Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
5513/10.3TBVFR.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: MANUEL DOMINGOS FERNANDES
Descritores: CONTRATO DE EMPREITADA
INTERESSE EM AGIR
REAPRECIAÇÃO DA PROVA
DEFEITOS
REPARAÇÃO URGENTE
Nº do Documento: RP201503025513/10.3TBVFR.P1
Data do Acordão: 03/02/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Indicações Eventuais: 5ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - O interesse em agir pressupõe a necessidade e a adequação do meio de tutela de que se lança mão, ou seja, exige que para a solução do conflito o autor deve socorrer-se inevitavelmente da actuação judicial (a necessidade), e ainda que o meio processual usado deve ser aquele apto a reparar uma efectiva lesão do direito do autor (a adequação), tal como este a representa.
II - No caso de transmissão, por acto entre vivos, da coisa ou direito litigioso (artigo 263.º, nº 1 do CPCivil), aquele interesse no prosseguimento da lide, que aqui se compagina com a questão da legitimidade, continua a existir na pessoa do transmitente.
III - Este normativo cria uma situação de legitimidade ad hoc extraordinária, sendo fundamentalmente os interesses da parte estranha à transmissão que justificam a permanência do transmitente enquanto parte legítima na acção que só cessará com a eventual habilitação do transmissário.
IV - Desde que a pessoa, posto que tenha interesse directo na causa, não ocupa nela a posição que permita o seu depoimento como parte (artigo 452.º do CPCivil), pode depor como testemunha, podendo, como é evidente, tal depoimento ser apreciado tendo em conta aquele interesse.
V - Na reapreciação da prova a Relação goza da mesma amplitude de poderes da 1.ª instância e, tendo como desiderato garantir um segundo grau de jurisdição relativamente à matéria de facto impugnada, deve formar a sua própria convicção.
VI - O direito de primazia concedido ao empreiteiro ou ao vendedor relativo à eliminação dos defeitos não é absoluto. Nos casos de urgência na reparação ou nos casos em que volvido um prazo razoável não realizar de forma definitiva e de modo útil a prestação a que está vinculado, o princípio da boa fé e o equilíbrio das prestações contratuais, determina que seja permitido ao dono da obra executar por si ou por terceiro, a eliminação dos defeitos à custa do empreiteiro.
VII - Neste particular contexto, quer a acção directa (artigo 336.° CC) como o estado de necessidade (artigo 339.º CC), justificam o afastamento do procedimento previsto nos artigos 1221.° e 1222.° do Código Civil, sendo legitimo que o dono da obra ou o comprador a realize por sua conta, com a possibilidade de ser reembolsado pelo empreiteiro ou pelo vendedor das despesas efectuadas.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº 5513/10.3TBVFR.P1-Apelação
Origem: Tribunal Judicial da Comarca de Santa Maria da Feira, 4º Juízo Cível
Relator: Manuel Fernandes
1º Adjunto Des. Caimoto Jácome
2º Adjunto Des. Macedo Domingues
Sumário
I- O interesse em agir pressupõe a necessidade e a adequação do meio de tutela de que se lança mão, ou seja, exige que para a solução do conflito o autor deve socorrer-se inevitavelmente da actuação judicial (a necessidade), e ainda que o meio processual usado deve ser aquele apto a reparar uma efectiva lesão do direito do autor (a adequação), tal como este a representa.
II- No caso de transmissão, por acto entre vivos, da coisa ou direito litigioso (artigo 263.º, nº 1 do CPCivil), aquele interesse no prosseguimento da lide, que aqui se compagina com a questão da legitimidade, continua a existir na pessoa do transmitente.
III- Este normativo cria uma situação de legitimidade ad hoc extraordinária, sendo fundamentalmente os interesses da parte estranha à transmissão que justificam a permanência do transmitente enquanto parte legítima na acção que só cessará com a eventual habilitação do transmissário.
IV- Desde que a pessoa, posto que tenha interesse directo na causa, não ocupa nela a posição que permita o seu depoimento como parte (artigo 452.º do CPCivil), pode depor como testemunha, podendo, como é evidente, tal depoimento ser apreciado tendo em conta aquele interesse.
V- Na reapreciação da prova a Relação goza da mesma amplitude de poderes da 1.ª instância e, tendo como desiderato garantir um segundo grau de jurisdição relativamente à matéria de facto impugnada, deve formar a sua própria convicção.
VI- O direito de primazia concedido ao empreiteiro ou ao vendedor relativo à eliminação dos defeitos não é absoluto. Nos casos de urgência na reparação ou nos casos em que volvido um prazo razoável não realizar de forma definitiva e de modo útil a prestação a que está vinculado, o princípio da boa fé e o equilíbrio das prestações contratuais, determina que seja permitido ao dono da obra executar por si ou por terceiro, a eliminação dos defeitos à custa do empreiteiro.
VII- Neste particular contexto, quer a acção directa (artigo 336.° CC) como o estado de necessidade (artigo 339.º CC), justificam o afastamento do procedimento previsto nos artigos 1221.° e 1222.° do Código Civil, sendo legitimo que o dono da obra ou o comprador a realize por sua conta, com a possibilidade de ser reembolsado pelo empreiteiro ou pelo vendedor das despesas efectuadas.
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I-RELATÓRIO

Acordam no Tribunal da Relação do Porto:

B…, solteiro, residente na Rua …, n.º …, em …, concelho de Santa Maria da Feira, intentou contra C…, Lda., com sede na Rua …, n.º .., em …, concelho de Santa Maria da Feira, a presente acção declarativa, sob a forma de processo ordinário, pedindo a condenação desta a executar ou mandar executar à sua custa as obras necessárias e adequadas à eliminação dos defeitos existentes na fracção urbana identificada no art. 1º da petição inicial, descritos nos arts. 9º e 17º a 40º da petição inicial, no prazo de 30 dias ou, caso a Ré nesse prazo o não faça, a pagar-lhe a quantia correspondente ao custo da reparação, a liquidar em execução de sentença.
Alega para tanto, e em síntese, que comprou à ré, por escritura pública outorgada em 27/09/2006, a fracção autónoma designada pela letra A, correspondente a uma habitação T-3, que faz parte do prédio, em propriedade horizontal, sito à Rua …, n.º …, em …, descrito na 2ª Conservatória do Registo Predial de S. M. da Feira sob o n.º 211, inscrito na matriz sob o artigo 2698 (art. 1º da petição inicial).
O referido prédio padece de vários defeitos, na parte exterior e na parte interior, que são discriminados no articulado inicial.
Para reparação dos vícios elencados, por que é responsável a Ré, é adequado o prazo de 30 dias.
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Devidamente citada, contestou a Ré que, pugnando pela improcedência da acção, não aceita a existência de defeitos de construção da sua responsabilidade.
Sem embargo, alega que há vícios alegados que eram do conhecimento do Autor aquando da compra ou são do seu conhecimento desde os anos de 2006, 2007 e 2008, ocorrendo, portanto, caducidade.
Para além disso, refere que o Autor fez obras no prédio, provocando a deterioração dos pisos e muros com o trânsito inapropriado de veículos. Não cuida do imóvel, nomeadamente através da aplicação de material hidrófobo transparente nas pinturas e pedras, de verniz no soalho, limpeza de caleiras e adequada ventilação e faz uso indevido da lareira, imprimindo-lhe excesso de calor.
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Replicou o autor, pugnando pela improcedência da excepção da caducidade, concluindo como na petição inicial.
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Foi proferido despacho saneador, foram fixados os factos assentes e elaborada a base instrutória que não foi objecto de qualquer reclamação.
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O Autor apresentou articulado superveniente, alegando que, após a chuva que caiu em Dezembro de 2012, os defeitos se agravaram, entrando água da chuva na casa do autor, vendo-se obrigado a colocar baldes e toalhas em vários locais da casa, para evitar que a água se acumule no chão. Pondo em causa a segurança de pessoas e bens. Danificando os tectos, as paredes e os pisos em madeira.
Apresentou, depois, novo articulado, alegando que os tectos e paredes ficaram podres e a instalação eléctrica começou a ter graves anomalias, tendo mandado proceder aos trabalhos indispensáveis para que as principais causas de infiltrações na moradia fossem eliminadas. Peticiona, por isso, que a ré seja condenada no pagamento da quantia da reparação.
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Foi proferido despacho a admitir o articulado superveniente e a Ré respondeu a ambos os articulados, concluindo como na contestação.
Nessa decorrência, foram aditados factos à Base Instrutória (elencados a fls. 190 e 191).
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Realizou-se, depois, a audiência de julgamento. Foi proferido despacho a admitir a ampliação do pedido requerida pelo autor (fls. 169 a 177), a saber, a condenação da ré no pagamento da quantia de € 4618,65 e, bem assim, na rectificação de erro de escrita no despacho de fls. 190 e 191 [cfr. fls. 222 e 223].
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A final foi proferida sentença que julgando a acção parcialmente procedente por provada condenou a Ré C…, Lda:
a)- a pagar ao Autor B… a quantia de € 3.178,65 (três mil cento e setenta oito euros e sessenta e cinco cêntimos);
b)- a executar, ou mandar executar à sua custa, as obras necessárias e adequadas à (cabal) eliminação dos defeitos referidos no ponto 8, als. a), b), c) e e), no ponto 9, als. a), b) e d), no ponto 10, als. e), g), h) e k), no ponto 11, als. a), b), c), d), e) e f) (no tocante às juntas abertas), g), h), e, bem assim, nos pontos 25 e 33 da factualidade provada nesta sentença, ainda subsistentes, na fracção referida no ponto 1 da mesma factualidade provada, no prazo de 30 dias e, caso o não faça nesse prazo, a pagar ao autor a quantia correspondente ao custo da reparação, em falta, no montante que vier a ser liquidado;
c) e absolveu-a quanto ao mais peticionado.
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Não se conformando com o assim decidido veio a Ré interpor o presente recurso, concluindo as suas alegações nos seguintes termos:
1ª- O recurso vem interposto da sentença de 1ª instância proferida em 31-03-2014 que, entre o mais, condenou a apelante C…, Lda a (i) pagar ao autor B… a quantia de € 3 178,65 (três mil cento e setenta oito euros e sessenta e cinco cêntimos), e a executar, ou mandar executar à sua custa, as obras necessárias e adequadas à (cabal) eliminação dos defeitos referidos no ponto 8, als. a), b), c) e e), no ponto 9, als. a), b) e d), no ponto 10, als. e), g), h) e k), no ponto 11, als. a), b), c), d), e) e f) (no tocante às juntas abertas), g), h), e, bem assim, nos pontos 25 e 33 da factualidade provada nesta sentença, ainda subsistentes, na fracção referida no ponto 1 da mesma factualidade provada, no prazo de 30 dias e, caso o não faça nesse prazo, a pagar ao autor a quantia correspondente ao custo da reparação, em falta, no montante que vier a ser liquidado;
2ª- Em 20-11-2010, data em que propôs a acção, o apelado detinha interesse em agir, mas após 7-7-2011, data em que foi registada a venda do prédio pelo apelado a terceiros, o apelado deixou de ter interesse em fazer prosseguir esta acção, o que constitui excepção dilatória inominada, de conhecimento oficioso (questão cujo conhecimento o tribunal omitiu, incorrendo assim em nulidade por omissão de pronuncia), conducente à absolvição da instância da apelante, o que se pede;
3ª- Resulta da Acta de 14-11-2013 a fls. 217, que prestou depoimento como testemunha, D…, a quem o autor vendeu o imóvel na pendência da acção, venda essa registada em 7-7-2011, depoimento este prestado por quem pode depor como parte, o qual foi arguido de nulo, mas indeferido por despacho que aqui se impugna;
4ª-Tal depoimento influiu decisivamente na fixação da matéria de facto, como resulta, designadamente do último parágrafo de fls. 229, pelo que o julgamento deve ser anulado, e repetido quanto à matéria de facto afectada, que é toda a factualidade que consta da base instrutória;
5ª-A apelante peticiona a reapreciação da prova produzida no que concerne a parte dos factos provados constantes de 8. da sentença;
6ª- Da prova por confissão de parte do autor, ouvido em audiência de julgamento, assinalado pela apelante nestas alegações, e tido por reproduzido nesta conclusão, é admissível alterar-se, por aplicação do disposto no art. 662º do CPC, a matéria de facto impugnada, como enunciado pela apelante nestas alegações;
7ª- Os defeitos invocados pelo apelado, surgidos antes de proposta a acção, aparecerem nos 5 anos subsequentes à celebração da compra e venda, provando-se, porém, que o prazo de denúncia foi excedido, razão pela qual se pode concluir pela invocada caducidade do direito do apelado;
8ª- Em casos excepcionais de urgência na efectivação das obras, o apelado não estava dispensado de, atenta a natureza dos defeitos, interpelar a ré para o efeito, e somente caso esta não leve a cabo as obras necessárias, seria então legítimo o recurso à acção directa, pelo que, a falta de alegação e prova dessa interpelação impossibilita a condenação da apelante a pagar-lhe o valor dito como gasto nessas obras urgentes.
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Devidamente notificado contra-alegou o Autor concluindo pelo não provimento do recurso.
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Corridos os vistos legais cumpre decidir.
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II- FUNDAMENTOS
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso-cfr. artigos 635.º, nº 4, e 639.º, nºs 1 e 2, do C.P.Civil.
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No seguimento desta orientação são as seguintes as questões a decidir:
a)- saber se existe nulidade da decisão por omissão de pronuncia;
b) saber se o depoimento da testemunha D… é, ou não, nulo;
c)- saber se o tribunal recorrido cometeu erro na apreciação da prova e assim na decisão da matéria de facto;
d)- saber se se mostra, ou não, correctamente feita a subsunção jurídica da factualidade que nos autos resultou demonstrada.
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A)- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

É a seguinte a matéria de facto que vem dada como provado pelo tribunal recorrido:
1. Por escritura pública de compra e venda de 27 de Setembro de 2006, lavrada no Cartório Notarial de Espinho da Lic. E…, o A. comprou à Ré o prédio urbano composto de fracção autónoma, designada pela letra “A”, correspondente a uma habitação tipo T-3, de cave, rés-do-chão e andar, com entrada pelos números … e …, com tudo o que a compõe, que faz parte do prédio urbano, em regime de propriedade horizontal, destinada à habitação, sita na Rua …, n.º …, freguesia de …, concelho de Santa Maria da Feira, descrito na 2ª Conservatória do Registo Predial de Santa Maria da Feira sob o número 211, inscrita na matriz urbana sob o art. 2698 (cfr. certidão de fls. 10/17, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido). (A)
2. O prédio era novo, nunca fora habitado e a transmissão para o A. foi a primeira após a construção. (B)
3. Foi a Ré que construiu, vendeu e entregou ao A. o prédio identificado em A) e que aquele, a partir da data aí referida, passou a habitar, dele fazendo a sua residência, pernoitando diariamente, tomando e confeccionado as suas refeições, passando as suas horas de lazer e recebendo amigos e conhecidos ou qualquer pessoa em geral. (C)
4. O A., através da sua mandatária judicial, enviou, em 02 de Julho de 2010, a carta registada com aviso de recepção que se mostra junta a fls. 18/21, a qual foi pela Ré recepcionada e na qual, além do mais, solicitava à R. que, num prazo de 15 dias a contar da recepção daquela, procedesse ou mandasse proceder à sua custa às obras necessárias e adequadas à eliminação dos defeitos ali enunciados. (D)
5. Respondeu a Ré essa carta dizendo que estava disponível para marcar dia e hora para deslocar um perito da sua confiança ao local e, se o A. assim o entendesse, poderia levar também perito da sua escolha, a fim de apurar as reclamações feitas e respectivas responsabilidades. (E)
6. No seguimento dessa sugestão, no dia 06/09/2010, foram ao local dois peritos, um da Ré e outro do Autor, acompanhados do legal representante da Ré e do Autor. (F)
7. Após análise de todas as situações denunciadas pelo Autor, a Ré comprometeu-se a informar quais os defeitos de construção cuja reparação iria assumir. (G)
8. Em meados do ano de 2010 o A. constatou que a sua casa, no exterior, apresentava:
a) Infiltrações de água, através da varanda da sala e da varanda dos dois quartos, o que causava humidades na arrecadação (na cave) e na divisão sob a escada de acesso à entrada de habitação (depósito de gás);
b) Os muros exteriores de vedação e de divisão com a moradia vizinha apresentavam diversas fissuras e rachadelas;
c) Uma pedra em granito da floreira havia rachado;
d) Nas fachadas lateral esquerda e posterior da fracção verificavam-se várias manchas na pintura, sobretudo desde o chão até cerca de um metro de altura;
e) Duas pedras em granito da fachada principal estavam partidas. (1º)
9. E no interior:
a) Verificavam-se infiltrações de humidade no quarto a sul, com incidência significativa na parede virada a sul e na parede abaixo da janela;
b) Verificavam-se várias fissuras nas paredes, estanhadas e pintadas, das divisões do rés-do-chão e do andar;
c) Os soalhos faziam barulho quando pisados - mas não anormal para este tipo de material.
d) A banheira da casa de banho situada entre os dois quartos de dormir não esgotava a água convenientemente, juntando muita água junto às paredes da mesma quando alguém tomava banho;
e) Os vidros duplos estão riscados, nas faces voltadas para os compartimentos, nomeadamente nas portas de dois quartos, janela de um quarto e porta da cozinha;
f) Ouviam-se sons produzidos na habitação vizinha. (2º)
10. No Exterior da moradia:
a) O depósito de água no patamar da escada da entrada principal;
b) O depósito de água no patamar de entrada apresentava deficiente escoamento, no alçado posterior, de acesso à cozinha, resultante da falta de pendente adequada no pavimento;
c) O depósito de água nas varandas do andar, apresentando deficiente escoamento, resultante da falta de pendente adequada no pavimento para o tubo de escoamento;
d) Existia descascamento da pintura exterior da moradia em diversos pontos (podendo ser consequência da deficiente dosagem de inertes, da argamassa e/ou da não aplicação de primário);
e) Estava por pintar arranjo de fissuras no muro de meação com vizinho junto à escadaria de acesso à entrada principal, no muro de vedação no alçado principal junto ao portão e muro de vedação com terreno contíguo;
f) Verificava-se a fractura de três “patins” e dois rodapé de granito em degraus na escadaria da entrada principal;
g) Numa zona do patamar da entrada principal, o mosaico cerâmico apresentava peças diferentes;
h) Existia deformações do pavimento em cubos de granito no logradouro em diversas zonas, com irregularidades deste, resultantes de uma má execução da base de assentamento;
i) Havia fractura de duas pedras de revestimento da fachada, levando a infiltrações de humidade para o interior da habitação;
j) Aparecia humidade heterogénea, aquando da ocorrência de pluviosidade, na pedra de revestimento da fachada principal, resultante da má execução do rufo da platibanda e ainda da deficiente hidrofugação dessa fachada;
k) Verificava-se o deslocamento do muro de vedação com terreno contíguo que poderá, se houver alteração do comportamento mecânico dos maciços terrosos que sobre ele exercerem impulsos, provocar o seu derrube. (3º)
11. No interior da moradia:
a) Havia infiltração de água no tecto e parede do alçado principal e de meação com vizinho, na arrecadação da cave [sendo na arrecadação causada pela deficiente impermeabilização dos pavimentos superiores (patamar e escada)].
b) Verificavam-se fissuras nas paredes da lavandaria;
c) Verificava-se fractura da pedra da moldura do fogão de sala e fissura na parede adjacente, resultante da deficiente execução desta tarefa;
d) O soalho, na zona da porta de entrada principal, estava danificado com algumas réguas manchadas;
e) Verificavam-se fissuras na parede interior de meação com vizinho, na parede junto à laje de piso do andar e junto à escadaria, e nas paredes divisórias do andar, provocadas pela retracção das massas;
f) O soalho, no quarto suite, estava com juntas abertas e empolamento de algumas réguas;
g) Havia infiltrações de água junto à janela do quarto-suite nas ombreiras e sob a soleira desta e, ainda, no canto com o exterior, verificando-se ali reparações já realizadas junto à janela;
h) Verificava-se um deficiente escoamento das águas da banheira do banho principal na sua bordadura, sendo estas encaminhadas para o pavimento;
i) Desprendera-se o espelho da fechadura do WC do rés-do-chão. (4º)
12. Para a reparação do indicado nos pontos anteriores são necessários 30 dias. (7º)
13. O referido nas alíneas a), b) e c) do ponto 10º da factualidade ora provada verifica-se desde o primeiro Inverno após a venda da casa, tendo nessa altura sido constatado pelo autor. (9º)
14. O autor não fez aplicação de material hidrófobo transparente. (10º)
15. As pedras em granito estavam em bom estado aquando da venda do prédio ao autor, mostrando-se ulteriormente partidas, o que é do conhecimento do autor. (11º)
16. O autor-a partir da aplicação pela ré de peças diferentes, ulteriormente à venda–soube do constante no ponto 10, al. g) da factualidade provada desta sentença. (12º)
17. O autor não faz aplicação anual de líquido hidrófobo transparente nas pedras de revestimento da fachada. (13º)
18. O aparecimento de humidade referido no ponto 10, al. j) da factualidade provada ocorre desde o primeiro Inverno que o autor comprou a fracção. (14º)
19. Os riscos nos vidros são visíveis a olho nu. (18º)
20. O referido no ponto 9, al. c) da factualidade provada nesta sentença e o empolamento de algumas réguas do soalho ocorre desde 2008, com conhecimento do autor, sendo visíveis a olho nu. (22º)
21. O deficiente escoamento das águas da banheira ocorre desde que o prédio foi transmitido autor e, havendo utilização de água naquela, é visível a olho nu, como o autor sabe. (24º)
22. O autor, após a aquisição da fracção, efectuou obras de construção civil, na área exterior (construção de um coberto). (27º)
23. O autor transportou materiais de construção civil para as obras que realizou. (28º)
24. Os acessos pedonais estão situados no jardim e no logradouro e não foram projectados para que nele circulassem veículos de grande porte, à excepção de veículos ligeiros. (29º)
25. Os muros de acesso à garagem e ao coberto apresentam fissuras. (31º)
26. No logradouro, pelo acesso à garagem e ao coberto, transitam, são manobrados e estacionados veículos ligeiros. (32º)
27. Assim que a ré colocou mosaico cerâmico diferente no patamar da entrada principal, o autor, através da sua mãe, reclamou e transmitiu àquela que não queria que a entrada principal ficasse daquela forma. (36º)
28. Foi colocada caixilharia dupla em janelas da fracção adquirida pelo autor, por vontade deste, de forma a eliminar o ruído e a aragem das janelas. (39º)
29. A ré assumiu, depois da data da escritura de compra e venda, a existência do problema relacionado com escoamento de água na banheira, tendo colocado uma pedra de revestimento, mas não resolveu o problema. (43º)
30. O autor, antes da compra e venda, solicitou que a casa tivesse um acesso pavimentado diferente (até ao “coberto”). (44º)
31. O que a ré aceitou. (45º)
32. Pelo acesso à garagem passam três veículos ligeiros: um jipe, uma carrinha comercial da marca Citroën e um outro automóvel. (47º)
33. Após o Inverno de 2012/2013, os tectos e as paredes apresentavam grandes infiltrações de humidade. (50º)
34. Perante tal situação, o autor consultou técnicos de construção civil, tendo sido recomendada a reparação imediata das principais causas das infiltrações de água na moradia, para evitar a acelerada degradação de elementos construtivos (51º)
35. O autor solicitou à empresa F…, Lda. orçamento para as reparações, tendo-lhe sido prestado o que se mostra junto a fls. 172 e 173. (52º)
36. Aceitando-o, o autor deu ordem para que aquela empresa, quando o tempo melhorasse, procedesse, não a todos os orçamentados, mas a trabalhos indispensáveis a que as principais causas de infiltrações de humidade na sua fracção fossem eliminadas (solicitou, ainda, a reparação e pintura das fachadas posterior e lateral esquerda da fracção, até cerca de um metro de altura, o que não era necessário à eliminação de causa de infiltração de água, que a referida empresa executou). (53º)
37. A referida empresa procedeu às reparações, emitindo a factura de fls. 174 e 175, no valor de € 4. 618,65, que o autor pagou. (54º)
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Da instrução e discussão da causa não resultaram provados, com interesse, quaisquer outros factos, tendo designadamente resultado não provada:-a factualidade dos pontos 1º, 2º, 3º, 4º, 5º, 6º, 8º, 9º, 10º, 11º, 12º, 13º, 14º, 15º, 16º, 17º, 19º, 20º, 21º, 22º, 23º, 24º, 25º, 26º, 29º, 30º, 31º, 32º, 33º, 34º, 35º, 36º, 37º, 38º, 39º, 40º, 41º, 42º, 43º, 44º, 45º, 46º, 48º, 49º, 50º, 51º e 52º da base instrutória (no todo ou, tão-somente, na parte não constante da factualidade provada, supra indicada).
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III. O DIREITO

Questão prévia

Nas contra-alegações veio o Autor dizer que, pese embora a Ré venha pedir a nulidade da decisão, em sede de recurso veio atribuir-lhe a este o valor € 8.000,00, quando à causa tinha sido atribuído o valor de € 30.000,01.
Efectivamente, à causa, conforme, aliás, tinha sido indicado na petição inicial, foi atribuído o valor de € 30.000.01.
E, sendo esse o valor da causa, não se vê a que propósito a Ré vem atribuir ao recurso o valor de € 8.000,00, quando, efectivamente, a lei processual não prevê, em qualquer das suas normas, que ao recurso interposto da decisão final proferida no âmbito da causa seja atribuído um valor distinto do desta.
Como, assim o valor do recurso é, como não poderia deixar de ser, idêntico da respectiva causa, ou seja, € 30.000,01.
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Como atrás se referiu a primeira questão que no recurso vem colocada consiste em saber:
a)- se existe nulidade da decisão por omissão de pronuncia.

Entende a apelante que tendo o Autor apelado, na pendência da acção, procedido à venda do imóvel cuja reparação impetra, tendo essa venda sido registada na Conservatória Predial em 7-7-2011 e tendo as obras de construção civil invocadas, pelo também apelado, sido feitas após a mencionada venda do prédio, deixou de ter interesse em fazer prosseguir esta acção, o que constitui excepção dilatória inominada de conhecimento oficioso conducente à sua absolvição da instância e que, surpreendentemente, o tribunal ignorou.
Será que assim é?
Nos termos do disposto no artigo 615.º, nº 1, alínea d) do CPCivil, a sentença é nula sempre que o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento.
Estabelece-se nesta previsão legal a consequência jurídica pela infracção ao disposto no artigo 608.º, nº 2, do mesmo diploma legal. Ou seja, a nulidade prevista na alínea d) está directamente relacionada com o nº 2 do art. 608.º, referido, segundo o qual o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.
Conforme este princípio, cabe às partes alegar os factos que integram o direito que pretendem ver salvaguardado, impondo-se ao juiz o dever de fundamentar a sua decisão nesses factos e de resolver todas as questões por aquelas suscitadas, não podendo, por regra, ocupar-se de outras questões.
Mas, importa precisar o que deve entender-se por “questões” cujo conhecimento ou não conhecimento integra nulidade por excesso ou falta de pronúncia.
Como tem sido entendimento pacífico da doutrina e da jurisprudência, apenas as questões em sentido técnico, ou seja, os assuntos que integram o “thema decidendum”, ou que dele se afastam, constituem verdadeiras “questões” de que o tribunal tem o dever de conhecer para decisão da causa ou o dever de não conhecer, sob pena de incorrer na nulidade em causa.
Há, assim, que distinguir as verdadeiras questões dos meros “raciocínios, razões, argumentos ou considerações”, invocados pelas partes e de que o tribunal não tenha conhecido ou que o tribunal tenha aduzido sem invocação das partes.
Num caso como no outro não está em causa omissão ou excesso de pronúncia.
No que concerne à falta de pronúncia dizia Alberto dos Reis[1] que “são na verdade coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão”.
Dentro deste raciocínio do ilustre mestre se poderá acrescentar que, quando o tribunal, para decidir as questões postas pelas partes, usar de razões ou fundamentos não invocados pelas mesmas partes não está a conhecer de questão de que não deve conhecer ou a usar de excesso de pronúncia susceptível de integrar nulidade.
Do que se conclui que apenas as questões essenciais, questões que decidem do mérito do pleito ou, convenhamos, de um problema de natureza processual relativo à validade dos pressupostos da instância, é que constituem os temas de que o julgador tem de conhecer, quando colocados pelas partes, ou não deve conhecer na hipótese inversa, sob pena de a sentença incorrer em nulidade por falta de pronúncia ou excesso de pronúncia.
Obviamente, sempre, salvaguardadas as situações onde seja admissível o conhecimento oficioso do tribunal.
Por último, importa não confundir a nulidade por falta ou excesso de conhecimento com o erro de julgamento, que se verifica quando o juiz não decide acertadamente, por decidir “contra legem” ou contra os factos apurados.[2]
Postos estes considerandos e regressando ao caso concreto que nos ocupa, é evidente que o tribunal recorrido, salvo o devido respeito por opinião contrária, não deixou de conhecer de qualquer questão de que deveria conhecer.
Vejamos.
Enquanto pressuposto processual, o interesse em agir, que se não confunde com a legitimidade, consiste na necessidade de se usar do processo, de instaurar ou fazer prosseguir a acção.[3]
Também tem vindo a ser entendido na jurisprudência que a falta desse pressuposto, ou seja, a falta de interesse em agir ou falta de interesse processual, constitui excepção dilatória inominada de conhecimento oficioso, conducente, como tal, à absolvição da instância.[4]
O interesse em agir pressupõe a necessidade e a adequação do meio de tutela de que se lança mão, ou seja, exige que para a solução do conflito o autor deve socorrer-se inevitavelmente da actuação judicial (a necessidade), e ainda que o meio processual usado deve ser aquele apto a reparar uma efectiva lesão do direito do autor (a adequação), tal como este a representa.[5]
Portanto, verificando-se uma situação de falta de interesse processual, aquando da elaboração da respectiva sentença, tal como estatui o artigo 608.º, nº 1 do CPCivil, em correspondência, aliás, com o artigo 278.º do mesmo diploma legal, ela aí deve ser conhecida com a consequente absolvição da instância, pelo que, se tal não acontecer existirá omissão de pronúncia a configurar a nulidade do artigo 615.º, nº 1 al. d) atrás citado.
Acontece que, a nulidade só se verificará se existir a excepção e o juiz dela não tiver conhecido.
Como assim, a questão que agora se coloca é analisar se existe falta de interesse processual por parte do Autor.
Como já supra se referiu, a Ré apelante filia esta falta de interesse processual, por parte do Autor, na circunstância de durante a pendência da acção este ter procedido à venda do imóvel cuja reparação impetra.
Como decorre dos autos a presente acção deu entrada em 20/11/2010 e, durante a pendência da acção, o Autor procedeu à venda do imóvel cujo registo de aquisição tem data de 07/07-2011.
Perante esta transmissão refere a Ré apelante que se o Autor em 20-11-2010 detinha interesse em agir, o certo é que após aquela data deixou de ter interesse em fazer prosseguir esta acção.
Não cremos, salvo o devido respeito, que assim seja.
É verdade que o interesse processual se não identifica com a legitimidade.
De facto, o autor pode ser o titular da relação material controvertida e, portanto, ser a pessoa que, em princípio, tem interesse na apreciação jurisdicional dessa relação em não ter, todavia, em face das circunstâncias concretas que rodeiam o caso, necessidade de recorrer à acção, como também pode suceder o inverso. Uma coisa é a titularidade da relação material litigada, base da legitimidade das partes; outra substancialmente distinta, a necessidade de lançar mão da demanda, em que consiste o interesse em agir.
Todavia, é também certo que a legitimidade assenta igualmente no interesse em demandar ou em contradizer (artigo 30.º do CPCivil) e, portanto, num caso como dos autos a questão da legitimidade não se pode dissociar da questão do interesse processual como, mais à frente, iremos ver.
Ora, no caso em apreço, aquando da introdução da acção em juízo e tal como ela vinha estruturada, ninguém questionará que o Autor era nela parte legítima e tinha igualmente interesse processual na demanda.
Bom, mas se era assim aquando da introdução da acção em juízo, haverá então que perguntar se o Autor continua a ter interesse em demandar após a transmissão do imóvel cuja reparação solicitou?
E, a esta questão responde o artigo 263.º, nº 1 do CPCivil (correspondente ao artigo 271.º, nº 1 do anterior CPCivil).
Estatui este preceito que: “No caso de transmissão, por acto entre vivos, da coisa ou direito litigioso, o transmitente continua a ter legitimidade para a causa enquanto o adquirente não for, por meio de habilitação, admitido a substituí-lo”.
A especialidade criada em sede de legitimidade pela transmissão da coisa ou direito em litígio, resulta, como refere Paula Costa e Silva[6], da circunstância de o critério aferidor daquele pressuposto mudar durante a acção.
Se até ao momento do negócio translativo o transmitente era parte legítima, porque era o titular da relação material, a partir deste momento o critério da determinação da sua legitimidade deixará de ser, necessariamente, o critério da titularidade.
Não que isto signifique que aquela especialidade se funda ainda no âmbito do artigo 30.º, nº 1 (anterior artigo 26.º), ou seja, que aquele preceito contém, não apenas o interesse directo em demandar e o interesse directo em contradizer, mas também o eventual interesse indirecto em continuar a demandar e o eventual interesse indirecto em continuar a contradizer.
Efectivamente, como refere Paula Costa e Silva[7] o artigo 273.º, nº 1 (actual 263.º, nº 1) cria uma situação de legitimidade ad hoc extraordinária, não só porque a legitimidade não decorre da titularidade da relação material litigada, mas também porque esta legitimidade não se funda num interesse directo da parte formal em demandar ou em contradizer.
Assim são fundamentalmente os interesses da parte estranha à transmissão que justificam a permanência do transmitente enquanto parte legítima na acção.
Efectivamente, porque da ilegitimidade do alienante poderiam resultar graves prejuízos para a outra parte, o legislador atribuiu uma legitimidade extraordinária àquele, a fim de a instância decorrer regularmente até final.[8]
Por outro lado, quer o transmitente quer o transmissário são partes legítimas de uma mesma relação material litigada, ou seja, concorrenciais mas que se excluem mutuamente, podendo afirmar-se que a legitimidade do adquirente é subsidiária. Só uma das partes potencialmente legítimas pode litigar pela coisa ou direito litigioso, imponde-se uma legitimidade ao transmitente, que só cessará com a eventual habilitação do transmissário.
Destarte, o interesse processual em o transmitente continuar na acção, após a transmissão, e aqui se compagina com a questão da legitimidade, decorre de uma imposição legal e, como ela não se funda na existência de um interesse directo em demandar, pode ser qualificada de extraordinária e, sendo uma legitimidade ad hoc, a norma que a atribui é, portanto, indispensável.
Na verdade, a legitimidade indirecta atribuída ao transmitente é uma legitimidade própria e não uma legitimidade substitutiva ou derivada da legitimidade do transmissário, pois que, o transmitente continua na acção como parte legítima porque a lei expressamente lhe atribui essa qualidade e não porque tenha existido uma transmissão de legitimidade do transmissário para o transmitente.[9]
*
Decorre assim do exposto que no caso em apreço não se verificava a excepção da falta de interesse processual em o Autor continuar na demanda e, como tal, não tinha o tribunal recorrido, a nível decisório, que pronunciar-se sobre ela, não padecendo, assim, a decisão da nulidade que lhe vem assacada pela Ré recorrente.
*
A segunda questão posta no recurso prende-se com:

b) saber se o depoimento da testemunha D… é, ou não, nulo.

Neste segmento entende o apelante que esta testemunha não podia depor nessa qualidade por ela poder depor como parte nos termos referidos no artigo 496.º do CPCivil.
Não cremos que, também aqui, assista razão à Ré apelante.
Como prescreve o artigo 496.º do CPCivil “Estão impedidos de depor como testemunhas os que na causa possam depor como partes”.
É certo que tal testemunha juntamente com o seu marido são os adquirentes ou transmissários do imóvel.
Acontece que, não consta dos autos que eles tenham sido habilitados para prosseguir a demanda (artigo 356.º do CPCivil), ou seja, desde que a pessoa, posto que tenha interesse directo na causa, não ocupa nela a posição que permita o seu depoimento como parte (artigo 452.º do CPCivil), pode depor como testemunha, podendo, como é evidente, tal depoimento ser apreciado tendo em conta aquele interesse.
Resulta, pois, do exposto que a testemunha não estava impedida de depor nos termos em que o fez, não se verificando, assim, a nulidade do seu depoimento.
*
A terceira questão posta no recurso consiste em:

c)- saber se o tribunal recorrido cometeu erro na apreciação da prova e assim na decisão da matéria de facto.

Como resulta do corpo alegatório e das respectivas conclusões a Ré recorrente impugnou a decisão da matéria de facto tendo dado cumprimento aos ónus impostos pelo artigo 640.º, nº 1 als. a), b) e c) do CPCivil, pois que, faz referência ao concreto ponto da matéria de facto que considera incorrectamente julgado, indica os elementos probatórios que conduziriam à alteração daquele ponto nos termos por ela propugnados, a decisão que no seu entender deveria sobre ele ter sido proferida e ainda as passagens da gravação em que se funda o recurso e que transcreveu [nº 2 al. a) do citado normativo].
Cumpridos aqueles ónus e, portanto, nada obstando ao conhecimento do objecto de recurso nesse segmento, refere a este respeito a recorrente que o facto descrito em 8., da fundamentação factual, deve ser objecto de correcção dele ficando a constar que os defeitos ou deficiências do imóvel são conhecidos desde o primeiro inverno após ter adquirido o imóvel à apelante, ou seja, ainda em finais de 2006/princípios de 2007.
Quid iuris?
O controlo de facto, em sede de recurso, tendo por base a gravação e/ou transcrição dos depoimentos prestados em audiência, não pode aniquilar (até pela própria natureza das coisas) a livre apreciação da prova do julgador, construída dialecticamente na base da imediação e da oralidade.
Efectivamente, a garantia do duplo grau de jurisdição da matéria de facto não subverte o princípio da livre apreciação da prova (consagrado no artigo 607.º nº 5) que está deferido ao tribunal da 1ª instância, sendo que, na formação da convicção do julgador não intervêm apenas elementos racionalmente demonstráveis, já que podem entrar também elementos que em caso algum podem ser importados para a gravação vídeo ou áudio, pois que a valoração de um depoimento é algo absolutamente imperceptível na gravação/transcrição.[10]
Ora, contrariamente ao que sucede no sistema da prova legal, em que a conclusão probatória é prefixada legalmente, no sistema da livre apreciação da prova, o julgador detém a liberdade de formar a sua convicção sobre os factos, objecto do julgamento, com base apenas no juízo que fundamenta no mérito objectivamente concreto do caso, na sua individualidade histórica, adquirido representativamente no processo.
“O que é necessário e imprescindível é que, no seu livre exercício de convicção, o tribunal indique os fundamentos suficientes para que, através das regras da ciência, da lógica e da experiência, se possa controlar a razoabilidade daquela sobre o julgamento do facto como provado ou não provado”.[11]
De facto, a lei determina expressamente a exigência de objectivação, através da imposição da fundamentação da matéria de facto, devendo o tribunal analisar criticamente as provas e especificar os fundamentos que foram decisivos para a convicção do julgador (artigo 607.º, nº 4 do CPCivil).
Todavia, na reapreciação dos meios de prova, a Relação procede a novo julgamento da matéria de facto impugnada, em busca da sua própria convicção, desta forma assegurando o duplo grau de jurisdição sobre essa mesma matéria, com a mesma amplitude de poderes da 1.ª instância.[12]
Impõe-se-lhe, assim, que “analise criticamente as provas indicadas em fundamento da impugnação, quer a testemunhal, quer a documental, conjugando-as entre si, contextualizando-se, se necessário, no âmbito da demais prova disponível, de modo a formar a sua própria e autónoma convicção, que deve ser fundamentada”.[13]
Tendo presentes estes princípios orientadores, vejamos agora se assiste razão à Ré apelante, neste segmento recursório da impugnação da matéria de facto, nos termos por ela pretendidos.
Como já noutro passo se referiu alega a este respeito a recorrente que o facto descrito em 8., da fundamentação factual, deve ser objecto de correcção dele ficando a constar que os defeitos ou deficiências do imóvel são conhecidos desde o primeiro inverno após ter adquirido o imóvel à apelante, ou seja, ainda em finais de 2006/princípios de 2007.
E para se dar como demonstrada essa realidade factual convoca a apelante o depoimento de parte do Autor.
O facto descrito em 8. tem, no seu início, a seguinte redacção:
“Em meados do ano de 2010 o A. constatou que a sua casa, no exterior, apresentava:
a) Infiltrações de água, através da varanda da sala e da varanda dos dois quartos, o que causava humidades na arrecadação (na cave) e na divisão sob a escada de acesso à entrada de habitação (depósito de gás);
b) Os muros exteriores de vedação e de divisão com a moradia vizinha apresentavam diversas fissuras e rachadelas;
c) Uma pedra em granito da floreira havia rachado;
d) Nas fachadas lateral esquerda e posterior da fracção verificavam-se várias manchas na pintura, sobretudo desde o chão até cerca de um metro de altura;
e) Duas pedras em granito da fachada principal estavam partidas (1º)”.
Este facto correspondia ao ponto 1º da base instrutória e que englobava também o ponto 2. da mesma peça no que se referia também à data em causa.
Prestado o depoimento de parte por parte do Autor sobre a matéria dos pontos 8º a 33º e 44º da base instrutória, foi ditada para a acta a seguinte assentada:
“Após a compra da casa, foi para lá viver, tendo lá passado o inverno de 2006.
Logo nessa altura notou a acumulação de águas no patamar, na parte final da escadaria da entrada principal.
Assim como havia acumulação de água (poça), no patamar da entrada no alçado posterior da casa.
Constatou também o depósito de água nas varandas do andar.
Ulteriormente, disse que tal se notou mais no inverno de 2009/2010 que foi rigoroso.
Não fez aplicação de material hidrófobo transparente.
As pedras de granito partiram-se, em data que não pode precisar, mas provavelmente em 2007.
A aplicação de mosaico cerâmico pela ré foi efectuado quando, já vivia na casa.
Não aceitou contudo a diferenciação de material.
Nunca aplicou verniz no soalho.
O soalho faz barulho ao ser pisado e apresenta madeira levantada, o que se verifica desde 2008.
Cerca de um ano depois da compra da casa, o legal representante da ré foi colocar uma pedra junto da banheira do banho principal.
Após a aquisição da casa, foi construído um telheiro, ou coberto, tendo sido transportado para o respectivo local material de construção civil.
Pelo logradouro de acesso à garagem e na parte lateral esquerda da casa olhando a partir da rua, circulam e são aparcados veículos”.
Ora, desta assentada não se retira ter o Autor confessado que os defeitos elencados nos factos descritos em 8., 9.,10., 11., e 12. eram dele conhecidos desde o Inverno de 2007, sendo certo que, da mesma, a Ré apelante apenas reclamou sobre a circunstância de que nela se devia incluir a resposta dada ao ponto 18 e ao ponto 25 da B.I., e que nada têm que ver com a matéria factual ora posta em apreciação.
Na verdade, o que o Autor confessou foi apenas que passou o Inverno de 2006 na casa e que nessa altura notou a acumulação de água nos patamares e na varanda, todavia, daí não decorre que nessa altura teve conhecimento de qualquer dos defeitos apontados nos mencionados factos da fundamentação factual.
Com efeito, a acumulação de água só por si pode não consubstanciar qualquer defeito, diferente será se por via dessa acumulação de água ocorrerem infiltrações, pois que, nesse caso, já tais infiltrações pressupõem a existência de defeito por deficiente impermeabilização.
Em relação às pedras de granito, apenas referiu que as mesmas se partiram em data que não pode precisar mas que terá sido provavelmente em 2007.
Como se sabe o que se pretende com o depoimento de parte é a confissão de determinada realidade desfavorável à parte que confessa e favorável à outra parte (artigo 352.º do C. Civil).
Como refere o Prof. Alberto dos Reis[14] “a confissão constitui prova não a favor de quem a emite, mas a favor da parte contrária; portanto recai necessariamente sobre factos desfavoráveis ao confitente e favoráveis ao adversário”.
Ora, no caso sub judice os factos confessáveis constam já da respectiva assentada e deles não consta aquele que a Ré apelante solicita que se dê como demonstrado, ou seja, que os defeitos os defeitos ou deficiências do imóvel são conhecidos pelo Autor desde o primeiro inverno após ter adquirido o imóvel à apelante, isto é, ainda em finais de 2006/princípios de 2007.
Com isso não se pretende afirmar que, em certas circunstâncias, o juiz não possa valorar o depoimento de parte não sendo confessório.
Com efeito, se é certo que o depoimento de parte é um meio processual destinado a provocar a confissão judicial, por outro lado, mostra-se ultrapassada a concepção restrita de tal depoimento vocacionada exclusivamente àquela obtenção, já que o mesmo tem um campo de aplicação muito mais vasto.
Como, entre outros, se refere no Ac. do STJ de 16.03.2011[15], o “juiz no depoimento de parte não está espartilhado pelo escopo da confissão, podendo ali colher alguns elementos para a boa decisão da causa de acordo com o princípio da “livre apreciação da prova”.[16]
A confissão e o depoimento de parte são, pois, realidades jurídicas distintas, sendo este mais abrangente do que aquela, pois que, como resulta do artigo 361.º do CCivil “o reconhecimento de factos desfavoráveis, que não possa valer como confissão, vale como elemento probatório que o tribunal apreciará livremente”.[17]/[18]
Acontece que, no caso em apreço, e ouvido o depoimento de parte do Autor, dele não se colhe, como pretende a Ré apelante que, na essência, tenha confirmado que os factos que invoca como defeitos dele são conhecidos desde o primeiro Inverno após ter adquirido o imóvel à apelante, ou seja, ainda em finais de 2006/princípios de 2007.
E, fora do âmbito confessório, o tribunal sobre o depoimento de parte discorreu do seguinte modo com o que, aliás, se concorda:
“Nesta senda, é oportuno salientar que, segundo se pode retirar dos depoimentos do autor e de D…, sua mãe, a escritura de compra foi celebrada por aquele, nomeadamente por razões relacionadas com o empréstimo bancário, mas a casa era para o agregado familiar, assumindo os pais do autor, e nomeadamente a mãe, a mencionada D…, protagonismo na condução e tratamento das questões relacionadas com a casa. Aliás, esta, presentemente, está registada em nome dos pais do autor (cfr. fls 215 e 216).
Não se ignora, portanto, antes se tem bem presente, que a testemunha D… não é desinteressada da sorte da causa.
Porém, no tocante à factualidade que teve conhecimento, o seu depoimento, concatenado com os demais elementos probatórios, mostrou-se suficientemente circunstanciado, inteirado e informado. Numa palavra, credível.
A testemunha D…, de modo terso e seguro, afirmou que as fotos de fls 210 a 214 se referem à casa em questão nos autos e às obras nela realizadas no ano 2103, tendo indicado descritivamente as situações em causa em cada uma delas.
Já o autor, apesar de ser formalmente o comprador, revelou no seu depoimento, de modo que nos semelhou genuíno, não estar inteirado de todas as questões versadas, perpassando ao invés que grande parte os assuntos foram tratados pelos pais, que na prática assumiram a condução do negócio.”
*
Assim, não tendo a Ré apelante convocado qualquer outro elemento probatório para que se desse como assente o facto em causa, improcede também o recurso nesta sede, permanecendo, desta forma, inalterada a matéria factual que o tribunal recorrido deu como demonstrada nos autos.
*
A quarta questão que cumpre apreciar é:

d)- se se mostra, ou não, correctamente feita a subsunção jurídica dos factos.

No que tange à questão da verificação da excepção da caducidade referente à denúncia dos defeitos, o tribunal recorrido entendeu estar apenas verificada em relação a alguns deles.
A Ré recorrente dissente deste entendimento alegando que se devia considerar verificada em relação a todos os defeitos.
Todavia, para que assim fosse era necessário que tivesse sido alterada a matéria factual no sentido por ela propugnado, o que, como resulta do decidido tal não aconteceu, razão pela qual se mantém a decisão recorrida quanto a esta questão.
*
Insurge-se também a apelante contra o facto de, no que toca às obras urgentes, o autor não estar dispensado de a interpelar para que levasse a cabo tais obras e, só no caso de não as realizar, é que seria então legítimo o recurso à acção directa.
Será que assim é?
Na venda de coisa defeituosa há, por regra, uma sequência lógica nas fases de tutela do comprador quanto aos defeitos da coisa vendida: em primeiro lugar, o vendedor está adstrito a eliminar os defeitos ou substituir a prestação; depois, a redução do preço ou a resolução do contrato.
Com efeito, embora esta regra esteja apenas expressamente prevista para o contrato de empreitada no artigo 1222.º, nº 1 do CCivil, todavia, ela depreende-se no domínio da compra e venda, como refere Pedro Romano Martinez[19], dos princípios gerais (artigo 562.º, 566.º, nº 1, 801.º, nº 2 e 808.º, nº 1), além de ser defensável a aplicação analógica do nº 1 do artigo 1222.º, no que se refere à imposição desta sequência, às hipóteses de compra e venda.
A indemnização por sucedâneo pecuniário não funciona, por regra, como alternativa aos diversos meios jurídicos facultados ao comprador em caso de defeito da coisa vendida.
Portanto, só após a condenação na eliminação dos defeitos, e perante a recusa da vendedora, poderia o comprador encarregar terceiro de proceder à realização dos trabalhos necessários a fazer suprimir os ditos defeitos, a expensas da vendedora (artigo 828.º do Código Civil).
Todavia, sendo urgente a reparação ou não tendo a vendedora procedido atempadamente à eliminação, é lícito ao comprador, com base nos princípios gerais, em particular a acção directa, proceder à reparação, exigindo o respectivo custo à vendedora.[20]
Desta forma e neste particular contexto, quer a acção directa (artigo 336.º CCivil) quer o estado de necessidade (artigo 339.º do mesmo diploma), justificam o afastamento do procedimento previsto nos artigos 1221.º e 1222.º do Código Civil, sendo legítimo que o dono da obra realize a obra, por sua conta, com a possibilidade de ser reembolsado das despesas efectuadas.
Portanto, a jurisprudência tem evoluído para o entendimento de que, havendo imprescindibilidade na reparação-no sentido de “perigo eminente de agravamento drástico do defeito, ou perigo deste provocar danos graves na própria coisa, ou em outros bens do dono da obra ou terceiros”-, o dono desta nem tenha de contactar o empreiteiro a solicitar-lhe a eliminação do defeito, podendo-se-lhe sem mais substituir nessa eliminação, por estarem em causa situações que “exigem uma intervenção de tal modo rápida que não se compadece com o tempo da interpelação do empreiteiro e da reacção deste”[21].
Nos casos em que não existe a citada urgência pode, ainda assim, o dono da obra ou o comprador proceder de modo a obter o incumprimento definitivo daquele relativamente à eliminação dos defeitos, com o recurso à interpelação admonitória genericamente prevista no artigo 808.º, nº 1 CCivil.
Diz a este respeito Cura Mariano[22] “Uma exagerada protecção da segurança do empreiteiro, levada ao ponto da existência dos deveres de eliminação ou de reconstrução ter de ser certificada por uma instância judicial, não justifica que se exija ao dono da obra tamanha demora na conclusão perfeita da obra contratada e se imponha o anacronismo de se condenar alguém a realizar uma prestação considerada definitivamente incumprida. O recurso a esse percurso processual justifica-se para os casos em que se pretenda utilizar esse meio para efectuar a interpelação do empreiteiro para efectuar as obras de eliminação dos defeitos ou em que exista uma situação de simples mora, mas nunca para situações de incumprimento definitivo imputáveis ao empreiteiro, nomeadamente as que resultam de uma recusa peremptória de realização dessas obras, do não acatamento do prazo admonitório nos termos do art 808º/1 CC, ou duma tentativa frustrada de eliminação dos defeitos ou de reconstrução da obra”.
Ponderando a situação de facto na questão em análise e considerando o exposto, mostra-se justificado o procedimento do Autor apelado, já que havia urgência na realização das obras tendentes a obstar às infiltrações de humidade, para evitar a degradação de elementos construtivos da fracção, como o evidencia a factualidade descrita sob os nºs 33. e 34., não tendo, portanto, como a Ré apelante defende, que tenha havido prévia interpelação solicitando a sua realização.
Como tal, assiste ao autor o direito a ser pago do montante despendido com obras mandadas realizar à sociedade F…, Lda., justamente aquelas que se podem considerar como necessárias a evitar a degradação de outros elementos construtivos.
*
Diante do exposto, improcedem, assim, todas as conclusões formuladas pela Ré apelante e, com elas, o respectivo recurso.
*
IV-DECISÃO

Pelos fundamentos acima expostos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar a apelação improcedente por não provada, confirmando-se, assim, a decisão recorrida.
*
Custas da apelação pela Ré apelante (artigo 527.º, nº 1 do CPCivil).
*
Porto, 2 de Março de 2015.
Manuel Domingos Fernandes
Caimoto Jácome
Macedo Domingues
_____________
[1] In “Código de Processo Civil”, Anotado, Volume V, pág. 143.
[2] Cfr. refere A. dos Reis, na obra supra citada, pág. 130.
[3] Cfr. Prof. Antunes Varela, in “Manual do Processo Civil”, 2ª Edição, pág. 179.
[4] Cfr. Abrantes Geraldes, in “Temas da Reforma de Processo Civil”, 1º Vol., 2ª Edição, revista e ampliada, pág. 264.
[5] Cfr. neste sentido, Ac. RL de 12-03-1992 in CJ92, II-128) e Ac. RP de 03-11-2003, in www.dgsi.pt.
[6] In “A Transmissão da Coisa ou Direito em Litígio”, Coimbra Editora, pág. 165.
[7] Obra citada pág. 166.
[8] Sobre as possibilidades de manipulação processual decorrentes da permissão de transmissão da coisa ou direito em litígio, veja-se Paula Costa e Silva, obra citada pág. 166.
[9] Cfr. Teixeira de Sousa, Legitimidade Singular, pág. 80.
[10] De facto, “é sabido que, frequentemente, tanto ou mais importantes que o conteúdo das declarações é o modo como são prestadas, as hesitações que as acompanham, as reacções perante as objecções postas, a excessiva firmeza ou o compreensível enfraquecimento da memória, etc.”-Abrantes Geraldes in “Temas de Processo Civil”, II Vol. cit., p. 201) “E a verdade é que a mera gravação sonora dos depoimentos desacompanhada de outros sistemas de gravação audiovisuais, ainda que seguida de transcrição, não permite o mesmo grau de percepção das referidas reacções que, porventura, influenciaram o juiz da primeira instância” (ibidem). “Existem aspectos comportamentais ou reacções dos depoentes que apenas podem ser percepcionados, apreendidos, interiorizados e valorados por quem os presencia e que jamais podem ficar gravados ou registados para aproveitamento posterior por outro tribunal que vá reapreciar o modo como no primeiro se formou a convicção dos julgadores” (Abrantes Geraldes in “Temas…” cit., II Vol. cit., p. 273).
[11] Miguel Teixeira de Sousa in Estudos Sobre o Novo Processo Civil, Lex, 1997, p. 348.
[12] Cfr. acórdãos do STJ de 19/10/2004, CJ, STJ, Ano XII, tomo III, pág. 72; de 22/2/2011, CJ, STJ, Ano XIX, tomo I, pág. 76; e de 24/9/2013, processo n.º 1965/04.9TBSTB.E1.S1, disponível em www.dgsi.pt.
[13] Cfr. Ac. do S.T.J. de 3/11/2009, processo n.º 3931/03.2TVPRT.S1, disponível em www.dgsi.pt.
[14] In C. P. Civil Anot. Vol. IV, pág. 76.
[15] In www.dgsi.pt.
[16] Atente-se que, por opção legislativa, a lei processual civil tem incrementado, cada vez mais, os poderes inquisitórios, em detrimento do princípio do dispositivo, com vista à maior aproximação do juiz à verdade material, sendo disso afloramento os artigos 6.º, 7.º, 411.º e 452.º, nº 1 do CPCivil.
[17] Cfr. Antunes Varela, in “Manual de Processo Civil”, 2.ª ed., pág. 573.
[18] Ainda, no sentido de que os simples esclarecimentos ou afirmações que não possam valer como confissão, podem valer como elementos probatórios sujeitos à livre apreciação do Tribunal, podem ver-se, Lopes do Rego, in “Comentários ao Código de Processo Civil”, 1999, Almedina, pág. 387, Manuel de Andrade, in “Noções Elementares de Processo Civil”, 1976, pág. 248, Abrantes Geraldes, in “Temas da Reforma do Processo Civil”, Vol. II, pág. 211
[19] In Cumprimento Defeituoso, Em Especial na Compra e Venda e na Empreitada, p. 441.
[20] Pedro Romano Martinez, ora citada p. 346 e 347 e ainda, Direito das Obrigações (Parte Especial), Contratos, 2ª ed., p. 482 e 483, citando-se aqui Ac. do TRP de 22/01/1996, CJ, t.I, p. 202 e ainda, entre outros, Ac. desta Rel. de 30 de Novembro de 2009 onde se refere que: “[…]o direito de primazia concedido ao empreiteiro relativo à eliminação dos defeitos não é absoluto. Nos casos de urgência na reparação ou nos casos em que volvido um prazo razoável não realizar de forma definitiva e de modo útil a prestação a que está vinculado, o princípio da boa fé e da razoabilidade traduzido no equilíbrio das prestações contratuais, determina que seja permitido ao dono da obra executar por si ou por terceiro, a eliminação dos defeitos à custa do empreiteiro”.
[21] Nestas situações de urgência, como refere Cura Mariano, ob. cit. pág. 128, o desrespeito pelo “direito à eliminação dos defeitos pelo empreiteiro”, segundo o autor em causa, colhe justificação na figura do estado de necessidade prevista no art 339º/1 CC, uma vez que a inutilização desse direito se deverá ter por abrangida pela referência à danificação de coisa alheia que engloba a violação de direitos de crédito.
[22] Obr. Citada pág. 126.