Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | CARLOS GIL | ||
Descritores: | NULIDADE POR FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO NULIDADE PARCIAL DA SENTENÇA | ||
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Nº do Documento: | RP20250710228/21.0T8MTS-B.P1 | ||
Data do Acordão: | 07/10/2025 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | CONFIRMADA | ||
Indicações Eventuais: | 5ª SECÇÃO | ||
Área Temática: | . | ||
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Sumário: | I - Tradicionalmente, invocando-se os ensinamentos do Professor Alberto dos Reis, é recorrente a afirmação de que a nulidade da sentença por falta de fundamentação apenas se verifica quando ocorre falta absoluta de especificação dos fundamentos de facto ou dos fundamentos de direito. II - No entanto, no atual quadro constitucional (artigo 205º, nº 1, da Constituição da República Portuguesa), em que é imposto um dever geral de fundamentação das decisões judiciais, ainda que a densificar em concretas previsões legislativas, de forma a que os seus destinatários as possam apreciar e analisar criticamente, designadamente mediante a interposição de recurso, nos casos em que tal for admissível, parece que também a fundamentação de facto ou de direito insuficiente, em termos tais que não permitam ao destinatário da decisão judicial a perceção das razões de facto e de direito da decisão judicial, deve ser equiparada à falta absoluta de especificação dos fundamentos de facto e de direito e, consequentemente, determinar a nulidade do ato decisório. III - A nulidade parcial da sentença recorrida, à semelhança das restantes nulidades, é em regra suprível devendo a segunda instância substituir-se à primeira instância (artigo 665º nº 1 do Código de Processo Civil) e, neste caso concreto, desde que esta instância tenha ao seu dispor todos os elementos que o tribunal recorrido teve (artigo 662º, nº 2, alínea c), do Código de Processo Civil, por identidade de razão). | ||
Reclamações: | |||
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Decisão Texto Integral: | Processo: 228/21.0T8MTS-B.P1
Sumário do acórdão proferido no processo nº 228/21.0T8MTS-B.P1 elaborado pelo relator nos termos do disposto no artigo 663º, nº 7, do Código de Processo Civil: ……………………………… ……………………………… ……………………………… *** * *** Acordam os juízes subscritores deste acórdão, da quinta secção, cível, do Tribunal da Relação do Porto:
1. Relatório Em 01 de abril de 2023, por apenso ao processo nº 228/21.0T8MTS, pendente no Juízo de Família e Menores da Maia, Juiz 1, Comarca do Porto, AA veio requerer contra BB a alteração das prestações alimentares devidas aos dois filhos de ambos, respetivamente, CC e DD, ambos nascidos em ../../2010, prestações inicialmente fixadas no montante mensal de € 500,00 para cada um dos menores e alteradas em 2022 para o montante mensal de € 325,00 para cada um, para o montante mensal não superior a € 100,00 para cada um deles. Fundamenta a pretensão de redução das prestações alimentares devidas a seus filhos na sua atual situação de desemprego, auferindo uma média mensal de € 760,00 e nas despesas mensais que suporta, circunstâncias que o impossibilitam de cumprir as prestações alimentares nos montantes em que se acham atualmente fixadas. Citada, a requerida comprovou ter requerido pedido de apoio judiciário na modalidade de nomeação e pagamento de compensação a patrono e de dispensa de pagamento de taxa de justiça e demais encargos com o processo. Em 29 de janeiro de 2024, os Serviços da Segurança Social informaram ter sido concedido à requerida apoio judiciário na modalidade de pagamento faseado de taxa de justiça e demais encargos com o processo. Em 18 de março de 2024 a requerida deduziu oposição ao pedido do requerente de redução da prestação alimentar aos dois filhos de ambos. Realizou-se conferência com a presença das partes, não tendo sido possível a conciliação dos progenitores e sendo estes notificados para, querendo, em quinze dias oferecer alegações e provas. Em 06 de junho de 2024, o requerente ofereceu alegações pugnando por que a prestação alimentar a seus dois filhos seja reduzida para o montante de € 350,00 para ambos. Em 06 de junho de 2024, a requerida ofereceu alegações pugnando pela improcedência da pretensão de redução das prestações alimentares formulada pelo requerente. Em 18 de setembro de 2024 realizou-se audiência final numa sessão e em 01 de outubro de 2024 fixou-se o valor da causa no montante de € 30000,01 e proferiu-se sentença[1] que julgou totalmente improcedente a pretensão de redução da prestação alimentar devida por AA a CC e DD. Em 21 de outubro de 2024, inconformado com a sentença AA interpôs recurso de apelação, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões[2]: “A) Foi proferida Sentença, no âmbito de ação de alteração de responsabilidade parentais, que julgou improcedente a ação e em consequência decidiu manter inalterado o montante da prestação de alimentos, com a qual o Recorrente não se conforma e, nesse conspeto, vem dela interpor recurso, nos termos e com os seguintes fundamentos; B) Entende, assim, o Recorrente que a Sentença proferida pelo Tribunal a quo padece de falta de fundamentação, atenta a ausência de descrição dos factos não provados, o que determina a nulidade da Sentença; C) Dispõe o artigo 607º n.º 4 do CPC que “Na fundamentação da sentença, o juiz declara quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção (…)”, pelo que deve o Mmo. Juiz indicar no teor da Sentença os factos que julga provados e os factos que julga não provados; D) É neste sentido que vai o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra[3] o qual explana o seguinte: “IDecorre do disposto nos artºs 205, nº1, da Constituição, 154 e 607, nºs 3 e 4 do C.P.C., a imposição de um dever ao Magistrado Judicial de especificar os fundamentos de facto e de direito das decisões que profere, de forma a assegurar a todos os cidadãos um processo equitativo e justo (cfr. artº 20 da C.R.P.). II- Em cumprimento deste dever de assegurar a todos os cidadãos um processo equitativo e justo, exige-se não só a indicação dos factos provados, como dos não provados e ainda, a indicação do processo lógico – racional que conduziu à formação da convicção do julgador, relativamente aos factos que considerou provados ou não provados, de acordo com o ónus de prova que incumbia a cada uma das partes (cfr. artº 607º, nº 4, do CPC.)”; E) Ora, no caso da sentença em crise não estão indicados os factos não provados, o que conduz à nulidade da sentença, porquanto não estão especificados os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão, tendo em consideração que nem sequer existem meras remissões, porquanto os factos não provados encontram-se totalmente omissos; F) Atendendo assim ao exposto, resulta claro que o teor da Sentença a quo é deficiente, em clara violação do normativo legal e do direito que assiste ao Recorrente, pelo que deve a mesma ser considerada nula pelos fundamentos supra expostos; G) Não obstante, entendeu o Tribunal a quo que não existe alteração sensível da capacidade económica do Recorrente e que a proceder a pretensão do Recorrente, na redução do montante de cada uma das pensões para € 175,00 (cento e setenta e cinco euros), os menores veriam a prestação de alimentos reduzida, num espaço de cerca de dois anos e meio, a 35% do valor fixado em 2019, o que parece pouco razoável (no entendimento do Mmo. Juiz a quo), ademais porque desde 2022 se assiste a um considerável aumento do custo de vida e ainda pelo facto de a prestação de alimentos pressupor estabilidade e previsibilidade, Decisão com a qual não pode o Recorrente concordar; H) Na sentença a quo, foram considerados provados diversos factos de entre os quais que “10. A partir de então, começou a trabalhar como empresário em nome individual, auferindo cerca de 1.280€ por mês”, o qual está em clara contradição com o Documento 2 junto com as Alegações apresentadas pelo Recorrente, em 06.06.2024 (Refª 49135737) I) Porquanto se extrai do Documento junto, o qual corresponde ao Modelo 3 de IRS, que os rendimentos auferidos pelo Recorrente, no ano de 2023, em média, a € 506,00 (quinhentos e seis euros) mensais, se atentarmos na declaração anual de rendimentos no valor global de € 6.074,14 (seis mil, setenta e quatro euros e catorze cêntimos); J) Não podendo ser considerado como provado o teor do indicado em 10), porquanto o que o Recorrente realmente auferia era cerca de € 506,00 (quinhentos e seis euros mensais), existindo uma clara contradição entre o facto elencado e a prova documental junta aos autos; K) Pelo que, se requer a V. Exas. que se dignem a revogar a decisão em crise e a substituir por outra, onde o facto supra referido conste dos factos dados como não provados e, por conseguinte, se verifique que, de facto, o Recorrente não tem capacidade financeira para manter o pagamento de ambas as pensões de alimentos e inerentes despesas de educação e saúde, nos moldes em que vinha a fazê-lo; L) Ademais, não obstante o facto de o Mmo. Juiz a quo referir que a convicção do Tribunal assentou no conjunto da prova produzida em audiência e nos documentos juntos aos pressentes autos e ao processo principal, parece-nos que tal não corresponde à verdade, pois a prova documental aos autos não foi tida em consideração e relevada como deveria, caso contrário a Decisão propugnada teria sido diversa. Em suma, seria totalmente procedente; M) Já que o Recorrente apresentou a juízo os fundamentos e a prova documental que crê serem suficientes para que se evidencie ser necessária a alteração dos montantes das pensões; N) Para tanto, em sede das Alegações suprarreferidas, procedeu à junção do Documento que comprovava os rendimentos obtidos no ano de 2023, bem como juntou uma comunicação da Requerida com a indicação das despesas do mês de janeiro de 2024 que o Recorrente teria a liquidar-lhe – o montante de € 438,73 (quatrocentos e trinta e oito euros e setenta e três cêntimos) – Cfr. Documento 1 que foi junto com as Alegações apresentadas no dia 06.06.2024 (Refª 49135737); O) Ou seja, apenas no mês de janeiro de 2024, o Recorrente teria de liquidar a título de pensões e comparticipação nas despesas escolares e médicas, a quantia global de € 1.088,73 (mil, oitenta e oito euros e setenta e três cêntimos), um montante muito acima daquele que é o rendimento mensal que aufere, sem incluir as suas próprias despesas; P) Veja-se o seguinte sumário do Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Guimarães: “I- A correspondente medida dos alimentos devidos ao menor, deve ser adequada aos meios de quem houver de prestá-los, devendo o tribunal valorar, de forma global e abrangente, a sua condição social, a sua capacidade laboral, bem como todo o acervo de bens patrimoniais de que seja detentor, nunca deixando de ter em conta o superior interesse do menor”[4]; Q) Se o Recorrente continuar a pagar os montantes a título de pensões de alimentos, no montante global de € 650,00 (seiscentos e cinquenta euros) e a comparticipação das despesas no valor de cerca de € 400,00 (quatrocentos euros) mensais, o mesmo vai privar-se dos meios necessários à subsistência, pelo que não pode continuar a prover o pagamento das pensões de alimentos, nos moldes em que tem vindo a fazer; R) Sendo certo que, as pensões de alimentos em Portugal, na grande maioria dos casos, variam entre os € 125,00 (cento e vinte e cinco euros) e os € 200,00 (duzentos euros) – a que acresce a comparticipação em despesas médicas e de educação – estamos aqui perante pensões de alimentos que já enquadram uma situação excecional e que, de facto, o Recorrente pôde em determinado momento da sua vida pagar, mas que, no momento atual, não pode, sendo certo que estamos a falar de dois menores; S) Tudo posto, torna-se evidente que não está acautelado aqui o equilíbrio das prestações com os rendimentos auferidos pelo Recorrente; T) Nesse decurso entendeu o Recorrente ser necessário o pedido de alteração para que, face a uma prestação de alimentos mais baixa e de acordo com aquilo que vai sendo entendimento dos Tribunais - fixada entre os € 100,00 (cem euros) e os € 175,00 (cento e setenta e cinco euros) – pudesse dar integral cumprimento ao pagamento da comparticipação nas despesas médicas e escolares; U) Conforme já se aludiu anteriormente, dispõe o artigo 615º n.º 1 alínea b) do Código de Processo Civil que “é nula a sentença quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão”, sendo manifesto que no que concerne aos factos não provados, a Sentença é totalmente omissa, violando, assim, não só a norma atrás mencionada, como também o artigo 607º n.º 4 do CPC, devendo, assim, a sentença ser declarada nula; V) Caso assim V. Exas. não entendam e atendendo a tudo quanto se disse, nomeadamente no que respeita à contradição existente entre os factos provados e a prova documental, bem como ao demais teor das Alegações agora apresentadas, deve a sentença a quo ser revogada por outra que julgue a ação totalmente procedente e fixe a pensão de alimentos de cada menor num valor compreendido entre os € 100,00 (cem euros) e os € 175,00 (cento e setenta e cinco euros).” Em 07 de novembro de 2024, a Digna Magistrada do Ministério Público respondeu ao recurso pugnando pela sua total improcedência. Em 08 de novembro de 2024, BB respondeu ao recurso pugnando pela sua total improcedência. Em 21 de novembro de 2024, o tribunal recorrido admitiu o recurso a subir nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo e pronunciou-se sobre as nulidades da sentença arguidas pelo recorrente nos seguintes termos: “O recorrente começa por arguir a nulidade da decisão recorrida. Sustenta que não estão especificados os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão, invocando o disposto no artigo 615º n.º 1, alíneas b), c) e d) do CPC. Cumpre proferir o despacho a que alude o art.º 617º, n.º 1 do mesmo diploma. Salvo melhor opinião, não se verifica a apontada nulidade. O art.º 615º, n.º 1 do CPC dispõe, no que agora interessa, que “É nula a sentença quando: (…) b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão; c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível; d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento; (...)”. O recorrente alega que o Tribunal omitiu a enunciação dos factos não provados. Não os enunciou, de facto, mas disse que “Com interesse para a decisão da causa, não se provaram outros factos, em contradição com estes [aqueles que deu como provados] ou para além deles.”. Ou seja, o Tribunal tomou posição sobre toda a matéria relevante para a decisão da causa, reputando de desnecessário descrever nos factos não provados aqueles que, ou eram irrelevantes para a decisão, ou estavam em manifesta contradição com os factos provados. Numa linguagem coloquial, se o Tribunal dá como provado que uma parede é branca, não há necessidade afirmar que não se provou que a mesma parede é preta [[5]]. Em resumo, cremos que na sentença estão amplamente especificados os fundamentos da decisão – de facto e de direito –; não existe qualquer oposição entre os fundamentos e a decisão nem a decisão é ininteligível; nem o Tribunal deixou de tomar posição sobre as questões submetidas à sua apreciação. Termos que, salvo melhor opinião, improcede a arguição de nulidade.” Recebidos os autos neste tribunal e colhidos os vistos dos restantes membros do coletivo, cumpre agora apreciar e decidir. 2. Questões a decidir tendo em conta o objeto do recurso delimitado pelo recorrente nas conclusões das suas alegações (artigos 635º, nºs 3 e 4 e 639º, nºs 1 e 3, ambos do Código de Processo Civil), por ordem lógica e sem prejuízo da apreciação de questões de conhecimento oficioso, observado que seja, quando necessário, o disposto no artigo 3º, nº 3, do Código de Processo Civil 2.1 Da nulidade da sentença recorrida (alíneas b), c) e d) do nº 1 do artigo 615º do Código de Processo Civil); 2.2 Da impugnação do ponto 10 dos factos provados; 2.3 Dos reflexos da eventual procedência da impugnação da decisão da matéria de facto na pretensão do recorrente de alteração das prestações alimentares a seus dois filhos. 3. Fundamentos 3.1 Da nulidade da sentença recorrida por falta de descrição dos factos não provados (alíneas b), c) e d) do nº 1 do artigo 615º do Código de Processo Civil) O recorrente suscita a nulidade da decisão recorrida por falta de fundamentação de facto em virtude de não ter descrito os factos não provados, citando em abono da sua posição o acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 10 de outubro de 2023, proferido no processo nº 525/21.4T8LRA.C1. No corpo da alegações o recorrente imputa também à sentença recorrida as nulidades previstas nas alíneas c) e d) do nº 1 do artigo 615º do Código de Processo Civil, sem curar de especificar as concretas razões que sustentam estas imputações, omitindo em sede de conclusões esta imputação, apenas o referindo em sede de pedido do recurso (vejam-se o último parágrafo da página do corpo das alegações que precede a página das conclusões, as conclusões das alegações de recurso e o pedido final). Neste circunstancialismo, apenas se conhecerá da nulidade decorrente da falta de descrição dos factos não provados, prevista na alínea b) do nº 1 do artigo 615º do Código de Processo Civil, pois que relativamente às nulidades decorrentes do preenchimento das previsões das alínea c) e d) do nº 1 do artigo 615º do Código de Processo Civil, o recorrente não observou o ónus de substanciar estas arguições, já que se trata de patologias que não são de conhecimento oficioso (vejam-se os nºs 2 e 4, do artigo 615º do Código de Processo Civil) e, além disso, não cuidou de integrar estas mesmas imputações em sede de conclusões, assim obstando a que possam ser conhecidas neste recurso (artigos 635º, nº 4 e 639º, nº 1, do Código de Processo Civil). Cumpre apreciar e decidir. De acordo com o previsto no artigo 615º, nº 1, alínea b) do Código de Processo Civil, é nula a sentença que não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão. Tradicionalmente, invocando-se os ensinamentos do Professor Alberto dos Reis[6], é recorrente a afirmação de que o vício em análise apenas se verifica quando ocorre falta absoluta de especificação dos fundamentos de facto ou dos fundamentos de direito. E quando é que ocorre a falta absoluta de especificação dos fundamentos de facto? Só se verifica quando o julgador omite a especificação dos factos provados e não provados ou também se poderá verificar se apenas ocorrer omissão de especificação ou dos factos provados ou dos não provados ou, ainda, quando a sentença for omissa quanto às razões de direito que suportam a decisão tomada a final? A nosso ver, no atual quadro constitucional (artigo 205º, nº 1, da Constituição da República Portuguesa), em que é imposto um dever geral de fundamentação das decisões judiciais, ainda que a densificar em concretas previsões legislativas, de forma a que os seus destinatários as possam apreciar e analisar criticamente, designadamente mediante a interposição de recurso, nos casos em que tal for admissível, parece que também a fundamentação de facto ou de direito insuficiente, em termos tais que não permitam ao destinatário da decisão judicial a perceção das razões de facto e de direito da decisão judicial, deve ser equiparada à falta absoluta de especificação dos fundamentos de facto e de direito e, consequentemente, determinar a nulidade do ato decisório[7]. Na prática judiciária é muito frequente que a enunciação dos factos não provados seja feita com fórmulas genéricas do estilo “julgam-se não provados todos os restantes factos não julgados provados” ou “julgam-se não provados todos os restantes factos em oposição com os julgados provados”. No caso destes autos, o Sr. Juiz a quo usou a seguinte “fórmula”: - “Com interesse para a decisão da causa, não se provaram outros factos, em contradição com estes ou para além deles.” Anote-se que esta formulação genérica nem sequer é exaustiva, pois não contempla outros factos que não estejam em contradição com os factos dados como provados ou que fiquem aquém deles. Serão estas referências genéricas formas corretas de enunciação dos factos não provados? Antes de mais, um pouco de história para enquadramento do problema. No Código de Processo Civil aprovado pelo decreto-lei nº 44129, de 28 de Dezembro de 1961, mesmo na versão do decreto-lei nº 39/95, de 15 de fevereiro, os factos incluídos no questionário eram julgados provados ou não provados, sendo apenas motivada a resposta aos factos provados (artigo 653º, nº 2, do Código de Processo Civil, na aludida versão), motivação que na prática dominante se bastava com a simples indicação dos meios de prova. De todo o modo, nunca os factos não provados eram incluídos na sentença[8]. No que respeita à motivação, a situação alterou-se com a nova redação do artigo 653º, do Código de Processo Civil dada pelo decreto-lei nº 329-A/95, de 12 de dezembro que, com certo mimetismo com o correspondente preceito do Código de Processo Penal[9], passou a dispor que a “matéria de facto é decidida por meio de acórdão ou despacho, se o julgamento incumbir a juiz singular; a decisão proferida declarará quais os factos que o tribunal julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas e especificando os fundamentos que foram decisivos para a convicção do julgador.” Esta redação manteve-se vigente até à entrada em vigor do atual Código de Processo Civil aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26 de junho. Com a entrada em vigor em 01 de setembro de 2013 do Código de Processo Civil na versão aprovada pela Lei nº 41/2013, de 26 de junho, passou-se a prever no nº 3, do artigo 607º do Código de Processo Civil que depois da identificação das partes, bem como do objeto do litígio e da enunciação da questões decidendas, se seguem os “fundamentos, devendo o juiz discriminar os factos que considera provados e indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes, concluindo pela decisão final.” De seguida, na primeira parte do nº 4 do mesmo artigo prevê-se que na “fundamentação da sentença, o juiz declara quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tirados dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção”. Não obstante relativamente aos factos não provados não exista uma previsão similar à dos factos provados, no sentido de os mesmos deverem ser discriminados (nº 3 do artigo 607º do Código de Processo Civil), também não existe qualquer normativo que preveja que os factos não provados sejam identificados por exclusão de partes, antes requer uma declaração específica sobre qual a factualidade julgada não provada[10]. Na nossa perspetiva, aquelas enunciações acima transcritas não contêm um juízo concreto e individualizado sobre a factualidade não provada[11], devolvendo ao destinatário da sentença a tarefa de determinar precisamente qual é afinal a matéria de facto não provada, nem procedem à destrinça da matéria não provada, da matéria impertinente e conclusiva e da matéria de direito contida também nos articulados (segunda parte da alínea d), do nº 1, do artigo 552º, do Código de Processo Civil), não observando por isso o dever legal de declaração de qual é a matéria de facto não provada. O dever legal de declarar qual é a matéria de facto provada e não provada visa que o tribunal se debruce especificamente sobre os diversos pontos de facto relevantes para as variadas questões suscitadas pelas partes e à luz das diversas soluções plausíveis dessas mesmas questões, possibilitando deste modo que as partes saibam o que o tribunal julgou provado ou não provado, o que considerou integrar matéria de direito, matéria conclusiva ou matéria impertinente. Ora, as referidas formulações genéricas não dão qualquer garantia de um juízo individualizado, ponto por ponto, sobre a matéria que não mereceu resposta positiva e, por outro lado, também levam a motivações genéricas dessa convicção genérica negativa que dificultam, quando não inviabilizam, uma aferição crítica do juízo probatório do tribunal[12]. Finalmente, com tais formulações genéricas, são os destinatários de tais decisões que constroem eles próprios a factualidade não provada, não havendo qualquer garantia que essa construção corresponda à que o tribunal teve em vista, se é que chegou verdadeiramente a determinar de modo preciso a factualidade não provada. Por isso, a nosso ver, uma tal forma de indicação dos factos não provados não constitui uma verdadeira enunciação dessa matéria e integra a nulidade de sentença prevista na alínea b), do nº 1, do artigo 615º do Código de Processo Civil[13]. Além disso, essa forma de indicação dos factos não provados, por substancialmente ser uma não decisão, enferma de obscuridade, já que não tem um sentido inequivocamente determinável, pois que compete a cada destinatário, com os seus a priori e as suas conceções sobre o que é matéria de direito, conclusiva e impertinente concretizar qual é a final a factualidade não provada[14]. A nulidade parcial da sentença recorrida, à semelhança das restantes nulidades, é em regra suprível devendo a segunda instância substituir-se à primeira instância (artigo 665º nº 1 do Código de Processo Civil) e, neste caso concreto, desde que esta instância tenha ao seu dispor todos os elementos que o tribunal recorrido teve (artigo 662º, nº 2, alínea c), do Código de Processo Civil, por identidade de razão). Ao contrário do que se sustenta no acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 10 de outubro de 2023, proferido no processo nº 525/21.4T8LRA.C1[15], a regra da substituição prevista no artigo 665º, nº 1 do Código de Processo Civil não implica a violação do duplo grau de jurisdição em matéria de facto[16], pois que, como sugestivamente refere o Sr. Professor Teixeira de Sousa[17], “a garantia do duplo grau de jurisdição vale para cima, não para baixo”. Aliás, a questão da violação da garantia do duplo grau de jurisdição colocou-se numa fase processual em que o Tribunal da Relação não procedia a qualquer controlo da decisão da matéria de facto por não dispor dos instrumentos necessários para o efeito. Violadora do duplo grau de jurisdição em matéria de facto é a decisão do Tribunal da Relação que se abstém de conhecer de facto quando dispõe de todos os elementos necessários para tanto. Em conclusão, a sentença recorrida é parcialmente nula por falta de discriminação dos factos não provados (artigo 615º, nº 1, alínea b), do Código de Processo Civil), nulidade que será suprida por este Tribunal da Relação quando se conhecer da impugnação da decisão da matéria de facto requerida pelo recorrente. 3.2 Da impugnação do ponto 10 dos factos provados O recorrente pugna por que o ponto 10 dos factos provados seja julgado não provado, pois que está em contradição com o documento nº 2 que ofereceu com as suas alegações, em 06 de junho de 2024. O ponto de facto impugnado tem o seguinte teor: - A partir de então [ou seja, a partir do termo do recebimento do seu subsídio de desemprego em julho de 2023], começou a trabalhar como empresário em nome individual, auferindo cerca de € 1 280,00 por mês. O tribunal motivou a sua decisão da matéria de facto nos seguintes termos: “A convicção do Tribunal assentou no conjunto da prova produzida em audiência e nos documentos juntos aos presentes autos e ao processo principal. Concretamente, baseou-se nas declarações das partes, que se referiram à sua condição económica e às necessidades dos menores, estas no essencial inalteradas desde que regulado o exercício das responsabilidades parentais. Baseou-se ainda no depoimento da testemunha EE, irmã da requerida. Confirmou, no essencial, as declarações por esta prestadas, ainda que, compreensivelmente, sem o mesmo pormenor, revelando ainda desconhecer a realidade económica do requerente.” Posteriormente, depois de ter conhecido das nulidades da sentença arguidas pelo recorrente, tentando, além do mais, suprir a motivação genérica da decisão da matéria de facto, escreveu o seguinte: “Duas notas adicionais: A primeira para reconhecer a existência de um mero lapso de escrita. Na página 11 da decisão, quando se escreveu “Auferindo, agora, cerca de 1.380€ por mês (…)”, pretendia escrever-se “Auferindo, agora, cerca de 1.280€ por mês (…)”, em consonância com o ponto 10 dos factos provados. A segunda para, ainda a propósito do rendimento mensal do requerente, ante o teor das conclusões H), I) e J), dizer que surpreende – para não dizer que está no limiar da má fé – que o recorrente diga que não pode “(…) ser considerado como provado o teor do indicado em 10), porquanto o que o Recorrente realmente auferia era cerca de € 506,00 (quinhentos e seis euros mensais), existindo uma clara contradição entre o facto elencado e a prova documental junta aos autos” quando o Tribunal se valeu, para dar como demonstrado esse facto, das declarações do requerente (cfr. as declarações prestadas em audiência, no dia 18.09.2024, entre os minutos 6:15 e 8:45). Resumindo, o teor dos pontos 9 e 10 dos factos provado correspondem fielmente àquilo que em audiência foi dito pelo requerente, que, a ser verdadeiro o teor das conclusões I) e J), parece ter declarado em sede de IRS um vencimento inferior àquele que verdadeiramente auferiu.” Cumpre apreciar e decidir. O recorrente indica o ponto de facto impugnado, as provas que sustentam a sua pretensão e a decisão pretendida. Observa assim suficientemente os ónus que recaem sobre o impugnante da decisão da matéria de facto (artigo 640º nº 1 do Código de Processo Civil). Examinou-se o documento nº 2 oferecido pelo recorrente com as suas alegações em 06 de junho de 2024 e procedeu-se à audição da prova pessoal produzida na audiência final. O documento nº 2 é cópia do modelo 3 de IRS via internet apresentado pelo recorrente em 21 de maio de 2024, referente aos rendimentos de 2023, resultando dessa declaração que o declarante não tem dependentes nem afilhados civis, tendo declarado em sede de rendimento de prestações de serviços o montante global de € 6074,14. O ora recorrente declarou, na parte que importa à impugnação da decisão da matéria de facto, que de janeiro a julho de 2023 esteve desempregado, recebendo subsídio de desemprego no montante mensal de € 980,00 e, depois disso, recebeu um apoio para criação do seu próprio emprego, passando a trabalhar por conta própria, ganhando mensalmente € 1280,00, ainda que tal valor não seja sempre certo, podendo variar entre € 1200,00 e € 1260,00 por mês. Não foi instado a esclarecer o valor do apoio que recebeu para criação do seu próprio emprego e o destino que lhe foi dado. A recorrida e a irmã desta nada revelaram saber sobre a situação económica do recorrente. Neste contexto probatório, que dizer? Nas suas alegações, o ora recorrente determinou o seu rendimento mensal em 2023 dividindo o rendimento declarado nesse ano – € 6704,14 – por doze meses (€ 6704,14: 12 = € 506,178333…), obtendo desse modo o valor mensal de cerca de € 506,00 (veja-se o artigo 14 das alegações do recorrente). Porém, esta forma de cálculo dos rendimentos do recorrente padece de um erro de perspetiva, pois que, por um lado, não tem em consideração que tais rendimentos respeitam apenas aos cinco últimos meses do ano de 2023 (€ 6704,14: 5= € 1 340,828) e, por outro lado, omite os valores que recebeu a título de subsídio de desemprego nos primeiros sete meses do ano de 2023 [€ 980,00 x 7 = € 6860,00), tal como omite o apoio que o recorrente recebeu para criação do seu próprio emprego. Se adicionarmos os valores recebidos pelo recorrente a título de subsídio de desemprego nos primeiros sete meses de 2023 aos rendimentos que auferiu no exercício da sua atividade após julho de 2023, obtemos o valor global de € 13564,14 (€ 6860,00+ € 6704,14 = € 13564,14), que representa um rendimento mensal de € 1130,345 (€ 13564,14: 12 = € 1130,345), sem ter em conta o apoio que o recorrente recebeu para criação do seu emprego, cujo valor se desconhece, tal como se desconhece se e como foi despendido. Assim, tudo sopesado constata-se que a pretensão do recorrente de que se julgue provado que os seus rendimentos mensais são de apenas cerca de € 506,00 não tem apoio probatório e constitui um falseamento da realidade, como exuberantemente resulta dos cálculos que antes efetuámos e bem assim das espontâneas declarações do recorrente que os fixou no montante médio mensal de € 1280,00, valor que certamente corresponderá ao valor médio líquido auferido em cada mês. Pelo exposto, bem andou o tribunal recorrido em dar como provado a factualidade que consta do ponto 10 dos factos provados, improcedendo a impugnação requerida pelo recorrente. Apreciada a impugnação da decisão da matéria de facto é tempo de suprir a nulidade parcial da sentença recorrida decorrente da falta de especificação dos factos não provados. A matéria vertida nos artigos 1, 2, 3, 4, 5, 6 das alegações do requerido de 06 de junho de 2024 está contemplada nos pontos 1 a 5 dos factos provados. A matéria vertida no artigo 7 das referidas alegações é meramente conclusiva. A matéria vertida no artigo 8 das mesmas alegações diz respeito a um montante que alegadamente foi exigido ao recorrente a título de despesas no mês de janeiro de 2024, factualidade que não foi incluída na factualidade provada. No entanto, esta matéria é por si só inócua pois que para aferir das possibilidades de o recorrente cumprir a obrigação alimentar que sobre ele impende importava uma visão do montante dessas despesas ao longo de um período de vários meses, de preferência, ao longo de um ano e por isso, não se pronunciará este tribunal sobre esta matéria. Os artigos 9 e 10 das citadas alegações do recorrente são meramente conclusivos. O artigo 11 das referidas alegações do recorrente está consumido pelo ponto 7 dos factos provados. O artigo 12 das mesmas alegações do recorrente é meramente conclusivo. O artigo 13 das já citadas alegações do recorrente é meramente instrumental do facto que se segue. O artigo 14º das alegações do recorrente que temos vindo a citar deve julgar-se não provado atenta a análise crítica que se fez quando se apreciou a impugnação do ponto 10 dos factos provados. Deve assim julgar-se não provado que em 2023, numa média mensal, AA auferiu um valor de cerca de € 506,00. No que respeita ao artigo 15 das alegações do recorrente que temos vindo a ter em vista, não foi produzida prova da média mensal que o recorrente tem de pagar a título de metade do montante das despesas com atividades extracurriculares frequentadas pelos menores, passeios escolares e/ou visitas de estudo; material e livros escolares, despesas médicas e medicamentosas, na parte não comparticipada, bem como quanto à necessidade de próteses e ortóteses. De facto, como se referiu quando se apreciou o artigo 8 da mesma peça processual, para que este tribunal estivesse em condições de formular um juízo probatório seguro sobre a matéria vertida no citado artigo 15, era necessário que o recorrente tivesse oferecido prova de pelo menos ao longo de vários meses lhe terem sido exigidas essas comparticipações e os respetivos montantes. Por isso, neste contexto probatório, a matéria vertida neste artigo 15 deve julgar-se não provada nestes termos: - Em média, o que AA tem de pagar a título de pensão de alimentos aos seus filhos ascende a € 1 000,00 (entre pensão de alimentos e a quota-parte que lhe cabe nas despesas mensais dos filhos). Os artigos 16 a 19 da peça processual em análise são meramente conclusivos. O conteúdo do artigo 20 da citada peça processual está consumido pela factualidade vertida nos pontos 12 e 13 dos factos provados. O conteúdo do artigo 21 da peça processual a que nos temos vindo a referir está consumido pelo ponto 15 dos factos provados. Os artigos 22 a 25 e 27 a 32, 34 a 36 das alegações do recorrente têm natureza meramente conclusiva. Os artigos 26, 33, 37 a 39 incidem sobre matéria de direito. Pelo exposto, suprindo a omissão de o tribunal recorrido especificar os factos não provados, com a motivação que precede, deve integrar essa matéria a seguinte: - Em 2023, numa média mensal, AA auferiu um valor de cerca de € 506,00; - Em média, o que AA tem de pagar a título de pensão de alimentos aos seus filhos ascende a € 1 000,00 (entre pensão de alimentos e a quota-parte que lhe cabe nas despesas mensais dos filhos). 3.3 Fundamentos de facto exarados na sentença recorrida com o aditamento decorrente do suprimento da nulidade da sentença recorrida por falta de especificação dos factos não provados 3.3.1 Factos provados 3.3.1.1 CC e DD nasceram no dia ../../2010 e são filhos de requerente e requerida. 3.3.1.2 Por decisão proferida no dia 04.03.2019, no âmbito do processo de Divórcio por Mútuo Consentimento nº 2695/2018 da Conservatória do Registo Civil da Maia, foi regulado o exercício das responsabilidades parentais relativas aos menores. 3.3.1.3 Ficou determinado, para além do mais, que os menores ficariam à guarda e aos cuidados da progenitora. 3.3.1.4 Ficou ainda determinado que: “- a título de alimentos, acordam que assumirá o progenitor o pagamento da quantia mensal de €500 (…) por cada um dos menores, a realizar até ao dia 10 do mês a que respeitar (…) - obriga-se o progenitor no pagamento de metade dos seguintes encargos: - atividades extracurriculares frequentadas pelos menores (…); - passeios escolares e/ou visitas de estudo; material e livros escolares; - despesas médicas e medicamentosas, na parte não comparticipada, bem como quanto à necessidade de próteses e ortóteses; (…)”. 3.3.1.5 Por decisão proferida no processo principal em 10.02.2022, transitada em julgado, foi homologada a transação alcançada entre os progenitores, nos termos da qual: “1) A título de prestação de alimentos devidos aos menores, o progenitor pagará a quantia mensal de € 325,00, para cada menor a enviar à progenitora, até ao dia 10 de cada mês a que disser respeito, por depósito ou transferência bancária para IBAN que já conhece; 2) No mais, mantém-se o regime em vigor.”. 3.3.1.6 O requerente trabalhou em França durante cerca de 6 anos, tendo regressado a Portugal em dezembro de 2022. 3.3.1.7 Durante parte do período em que trabalhou em França, [d]e acordo com os documentos que juntou ao processo principal, com o requerimento inicial e com as alegações: - em março de 2020, auferiu € 697,77; - em maio de 2020, auferiu € 660,84; - em junho de 2020, auferiu € 1540,75; - em julho de 2020, auferiu € 1411,31; - em agosto de 2020, auferiu € 817,52; - em setembro de 2020, auferiu € 1160,69; - em outubro de 2020, auferiu € 1389,83; - em novembro de 2020, auferiu € 1389,83; - em agosto de 2021, auferiu € 2200,47; - em setembro de 2021, auferiu € 1300,13; - em outubro de 2021, auferiu € 1833,61; - em novembro de 2021, auferiu € 1489,63. 3.3.1.8 À data, de acordo com os documentos que apresentou com as alegações juntas ao processo principal, suportava, em França, € 618,00 de renda. 3.3.1.9 Regressado a Portugal, manteve-se na condição de desempregado entre janeiro e julho de 2023, altura em que beneficiou de subsídio de desemprego no montante de cerca € 980,00. 3.3.1.10 A partir de então, começou a trabalhar como empresário em nome individual, auferindo cerca de € 1 280,00 por mês. 3.3.1.11 Reside [em] casa própria. 3.3.1.12 Desde há cerca de 5 anos, suporta um encargo de cerca de € 250,00 por mês para amortização de um empréstimo contraído para aquisição de habitação, a que acrescem cerca de € 650,00 por mês para amortização de um outro empréstimo contraído para realização de obras de restauro da habitação. 3.3.1.13 Paga despesas com o consumo de eletricidade, no montante de cerca de € 70,00 por mês e despesas com o serviço de internet, telefone e televisão, no montante de € 20,00 a € 30,00 por mês. 3.3.1.14 Utiliza veículo que adquiriu em agosto de 2023 no âmbito da atividade profissional que exerce, suportando um encargo de cerca de € 220,00 para amortização do empréstimo contraído para aquisição da viatura. 3.3.1.15 Suporta ainda os montantes mensais correspondentes à alimentação, água, saúde e combustível. 3.3.1.16 Não tem cumprido integralmente a prestação de alimentos, pagando apenas o montante de € 400,00 por mês. 3.3.1.17 Reside sozinho e não tem outros filhos. 3.3.1.18 A requerida trabalha por conta de outrem como técnica de contabilidade. 3.3.1.19 Em 2019, auferia cerca de € 1100,00 por mês, auferindo atualmente cerca de € 1200,00 a € 1300,00. 3.3.1.20 Reside em casa própria, com os menores, suportando cerca de € 250,00 para amortização do empréstimo contraído para aquisição da habitação. 3.3.1.21 Em consumos de eletricidade, água e serviços de internet e telefone, despende, respetivamente, cerca de € 100,00, € 30,00 e € 80,00 a € 90,00 por mês. 3.3.1.22 Suporta ainda os montantes mensais correspondentes à alimentação, água e saúde. 3.3.2 Factos não provados 3.3.2.1 Em 2023, numa média mensal, AA auferiu um valor de cerca de € 506,00. 3.3.2.2 Em média, o que AA tem de pagar a título de pensão de alimentos aos seus filhos ascende a € 1000,00 (entre pensão de alimentos e a quota-parte que lhe cabe nas despesas mensais dos filhos). 4. Fundamentos de direito Dos reflexos da eventual procedência da impugnação da decisão da matéria de facto na pretensão do recorrente de alteração das prestações alimentares a seus dois filhos O recorrente pretende a revogação da sentença recorrida em consequência da alteração da decisão da matéria de facto por que pugnou e ainda por força do valor médio mensal das despesas mensais de seus filhos que está obrigado a suportar na proporção de metade. Na decisão recorrida, a pretensão de redução da prestação alimentar foi julgada improcedente, em síntese, por ter considerado que entre fevereiro de 2022 (veja-se o ponto 3.3.1.5 dos factos provados) e o momento da prolação da sentença não ocorreu qualquer circunstância que afete negativamente a situação económica do recorrente e, consequentemente, a capacidade de prestar alimentos a seus filhos. Cumpre apreciar e decidir. Nos termos do disposto no nº 1 do artigo 42º do Regime Geral do Processo Tutelar Cível “[q]uando o acordo ou a decisão final não sejam cumpridos por ambos os pais, ou por terceira pessoa a quem a criança haja sido confiada, ou quando circunstâncias supervenientes tornem necessário alterar o que estiver estabelecido, qualquer um daqueles ou o Ministério Público podem requerer ao tribunal, que no momento for territorialmente competente, nova regulação do exercício das responsabilidades parentais.” A pretensão do recorrente de revogação da decisão recorrida por causa da alteração da decisão da matéria de facto que requereu improcede já que a factualidade provada se manteve inalterada, apenas se tendo suprido a falta de indicação dos factos não provados. Por outro lado, o recorrente não impugna o juízo do tribunal recorrido que concluiu pela inexistência de qualquer circunstância superveniente determinante da necessidade de redução da prestação alimentar, nomeadamente, procedendo ao confronto das despesas que suportava em fevereiro de 2022 com as que atualmente suporta. De facto, atentando na factualidade provada no ponto 3.3.1.7 dos factos provados, constata-se que entre março de 2020 e novembro de 2021 o recorrente auferiu o montante global de € 14502,55 e, tendo em atenção que esse montante foi recebido num período de doze meses, pode concluir-se que nesses doze meses o rendimento mensal do recorrente foi em média, por arredondamento, de € 1208,55 (€ 14502,55:12= € 1208,5458333…). Se considerarmos o número de meses compreendido entre março de 2020 e novembro de 2021, ou seja, vinte e um meses, o rendimento mensal do recorrente passa a ser de € 690,60, por arredondamento (€ 14502,55:21= € 690,597619047619). Os cálculos que precedem permitem-nos concluir que no período temporal em causa o recorrente teve necessariamente de auferir outros rendimentos pois não se vê como com tais proventos pudesse suportar o pagamento da prestação alimentar fixa devida a seus filhos no montante então de mil euros e muito menos a prestação alimentar variável que a essa pensão fixa acrescia. Na atualidade provou-se que o recorrente tem um rendimento mensal médio de € 1280,00. Deste modo, conclui-se, como concluiu o tribunal recorrido que não houve qualquer alteração superveniente dos rendimentos do recorrente que possa justificar a redução da prestação alimentar que vem prestando a seus filhos. Pelo exposto, não obstante a procedência da arguição de nulidade da sentença recorrida, a pretensão de revogação da mesma sentença improcede, improcedendo deste modo o recurso. As custas do recurso são da responsabilidade do recorrente já que a final improcedeu a sua pretensão recursória (artigo 527º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil). 5. Dispositivo Pelo exposto, os juízes subscritores deste acórdão, da quinta secção, cível, do Tribunal da Relação do Porto acordam em declarar a nulidade parcial da sentença recorrida proferida em 18 de setembro de 2024 por falta de fundamentação e conhecendo do objeto da apelação, julga-se improcedente a impugnação da decisão da matéria de facto, supre-se a omissão geradora da aludida nulidade nos termos antes enunciados e, no mais, julga-se improcedente o recurso de apelação interposto por AA e, em consequência, confirma-se a sentença recorrida na parte em que a sua validade não foi afetada. Custas do recurso a cargo do recorrente já que decaiu a final, sendo aplicável a secção B, da tabela I, anexa ao Regulamento das Custas Processuais, à taxa de justiça do recurso. *** O presente acórdão compõe-se de vinte e uma páginas e foi elaborado em processador de texto pelo primeiro signatário. |