Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
1565/15.8T8VFR-A.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: RUI MOREIRA
Descritores: CONTRATO-PROMESSA DE COMPRA E VENDA
CASO JULGADO
IDENTIDADE DO PEDIDO
Nº do Documento: RP201703281565/15.8T8VFR-A.P1
Data do Acordão: 03/28/2017
Votação: MAIORIA COM 1 VOT VENC
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO, (LIVRO DE REGISTO N.º 761, FLS.164-168)
Área Temática: .
Sumário: I - Em sede de apreciação da excepção dilatória do caso julgado, a verificação dos pressupostos da identidade dos pedidos serve o objectivo último de prevenir que o tribunal se veja na contingência de proferir decisão de mérito que contrarie ou repita uma outra, anterior e definitiva.
II - Nas palavras de Anselmo de Castro, o pedido aparece como o “círculo dentro do qual o tribunal se tem de mover para dar solução ao conflito de interesses que é chamado a intervir.”
III - Não há identidade entre o pedido formulado numa acção de execução específica de um contrato - promessa, que foi julgada improcedente, e aqueles formulados noutra acção ulterior em que se pede a condenação dos promitentes vendedores à realização de deveres de que depende a própria possibilidade de celebração do contrato - prometido e cuja omissão motivara aquela improcedência, a cumular com a consequente condenação na celebração, então possível, do contrato prometido.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: PROC. 1565/15.8T8VFR-A

Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro
Juízo Local Cível de Santa Maria da Feira - Juiz 3

REL. N.º 404
Relator: Rui Moreira
Adjuntos: Fernando Samões
Vieira e Cunha
*
ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO:
1 - RELATÓRIO
O Município B… veio intentar acção em processo comum contra os herdeiros da Herança aberta por óbito de C… e D…, pedindo, entre outras coisas, a sua condenação ao cumprimento de um contrato promessa de compra e venda, que descreve, devendo comparecer ao acto que, para esse efeito, venha a ser marcado por si, bem como a respectiva condenação numa sanção pecuniária compulsória de 250,00€ por cada mês vencido desde a data desse acto, caso lhe venham a faltar.
Para o efeito, alegou – na parte que ao caso agora interessa - que, com data de 03/01/1991, mas assinado a 18/03/1991, celebrou, na qualidade de promitente comprador, com C… e marido D…, na qualidade de promitentes vendedores, um contrato promessa de compra e venda de uma parcela de terreno com a área aproximada de 270 m2, a destacar do prédio sito na Rua …, Santa Maria da Feira, o qual tem a área de 1018 m2, inscrito na matriz sob o art° 1322, e que nessa data logo foi paga a totalidade do preço. Mais alegou que, foi acordado entre as partes que o Autor tomasse posse da parcela de terreno, para a realização das obras de infraestruturas urbanísticas, tendo executado o muro de vedação, na parte sobrante do prédio dos promitentes vendedores, encontrando-se o mesmo fisicamente separado da parcela prometida vender, reconhecendo os promitentes vendedores como prédio autónomo, distinto e demarcado, a parcela de terreno com a área de 270 m2, encontrando-se o mesmo, desde essa, desanexado de facto do prédio de que proveio. Por fim, alegou que os RR. notificados para esse efeito, nem forneceram os elementos necessários à realização a escritura, nem compareceram aos actos que foram aprazados.
Os RR contestaram, opondo a tais pedidos, além de outras excepções e razões, a excepção de caso julgado, alegando a prévia existência de uma acção de execução específica, entre as mesmas partes, destinada a obter o cumprimento do mesmo contrato promessa, que foi julgada improcedente.
Em fase de saneador, esta excepção foi julgada procedente em relação a tais pedidos, pelo que os RR. foram absolvidos da instância na parte respectiva.
É desta decisão que vem interposto recurso pelo autor, que o termina elencando as seguintes conclusões, onde se condensam as razões da sua discordância:
1 - Por acção sumária no Processo n.º 2540/08.4 TBVFR já transitado em julgado o A., ora recorrente, peticionou contra os RR., ora recorridos, no sentido de obter declaração judicial de transmissão do direito de propriedade sobre o prédio em causa da esfera jurídica dos RR. para a esfera jurídica do A., em substituição da declaração de vontade dos primeiros (artigo 830 n,º 1 do Código Civil), estando perante claramente o Instituto da execução especifica;
2 - No âmbito dos presentes autos, vem o A., ora recorrente, peticionar, entre outros pedidos, e reportando-nos apenas à questão da procedência da excepção de caso julgado quanto aos pedidos das alíneas d) e e) da sua Petição Inicial, absolvendo os RR. da instância quanto aos mesmos, o seguinte:
Alínea d) - Condenar-se os RR (ora recorridos) ao cumprimento do contrato promessa de compra e venda, comparecendo na data e hora para realização da escritura pública de compra e venda que venha a ser agendada pelo A. (ora recorrente) e mediante notificação por carta registada com aviso de recepção para o domicílio profissional do(s) ilustre(s) mandatários dos RR, (ora recorridos);
Alínea e) - Condenar-se os RR., ora recorridos, ao pagamento de uma sanção pecuniária compulsória por cada mês vencido após a data agendada para realização da escritura de compra e venda à qual não tenham comparecido no valor de 250€/mês;
3 - Por Despacho Saneador proferido pelo douto Tribunal a quo foi considerada procedente a excepção de caso julgado invocada pelos RR., ora recorridos, quanto aos pedidos das alíneas d) e e) da Petição Inicial do A., ora recorrente, absolvendo os RR. da instância quanto aos mesmos.
4 - A verificação do caso julgado depende do preenchimento cumulativo da tríplice identidade a que o artigo 581º do Código de Processo Civil faz referência: identidade quanto aos sujeitos, ao pedido e à causa de pedir .
5 - Nos termos do douto Despacho Saneador do Tribunal a quo "Na Acção Sumária n,º 2540/08.4TBVFR o A. pretendia obter a execução específica do contrato promessa de compra e venda instaurada contra os promitentes vendedores, a qual foi improcedente" acrescentando que "Através do execução específica o Tribunal emite sentença que supre a declaração negocial do faltoso, dando satisfação ao interesse do credor que não viu cumprida a prestação a que tinha direito, por incumprimento do devedor, sendo pressuposto da execução específica a existência de mora e não o incumprimento definitivo do promitente vendedor (artigo 830º do Código Cívil)."
6 - Ora, o A., ora recorrente, peticiona na alínea d) do pedido constante na sua Petição Inicial a condenação dos réus, ora recorridos, ao cumprimento do contrato promessa de compra e venda, comparecendo na data e hora para realização da escritura pública de compra e venda que venha a ser agendada pelo A., ora recorrente, e mediante notificação por carta registada com aviso de recepção para o domicílio profissional do(s) ilustre(s) mandatário(s) dos RR., ora recorridos.
7 - E bem assim, na alínea e) do pedido, na condenação dos RR., ora recorridos, ao pagamento de uma sanção pecuniária compulsória por cada mês vencido após a data agendada para realização da escritura de compra e venda à qual não tenham comparecido no valor de 250€/mês;
8 - O pedido formulado pelo A. é claro no sentido de condenação dos RR. a celebrar o contrato definitivo de compra e venda do imóvel e à comparência dos mesmos na data e hora que venha a ser agendada por este para a realização do escritura pública.
9 - Na petição inicial inexiste a mínima referência, quer em sede de causa de pedír, quer no pedido, à execução específica do contrato em causa, nem a qualquer norma jurídica que se refira a esse instituto de direito substantivo, por não ser essa a pretensão do A., ora recorrente.
10. E O pedido que o A. formulou é claro no sentido de condenação dos RR. a celebrar o contrato definitivo de compra e venda do imóvel e não no sentido de obter declaração judicial de transmissão do direito de propriedade sobre o prédio em causa da esfera jurídica dos RR. para a esfera jurídica do A., em substituição da declaração de vontade dos primeiros (artigo 830º n.º 1 do Código Civil) e bem assim ao pagamento de uma, sanção pecuniária compulsória por cada mês vencido após a data agendada para realização da escritura de compra e venda à qual não tenham comparecido no valor de 250€/mês.
Os recorridos ofereceram resposta ao recurso, defendendo a confirmação da decisão recorrida e apontando a inadmissibilidade de um pedido de condenação ao cumprimento de um contrato promessa, pois que a essa pretensão só cabe a tutela da execução específica.
O recurso foi admitido como de apelação, com subida em separado e efeito devolutivo.
Foram, depois, recebidos, nesta Relação, considerando-se os mesmos devidamente admitidos, no efeito legalmente previsto.
Cumpre decidir.
2- FUNDAMENTAÇÃO
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso (cfr. art. 639º e nº 4 do art. 635º, ambos do CPC).
No caso, a questão a decidir traduz-se na verificação da excepção de caso julgado relativamente aos pedidos que o autor formulou nesta acção, sob as als. d) e e) supra referidos, em especial no tocante à condenação dos réus a celebrarem uma escritura a que estariam obrigados por efeito de um contrato-promessa, em função da prévia decisão de uma acção judicial na qual havia sido pedida a execução específica do mesmo contrato, que foi de improcedência.
Como dispõe o art. 580º do CPC, a excepção de caso julgado pressupõe a repetição de uma causa, definindo-se no nº 1 do art. 581º em que consiste essa repetição: “Repete-se a causa quando se propõe uma acção idêntica a outra quanto aos sujeitos, ao pedido e à causa de pedir.”
No caso em apreço, o apelante não discute o pressuposto referente à identidade dos sujeitos, nem o que se reporta à causa de pedir, que é o contrato promessa celebrado em 03/01/1991 e assinado a 18/03/1991, entre o Município, na qualidade de promitente comprador, e, C… e marido D… (antecessores dos ora apelados), na qualidade de promitentes vendedores, que tinha por objecto a compra e venda de uma parcela de terreno com a área aproximada de 270 m2, a destacar do prédio sito na Rua …, Santa Maria da Feira, inscrito na matriz sob o art° 1322, contra um preço que logo foi pago na totalidade.
O que o apelante questiona é que o pedido se repita, numa e noutra acção. E isso, porquanto, naquela acção já julgada improcedente, pedira a execução específica desse contrato promessa; e agora pede a condenação dos RR. a celebrar o contrato prometido, sob a sujeição a uma sanção pecuniária compulsória.
Diz-nos o nº 3 daquela norma: “Há identidade de pedido quando numa e noutra causa se pretende obter o mesmo efeito jurídico.”
Esta matéria tem sido alvo recorrente de tratamento jurisprudencial e doutrinal, não se revestindo de controvérsia.
Assim, numa fórmula por vezes repetida, o Ac. do TRC de 6/9/2011, (proc nº 816/09.2TBAGD.C1, em dgsi.pt) esclareceu: “A identidade dos pedidos é perspectivada em função da posição das partes quanto à relação material: existe tal identidade sempre que ocorra coincidência nos efeitos jurídicos pretendidos, do ponto de vista da tutela jurisdicional reclamada e do conteúdo e objecto do direito reclamado, sem que seja de exigir uma adequação integral das pretensões, nem sequer do ponto de vista quantitativo.
Na doutrina, já Alberto dos Reis (CPC Anotado, Vol. III, pg. 107) apontava como essencial, para este efeito, a análise da providência jurisdicional solicitada pelo autor, nos termos positivos e concretos definidos na petição inicial, com referência ao direito que se pretende fazer valer e à incidência material desse direito.
A questão fica melhor esclarecida à luz do ensinamento de Anselmo de Castro (Processo Civil Declaratório, Vol. I, Almedina, 1981, pg 201), que explica que ninguém pode propor uma acção expondo uma situação de facto, deixando ao tribunal a escolha da medida a aplicar, tal como ninguém pode requerer determinada providência sem que exponha a situação de facto com base na qual se arroga a titularidade do direito para o qual pretende tutela. Por isso, conclui: “Daí que o pedido nos apareça como o círculo dentro do qual o tribunal se tem de mover para dar solução ao conflito de interesses que é chamado a intervir.”
E continua: “Por pedido, porém, tanto se pode entender as providências concedidas pelo juiz, através das quais é actuada determinada forma de tutela jurídica (condenação, declaração, etc)…. ; como os meios através dos quais se obtém a satisfação do interesse à tutela, ou seja, a consequência jurídica material que se pede ao tribunal para ser reconhecido. O primeiro é o objecto imediato; o segundo é o objecto mediato. (…)
Para determinar o petitum concorrem ambos os aspectos, embora o objecto imediato contribua em menor escala que o objecto mediato.”
Por outro lado, não se deve esquecer que, em sede de apreciação da excepção dilatória do caso julgado, a verificação dos pressupostos da identidade dos pedidos serve o objectivo último de prevenir que o tribunal se veja na contingência de proferir decisão de mérito que contrarie ou repita uma outra, anterior e definitiva.
É à luz desta doutrina que a análise do tribunal recorrido nos parece ter ficado aquém do necessário, e isso como consequência da autonomização que fez das várias alíneas do pedido constante desta acção, separando os pedidos formulados sob as als. b) e c) – em relação aos quais a acção prosseguiu – dos deduzidos sob as als. d) e e), quanto aos quais deu por verificada tal excepção dilatória. E isso melhor se compreende se tivermos presente o que fora pedido e o conteúdo da decisão proferida na acção anterior, com n,º 2540/08.4TBVFR, onde o A. pretendia obter a execução específica do mesmo contrato promessa de compra e venda.

Na citada acção nº 2540/08.4TBVFR, o pedido formulado era o de uma típica acção de execução específica: o Município pretendia que o tribunal proferisse sentença que substituísse a declaração faltosa dos promitentes vendedores.
Porém, face ao concreto contrato-promessa a executar, foi ajuizado que a correspondente obrigação principal (a celebração do contrato prometido) estava “rodeada de outras obrigações ou deveres acessórios que não tendo expressão no texto do contrato-promessa, são essenciais para o eu cumprimento (…) tendo em vista o cumprimento do contrato prometido. São obrigações ou deveres acessórios dos promitentes vendedores a autonomização da parcela de terreno prometida vender como um prédio autónomo (…).
Assim, sem que a parcela de terreno prometida vender tenha existência e autonomia jurídica, nunca seria possível ao tribunal substituir-se aos réus e emitir, em vez deles, a declaração de venda (…).” (cfr. certidão da sentença, a fls. 77 a 84).
Foi, nestes termos e com tal fundamentação que a acção de execução específica improcedeu.
Num acto inequívoco de aceitação dessa sentença, o Município veio agora formular os seguintes pedidos:
a) (…)
b) Que se reconheça a parcela negociada, de 270 m2, como um prédio autónomo, dividido e demarcado, decretando-se a desanexação da mesma, de facto e de direito, relativamente ao prédio de onde procede, livre de ónus ou encargos;
c) Que se condenem os RR. a acatar essa solução;
d) Que se condenem os réus ao cumprimento do contrato-promessa, outorgando a escritura de venda daquela parcela;
e) Que se condenem os RR. numa sanção pecuniária compulsória, no caso de não comparecimento a esse acto, por cada mês de atraso.
A interpretação dos termos deste pedido à luz da decisão anteriormente proferida na acção nº 2540/08.4TBVFR explica, por um lado, a admissão dos pedidos formulados nas als. b) e c); e, por outro lado, o reconhecimento de uma interdependência entre esses pedidos e os descritos nas als. d) e e), que obstam ao seu tratamento atomístico, nos termos da decisão recorrida.
Com efeito, naquela outra sentença, o tribunal decretou que a obrigação principal do contrato-promessa em questão só era exequível se previamente fossem cumpridos deveres acessórios conducentes à autonomização da parcela de 270m2, do prédio em que se integrava.
Como à realização do direito alegado – que não foi excluído nem reconhecido naquela decisão – deve ser assegurado um meio processual adequado (art. 2º, nº 2 do CPC), não podendo ele ficar dependente da livre vontade dos obrigados de cumprirem aqueles deveres acessórios identificados, deve admitir-se a propositura de uma acção tendente à condenação dos réus ao respectivo cumprimento, sendo nessa acção, i. é, na presente acção, que se discutirá se os mesmos existem, subsistem, enfim, e em que termos o seu cumprimento pode ser imposto.
Todavia, o cumprimento desses deveres acessórios só tem sentido na medida em que seja instrumento da realização da obrigação principal.
Significa isto que, na situação em apreço e na sequência da decisão proferida na acção nº 2540/08.4TBVFR, a presente acção só tem sentido, em função do direito invocado resultante do contrato promessa que integra a causa de pedir, desde que se destine a exigir o cumprimento dos deveres acessórios ali identificados, pois deles depende a possibilidade de cumprimento da obrigação principal; mas só terá sentido útil desde que isso redunde na imposição aos RR., isto é, na sua condenação, no cumprimento dessa obrigação principal, de outorga do contrato de compra e venda dessa mesma parcela, como prometido.
Por consequência, e tendo por referência a lição de Anselmo de Castro que supra se citou e a definição do que seja o petitum, entendemos que não poderão considerar-se autonomamente os pedidos formulados nas als. b) e c), relativamente aos descritos sob as als. d) e e). Eles incluem-se num mesmo e único “círculo dentro do qual o tribunal se tem de mover para dar solução ao conflito de interesses que é chamado a intervir” (repetindo-se a citação feita acima). E, neste contexto, os pedidos formulados naquela acção nº 2540/08.4TBVFR e na presente causa resultam como marcadamente distintos, pois o efeito jurídico que a procedência de uma e outra poderiam assegurar é claramente diferente. De resto, isso mesmo nos parece ser inerente à verificação a posteriori, dos termos e fundamentos da decisão de improcedência proferida naquela outra acção: foi por não poder assegurar a prévia realização dos deveres acessórios identificados que improcedeu a pretensão correspondente à realização da obrigação principal. No caso em apreço, esta realização será viável, desde que previamente imposta a condenação à realização dos deveres acessórios.
A isso acresce que, mesmo por referência ao conteúdo do pedido “imediato” em cada um dos processos, também são distintos os pedidos formulados numa e noutra causa: numa, a substituição da declaração negocial dos promitentes faltosos; noutra (esta), a respectiva condenação ao cumprimento das obrigações acessórias e da própria obrigação principal. E, como vimos, a identidade do pedido “imediato” concorre também para a verificação de uma hipótese de identidade de pedidos.
Por fim, mas com não menos relevância para a decisão desta questão, tenha-se em conta o objectivo servido pelo instituto do caso julgado: a prevenção de que o tribunal se veja na contingência de proferir decisão de mérito que contrarie ou repita uma outra, anterior e definitiva. Segundo este critério, logo se vê que a decisão da totalidade dos segmentos do pedido formulado nesta causa de forma alguma põe em crise, contrariando ou descredibilizando, a decisão proferida naquela acção nº 2540/08.4TBVFR. Esta conclusão logo nos deverá levar a rejeitar a hipótese de caso julgado sob análise.
Resta, então, concluir pela não verificação de uma tal hipótese de identidade de pedidos, entre a acção nº 2540/08.4TBVFR e aqueles que, sob as als. d) e e), aparecem deduzidos na presente acção, o que impede que, em relação a estes, se possa dar por verificada a excepção de caso julgado.
Cumprirá, nestes termos, revogar a decisão recorrida, com a consequência de a acção prosseguir para a apreciação, também, de tais pedidos.
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Sumariando (nº 7 do art. 663º do CPC):
- Em sede de apreciação da excepção dilatória do caso julgado, a verificação dos pressupostos da identidade dos pedidos serve o objectivo último de prevenir que o tribunal se veja na contingência de proferir decisão de mérito que contrarie ou repita uma outra, anterior e definitiva.
- Nas palavras de Anselmo de Castro, o pedido aparece como o “círculo dentro do qual o tribunal se tem de mover para dar solução ao conflito de interesses que é chamado a intervir.”
- Não há identidade entre o pedido formulado numa acção de execução específica de um contrato-promessa, que foi julgada improcedente, e aqueles formulados noutra acção ulterior em que se pede a condenação dos promitentes vendedores à realização de deveres de que depende a própria possibilidade de celebração do contrato-prometido e cuja omissão motivara aquela improcedência, a cumular com a consequente condenação na celebração, então possível, do contrato prometido.
3 - DECISÃO
Pelo exposto, acordam os juízes que constituem este Tribunal em julgar procedente a presente apelação, em consequência do que revogam a decisão recorrida, que deu por verificada a excepção de caso julgado e absolveu da instância os RR., relativamente às pretensões constantes das als. d) e e) do pedido, a qual substituem por outra que, julgando não verificada tal excepção dilatória, determina que a acção prossiga para a respectiva apreciação.
Custas pelos apelados.

Registe e notifique.

Porto, 28/3/2017
Rui Moreira
Fernando Samões
Vieira e Cunha (Vencido. Considerei existir caso julgado. Os efeitos práticos de competir ao prometido - independentemente da viabilidade do pedido – onde execução especifica são idênticas e continua a não se saber se é viável o destaque).