa de Justiça não foi paga.
O arguido fora notificado nos termos do nº 1 do Código; e posteriormente, a secretaria notificou o seu Ilustre Mandatário, para os efeitos do nº 2 daquele Art. 80º.
Defende o arguido que a notificação a que se refere o Art. 80º, nº 2, citado, deveria ter sido feita na pessoa, quer do arguido, quer do seu Advogado e defensor.
O nº 2 do Art. 80º, do CCJ, tem de ser visto no encadeamento lógico do seu nº 1 e disciplina a falta de apresentação do documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça a que se reporta o referido nº 1; assim, na falta de apresentação do documento comprovativo no prazo referido no nº 1 da norma em causa, a secretaria notifica o interessado para proceder à sua apresentação no prazo de cinco dias, com o acréscimo de taxa de justiça de igual montante, conforme impõe o Art. 80º, nº 2, do CCJ.
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As notificações, em sede processual penal, são efectuadas nos termos do Art. 113º do Código de Processo Penal.
Relevante para o caso em concreto é o seu nº 9, que reza assim:
As notificações do arguido, do assistente e das partes civis podem ser feitas ao respectivo defensor ou advogado. Ressalvam-se as notificações respeitantes à acusação, à decisão instrutória, à designação de dia para julgamento e à sentença, bem como as relativas à aplicação de medidas de coacção e de garantia patrimonial e à dedução do pedido de indemnização civil, as quais, porém, devem igualmente ser notificadas ao advogado ou defensor nomeado; neste caso, o prazo para a prática de acto processual subsequente conta-se a partir da notificação efectuada em último lugar.
Assim só naqueles casos específicos, expressamente descritos nesta norma, é o arguido também notificado (e só nesses).
Não se pretenda interpretar uma norma desta importância, com apelo ao texto de uma norma que regula o mero pagamento de custas: o interessado de que fala o Art. 80º é o arguido, mas a notificação relativa ao pagamento da taxa de Justiça é feita apenas ao seu advogado ou defensor, nos termos regulados na lei de processo.
E quem melhor que o Advogado do arguido, para saber contar prazos e fazer os pagamentos a tempo e horas (o argumento de que seria sempre o arguido a fazer o pagamento obviamente não colhe).
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Não se vê, por outro lado, como foi violado o disposto no Art. 32º da Constitui­ção: prescreve esta norma da Constituição da República Portuguesa que o arguido tem direito a escolher defensor e a ser por ele assistido em todos os actos do processo.
E o arguido beneficiou de todas as garantias e direitos que a Lei fundamental lhe confere, sendo mesmo na pessoa do seu defensor que um acto necessário à prossecução de um recurso foi notificado (mal, seria a situação inversa).
Pelo que nenhuma violação existiu a esta norma.
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Em suma e para concluir, tal como rege o Art. 113º, nº 9, do Código de Processo Penal, a notificação para o pagamento da taxa de justiça de um recurso, mesmo com acréscimo, só deve ser feita na pessoa do mandatário ou defensor do arguido, já não na pessoa deste.
De tal norma não resulta ser esta uma das suas excepções, pelo que não é imposta tal notificação ao arguido.
O que significa que o despacho em crise não violou qualquer norma, aplicou a lei de forma correcta e bem decidiu, ao não considerar sem efeito o recurso interposto, por não se mostrar paga a respectiva taxa e acréscimos.
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Decisão.
Pelo exposto, acordam nesta Relação em julgar improcedente o recurso do arguido, confirmando o despacho recorrido.
O arguido pagará 3 UCs de taxa de Justiça.
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Porto, 8/10/2008
António Luís T. Cravo Roxo
António Álvaro Leite de Melo