Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
218/12.3GBAMT-A.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: WILLIAM THEMUDO GILMAN
Descritores: JUIZ NATURAL
LEI ANTERIOR
ALTERAÇÃO DA LEI
PRINCÍPIO DA PLENITUDE DO JUIZ
Nº do Documento: RP20190411218/12.3GBAMT-A.P1
Data do Acordão: 04/11/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: CONFERÊNCIA
Decisão: PROVIDO
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO, (LIVRO DE REGISTOS N.º 795, FLS.72-78)
Área Temática: .
Sumário: I – O princípio do Juiz natural, consagrado no art.º 32º, n.º 9 do CPP, impõe que a definição do juiz competente resulte da lei, abrangendo não só as regras legais propriamente ditas com relevo para a determinação a competência, como também eventuais regulamentos, regimentos, etc., emanados pelo próprio sistema judiciário de que a mesma esteja dependente.
II - Mas não se exige que a competência seja definida pela lei em vigor à data do facto, pois a lei pode ser alterada sem que se fira o princípio. O que importa é que se impeça que as regras gerais de competência sejam desvirtuadas por intervenções arbitrárias ad hoc que desviem o processo do juiz a quem deveria ser distribuído.
III - Assim, o juiz natural é o titular do processo, o qual sendo transferido, promovido ou aposentado deixa de o ser, perdendo a titularidade, não podendo por isso ter mais intervenção no processo, sob pena de violação do dito princípio.
IV - Face aos inconvenientes e prejuízo para o funcionamento do sistema de justiça decorrentes da sucessão de juízes na titularidade dos processos, impôs-se a adoção de um princípio complementar aplicável às situações de continuação de julgamento, que é o princípio da plenitude da assistência dos juízes, consagrado no artigo 328°-A do Código Processo Penal.
V - Nos termos do n.º 5 do artigo 328°-A do Código Processo Penal e ressalvadas as excepções nele enunciadas, e outras decorrentes da lei, designadamente do regime das escusas, recusas e impedimentos, o juiz que for transferido, promovido ou aposentado conclui o julgamento.
VI - Pressuposto da sua aplicação é que a audiência de discussão e julgamento se tenha iniciado, pois só assim se justifica que um juiz, após cessação de funções num determinado Tribunal, aí continue a administrar a justiça.
VII – O princípio da plenitude da assistência dos juízes não é absoluto, podendo ser preferível, dependendo das circunstâncias do caso concreto, a intervenção do atual juiz titular e a repetição dos atos já praticados.
VIII - Desta relatividade do princípio dá conta o n.º 5 do artigo 328°-A do CPP, quando refere que o juiz que for transferido, promovido ou aposentado conclui o julgamento, excepto se a aposentação tiver por fundamento a incapacidade física, moral ou profissional para o exercício do cargo, ou se em qualquer dos casos as circunstâncias aconselharem a substituição do juiz transferido, promovido ou aposentado, o que é decidido, em despacho fundamentado, pelo juiz que deva presidir à continuação da audiência.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo n n.º 218/12.3GBAMT-A.P1
Data do acórdão: 11 de Abril de 2019
Relator: William Themudo Gilman
Adjunto: António Luís Carvalhão
Origem:
Tribunal Judicial da Comarca do Porto Este
Juízo Local Criminal de Amarante
Sumário (da responsabilidade do relator):
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Acordam em conferência na Segunda Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto:
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1 - RELATÓRIO
No processo comum, com intervenção do Tribunal singular, n.º 218/12.3GBAMT, do Tribunal Judicial da Comarca do Porto Este - Juízo Local Criminal de Amarante, o Ministério Público veio arguir a nulidade de todo o processado posterior ao despacho que designou dia para julgamento.
O Mmo. Juiz que se encontrava a presidir à audiência de julgamento proferiu, em 29.11.2018, despacho nos autos entendendo que tendo dado início à audiência de julgamento era competente para prosseguir os ulteriores termos do processo e decidiu manter a data designada para continuação da audiência de julgamento.
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O Mmo. Juiz recorrido sustentou a decisão recorrida.
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O Exmo. Procurador-Geral Adjunto nesta Relação pronunciou-se no sentido de o recurso merecer provimento.
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Notificado nos termos do artigo 417º, n.º 2 do CPP, o arguido apresentou requerimento em que manteve a posição anteriormente tomada na resposta ao recurso.
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Colhidos os vistos, foram os autos à conferência.
Cumpre apreciar e decidir.
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2 - FUNDAMENTAÇÃO
2.1 - QUESTÕES A DECIDIR
Conforme jurisprudência constante e assente, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, é pelas conclusões que o recorrente extrai da motivação apresentada, em que sintetiza as razões do pedido (artigo 412.º, n.º 1, do CPP), que se delimita o objecto do recurso e os poderes de cognição do Tribunal Superior.
Face às conclusões extraídas pelo recorrente da motivação apresentada, a questão a apreciar e decidir é a de se saber se o Juiz que declarou aberta a audiência de julgamento e profere de imediato despacho de adiamento sine die pode, depois de ter sido movimentado para outro Tribunal, vir declarar de novo aberta a audiência e presidir ao julgamento, sem incorrer na nulidade insanável do artigo 119º, n.º 1 al. a) do CPP.
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2.2 - A DECISÃO RECORRIDA E CIRCUNSTÂNCIAS RELEVANTES EXTRAÍDAS DOS AUTOS.
Com relevo para a resolução das questões colocadas importa, desde logo, considerar como pertinentes o despacho recorrido e as circunstâncias que a seguir se descrevem.
2.2.1 - O despacho recorrido.
O teor do despacho recorrido (cfr. fls. 55-56) é o seguinte:
«O ministério público veio requerer a nulidade de todo o processado posterior ao despacho que designou a audiência de julgamento.
A assistente concorda com a posição do ministério público.
O arguido entende que não assiste razão ao ministério público.
Cumpre apreciar e decidir.
O artigo 329.º, do código de processo penal dispõe:
«1 - Na hora a que deva realizar-se a audiência, o funcionário de justiça, de viva voz e publicamente, começa por identificar o processo e chama, em seguida, as pessoas que nele devam intervir.
2 - Se faltar alguma das pessoas que devam intervir na audiência, o funcionário de justiça faz nova chamada, após o que comunica verbalmente ao presidente o rol dos presentes e dos faltosos.
3 - Seguidamente, o tribunal entra na sala e o presidente declara aberta a audiência».
Foi precisamente o que se verificou nos presentes autos.
Isto é, o tribunal declarou aberta a audiência de julgamento, tendo entrado na sala de audiências e só após tal ato é que foi suscitada a questão da prova pericial, tendo sido requerido o complemento da mesma, por forma a dotar o tribunal de exame pericial mais completo, para poder apreciar a questão do pedido de indemnização civil deduzido pela assistente.
Diligência essa determinada pelo ora signatário.
Por conseguinte, tem que se entender que se deu início à audiência de julgamento, apesar de formalmente não se ter produzido prova, ou seja, de não se terem tomado declarações ao arguido nem à assistente.
Entendimento diferente, agora nesta fase, em que já se produziu prova, em que foram tomadas declarações ao arguido e à assistente e inspeção judicial ao local onde os alegados factos foram praticados, afetaria a imediação e a espontaneidade da prova. Com efeito, a determinar-se a anulação de todo o processado, ter-se-ia que ouvir novamente o arguido, sabendo este o que já foi dito pela assistente, poderia ajustar as suas declarações aquilo que já foi dito pela assistente, perdendo-se assim a espontaneidade e a autenticidade das declarações já prestadas.
Por conseguinte, entendo que tendo dado início à audiência de julgamento, sou competente para prosseguir os ulteriores termos do processo, daí que tenha proferido despacho a designar julgamento, caso contrário, ter-me-ia desde logo declarado incompetente para despachar e presidir à audiência de julgamento.
Deste modo, mantém-se a data designada para continuação da audiência de julgamento.
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Anadia, 2018-11-29»
2.2.2- Circunstâncias extraídas dos autos.
Por despacho de 28 de Novembro de 2014 foi recebida a acusação deduzida e designado o dia 06 de Fevereiro de 2015 para o início de julgamento (fls. 4 e 5 do presente apenso).
Por despacho proferido em 30.01.2015 (fls. 19 e 20) foi, nomeadamente, determinada a realização da nova perícia requerida pelo arguido e, face às diligências de prova supervenientes admitidas, dadas sem efeito as datas previamente designadas para a realização de julgamento, tendo, então, sido designada a data de 25 de Maio 2015 para início do julgamento.
Em 25 de Maio de 2015, conforme da ata consta (fls. 27 e 28), quando eram 9 horas e 30 mn, pelo Mmo. Juiz de Direito (Dr. B…) foi declarada aberta a audiência de discussão e julgamento, após o que o arguido requereu o adiamento da audiência, tendo sido proferido o seguinte despacho pelo Mmo. Juiz:
"Tendo em conta o ora requerido pelo Ilustre mandatário do arguido, atenta a eventual demora da prestação dos esclarecimentos por parte dos peritos médicos, bem como da eventual realização de uma segunda perícia e que tal facto poderá levantar obstáculos quanto à continuidade da audiência de julgamento e a eventual perda de prova, em face do disposto no artigo 328º, n.º 6 do C.P.P., e ainda o respeito pelo princípio da aquisição de toda a prova antes da audiência de julgamento de forma a assegurar a todos os sujeitos processuais os respectivos direitos, dá-se sem efeito as duas datas designadas para realização de audiência de julgamento a qual será oportunamente designada.
Em relação às testemunhas faltosas, e uma vez que o adiamento do julgamento não é por facto imputável às mesmas, ficam as mesmas dispensadas de justificarem a respectiva falta não sendo condenadas em multa.
Notifique."
Consta ainda da ata que logo todos os presentes foram notificados, tendo a audiência sido declarada encerrada quando eram 10 horas e 50 minutos.de seguida,
Em 26 de setembro de 2018, o mesmo Mmo. Juiz proferiu despacho (fls. 45) designando o dia 09 de novembro de 2018 para a realização da audiência de julgamento.
No movimento judicial ordinário de 2018, Diário da República, 2ª Série, n.º 168, de 31 de agosto de 2018, o Mmo. Juiz de Direito, B… foi colocado por destacamento no TJ Comarca Beja > Juízo de competência genérica de Odemira > Vaga de Auxiliar de substituição de titular, pelo que deixou de ser Juiz na Instância Local de Amarante.
Não obstante ter sido colocado em diferente Comarca no movimento judicial ordinário de 2018, o Mmo. Juiz B… declarou aberta a audiência de discussão e julgamento no dia 09 de novembro de 2018, tendo iniciado a produção de prova, com tomada de declarações ao arguido, assistente e procedido a inspeção ao local, após o que determinou data para a continuação da audiência.
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2.3.- APRECIAÇÃO DO RECURSO.
Entende o Ministério Público que com a intervenção no julgamento do processo dos presentes autos de Juiz que já não era Magistrado na Comarca e afeto à Instância Local Criminal onde tem lugar o julgamento ocorreu uma clara preterição do princípio do Juiz natural, o que configura uma nulidade insanável nos termos do art.º 119º, nº1, al a), do Código de Processo Penal por manifesta violação das regras legais relativas ao modo de determinar o Juiz do Tribunal competente.
Vejamos.
Comecemos pelo princípio do Juiz natural.
Dispõe o artigo 32º, n.º 9 da Constituição da República o seguinte: “Nenhuma causa pode ser subtraída ao tribunal cuja competência esteja fixada em lei anterior”.
Neste artigo consagra-se a garantia Constitucional do «Juiz natural» ou «Juiz legal», corolário do princípio da legalidade em matéria penal, proibindo-se a criação post factum de um juiz para uma determinada causa, ou a possibilidade de se determinar de forma arbitrária ou discricionária o juiz competente[1].
Impõe este princípio que a definição do juiz competente resulte da lei, abrangendo não só as regras legais propriamente ditas com relevo para a determinação a competência, como também eventuais regulamentos, regimentos, etc., emanados pelo próprio sistema judiciário de que a mesma esteja dependente[2].
Mas não se exige que a competência seja definida pela lei em vigor à data do facto, pois a lei pode ser alterada sem que se fira o princípio. O que importa é que se impeça que as regras gerais de competência sejam desvirtuadas por intervenções arbitrárias ad hoc que desviem o processo do juiz a quem deveria ser distribuído[3].
E é por isso, para obviar a possíveis manipulações, que o princípio do juiz natural ou legal tem igualmente reflexos na designação dos titulares dos respetivos tribunais e na repartição funcional da sua atividade, o que contribui também para garantir a independência e imparcialidade dos juízes[4].
Assim, o juiz natural é o titular do processo, o qual sendo transferido, promovido ou aposentado deixa de o ser, perdendo a titularidade, não podendo por isso ter mais intervenção no processo, sob pena de violação do dito princípio.
Face aos inconvenientes e prejuízo para o funcionamento do sistema de justiça decorrentes da sucessão de juízes na titularidade dos processos, impôs-se a adoção de um princípio complementar aplicável às situações de continuação de julgamento.
Este complemento do princípio do Juiz natural é o princípio da plenitude da assistência dos juízes, consagrado no artigo 328º-A do Código Processo Penal, já aplicável no processo penal anteriormente à Lei n.º 27/2015, de 14.04, quer através do artigo 654.º, n.º 1, do Código Processo Civil[5] “ex vi” art. 4.º, do Código Processo Penal, quer por força do disposto do artigo 70º do Estatuto dos Magistrados Judiciais[6].
Nos termos do n.º 5 do artigo 328º-A do Código Processo Penal e ressalvadas as exceções nele enunciadas e outras decorrentes da lei, designadamente do regime das escusas, recusas e impedimentos, o juiz que for transferido, promovido ou aposentado conclui o julgamento.
Ou seja, o juiz que inicia o julgamento, em regra, também o conclui[7].
Este princípio, além de visar a oralidade e imediação do juiz com a totalidade da prova, a conservação da prova produzida, a eficácia do sistema e a celeridade processual, também procura impedir que, injustificadamente, ocorra uma modificação orgânica ou funcional com incidência num momento crucial já iniciado e ainda não terminado do processo penal: a audiência de discussão e julgamento.
Pressuposto da sua aplicação, claro está, é que o julgamento, ou melhor dizendo, a audiência de discussão e julgamento se tenha iniciado, pois só assim se justifica que um juiz, após cessação de funções num determinado Tribunal, aí continue a administrar a justiça.
Mas ainda que se tenha iniciado a audiência de julgamento, cabe referir que o princípio da plenitude da assistência dos juízes não é absoluto, podendo ser preferível, dependendo das circunstâncias do caso concreto, a intervenção do atual juiz titular e a repetição dos atos já praticados[8].
Desta relatividade do princípio dá conta o n.º 5 do artigo 328º-A do CPP, quando refere que o juiz que for transferido, promovido ou aposentado conclui o julgamento, exceto se a aposentação tiver por fundamento a incapacidade física, moral ou profissional para o exercício do cargo, ou se em qualquer dos casos as circunstâncias aconselharem a substituição do juiz transferido, promovido ou aposentado, o que é decidido, em despacho fundamentado, pelo juiz que deva presidir à continuação da audiência.
É certo que esta norma foi pensada tendo em vista, em primeiro lugar, o Tribunal Coletivo, mas cremos que tem aplicação, depois de devidamente interpretada, também para o Tribunal Singular.
Descendo ao caso concreto, a primeira questão a averiguar é a de se saber se a audiência de discussão e julgamento do dia 25.05.2015 teve realmente início.
Formalmente teve início, pois foi declarada aberta a audiência, conforme da ata consta.
Mas também é certo que foi de imediato adiada, sem que tivesse sido produzido qualquer prova.
E foi formalmente encerrada, conforme da ata consta no mesmo dia 25.05.2015 e nova e formalmente declarada aberta no dia 09.11.2018, com início da produção de prova.
Mas materialmente, nos termos e para os fins prosseguidos pelo princípio da plenitude da assistência do juiz, em especial para a defesa da oralidade e imediação do juiz com a totalidade da prova, da conservação da prova produzida, da eficácia do sistema e da celeridade processual, não nos parece que a mesma se deva ter como iniciada.
Com efeito, não vemos qual a justificação para manter excecionalmente em exercício de funções, num determinado processo duma comarca, um juiz que nesta cessou as suas funções, sem que tenha produzido qualquer diligência de prova na audiência de discussão e julgamento desse processo, a qual se limitou a declarar aberta, adiar sine die e encerrar.
Materialmente, nos termos e para os efeitos do princípio da plenitude da assistência dos juízes, o julgamento não se iniciou no dia 25.05.2015, mas apenas no dia 09.11.2018, altura em que o juiz titular do processo, por ser o juiz colocado na comarca em causa, era diverso daquele do dia 25.05.2015 que tinha cessado funções nessa comarca por força do movimento judicial de 2018.
Mas assim sendo, tendo o juiz da abertura formal da audiência em 25.05.2015 sido transferido, perdeu a titularidade do processo e, não estando a coberto do princípio da plenitude da assistência do juiz, não podia por isso ter declarado aberta de novo a audiência no dia 09.11.2018 e iniciado a produção de prova.
Ao fazê-lo verificou-se a violação do princípio do Juiz natural.
A composição do Tribunal Singular nos presentes autos na audiência de discussão e julgamento do dia 09.11.2018 foi feita em violação das regras legais que determinavam que o Juiz que o deveria integrar seria aquele que se encontrava na referida data em exercício de funções na Comarca, por nela ter sido colocado no movimento judicial de 2018, e não o Juiz que três anos antes havia declarado aberta a audiência de julgamento e proferido de imediato despacho de adiamento sine die, o qual havia entretanto sido movimentado para outro Tribunal, tendo cessado de exercer funções na comarca onde corre os seus termos o presente processo.
Ora, como nos termos do artigo 119.º, alínea a) do Código de Processo Penal constitui nulidade insanável, que deve ser oficiosamente declarada em qualquer fase do procedimento, a violação das regras legais relativas ao modo de determinar a composição do Tribunal, temos de concluir que, face à intervenção na audiência de julgamento de Juiz que à data do efetivo início da mesma já não exercia funções na comarca, foi cometida tal nulidade.
Resumindo, o Juiz que declarou aberta a audiência de julgamento e profere de imediato despacho de adiamento sine die não pode, depois de ter sido movimentado para outro Tribunal, sob pena de violação do princípio do Juiz natural e das regras legais relativas ao modo de determinar a composição do Tribunal, vir declarar de novo aberta a audiência e presidir ao julgamento, pois incorrerá na nulidade insanável do artigo 119º, n.º 1 al. a) do Código de Processo Penal.
Tal nulidade determina a invalidade do julgamento que se encontra a ser realizado nos presentes autos pelo Mmo. Juiz em causa, devendo ser revogado o despacho recorrido, bem como anulado o julgamento em curso nos presentes autos e ser designada nova data para o começo da audiência de julgamento, desta vez com a composição do Tribunal integrada nos termos das respetivas normas legais.
Pelo exposto, será de considerar procedente o recurso.
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3 - DECISÃO.
Pelo exposto, acordam os juízes desta secção criminal do Tribunal da Relação do Porto em julgar procedente o recurso e, em consequência, revogam o despacho recorrido e declaram nulos, por violação do princípio do Juiz natural e das regras referidas na alínea a) do artigo 119.º do Código de Processo Penal, o julgamento em curso nos presentes autos e os atos dele dependentes, bem como determinam seja designada nova data para o começo da audiência de julgamento, desta vez com a composição do Tribunal integrada nos termos das respetivas normas legais.
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Sem custas.
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Notifique.
(Elaborado e revisto pelo relator – art. 94º n.º 2, do CPP)
Porto, 11 de Abril de 2019
William Themudo Gilman
António Luís Carvalhão
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[1] JORGE DE FIGUEIREDO DIAS/NUNO BRANDÃO, Sujeitos Processuais Penais: O Tribunal - Texto de apoio ao estudo da unidade curricular de Direito e Processo Penal do Mestrado Forense da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra (2015/2016), Coimbra 2015, pág. 32. Cfr. ainda Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Anotada, vol. I, pág. 525.
[2] JORGE DE FIGUEIREDO DIAS/NUNO BRANDÃO, ob. cit., pág. 33.
[3] JORGE DE FIGUEIREDO DIAS/NUNO BRANDÃO, ob. cit., pág. 34-35.
[4] Cfr. neste sentido o Ac. do Tribunal da Relação do Porto de 06-01-2010 (Rel. JOAQUIM GOMES),in dgsi.pt.
[5] Cfr. o artigo 605º, n.º 3 do atual CPC: «O juiz que for transferido, promovido ou aposentado conclui o julgamento, exceto se a aposentação tiver por fundamento a incapacidade física, moral ou profissional para o exercício do cargo ou se for preferível a repetição dos atos já praticados em julgamento.»
[6] O artigo 70º da Lei n.º 21/85, de 30 de Julho, dispõe: «1- Os magistrados judiciais cessam funções: a) No dia em que completem a idade que a lei prevê para a aposentação de funcionários do Estado; b) No dia em que for publicado o despacho da sua desligação de serviço; c) No dia imediato àquele em que chegue à comarca ou lugar onde servem o Diário da República com a publicação da nova situação. 2 - No caso previsto na alínea c) do número anterior, os magistrados que tenham iniciado qualquer julgamento prosseguem os seus termos até final, salvo se a mudança de situação resultar de ação disciplinar.»
[7] Cfr. neste sentido, relativamente ao processo civil, o Ac. do Tribunal da Relação de Guimarães de 19-05-2016 (Rel. JORGE SEABRA), in dgsi,pt.
[8] Cfr. neste sentido, relativamente ao processo civil, o Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 31-05-2012 (Rel. JOÃO TRINDADE), in dgsi,pt.