Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
1150/13.9TBBGC-A.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: MANUEL DOMINGOS FERNANDES
Descritores: SUSPENSÃO DE DELIBERAÇÃO SOCIAL
OBJECTO DA SUSPENSÃO
CADUCIDADE
FACTOS
REQUISITOS
DANO
Nº do Documento: RP20140630115013.9TBBGC-A.P1
Data do Acordão: 06/30/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: ALTERADA
Indicações Eventuais: 5ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - A providência cautelar de suspensão de deliberações sociais só pode incidir sobre deliberações tomadas em assembleia geral e não sobre deliberações tomadas por outros órgãos, conselho fiscal, direcção, administração, gerência ou outro.
II - Assim, não pode ser objecto de suspensão a decisão (resolução) da Mesada Assembleia Geral relativa à admissão das listas candidatas aos órgãos sociais, pois que, se assim fosse a providência teria de ser requerida apenas (ou também) contra esses órgãos, por se tratar de declarações que exprimem a vontade do órgão de que emanam, não a vontade da sociedade ou associação.
III - O prazo de 10 dias estatuído no artigo 396.º, nº1 do anterior CPCivil tem natureza civil ou substantiva e é um prazo de caducidade porque limita a vida do respectivo direito.
IV - Tal caducidade, relativa a um direito disponível, não pode ser conhecida oficiosamente.
V - O deferimento da providência cautelar de suspensão de deliberação social depende da verificação cumulativa dos seguintes requisitos: a) o requerente tem que ser sócio da sociedade que a tomou; b) a deliberação tem que ser contrária à lei ou ao pacto social e c) há-de resultar da deliberação dano apreciável.
VI - O dano apreciável é o dano significativo que pode resultar da execução da deliberação social ilegal e que impõe a alegação de factos concretos que permitam aferir da existência dos prejuízos e da correspondente gravidade.
VII - Nos termos do nº 2 do artigo 397.º, do CPCivil, permite-se que o juiz deixe de suspender a deliberação social, ainda que ilegal ou contrária aos estatutos ou ao contrato se o prejuízo resultante da suspensão for superior ao que pode advir da respectiva execução.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº 1150/13.9TBBGC-A.P1-Apelação
Origem-Tribunal Judicial da Comarca de Bragança 2 Juízo
Relator: Manuel Fernandes
1º Adjunto Des. Caimoto Jácome
2º Adjunto Des. Macedo Domingues
5ª Secção
Sumário:
I- A providência cautelar de suspensão de deliberações sociais só pode incidir sobre deliberações tomadas em assembleia geral e não sobre deliberações tomadas por outros órgãos, conselho fiscal, direcção, administração, gerência ou outro.
II- Assim, não pode ser objecto de suspensão a decisão (resolução) da Mesada Assembleia Geral relativa à admissão das listas candidatas aos órgãos sociais, pois que, se assim fosse a providência teria de ser requerida apenas (ou também) contra esses órgãos, por se tratar de declarações que exprimem a vontade do órgão de que emanam, não a vontade da sociedade ou associação.
III- O prazo de 10 dias estatuído no artigo 396.º, nº1 do anterior CPCivil tem natureza civil ou substantiva e é um prazo de caducidade porque limita a vida do respectivo direito.
IV- Tal caducidade, relativa a um direito disponível, não pode ser conhecida oficiosamente.
V- O deferimento da providência cautelar de suspensão de deliberação social depende da verificação cumulativa dos seguintes requisitos: a) o requerente tem que ser sócio da sociedade que a tomou; b) a deliberação tem que ser contrária à lei ou ao pacto social e c) há-de resultar da deliberação dano apreciável.
VI- O dano apreciável é o dano significativo que pode resultar da execução da deliberação social ilegal e que impõe a alegação de factos concretos que permitam aferir da existência dos prejuízos e da correspondente gravidade.
VII- Nos termos do nº 2 do artigo 397.º, do CPCivil, permite-se que o juiz deixe de suspender a deliberação social, ainda que ilegal ou contrária aos estatutos ou ao contrato se o prejuízo resultante da suspensão for superior ao que pode advir da respectiva execução.

I-RELATÓRIO
Acordam no Tribunal da Relação do Porto:
O B…, com sede na …, …, em Bragança, intentou contra a C…, com sede no …, …, Bloco ., Entrada ., em Bragança, o presente procedimento cautelar para suspensão de deliberação social.
Alegou, para tanto e em síntese, que:
- é uma associação constituída por escritura pública, fundada em 11.06.1943, que tem por fim promover a educação física dos seus associados, desenvolver a prática dos desportos e proporcionar meios de recreio e de cultura, em especial aos seus associados, sem qualquer fim de lucro económico dos mesmos;
- é sócio da requerida sendo esta uma associação de âmbito regional constituída por escritura pública, filiada na D…, que tem por fins principais promover, fomentar, incentivar, dirigir e regulamentar a prática de futebol no distrito de Bragança, estabelecer e manter relações com as Associações congéneres e restantes sócios ordinários da D…, cuidar e defender os direitos dos seus Associados e os seus legítimos interesses, representando-os perante a administração Pública, representar o futebol distrital, organizar, anual e obrigatoriamente, os Campeonatos distritais e, facultativamente, quaisquer outras provas de interesse para o futebol distrital, sem qualquer fim de lucro económico dos seus associados;
- em 15.05.2013, por convocatória do Presidente da Assembleia Geral da Requerida, foram convocados os sócios ordinários da C… para reunirem em “Assembleia Eleitoral, para eleição, por sufrágio directo e secreto, dos titulares dos respectivos Órgãos Sociais, para o mandato de 2013 a 2017, no dia 8 de Junho de 2013, das 15h00m às 18h00m, na sede da C…”;
- candidataram-se à eleição duas listas, apresentadas nos serviços administrativos da Requerida em 28.05.2013 e em 29.05.2013, instruídas com vários documentos que as acompanhavam; por deliberação de 30.05.2013 a Mesa da Assembleia Geral, após analisar e conferir as listas candidatas e os documentos respectivos, admitiu-as a sufrágio por entender que as mesmas “não continham irregularidades”;
- após sorteio, designou com as letras “A” e “B”, as listas encabeçadas, respectivamente, por E… e por F…, para Presidente da Direcção da C…;
- no dia 08.06.2013 decorreu o acto eleitoral, tendo obtido a lista “A” 35 votos e a lista “B” 42 votos, resultado que foi homologado, tendo sido ordenada a publicação dos resultados e lavrada a respectiva Acta (n.º 2/2013);
- acontece que, o processo eleitoral está afectado por várias irregularidades que inquinam o resultado da eleição e até a própria realização do acto eleitoral;
- a supra referida eleição pode prejudicar o prestígio obtido com os resultados até agora alcançados pelos legítimos representantes do futebol brigantino, pois que, desconhece se os membros eleitos têm ou não a aptidão e os conhecimentos necessários ao cabal desempenho dos seus cargos, que se exige seja objectivo e imparcial e portanto, capacitado.
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Devidamente citada para, querendo, deduzir oposição ao procedimento cautelar, com a advertência da legal cominação, a Requerida não deduziu oposição no prazo legal.
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O G… e F… vieram requerer a sua intervenção principal, como associados da Requerida, a qual veio a ser admitida.
Por extemporânea, foi julgada inadmissível a oposição ao procedimento cautelar que os Intervenientes deduziram, tendo, porém, sido admitido o requerimento de condenação de Requerente e Requerida como litigantes de má fé.
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Foi proferido despacho saneador onde, após se afirmar a existência dos pressupostos processuais foi julgado caduco direito do Requerente impugnar a deliberação da Mesa da Assembleia Geral realizada no dia 30.05.2013 na parte em que admitiu a sufrágio as duas listas candidatas.
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Fixada a matéria de facto, pela forma que dos autos consta, foi proferida decisão que julgou totalmente improcedente o presente procedimento cautelar e, em consequência, não decretou a providência cautelar solicitada pelo Requerente, da mesma forma que se absteve de condenar o Requerente e a Requerida por litigância de má fé.
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Não se conformando com a sentença assim proferida veio o Requerente interpor o presente recurso, concluindo as suas alegações nos seguintes termos:
1ª - A decisão proferida pela Mesa da Assembleia Geral na reunião ocorrida no dia 30.05.2013 não é uma deliberação social da própria Assembleia Geral e por isso, não é sequer possível requerer autónomamente a suspensão da sua execução.
2ª - A Mesa da Assembleia Geral não é sequer um dos órgãos sociais da Associação Requerida, mas antes a própria Assembleia Geral constituída pelos sócios ordinários da C….
3ª - As decisões da Mesa, quer anteriores às reuniões das Assembleias Gerais, quer tomadas no decorrer das mesmas são apenas susceptíveis de reclamação para a própria Assembleia Geral.
4ª - As decisões da Mesa limitam-se a fazer parte do processo formativo da decisão que venha a ser tomada pela própria Assembleia Geral; a deliberação social desta é que é decisiva e soberana e consequentemente, impugnável.
5ª - A decisão da Mesa de 30.05.2013 constituiu um mero acto intercalar do processo eleitoral, tal como sucede com a convocatória da Assembleia Geral, sendo ambos actos componentes da deliberação eleitoral que só ocorreu com a votação realizada pelos sócios ordinários da C… na Assembleia Geral de 8.06.2013.
6ª - As irregularidades da convocatória ou de qualquer decisão intercalar ou preparatória da deliberação social eleitoral não são autonomamente impugnáveis, sendo-o apenas, a deliberação tomada na Assembleia Geral Eleitoral.
7ª - O processo cautelar de suspensão da execução de uma deliberação social pressupõe a susceptibilidade da sua anulação, pelo que nunca seria possível requerer a suspensão da decisão da Mesa de 30.05.2013, mesmo no prazo de 10 dias a ela subsequentes.
8ª - O Recorrente não impugnou aquela decisão da Mesa, mas apenas, a deliberação social tomada na Assembleia Geral de 8.06.2013 de eleição dos Órgãos Sociais da C…, por ser esta a deliberação final do processo eleitoral e a única deliberação impugnável.
9ª - Ao Tribunal, em qualquer caso, estava vedado o conhecimento oficioso da declarada caducidade, pelo que só podia dela conhecer se a mesma tivesse sido invocada pela Requerida, uma vez que tal caducidade não está estabelecida em matéria excluída da disponibilidade das partes.
10ª - Finalmente, frisa-se que a reunião do dia 30.05.2013 realizou-se apenas com a presença de dois membros da Mesa da Assembleia Geral da C… e visou exclusivamente a análise por parte da Mesa, das candidaturas ao acto eleitoral designado para o dia 8.06.2013, no âmbito das competências deferidas pelos Estatutos.
11ª - É evidente e notório, por isso, que o Recorrente não estava presente, nem tinha de estar, e não foi convocado para tal reunião, nem tinha de o ser.
12ª - Para declarar a caducidade do direito de impugnação da deliberação tomada pela Mesa na referida reunião, o Tribunal tinha que dar como demonstrado, o que não sucedeu, que o Requerente teve conhecimento da aludida deliberação mais de 10 dias antes da propositura do presente processo cautelar.
13ª - Por todas as razões expostas não podia ter sido declarada a caducidade do direito de impugnação da deliberação da Mesa da Assembleia Geral de 30.05.2013.
14ª - Independentemente da decisão que recaia sobre a questão da caducidade, devem ser considerados como provados todos os factos articulados pelo Requerente e que devam ser tidos como confessados, por não ter havido oposição/impugnação dos Requeridos.
15ª - Tais factos deviam ter sido também, considerados na fundamentação da sentença, por serem importantes e relevantes para a decisão de mérito.
16ª - Deve ser alterada pela Relação a decisão do Tribunal recorrido sobre a matéria de facto, uma vez que constam do processo todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre a matéria de facto e os elementos fornecidos pelo processo impõem decisão diversa, insusceptível de ser destruída por quaisquer outras provas.
17ª - Por força de tal modificação da decisão de facto, impõe-se considerar como provados os factos alegados pelo Recorrente nos artigos 5, 21, 23, 25, 26, 27, 28, 30, 32, 34, 36, 38, 42, 45, 46 e 80 do Requerimento Inicial e mais deve ser considerado reproduzido o teor dos Estatutos da associação Requerida.
18ª - O Recorrente alegou e demonstrou portanto, ocorrer dano apreciável da execução da deliberação cuja suspensão requereu, pelo que deve a providência ser decretada.
19ª - Foram violados ou mal interpretados os artigos 177º e 333º, nºs 1 e 2 do C. Civil, e os artigos 396º, nºs 1 e 3; 484º, nº 1; 659º, nº 3 e 664º, do C.P.C..
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Contra-alegaram os intervenientes concluindo pelo não provimento do recurso.
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Foram dispensados os vistos.
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II- FUNDAMENTOS

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso- cfr. artigos 635.º, nº 3, e 639.º, nºs 1 e 2, do C.P.Civil.
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No seguimento desta orientação são as seguintes as questões a decidir no presente recurso:
a)- saber se o tribunal deveria ter declarado a caducidade da deliberação da mesa da assembleia ocorrida no dia 30/05/2013;
b)- saber se o tribunal deveria ter dado como provados todos os factos constantes do requerimento inicial, não excluindo, pois, da fundamentação factual os atinentes à questão da caducidade.
c)- saber se estão ou não verificados os requisitos para a procedência da presente providência.
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A)-FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

É a seguinte a matéria factual que o tribunal recorrido deu como provada:

1. O Requerente é uma associação constituída por escritura pública, fundada em 11.06.1943, que tem por fim promover a educação física dos seus associados, desenvolver a prática dos desportos e proporcionar meios de recreio e de cultura, em especial aos seus associados, sem qualquer fim de lucro económico dos mesmos.
2. A Requerida é uma associação de âmbito regional constituída por escritura pública, filiada na D…, que tem por fins principais: promover, fomentar, incentivar, dirigir e regulamentar a prática de futebol no distrito de Bragança; estabelecer e manter relações com as Associações congéneres e restantes sócios ordinários da D…; cuidar e defender os direitos dos seus Associados e os seus legítimos interesses, representando-os perante a administração Pública; representar o futebol distrital; organizar, anual e obrigatoriamente, os Campeonatos distritais e, facultativamente, quaisquer outras provas de interesse para o futebol distrital, sem qualquer fim de lucro económico dos seus associados.
3. O Requerente é sócio ordinário da Requerida.
4. Em 15.05.2013, por convocatória do Presidente da Assembleia Geral da Requerida, foram convocados os sócios ordinários da C… para reunirem em “Assembleia Eleitoral, para eleição, por sufrágio directo e secreto, dos titulares dos respectivos Órgãos Sociais, para o mandato de 2013 a 2017, no próximo dia 8 de Junho de 2013, das 15h00m às 18h00m, na sede da C…”.
5. Candidataram-se à eleição duas listas, apresentadas nos serviços administrativos da Requerida em 28.05.2013 e em 29.05.2013, instruídas com vários documentos que as acompanhavam.
6. Por deliberação de 30.05.2013 a Mesa da Assembleia Geral, após analisar e conferir as listas candidatas e os documentos respectivos, admitiu-as a sufrágio por entender que as mesmas “não continham irregularidades”.
7. Após sorteio, designou com as letras “A” e “B”, as listas encabeçadas, respectivamente, por E… e por F…, para Presidente da Direcção da C….
8. No dia 08.06.2013 decorreu o acto eleitoral, tendo obtido a lista “A” 35 votos e a lista “B” 42 votos, resultado que foi homologado, tendo sido ordenada a publicação dos resultados e lavrada a respectiva Acta (n.º 2/2013).
9. Em 17.06.2013, a Mesa da Assembleia Geral da C… convocou “todos os membros dos membros dos órgãos eleitos para a tomada de posse no dia 1 de Julho de 2013, pelas 21h00m, na sede da C…”.
10. Há irregularidades ao nível da representação dos sócios ordinários da C… na Assembleia Geral Eleitoral realizada no dia 08.06.2013.
11. As credenciais emitidas pelos seguintes sócios da C… não contêm a assinatura dos respectivos Delegados:
- H…;
- I…;
- J…;
- K…;
- L…;
- M…;
- N…;
- G…;
- O…;
- P…s;
- Q…;
- S…; e
- T….
12. O descrito em 11. suscita dúvidas sobre se os Delegados indicados naquelas credenciais aceitaram a sua designação pelos respectivos Clubes e sequer se foram eles próprios que compareceram e representaram os clubes mandantes na Assembleia Geral do dia 8 de Junho.
13. A credencial apresentada pelo Delegado representante do U..., sócio ordinário da C…, constitui uma mera fotocópia na parte das assinaturas imputadas aos legais representantes daquele Clube, fotocópia sobre a qual foi aposto o carimbo do Clube e feita a assinatura do Delegado.
14. Tal credencial contém apenas duas assinaturas, não estando assinado, como deveria, pela maioria dos membros da Direcção daquele Clube, que é formada por 5 elementos.
15. Existe uma credencial que não identifica o clube mandante.
16. O descrito em 15. são permite saber a que sócio ordinário da C… respeita tal credencial e quem representava o Delegado que foi admitido a participar e votar na Assembleia Geral Eleitoral.
17. O O…, a V…, o N… e o W…, sócios ordinários da C…, fizeram-se representar na Assembleia Geral Eleitoral através de credenciais emitidas por pessoas estranhas aos respectivos Órgãos Sociais.
18. Tais Clubes têm as respectivas Direcções demissionárias, estando a ser geridos por Comissões Administrativas.
19. Só a maioria da Direcção dos sócios Ordinários tem legitimidade para emitir a credencial designadora do respectivo Delegado, representante do Clube na Assembleia Geral.
20. A C… organiza os campeonatos distritais de futebol de séniores (Divisão de Honra), de juvenis, de infantis e de benjamins, organiza os campeonatos distritais de futsal de séniores (1ª Divisão), masculinos e femininos, de juniores, de juvenis, de iniciados, de infantis e de benjamins, campeonatos distritais que permitem ao respectivo campeão aceder aos campeonatos nacionais da respectiva categoria e escalão.
21. A Requerida organiza, ainda, a disputa de uma Taça (Taça da C…) na variante de futebol de séniores, de iniciados, de infantis e de benjamins, e também de uma Taça (Taça da C…) na variante de futsal de séniores, masculinos e femininos, de juniores e de juvenis.
22. A C… conta nos seus quadros de árbitros e de observadores, com 75 árbitros de futebol e 5 observadores e com 24 árbitros de futsal e 1 observador, os quais são objecto de classificação pelo Conselho de Arbitragem da C…, que permitem a sua evolução e ascensão aos quadros de competição nacional e para os quais é necessário organizar acções de formação.
23. A C… tem, ainda, Selecções Distritais que participam em torneios nacionais de futebol e de futsal, nomeadamente, as Selecções Feminina de Futebol de 7 de Sub-16, de futebol de Sub-14, de futsal Feminina Sénior e de futsal Masculina Sub-20 e Masculina Sub-15.
24. Toda esta organização de campeonatos, de ascensão de equipas, de árbitros e de observadores e de selecções distritais impõe que os membros eleitos para os órgãos Sociais da Requerida sejam pessoas competentes e com conhecimentos idóneos, aptos e capazes para o desempenho das respectivas funções, sob pena de se prejudicar e de se pôr em causa a evolução do futebol nordestino, nas suas várias vertentes (futebol, futsal e arbitragem) e nas suas várias categorias e escalões etários, e sob pena de se prejudicar o prestígio obtido com os resultados até agora alcançados pelos legítimos representantes do futebol brigantino.
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III- O DIREITO

Antes de entrarmos na apreciação do objecto do recurso importa estabelecer qual a lei aplicável, tendo em conta que Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, aprovou um novo Código de Processo Civil que entrou em vigor no dia 1 de Setembro de 2013 (cfr. artigo 8.º).
Ora, nos termos do artigo 7.º, nº 2 da citada lei o Código de Processo Civil por ela aprovado não é aplicável aos procedimentos cautelares instaurados antes da sua entrada em vigor.
Como, assim ao presente recurso é ainda aplicável o anterior CPCivil, na parte atinente às normas específicas reguladoras do providência cautelar impetrada e cuja e cuja entrada ocorreu 18 de Junho de 2013.
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Como supra se referiu o primeiro ponto da decisão do tribunal recorrido que vem posto em crise pelo apelante é:
a)- saber se o tribunal deveria ter declarado a caducidade da deliberação da mesa da assembleia ocorrida no dia 30/05/2013;
Na decisão recorrida entendeu-se julgar caduco o direito do apelante impugnar, nesta sede, a deliberação da Mesa da Assembleia Geral realizada no dia 30.05.2013, na parte em que admitiu a sufrágio as duas listas candidatas.
Com este entendimento não concorda o apelante, desde logo, por entender que tal decisão da Mesa da Assembleia Geral não podia ser objecto de impugnação autónoma, dado que a suspensão das deliberações só poder incidir sobre deliberações tomadas em Assembleia Geral e não sobre deliberações tomadas por outros órgãos.
Quid iuris?
Cremos, salvo o devido respeito que, neste segmento recursório assiste, de facto, razão ao apelante.
Efectivamente, o procedimento cautelar de suspensão de deliberações sociais regulado nos artigos 396.º e 397.º do CPCivil apenas pode ser requerido quanto a actos respeitantes a associações ou a sociedades, como directamente deflui do teor literal do nº 1 do citado artigo 396.º
Todavia, não é todo e qualquer acto que pode ser objecto de suspensão, mas apenas as deliberações em que os membros da associação ou os sócios da sociedade exprimam a vontade do ente colectivo o que, em regra, fazem numa assembleia.
Significa, portanto, que só as deliberações dos sócios de uma sociedade ou dos membros de uma associação-normalmente tomadas em assembleia geral e que exprimem a vontade do ente colectivo a que respeitam-podem ser atacadas pela via cautelar de suspensão.
Como assim, esta providência não é, pois, aplicável às deliberações tomadas por outros órgãos (direcção, conselho fiscal, administração, gerência etc.) da sociedade ou da associação.[1]
Na verdade, a providência cautelar de suspensão de deliberações é sempre requerida contra a sociedade ou a associação a que respeita a deliberação, isso mesmo resulta, aliás, do nº 1 do artigo 397.º do CPCivil que alude à citação da associação ou sociedade.
Ora, se tal procedimento se aplicasse também às deliberações de outros órgãos da associação ou da sociedade (a que Pinto Furtado chama resoluções) a providência teria de ser requerida apenas (ou também) contra esses órgãos, por se tratar de declarações que exprimem a vontade do órgão de que emanam, não a vontade da sociedade ou associação.
Isto dito, no caso concreto dos autos no dia 30.05.2013 não se realizou qualquer Assembleia Geral.
Naquela data, como decorre da acta nº 1/2013 junta como documento nº 7 ao requerimento inicial, apenas reuniu a Mesa da Assembleia Geral e não os associados da entidade requerida em Assembleia Geral.
A reunião em Assembleia Geral dos associados da requerida C… ocorreu apenas em 8.06.2013, como também resulta da acta nº 2/2013, junta ao requerimento inicial como documento nº 8.
Resulta, pois, do exposto, que a decisão proferida pela Mesa da Assembleia Geral na reunião ocorrida no dia 30.05.2013 não é, portanto, uma deliberação social da própria Assembleia Geral e, por assim ser, não é possível requerer autonomamente a suspensão da execução de tal decisão, no âmbito da presente providência, aliás, diga-se, nem isso foi requerido pelo apelante.
A decisão da Mesa de 30.05.2013 constituiu, assim, um mero acto intercalar do processo eleitoral, componente da deliberação eleitoral que resultou apenas da votação realizada pelos sócios ordinários da C… na Assembleia Geral de 8.06.2013.
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Mas ainda que assim não se entendesse à Srª juiz estava-lhe vedado o conhecimento da excepção da caducidade.
Analisando.
Prazo judicial é o período de tempo fixado para se produzir um determinado efeito processual, pressupondo, por isso, necessariamente, que já está proposta a acção. E nestas condições não está o prazo estabelecido por lei para propositura de uma acção-nesta terminologia se englobam, para o efeito, os incidentes e as providências cautelares-que é um prazo a decorrer anteriormente à organização do processo.[2]
Tal prazo tem natureza civil, é elemento integrante do regime jurídico da respectiva relação de direito substantivo ou material; é um prazo através do qual se impõe que o direito seja exercido nesse lapso de tempo, não susceptível de prorrogação, e que pressupõe o interesse da rápida definição do direito.
E é um prazo de caducidade porque limita a vida de certo direito-no caso de obter a suspensão da deliberação social-e não de prescrição onde o que se limita é a negligência ou inacção do titular do direito, traduzindo-se a excepção em que pode expressar-se num facto estranho ou prejudicial ao direito, num facto que não é elemento dele.[3]
Nos termos do n.° 2.° do artigo 298.° do CCivil quando por força da lei ou da vontade das partes um direito deva ser exercido dentro de certo prazo são aplicáveis as regras da caducidade, a menos que a lei se refira expressamente à prescrição.
Decorre, portanto do exposto ser um prazo de caducidade aquele que se fixa no n.° 1.° do citado artigo 396.° do CPCivil e não um prazo judicial ou processual.[4]
Acontece que, a caducidade, no caso em apreço não foi estabelecida em matéria excluída da disponibilidade das partes.
A lei pode não declarar expressamente se certo direito é inalienável ou indisponível objectiva e intrinsecamente-não interessa que o seja por mercê da qualidade ou condição do seu titular-direito subtraído, portanto, à influência da vontade do titular respectivo. Haverá então, através da interpretação dos preceitos, que indagar se a lei quer tornar esse direito indisponível pelo seu titular.
Será numa razão de ordem pública que assentará a sua indisponibilidade.
Ora, não se alcança que a ordem pública possa ser afectada pela falta de justeza e desacerto das deliberações que a assembleia geral de uma sociedade ou associação, como seu órgão, assuma.
Estarão em jogo os interesses privados dos sócios ou dos associados ou os particulares interesses da sociedade ou da associação como ente sujeito de direitos e de obrigações, e não os superiores interesses da Colectividade e do Estado.
Por outras palavras poderá dizer-se que, no caso, não é ofendido o conjunto de princípios fundamentais subjacentes ao sistema jurídico que o Estado e a Sociedade estão substancialmente interessados em que prevaleçam e que têm uma acuidade tão forte que devem sobrepor-se às convenções privadas.[5]
A caducidade só pode ser conhecida oficiosamente se tiver sido estabelecida em matéria excluída da disponibilidade das partes, de contrário carece, para tanto, de ser invocada (artigo 303.° do CCivil).
Tratando-se de um direito disponível o seu titular é livre de exercê-lo ou não e, no caso afirmativo, também a parte contrária é livre para poder opor ou não a extemporaneidade do seu exercício.
Deste modo, a Sr. Juiz não podia ter conhecido da excepção de caducidade porque esta não se achava invocada, tanto mais, que nem sequer foi deduzida oposição.
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Acresce que, e para o caso de também assim não se entender, ainda por outra razão a Srª juiz não podia ter julgado verificada a caducidade.
Efectivamente, não vemos como, por referência às datas da decisão da Mesa da Assembleia de 30/05/2013 e entrada do requerimento inicial da providência de 18/06/2013 se pode concluir que já estava caduco o direito.
Com efeito, resulta do disposto nos nºs 1 e 3 do art. 396.º do CPCivil, que o prazo para requerer a suspensão de deliberações tomadas pela associação ou sociedade é de 10 dias a contar da assembleia em que tais deliberações foram tomadas, desde que o requerente tenha estado presente na mesma ou para ela tenha sido regularmente convocado, ou não tendo sido convocado da data em que ele teve conhecimento das deliberações, isto é, do seu teor.
Ora, não estando demonstrado nos autos que o apelante tenha estado presente aquando dessa decisão da Mesa da Assembleia, aliás, a mesma realizou-se apenas com a presença de dois membros da Mesa da Assembleia Geral da C…, para declarar a caducidade do direito de impugnação da deliberação tomada pela Mesa na referida reunião, o tribunal tinha que dar como demonstrado, o que não sucedeu, que o apelante teve conhecimento da aludida deliberação mais de 10 dias antes da propositura da presente providência cautelar.[6]
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Procedem, deste modo, as conclusões formuladas pelo apelante 1ª a 13ª e, como tal, este segmento recursório.
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A segunda questão que o apelante coloca no recurso prende-se com:

b)- saber se o tribunal deveria ter dado como provados todos os factos constantes do requerimento inicial, não excluindo, pois, da fundamentação factual os atinentes à questão da caducidade.

Refere neste âmbito o apelante que independentemente da decisão que recaiu sobre a questão da caducidade, deviam ser considerados como provados todos os factos articulados pelo Requerente e que devam ser tidos como confessados, por não ter havido oposição/impugnação dos requeridos.
Vejamos se assim é.
Por ter sido devidamente citada a requerida e não ter deduzido oposição o tribunal recorrido aplicou e bem, o efeito cominatório e considerou confessados os factos articulados no requerimento inicial (artigo 484.º, nº 1 do CPCivil ex vi artigo 385.º, nº 5 do mesmo diploma legal) excepto os atinentes à facticidade abrangida pela caducidade que declarou.
Não cremos, salvo o devido respeito, que se tenha decidido com acerto.
Na verdade, verificada uma situação de revelia operante, todos os factos narrados devem ser considerados confessados e, portanto, provados ainda que neutrais para a apreciação do mérito da pretensão.[7]
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Acontece que, só os factos é que se devem considerar provados e não meras conclusões ou afirmações.
Como assim, dos elencados pelo apelante apenas os constantes dos artigos 21º, 45º, 46º, encerram factos.
Com efeito, todos os outros limita-se a fazer transcrições dos artigos estatutários e a produzir meras afirmações (artigos 5º, 23º, 25º, 26º, 27º, 28º, 32º, 34º, 36º, 38.º e 42).
Efectivamente, o que o apelante devia era ter alegado factos que preenchessem a facti species de cada um dos artigos estatuários que tivessem sido violados, afirmando que os candidatos da lista “A” ou “B” não tinha estas ou aquelas características exigidas pelas normas estatutárias e não dizer que as listas “A” e “B”não demonstraram isto ou aquilo, isso não são factos, são simples afirmações.
É que as normas estatutárias não dizem que as listas devem especificar isto ou aquilo, o que dizem é que os candidatos devem ter estes ou aqueles requisitos, portanto, o que apelante deveria ter alegado era que os candidatos das listas “A” ou “B” não tinham os requisitos exigidos por aquelas normas.
No que tange ao artigo 80.º trata-se de uma mera conclusão e não de um facto.
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Resulta, pois do exposto que apenas devem se aditados à fundamentação factual supra descrita os factos constantes dos artigos 21º, 45º, 46º do requerimento inicial, sendo que, quanto aos estatutos contêm eles normas e não factos e, estando juntos aos autos, tanto basta para se aferir da sua violação (artigo 662.º, nº 1 do CPCivil).
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Procedem assim, em parte, as conclusões 14ª a 17ª.
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Com vista, pois, a apreciar a terceira questão colocada no recurso são os seguintes os factos provados renumerados pela sequência lógica possível:
1. O Requerente é uma associação constituída por escritura pública, fundada em 11.06.1943, que tem por fim promover a educação física dos seus associados, desenvolver a prática dos desportos e proporcionar meios de recreio e de cultura, em especial aos seus associados, sem qualquer fim de lucro económico dos mesmos.
2. A Requerida é uma associação de âmbito regional constituída por escritura pública, filiada na D…, que tem por fins principais: promover, fomentar, incentivar, dirigir e regulamentar a prática de futebol no distrito de Bragança; estabelecer e manter relações com as Associações congéneres e restantes sócios ordinários da D…; cuidar e defender os direitos dos seus Associados e os seus legítimos interesses, representando-os perante a administração Pública; representar o futebol distrital; organizar, anual e obrigatoriamente, os Campeonatos distritais e, facultativamente, quaisquer outras provas de interesse para o futebol distrital, sem qualquer fim de lucro económico dos seus associados.
3. O Requerente é sócio ordinário da Requerida.
4. Em 15.05.2013, por convocatória do Presidente da Assembleia Geral da Requerida, foram convocados os sócios ordinários da C… para reunirem em “Assembleia Eleitoral, para eleição, por sufrágio directo e secreto, dos titulares dos respectivos Órgãos Sociais, para o mandato de 2013 a 2017, no próximo dia 8 de Junho de 2013, das 15h00m às 18h00m, na sede da C…”.
5. Candidataram-se à eleição duas listas, apresentadas nos serviços administrativos da Requerida em 28.05.2013 e em 29.05.2013, instruídas com vários documentos que as acompanhavam.
6. Por deliberação de 30.05.2013 a Mesa da Assembleia Geral, após analisar e conferir as listas candidatas e os documentos respectivos, admitiu-as a sufrágio por entender que as mesmas “não continham irregularidades”.
7. Após sorteio, designou com as letras “A” e “B”, as listas encabeçadas, respectivamente, por E… e por F…, para Presidente da Direcção da C….
8. A lista que veio a ser designada pela letra “B” foi apresentada em papel do qual consta o símbolo da própria C… e a expressão “Associação em Movimento” e ainda, a figura de um atleta e de uma bola de futebol.
9. A declaração de aceitação do sr. X…, candidato pela lista “B” ao Conselho Fiscal, é uma simples fotocópia, não constando do processo eleitoral o original da declaração formal de aceitação do desempenho do cargo.
10. O mesmo sucede com as declarações de aceitação dos srs. Y…, Z…, AB… e AC…, candidatos à Direcção, e do sr. AD…, candidato ao Conselho Técnico, todos integrantes da lista “A”.
11. No dia 08.06.2013 decorreu o acto eleitoral, tendo obtido a lista “A” 35 votos e a lista “B” 42 votos, resultado que foi homologado, tendo sido ordenada a publicação dos resultados e lavrada a respectiva Acta (n.º 2/2013).
12. Em 17.06.2013, a Mesa da Assembleia Geral da C… convocou “todos os membros dos membros dos órgãos eleitos para a tomada de posse no dia 1 de Julho de 2013, pelas 21h00m, na sede da C…”.
13. Há irregularidades ao nível da representação dos sócios ordinários da C… na Assembleia Geral Eleitoral realizada no dia 08.06.2013.
14. As credenciais emitidas pelos seguintes sócios da C… não contêm a assinatura dos respectivos Delegados:
- H…;
- I…;
- J…;
- K…;
- L…;
- M…;
- N…;
- G…;
- O…;
- P…;
- Q…;
- S…; e
- T….
15. O descrito em 11. suscita dúvidas sobre se os Delegados indicados naquelas credenciais aceitaram a sua designação pelos respectivos Clubes e sequer se foram eles próprios que compareceram e representaram os clubes mandantes na Assembleia Geral do dia 8 de Junho.
16. A credencial apresentada pelo Delegado representante do U…, sócio ordinário da C…, constitui uma mera fotocópia na parte das assinaturas imputadas aos legais representantes daquele Clube, fotocópia sobre a qual foi aposto o carimbo do Clube e feita a assinatura do Delegado.
17. Tal credencial contém apenas duas assinaturas, não estando assinado, como deveria, pela maioria dos membros da Direcção daquele Clube, que é formada por 5 elementos.
18. Existe uma credencial que não identifica o clube mandante.
19. O descrito em 15. não permite saber a que sócio ordinário da C… respeita tal credencial e quem representava o Delegado que foi admitido a participar e votar na Assembleia Geral Eleitoral.
20. O O…, a V…, o N… e o W…, sócios ordinários da C…, fizeram-se representar na Assembleia Geral Eleitoral através de credenciais emitidas por pessoas estranhas aos respectivos Órgãos Sociais.
21. Tais Clubes têm as respectivas Direcções demissionárias, estando a ser geridos por Comissões Administrativas.
22. Só a maioria da Direcção dos sócios Ordinários tem legitimidade para emitir a credencial designadora do respectivo Delegado, representante do Clube na Assembleia Geral.
23. A C… organiza os campeonatos distritais de futebol de séniores (Divisão de Honra), de juvenis, de infantis e de benjamins, organiza os campeonatos distritais de futsal de séniores (1ª Divisão), masculinos e femininos, de juniores, de juvenis, de iniciados, de infantis e de benjamins, campeonatos distritais que permitem ao respectivo campeão aceder aos campeonatos nacionais da respectiva categoria e escalão.
24. A Requerida organiza, ainda, a disputa de uma Taça (Taça da C…) na variante de futebol de séniores, de iniciados, de infantis e de benjamins, e também de uma Taça (Taça da C…) na variante de futsal de séniores, masculinos e femininos, de juniores e de juvenis.
25. A C… conta nos seus quadros de árbitros e de observadores, com 75 árbitros de futebol e 5 observadores e com 24 árbitros de futsal e 1 observador, os quais são objecto de classificação pelo Conselho de Arbitragem da C…, que permitem a sua evolução e ascensão aos quadros de competição nacional e para os quais é necessário organizar acções de formação.
26. A C… tem, ainda, Selecções Distritais que participam em torneios nacionais de futebol e de futsal, nomeadamente, as Selecções Feminina de Futebol de 7 de Sub-16, de futebol de Sub-14, de futsal Feminina Sénior e de futsal Masculina Sub-20 e Masculina Sub-15.
27. Toda esta organização de campeonatos, de ascensão de equipas, de árbitros e de observadores e de selecções distritais impõe que os membros eleitos para os órgãos Sociais da Requerida sejam pessoas competentes e com conhecimentos idóneos, aptos e capazes para o desempenho das respectivas funções, sob pena de se prejudicar e de se pôr em causa a evolução do futebol nordestino, nas suas várias vertentes (futebol, futsal e arbitragem) e nas suas várias categorias e escalões etários, e sob pena de se prejudicar o prestígio obtido com os resultados até agora alcançados pelos legítimos representantes do futebol brigantino.
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A terceira questão que no recurso o apelante põe à apreciação deste tribunal consiste em:

c)- saber se estão ou não verificados os requisitos para a procedência da presente providência.

Dispõe o artigo 396.º do Código de Processo Civil, no seu nº 1, que “se alguma associação ou sociedade, seja qual for a sua espécie, tomar deliberações contrárias à lei, aos estatutos ou ao contrato, qualquer sócio pode requerer, no prazo de 10 dias, que a execução dessas deliberações seja suspensa, justificando a qualidade de sócio e mostrando que essa execução pode causar dano apreciável”.
O deferimento da providência cautelar de suspensão de deliberação social depende, portanto, da verificação cumulativa dos seguintes requisitos:
a) O requerente tem que ser sócio da sociedade que a tomou;
b) A deliberação tem que ser contrária à lei ou ao pacto social; e
c) Há-de resultar da execução da deliberação dano apreciável.
O primeiro dos referidos requisitos é um pressuposto de legitimidade e o segundo satisfaz-se com um juízo de probabilidade e verosimilhança que é próprio das providências cautelares[8].
Porém, a prova do terceiro pressuposto tem sido vista com maior exigência na doutrina e na jurisprudência, de molde a permitir a manutenção de um clima de equilíbrio no funcionamento da sociedade ou associação e no relacionamento dela com os sócios e daí o estatuído no nº 2 do artigo 397.º, do CPCivil, ao permitir que o juiz deixe de suspender a deliberação social, ainda que ilegal ou contrária aos estatutos ou ao contrato se o prejuízo resultante da suspensão for superior ao que pode advir da respectiva execução.
Dúvidas, não existem de que a providência cautelar serve para obviar às consequências do periculum in mora, exigindo como requisito a alegação e prova de que resulte, antes da acção ser proposta ou na pendência dela, lesão grave ou dificilmente reparável ao direito do requerente.
O ónus da prova é do requerente (artigo 342.º, nº 1, do CCivil), e o zelo e cautela do seu direito pressupõe, desde logo, no requerimento da providência, a alegação de factos concretos reveladores do perigo de ocorrência de determinadas consequências danosas de relevo que se mostrem sérias e certas ou quase inevitáveis, muito fortemente prováveis.[9]
Para além disso, o requerente tem de convencer o tribunal de que a suspensão da deliberação é condição essencial para impedir a verificação daquele dano.
Neste circunstancialismo e apenas estando ele devidamente configurado, é que se deverá então considerar que “só quando o prejuízo decorrente da suspensão da deliberação ilegal for superior ao prejuízo advindo da execução dessa deliberação é que esta deverá permanecer eficaz enquanto não for declarada nula ou anulada”.[10]
Abrantes Geraldes[11], explica que a expressão: dano apreciável, é um conceito indeterminado carecido de densificação através de alegação e prova de factos dos quais se possa extrair que a execução da deliberação no seio da pessoa colectiva acarretará um prejuízo significativo, de importância relevante, mas sem ser uma situação de irrecuperabilidade ou de grave danosidade.
O legislador pretende, pois, compatibilizar os interesses do requerente e da sociedade ou associação, procurando uma menor interferência na vida da sociedade ou associação, procurando suspender deliberações quando apesar de feridas de alguns vícios atendíveis, os efeitos da suspensão sejam superiores aos da execução.
Assim, refere aquele autor “O modo como está arquitectada a suspensão de deliberações sociais revela que o legislador pretendeu compatibilizar os interesses contrapostos do requerente e da sociedade requerida: aquele a exigir a suspensão da deliberação invocando o risco de ocorrência de dano apreciável; e esta a reclamar a menor interferência jurisdicional na sua actividade, de modo a evitar a suspensão de deliberações quando, apesar das feridas de alguns dos vícios atendíveis, os efeitos da suspensão sejam superiores aos da execução”.
Como se refere no acórdão da Relação de Lisboa de 28-02-2008[12], “o dano apreciável é o dano significativo que pode resultar da execução da deliberação social ilegal, que a própria providência visa esconjurar reconhecendo o periculum in mora na obtenção de uma decisão através da acção judicial de oposição a uma determinada deliberação”.
Exige-se, portanto, um juízo de forte probabilidade de dano iminente, bem como da medida e extensão do mesmo, que permitam tomá-lo por considerável, não sendo suficiente a alegação de mera possibilidade de prejuízo cujo volume não possa aquilatar-se.[13]
Importa, porém, que não se olvide o que nos parece ser aqui de considerar da maior importância: enquanto a providência em causa visa apenas evitar o dano resultante da deliberação tomada, quando imputável à demora na resolução do litígio, a acção de anulação ou declaração de nulidade (a acção principal de que aquela é dependente), é que se destina, verdadeiramente, a apreciar da própria legalidade do acto.
Não pode, portanto, entender-se a providência como uma mera antecipação provisória da sentença de anulação.[14]
Neste contexto, a simples aparência de invalidade da deliberação social deverá ser tida como suficiente ao decretamento da suspensão dos efeitos dessa deliberação se o dano necessário estiver devidamente configurado.
Feitos estes considerandos e sendo cumulativos, como acima se assinalou, os supra referidos requisitos da suspensão da deliberação social resultantes do artigo 396.º, nº 1, do CPCivil, vejamos então se, no concreto, está ou não verificado o “dano apreciável”, já que, não vêm questionados os dois outros requisitos.
Respigando o vertido no requerimento inicial verifica-se que, nesta sede, o apelante se limitou a alegar simples vaguidades e meras conclusões, ou seja, o requerimento inicial revela a ausência dum acervo factual donde, uma vez provado, se pudesse concluir pela existência do citado dano apreciável, facticidade que também não emerge da fundamentação factual supra descrita.
Atente-se o que, a este propósito, o apelante verteu no requerimento inicial:
“79 – Toda esta organização de campeonatos, de ascensão de equipas, de árbitros e de observadores e de selecções distritais impõe que os membros eleitos para os órgãos Sociais da Requerida sejam pessoas competentes e com conhecimentos idóneos, aptos e capazes para o desempenho das respectivas funções.
80 – Sob pena de se prejudicar e de se pôr em causa a evolução do futebol nordestino, nas suas várias vertentes (futebol, futsal e arbitragem) e nas suas várias categorias e escalões etários.
81 – E sob pena de se prejudicar o prestígio obtido com os resultados até agora alcançados pelos legítimos representantes do futebol brigantino.
(…)
85 – Impõe-se por isso, decretar a suspensão da deliberação social de eleição dos Órgãos Sociais da C….
86 – Sob pena de a sua execução causar portanto, danos apreciáveis, não apenas ao Requerente, como aos demais agentes desportivos associados ao fenómeno do futebol e do futsal inscritos naquela Associação.”
Com esta alegação o apelante tenta aliar o dano à falta de competência dos membros.
Todavia, não alega um único facto concreto que permita estabelecer essa correspondência.
Como inferir que das irregularidades cometidas os membros eleitos não são competentes e capazes?
Essa conclusão não se pode retirar, sem mais, pelo facto de, na sua eleição, não terem sido observadas determinadas formalidades consignadas estatutariamente.
Trata-se, apenas, de uma hipótese, de mera previsão ou suposição antecipada daquilo que poderá suceder. Não são alegados factos concretos consubstanciadores de que a execução da deliberação acarretará, com certeza, ou com uma probabilidade muito forte e séria, prejuízo apreciável.
A inaptidão dos membros eleitos tinha de ser aferida em função de eventuais condutas que os mesmos já tivessem adoptado o que, neste caso, nem sequer isso era possível configurar, pois que, os membros eleitos não foram ainda empossados (a tomada de posse dos órgãos eleitos foi dada sem efeito, como se alcança da decisão da Mesa da Assembleia Geral de 26.06.2013, junta pelos Intervenientes como doc. nº 1, com o seu requerimento de 8.07.2013).
Resulta, assim do exposto que o apelante não demonstrou como lhe era exigível (artigo 342.º, nº 1 do CCivil) a existência de qualquer eventual dano decorrente da execução da deliberação inválida e, por conseguinte, que o dano é significativamente prejudicial à actividade da apelada.
Na verdade, do simples facto de não terem sido observadas determinadas formalidades na eleição, não pode inferir-se que os membros eleitos não têm a aptidão e os conhecimentos necessários ao cabal desempenho das suas funções, e que isso é causador de prejuízos apreciáveis, numa palavra, não foi demonstrado o periculum in mora.
A aferição do justo ou fundado receio, sem se reconduzir a situações de certeza inequívoca, deve fazer-se a partir de um juízo de certeza, de verdade, de realidade, nomeadamente sobre a iminência da lesão.[15]
Os factos alegados são, assim, insuficientes para que, a partir deles, se perspective, como provável, um dano apreciável para a associação e/ou para os sócios.
Como assim, não estando demonstrou o perigo de ocorrência de dano apreciável decorrente da execução da deliberação inválida, não poderá a providência requerida ser decretada, tal como se sentenciou.
Mas, ainda que assim não se entendesse, sempre a providência não deveria ser decretada.
Como resulta do nº 2 do artigo “ainda que a deliberação seja contrária à lei, aos estatutos ou ao contrato, o juiz pode deixar de suspendê-la, desde que o prejuízo resultante da suspensão seja superior ao que pode derivar da sua execução”.
De facto, tendo em conta a factualidade descrita em 24., 25. e 26., torna-se evidente que o prejuízo para a apelada resultante da providência peticionada-suspensão da deliberação que homologou o resultado eleitoral e, por conseguinte, paralisação da actividade da C…-até que seja definitivamente decidida a acção principal, excederia consideravelmente o pretenso dano que com ela o apelante pretenderia evitar.
E contra isso não colheria o argumento alinhado pelo apelante de que os membros eleitos ainda não tomaram posse, pois que, a suspensão desse empossamento adveio, como parece evidente decisão da Mesa da Assembleia Geral de 26.06.2013, do facto de ter sido instaurada a presente providência cautelar.
*
Nestes termos e atenta a natureza cumulativa dos requisitos exigidos para que seja decretada a providência de suspensão de deliberação social, não se verificando o requisito supra enunciado-dano apreciável-forçoso é concluir que falta um dos pressupostos de que depende o decretamento da providência.
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Improcede deste modo, a conclusão 18ª formulada pelo apelante, não merecendo, pois, censura a decisão que não a decretou.
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IV-DECISÃO
Pelos fundamentos acima expostos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar parcialmente procedente por provada a apelação e, consequentemente, revoga-se a decisão recorrida na parte em conheceu da invocada excepção da caducidade bem como no segmento que não deu por provados todos os factos confessados, mantendo-se quanto ao mais, isto é, na parte em que não decretou a providência cautelar requerida.
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Custas por apelante e apelada na proporção do respectivo decaimento (artigo 527.º, nº 1 do C.P.Civil).
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Porto, 30 de Junho de 2014.
Manuel Domingos Fernandes
Caimoto Jácome (dispensei o visto)
Macedo Domingues (dispensei o visto)
________________
[1] Cfr. neste sentido Alberto dos Reis, C.PCivil Anotado, Vol. I, pág. 676; J. Rodrigues Bastos, Notas ao CPCivil, Vol. II, 1966, pág. 252 e Pinto Furtado, Curso de Direito das Sociedades, 1983 pag. 236.
[2] Cfr. J. A. Reis, in Comentário ao Código Processo Civil, Vol. II, págs. 57/58.
[3] Cfr. Aníbal de Castro, A caducidades, págs. 381.
[4] Cfr. neste sentido Abrantes Geraldes in “Temas da Reforma do Processo Civil”, IV Volume, 3.ª edição, Almedina, pp. 82 e 83.
[5] Cfr. Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, pág. 434.
[6] Cfr. Vasco Da Gama Lobo Xavier, Anulação da Deliberação Social, pág. 384, nota 3.
[7] Cfr. Antunes Varela e outros, Manual de Processo Civil, 1984, pág. 331.
[8] Cfr. acórdãos desta Relação de 01/04/1993 e do Supremo Tribunal de Justiça de 19/01/1994 e de 24.10.1994, www.dgsi.pt.
[9] Cfr. acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 04/05/2000 e da Relação de Lisboa de 28/02/2008, in www.dgsi.pt.
[10] Cfr. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16-3-1999, in www.dgsi.pt.
[11] Obra citada págs. 96 e 97.
[12] Citado na nota 9.
[13] Como escreve Lobo Xavier, in Revista de Direito e Estudos Sociais, XXII, pág. 215 “não é toda e qualquer possibilidade de prejuízo que a deliberação, ou a sua execução, em si mesmas comportem, mas sim a possibilidade de prejuízos imputáveis à demora no processo de anulação. Não faria sentido que o legislador desse relevo, para efeitos de concessão de providência à eventualidade de danos diferentes dos originados pelo retardamento da sentença naquela acção preferida”.
[14] Cfr. Palma Carlos, in Revista dos Tribunais, 62/212 e Vasco Xavier Rev. Dir. Est. Soc. pág. 268.
[15] Cfr. Alberto dos Reis in Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, pág. 683.