Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
2602/17.7T8AVR.1.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: RITA ROMEIRA
Descritores: REMIÇÃO DE PENSÃO
REMIÇÃO PARCIAL
REMIÇÃO FACULTATIVA
ENTIDADES RESPONSÁVEIS
QUOTAS PARTES RESPONSABILIDADE
Nº do Documento: RP201911042602/17.7T8AVR.1.P1
Data do Acordão: 11/04/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE, REVOGADA A DECISÃO
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL)
Área Temática: .
Sumário: I – A aferição do preenchimento das condições estabelecidas nas alíneas do nº 2, do art. 75º, da NLAT, tem de ser efectuada em função da pensão globalmente considerada, independentemente da divisão da responsabilidade pelo respectivo pagamento.
II - As pensões constituem um todo único ainda que a responsabilidade pelo seu pagamento esteja distribuída por mais do que uma entidade.
III - A remição parcial de uma pensão com quotas-partes de responsabilidade pelo seu pagamento divididas por várias entidades incide, na respectiva proporção, sobre as várias quotas da pensão.
IV - Embora a pensão seja da responsabilidade de duas entidades, não é possível remir a totalidade da quota da pensão da responsabilidade de uma delas, dado não ser possível a remição das fracções, mas só da pensão global.
V - O art. 75º, da NLAT estipula sobre as condições de remição de pensões, em concreto, no seu nº 2, de remição facultativa mas, apenas, prevê que a mesma ocorra quando, entre os demais requisitos aí previstos, a requerimento do sinistrado, a pensão anual vitalícia corresponda a incapacidade igual ou superior a 30% e não em casos de pensões atribuídas com base em incapacidades inferiores, ainda que com IPATH.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Proc.Nº 2602/17.7T8AVR.1.P1
Origem: Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro, Aveiro - Juízo do Trabalho - Juiz 1
Recorrente: Companhia de Seguros B…, S.A.
Recorridos: C… e D…, Lda

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto

I – RELATÓRIO:
Nestes autos emergentes de acidente de trabalho, com processo especial, ocorrido em 01.07.2016, em que é sinistrado, C… e entidades responsáveis, as Rés, Companhia de Seguros B…, S.A. e D…, Lda, teve o presente incidente, de remição de pensão, início através do requerimento apresentado pelo sinistrado e pela responsável/empregadora, nos termos que constam a fls. 129 e ss., no qual pedem que seja admitida a remição parcial da pensão, posteriormente, especificando, somente quanto à parte da pensão da responsabilidade da co-Ré, D…, Lda, na sua totalidade.
Após, a prática das diligências que teve por convenientes, em 21.05.2019, o Mº Juiz “a quo” proferiu a seguinte decisão:
«Neste processo especial emergente de acidente de trabalho, o sinistrado C… e a entidade empregadora “D…, Ld.ª”, com os sinais dos autos, vieram requerer conjuntamente a remição da pensão, na parte pela qual é responsável a entidade empregadora.
Não houve oposição do Ministério Público.
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Como resulta do disposto no art. 75° n.º 2 da Lei n.º 98/2009, de 04/091, as pensões anuais e vitalícias podem ser parcialmente remidas, a requerimento do sinistrado ou do beneficiário, desde que a pensão anual sobrante não seja inferior a 6 vezes o valor da retribuição mínima mensal garantida (rmmg) em vigor à data da autorização da remição, e o capital a remir não seja superior ao que resultaria de uma pensão calculada com base numa incapacidade de 30%.
Ao sinistrado foi fixada, em virtude do acidente em discussão nos presentes autos, uma IPP de 22,5%, com IPATH (cfr. fls. 122 e segs. dos autos), que lhe dá direito a receber uma pensão anual e vitalícia no valor actual global de € 8.902,28, da qual € 1.366,51 são da responsabilidade da entidade empregadora e € 7.535,77 da Companhia de Seguros B…, S.A..
Atendendo à rmmg actualmente em vigor (€ 600,00), mostram-se preenchidos em concreto os requisitos necessários à remição parcial requerida, na parte pela qual é responsável a entidade empregadora (€ 1.366,51), cujo capital de remição não é superior ao que resultaria de uma pensão calculada com base numa IPP de 30%. Ficando por remir a parte da pensão pela qual é responsável a seguradora, no valor actual de € 7.535,77, que não é inferior ao produto da rmmg x 6.
Custas do incidente pelo sinistrado e entidade empregadora, em partes iguais (art. 527 n.ºs 1 e 2 do Cód. de Processo Civil), com taxa de justiça mínima.
Registe e notifique.
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Valor do incidente: O do capital a remir.
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Proceda-se ao cálculo do capital de remição e, após, vão os autos com vista ao Ministério Público, nos termos e para efeitos do disposto no art. 148º n.ºs 3 e 4 do Cód. de Processo de Trabalho
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Inconformada com esta decisão, a seguradora veio interpor recurso, com os fundamentos que constam das alegações, terminando com as seguintes “CONCLUSÕES:
1. Vem a presente apelação interposta do douto despacho de fls., que, apreciando o pedido formulado pelo sinistrado de remição parcial da pensão que lhe foi atribuída, com a especificidade de requerer apenas a remição total da quota parte da pensão a cargo da entidade patronal, julgou procedente tal pedido de remição nos seus precisos termos, dela excluindo a quota parte da pensão a cargo da seguradora e ora recorrente, que manteve integralmente.
2. Salvo o devido respeito, esta decisão deve ser revogada, por enfermar de erro de interpretação e aplicação da lei, ao tratar individualmente cada uma das quotas-partes da pensão atribuída ao sinistrado, como se se tratasse de duas pensões distintas, considerando admissível a remição total da quota-parte a cargo de uma das responsáveis, deixando inalterável a quota-parte a cargo da outra responsável.
3. Com efeito, a sentença proferida no presente processo declarou o sinistrado afectado de uma incapacidade permanente parcial de 22,5%, com IPATH, atribuindo-lhe uma pensão anual e vitalícia no montante de 8.902,28 €, devida desde 02/12/2017, dos quais 7.535,77 € ficaram a cargo da seguradora, ora recorrente, e 1.366,51 € a cargo da sua entidade empregadora.
4. Por requerimento de 8 de Maio de 2019, o sinistrado requereu a remição parcial daquela sua pensão anual e vitalícia, especificando posteriormente – em 16 de Maio de 2019 e na sequência de despacho proferido nesse sentido – que “a remissão [sic] que pretende diz respeito somente à parte da pensão da responsabilidade da Ré, D…, Lda, na sua totalidade”.
5. Apreciando esse requerimento, o Mtº Juiz recorrido entendeu que “atendendo à rmmg actualmente em vigor (€ 600), mostram-se preenchidos em concreto os requisitos necessários à remição parcial requerida, na parte pela qual é responsável a entidade empregadora (€ 1.366,51), cujo capital de remição não é superior ao que resultaria de uma pensão calculada com base numa IPP de 30%. Ficando por remir a parte da pensão pela qual é responsável a seguradora, no valor actual de € 7.535,77, que não é inferior ao produto da rmmg x 6”.
6. Ora, do disposto nos arts. 48º-3-b) e 79º-4 e 5 da Lei 98/2009, de 4 de Setembro (LAT), resulta evidente que o sinistrado não tem direito a duas pensões, mas sim a uma única pensão por cujo pagamento são responsáveis em conjunto, e não solidariamente, duas entidades.
7. Assim, o caráter unitário das pensões por acidente de trabalho impõe que na sua extinção, parcial, intervenham os mesmos responsáveis pelo seu pagamento e na mesma proporção em que foram condenados a pagar essa pensão,
8. O que significa que não é possível remir a totalidade da quota da pensão - parcial - da responsabilidade de uma entidade com o argumento de que a parte remível da pensão - global - é superior ao legalmente exigível.
9. Aliás, o facto de as remições facultativas serem sempre parciais implica que as entidades responsáveis fiquem obrigadas a pagar sempre uma parte da pensão, sob a forma de renda, depois de efetuada essa remição.
10. Ao decidir que “a remição poderá operar apenas quanto à entidade patronal – uma vez que só quanto a ela foi requerida – mantendo-se o pagamento da pensão anual vitalícia por parte da Seguradora”, mandando proceder ao cálculo do capital de remição da quota parte da pensão a cargo da entidade patronal e declarando que se manterá o pagamento da quota-parte da seguradora, o douto despacho recorrido violou, por erro de interpretação e aplicação, o disposto nos arts. 48º-3-b), 75º-2-a) e 79º-4 e 5 da Lei 98/2009, de 4 de Setembro,
11. Pelo que essa decisão deve ser revogada e substituída por outra que julgue que a remição parcial da pensão atribuída ao sinistrado apenas é possível com referência à totalidade da pensão, e não apenas quanto à quota-parte de um dos responsáveis pelo seu pagamento, indeferindo o requerido pelo sinistrado,
12. Ou, se assim se entender, deferindo a remição parcial da pensão quanto a 1.366,51 €, mas repartindo o respectivo capital de remição proporcionalmente pelas responsáveis pelo pagamento da pensão.
Assim se fazendo J U S T I Ç A!
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O Ministério Público veio responder, nos termos que constam a fls. 154 e ss., sem formular conclusões, finaliza expressando o entendimento de que a decisão sob recurso não merece censura.
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Nos termos que constam do despacho de fls. 156, o Mº Juiz “a quo” admitiu a apelação, a subir imediatamente, com efeito meramente devolutivo e ordenou a remessa dos autos a este Tribunal.
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O Ministério Público teve vista nos autos, nos termos do art. 87º nº3, do CPT, tendo-se pronunciado no sentido de ser concedido provimento ao recurso, no essencial, por considerar que o sinistrado não tem direito a duas pensões, mas a uma única.
As partes não apresentaram resposta a este parecer.

Dado cumprimento ao disposto no art. 657º, nº 2 do CPC, cumpre decidir.
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O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações da recorrente, cfr. art.s 635º, nº 4 e 639º, nºs 1 e 2 do Código de Processo Civil aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho, aplicável “ex vi” do art. 87º, nº 1, do Código de Processo do Trabalho, ressalvadas as questões de conhecimento oficioso que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado.
Assim, a questão única colocada à resolução deste Tribunal, consiste em saber se a decisão recorrida deve ser revogada por, erradamente, ter considerado ser admissível a remição parcial da pensão, na sua totalidade, quanto à quota-parte da responsabilidade da entidade empregadora.
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II - FUNDAMENTAÇÃO
A factualidade com relevância para apreciação e decisão deste recurso é a que resulta do relatório que antecede, devidamente documentada nos autos, nomeadamente:
- O sinistrado à data do acidente, auferia a retribuição anual de € 15.792,95, estando a responsabilidade infortunística da empregadora transferida para a seguradora, apenas, pela retribuição anual de € 13.368,71.
- Desde 02.12.2017, o A. tem direito a uma pensão anual e vitalícia de € 8.607,16, derivada de uma IPP de 22,5% com IPATH, sendo € 7.285,95 da responsabilidade da seguradora e € 1.321,21 da responsabilidade da entidade empregadora, actualizada para o montante global de € 8.902,28, do qual € 1.366,51 são da responsabilidade da entidade empregadora e € 7.535,77 da entidade seguradora.
- Em 12.03.2019 e 16.05.2019, o sinistrado e a entidade empregadora vieram requerer a remição parcial da pensão, somente quanto à parte da pensão da responsabilidade da Ré, empregadora, na sua totalidade.
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Vem o recurso em análise interposto da decisão, supra transcrita, que considerando o disposto no art. 75° nº 2 da Lei nº 98/2009, de 04/09, NLAT (Regime infortunístico aplicável ao caso, dada a data (01.07.2016) em que ocorreu o acidente sofrido pelo sinistrado (diploma a que pertencerão os demais artigos a seguir referidos, sem outra indicação de origem)) e por considerar que, “atendendo à rmmg actualmente em vigor (€ 600,00), mostram-se preenchidos em concreto os requisitos necessários à remição parcial requerida, na parte pela qual é responsável a entidade empregadora (€ 1.366,51), cujo capital de remição não é superior ao que resultaria de uma pensão calculada com base numa IPP de 30%”, deferiu o pedido formulado pelo sinistrado e pela empregadora, concedendo-lhe a remição parcial da pensão, na sua totalidade quanto à parte da pensão da responsabilidade da entidade empregadora. “Ficando por remir a parte da pensão pela qual é responsável a seguradora, no valor actual de € 7.535,77, que não é inferior ao produto da rmmg x 6”.
Ora, desta, discorda a seguradora/recorrente, invocando o carácter unitário das pensões por acidente de trabalho e o facto de as remições facultativas serem sempre parciais, implicando que, pese embora esta, as entidades responsáveis fiquem obrigadas a pagar sempre uma parte da pensão, sob a forma de renda, pugna pela sua revogação, no que a acompanha a Ex.ma Procuradora junto deste Tribunal, nos termos que constam do parecer proferido nos autos.
Que dizer?
Desde já, que assiste razão à recorrente.
Sem dúvida, sempre com o devido respeito por diverso entendimento, atento o que decorre da lei e é o entendimento doutrinal e jurisprudencial a este propósito, que acompanhamos, aquela não pode manter-se.
Justificando.
O art. 48º da NLAT sob a epígrafe “Prestações”, dispõe que:

“1 – (...).
2 - A indemnização em capital e a pensão por incapacidade permanente e o subsídio de elevada incapacidade permanente são prestações destinadas a compensar o sinistrado pela perda ou redução permanente da sua capacidade de trabalho ou de ganho resultante de acidente de trabalho.
3 - Se do acidente resultar redução na capacidade de trabalho ou de ganho do sinistrado, este tem direito às seguintes prestações:
(...);
b) Por incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual - pensão anual e vitalícia compreendida entre 50 % e 70 % da retribuição, conforme a maior ou menor capacidade funcional residual para o exercício de outra profissão compatível;
(...)”.
Quanto ao “Cálculo e pagamento das prestações”, dispõe o art. 71º, que:
“1 - A indemnização por incapacidade temporária e a pensão por morte e por incapacidade permanente, absoluta ou parcial, são calculadas com base na retribuição anual ilíquida normalmente devida ao sinistrado, à data do acidente.
(...)”.
E o art. 79º, sobre o “Sistema e unidade de seguro”, dispõe que:
“1 - O empregador é obrigado a transferir a responsabilidade pela reparação prevista na presente lei para entidades legalmente autorizadas a realizar este seguro.
(...)
4 - Quando a retribuição declarada para efeito do prémio de seguro for inferior à real, a seguradora só é responsável em relação àquela retribuição, que não pode ser inferior à retribuição mínima mensal garantida.
5 - No caso previsto no número anterior, o empregador responde pela diferença relativa às indemnizações por incapacidade temporária e pensões devidas, bem como pelas despesas efectuadas com a hospitalização e assistência clínica, na respectiva proporção.”.
Foi com base e atento o que decorre destes dispositivos que se verifica que ao sinistrado, devido ao acidente a que se reportam os autos e ao facto da empregadora não ter a sua responsabilidade totalmente transferida, foi atribuída, desde 02.12.2017, uma pensão anual e vitalícia de € 8.607,16 que, devidamente actualizada, ascende ao valor actual de € 8.902,28, sendo € 7.535,77 da responsabilidade da seguradora e € 1.366,51 da responsabilidade da entidade empregadora e não duas pensões.
Ora, sendo deste modo, tal como defende a recorrente, é claro que o sinistrado só tem direito a uma pensão, sendo a responsabilidade do seu pagamento conjunta das entidades, seguradora e empregadora, atenta a retribuição auferida, na proporção transferida e não transferida, não sendo nenhuma delas responsável autónoma por, respectivamente, uma pensão de € 7.535,77 e de € 1.366,51, mas sim, em conjunto, são responsáveis pela pensão de € 8.902,28, cabendo à seguradora a quota-parte de responsabilidade de 84,65% e à empregadora a quota-parte de 15,35%, “designadamente para efeitos de remição de pensões”, neste sentido veja-se o (Ac. do TRC de 21.11.2013, Proc. 899/09.5TTLRA.C1, relatado pelo Desembargador Jorge Loureiro, disponível in www.dgsi.pt (lugar da internet onde se encontrarão os demais acórdãos a seguir citados, sem outra indicação)).
Entendimento idêntico, ao contrário do que se considerou na decisão recorrida, decorre do que dispõe aquela Lei nº 98/2009, na SECÇÃO VII sob a epígrafe “Remição de pensões”, quando no art. 75º estipula sobre “Condições de remição” que:
“1 – (...).
2 - Pode ser parcialmente remida, a requerimento do sinistrado ou do beneficiário legal, a pensão anual vitalícia correspondente a incapacidade igual ou superior a 30% ou a pensão anual vitalícia de beneficiário legal desde que, cumulativamente, respeite os seguintes limites:
a) A pensão anual sobrante não pode ser inferior a seis vezes o valor da retribuição mínima mensal garantida em vigor à data da autorização da remição;
b) O capital da remição não pode ser superior ao que resultaria de uma pensão calculada com base numa incapacidade de 30 %.
(...).
5 - No caso de o sinistrado sofrer vários acidentes, a pensão a remir é a global.”.
Sem dúvida, a interpretação deste artigo, quanto à análise sobre as condições de remição parcial da pensão, só pode ser efectuada tendo em atenção a pensão global anual fixada, ainda, que a responsabilidade pelo seu pagamento seja de duas entidades, como é o caso.
Neste mesmo sentido, de as pensões constituírem um todo único e da não admissibilidade de remição, apenas, de quotas-partes, na sua totalidade, quando a pensão global é da responsabilidade de duas ou mais entidades, já há muito ensinou (José Augusto Cruz de Carvalho in “ACIDENTES DE TRABALHO E DOENÇAS PROFISSIONAIS” LEGISLAÇÃO ANOTADA, 2ª ED., ACTUALIZADA, 1983, pág. 265) onde se lê: “-As pensões constituem um todo único ainda que a responsabilidade pelo seu pagamento esteja distribuída por mais de uma pessoa ou entidade. Só no caso do seu montante global não exceder o limite fixado neste artigo, a sua remição será possível.
-É lícita a remição de pensões dentro dos limites estabelecidos na lei. No caso de uma pensão exceder os limites ali fixados, embora a responsabilidade pelo seu quantitativo esteja repartida por mais de uma pessoa não é possível a remição das fracções (Parecer Inspector Jud., Henrique Parreira, in Bol. INTP, X, págs. 12 e 375).”.
Seguindo idêntico entendimento, apreciando idêntica questão, à colocada nos autos, de saber se é possível remir parcialmente uma pensão, quando a responsabilidade pelo respectivo pagamento esteja dividida entre a seguradora e a empregadora do sinistrado, imputando a parte a remir na totalidade da quota da responsabilidade da empregadora, na fundamentação de douto (Ac. desta Relação e Secção, de 19.12.2005, proferido no Proc. nº 0544117, relatado pelo Desembargador Ferreira da Costa), assentou-se o seguinte: “Ora, sendo a pensão uma só, mas sendo duas ou mais as entidades responsáveis pelo seu pagamento, a remição, sendo uma forma de extinção da obrigação, impõe a intervenção conjunta dos sujeitos passivos ou, pelo menos, que se trate o interesse de cada um deles na mesma proporção em que aceitaram - ou foram condenados a - pagar a pensão.
Tal significa que, como no caso em apreço, não é possível remir a totalidade da quota da pensão - parcial - da responsabilidade de uma entidade com o argumento de que a parte remível da pensão - global - é superior. Na verdade, como refere o Tribunal a quo no despacho de sustentação, tal entendimento levaria a impossibilitar a outra entidade – a seguradora – de exercer o seu direito a remir, pelo menos na amplitude legalmente admissível.
(…).
Assim, sendo a quota da pensão da responsabilidade da entidade empregadora do montante de € 1.642,67, ela poderia – na tese dela – ser remida na totalidade.
Mas não é assim.
Estabelecida na proporção a responsabilidade das entidades - seguradora e patronal - na formação da pensão, igual proporção tem de ser observada na remição [extinção] dela, sob pena de se poder postergar o direito de remir daquela que – ainda – não exerceu o direito correspondente. Aliás, sendo as remições facultativas sempre parciais, como resulta do disposto no Art.º 56.º n.º 2, corpo, do Decreto-Lei n.º 143/99, de 30 de Abril, tal significa que a entidade responsável ou as entidades responsáveis, ficam obrigadas a pagar sempre uma parte da pensão, sob a forma de renda, depois de efectuada a remição e que corresponde, naturalmente, à parte proporcional da pensão não remida. Trata-se de questão de elementar justiça e corresponde aos ensinamentos da doutrina.”.
Seguindo esta fundamentação, no citado (Ac. TRC, Proc. n.º 899/09.5TTLRA.C1), sumariou-se o seguinte:
“I – O carácter unitário das pensões por acidente de trabalho, devidas ao trabalhador sinistrado ou ao seu cônjuge, ainda que por duas entidades (seguradora e entidade patronal), não permite uma apreciação individualizada de cada quota-parte da pensão devida por cada um dos obrigados ao seu pagamento para efeitos de se saber se essa pensão é ou não remível e, na afirmativa, em que condições.
II – As pensões desta natureza constituem um todo único, ainda que a responsabilidade pelo seu pagamento esteja distribuída por mais de uma pessoa ou entidade.
III – Só no caso do seu montante global não exceder o limite fixado nos artºs 56 e 57º do Dec.Lei nº 143/99, de 30/04 é que a sua remição será possível.”.
Entendimento, também, perfilhado, pelo Supremo Tribunal de Justiça (Ac. de 10.12.2015, Proc. nº 996/04.3TTLSB-C.L1.S1, 4ª SECÇÃO, relator Conselheiro Leones Dantas), como decorre do que se sintetizou, no seu sumário:
“1 – As condições estabelecidas nas alíneas do n.º 2 do artigo 56.º do Decreto-Lei n.º 143/99, de 30 de abril, relativamente a remição parcial de pensões aferem-se em função da pensão fixada ao sinistrado, globalmente considerada, independentemente da divisão da responsabilidade pelo respetivo pagamento por várias entidades.
2 – O equilíbrio de interesses subjacente à remição parcial de pensões estabelecido no dispositivo referido no número anterior impede a imputação na quota de um dos co-obrigados pelo pagamento da pensão do capital da remição parcial e a imputação na quota do outro, ou outros, da pensão sobrante.”.
De acordo com o entendimento que antecede e o que decorre daquele art. 75º, da NLAT, como já supra referimos, só podemos concluir que a decisão recorrida não pode manter-se. As condições estabelecidas nas alíneas do nº 2 daquele artigo, terão de ser aferidas em função do montante anual unitário e global da pensão fixada ao sinistrado devendo, quer na determinação do capital de remição, quer da pensão anual sobrante, manter-se a distribuição de responsabilidades na proporção inicialmente fixada.
Pois como decorre do que se deixou exposto, em situações, como no caso, de pensões com responsabilidade de pagamento dividida por seguradora e entidade empregadora, esta dimensão de equilíbrio, não pode ser posta em causa no âmbito da remição parcial da pensão, tem de manter-se, nas respectivas proporções, não sendo admissível a remição, apenas, da totalidade da quota-parte da pensão de um dos responsáveis.
Ou seja, em casos de remição facultativa das pensões, não pode concentrar-se a responsabilidade pelo pagamento do capital da parte da pensão remida no responsável por essa quota e transformar a quota do outro responsável, não afectada com a remição, em pensão sobrante, designadamente, para efeitos de aferição do preenchimento das condições estabelecidas naquele art. 75º, que estipula que tem de ser efectuada em função da pensão globalmente considerada, independentemente da divisão da responsabilidade pelo respectivo pagamento.
Em suma, a remição parcial de uma pensão com quotas-partes de responsabilidade pelo seu pagamento divididas por várias entidades incide, na respectiva proporção, sobre as várias quotas da pensão.
Assim, tendo-se deferido no caso, o pedido de remição da totalidade da quota-parte da pensão da empregadora, não podem suscitar-se dúvidas que a decisão recorrida não pode manter-se e tem de ser revogada, como defende a recorrente mas, apenas, isso.
Pois que, a mesma, não pode ser substituída por outra que julgue que a remição parcial da pensão atribuída ao sinistrado, apenas, é possível com referência à totalidade da pensão porque, no caso, não se verificam tão pouco as condições para que tal ocorra.
A pensão devida ao sinistrado foi-lhe atribuída, em virtude de lhe ter sido fixada uma IPP de 22,5%, com IPATH, não abrangida pelo art. 75º, da NLAT que estipula sobre as condições de remição, em concreto, no seu nº 2, de remição facultativa mas, apenas, prevê que a mesma ocorra quando, como é o caso, a requerimento do sinistrado, quando a pensão anual vitalícia corresponda a incapacidade igual ou superior a 30% e não, em casos de pensões atribuídas com base em incapacidades inferiores, ainda que com IPATH, como é o caso dos autos, em que a IPP é inferior a 30%.
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III - DECISÃO
Pelo exposto, acordam as Juízas desta secção em julgar procedente a apelação e em revogar a decisão recorrida.

Custas, em partes iguais, pelo A. e empregadora, recorridos.
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Porto, 4 de Novembro de 2019
Rita Romeira
Teresa Sá Lopes
Fernanda Soares